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.Essa acumulação primitiva desempenha na economia política


um papel análogo ao do pecado original na teologia. Adão mordeu
a maçã e, por isso o pecado contaminou a humanidade inteira.
Pretende-se explicar a origem da acumulação por meio de uma
estória ocorrida em ,tlassado distante. Havia outrora, em tempos
muito remotos, duas espécies de gente: uma elite laboriosa, inteli-
gente e SObretudo econômica, e- uma· população constituída de
vadios. trapalhões que gastavam mais do que tinham. A lenda
teológica conta-nos que o homem foi condenado a comer o pão
com o suor de seu rosto, Mas, a lenda econômica explica-nos o
CAPITULO XXIV· motivo por que existem pessoas que escapam a êsse mandamento
divino. Aconteceu que a elite foi acumulando riquezas e a popula-
ção vaJia ficou finalmente sem ter outra coisa para vender além
da própria. _pele: Temos aí q~.cado_()!!g!nal rl:l!._J;conomia. Por
caU~a dêie. a grande massa é pobre e, apesar de se esfalfar, só
(em pMa vender a própria fôrça de trabalho, enquanto creSCe con-
A Chamada tinuamente a riqueza de poucos, embora tenham êsses poucos para-
do de trabalhar há muito tempo. Thiers. com tôda a untuosidade
pre~iúcncial, defende a propriedade. servindo aOs franceses, outrO·
Acumulação Primitiva ra tão espirituosos, essas puerilidades jnsulsas .. Mas, quando está
em jÔgo a questão da propriedade torna se dever sagrado a defesa
intransigente da doutrina infantil do abecedário capitalista. como
a única legítima para tôdas as idades e para todos os estágios de
desenvolvimento. lia.bjºQº-Wl~dç -papel ..de.se_l}1penl1~ºQ _ºª_ ver-
dadeiraJtist9x:i1L pela. conquista, pela escravizaç~.o._~lli_X:~08,. e
P.t!lo assassin.!lto,_€:.Il!_.s!l!l1_a._ pela. y'i?I~I1~~a=- Na suave economia po-
1. o SBodOO DA ACUMULAÇÃO PIuMITIVA lítica o idílio reina desde os primórdios. Desde o início da huma-
nidade. o direito é o trabalh~ são os únicos meios de ·enriqueci-
mento, excetuando-se naturalmente o ano corrente. Na realidade,
V lMOS COMO o dinheiro se transforma em capital, como ~t: (1S métodos da acumulação primitiva nada têm de idílicos.

produz mais valia com capital, e mais capital com mais valia. Ma, .. lO Como os meios de produção e os de subsistência. dinheiro
1.: mercadoria em si mesmos não s~ capital. Tem de haver antes
a acumulação do capital presst~ mais valia, .a mais valia ::L
.. l!ma ~~ que· s8 pode' ocorrer em determinadas cir-
produção capitalistli, e esta a_existência de grandes quantid<l~e\
<:unstâncias. Vejamos, logo a seguir, a que se reduzem, em suma.
de capital e de "fÔrça de trabalho nas mãos dos produtores de mer-
essas circunstâncias. Duas espécies bem diferentes de possuidores
cadori;s. Todo êsse movimento tem assim.a aparência de _U,-m. ..cfr - de mercadorias têm de confrontar-se e entrar em contactO: de um
culo vicios~'-doqual só J>2dt:rem_os.escap.a.r.~dmitindo uma acumu· . lado, o~rietário de dinheiro, de meios de produção e de meiQ~_
.. - 1~~~.~_P-I1ll1.itiva, -. a.ll_t~iI~r__ à. __ llc~\lll!Çãg_ .~_ap~talista _ ("prcvio~s \ I de subsistência, empenhado em aumentar a soma de valôres'que.·
accumulation", segundo Adam Smlth), uma !lcumulaça0 que nao I • [!()ssui, comprando a fôrça de trabalho alheia, e, do outro, os 'traba"
decorre do mo<!C? capitalista de produ'i..ão,. mas é seu 'ponto dc\ / 1!L1!~ores livres,' vepdedores da próp~ia fô.rça de trabalho e.......QQrtan.:-.
