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Capítulo 4

Transporte de Água
no Sistema 5010-
Planta-Atmosfera
Movimento de água
e solutos nas plantas

Frederico Ozanan Machado Ourães


Paulo César Magalhães
Transporte de Água no Sistema Solo-Planta-Atmosfera ..

Introdução

A água é um insumo fundamental para a produção vegetal, por


participar dos processos vitais da planta, e a sua utilização e a eficiência de
uso são tecnologicamente parâmetros de produtividade e competitividade.

Cerca de 75 % da superfície terrestre encontra-se recoberta pela


água. Essa substância forma mais da metade de todos os tecidos vivos e
mais de 90 % da maioria dos tecidos vegetais. O movimento da água, nos
sistemas vivos ou no mundo abiótico, é governado por três princípios: o movi-
mento em massa (é o movimento global da água - ou de outro líquido =,
que ocorre em resposta a diferenças no potencial energético da água, geral-
mente designado por potencial
/I da água "), a difusão (que pode ser
entendida como a dispersão de substâncias pelo movimento independente
de seus íons ou moléculas, que tende a igualar suas concentrações num sistema)
e a osmose (fenômeno do movimento da água através das membranas).

As propriedades da água, tais como tensão superficial, coesão e


adesão, embebição, calor específico e latente de vaporização e de fusão,
constituem uma das mais poderosas forças que dirigiram a história evolutiva
dos sistemas vivos em geral e, em virtude da sua dependência de água
subterrânea, a evolução das plantas terrestres, em particular.

Neste capítulo, descreve-se o movimento de água e de solutos através


do organismo vegetal, do solo até a atmosfera, e, depois, o movimento de
solutos e da água dos locais de fotossíntese às partes não-assimiladoras do
corpo da planta. Descreve-se ainda o processo de transpiração, que é o
principal fator determinante do movimento da água através da planta.
A magnitude da transpiração é de tal grandeza que uma única planta de
milho, pesando cerca de 0,4 kg (base peso seco) na época da colheita,
absorve, transporta e transpira de 130 L a 180 L (ou kg) de água. Estima-se
que a água perdida por transpiração por um pé de milho médio, durante a
estação de crescimento, equivale a cerca de 38 cm de chuva.

A água no sistema solo-planta-atmosfera


A vida evoluiu na água, que é o meio essencial da ocorrência de
processos bioquímicos. O protoplasma celular exibe os sinais de vida somente
quando provido de água. Quando em processos de secagem, o protoplasma
deve, no mínimo, entrar no estado anabiótico (no qual os processos vitais
são suspensos) ou morre.

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Uso e Manejo de Irrigação

As plantas compõem-se principalmente de água. Em média, o


protoplasma contém 85 % a 90 % de água. Mesmo as organelas das células
ricas em lipídios, como os cloroplastos e os mitocôndrios, são constituídas
de 50 % de água. O conteúdo de água dos frutos é particularmente elevado
(85 % a 95 % do peso fresco), assim como o das folhas tenras (80 % a
90 %) e das raízes (70 % a 95 %). As madeiras recém-cortadas contêm
cerca de 50 % de água. As partes das plantas com menos água são as
sementes maduras (geralmente, 10 % a 15 %). Algumas sementes com
grandes estoques de gordura contêm apenas 5 % a 7 % de água.

Nas plantas terrestres, cujas partes assimilativas estão em contato


com o ar e perdem água continuamente, por evapotranspiração, o estabe-
lecimento de relações adequadas com a água é o primeiro requisito.
Dependendo do fato de poderem ou não compensar as flutuações, a curto
prazo, no suprimento de água e na taxa de evaporação, as plantas terrestres
podem distinguir-se como poiquiloídricas (ou peciloídricas, aquelas que
combinam seu conteúdo de água com a umidade de seu meio ambiente) e
homeoídricas (ou homoioídricas, com grande vacúolo central).

A água atinge o solo principalmente como chuva. Uma parte é arma-


zenada no próprio solo, outra parte é drenada através de seu perfil para as
camadas mais profundas e, estando o solo já saturado, outra parte pode
fluir através da superfície para drenos e cursos d'água. Uma porção da
água no solo evapora na superfície, enquanto a outra é absorvida pelas
raízes das plantas e evaporada ou transpirada para a atmosfera através de
suas folhas. Essa circulação da água da atmosfera para o solo e seu retorno
à atmosfera compreende o ciclo hidrológico.
As diversas formas de fornecimento de água para as plantas são
derivadas principalmente da precipitação, do lençol freático ou do
movimento de água para cima ou lateralmente para dentro do solo. A água
suplementar para irrigação pode ser obtida de cursos d'água, lagos, poços
comuns ou poços artesianos.

Apenas parte da água que um solo pode reter fica disponível para as
plantas. Essa parte é comumente compreendida como a água retida entre
a capacidade de campo e o ponto de murcha permanente. Fundamental-
mente, as forças responsáveis pelo movimento de água no sistema solo-
planta-atmosfera são os gradientes de potenciais gravitacional, matricial,
de pressão e osmótico, sendo o movimento de água um processo espontâneo
à procura de um potencial (ou estado de energia) mais baixo. O processo
de absorção de água do solo não consome diretamente energia metabólica

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Transporte de Água no Sistema Solo-Planta-Atmosfera ...

da planta. Entretanto, a atividade metabólica da planta é responsável pela


composição da água da planta (sais minerais, açúcares, etc.) e é ela que
determina o potencial osmótico.

Em plantas que transpiram água em taxas médias e altas, o potencial


muito negativo da água da atmosfera é o responsável pela grande perda
de água pelas folhas e, em conseqüência, a água líquida nos terminais do
xilema na folha assume potenciais bem negativos. Essa grande diferença
de potencial de água entre as folhas e o solo é que causa o grande fluxo de
água na planta, isto é, da absorção de água, fenômeno conhecido como
"absorção passiva".

Explica-se as baixas taxas de transpiração de algumas plantas por


uma das seguintes razões: a) atmosfera saturada (ou perto da saturação);
b) pouca energia disponível para o processo de evaporação; c) plantas em
dormência (sem ou quase sem folhas). A principal força responsável pelo
fluxo de água é o gradiente de potencial osmótico. A água na planta assume
pressão positiva (pressão de raiz, por exemplo, gutação nas bordas das
folhas, que acontece pela madrugada, quando praticamente não há
transpiração, e o caso da seiva que escorre de plantas dormentes recém-
podadas). Essa absorção é denominada "absorção ativa".

A estrutura de partes das plantas vasculares que participam da


transferência de água do solo para a atmosfera é descrita como sistema
radicular, cujos tecidos são capazes de absorver água líquida e fazer a sua
transferência para os vasos do xilema e para as células das folhas, que
recebem a água das extremidades superiores dos vasos do xilema e a
evaporam através de suas superfícies, para os espaços intercelulares, de
onde ela retorna à atmosfera, principalmente através dos estômatos.

Ciclo hidrológico na agricultura


A água que penetra no solo enche o reservatório do solo e, quando
este atinge a saturação, o excesso é drenado para os aqüíferos. A água
retida no reservatório do solo é absorvida pelas raízes das plantas e levada,
através de seus caules, às folhas, onde evaporam, retornando assim para a
atmosfera, onde se reúne à água evaporada do mar, dos lagos e rios e da
superfície de solos úmidos (Fig. 1). Esse ciclo hidrológico depende, para sua
continuação, da energia derivada da radiação solar, e sua taxa é altamente
governada por fatores meteorológicos (por exemplo, distribuição e taxa de
precipitação, evaporação, orvalho, etc.).

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Uso e Manejo de Irrigação

:;):.~.....
: .. ..
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àirculação beral':
Radiação solar da'atrnosfera-:
Chuva irrigação

Vento

Fig.1. Ciclo da água


na agricultura.
Ilustração: Idmar Pedra.

Armazenamento
pelo solo

percolaçãolll
profunda" •. ,. AI! Ascensão
Armazenamento
pelo solo
! capilar

o significado agrícola de taxa de precipitação reside em sua relação


com a taxa em que o solo local pode aceitar a água, isto é, sua taxa de
infiltração característica.

A água evapora para o ar de qualquer superfície úmida: de lagos, dos


cursos de água e do mar, do solo úmido ou da folhagem, e também de
superfícies úmidas das células do parênquima esponjoso das folhas. A taxa
de evaporação é governada pela energia da radiação incidente, pela
temperatura, pela umidade e pelo movimento do ar imediatamente acima
da superfície evaporante. O ponto importante é que a transpiração das
plantas é um processo de evaporação passivo, sujeito às mesmas restrições
que a evaporação de superfícies não-vivas.

A relação entre a precipitação (entrada de água), a evaporação, a


transpiração e a drenagem (saída de água) é mostrada na Fig. 1, que fornece
valores para os diferentes termos medidos em um ano de tempo médio. Do
total de precipitação anual, cerca da metade é transpirada através das
plantas, aproximadamente um quinto é perdida no verão pela evaporação
da superfície do solo, e aproximadamente um terço é perdida durante o
inverno pela drenagem através do solo.

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Transporte de Água no Sistema Solo-Planta-Atmosfera ...

Formas de fornecimento
de água para as plantas

Como já comentado, a água disponível para as plantas origina-se


especialmente da precipitação, do lençol freático ou do movimento de água
para cima ou lateralmente dentro do solo. Entretanto, água suplementar
para irrigação pode ser obtida de cursos d'água, lagos, poços comuns ou
poços artesianos.
A chuva ou precipitação pluvial é a forma principal pela qual a água
retorna da atmosfera para as culturas agrícolas e para o solo, nas regiões
tropicais e subtropicais.
A chuva, ao atingir uma cultura, pode ser diretamente absorvida pelas
folhas, pelos ramos e pelos caules, mas, geralmente, a maior quantidade
acaba atingindo a superfície do solo. Parte fica na planta (interceptação
vegetal ou da cultura) e parte atinge o solo (chuva efetiva). Dependendo
da intensidade de chuva, da declividade do terreno e do tipo de solo, parte
da chuva efetiva não penetra no solo e escorre sobre sua superfície,
constituindo a enxurrada (run-off, ou escoamento superficial). A parte que
se infiltra geralmente se movimenta de cima para baixo, por causa do
gradiente de potencial gravitacional, e acaba abastecendo o reservatório
de água constituído pelos poros do solo. Com o excesso de chuva, o
reservatório enche-se (capacidade de campo - CC) e o excesso drena para
camadas mais profundas, saindo da zona radicular da cultura. Essa água
contribuirá para a recarga dos aqüíferos subterrâneos.
A quantidade de chuva é medida pelo volume de água precipitada
por unidade de área, enquanto a intensidade de chuva mede-se pelo volume
de água precipitada por unidade de área e de tempo. A medida é feita por
pluviõmetros, que são instrumentos captadores de chuva, constituídos de
um cilindro captador e de um reservatório de água.
Se uma cultura anual desenvolver-se adequadamente, com um supri-
mento suficiente de água, ela consumirá, em média, 4 mm a 6 mm de água
por dia. Para um ciclo de 120 dias, são necessários, portanto, de 480 mm a
720 mm por cultura. Observando-se a distribuição média de chuva, pode-
se avaliar o potencial agrícola de diferentes regiões. Para culturas perenes,
como o café e a laranja, pode-se utilizar uma demanda menor, de 2 mm a
3 mmldia, mas, pelo período de um ano, totalizando de 730 mm a 1.095 mm.

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Uso e Manejo de Irrigação

Água disponível para as plantas

A água é retida no solo, ou seja, em seus poros, fenômeno conhecido


como capilaridade e adsorção. A capilaridade está ligada à afinidade entre
as partículas sólidas do solo e a água, havendo, porém, a necessidade de
interfaces água-ar chamadas de meniscos (que apresentam uma curvatura
que é tanto maior quanto menor for o poro). Como o solo possui uma
variedade imensa de poros, em forma e tamanho, quando se aplica uma
dada energia ao solo (por exemplo, pela sucção), esvaziam-se inicialmente
os poros maiores. Aumentando-se a energia aplicada, esvaziam-se os poros
menores.
A capilaridade atua na retenção de água nos solos na faixa úmida,
quando os poros se apresentam razoavelmente cheios de água. Quando o
solo se seca, os poros vão se esvaziando e filmes de água recobrem as
partículas sólidas. Nessas condições, o fenômeno de adsorção passa a
dominar a retenção de água. A adsorção pode ser elétrica, pois a água é
um dipolo, ou material, correspondendo a uma atração entre os sólidos e a
água. A energia de retenção da água nessas condições é ainda muito maior
e, por isso, grande quantidade de energia é requerida para se retirar essa
água do solo.
Entre os fatores que afetam a retenção de água no solo, a textura é
o principal fator, pois, diretamente, determina a área de contato entre as
partículas sólidas e a água, e estabelece as proporções de poros de diferentes
tamanhos. A textura refere-se apenas ao tamanho da partícula e ao tipo
de argila (por exemplo, montmorilonita, vermiculita, ilita têm ótimas proprie-
dades de retenção; enquanto caulinita e gibsita não apresentam boas
propriedades de retenção de água). A matéria orgânica, quando coloidal,
também apresenta boas propriedades de retenção. Por isso, adições
repetidas de esterco ou matéria orgânica ao solo podem aumentar sua
retenção de água. A estrutura determina o arranjo das partículas, quem
por sua vez, vai determinar a distribuição dos poros.
Ao se medir a água retida pelo solo, alcança-se, como resultado, a
umidade do solo (medida à base de peso ou à base de volume), que pode
ser: a) umidade à base de peso = (massa de água/massa de partículas
sólidas) x 100; b) umidade à base de volume = (volume de água/volume
total do solo) x 100. Mais detalhes são vistos no Capítulo 2.
A umidade do solo é um parâmetro extremamente variável,
principalmente com o tempo. Com a chuva ou irrigação ela aumenta, e

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Transporte de Água no Sistema Solo-Planta-Atmosfera ...

com a drenagem ou evapotranspiração ela diminui. Os extremos de sua


variação são a umidade do solo seco em estufa a 105°C e o solo saturado,
no qual todos os poros são ocupados com água. O valor desses extremos
varia de solo para solo. A umidade do solo seco em estufa a 105°C é
considerada zero, apesar de os solos, nessascondições, ainda reterem água
de cristalização. Outro valor importante é a umidade do solo seco ao ar.
Um solo, depois de exposto ao ar por tempo relativamente longo, permanece
a uma umidade praticamente constante, variável de solo para solo. Nessas
condições, a umidade de um solo arenoso é da ordem de 0,2 % a 1 %, e
de um solo argiloso, de 5 % a 10%.
Como o solo é um reservatório sem fundo, quanto maior for a profun-
didade considerada, maior será a quantidade de água armazenada. Entre-
tanto, em virtude da ação da gravidade, parte da água move-se no sentido
vertical, para baixo, saindo da zona radicular e indo contribuir para a recarga
dos reservatórios subterrâneos. Por isso, ao se definir o armazenamento de
água de um solo, é preciso definir a profundidade. Normalmente, toma-se
a profundidade explorada pelo maior volume (90 % a 100 %) do sistema
radicular. Assim, para a cultura de feijão, essa profundidade seria pequena
(20 cm a 40 cm); para a cana-de-açúcar, média, de 80 cm a 120 cm; para
seringueiras, grande (maior que 1 m). A distribuição radicular da mesma
planta depende do sistema de plantio, do tipo de solo, da variedade, do
preparo do solo, da profundidade de calagem, etc.
Além dos fenômenos matriciais, a presença de solutos na água do
solo também afeta seu estado de energia. Como os solutos movem-se junto
com a água, essa energia potencial, chamada de osmótica, geralmente
não é importante. Mas ela é significativa na presença de membranas
semipermeáveis, que permitem a passagem da água, e não a dos solutos.
A energia potencial total da água (potencial total, 'l') é a soma de
todas as energias. Cada uma de suas partes é uma componente, e assim
tem-se: \jf = 'l'g + 'l'p + 'l'm + 'l'os + ...; sendo: 'l'g = componente gravitacional;
'l'p = componente de pressão; 'l'm = componente matricial; 'l'os = componente
osmótica, e outras formas de energia, geralmente desprezíveis.
Diferenças de potencial são indicativos da tendência de movimento
da água; por exemplo, em uma cultura agrícola, em pleno desenvolvimento,
se o potencial da água no solo é da ordem de -1 atm (- 0,1 MPa), na planta
é de -5 atm (-0,5 MPa) e na atmosfera é de -100 atm (-10 MPa), a tendência
natural da água é passar do solo para a planta e da planta para a atmosfera.
Desse movimento resulta o fluxo de evapotranspiração.

