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NÍVEIS DE CONHECIMENTO ESPERADOS DOS ESTUDANTES:

A NOÇÃO INTUITIVA DE CONJUNTO.

AUREO DE ALBUQUERQUE RIBEIRO


aureoaribeiro@yahoo.com.br

MARLENE ALVES DIAS


alvesdias@ig.com.br
UNICSUL

Público alvo:
Este trabalho está direcionado aos estudantes e professores de matemática do ensino
fundamental, médio e superior e aos pesquisadores em educação matemática.

1. Introdução

Cada vez mais é possível perceber que existem alguns motivos que interferem na
capacidade de aprendizagem real dos estudantes que vão além da simples obtenção dos
conceitos bons, médios ou regulares nos resultados escolares, qualquer que seja a
matéria estudada. Em particular, no caso da matemática observamos que estudantes que
tem um bom desempenho escolar muitas vezes não são capazes de manter esse
resultado quando são confrontados com problemas nos quais as ferramentas que devem
ser utilizadas são aquelas desenvolvidas em seu percurso escolar, mas o questionamento
proposto exige que os mesmos mobilizem e/ou disponibilizem esses conhecimentos.
Considerando a dificuldade acima, questionamos desde a licenciatura sobre
quais seriam os motivos que dificultam a resolução de determinados problemas mesmo
por estudantes que têm um percurso escolar sem apresentar dificuldades concretas em
matemática.
A partir das reflexões acima nos questionamos sobre: Que níveis de problemas
de matemática esperamos que nossos alunos sejam capazes de resolver quando
trabalhamos com a noção intuitiva de conjunto?
Escolhemos trabalhar com a noção intuitiva de conjunto por tratar-se de um
conteúdo matemático que acompanha os estudantes desde as primeiras séries do ensino
fundamental, mas mesmo assim pudemos verificar que os mesmos têm grandes
dificuldades em resolver questões em que esta noção aparece em um nível disponível
nos remetendo à noção definida por A.Robert [Robert, 1997].
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Na tentativa de encontrar meios de contornar estas dificuldades escolhemos


como referencial teórico central para o nosso trabalho a noção de níveis de
conhecimentos esperados dos estudantes segundo definição de A. Robert, que nos
parecem bem adaptadas para a análise das dificuldades que apresentam nossos
estudantes em relação à resolução de problemas, quando estes são apresentados em
diferentes domínios e contextos ou se apresentam sob diferentes pontos de vista ou
quando são utilizados diferentes registros de representação semiótica, e neste caso,
principalmente quando é necessário um trabalho de conversão conforme a definição de
R.Duval [Duval, 1995]. Ainda nessa abordagem, o referencial teórico é complementado
segundo a teoria de D.P. Ausubel [Ausubel, 1968] quanto à aprendizagem significativa.
Sendo assim, nos colocamos inicialmente as seguintes questões:
1) Nas diferentes etapas da escolaridade, que nível de conhecimentos em
matemática, segundo A Robert, em particular para a noção intuitiva de
conjuntos, esperamos de nossos alunos?
2) Que tipos de discursos técnico, tecnológico e teórico (segundo Chevallard)
[Chevallard,1992] são utilizados para explicitar o trabalho matemático?
3) Que meios desconhecidos (segundo Polya) [Polya, 1997] são desenvolvidos para
ensinar a noção intuitiva de conjunto?
4) Se existe um trabalho de conversão dos diferentes registros de representação
semiótica ou se esse trabalho fica totalmente a cargo dos estudantes?
5) Os conhecimentos prévios dos alunos são valorizados para que eles possam
construir outros conhecimentos (segundo Ausubel) [Ausubel, 1968]?
Na tentativa de responder a estas questões propusemos a seguinte metodologia.

2. Metodologia

1) Uma análise preliminar dos níveis de conhecimentos esperados dos estudantes e


o uso da aprendizagem significativa. Nesta análise procuramos estabelecer os
diferentes tipos de tarefas e práticas que intervém no ensino da noção intuitiva
de conjuntos ressaltando as necessidades de articulação entre domínios, registros
de representações semióticas, contextos e pontos de vista para que os estudantes
possam trabalhar em um nível disponível às noções associadas ao domínio
particular em estudo.
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2) Uma análise da forma como o trabalho matemático é gerado institucionalmente


através da pesquisa de livros didáticos, softwares e endereços eletrônico, em que
observaremos as regularidades e diferenças nos trabalhos existentes.
3) Um estudo do nível de conhecimento e a utilização dos conteúdos prévios que
são necessários na aprendizagem significativa desenvolvido pelos estudantes
através de um teste diagnóstico com alunos do ensino médio e ingressantes na
universidade.