... partida. \ to, dfê...!I.~lIll!Q. Trabalhadores livres em dois sentidos, porque não

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são parte direta dos meios de produção, como escravos e servos, da indústria: só conseguiram expulsar os cavaleiros da espada, ex-
e parQ.ue não são donos dos meios de produção, como o camponês plorando acontecimentos para os quais em nada tinham concorrido.
autônomo, estando assim livres e desembaraçados dêles. Estabeleci- Subiram por meios tão vis quanto os empregados Outrora pelo
dos êsses dois pólos do mercado, ficam dadas as condições bási.c~ libe!1.0 romano para se tOrnar senhor de seu "patronus"$
.. c!.ã produção capjtalista. o sistema capital!~tl!..J>Eessl!Põ~" ~<fis~2cia-\ í Lo
processo que produz; (,) assalariado e o capitalista tem suas
ção entre os trabalhadorçs. e a propriedade dos meios peJos. .9.uais : raÍZes n~"!!!i~~() do trabalhador) O progresso consistiu numa
.. rêãifZãz:;;o"írãbaího. Quando a .produção capitalista se torna inde-·- metamorfose dessa sujeição, na transformação da exploração feu ..
Pe;d~gie.·..não se limita 8: manter essa dissociação, mas a reprodu~ , daI em exploração capitalista.' Para compreender sua marcha, não'
em escala cada vez maior.'G-processoque cria o sistema capitalista \ . ' / precisamos ir muito longe na história. Embora os prenúncios da
c_onsiste ape...nas. n. o _",o que retira 00. trabalhadora prORrie. i ~ ., produção capitalista já apareçam, nos séculos XIV e XV, em algu.
-.
capftal Os meios sociais de subsistência e os de produção e con-
verte em ãSsalaríados os produtõres" diretos. t}. chamada acúmul.a- ~
ção primitiva é apenas o· processo histórico qye dissocia o traba-
J
-º.ª,~e de .seu.s _~~ios de trabalno, uDL,.QJ.2ÇCSSG:i1J,le: rr~~sforma. em mas -cidades mediterrân~as, a era capitalista data do século XVI.
Onde. ela ..surge, a servidão já está abolida há muito ~ e já
.. estão em plena decadência as cidades soberanas que representam
o apogeu da Idade pMédia:
.. Ihador dos meios de produção]:e con'iideradr primitiva porque
Marcam ép<>~~"lla_~ist?rill daacull1ulilÇão. pri:ffiiti-..:llLtÔdas
~Qnstitui a pré-história do capital e do modo de produção capitalista. .~ transformações que servem de alavanca à classe capitalista.em
Ô estrutura econÔmica da sociedade capitalista nasceu da estrú- formalrão, sobretudo aqiléles deslocamentos de grãndes massas hu-
tma econÔmica da socjedade feudal. A decomoosição desta liberou .. manas, súbitae"víõlentamente privadas de seus meios de subsistên-
~ elementos para formação daquela. - - cia e lançadas no mercado de trabalho como, levas de prOletários
O produtor direto, o trabalhador, só pôde dispor de sua peso destituídos de direitos;, A expropriação do produtor rural, do caro-
soa d~is que deixou de-estar vincUlado à'-gleba e de ser escravo PQllês, que. Ji~a.. assim privado de suas ten:as.J. "~onstituLa base d~
cu serv~ de outra pessoa. Para vender livremente sua fôrça de .. todo o processJ;.' A história dessa expropriação assume coloridos
trabalho, levando sua mercadoria a qualquer mercado, tinha ainda diversos nos diferentes países, percorre várias fases em seqüên-
de livrar-se do' domínio das corporações, dos regulamentos a que cia diversa e em épocas históricas diferentes. Encontramos sua for·
elas subordittavam os aprendizes e oficil$ e das prescrições com .. ma clássica na Inglaterra, que, por isso, nos servirá de exemplo.~