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Uso e Manejo de Irrigação

A Fig. 2, com pontos no solo, na planta (esquema de uma cultura de


milho) e na atmosfera, expressa os componentes do potencial total, "'.

Fig. 2. Componentes
do potencial total \jf na
cultura do milho.
Ilustração: Idmar Pedra.

+ -D

Na Fig. 2, o potencial gravitacional ("'9) para cada ponto é


simplesmente calculado de acordo com a equação lfIg = mgz/V = dgz, e o
resultado é:
Em A: '" 9 = O (plano referencial, na superfície do solo e região do
coleto na planta).
Em B: "'9 = -49.050 bárias = -0,048 atm = -50 cm H20 = -4,9 kPa.
Em C: "'9 = -98.100 bárias = -0,097 atm = -100 cm H20 = -9,8 kPa.
Em D: "'9 = -49.050 bárias = -0,048 atm = -50 cm H20 = -4,9 kPa.
Em E: "'9 = +68.670 bárias = +0,068 atm = +70 cm HP = +6,9 kPa.
"'9
Em F: = + 117.720 bárias = +0,116 atm = + 120 cm HP = + 11,8 kPa.
° gradiente do potencial gravitacional é constante, independen-
temente da posição considerada no solo, na planta ou na atmosfera, sendo:
gradiente "'9= L1"'/L1Z = constante = dgzlz = dg.
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Transporte de Água no Sistema Solo-Planta-Atmosfera ...

Tomando-se os pontos A e B; B e C; e F e D da Fig. 2, tem-se:

A e B: gradiente '1'g= {O - (-49.050)}/50 = 981 bária/cm.


B e C: gradiente '1'g= {-49.050 - (-98.1 00)}/50 = 981 bária/cm.
F e D: gradiente 'V
9
=
{117.720 - (-49.050)}/170 =
981 bária/cm.
Nas demais unidades, o gradiente de potencial tem os seguintes
=
valores: gradiente '1'g 981 bária/cm =
0,00097 atm/cm =
1 cm H20/cm =
9,81 kPa/m, sendo que todos esses valores são força, mas como '1'gé medido
em energialvolume, o gradiente 'V é força por unidade de volume.

° gradiente gravitacional
9

é de grande importância para solos bem


úmidos, próximos à saturação, pois, nessas condições, gradiente '1'g é a
maior força que atua sobre a água do solo. Quando um solo perde água, os
outros gradientes vão ganhando importância com relação ao gravitacional
e este, por sua vez, vai perdendo importância. Um fato marcante é que o
gradiente '1'gé constante e dirigido de baixo para cima, independentemente
de a água estar em um solo arenoso ou argiloso, na planta ou na atmosfera.

Como o solo é um material poroso e estando todos os poros cheios


de água (solo saturado), a pressão hidrostática ('1'p) preenche os poros e o
ponto C (Fig. 2), que se encontra no solo, é submetido a uma carga hidráulica
=
de 40 cm. Assim, em C, 'Vp (1 g crn=) x (981 cm S'2) x (40 cm) =
39.240 bária.
Como, na componente de pressão, só são consideradas cm S·2 (acima da
pressão atmosférica), ela só existe em situações de excesso de água - água
livre exercendo carga hidráulica sobre o solo saturado. Nas plantas,
existe o turgor vegetal, isto é, pressão positiva, que é a componente de
pressão '1'p'
Os fenômenos de capilaridade e de adsorção dependem principal-
mente do arranjo poroso, da distribuição de poros segundo seu diâmetro
médio, da tensão superficial da água, da afinidade entre a água e as
superfícies sólidas, da superfície específica do solo, da qualidade das
partículas sólidas (principalmente da fração argila), etc. Se, por exemplo,
um capilar de vidro for introduzido na água, a água nele penetra esponta-
neamente e atinge uma determinada altura (h). °
fato de a água penetrar
espontaneamente no capilar já indica que a energia da água dentro do
tubo é menor do que fora dele.

° solo possui poros de diversas dimensões e de formas irregulares.


De qualquer forma, fenômenos semelhantes ao do capilar de vidro
introduzido na água ocorrem no solo. Esses fenômenos conferem um estado
negativo de energia à água nele contida. Essa energia negativa ou tensão

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Uso e Manejo de Irrigação

é a componente matricial 'Vm (Fig. 2). Além do fenômeno de capilaridade, o


fenômeno de adsorção contribui para 'Vm.

Para um solo saturado, no qual todos os poros estão cheios de água,


não existem meniscos (interfaces água/ar), e a adsorção também é nula.
Nessas condições, a componente matricial é nula ('Vm = O). Com a saída de
água, o solo vai se tornando não-saturado e o ar repõe a água inicialmente
nos poros maiores. Aparecem meniscos e a capilaridade começa a atuar.
Como conseqüência, a componente matricial torna-se cada vez mais
negativa. A água sempre vai ocupar os poros menores, nos quais a energia
é mais negativa. Portanto, quanto menor for a umidade do solo, mais
negativo será 'Vm. Para valores de umidade do solo relativamente altos (solos
úmidos), a capilaridade é o principal fenômeno que determina 'Vm. Por isso,
nessas condições, o arranjo poroso, determinado pelas estrutura, textura,
composição das partículas, etc., é de enorme importância. A compactação,
por exemplo, afeta o arranjo poroso, afetando, assim, o valor de 'Vm.
Para valores de umidade do solo relativamente baixos (solos secos), a
água apresenta-se na forma de filmes, cobrindo as partículas de solo, e o
fenômeno de capilaridade deixa de ter importância. Nessa condição, a
adsorção é importantíssima e, por conta dela, 'Vm assume valores bem
negativos. O arranjo poroso passa a ter menos importância pelo fato de ele
não afetar a adsorção da água.

As curvas de retenção são de grande utilidade para estimar valores


de 'Vm por meio de dados de umidade do solo. Como a curva é uma
característica do solo, ela é determinada uma vez apenas e, se for preciso
obter valores de potencial matricial, determina-se a umidade do solo e,
pela curva, estima-se o valor de 'Vm. A curva de retenção apresenta limitações
e varia bastante com pequenas variações de textura, de compactação, de
estrutura, etc. Geralmente, ela é determinada em laboratório, com amostras
deformadas, muitas vezes peneiradas, com estrutura bem diferente da
encontrada no campo. Variações de densidade e de textura de um horizonte
para outro, dentro do mesmo perfil de solo, podem determinar a necessidade
do uso de curvas distintas de retenção de água para cada horizonte.

Considerando os íons e outros solutos encontrados na água do solo,


a água adquire uma energia de potencial osmótico e essa é a componente
'Vos (Fig. 2). Observa-se que, quanto mais concentrada
for a solução, menor
será o estado de energia da água e, portanto, mais negativo o valor de 'Vos.
Uma forma aproximada de calcular a componente osmótica é pela equação
de van't Hoff: 'Vos = -RTC; em que R é a constante geral dos gases (0,082 atm

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Transporte de Água no Sistema Solo-Planta-Atmosfera ...

x l/moi xOK, ou 84,7 cm H20 x l/moi xOK, ou 8,2 MPa x rnvrnol x == K); T éa
temperatura absoluta da solução (em °K); e C é a concentração de soluto
em moi/L. Diferenças de potencial osmótico não causam movimento
significativo de água, mas, sim, de soluto. Diferenças de potencial osmótico
só causarão movimento de água quando o sistema estiver "separado" por
uma membrana semipermeável.

Na planta, as membranas celulares são semipermeáveis e, por isso,


nelas o potencial osmótico é de grande importância. Por causa dessas
membranas, a água penetra nas células, conferindo-Ihes um turgor (pressão
positiva) que mantém a planta ereta e túrgida. Na passagem da água do
solo para as raízes, também são encontradas as membranas semiper-
meáveis, e o potencial osmótico não pode ser desprezado.

No solo, de uma maneira geral, não existem membranas semiper-


meáveis e a componente de potencial osmótico não é considerada para
movimento de água. Qualquer gradiente de potencial osmótico que se
estabeleça' no solo por uma razão qualquer acaba provocando um
movimento de solutos (que se redistribuem) e um movimento desprezível
de água. Mesmo no solo, toda vez que a água passa para o estado de
vapor, como é o caso da evaporação através de sua superfície, "aparece"
uma membrana semipermeável, pelo fato de os solutos não passarem para
o estado de vapor. A água que fica para trás torna-se mais concentrada.
Daí a concentração de sais na superfície, formando uma crosta salina.

Uma adubação exagerada e próxima à semente pode desidratá-Ia.


É que a semente não absorve os sais, mas perde água, ficando assim afetado
seu poder germinativo.

Potencial total de água ('JI)


° potencial total da água (\jf) é a soma de todas as componentes e é
dado pela equação \jf =
\jfg + \jfp + \jfm + \jfos + .... Acontece, porém, que,
para diversos sistemas, a importância de cada componente é diferente, e a
equação do \jf fica simplificada.

No solo

• No solo saturado e imerso em água: \jf = \jfg + \jfp' Nesse caso, \jfg é
importantíssima, depende do valor da carga hidráulica que atua
\jfp

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Uso e Manejo de Irrigação

sobre o solo, 'l'm = 0, pois não há interfaces água/ar e '1'05 não é


considerado por não haver membrana semipermeável.
• No solo não-saturado: 'I' = 'l'g + 'l'm' Nesse caso, 'l'g é de grande
importância na faixa úmida e vai perdendo importância com o
decréscimo da umidade, Com esse decréscimo da umidade, 'l'm vai
ganhando importância até que, para o solo bem seco, 'I' = 'l'm' Como
não existe água livre no sistema, 'l'p
não haver membrana semipermeável.
= ° e '1'05 não é considerado por

Passagem da água do solo para as raízes

• No solo inundado (por exemplo, arroz irrigado, milho "saracura"


sob encharcamento): 'I' = 'l'g + 'l'p + '1'05'
• No solo não-saturado (por exemplo, arroz de sequeiro, milho
"normal "): 'I' = 'l'g + 'l'm + '1'05'
Na planta

• Em células de tecido tenro (por exemplo, folha): 'I' = 'l'p + '1'05' Nesse
caso, 'I' p é o turgor celular (uma pressão positiva que aparece em
células túrgidas em decorrência da entrada de água em um volume
celular limitado), Em casos extremos, a turgidez pode arrebentar a
célula, Em caso de falta de água, 'l'p tende para zero e a planta
entra em murcha, Valores típicos de 'l'p em folhas variam de -2 atm
a -6 atm (de -0,2 MPa a -0,6 MPa), '1'05 aparece em virtude da
presença de solutos na água da planta (seiva bruta e seiva elabora-
da) e seus valores são da ordem de -5 atm a -10 atm (de -0,5 MPa
a -1,0 MPa), Como 'l'p e '1'05 são da ordem de atmosferas, geralmente
'l'g é desprezível, e como não há interfaces água/ar, 'l'm = 0,
• No tecido vegetal fibroso ou lenhoso: 'I' = 'l'm + '1'05' A componente
'l'm aparece porque as fibras de celulose e aglomerados de amido
comportam-se como a matriz sólida do solo, Sementes e outros
tecidos lenhosos em caules, raízes e tubérculos podem apresentar
valores bem negativos de 'l'm' Como '1'05 também é negativo, o valor
final de 'I' fica bem negativo, Por isso, as sementes são ávidas por
água e a absorvem com rapidez, muitas vezes dobrando seu volume,
• Na atmosfera: 'I' =
'l'p' Na atmosfera, a água encontra-se na fase
de vapor e seu estado é definido pela pressão parcial de vapor e,

182
Transporte de Água no Sistema Solo-Planta-Atmosfera ...

Essapressão em valores absolutos é pequena, mas confere à água


um potencial bem negativo. A equação do potencial do vapor d'água
\jf na atmosfera é utilizada para calcular \jfp e, como seu valor é, em
geral, bem negativo, \jfg é desprezado. \jfm e \jfos não entram em
consideração pelo fato de se tratar de vapor d'água "dissolvido"
em ar. Por meio de tratamento termodinâmico, pode-se demonstrar
que o potencial do vapor d'água \jf na atmosfera é dado por
\jf = (RT/M) In (ele), em que: R é a constante universal dos gases
(8,31 J rnol' "K:'): T é a temperatura absoluta do ar (em °K); Mv é a
massa molecular da água (18,016 g mol'): e é a pressão parcial de
vapor do ar (em kPa); es é a pressão de vapor do ar saturado (em
kPa); e In é Iogaritmo neperiano.
O vapor d'água (símbolo e significa pressão absoluta de vapor, ou
pressão de vapor) é regido por três princípios básicos, quais sejam: 1) quanto
maior a quantidade de vapor existente no ar, maior a pressão de vapor e;
2) a uma dada temperatura T, existe um máximo de vapor que o ar pode
reter e, nesse máximo, o ar é denominado saturado e sua pressão de vapor
é denominada de pressão de saturação; 3) quanto maior a temperatura do
ar, maior a quantidade de vapor que o ar pode reter, isto é, quanto maior 1,
maior es' Portanto, vê-se que o ar frio pode "carregar" menos vapor d'água
do que o ar quente. A relação entre a pressão de saturação es e a tempera-
tura T é bem definida, e dada por: es = 0,61078 exp [(17,269 t)1 (t + 237,3)],
sendo es obtido em kPa para valores de t em "C. A diferença (es - e) é
denominada de déficit de saturação - d = (es - e) - e representa a pressão
que falta para o ar se saturar. O déficit de saturação dá uma idéia da umidade
do ar; e, quanto menor for o déficit, mais saturado será o ar. Muito utilizada
também é a relação entre e e es' que, quando multiplicada por 100, é
denominada de umidade relativa UR: UR = (e I es) x 100. Vê-se que UR =
100 % quando e = es' o que significa que o ar está saturado. Por sua vez,
°
UR = % quando e = 0, representando ar completamente seco, o que, na
prática, não acontece.