3. Referencial teórico

Nos apoiamos principalmente nas teorias de aprendizagem de D. P. Ausubel


(1968), nas teorias de Y. Chevallard (1992), nas definições de R. Duval (1995), no
trabalho desenvolvido por P. R. Halmos (2001), nos métodos de G. Polya (1997) e nas
abordagens de A. Robert (1997).

Nas teorias de aprendizagem significativa de D. P. Ausubel (1968), destacamos


os conceitos principais e básicos. A aprendizagem é significativa quando uma certa
informação (nova) e identificada para o aprendiz, isto é, ele adquire essa informação
com certa clareza, estabilidade e diferenciação. Na aprendizagem significativa existe
uma interação entre o novo conhecimento e o já existente no aprendizado do aluno.
Na aprendizagem significativa o novo conhecimento é internalizado de maneira
que possa ter significado fundamental para o aprendiz, diferentemente do acontece com
o aprendizado mecânico, onde o conhecimento é armazenado de forma arbitrária e
literal na mente do aprendiz. Ele aprende e reproduz mecanicamente, mas esse
conhecimento não significa nada para ele.

A abordagem teórica dos três níveis de conhecimento (nível técnico, mobilizável


e disponível) esperados dos estudantes será fundamentada na definição de A. Robert.

O nível técnico corresponde a um trabalho único e simples. Está relacionado


principalmente às definições utilizadas em uma determinada tarefa.
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Exemplo:

Usando dois conjuntos A = {1, 2, 3, 4, 5, 6} e B = {a, b, c, d , e, f} obter todos os pares


ordenados dos elementos de A e B, tomados dois a dois.

Resp.: (1,a),(1,b),(1,c),(1,d),(1,e),(1,f),(2,a),(2,b),(2,c),(2,d),(2,e),(2,f),(3,a),(3,b),(3,c),
(3,d), (3,e),(3,f),(4,a),(4,b),(4,c),(4,d), (4,e), (4,f), (5,a), (5,b),(5,c),(5,d),(5,e),(5,f),
(6,a),(6,b), (6,c),(6,d),(6,e),(6,f) }.

O nível mobilizável corresponde a um início de justaposição de saberes de um


certo domínio, vários métodos podem ser mobilizados. Se um saber é identificado, ele é
considerado mobilizado se ele é acessível, isto é, se o estudante o utiliza corretamente.
Um aluno consegue mobilizar os conhecimentos de desigualdade. No exemplo dado ele
consegue fazer um relacionamento entre duas formas de representação de conjuntos.

Ex.: Dado o conjunto A = { x ∈ N / 2 ≤ x < 5 } , faça sua representação onde aparecem


todos os elementos desse conjunto.
Resposta: A= { 2, 3, 4 }

O nível disponível corresponde em saber responder corretamente o que é


proposto sem indicações, de poder, por exemplo, dar contra-exemplos (encontrar ou
criar), fazer relações, aplicar métodos não previstos.

Este nível de conhecimento está associado ao conhecimento de referência


variadas que o estudante conhece, servem de questionamentos e de organização.
Podendo funcionar para um único problema ou possibilitando fazer resumos.

Exemplo:

Sendo A = {1, 2}, B = {2, 3}, C = {1, 3, 4} e D = {1, 2, 3, 4}, classificar em V ou F


cada sentença abaixo e justificar:
a) A ⊂ B
b) A ⊂ C
c) C = D
d) D ⊃ B
f) A ⊄ C

Em relação aos diferentes níveis de conhecimento exigidos, consideramos


importantes as tarefas definidas abaixo:
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*O nível de conhecimento pedido no exercício;

*Os registros e representações dadas no enunciado;

*O quadro em que a tarefa é enunciada;

*Os tipos de representação exigidos na solução do exercício;

*Que níveis de conhecimento são necessários para a execução do exercício.