que entravavam o trabalho. Dêsse modo, ~m <!<?~_ as~c::tQ~
movimento histórico que transformou os, p[Q<Ntm;:eL em assalaria-
do~. é a iibertàçJo "da servidão e da coerção corporativa; e ês!e
~~to- êü único que existe para "nossos historiadores -burgueses .. 2 FXp~.ºPªIAÇ~Q nos Ct.M,PONF5FS
Mas, ps que se emanciparam só se tornaram vendedores de si ines- -
mos depois que lhes roubaram todos os seus meios de produção
(; os privaram de tôdas as garantias que as velhas instituições feu- f Nos fins do século XIV, a servidão tinha desaparecido pràtica·
dais asseguravam à sua existência. E a história da expropriação lO mente da Inglaterra. Então e mais ainda no século XV, a imensa
to que sofreram foi inscrita a sangue e fogo nos_.:in.:lis .. dl!, .hllmanidade"
Os capitalistas industriais, isses novos potentados, tiveram de ® Senhor que libertou seu escravo,
Na Itália, onde a produção capitalista se desenvolveu mais cedo,
remover os mestres das corporações e os senhores feudais, que
J..SJ.l
ocorre também mais cedo a dissolução das relações de servidão, O
possuíam. o' domínio dos mananciais das riquezas. Sob êsse aspecto: servo italiano foi emancipado sem ter chegado a assegurar-se, por
rep~se11ta.se sua ascensão como uma luta vitoriosa contra o poder prescrição, de qualquer direito à terra. Sua emancipação transfdr-
feudal e seus privilégios revoltantes, contra as corporações e os moy-o· i!!!..e.q.!a..tlj.l11e!l:t.~._Ilum proletá,r:io _se.m _à.i.rgi,tos, quejIL.eru:g,ptrava
UOY.!ls..IH~l1hor~:L!\.§u5L.l:sperÂnas cid!idesque, emsua maioria, vinham
embaraços que elas criavam ao livre desenvolvimento da produção'-~ dos.. iempc:; dcs I.!llnaIlOS. Quando a revolução no mercado mundial
e à livre exploração do homem pelo homem. Todavia. os cavaleiros dest!·uiu. nos fms do século XV. fi suprf'macia comercial do nane da

830 fUi
11
maioria da populaçãol.ll consistia de campcneses proprietários,-
lt
repartição da terra pelo maior número possível de camponeses-:-\O
4 ual quer 4 ue fôsse o título feudal com que se revestissem seus·- poder do senhor feudal, como o dos soberanos, n~o- depende da
Jireitt)s de propriedade sôbre a terra que lavravam. Nos grandes magnitude de suas rendas, mas do número de seus súditos, ou me·
domínios senhoriais . .Q",,ba,ilill, ainda u.fi:! .servo, foi substituído pelo Ihor do número de camponeses estabelecidos em, seus domínios.ili)
arrendatário livre. Eram assalariados da agricultura os camponeses °
Embora solo inglês, depois da conquista normanda, se repartisse
que utilizavam seu tempo de lazer trabalhando para os grandes em baronias gigantescas, havendo casos de uma.só abranger 900
r.roprictários. e os assalariados propriamente ditos, uma classe in- antigos senhorios anglo-saxÔnicos, estava êle coalhado de sítios dos
dependente. relativa e absolutamente pouco numerosa. Mas êstes, camponeses, embora separados a espaços pelas gr!1ndes áreas senho-
aO mesmo tempo, eram de fato lavradores independentes. pois, além riais. Essas condições, juntamente com o florescimento das cidades,
do salário. recebiam uma habitação e uma área para lavrar de 4 característico do século XV, propiciavam ao povo aquela riqueza
e mais ~es. Demais, junto com os camponeses propriamente di- que o chanceler Fortescue descreve com tanta eloqüência em sua.
tos, dispunham do usufruto das terras comuns, on.d. e PiSt~. se( -,",) obra "laudibus Legum Angliae", mas excluíam a riqueza capitalista.