Movimento de água
A equação de Darcy (q = -K x grad \jf) mostra que a movimento de
água no solo, medido pelo seu fluxo, é o produto de K por gradiente \jf.
Portanto, o produto dos dois fatores é que determina o fluxo. Se a
condutividade hidráulica do solo for grande, isso não implicará

183
Uso e Manejo de Irrigação

necessariamente um fluxo grande. Se o gradiente de '" for muito pequeno,


não haverá fluxo grande, mesmo se a condutividade hidráulica for grande. •
Assim, em um solo seco, mesmo na presença de um gradiente de potencial
relativamente grande, o fluxo de água será praticamente nulo. Pode,
portanto, haver uma variedade grande de combinações de K e de gradiente
"', cada uma determinando um fluxo q de água.
O fluxo de água na planta e na atmosfera obedece a leis semelhantes,
sendo que a condutividade hidráulica dessessistemas é sempre bem grande,
não havendo limitação para o fluxo. Na maioria dos casos, quem determina
o fluxo de água é o gradiente "'.
A análise do movimento de água em um sistema constituído de uma
cultura agrícola qualquer em pleno desenvolvimento é mostrada na Fig. 3,
que indica um ponto genérico A no solo, outro B na raiz da planta, outro
C na folha e outro D na atmosfera. Durante um dia ensolarado, o potencial
total de água no solo "'A gira em torno de -0,1 atm a -2 atm (-0,01 MPa a
-0,2 MPa); na raiz "'9 em torno de -1 atm a -5 atm (-0,1 MPa a -0,5 MPa); na
folha "'c em torno de -3 atm a -10 atm (-0,3 atm a -1 MPa); e na atmosfera
"'D em torno de -50 atm a -200 atm (de -5 kPa a -20 kPa). Como: "'A(solo) > "'9
(raiz) > "'C (folha) > "'D (atmosfera)' O movimento da água dá-se de A para B, para C e,

Fig. 3. Movimento de
água no sistema
solo-planta-atmosfera.
Ilustração: Idmar Pedro.

184
Transporte de Águ,a no Sistema Solo--Planta-Atmosfera ...

finalmente, para D, ou seja, do solo para a planta, e desta para a atmosfera.


Esse movimento dá-se espontaneamente, sendo que a água apenas procura
um estado de energia mais baixo, que, no caso, está na atmosfera; daí, a
demanda atmosférica. É, portanto, errado dizer que a planta retira água
do solo. A água vai espontaneamente do solo para a planta, ainda que,
para o observador, pareça que a planta é que faz uma "sucção" da água
do solo. As plantas não consomem energia nesse processo. É, porém, comum
falar-se em absorção de água pelas plantas.

Na Fig. 3, o movimento de água de A para B é movimento no solo. Ele


=
é regido pela equação de Darcy (q -K x grad '1') e é, portanto, proporcional
ao gradiente 'I' entre A e B e à condutividade hidráulica do solo K entre A e
B. Enquanto esse fluxo de água q =
-K gradiente 'I' atender à demanda
atmosférica, o que significa que toda água perdida por transpiração nas
folhas é reposta pelo solo, a planta desenvolve-se adequadamente,
permanece túrgida, sem entrar em murcha. Quando o fluxo de água q no
solo não atender à demanda evaporativa da atmosfera, a planta passa a
perder sua própria água e entra em murcha. Uma pequena murcha nas
horas mais quentes do dia é comum e tolerável, não afetando sensivelmente
a produtividade agrícola. Quanto maior a perda de água e mais longo o
período de murcha, tanto mais irreversível será o processo, ficando a
produtividade ameaçada e, em casos extremos, provocando a morte da
planta. É por esse motivo que se deve procurar saber quais os níveis de
água no solo, de forma que não ocorra nem falta nem excesso de água
para as plantas.

O movimento de água na planta, de B para C, dá-se por meio dos


sistemas condutores de água da planta, denominados de xilema. Trata-se
de feixes de células de forma tubular, próprios para a condução de água.
Uma equação do mesmo tipo q = -K gradiente 'I' rege o movimento, sendo
que a condutividade K do xilema é alta em comparação à do solo, e seu
valor é praticamente constante. Apenas em casos extremos de murcha
severa, a continuidade dos feixes de tubos do xilema é quebrada e a
condutividade da planta assume valores mínimos, não permitindo mais o
fluxo. Também em condições patológicas, fungos e/ou bactérias podem
afetar o xilema e, assim, a condutividade. Porém, em condições normais,
K na planta é constante e o fluxo q fica uma função apenas de gradiente
'I' entre os pontos B e C.

O movimento de água de A até C dá-se na fase líquida e, em C, a


água passa para a fase de vapor, saindo da folha e passando para a

185
Uso e Manejo de Irrigação

atmosfera. Para a passagem da fase líquida para a gasosa é necessário


energia (583 calou 2.436 J a 20 De) e essa vem do sol. Por isso, o processo
de transpiração é tanto maior quanto mais "quente" for o dia.

A passagem de líquida para gasosa dá-se dentro da folha em câmaras


subestomatais, nas quais termina o xilema. Essas câmaras têm contato com
a atmosfera por meio dos estômatos, que são pequenas aberturas
constituídas de células de forma especial. Quando a planta está túrgida, a
forma das células do estômato é tal que a abertura do orifício é máxima (da
ordem de 2 a 10 mícrons), e com a perda de turgor, as paredes vão ficando
fi ácidas, fechando quase completamente o orifício. Dessa forma, a planta
tem algum controle sobre o fluxo de água q, podendo evitar perdas por
transpiração. Porém, o controle não é total; primeiro, porque os estômatos
nunca se fecham totalmente e, segundo, porque a planta também perde
água através da cutícula de sua epiderme. Essa cutícula, que cobre toda a
planta, mesmo resistente, permite a perda de um pouco de água.

O fechamento dos estômatos também está ligado à fotossíntese.


É através dos estômatos que entra o e02 necessário para a fotossíntese
dentro da folha e, por isso, longos períodos de estômato fechado vão afetar
a fotossíntese e, conseqüentemente, a produtividade. Assim, o ideal é dispor
de água suficiente no solo para que a planta não precise fechar os estômatos.
Nessas condiçôes, a fotossíntese, a absorção de nutrientes (que são
arrastados pela água) e a produtividade são máximas.

O movimento de água de e para D, que se dá na fase gasosa, é


também regido por uma equação do tipo q = -K gradiente \jf. Pelo fato de
se tratar de movimento gasoso, ou seja, movimento de vapor d'água em ar,
geralmente não se fala em condutividade hidráulica K, mas sim em difu-
sividade D do vapor em ar. O fenômeno é semelhante, embora mais com-
plicado, em virtude das variações da umidade do ar que afetam a difusivi-
da de D, e do vento, que introduz o fenômeno de turbulência. De qualquer
forma, o fator gradiente \jf é importantíssimo, pois \jf na atmosfera assume
quase sempre valores bem negativos, da ordem de -100 atm a -500 atm
(de -10 MPa a-50 MPa).

O movimento de água do ponto A para o ponto D, esquematizado na


Fig. 3, é afetado por fatores de solo, de planta e de atmosfera. São fatores
importantes do solo: umidade (8), relação enye 8 e \jfm (curva característica
de água) e condutividade hidráulica (K). E, porém, importante não se
esquecer de que esses fatores são afetados pela textura, pela estrutura,
pela densidade do solo, etc. Os fatores importantes da planta são a atividade

186
Transporte de Água no Sistema Solo-Planta-Atmosfera ...

radicular, a distribuição radicular, principalmente em profundidade, a


condição de sanidade do xilema, a área foliar, a arquitetura foliar, etc. Na
atmosfera, os fatores de mais destaque são a radiação solar, o vento e a
umidade relativa do ar. A perda de água pelas plantas é um processo
complexo, sendo sempre necessário analisar o contínuo solo-planta-
atmosfera.

Água disponível

o movimento de água do ponto A ao ponto D, esquematizado na


Fig. 3, mostra que o solo ocupa uma posição de destaque. Se houver água
disponível no solo, o movimento de água prossegue da planta para a
atmosfera. Não havendo água disponível, o movimento cessa. O conceito
de água disponível (AD) está relacionado à busca dos níveis ótimos de água
no solo.

O intervalo total de água do reservatório do solo é 100% cheio quando


=
sua umidade é a de saturação (8 8), ao longo do perfil em consideração;
e vazio quando o solo se encontra seco (8 =O). Abaixo da umidade de
saturação, há o conceito da capacidade de campo (CC, 8 = 8cc)' que é
definido arbitrariamente como o limite superior da água armazenada pelo
solo a qual está disponível para a planta. Esse limite superior é definido
como a quantidade de água retida pelo solo após a drenagem de seu
excesso, quando a velocidade do movimento descendente praticamente
cessa, o que geralmente ocorre de 2 a 3 dias após a chuva ou a irrigação, .
em solos permeáveis de estrutura e textura uniformes. O limite inferior de
umidade, no qual a reserva de água do solo esgota-se, é denominado de
"ponto de murcha permanente" (PMP, 8pMP)' que envolve a condutividade
hidráulica K do solo quando muito seco. Isso significa que a reserva de água
do solo está no fim.

Em resumo, tem-se a água gravitacional (AG): água contida no solo


entre 85 e 8cC' que pode ser aproveitada pelas plantas enquanto permanecer
na zona radicular; mas, como ela drena rapidamente, em muitas situações
ultrapassa a zona das raízes e se perde em horizontes mais profundos);
água disponível (AD): água contida no solo entre 8cc e 8pMP); e água não-
disponível (AND): água contida no solo entre 8pMP e solo seco (8 O). =
Mais detalhes sobre o conceito de água no solo podem ser vistos no
Capítulo 2.

187
Uso e Manejo de Irrigação

Estrutura hidrológica de
plantas vasculares que participam da
transferência de água do solo para a atmosfera

A planta contém dois sistemas de transporte quase independentes: o


floema (sistema vivo, que carrega substâncias metabolizadas, principalmente
no sentido descendente, a partir da copa, de e para os órgãos de
armazenagem) e o xilema (constituído principalmente de tecido morto, o
qual transporta água e nutrientes no sentido ascendente, a partir das raízes).

Os vasos condutores de água

São construídos de seqüências de células mortas, grandes e alongadas,


cujas paredes laterais, por diferentes processos, se tornaram espessas e
impermeáveis à água e com padrões distintos de poros sobre elas distribuídos.
As paredes transversais das células desintegraram-se de tal forma que o
resultado é uma série de tubos que fazem a comunicação direta da fonte
de água nas raízes com o seu destino final, a atmosfera, que envolve a
folhagem. Os vasos terminam fechados em suas extremidades inferiores
entre as células absorventes das raízes, e, em suas extremidades superiores,
eles terminam entre as células fotossintéticas das folhas.
Entre os vasos do xilema, existem fibras mais curtas, quase sólidas,
que têm aparentemente uma função puramente mecânica, e células de
parênquima vivo, que envolvem os raios medulares, os quais, por sua vez,
comunicam os vasos com os tecidos das partes externas do caule, incluindo-
se o floema, de onde se extraem materiais para armazenamento temporário.

O sistema radicular

A arquitetura (aparência e conformação) do sistema radicular depende


das condições externas.
Propõe-se que culturas estabelecidas com suprimento adequado de
água tendem a produzir um sistema radicular confinado à superfície do
solo, ao passo que culturas submetidas a variados suprimentos de água
têm desenvolvimento radicular mais profundo. Alguma evidência dessa
sugestão foi encontrada, mas, freqüentemente, existe uma variação maior

188
Transporte de Agua no Sistema Solo-Planta-Atmosfera ...

entre sistemas radiculares submetidos a determinado regime de água, do


que entre profundidade radicular média de plantas de regimes de água
contrasta ntes.
O comprimento total e a taxa de crescimento das raízes fornecem
parâmetros convenientes para comparar o comportamento de plantas sob
diferentes tratamentos.
A rizosfera é confinada principalmente a um volume de solo úmido
suficiente para suprir a demanda evaporativa da parte aérea; enquanto a
água é "extraída" do solo, as raízes tendem a se expandir ao longo
de gradientes de água, mas permanece a possibilidade de absorção de
água de qualquer parte do solo previamente esgotada, caso essa seja
remolhada.
Os órgãos extremos das raízes que entram em contato com o solo
são os pêlos absorventes; cada um é uma protuberância de uma única
célula da epiderme. Os pêlos absorventes têm vida curta e desaparecem
depois de alguns dias para serem repostos por novos, formados
imediatamente após o ápice radicular em avanço.
Cada raiz termina em um ponto de crescimento sobreposto por uma
coifa razoavelmente distinta, que é uma proteção de células mucilaginosas,
cuja finalidade é estimular o avanço da extremidade em crescimento,
lubrificando os agregados do solo.

Caules e folhas

Os caules sustentam os órgãos fotossintéticos e reprodutivos no


ambiente apropriado para suas funções e também contêm os sistemas de
transporte que os comunicam com as raízes.
A parte aérea consiste normalmente em caules e folhas verdes.
A estrutura da folha reflete sua função fotossintética. Na superfície superior,
imediatamente abaixo da epiderme, está o parênquima palissádico, cons-
tituindo-se de células justapostas, providas de cloroplastos. Entre o parên-
quima e a epiderme inferior existe uma zona de células livremente dispostas
em espaços vazios, zona esta chamada de parênquima lacunoso ou
esponjoso, que também é fotossintético. O contato entre os espaços vazios
do parênquima esponjoso e a atmosfera externa é feita pelos poros
estomatais (Fig. 4).

189
Uso e Manejo de Irrigação

+-- Epiderme superior

Folha

I ""
-

.,...,_....,J.", ...,_" •..••..., -

t
Epiderme
inferior
Parénquirna esponjoso
com cloroplasto
~g.;;~~:;fa~~iSSádiCO

Caule

~t,~
Solo
absorvente

Particulã
Cortex radicular

~Água
{ do solo ••• ~~, _ • .1

Fig. 4. Representação do sistema vascular da planta, com ênfase nas células da folha.
Ilustração: Idmar Pedra.

Estômatos

Cada estômato consiste num par de células de guarda alongadas,


ocasionalmente sendo suplementadas com células subsidiárias, como
acontece nas gramíneas. Ao contrário do restante das células epidermais,
as células de guarda contêm cloroplastos. A forma das células de guarda é
tal que, quando túrgidas, suas paredes adjacentes se separam para formar
um poro. A forma e a largura do poro determinam sua habilidade de permitir
a passagem de vapor e gases. A abertura do poro diminui proporcionalmente
a redução de pressão de turgor das células de guarda; quando elas estão
flácidas, o estômato está completamente fechado. Os estômatos, em grande
número por centímetro quadrado, estão geralmente dispostos na face
inferior das folhas, mas, em algumas espécies, eles também podem estar
presentes na face superior, porém, em menor número. Estômatos podem
ser encontrados em alguns caules, mas nunca em raízes.

o sistema condutor
Consiste em grupos superiores e inferiores de células vivas de paredes
finas, em íntimo contato com os terminais de tubos mortos de paredes

190
Transporte de Água no Sistema Solo-Planta-Atmosfera ..

espessas, que contêm poros no sentido lateral, o que permite a comunicação


entre eles e os outros tecidos nos caules. Na extremidade inferior do sistema,
as células de paredes finas mais externas estão em contato com as camadas
de água que envolvem as partículas do solo, enquanto, na extremidade
superior, as células de paredes finas formam os limites de cavidades de ar
dentro das folhas. Essas cavidades comunicam-se com a atmosfera externa
através de poros, que se podem fechar ao receber o estímulo apropriado.
Assim, existe uma coluna contínua de água ligando a água do solo à
atmosfera, tendo mecanismos de regulagem em ambas as extremidades
(células vivas, nas quais a passagem de água depende do potencial osmático,
de seu conteúdo e do potencial da água da atmosfera ou do solo), e um
mecanismo secundário de regulagem (os estórnatos). colocado entre o ar
contido dentro da folha e o ar da atmosfera externa. A Fig. 5 mostra uma
representação esquemática do sistema de condução.