4. Resultados parciais encontrados

Da análise matemática, obtivemos estes resultados:

- Uma organização simples quando trabalhamos com a introdução da noção


intuitiva de conjuntos no ensino médio, pois nenhuma articulação é feita com a
lógica proposicional que, em geral, é introduzida num capítulo anterior ao da
introdução da noção de conjunto.
- Um desenvolvimento histórico que coloca em evidência o caráter puramente
intuitivo desta noção que só poderá ser realmente compreendido do ponto de
vista matemático através da evolução da lógica em que a teoria dos conjuntos e
tratada formalmente e, conseqüentemente, é nesse momento que as articulações
entre a teoria de conjuntos e a lógica, podem ser realmente trabalhadas. Aqui,
podemos ressaltar o trabalho de Halmos [Halmos, 2001] que em seu livro
“Teoria ingênua dos conjuntos” coloca em evidência a complexidade das noções
em jogo.
- Nos exemplos dos livros analisados, dica evidente a importância dos níveis
mobilizável e disponível no aprendizado de conjuntos. Os exercícios aplicados
estão sempre associados a aprendizagem significativa, utilizando os momentos
de uma descrição baseada na realidade do aluno e exigindo um trabalho mais
complexo que é o da solução de uma tarefa determinada.

A análise das tarefas e práticas nos mostra que:


- O espaço de trabalho do nível disponível está mais associado à aplicação da
noção intuitiva de conjunto, suas operações e relações, nas outras disciplinas do
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ensino médio, uma vez que não trabalhamos com o conceito matemático de
conjunto tal como foi desenvolvido em teoria dos conjuntos. Trata-se de um
conteúdo, no ensino médio e para alguns cursos mesmo no ensino superior
brasileiro é desenvolvido na sua forma mais rudimentar, isto é, as definições
estão mais associadas às aplicações possíveis.
- Contrastando com a aprendizagem significativa, a análise nos mostra que na
prática utilizamos a aprendizagem mecânica, definida por Ausubel [Ausubel,
1968] como sendo a aprendizagem de novas informações com pouca ou
nenhuma associação com conceitos relevantes existentes na estrutura cognitiva.

A análise das tarefas e práticas exigidas no ensino médio mostra que:


- O espaço para desenvolver o nível disponível em relação à noção de conjunto
propriamente dita é muito limitado, alguns livros apresentam questões de
aplicação da noção intuitiva de conjunto, suas operações e relações relacionadas
com as disciplinas de biologia, estatística, mas a articulação entre essas noções e
as questões de lógica não aparecem neste momento da escolaridade para a
maioria dos livros didáticos brasileiros.
- O nível disponível é trabalhado mais em relação às aplicações possíveis tanto
nos outros domínios da matemática como nas outras ciências.

A análise do trabalho desenvolvido pelos estudantes através de um teste


experimental passado para os estudantes no primeiro ano da universidade mostra
que:
- Os estudantes são capazes de identificar conjuntos quando estes são definidos
em extensão, mas sentem dificuldades quando os mesmos são definidos em
compreensão principalmente quando necessita mobilizar algum conhecimento
relativo a propriedade matemática que define o conjunto.
- A conversão é simples no sentido de passagem da definição do conjunto por
compreensão para extensão quando os estudantes mobilizam corretamente a
propriedade matemática em jogo, mas a passagem da definição do conjunto por
extensão para compreensão apresenta um alto grau de dificuldade.

- O trabalho com as operações e relações é o que apresenta maior dificuldade


porque os estudantes, em geral, não dispõem das representações adequadas para
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trabalharem com determinadas tarefas. Essa dificuldade fica ainda mais


acentuada quando a tarefa exige, mesmo que restrita, uma articulação entre a
operação ou relação que está sendo trabalhada e as noções de lógica
proposicional que deixam mais evidentes as definições que deverão ser
aplicadas.
- É necessário que a aprendizagem significativa seja introduzida em todo o ensino
básico em todas as disciplinas e particularmente no ensino da matemática. Além
disso, a questão da utilização dos conhecimentos dos alunos no ensino de
matemática deve ser evidenciada, utilizando exemplos simples e usuais do
conhecimento adquirido.