.. gado e de onde ..x:e.tiravanJ.. o.....combustivel, lenha, $urfIL~\!!H!i:n O prelúdio da revolução que criou a base~modo ca.p.i~a1ista ,,'
todos os países da Europa,i"! produção feudal se caracteriza pela ) li. de produção -ocõrreu nõUllliiiõt!i'Cõ"ãõ·-SécUto -. e nas primeiras I -,
décadas do século XVI.rcon:;LdissoluÇag: dasUMillf~P$fIlI~S,
Itália, surge um movimento populacional em sentido inverso. Os tn.- '~ é Jançada ao . mercado 'a'e tràtiâUio _uma massa,_º~_.proletários....)ie
ba.lhadores das cidades foram enXotados para os campos onde deram
um. impulso nunca. visto à pequena agricultura de hortas e jardiris. indivíduos sem direitos, que "por tôdaparte_ enchiam inu,tilmente
190 "Os pequenos proprietáriOS qúe cultivavam suas terras com as os solares", conforme observa acertadame~te Sir James Steuart. Em-
próprias mãos e fruiam um modesto bem-estar .... const1tuiam, em bora o poder real, produto do desenvolvimento burguês, em seu
comparação com os tempos atuais, uma parte muito mais importan- esfôrço pela soberania absoluta, acelerasse pela fôrça .a dissolucão
te da nação... Não menos de 160 000 proprietários, que com· SU3S
1 das vassalagens. não foi· de modo algum a causa única dela. Opou-
famil1as deviam representar mais de - - da população, .tiravam sua do-se arrogantemente ao Rei e ao Parlamento, o grande senhor feu-
'1 " dai criou um proletariado incomparàvelmente maior, usurpando as
subsistência de pequenas áreas das 'quais tinham li proprl""* alQ,- terras comuns e expulsando os camponeses das terras, os quais pos-
..d1il. Cada um dêSSes pequenos proprietários dispunha. de um rendi- suíam ~ireitos. sôbre elas,baseados, como os do próprio .se$()!,
mento médio estimado em 60 a '10 libras esterlinas por ano. Calculou-
se que o número daqueles que exploravam sua própria. terra. era nos mes~os institutos feudâis;Q florescimento da manufatura de
maior que o dos arrendatá.r1os que lavravam terra alheia." (Macaulay, • Jã, com a elevação conseqüente dos preços da lã, impulsionou direta-
"Hlst. of England", 10.- ed., Londres, 1854, I, págs. 333 e 334). Ainda mente essas violências na Inglaterra. A velha nobreza fôra devora-
no .último têrço .do .século XVII."- populaçãorural,mKl~~,_®.M~ituía da pelas guerras feudais. A nova era um produto do seu tempo, e,
4 para ela, g dinheiro era o poder dOs podêres. Sua preocupação,. por
_ _ da população total <1. c., p. 413). Cito Macauley porque êle-,
isso. era transformar as terras de lavoura em pastagens. Em sua
5
.procura reduzir a impo.rtância de fatos dessa natureza, com seu sJ.s. obra "Description of England. Prefixed to HoHnshed's Chronicles",
}e~a de falsificar a história. descreve Harrison como a expropriação dos pequenos camponeses
~ Nunca devemos esquecer que mesmo o servo, embora sujeito ao arruína o país. "Mas que importa isso aos nossOs grandes usurpado-
tributo de vassalagem, e.ra proprietá.rio do lote vmculacio à. sua habi- res!" As habitações dos camponeses e as choupanas dos trabalhado- .
tação e ainda co-proprietário das terras comuns. "Lá (na Silésia) o
camponês é servo." Não obstante, OS servos dessa provinda prussianr.
possuem ten:as comuns." Não se pôde até agora induzir os sileslanos @> Q Ja*., com ~u sistema. puramente feuda.l de propriedade das
a repartirem as terras comulls. Entretanto, na nova Marca não terras e de peque.nas emprêsas agr1co!as desenvolvidas, oferece um
existe uma. aldeia onde não se tenha efetuado essa repartição com quadro muito mais fiel da Idade Média européia do que todos os
o maior sucesso" (Mirabeau. "De la Monarchle Prussianne", Londres, nossos livros de história, dominados em sua maioria por preconceitos
1788, t. n. pá.gs. 125 e 126). burgueses. li: multo fácil ser liberal às custas da Idade Média.