Folha

Tecido
Bainha vascular)'" ~ •... parenquimatoso,
Mesofilo bainhas vasculares
-/ e vasos

Fig. 5. Representação
do sistema vascular
da planta.
Ilustração: Idmar Pedra.

Solo

Medida da abertura estomatal

A porosidade de uma superfície de folha pode ser medida por


porômetros, forçando-se o ar por uma pequena zona coberta, fazendo-o
penetrar nos espaços intercelulares e daí para a atmosfera, através dos
estômatos localizados fora da zona coberta da folha.

191
Uso e Manejo de Irrigação

Absorção e transporte de água


em plantas vasculares, transpiração
e medição do status de água na planta

Entrada de água na planta

o movimento de água no ciclo hidrológico é uma resposta a uma


série de gradientes de potencial. A água move-se por não encontrar nada
que a impeça de mover. Obviamente, em certo ponto do ciclo, uma
quantidade substancial de energia deve ser injetada. Ela vem do sol e é
usada quase que totalmente na conversão de água líquida em vapor, nas
superfícies de evaporação e transpiração da planta e do solo. Os demais
movimentos ocorrem porque o potencial no final de cada estágio é menor
que no estágio inicial. O movimento da água dentro da planta depende das
propriedades de coesão da água para permanecer em colunas intactas,
mesmo quando sujeita a tensão, em virtude da perda (evaporação) de água
por suas partes superiores. Esse conceito é, por isso, conhecido como "teoria
da coesão-tensão".

A água move-se na direção do sistema radicular em resposta a


gradientes de potencial de água que se iniciam com a evaporação da água
nas células úmidas das superfícies internas das folhas. A osmose corresponde
apenas a parte limitada na absorção de água.

Entrada de água na raiz

Qualquer parte do sistema radicular absorve água em resposta a seu


ambiente local; se existir um gradiente de potencial de água localizado do
solo para dentro da raiz, a água entra na raiz independentemente das
condições reinantes nas demais partes do sistema radicular. Assim, em um
sistema radicular disperso no solo uniformemente úmido, a água entra
uniformemente por todas as raízes, criando um déficit de água uniforme
que prevalece em toda a rizosfera. Quando ocorre chuva ou irrigação e sua
quantidade excede o déficit, a rizosfera inteira é reumedecida e o sistema
radicular continua a absorver água uniformemente. Se, como acontece mais
freqüentemente, a precipitação é menor que o déficit de água, apenas
uma porção do solo, a partir de sua superfície, alcança a capacidade de

192
Transporte de Água no Sistema Solo-Planta-Atmosfera ...

campo. A profundidade assim umedecida é proporcional à quantidade de


chuva, e o solo abaixo dessa camada permanece ressequido.

Embora a absorção mais rápida se dê nas proximidades dos ápices


radiculares, essa região corresponde a uma pequena fração da superfície
absorvente do sistema radicular, e a maior parte da satisfação da necessi-
dade de água da planta é obtida por absorção através das raízes mais
velhas, parcialmente suberizadas.

A resistência ao movimento de água na direção das raízes aumenta


bruscamente com a diminuição da umidade do solo. A maior resistência ao
movimento de água no sistema solo-planta é provavelmente o ponto de
passagem entre o solo e o córtex radicular.

Hidrotropia e geotropia são demonstráveis, mas a resposta das raízes


a elas não é inflexível. As raízes proliferam-se em regiões de solo úmido,
crescendo para cima; raízes crescem horizontalmente em meios não-úmidos.

A absorção da água pelo sistema radicular é preferencial em regiões


mais úmidas e, assim, a rizosfera é auto-equilibrante em relação à umidade
do solo. A capacidade de água disponível descreve a quantidade de água
que um solo pode reter depois de precipitação excessiva; a água disponível
pode ser explorada em sua totalidade apenas quando o sistema radicular
se ramifica por todo o perfil.

Não existe diferença entre raízes que absorvem água e raízes que
absorvem nutrientes. A maioria das raízes pode executar ambas as funções
virtualmente, de maneira independente. A falha do crescimento de raízes
em solo seco está mais associada à impedância mecânica do que à falta
d'água.

Murchamento temporário (déficit do meio-dia) é o resultado de uma


taxa de transpiração que excede a máxima capacidade de absorção do
sistema radicular. Ele não pode ser amenizado pela adição de água ao solo,
mas sim pela redução da taxa de transpiração.

Medida da entrada de água na planta. Não é possível medir dire-


tamente a entrada da água em raízes, utilizando um métodos simples.
É comum inferir a entrada de água no sistema radicular pelo estudo das
variações do status de água nas diferentes zonas do solo. Isso pode ser
feito quantitativamente, por meio de medidas repetidas de umidade do
solo. Infelizmente, a amostragem destrói raízes e deixa canais artificiais para a
distribuição da água. Como uma alternativa a esse procedimento, pode-se
recorrer a tensiômetros, que podem ser instalados permanentemente a

193
Uso e Manejo de Irrigação

várias profundidades e distâncias da planta, ou pode-se instalar tubos de


acesso para sondar nêutrons.

A água dentro da planta. A água dentro da planta forma um


contínuo, isto é, existe um contato contínuo entre a água presente nas
superfícies das células dos espaços intercelulares da folha (virtualmente a
atmosfera), as contínuas colunas de água dentro dos vasos do xilema e as
células do córtex radicular e os pêlos absorventes. As paredes das células
externas das raízes estão em contato com a água que envolve as partículas
de solo. Conseqüentemente, a retirada da água por evaporação (transpi-
ração) das células da folha estabelece um gradiente de potencial que é
transmitido para baixo, através da planta, e para o solo; a água do solo
tende, por isso, a se mover no sentido ascendente, ao longo desse gradiente.

°
potencial de água de um tecido ou de um material, como o solo,
expressa sua capacidade de permitir a passagem da água para outro tecido
ou material a um potencial mais baixo ou a um estresse de água mais baixo.

A redução do potencial de água da planta tende a fechar os estômatos,


o que interfere com o fluxo de CO2 e, conseqüentemente, com o cresci-
mento.

Transpiração. É a perda de água das plantas na forma de vapor.


Embora seja basicamente um processo de evaporação, ele é efetado pela
estrutura da folha e pela abertura estomática, assim como por fatores
ambientais. A perda de água é um processo de difusão e ocorre por duas
rotas paralelas: a estomática e a cuticular. A estomática é quantitativa mente
a mais importante. Transpiração é um processo dominante nas relações
solo-planta porque produz o gradiente necessário que causa o movimento
da água dentro e através das plantas.

Nos vegetais, o intercâmbio de gás carbônico e de oxigênio é


diretamente proporcional ao do vapor d'água. Assim, plantas com altas
taxas de absorção de CO2 apresentam altas perdas por transpiração, o que
torna implícito que elevado consumo de água aumenta a produtividade.

A fotossíntese e a respiração envolvem processos químicos complexos,


de sensíveis a muitas variáveis, diferentemente da transpiração, que é mais
simples, controlada principalmente por variáveis físicas ligadas à difusão
dos gases. Transpiração é o fluxo de água proveniente de um reservatório
de capacidade limitada, sendo a força impulsora o gradiente de potencial
de água.

194
Transporte de Água no Sistema Solo-Planta-Atmosfera ...

A água é o constituinte mais abundante dos tecidos da plantas. Porém,


a planta retém uma pequena parte daquela absorvida. Grande quantidade
de água é continuamente absorvida do solo, translocada através da planta
e passada para a atmosfera sem estar envolvida em nenhuma função apa-
rente. Uma curiosidade que nos surpreende na natureza é a enorme inefi-
ciência de economia de água pelas plantas. Embora as plantas necessitem
de grande quantidade de água para sobreviver, a estrutura anatômica foliar
é tal que não comporta que ela seja estocada. Apenas uma pequena fração,
geralmente menos de 1 % da água absorvida, é usada nas reações meta-
bólicas.

O fluxo potencial máximo de água pela planta (taxa de transpiração


potencial) é determinado primariamente pela diferença entre o potencial
da água nas superfícies radiculares e aquele nos pontos de evaporação
dentro das folhas; a taxa atual é reduzida em proporção às resistências
existentes dentro das raízes, dos caules e das folhas. É difícil medir essas
resistências individuais, mas o valor da resistência da folha é provavelmente
da mesma ordem de grandeza da resistência do caule e bem menor que a
resistência radicular.

Durante a noite, o potencial de água das superfícies das paredes


celulares em contato com o ar nos espaços intercelulares é igual àquele
dentro das células, porque praticamente nenhuma evaporação ocorre, já
que a planta não está transpirando. Nessas condições, não há movimento
ascendente de água no xilema, mas há uma tensão descendente, resultante
de atração gravitacional, que atua sobre as colunas estacionárias de água.
Durante o dia, inicia-se a evaporação das paredes celulares e um gradiente
de potencial é estabelecido entre a parte externa das paredes e o conteúdo
celular, que implica a perda inicial de água dos próprios tecidos. Pelo fato
de as paredes celulares serem elásticas, ocorre uma variação inicial em seu
tamanho, mas, eventualmente, se estabelece uma diferença de potencial
entre os interiores das células e as extremidades superiores dos vasos do
xilema. Isso cria uma diferença semelhante entre as extremidades inferiores
e as superiores dos vasos, e um movimento geral e ascendente de água
tem início. Existe agora diferença de potencial entre as extremidades
inferiores dos vasos e as células das raízes, as quais, então, perdem água; a
parte de suas paredes, inclusive os pêlos absorventes, em contato com a
água do solo terá um potencial menor do que a água do solo e, assim, a
água se moverá para dentro da planta.

A taxa de transpiração atual varia irregularmente, como resultado de


mudanças transitórias no ambiente. Há também variações diárias regulares

195
Uso e Manejo de Irrigação

no conteúdo de água das plantas, que atinge um mínimo à tarde e um


máximo durante a noite. Essas estão, pelo menos parcialmente, relacionadas
com as mudanças na taxa de transpiração. Há mudanças simultâneas no
diâmetro de troncos, mesmo de árvores lenhosas, cujo diâmetro é mínimo
durante a tarde. Como é esperado, as folhas mostram uma diminuição de
volume similar durante a tarde. Variações cíclicas na taxa de transpiração,
de periodicidade muito mais curta do que variações diurnas, foram
observadas em girassol, acompanhadas por variações de temperatura de
folha e abertura de estômatos. Essas relações poderiam ser explicadas por
um mecanismo de "cadeia". Se as condições atmosféricas permitissem que
a taxa de transpiração potencial excedesse a capacidade de a planta
atendê-Ia, os estômatos tenderiam a se fechar; as taxas de transpiração e
de esfriamento por evaporação também tenderiam a cair e, portanto, a
temperatura da folha tenderia a subir. A redução da taxa de transpiração
aumentaria o potencial da água na folha, os estômatos se abririam e, assim,
a série cíclica de eventos recomeçaria.
O caminho do vapor d'água expressa as perdas de água por
transpiração, que ocorrem em qualquer parte da planta exposta à atmosfera
externa, ressaltando-se os estômatos, seguidos, em pequena escala, pela
cutícula das folhas. O contínuo solo-planta-atmosfera, em termos práticos,
é uma série de condutores por onde flui a água, com resistência variável.
A abertura dos estômatos varia de acordo com a turgescência das células-
guarda, de modo que, quanto mais túrgidas, maior a abertura e menor a
resistência, a qual depende, ainda, da freqüência dos estômatos e da posição
deles na folha. Assim, os estômatos podem se localizar: a) nas duas faces
da folha (abaxial e adaxial), (anfiestomática, por exemplo, o milho) - sendo
que, nesse caso, o número de estômatos nas duas faces é semelhante;
b) somente na face abaxial (hipoestomática, por exemplo, as plantas aquá-
ticas); c) por último, quando os estômatos se encontram nas duas faces, mas
com predominância na face abaxial (anisoestomática, por exemplo, o feijão).
A água que se evapora das paredes das células do mesófilo-foliar
difunde-se pelos espaços intercelulares até os estômatos e, daí, para o
exterior. Pode-se fazer uma analogia entre o fluxo do vapor d'água e o
circuito elétrico (Fig. 6) que indica as resistências encontradas ao fluxo da
água. Observam-se resistências do solo, da raiz, do xilema, do mesófilo,
dos espaços intercelulares. dos estômatos, da camada limite e da cutícula.
As resistências dos espaços intercelulares (r) e dos estômatos (rs) ocorrem
em série, sendo uma simples soma de resistências (r+ r),Is
similiar à resistência
cuticular (r).

196
Transporte de Água no Sistema Solo-Planta-Atmosfera, ..

Fluxo de R
Atmosfera
vapor

,1
R Estômatos

R
Cuticular
R R
Folha Total
R Espaços intercelulares

Fluxo na
1 R Mesofilo
,

fase líquida

R.Xilerna

I--- R Solo --
' R Raiz __ ---'

Fig. 6. Resistências aos fluxos de água.


Ilustração: Idmar Pedra.

°
percurso do CO2 é um pouco mais complexo do que o do vapor
d'água, pois sofre resistência ao fluxo e à assimilação de COr CO2 vindo
do ar atmosférico deve ultrapassar a camada limite adjacente à folha, os
°
estômatos, os espaços intercelulares até as células do mesófilo e, eventual-
mente, pode entrar nos cloroplastos. Assim, o CO2 deve ultrapassar a parede
celular de uma célula do mesófilo - a plasma lema -, parte do citoplasma,
as membranas que envolvem o cloroplasto e a estroma do cloroplasto.

Pergunta-se: por que é necessário perder tanta água por transpiração,


para alcançar o final do ciclo de uma cultura como o milho? Provavelmente
porque uma parte essencial daquelas sementes de milho e de todas as
outras partes da planta são átomos de carbono que formam os esqueletos
das moléculas orgânicas, as quais vão compor partes das plantas, e virtual-
mente todo esse carbono tem que vir da atmosfera. Ele entra na planta
como CO2 através dos poros estomáticos, na maioria das superfícies foliares;
e, através 'dessas mesmas aberturas, a água se difundirá para a atmosfera.

A transpiração relativa é a relação entre a transpiração real e a


transpiração potencial. A planta, assim como o solo, são condutores
hidráulicos, nos quais a taxa de fluxo é proporcional à força e à conduti-

197
Uso e Manejo de Irrigação

bilidade. Se essa condutibilidade se mantiver constante, a variação na taxa


de fluxo provirá da força impulsora que é, principalmente, a transpiração.
No entanto, a condutibilidade não parece ser constante, sendo o seu
decréscimo acompanhado por uma progressiva redução nos potenciais de
água da folha e do fechamento dos estômatos. Os principais fatores que
atuam na transpiração real são o potencial de água no solo (\jf), a
condutividade hidráulica do solo (K), o volume e a densidade das raízes, a
resistência interna da planta, o potencial crítico de fechamento dos estôma-
tos e a transpiração potencial.
Vários métodos têm sido empregados para a medição da transpiração.
Esses métodos geralmente abrangem uma medida da água absorvida ou
uma medida do vapor d'água transpirada por planta. Entre os métodos
existentes, destacam-se: a) métodos gravimétricos (pesagens); b) potômetro;
c) medições gasométricos rápidas; d) coleta e pesagem do vapor d'água;
e) medição por absorção de radiação infravermelha; f) método do cloreto
de cobalto; g) medição por psicrometria; h) higrômetros de resistência.