5. Considerações finais

Em quase todo o estudo precisa-se destacar os aspectos relevantes que


chamamos de conclusão. Tem-se a certeza de que este estudo não chegou ao fim, então,
faz-se necessário apresentar os aspectos considerados importantes.
É oportuno salientar que nas análises realizada, os dados coletados nos
permitiram afirmar que a temática “ aprendizagem significativa “ não está presente na
prática executada em nossas escolas.
Esta análise permitiu destacar os seguintes itens:

. resistência do professor em inserir a aprendizagem significativa no processo de


construção do conhecimento matemático;
. ausência de elementos dessa aprendizagem no processo de planejamento, tais
como: objetivos, metodologia e avaliação;
. elenco de conteúdos sem uma proposição para a discussão dos conhecimentos
matemáticos na vida cotidiana;
. centralidade do professor na exposição dos conteúdos, exercendo ainda uma
postura detentora do conhecimento.

Este trabalho mostra que, no contexto da educação matemática, temos um longo


caminho a percorrer e por outro lado fortalece a idéia de que a aprendizagem
significativa se constitui em um dos aspectos de maior relevância no processo de
ensino-aprendizagem desta disciplina e na formação do aluno. Essa concepção mostra
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com clareza a vinculação existente entre a matemática e a realidade, algo que pode ser o
ponto de origem de um processo de transformação da visão da matemática enquanto
algo pronto, intocável e inacessível para a maioria dos alunos, uma vez que todos eles
sempre estarão enfrentando algum tipo de problema para resolver.
Como forma de implementação de uma atitude eficaz, tendo em vista o
desenvolvimento da capacidade dos alunos na aprendizagem significativa, a teoria de
Ausubel apresenta uma aprendizagem que tenha como ambiente uma comunicação
eficaz, respeite e conduza o aluno a imaginar-se como parte integrante desse novo
conhecimento. O educador pode diminuir a distância entre a teoria e a prática na escola,
conhecendo sua realidade e seus anseios, pois essa teoria propõe que os conhecimentos
prévios dos alunos sejam valorizados, para que possam construir estruturas que
permitam descobrir outros conhecimentos, caracterizando, assim, uma aprendizagem
eficaz e prazerosa.

A análise das tarefas nos permite identificar uma forte tendência dos níveis
mobilizável e disponível e, portanto, uma necessidade de articulação entre quadros,
registros e pontos de vista fica cada vez mais evidente.
Acredita-se que o ensino de matemática deve levar em conta, hoje, a educação
para a cidadania, e isso implica no envolvimento do conhecimento moderno. Com isso,
o professor de matemática se constitui como elemento importante para trabalhar com os
princípios éticos associados à matemática.
Apesar de Ausubel discutir outros tópicos, preferimos enfatizar a aprendizagem
significativa, ou seja, o processo de adquirir significados a partir de material
potencialmente significativo na estrutura cognitiva.

6. Referências bibliográficas

[AUSUBEL, 1968] Ausubel, D. P., Educational psychology: A cognitive view. In.:


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MOREIRA, M. A. A aprendizagem significativa: a teoria de David Ausubel. São Paulo:


Moraes, 1982.

[CHEVALLARD, 1992] Chevallard, Y., Concepts fondamentaux de la didactique:


perspectives _portes par une approche anthropologique, Recherches en didactique des
mathématiques, vol.12-1, La Pensée Sauvage, Grenoble, 73-112, 1992.

[DUVAL, 1995] Duval, R., Sémiosis et pensée humaine, Perter Lang, Paris, 1995.
Enseigner autrement lés mathématiques en DEUG a prèmiere année. Brochures de la
comission Inter IREM Université.1990.

[HALMOS, 2001] Halmos, P. R. Teoria ingênua dos conjuntos. Rio de Janeiro: Ciência
Moderna, 2001.

[MOREIRA, 1988] M. A. Mapas conceituais e aprendizagem significativa. O Ensino,


23 a 28: 97-95,1988. Site disponível em :

http://www.emack.com.br/info/apostilas/nestor/mapasmoreira.pdf

[POLYA, 1997] Polya.G. Califórnia Mathematics Council Bulletin (v.7, nº 2). In.:
KRULIK, Stephen, REYS, Robert E. A resolução de problemas na matemática escolar.
São Paulo:Atual,1997.

[ROBERT, 1997] Robert,A. Quelques outils d’analyse épistemologique et didactique de


connaissances mathématiques à enseigner au lycée et à l’université. Actes de la IX école
d’ete de didactique dês mathématiques. Houlgate. França.1997.

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