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res foram violentamente demolidas ou abandonadas à decadência
pelo menos 20 acres de terra. Renova-a Henrique VIII. no anl) 25
fotal. de seu reinado, com outra lei -onde se lê:

"Quando confrontamos", diz Harrison, "os velhos inventá-


rios dos senhorios, verificamos que desapareceram inúmeras casas "l\(uitos arrendamentos e grandes pastagens, especialmente
e pequenas lavouras, de modo que a terra alimenta muito menos de ovelhas, estão concentrados em poucas mãos; por isso, muito
o gente, mwtas cidades decaíram, embora floresçam algumas DO- aumentou a renda da terra, decaindo a lavoura; casas e igreja,
vas .. , Poderia falar de cidades e de aldejas, transformadas em
pastos de ove!1w e onde apenas se encontram as mansões senho-
• foram demolidas, e um número imenso de pessoas ficaram impe-
didas de prover seu próprio sustento e de suas famílias".
riais. ».

A lei determina a reconstituição das culturas e, de suas ins-


Aquelas velhas crônicas exageram as queixas, mas traduzem talações, fixa a relação entre área de lavoura e área de pastagem
exatamente a impressão causada. sôbre OS contemporâneos pela re- etc. Lei de 1533 deplora haver propnetános "pOSsumdó "24lmt\
volução nas condições de produção. Uma comparacão entre as oU ovelhas e limita o número destas a 2.000 por proprietário.® As
dos chanceleres Fortescue e Thomas Moros revela o abismo que queixas populares e _ªsJ~is qu~,"a_.pª!'tir_~_l!~nrique VII, durww
separava os séculos XV e XVI. A classe trabalhadora inglêsa foi J 50 anos, se _destinavam a coibir a expropriaçã() _c!()!l"pequ~nos !!!-
lançada, sem transições, da idade de ouro, na expressão acertada rendatlÍ.~i()s e dos C::~P<>l1eses, Ilã~ _ª!.i!!8!f.ªm a nenhu_m resultado
de Thornton. para a idade de ferro. Px:á~ Sacon, sem o saber, revela-nos o segrêdo dessa ineficácia,
Essa revolução fazia estremecerem os próprios legisladores. em seus "Essays, Civil and Moral". seção 29.
Não tinham chegado ainda àquele nível de civilização em que a
riqueza nacional, isto é. I formação de capi~ a exploração im-
piedosa e o empobrecimento' da m·...' pQpUlar. constitui a reriR "A lei de Henrique VI!", diz êle, "era profunda e digna dt'
última da sabedoria política. Em sua hist6ria de Henrique vn. admiração, ao criar lavouras e casas de lavradores, de determi-
diz Saeco: nado padrão, isto é; ao garantir aos lavradores área· que lhes per-
mita colocarem no mundo súditos com recursos suficientes e não
sujeitos à condição servil, pondo assim o arado em mãos de pro-
''Nessa época (1489) aumentaram as queixas sabre li trans- prietários .e não de mercenários. "@
formação de terras de lavoura em pastos" (para ovelhas etc.).