O estado de água dos tecidos vegetais. Pelo fato de existir um


gradiente de potencial do solo à atmosfera, através da planta, a água dentro
da planta está sempre sob alguma tensão, isto é, sob algum estresse de
água, que se origina de duas maneiras: a) estresse osmático, relacionado
com a concentração salina no solo; b) simples déficit de água, resultante da
falta de água no solo ou da alta condição evaporativa da atmosfera.
Os sintomas de estresse interno de água produzidos por essas duas
fontes diferem pelo fato de o estresse induzido por salinidade se manifestar
por um engrossamento e pelo escurecimento de tecidos verdes, freqüen-
temente sem murchamento, enquanto o déficit de água pura resulta em
murchamento temporário ou permanente, redução na taxa de crescimento,
escurecimento da cor da folhagem e, às vezes, intensificação de um
florescimento ceroso sobre a superfície das folhas.

Estresse de água. O estresse de água é conhecido, numa expressão


termodinâmica, como" energia livre parcial de Gibbs". ou o potencial químico
da água (ou o potencial da água). Ou, ainda, como déficit de pressão de
difusão (DPD), déficit interno de água, pressão ou potencial capilar, pressão
de sucção e estresse total de umidade.
O potencial de água (expresso em bars ou atmosferas) de um tecido
dentro da planta é, da mesma forma como no solo, a soma de alguns fatores
contribuintes, incluindo-se a pressão de vapor (pressão osmática) e a tensão
hidráulica.

198
Transporte de Água no Sistema Solo-Planta-Atmosfera ...

A natureza do potencial de água é mais bem compreendida pelos


métodos comumente utilizados para medi-Ia. O potencial da água pode ser
medido em termos do conteúdo total da água dos tecidos ou do estado de
energia da água. Não basta indicar apenas a porcentagem do conteúdo de
água da amostra; o conteúdo de água precisa também ser relacionado a
um padrão, como o conteúdo da amostra quando inteiramente túrgida,
tendo sido armazenada a maior quantidade possível de água. Esseparâmetro
pode ser obtido pesando-se discos de folha imediatamente após retirados
da folha e tornando a pesá-Ios após permanecerem flutuando sobre a água
até alcançar a turgescência completa, e, depois, determinando seu peso
seco. O potencial de água, ou déficit de água, ou déficit de saturação do
tecido original, pode depois ser calculado em relação à quantidade de água,
no tecido completamente túrgido. O termo "turgescência relativa" tem
sido utilizado para indicar a relação entre a turgescência atual do tecido e
a turgescência máxima dos discos flutuantes na água.
Outra possibilidade baseia-se no fato de que, quando um tecido não
está totalmente túrgido, isto é, quando seu potencial de água não é máximo,
suas células absorverão água de qualquer solução de potencial mais alto e,
assim, aumentarão de tamanho. Amostras de tecidos são colocadas em
uma série de soluções de conteúdo crescente em sal (e, portanto, crescentes
em pressão osmótica). A solução na qual não existe variação nas dimensões,
no volume ou no peso da amostra tem o mesmo potencial de água. Pode-
se também observar qual das soluções não sofreu mudança de densidade
depois de a amostra de tecido ter permanecido dentro dela.
O potencial da água ou déficit interno de água na planta pode também
ser determinado a partir de mudanças associadas a algumas propriedades
físicas do tecido, de fácil medida, como o diâmetro do caule, a espessura
da folha ou o tamanho da fruta.
O potencial total geral de um ramo intacto, resultante da soma dos
potenciais dos tecidos componentes, pode ser medido colocando-se o ramo
inteiro em uma câmara, com a extremidade cortada para fora. A pressão
do gás dentro da câmara é aumentada até que a água é forçada de volta,
no sentido descendente do caule, aparecendo como um exsudado no corte
externo. A pressão do gás, ao atuar nas partes externas das células,
contrabalança seu potencial de água e reverte o fluxo de transpiração; a
força necessária para fazer isso é evidentemente igual ao potencial da água.
Ele pode ser descrito como a pressão hidrostática negativa da seiva do
xilema, que pode ser da ordem de 20 bar a 30 bar (de 2 MPa a 3 MPa).

199
Uso e Manejo de Irrigação

° aparelho precisa ser suficientemente resistente para resistir a pressões


muito mais altas do que esta, de até 50 bar (5 MPa) (SCHOLANDER,
et aI., 1965).

Resultados da redução
do potencial da água na planta

Os efeitos da redução da água sobre os estômatos das plantas


são conhecidos pelo fato de que eles tendem a se fechar quando existe
essa carência, havendo evidência substancial de que isso representa o

°
principal mecanismo de regulagem contra a perda excessiva de água.
funcionamento mecânico dos estômatos é bem conhecido. A estrutura
do par de células-guarda é tal que mudanças em seu turgor se refletem na
mudança da sua forma e, assim, do tamanho do poro existente entre elas.
A variação do turgor é acompanhada por variação de concentração de
grânulos de amido dentro delas. ° amido não está em solução e, por isso,
não contribui para a pressão osmótica, e existe uma variação recíproca na
concentração de açúcar do suco celular e, portanto, do potencial da água.
A luz solar causa a conversão de amido em açúcar e, assim, abre os
estômatos. Uma teoria para explicar isso postula que a luz favorece a
utilização do CO2 na formação do açúcar; a remoção do CO2 torna as
condições menos ácidas e isso, por sua vez, favorece a transformação de
amido em açúcar pela enzima fosforilase. Experimentos nos quais a
concentração de CO2 dentro da folha foi artificialmente modificada
confirmaram que uma alta concentração de CO2 causa o fechamento dos
estômatos, enquanto concentrações baixas (menos ácidas) causam a
abertura.
Gases movem-se pelos diminutos poros, por difusão, a qual ocorre
graças ao movimento casual das moléculas do gás. Esse processo é muito
mais rápido se for através de poros pequenos, do que pelo fluxo de massa.
Se os poros em uma membrana estão suficientemente próximos entre si, a
difusão processa-se tão rapidamente como se não existisse uma membrana.
A distância entre os estômatos na superfície foliar é muitas vezes igual a
dez vezes seu diâmetro e, nesse espaçamento, quando completamente
abertos, a resistência foliar à difusão é desprezível.
Toda a água perdida por uma planta para a atmosfera passa, na forma
de vapor, pela cutícula ou pelos estômatos ou, como em algumas poucas
plantas, por hidatódios, na forma líquida. A comparação entre as perdas

200
Transporte de Água no Sistema Solo-Planta-Atmosfera ..

cuticulares e as estomatais é obviamente muito difícil de ser feita tecnica-


mente. Foram feitas comparações entre perdas de água por folhas intactas,
folhas cuja cutícula foi retirada e folhas sob luz solar e sob escuridão, quando
os estômatos estão mais ou menos fechados. Desses experimentos, estimou-
se que a transpiração através de estômatos é de 3 a 150 vezes maior que
a transpiração cuticular. É sabido que a maior parte da água passa pelos
estômatos e que esses, portanto, representam um meio de controle da
transpiração. Eles representam hidrostatos efetivos no controle do estado
interno da água da folha, mesmo havendo perda substancial de água pela
cutícula, quando os estômatos estão bem fechados.

Muitas espécies têm adaptações, como coberturas com substâncias


cerosas, folhas enroladas ou dobradas, que reduzem a transpiração cuticular.
Em Glicine, estimou-se que os pêlos reduzem a transpiração de 40 % em
condições de vento moderado. De maneira similar, foi calculado que
estômatos localizados dentro de cavidades, com em Agave, perdem água
em uma taxa cinco vezes menor do que se estivessem situados sob a
superfície plana, mesmo quanto totalmente abertos.

O fechamento dos estômatos não reduz apenas a saída da água,


mas também a entrada de dióxido de carbono, e isso reduz a taxa de
fotossíntese (efeitos fisiológicos). O ganho em peso, como um resultado da
assimilação de carbono, é menor em tecido murcho do que em tecido túrgido.
A redução da taxa de síntese de proteínas também tem sido associada à
diminuição do teor de água dos tecidos; na verdade, o metabolismo completo
da planta parece reduzir-se com a redução do potencial de água, mas,
graças ao decréscimo de crescimento resultante, são facilmente demons-
tradas as razões por que é inexplicável como o baixo potencial interfere
nos muitos processos que contribuem para o crescimento vegetal.

A relação entre a abertura dos estômatos, a perda de água e a


fotossíntese é muito bem ilustrada pelo comportamento peculiar da cultivar
de batata Droopy, que é geneticamente incapaz de fechar os estômatos.
Conseqüentemente, ela continua a perder água e murcha prematuramente
sob condições nas quais outras cultivares se mantêm túrgidas graças ao
fechamento de estômatos. As folhas perdem a postura correta para
interceptar a radiação solar e, assim, a fotossíntese e o crescimento são
reduzidos, mesmo estando os estômatos abertos.

Um abaixamento do potencial da água na planta afeta vários órgãos


de diferentes formas. O efeito mais comum do estresse de umidade é a
redução na taxa de crescimento e desenvolvimento da folhagem e, de
maneira Inversa, uma diminuição no estresse causa um aumento na

201
Uso e Manejo de Irrigação

produção de folhagem. Em beterraba e gramíneas, uma redução no estresse


induz uma taxa maior de crescimento geral do que em plantas que nunca
estiveram sujeitas a estresse, mas a produção final das plantas nas quais o
estresse foi diminuído nunca chega a superar a produção daquelas que
nunca estiveram sujeitas a estresse.

O abaixamento do potencial da água em certos estágios de cresci-


mento tem efeitos específicos; um exemplo óbvio é a falha de germinação
das sementes ou de desenvolvimento de seed/ings, mas a falta de água na
floração de muitas espécies contrastantes, incluindo-se as ervilhas, os cereais
e o café, influencia a produtividade de sementes. Com ervilhas, o estresse
de água durante a queda das pétalas e intumescência das vagens afeta,
de maneira ainda não compreendida, a eficiência de fertilização e o
subseqüente crescimento, de tal forma que um número menor de sementes
menores é produzido.

Um fenômeno mais importante é que os tecidos apicais e as folhas


muito novas parecem ter maior facilidade em suportar efeitos adversos de
potencial temporariamente baixo, do que os tecidos mais velhos. Em plantas
que estiveram sujeitas a seca severa e depois forem molhadas, as folhas
velhas caem e são repostas pela rápida expansão das folhas mais jovens e
pelo desenvolvimento de mais folhas no ápice da planta. Quando as raízes
de plantas transplantadas são danificadas por técnicas ruins de transplante
e, por conta disso, são sujeitas a estresse de água temporário, as folhas
velhas são as que morrem e as mais novas sobrevivem e eventualmente
substituem as primeiras.

Uma função do fluxo de transpiração é o transporte de nutrientes


inorgânicos dissolvidos, das raízes para os locais de atividade metabólica;
esse processo cessa à noite, quando há pouca ou nenhuma transpiração.
A distribuição de material elaborado e dos produtos da fotossíntese na
direção oposta ocorre principalmente pelos vasos do floema, mas a
reutilização desses materiais armazenados, em tecidos de armazenamento,
ocorre em ambos, no xilema e no floema. O baixo potencial interfere em
ambos os processos.

Medidas de fatores associados


ao movimento de água dentro da planta

A absorção de água pela parte aérea da planta e, portanto, a


transpiração de um ramo cortado podem ser demonstrados, fixando-se a

202
Transporte de Água no Sistema Solo-Planta-Atmosfera ...

parte cortada a um potômetro de bolha, que é um tubo capilar horizontal


cheio de água. A velocidade do movimento da bolha introduzida indica a
taxa de absorção de água. O corte e a adaptação do tubo ao corte devem
ser executados debaixo d'água, para prevenir a entrada de ar no xilema.
A medida precisa do potencial da água da parte aérea da planta pode-se
fazer pelo uso da bomba de pressão.

Potencial da água de tecidos. Existe uma série de métodos


isopeísticos, ou seja, a pressão é a mesma em todos os pontos do sistema;
conseqüentemente, métodosisopiésticos para medir o potencial da água
na folha dependem de igualar a pressão osmótica entre amostras e padrões.
Um método simples e efetivo é preparar um número de pares de tubos
contendo uma série de concentrações de um soluto não-penetrante, como
manitol ou carbowax, em água. Amostras de discos de folha de tamanho
conveniente são embebidas, por algumas horas, em um de cada par de
tubos; uma gota de corante é então adicionada ao outro tubo de cada par.
Usando uma pipeta fina, um pouco da solução colorida é introduzido abaixo
da superfície de seu par no qual a amostra foi embebida. Se a solução
colorida sobe, significa que a amostra absorveu água e reduziu a densidade
da solução original; seu potencial de água é, por isso, maior do que aquele
da solução. Se a solução colorida afundar, o potencial da água era menor.
Achar soluções de concentração adequada a um experimento específico
pode consumir muito tempo.
No método de radiação beta, uma folha é interposta entre uma fonte
de radiação beta e um detector; a atenuação dos raios beta é proporcional
à massa da folha e é detectada como uma redução na taxa de contagem.
Mudanças em massa em curtos períodos de tempo são apenas devidas à
variação na umidade da folha; o método não danifica tecidos e pode ser
usado em plantas intactas no campo.
O potencial da água de qualquer solução está relacionado com a
pressão de vapor da atmosfera em contato com ela. Esse fenômeno é
explorado em muitos métodos de medida do potencial de água. Uma
amostra é deixada entrar em equilíbrio com o vapor do ar de uma câmara
fechada; a pressão de vapor desse ar é depois medida, observando-se, por
exemplo, qual solução de uma série de soluções de pressões osmóticas
diferentes, também fechadas na cápsula, não sofre variação em volume.
As soluções são convenientemente sustentadas em curtos tubos capilares.
Outra forma é o uso do psicrômetro de par termelétrico, para medir a pressão
de vapor do ar da câmara.

203
Uso e Manejo de Irrigação

No método da gota suspensa, uma pilha de anéis de tecido foliar é


colocada em uma pequena câmara fechada, imersa em banho de
temperatura constante. Uma pipeta capilar é selada dentro da tampa da
cápsula. Depois de equilibrar por aproximadamente 3 horas, uma gota de
água é parcialmente exsudada, de tal forma que fique pendurada na
extremidade da pipeta; a gota é depois retirada, e seu menisco superior no
capilar é alinhado com um ponto de referência. A posição do menisco inferior
(e, portanto, o volume da gota) é anotada. A gota é agora novamente
exsudada por um período de tempo exatamente medido, depois do qual
seu volume é novamente medido. A perda de água por evaporação está
relacionada com o potencial da água dos discos dentro da câmara.
O aparelho é calibrado, expondo-se a gota a soluções salinas de potencial
conhecido.