"para os quais bastavam poucos pastóres; e áreas arrendadas por
tempo indeterminado, por ano ou vitaliciamente, das quais vivia @ Em sua "Utopia", Thomas Morus fala de um pais singular em
grande parte dos ~vradores independentes (yeomen), transfor- que "as ovelhas devoram os sêres humanos" ("Utooia", tradução de
maram-se em terras ocupadas pelo senhorio. Isso prowcou deca- RlLbinsõn, ed. Arber-;-Londres, 1869, p. 41). -
(;.9.3.'9 Bacon analisa a relação existente entre WIl_ª classe..liYE e -ªbas-
dência. do povo e em conseqüência. decadência de cidades, igre- JII,5ia de camponeses e uma bºªjJ:;'~Ataria. "Era da maior importância.
jas, queda de dírunos. .. Foi admirável 11 sabedoria do Rei e do para o poderio e a manutenção do reino, terem os arrendaniento~
Parlamento aplicada, nessa época, à cura dêsses males... Ado- área suficiente para manter homens capazes a coberto de necessidades.
taram 'medidas contra a usurpação das terraS comuns, que provo- e serem as terras do reino, em grande parte, ocupadas pela XGQIDfIPry
cava o despovoamento. e contra a expansão das pastagens. que uma classe de pessoas situadas no meio, entre nobres, de um lado. l'
produzia os mesmos ~itos." agregados e braceiros, do outro ... ll: o!Jiniáo geral dos que mais en-
tendem da arte da guerra ... que. a principal fôrça de um exército está
na. infantarla, nos que combatem a pé. Mas para formar uma boa in-
Em 1489, lei de Henrique VII, capítulo 19. proibia a demoli- fantaria, são necessárias peEsoas que tenham crescido não em condi-
• ção de tôdas as casas de camponeses às quais estivessem vinculados ções servis ou de indigência, mas livres e com certo bem-estar. Quan-
do um estado favorece exageradamente os nobres e 9;5 gentis-homens.
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Mas, o sistema capitalista exigia. ao contrário. a subordinação LJ10s bens da Igr~ia que_J~.~~'?.mpanhQ..u. À época_ da .. n:f()!'!Jla: _a
servil da massa popular, sua transformação em mercenários e a Igreja Católica era .propri~tária feudal de grande parte do solo
conversão de seu instrumental de trabalho em capital. Duranle êsse ~. A supressão dos conventos etc. enxotou os habitantes de
- período de transição, a legislação procurou manter o lote de 4 ~, suas· terras, os quais passaram a engrossar o. oroletariado. Os bens
acres junto à choupana do trabalhador agrícola, e proíbiulhe nela eclesiásticos foram amplamente doados a vorazes favoritos da Côr-
.abrigar inquilinos. Ainda em 1627, no reinado de Carlos l. Roger te ou vendidos a preço ridículo a ·especuladores, agricultores ou
Crocker de Fontmill foi condenado p<>rteL~ons~uíd'? .. ~ma c~ burgueses, que expulsaram em massa os velhOs moradores heredi-
p'ara lavrador no seu feud()~_em acrescen~ar-Ihe. em caráter per- tários e fundiram seUs sítios. O direito legalmente explícito dos
manente, uma área de 4.l!-cres; ainda no reinado de Carlos I, em lavradores empobrecidos a uma parte dos dízimos da Igreja foi
1638, foi nomeada uma comissão real encarregada de impor a confiscado tàcitamente. 195 "Pauper ubique jacet"I exclamou a rai-
aplicação das velhas leis, notadamente com relação a essa área nha Elizabeth após uma viagem através da Inglaterra. No ano 43 '
de 4 acres, e Cromwell proibiu que se construíssem, na periferia de seu reinado, foi o govêrno por fim compelido a reconhecer
de Londres até 4 milhas da cidade, casas que não estivessem do-
oficialmente o pauperismo .... introduzindo .9 impôsto de ~stência
tadas de uma área adicional de 4 acres. Ainda na primeira metade .aos pobres. . __--
do século XVIII, ouvem-se queiXas quando a choupana do traba-
lhador não dispõe de um terreno anexo de 1 a 2 acres. Hoje em
.dia, êle se considera muito feliz se ~ua habitação dispõe. de ug2 "Os autores dessa lei não ousaram apresentar as razões dela,
pequeno jardin!..OJl_i!ºn~!Ult() à sua habitação ou se pode ar- e, contra tôda a tradição, trouxeram-na ao mundo sem qualquer
rendar um lote de teITl~, Ü!WUtiang. .-/. ' exposição de motivos",l98 .