Relação solo-planta (absorção e transporte de água em plantas


vasculares). A água dentro da planta forma um contínuo, isto é, existe um
contato contínuo entre a água presente nas superfícies das células dos
espaços intercelulares da folhas (virtualmente a atmosfera), as contínuas
colunas de água dentro dos vasos do xilema e as células do córtex radicular
e os pêlos absorventes. As paredes das células externas das raízes estão
em contato com a água que envolve as partículas do solo. Conseqüen-
temente, a retirada da água por evaporação (transpiração) das células da
folha estabelece um gradiente de potencial que é transmitido para baixo,
através da planta, e para o solo; a água do solo tende, por isso, a se mover
no sentido ascendente ao longo desse gradiente.

O potencial de água de um tecido ou de um material, como o solo,


expressa sua capacidade de permitir a passagem da água para outro tecido
ou material a um potencial mais baixo ou estresse de água mais baixo.

A redução do potencial da água da planta tende a fechar os estômatos,


o que interfere com o fluxo de dióxido de carbono e, conseqüentemente,
com o crescimento.

Movimento da água
para fora do sistema solo-planta

A água move-se em torno do ciclo hidrológico em resposta à. energia


fornecida principalmente no ponto no qual a água, no estado líquido, passa
para vapor, dentro da parte aérea da planta ou na superfície do solo.
A maior parte dessa energia entra na forma de radiação de onda curta do

204
Transporte de Água no Sistema Solo-Planta-Atmosfera ...

sol. Uma componente comparativamente pequena entra como energia


advectiva, isto é, energia proveniente das variações de temperatura do ar
quando esse passa sobre superfícies evaporantes ou transpirantes.

A evaporação pode ser medida, em vez de estimada, por meio de


lisímetros e evaporímetros, mas, como é difícil a exposição adequada desses
instrumentos, estimativas da evaporação com base em dados meteorológicos
são comumente consideradas mais corretas do que as medidas diretas.

A camada-limite é a camada da atmosfera, adjacente à superfície do


solo, dentro da qual parâmetros, como vapor e fluxo de calor, variam
conforme a altura, regular e previsivelmente. É dentro dessa camada-limite
que estimativas precisas de evaporação podem ser feitas. A camada-limite
é perturbada por descontinuidades na, vegetação ou na topografia, o que
obriga que o ponto de medida ou de estimativa esteja dentro de uma área
uniforme. Para uma camada-limite de meio metro de altura, é necessário
que exista um contorno uniforme de vegetação ou solo de aproximadamente
70 m de diâmetro; uma camada-limite de 2 m exige, teoricamente, um
contorno de 400 m de raio. Essas condições raramente ocorrem na prática,
o que nos leva a concluir que lisímetros realmente não satisfazem essas
exigências, e seus resultados, por conseguinte, devem ser considerados
suspeitos, e que estimativas meteorológicas são confiáveis e precisas apenas
quando relativas a grandes áreas de vegetação uniforme.

Métodos empíricos de determinação de evaporação abrangem o uso


de vaporímetros e tanques de evaporação e a correlação direta da radiação
ou da temperatura do ar com a evaporação. O método da correlação
evaporação/radiação tem sido utilizado com sucesso em casa de vegetação.
Os melhores resultados são obtidos utilizando-se um radiômetro líquido ou
um integrador de radiação incidente, em vez de estimar a radiação a partir
de horas de radiação solar.

Os métodos de correlação temperatura/evaporação mais comumente


utilizados são os de Thornthwaite e Blaney-Criddle. O primeiro é baseado
em observações de temperatura média, que está altamente relacionada
com a radiação incidente; o método é mais adequado para grandes áreas
de terra, do que para pequenas. O método de Blaney-Criddle recorre a
fatores de ponderação para relacionar a estimativa a condições locais, os
quais precisam ser determinados para cada local e cada cultura.

Pelo fato de a evaporação ser um fenômeno físico bem conhecido,


sua taxa pode ser estimada de maneira básica direta, mas, na prática, bem
complexa, a partir de valores de todos os parâmetros que descrevem o

205
Uso e Manejo de Irrigação

ambiente físico, incluindo a temperatura do ar, a umidade e o movimento,


a radiação e as propriedades físicas do ar, do solo e da água. Métodos
desse tipo podem ser classificados como métodos de participação de energia,
métodos aerodinâmicos e métodos combinados. O método de combinação
mais utilizado é o de Penman, que possui vantagens em relação aos demais.

Transpiração. Estimado ou medido, o resultado aparece como a


evaporação de uma superfície aberta de água ou diretamente como
transpiração potencial. A evaporação de uma superfície aberta de água é
geralmente maior do que a transpiração de uma cultura submetida a
condições semelhantes de exposição, em virtude da intervenção de
resistências ao movimento de vapor, como aquelas impostas por abertura
de estômatos e pela permeabilidade baixa da cutícula da folha.

A relação entre a transpiração atual e a potencial pode ser medida


experimentalmente, utilizando-se lisímetros de balança para medir a taxa
atual de perda d'água de um sistema confinado planta-solo, para compara-
ção com a estimativa, e utilizando-se perdas medidas por evaporímetros.
Entretanto, as condições, em todos os lisímetros, são inerentemente
artificiais, pelo fato de o sistema radicular estar confinado e não estar livre
para a absorção de água. Além do mais, o solo é isolado do subsolo e,
assim, não está sujeito às mesmas tensões e fenômenos de drenagem como
no solo não-confinado. Para sanar essas dificuldades, os lisímetros têm sido
equipados com instrumentos de sucção, para tornar o potencial da água de
dentro igual ao potencial da água de fora.

A maioria dos métodos descritos, inclusive o de Penman, fornece


estimativas da transpiração de uma cultura verde, cobrindo uniforme e
inteiramente o solo, com suprimento não limitado de água. Na prática, a
cultura nem sempre cobre totalmente o solo; existe solo nu entre as linhas
de culturas anuais durante 80 % do seu ciclo de cultivo. Além disso, a redução
do potencial d'água ocorre normalmente em condições de campo.

Constante de raiz ou cultura. O volume de água que pode ser


extraído de um solo, antes que a atenuação das reservas comece a limitar
a transpiração, depende da textura do solo, da profundidade, do estado
inicial de umidade e da profundidade alcançada pelas raízes.

A constante de raiz é definida como o máximo déficit de água do solo


que pode ocorrer sem interferir na transpiração. A constante da raiz é,
primariamente, mas não completamente, uma característica da planta, e
ela varia de acordo com o seu crescimento e seu desenvolvimento e a

206
Transporte de Água no Sistema Solo-Planta-Atmosfera ..

densidade do sistema radicular. A constante da raiz é expressa nos mesmos


termos que a precipitação, isto é, a altura de água corresponde à quantidade
de água em consideração, que cobriria uniformemente a superfície do solo.
Para pastos permanentes, ela é da ordem de 75 mm a 120 mm; para culturas
herbáceas sobre solo de textura média, 50 mm; enquanto, para árvores
frutíferas com sistemas radiculares profundos, pode ser acima de 200 mm.
Precisa ler lembrado que esses dados são apenas ilustrativos, pois a
constante de raiz de uma cultura relativamente resistente à seca, com a da
alfafa, pode exceder 100 mm, enquanto a constante de árvores frutíferas
cujas raízes estão confinadas a camadas superficiais pode ser menor que
75 mm.

Cobertura incompleta da cultura. Onde existem manchas de solo


nu entre as plantas e superfície do solo molhada, há perda de água por
evaporação na mesma taxa que uma superfície aberta de água e,
conseqüentemente, nenhuma ou pouca modificação precisa ser feita sobre
a perda de água estimada (aqui a diferença entre a taxa de transpiração e
a taxa de evaporação de superfície aberta é ignorada). Mas, quando a
superfície descoberta do solo se torna seca, ela virtualmente não perderá
água por evaporação e, nessas circunstâncias, o volume calculado de água
perdida pela cultura deve ser reduzido proporcionalmente à área livre de
folhagem. Esse é o princípio no qual se baseia a prática tradicional de
conservação de água do solo pela manutenção de uma "crosta seca".
Quando se aplica essa técnica, o cultivo para produzir essa camada deve-
se limitar à menor profundidade possível, porque, se solo úmido for levado
à superfície, esse perderá sua água e o resultado será perda e, não,
conservação de água. É fácil observar a propriedade de reter água por
meio de uma superfície seca, no fim da primavera, verificando-se a umidade
do solo a alguns centímetros abaixo da superfície seca; esse solo perma-
necerá úmido até um período avançado do verão, se não houver crescimento
vegetal e se ele não for cultivado.

Déficit de água do solo. A taxa de água que sai da planta e da


superfície do solo varia, principalmente, conforme as condições meteoro-
lógicas. O solo da rizosfera contém uma quantidade finita de água, cuja
redução pode ser reposta pela precipitação por cima, lateralmente, por
movimento através de rachaduras, ou muito vagarosamente, mesmo
lateralmente e no sentido ascendente, por movimento capilar de água em
resposta a gradientes de potencial. Esse fluxo de água dentro do solo é
denominado "redistribuição" e é um processo contínuo em solo cultivado.

207
Uso e Manejo de Irrigação

o déficit de água consiste na diminuição do estado de umidade do


solo abaixo da capacidade de campo. Ele é normalmente avaliado conforme
a precipitação e, conseqüentemente, o déficit equivale à precipitação
máxima ou à irrigação que um solo absorve sem perdas por drenagem.

Absorção da água disponível. O déficit de umidade no solo não


está relacionado ao tipo de solo; determinadas condições meteorológicas
produzirão o mesmo déficit tanto em um solo arenoso, como em um solo
de boas propriedades de retenção, mas o efeito desse déficit sobre o
crescimento vegetal é bem diferente para cada tipo de solo. Por exemplo,
25 mm de déficit podem representar o uso de quase toda a água disponível
nos primeiros 40 cm de um solo arenoso, ao passo que, em um solo barrento,
apenas metade da água disponível teria sido utilizada. Assim, um parâmetro
relacionado às condições às quais uma cultura está sujeita é a porcentagem
de uso da água disponível. Essa é freqüentemente utilizada como úm critério
para determinar quando aplicar água em experimentos de irrigação. Pode
ser observado que determinado uso da água disponível corresponde,
aproximadamente, ao mesmo potencial de água em qualquer solo, mas ele
aumenta, como resultado de perdas diferentes de água em distintos solos,
e da acumulação de déficits específicos de umidade do solo.

A importância da transpiração. A transpiração é um processo


passivo, que ocorre como um resultado da incidência diária da radiação de
onda curta sobre uma estrutura constituída principalmente de água, que
possui uma superfície mais ou menos permeável. A perda de água na
extremidade superior dessa estrutura cheia de água estabelece um
gradiente de potencial que induz um movimento ascendente de água e,
conseqüentemente, uma redução no potencial da extremidade inferior em
relação àquele no solo. Assim, a água entra na planta e caminha na forma
de fluxo de transpiração, no sentido ascendente, durante todas as horas de
radiação solar. O fluxo de transpiração tem uma função de transporte, que
poderia, sem dúvida alguma, ser satisfeita pelo movimento de um volume
bem menor de água, pois a quantidade de água armazenada nos tecidos é
relativamente pequena e desprezível. O fluxo de transpiração é a fonte de
água que mantém a turgescência e a postura, mas esse fato implica uma
entrada de água não maior do que o volume dos tecidos que devem
permanecer túrgidos. A evaporação da água das superfícies expostas
mantém-nas frescas, utilizando e assim neutralizando a radiação incidente,
que aqueceria os tecidos; o fluxo de transpiração é a fonte dessa água de
refrigeração mas, mesmo sendo esse efeito significante, ele não deve ser
superestimado, pois plantas adaptadas a climas áridos sobrevivem sem um

208
Transporte de Água no Sistema Solo-Planta-Atmosfera ...

superaquecimento, mesmo possuindo uma taxa de transpiração muito


pequena. O fato de que cactáceas e suculentas crescerem muito devagar,
contrabalançando a exposição a generosas quantidades de radiação que
poderiam ser utilizadas pela fotossíntese, indica a função mais importante
da transpiração que, com efeito, é quase acidental. A alta turgescência
mantém os estômatos abertos, permitindo não apenas uma saída máxima
de vapor, mas também o ingresso máximo de dióxido de carbono para a
fotossí ntese.

O crescimento da planta depende da absorção de dióxido de carbono


e da exposição adequada à radiação de onda curta para fotossintetizá-Io
em carboidratos. Como efeito colateral, a radiação de onda curta também
evapora grande quantidade de água, que deverá ser reposta, se o ingresso
de dióxido de carbono não for impedido por fechamento dos estômatos.
Essa é a razão da relação estreita entre o crescimento e o suprimento de água.

Medida da transpiração. A medida direta do fluxo de vapor que


abandona a planta, apesar de possível, requer equipamento sofisticado.
Por sua vez, métodos de inferência que dependem da variação de peso da
unidade total planta-solo ou planta-água não requerem nada mais do que
uma balança sensível. Esses métodos justificavelmente atestam que a
variação de peso decorrente da fotossíntese é desprezível em comparação
com a variação de peso resultante da transpiração. Máquinas capazes de
pesar com precisão volumes extensos de solo são caras; conseqüentemente,
há muita receptividade para o desenvolvimento de novos sistemas de
pesagem para lisímetros. Para o caso de casa de vegetação ou de culturas
de laboratório em pequenos vasos, balanças convencionais são adequadas,
mas a grande repetição necessária para atender à variabilidade do material
vegetal estimulou o interesse por sistemas de pesagem de baixo custo, tal
como a balança eletromagnética de registro de transpiração.

Medida e estimativa do déficit de água no solo. A medida do


déficit de água no solo consiste na somatória da umidade do solo em cada
horizonte pertencente ao perfil, utilizando determinações de densidade
(g de solo por em" de solo) para expressar a umidade em termos volumé-
tricos. O total é depois deduzido da umidade total na capacidade de campo
(e não da capacidade de água disponível). Como esse procedimento é
tedioso, aconselha-se estimar o déficit utilizando-se um dos métodos de
medida do poder evaporante do ambiente, tomando por base observações
meteorológicas. O método mais simples recorre a tanques de evaporação
e evaporímetros, mas a colocação satisfatória de todos esses instrumentos
é difícil.

209
Uso e Manejo de Irrigação

Dois modelos do indicador de déficit, constituídos da combinação de


pluviômetro com evaporímetro, precisam estar colocados dentro da cultura
da qual se pretende medir o déficit; esses instrumentos são suficientemente
precisos para a irrigação comercial.

Uma estimativa mais precisa do déficit pode ser obtida utilizando-se


um dos métodos de cálculo da evaporação potencial, por meio de
parâmetros meteorológicos atuais, mas esses requerem o uso de
instrumentos meteorológicos apropriadamente instalados e operados.

Métodos simples para a estimativa da necessidade de irrigação.


Para locais onde registros meteorológicos se estendem por períodos
superiores a 20 anos, médias (normais) de transpiração potencial podem
ser calculadas. O fator que causa o maior desvio da média é, sem dúvida, a
variação da radiação solar; assim, é possível estimar a transpiração atual e,
conseqüentemente, o déficit, utilizando-se apenas a média de transpiração,
um pluviômetro e um heliógrafo. O fornecimento de correções atualizadas
da radiação solar pode dispensar registros de heliógrafo.

O encarregado da irrigação deve manter um balanço diário do estado


de umidade do solo. Indicado o mês do registro, quando o solo está na
capacidade de campo, isto é, sem déficit, a transpiração é subtraída, a
chuva e irrigação somadas, em períodos semanais ou outros convenientes.
O valor da transpiração é obtido de tabelas, somando-se ou subtraindo-se
a correção entre o valor atual e a média. A precipitação que exceda o
déficit em água será perdida, com o escorrimento superficial ou por
drenagem, e assim não é acumulada para contrabalançar a transpiração
futura. Por sua vez, a transpiração em excesso da precipitação é acumulada
e aumenta o déficit, que, se não for eliminado por chuva futura ou irrigação,
representará a quantidade máxima de irrigação que o solo pode absorver
sem perdas.

Relação planta-atmosfera: movimento


de água no sistema solo-planta-atmosfera

A água move-se pela planta e para a atmosfera como um resultado


da evaporação da água pela folhagem, em decorrência da incidência de
energia solar.

210
Transporte de Agua no Sistema Solo-Planta-Atmosfera ...

A evaporação pode ser medida por lisímetros de balança e evaporí-


metros, mas, por conta de problemas de localização e exposição desses
instrumentos, é mais indicado estimar esses parâmetros com base em dados
meteorológicos e físicos.
Métodos de estimativa baseados em partição de energia ou em
balanço de energia requerem medidas de energia líquida, dissipação de
calor no solo e mudanças na temperatura e na umidade do ar.
Métodos de correlação aerodinâmicos e de turbulência requerem
medidas diretas do fluxo ascendente de vapor d'água na atmosfera.
Métodos de combinação, incluindo-se o de Penman, combinam o
balanço de energia relativo com o sistema ar-planta-solo e fatores que
influenciam a transferência de calor e água para fora do sistema.
A transpiração e a evaporação atuais são geralmente menores do
que as estimativas potenciais, em virtude das restrições impostas pela falta
de água no solo, da limitação da extensão radicular e da cobertura
incompleta do solo pela folhagem.
A magnitude do efeito de um dado déficit de água no solo depende
do tipo de solo e da porcentagem de esgotamento da água disponível e,
conseqüentemente, do estresse ao qual a cultura é submetida. Normal-
mente, quanto maior for o estresse, maior será a redução do crescimento,
em virtude da interferência na absorção de dióxido de carbono.

Os efeitos do estresse de água em culturas (espécies vegetais) são


variados. Altos valores de tensão de água no solo ou estresse (baixo potencial
de água no solo), causados por teores baixos de água no solo, opõem-se à
passagem da água para a planta e, através de suas superfícies transpirantes,
para a atmosfera. O resultado dessa oposição é o aumento do déficit de
pressão de sucções dentro dos tecidos da planta, o que é ainda intensificado
por condições de alta demanda evaporativa - forte radiação solar, alta
temperatura, baixa umidade e movimento rápido de ar. Essas condições
são típicas de ambientes tropicais e subtropicais (e, assim, em casa de vegeta-
ção e em região temperada) e necessitam apenas que a demanda
evaporativa seja satisfeita para transformá-Ia de condições quase letais
para as plantas para condições de máximo crescimento.

A restrição no suprimento de água diminui a entrada de dióxido de


carbono e, assim, uma planta com suprimento limitado de água é menor do
que uma com suprimento não limitado de água. O desenvolvimento de
órgãos é freqüentemente mais lento em plantas sob estresse, mas há
exceções, como o amadurecimento de ervilhas, que é provocado pela

211
Uso e Manejo de Irrigação

conversão de açúcar em amido nos cotilédones das sementes em


desenvolvimento, em que o alívio ao estresse de umidade no momento da
intumescência das sementes atrasa o amadurecimento e prolonga o período
durante o qual as ervilhas se tornam suficientemente doces para atender
às exigências da indústria de produtos congelados.
O efeito óbvio que se manifesta na maioria das culturas com supri-
mento adequado de água é a produção de mais folhagem, em comparação
com culturas em que ocasionalmente a transpiração é limitada. Essa
folhagem extra pode ou não vir acompanhada por órgãos florais ou de
armazenamento maiores, ou em maior quantidade e, nisso, distintas espécies
comportam-se diferentemente. Se supermolhado, o Pe!argonium zona!
produz, prioritariamente, folhas no lugar de flores, mas a couve-flor produz
uma inflorescência maior; enquanto a ervilha produz mais grãos por vagem,
se água extra lhe for adicionada no momento da abertura das flores, e
ervilhas maiores se a água lhe for fornecida quando as vagens intumescerem.
Há ainda diferença de resposta entre cultivares. Alguns desses efeitos
são o resultado da manutenção de determinado tratamento de água durante
todo o desenvolvimento da cultura; outros ocorrem quando o estresse de
água é aliviado temporariamente, durante um estádio de crescimento
sensível à umidade. Em gramíneas, se a cultura for molhada antes desse
estádio crítico, a produção requerida é constituída de folhas e, não, de
sementes. Assim, o tratamento de irrigação dado a uma cultura vai depender
de quais órgãos serão comercializados. Esses fenômenos oferecem a
oportunidade de fazer bom uso do suprimento controlado de água.

Relações solo-água-planta em
algumas culturas de expressão econômica

Serão discutidos vários aspectos de crescimento e desenvolvimento


das espécies, tanto da parte aérea como do sistema radicular, os períodos
críticos de demanda de água e as necessidades hídricas.

Milho (Zea mays l.)

O milho (Zea mays L.) é originário da região andina da América Central


e hoje é cultivado em todas as regiões temperadas e tropicais. É um dos
cereais mais importantes, tanto para o consumo humano como para o animal,

212
Transporte de Água no Sistema Solo-Planta-Atmosfera ...

sendo cultivado para grãos e forragem. A produção mundial, em 2004, foi


de cerca de 724 milhões de toneladas de grãos procedentes e, aproxima-
damente, 147 milhões de hectares (FAO, 2006).

Existem muitos tipos de milho adaptados a um amplo espectro de


condições de clima e de cultivo. Ele é cultivado em épocas nas quais a
temperatura média do ar seja superior a 15 O( e sem geadas. A adapta-
bilidade das variedades a diferentes climas varia muito, dependendo da
seleção das variedades, de tal modo que a duração do ciclo fenológico da
cultura coincida com a duração da temporada de crescimento e, ainda, da
finalidade para a qual se produz a cultura.

Quando as temperaturas médias durante o ciclo forem superiores a


20°(, as variedades precoces atingirão a maturação entre 80 e 110 dias, e
as variedades tardias entre 110 e 140 dias. Quando as temperaturas médias
diárias forem inferiores a 20°(, será estendido o período para chegar ao
amadurecimento em, aproximadamente, de 10 a 20 dias para cada 0,5 O(
de diminuição da temperatura, dependendo da variedade, sendo que, a
15°C, a cultura de milho de grão leva de 200 a 300 dias para amadurecer.
Com temperatura média diária de 10 O( a 15°C, o milho é cultivado, prin-
cipalmente como forragem, em virtude do problema de formação da semente
e de amadurecimento do grão em condições frias. Para a germinação, a
temperatura média mínima diária é de, aproximadamente, 10°(, estando
a ótima entre 18 O( e 20°C. A cultura é muito sensível a geada, particular-
mente no estágio de plântula, porém tolera condições atmosféricas quentes
e secas enquanto se dispuser de água suficiente para a planta e as tempera-
turas forem inferiores a 45°C. As necessidades de temperatura, expressas
como soma das temperaturas médias diárias, para as variedades do tipo
médio são de 2.500 O( a 3.000 °C/dia, enquanto as precoces necessitam
em torno de 1.800 e, as tardias, de 3.700 °C/dia ou mais.

Com respeito ao fotoperíodo, o milho é considerado planta neutra ou


de dias curtos. Seu desenvolvimento é, porém, muito afetado pela
quantidade de radiação solar, e a maior produtividade é obtida em condições
de alta radiação. As cinco ou seis folhas situadas próximo, ou acima, da
espiga, são a fonte de assimilação para o enchimento de grão, e, portanto,
a luz deverá penetrá-Ias. Para a interceptação ótima da luz, no caso da
produção de grão, o índice de densidade (número de plantas por hectare/
espaçamento entre fileiras) sofre uma variação, porém, a média fica em
torno de 150 para as variedades grandes e tardias, e em cerca de 500 para
as variedades pequenas e precoces. Os métodos de plantio e o espaçamento
variam, sendo os fertilizantes e a água fatores decisivos na escolha da ótima

213
Uso e Manejo de Irrigação

com relação à interceptação de luz e aos rendimentos máximos. A população


varia de 20 mil a 30 mil plantas/ha para as variedades grandes e tardias,
até 50 mil a 80 mil plantas/ha para as variedades pequenas e precoces.
O espaçamento entre fileiras varia entre 0,6 m e 1 m; a profundidade de
semeadura é de 5 cm a 7 cm, com uma ou mais sementes por cova. Quando
se cultiva para forragem, a população de plantas é 50 % maior.

O solo deve ser bem drenado e arejado, pois a cultura é sensível a


condições de saturação de água, mesmo que seja por alguns dias.
A necessidade de fertilizantes para o milho em grão é relativamente elevada,
chegando até cerca de 200 kg ha' de N, de 50 kg ha' a 80 kg ha' de P, e
de 60 kg ha' a 100 kg ha' de K para as variedades altamente produtivas.
Geralmente, a cultura pode ser produzida de forma contínua, enquanto for
mantida a fertilidade do solo.

A cultura é moderadamente sensível à salinidade. As perdas de


produtividade devidas à condutividade elétrica do solo são apresentadas
na Tabela 1.

Tabela 1. Perdas de produtividade do milho em relação à condutividade


elétrica do extrato de saturação solo (CEes).

Perdas (%) CEes (mmbos/cm a 25°C, ou dS/m)


O O a 2,5
10 5,0
25 6,0
50 7,0
100 10 ou mais

Fonte: Ayers e Westcot (1991).

O sistema radicular é fasciculado e sua profundidade é determinada


geneticamente. De maneira geral, pode-se dizer que cerca de 60 % do
sistema se encontra na camada superficial de O cm a 30 cm, e a profun-
didade média máxima é de 1 m, podendo, às vezes, atingir 1,5 m.
A Tabela 2 mostra um exemplo de distribuição radicular para uma cultura
de milho não-irrigada.

Verificou-se que, para a maioria das variedades, o desenvolvimento


radicular é proporcional à umidade. Esse aumento também se reflete em
aumento de produtividade. Por isso, a cultura é tida como exigente em

214
Transporte de Água no Sistema Solo-Planta-Atmosfera ..

Tabela 2. Extração de água do perfil de solo por uma cultura de milho,


conforme o estádio de desenvolvimento.

Pereentual de ETa(l)

Profundidade (em em)


Período em dias
O a 30 30 a 60 60a 90 90a 120
O a 15 100 O O O
15 a 30 70 30 O O
30 a 60 60 20 20 O
60 a 90 60 15 15 10
90 a 120 60 15 15 10
(1) Percentual de ETa = porcentagem da evapotranspiração de cada camada de solo.
Fonte: Reichardt (1987).

água. Apesar disso, ela é uma das culturas mais eficientes no uso da água,
isto é, produz um grande acúmulo de matéria seca por unidade de água
absorvida.

Para produções ótimas, variedades de ciclo médio (90 a 110 dias)


exigem de 500 mm a 800 mm por ciclo, dependendo das condições
climáticas. O período de máxima exigência é na fase do embonecamento
ou um pouco depois dele; por isso, déficits de água que ocorrem nesse
período são os que provocam maiores reduções na produtividade. Déficit
de água anterior ao embonecamento reduz a produtividade em 20 % a
30 %; no embonecamento, em 40 % a 50 %; e após o embonecamento,
em 10% a 20 %. A extensão do período de déficit também é importante.

O milho tem por coeficientes de cultura os seguintes valores: 0,3 a


0,5, de O a 30 dias; 0,7 a 0,85, de 30 a 75 dias; 1,05 a 1,20, de 75 a 120
dias; 0,8 a 0,9, de 120 a 140 dias; e 0,55 na colheita.

Ótimas produtividades de milho variam de 6 t ha' a 9 t ha'. Em


condições de chuva natural, a produtividade oscila entre 2 t ha' e 4 t ha'.
dependendo do híbrido e das condições solo-clima.

Necessidades hídricas

Em termos de produção total de matéria seca, o milho utiliza


eficientemente a água e, entre os cereais, é potencialmente a cultura de
maior rendimento em grãos. Para se obter produção máxima, um cultivo
de grãos com período médio de amadurecimento necessita entre 500 mm

215
Uso e Manejo de Irrigação

e 800 mm de água, dependendo do clima. Devem-se acrescentar a essa


quantidade as perdas durante o transporte e a aplicação. O coeficiente de
cultivo (kc) que relaciona as necessidades hídricas máximas (ETm) com a
evapotranspiração de referência (ETo) para diferentes estágios de
crescimento da cultura do milho em grão é o seguinte: no estágio inicial, de
0,3 a 0,5 (de 15 a 30 dias); no estágio de desenvolvimento, de 0,7 a 0,85
(de 30 a 45 dias); no estágio intermediário, de 1,05 a 1,2 (de 30 a 45 dias);
no estágio final, de 0,8 a 0,9 (de 10 a 30 dias); e, na colheita, de 0,55 a 0,6.

Suprimento de água e rendimento da cultura

A freqüência, a lâmina de irrigação e a chuva têm um efeito pronun-


ciado sobre o rendimento em grãos. O milho parece ser relativamente
tolerante aos déficits hídricos durante os períodos vegetativo (1) e de
maturação (4). A maior diminuição nos rendimentos em grão provocada
pelos déficits hídricos ocorre durante o período de floração (2), incluindo
inflorescência, estigma e polinização, em decorrência principalmente da
redução do número de grãos por espiga. Esseefeito é menos pronunciado
quando a planta sofre déficit hídrico no período vegetativo precedente (1).
Déficits hídricos severos durante o período de floração (2), particularmente
na época de formação da espiga e da polinização, podem resultar num
rendimento baixo ou nulo de grãos, em virtude do secamento dos estigmas.
Durante o período de formação da colheita (3), os déficits hídricos podem
traduzir-se em diminuição de rendimento decorrente da redução do tamanho
do grão, porém, durante o período de maturação (4), tem pouco efeito
sobre o rendimento de grãos.

O efeito da limitação de água sobre o rendimento do milho em grãos


é considerável, sendo necessário o controle cuidadoso da freqüência e da
lâmina de irrigação para obter rendimentos ótimos em condições de
escassezde água. Portanto, onde o suprimento de água for limitado, pode
ser mais vantajoso atender, no que for possível, a todas as necessidades
hídricas (ETm) para se obter um rendimento próximo do máximo sobre
uma área limitada, em vez de se distribuir a água limitada sobre uma área
maior.

O milho prospera em solos bem drenados, devendo-se evitar o


encharcamento, particularmente durante os períodos de floração (2) e
formação da colheita (3). O encharcamento durante a floração (2) pode
reduzir o rendimento em grãos em até 50% ou mais.

216
Transporte de Água no Sistema Solo-Planta-Atmosfera ..

Absorção de água

Quando as condições de evaporação correspondem a uma ETm de


5 mm a 6 mm/dia, o esgotamento da água disponível no solo (Sa) até 55 %
tem um pequeno efeito sobre o rendimento (p = 0,55). Para se obter um
desenvolvimento rápido e profundo das raízes, pode ser vantajoso o
esgotamento um pouco maior de água durante os períodos iniciais de
crescimento. Durante o período de maturação, pode-se permitir um
esgotamento de 80 % ou mais.

Embora, nos solos profundos, as raízes possam atingir a profundidade


de 2 m, o sistema mais ramificado fica situado na camada superior, de
0,8 m a 1,0 m, e cerca de 80 % da absorção da água do solo ocorre dentro
dessa camada. Normalmente, 100 % da água é absorvido na primeira
camada de 1 m a 1,7 m de profundidade do solo (D =
1-1,7 m). A profun-
didade e a taxa de crescimento das raízes, no entanto, são bastante influen-
ciadas pelo regime pluviométrico e pelas práticas de irrigação adotadas.
Além da umidade do solo e dos níveis dos nutrientes, a estratificação
estrutural e textural, os sais e o lençol freático influem intensamente no
desenvolvimento das raízes.

Calendário de irrigação

Para se obter uma boa uniformidade e um desenvolvimento rápido


das raízes, a zona radicular deve, onde for possível, estar úmida no momento
da semeadura, ou logo depois. Levando-se em conta o nível da ETm, para
atender plenamente às necessidades hídricas, o nível de esgotamento da
água fica em torno de 40 % no período de estabelecimento (O), entre 55 %
e 65 % durante os períodos 1, 2 e 3, e até 80 % durante o período de
maturação (4).

Onde a precipitação for baixa e o suprimento de água for limitado, o


calendário de irrigação deve ser proposto com o objetivo de evitar os déficits
hídricos durante o período de floração (2) seguido pelo período de formação
da colheita (3). Quando um déficit hídrico severo for inevitável durante o
período de floração (2), será possível economizar água reduzindo-se o
suprimento durante o período vegetativo (1), bem como durante o de
formação da colheita (3) sem provocar perdas adicionais de rendimento.

Em condições de chuvas marginais e suprimento limitado de água de


irrigação, o número de irrigações pode variar entre 2 e 5. Na Tabela 3,
apresenta-se um calendário para o tempo dessas aplicações de irrigação.

217
Uso e Manejo de Irrigação

Para se obter uma boa uniformidade e um desenvolvimento adequado das


raízes, a zona radicular potencial deve estar úmida, seja mediante chuvas
seja por irrigação, antes ou logo depois da semeadura.

Tabela 3. Calendário de sugestão para a aplicação de irrigação em milho.

N°de Estabelecimento Vegetativo Floração Formação da Maturação


irrigações (O) (1) (2) colheita (3) (4)
2
3
4
5
Fonte: Reichardt (1987).

Rendimento

Em condições irrigadas e produção de grãos para comercialização,


são considerados bons os rendimentos da ordem de 6 t ha' a 9 t ha' (com
10 % a 13 % de umidade). A eficiência de utilização de água para o rendi-
mento obtido (Ey) em grãos varia entre 0,8 kg rn' e 1,6 kg m'.

Sorgo - Sorghum bicolor (L.) Moench

o
sorgo (Sorghum bicctot) parece ter sido cultivado na Etiópia há
cerca de 5 mil anos. A produção mundial, em 2005, foi de 56,9 milhões de
toneladas de grãos procedentes de 42,7 milhões de hectares (FAO, 2006).

O sorgo possui características que o classificam como cultura resistente


à seca. É cultivado extensivamente em condições de sequeiro para a pro-
dução de grãos e de forragem. Em zonas secas, com precipitações baixas
e/ou irregulares, a cultura pode responder de forma favorável à irrigação
suplementar. Entretanto, existem diferenças consideráveis entre as diversas
variedades quanto a resposta à irrigação, sendo que aquelas consideradas
muito resistentes à seca respondem ligeiramente, enquanto as outras produ-
zem rendimentos altos com irrigação, porém baixos quando a água é limitada.

A temperatura é fator importante na seleção da variedade. As tempe-


raturas ótimas para as variedades altamente produtivas são superiores a
25°C, mas algumas estão adaptadas a temperaturas mais baixas, produ-
zindo rendimentos aceitáveis. Quando as temperaturas médias diárias
durante o período de crescimento são superiores a 20°C, as variedades
precoces de grãos levam de 90 a 110 dias, enquanto as variedades

218
Transporte de Água no Sistema Solo-Planta-Atmosfera ...

intermediárias, de 110 a 140 dias para amadurecer. Quando as temperaturas


médias diárias são inferiores a 20 O( , há um prolongamento no período de
crescimento de cerca de 10 a 20 dias para cada 0,5 O( de queda na tem-
peratura. Dependendo da variedade e a 15°C, a cultura de sorgo para grãos
leva de 150 a 300 dias até a maturação. Com temperaturas médias diárias
na faixa de 10 O( a 15 O( , o cultivo de sorgo somente poderá ser realizado
para forragem, em virtude dos problemas relativos ao estabelecimento da
semente e ao amadurecimento do grão em condições frias. Temperaturas
baixas «15 O() e altas (>35 O() durante a floração e a formação da colheita
provocam um mau estabelecimento da semente, problemas de maturação
e rendimentos reduzidos.
Para interceptação ótima da luz, o índice de densidade (razão entre
plantas por hectare e espaçamento entre fileiras) é em torno de 3 mil, quando
se dispõe de quantidade suficiente de água e fertilizantes (100 mil a 150 mil
plantas/ha). Em zonas com escassez de água (precipitação + irrigação),
quanto maior for a escassez, maior será a vantagem de espaçamento maior.
O sorgo é uma planta de dias curtos, porém existem variedades neutras em
relação à duração do dia.
A cultura adapta-se bem à maioria dos solos, porém melhor nos de
textura leve a média. O solo deve ter, preferencialmente, aeração e
drenagem boas. O sorgo é relativamente tolerante a períodos curtos de
encharcamento. As necessidades de fertilizantes são de até 180 kg ha' de
N, de 20 kg ha' a 45 kg ha' de P, e de 35 kg ha' a 80 kg ha' de K.
O sorgo é moderadamente tolerante à salinidade do solo. Em condições
de irrigação, a diminuição de rendimento resultante da condutividade elétrica
do extrato de saturação do solo (Cf.es) para valores de 4,0, 5,1, 7,2, 11,0 e
18,0 dS rn' é, respectivamente, de O %, 10 %, 25 %, 50 % e 100 %.

Necessidades hídricas

Para se obter produção elevada, as necessidades hídricas (ETm) da


cultura de sorgo de 110 a 130 dias (Tabela 4) deverão estar entre 450 mm
e 650 mm, dependendo do clima, devendo-se incluir as perdas durante a
condução e a aplicação da água. O coeficiente de cultivo (Kc), que relaciona
a evapotranspiração máxima (ETm) com a evapotranspiração de referência
(ETo), possui os seguintes valores, seguindo o ciclo apresentado na Tabela 4:
durante o estágio inicial, 0,4 (de 20 a 25 dias); no estágio de desenvol-
vimento, de 0,7 a 0,75 (de 30 a 40 dias); no estágio intermediário, de 1,0 a
1,15 (de 40 a 45 dias); no estágio final, de 0,75 a 0,8 (30 dias); e, na colheita,
de 0,5 a 0,55.

219
Uso e Manejo de Irrigação

Tabela 4. Fasesdo ciclo de desenvolvimento do sorgo para suprimento de


água à cultura.

Fase Períodos de desenvolvimento do sorgo Dias


O Estabelecimento
(desde a semeadura até o início da formação da espiga) De 15 a 20

Vegetativo
(desde o início da formação da espiga até a saída desta) De 20 a 30

2 Floração
(desde o início até o estabelecimento da semente) De 15 a 20

3 Formação da colheita
(desde o estabelecimento da semente até o amadurecimento
fisiológico) De 35 a 40
4 Maturação
(desde o amadurecimento fisiológico até a colheita) De 10 a 15

Ciclo total da cultura do sorgo (em dias): ... De 95 a 125


Fonte: Paul (1990)

o sorgo é, relativamente,
mais resistente à seca do que muitas outras
culturas, como o milho. Isso se deve a seu sistema radicular extenso, ao
controle efetivo da evapotranspiração e aos estômatos com capacidade de
recuperação rápida após os períodos de estresse hídrico, assim como a sua
capacidade de suportar a estiagem. Entretanto, quando o período de
crescimento é longo, as variedades com perfilhamento são capazes de se
recuperar, até certo ponto, dos déficits hídricos anteriores nos períodos
iniciais de crescimento, mediante a formação de perfilhos adicionais
portadores de espigas. Os déficits hídricos severos durante o período de
floração (2) causam o fracasso da polinização ou o secamento da espiga.
A diminuição de rendimento resultante pode ser compensada parcialmente
pelos perfilhos adicionais com espiga.
O sorgo mostra grande flexibilidade com relação às lâminas e à
freqüência de suprimento de água, por conta de suas características de
resistência à seca. Quando o suprimento de água é limitado, pode ser
vantajoso distribuir água por uma área maior. Embora se reduza o
rendimento por unidade de área, a eficiência de utilização de água para o
rendimento obtido será maior, resultando numa produção global superior
em relação ao volume de água fornecido. O momento de suprimento de
água deve ser programado com o objetivo de reduzir os déficits hídricos ao
mínimo durante os períodos de estabelecimento (O), floração (2) e início de
formação da colheita (início de 3).

220
Transporte de Água no Sistema Solo-Planta-Atmosfera ...

Absorção de água

o sistema radicular principal, pouco ramificado, cresce rapidamente


em solos profundos até 1 ma 1,5 m. O sistema secundário inicia várias sema-
nas após a emergência e estende-se rapidamente até 2 rn, dependendo da
profundidade de solo úmido. A profundidade máxima é atingida geralmente
no momento da emissão das espigas. Em solos profundos, o sistema radicular
extenso permite flexibilidade adicional no calendário de irrigação.
Dependendo da lâmina e da freqüência de irrigação, 60 % (menos
freqüente) a 90 % (freqüente) da absorção de água ocorre a partir do
primeiro metro de profundidade do solo. Normalmente, quando o sorgo
está plenamente desenvolvido, 100 % da água é extraída da primeira
camada de 1 m a 2 m (D = 1 m a 2 m). Em condições em que a ETm é de
5 mm/dia a 6 mm/dia, podem ser esgotados em torno de 55 % da água
total disponível no solo, sem reduzir a absorção de água (p =
0,55). Durante
a maturação (4), podem ser esgotados até 80 % da água disponível.

Calendário de irrigação

Quando a chuva não é suficiente e o suprimento de água de irrigação


é limitado, para se alcançar a produção ótima, a aplicação de irrigação
deve ser baseada no propósito de evitar os déficit hídricos durante os
períodos de utilização máxima de água, desde a floração (2) até o início do
período de formação da colheita (3). Quando o suprimento de água for
limitado durante o período de floração, a economia de água pode ser feita
sem provocar perdas significativas de rendimento, reduzindo-se o
suprimento de água durante o período vegetativo (1), no período final de
formação da colheita (final de 3) e no período de maturação (4).

O número de irrigações varia normalmente entre um e quatro, depen-


dendo das condições climáticas e da textura do solo. A eficiência máxima
de utilização de água será obtida quando essas irrigações estiverem bem
programadas em relação à sensibilidade da cultura aos déficit hídricos.

A irrigação é reduzida, na maioria das vezes, por métodos superficiais


(faixas, bacias ou corrugação).

Rendimento

Em condições de irrigação, são considerados bons os rendimentos entre


3,5 t ha' e 5,0 t ha' (de 12 % a 15 % de umidade). A eficiência de utilização
de água para o rendimento obtido (Ey) em grão é de 0,6 kg rn? a 1,0 kg m'.

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Uso e Manejo de Irrigação

o rendimento em grãos, quando irrigado por inundação, com pouca


ou nenhuma chuva, tendo período total de crescimento de 90 dias, com
ETm de 425 mm a 450 mm e lâmina de aplicação líquida em torno de 300 mm,
fica em torno de 800 kg ha'. com o máximo de 1.300 kg ha'.

Feijão (Phaseolus vulgaris L.)

A produção mundial de feijão (grão seco, e não vagem verde) foi, em


2004, de 18,3 milhões de toneladas de grãos, procedentes de 24,5 milhões
de hectares (FAO, 2006).

O feijão (Phaseo/us vu/garis L.) é uma leguminosa anual cultivada para


a obtenção de vagens verdes e, principalmente, de sementes secas na forma
de grão. Ele é uma excelente fonte de proteína, principalmente nas regiões
do Terceiro Mundo. Originário das regiões semitropicais da América Central,
está adaptado a várias condições climáticas. A maioria das cultivares
destinadas à produção de grãos tem um crescimento determinado. Muitas,
porém, têm um crescimento indeterminado, principalmente aquelas
cultivadas para a produção de vagens verdes.

Apesar de ser uma leguminosa e de possuir a capacidade de fixar


nitrogênio da atmosfera em seus nódulos localizados no sistema radi-
cular, o feijão é tido como um mau fixador. Raramente mais de 30 % de
seu nitrogênio provém da fixação biológica simbiótica com as bactérias
Rhizobium spp.
O feijão desenvolve-se bem em áreas de precipitação pluvial média,
e não se adapta a condições muito úmidas. Chuva em excesso e tempera-
turas altas causam a queda das flores e aumentam a incidência de moléstias.
O intervalo ótimo de temperaturas médias diárias está entre 15°C e 20°C.
Abaixo de 10°C, o crescimento é praticamente inibido, enquanto acima de
27 °C , seu crescimento começa a ser prejudicado.

O ciclo completo da cultura é de 60 a 90 dias no caso de colheita de


vagens verdes, e 90 a 120 dias para a produção de grãos. A cultura é
sensível à salinidade, e a redução de produção resulta da CE do solo: O %
para CE de O a 1 mmhos/cm a 25°C; 10 % para 1,5 mmhos/cm; 25 % para
2,3 mmhos/cm; 50 % para 3,6 mmhos/cm; e 100 % para valores superiores
a 6,5 mmhos/cm.

O sistema radicular do feijão, apesar de poder atingir a profundidade


de 1,0 m, é bastante superficial (de 80 % a 90 % nos primeiros 25 cm).

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Por isso, a cultura responde a freqüentes irrigações. De forma geral, pode-


se dizer que a cultura é muito sensível à umidade do solo e sua produtividade
pode ser intensamente afetada mesmo com curtos períodos de falta de
água. Não existe informação adequada sobre os efeitos de déficit de água
no período pré-floral, mas é de consenso geral que déficit de água durante
a floração e a formação de vagens diminuem a produtividade. Um experi-
mento no qual a cultura foi submetida a um déficit de água correspondente
a um potencial matricial de -8 atm nos períodos após floração, pré-floração
e floração, as reduções de produtividade foram, respectivamente, de 35 %,
53 % e 71 %.
Os coeficientes de cultura K médios para a cultura variam de 0,3 a
0,4, de O a 20 dias; de 0,65 a 0,75, de 20 a 40 dias; de 0,95 a 1,05, de 40 a
70 dias; de 0,9 a 0,95, de 70 a 90 dias; e de 0,85 a 0,9, nos restantes, até a
colheita.
A necessidade de água da cultura para ciclos de 60 a 120 dias é de
300 mm a 500 mm; a falta de água pode, porém, reduzir sensivelmente o
rendimento da cultura. Boas produtividades de feijão estão entre 1,5 mil e
2 mil kg ha' de sementes secas, mas podem chegar a 3 mil kg ha'.

Referência

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