"Os senhorios e os arrendatários" diz doutor Hunter, "agem


em conjunto. Poucos acres junto à cho~na tornariam o traba- . Tornou-a definitiva a lei n. o 4, do ano 16, do reinado de Car-
lhador demasiadamente independente". ~ los I, e só veio a ser modificada em 1834. quando foram adotadas
prescrições' mais severas. 197 Mas, a Reforma ainda teve outros efei-
o plOCessO violento de e~~ .áD..~.\'!Lr~f~beu um
• ( terrível impulso, no séCülo XVI,_colll a Reforma. e. oime1l:s~.sª~ue
I
195
"O pobre está prostrado por tMa parte."
"0 direito dos pobres a uma parte dos dizimos da Igreja esti
\~ fixado nos velhos estatutos" (Tuckett, 1. c .• v. lI, pága. 804 e 8(5) •
enquanto os lavradores não D!I.SS9.m. de trabalhadores e criados a 196 William CObbett, "A Hlstory of the Protests.nt Reformation,"
serviço dêles, ou. de agregados, Isto é, de indigentes que moram em § 471.
seus dom1nlos senhoriais, pode-se ter uma boa cavalaria, mas nunca 197 O esptrito protestante se retrata bem no seguinte caso. No sul
se terá uma infantaria resoluta ... ll: o que se vê na França e na Itá- da Inglaterra; proprietários de terras e arrendatários abllliltados se
1111. e em. outros paise.s estr~ng-eiros onde só se encontra a nobreza, reuniram e formularam 10 qUt!litões Sóbre a interpretação li. ser dada.
{fc um lado, e. do outro, camponeses miseráveis. Dêsse mOdo, são à lei de assl.!!itência. &OS pobres de Elizabeth, IIUbmetelldo-:as 8.0 pare-
êsBes paises obrigados a empregar mercenários suíços e de outras cer de um célebre jurista da época, Sergeant Srugge, que foi nomeado
proce.dências. Vê-se por ai que essas nações possuem muita gente e juiz no reinado de Jaime I. "Nonaquest:ão: Alguns dos riCOI!I arren_
poucos soldados" ("The Reign of Henry VII etc. Verbatlm Reprint eb-tários da paróquia imaginaram um método engenhOso com o qual
from Kennet's England, ed. 1719", Londres, 1870, p. 308). se pode afastar todas as confUSões que ocorrem na. a.pllc&çl.o da le.t.
~ nr. Hunter. 1. c.. D. 134. - "A auantidade de terra que era Propõem que se construa uma. cadeia. na. paróquia.. sen. negada. qual-
atribuída aos trabalhadort!li" (nas velhas leis) "seria. hoje considera- quer· ajuda 8.0 pobre que nela não. se deixar encarcerar. Entio toda.
da grande demais e suscetível de convertê-los em pequenas agricul- 11. v1zinhBnça será avisada. de que qualquer pessoa que queira &lugar
tores" (George Roberts, "The Social H!story of the People oLtD.e 011 pobres dessa parõquia deve apresentar propostas 1&cradaa, num
Southern Counties --ºL-EnKland In l!.ML&entunes". Londres, 1850. dia determinado, fl.xa.ndo o menor preço pelo qual ficaria. com êles.
p. 184). Os autores désse plano IIUpõcm mst1rem. nos condados próxl.mol pes_

836 837
tos mais poderosos. A propriedade da Igreja constituía o baluarte ~ yeomanry~,,-! .. ~, . .n~. últimas décadas do séculoxvm,. OS ves-
religioso das antigas relações de propriedade. Ao cair aquela. estas " tígios que ainda restavam da propriedade -éõDilÍiiàfdÕs .. lavradorC$.
Deixamos de lado as fôrças motoras puramente econômicas da
não poderiam mais se manter~198
Ainda nas últimas décadas do século xvn, a yeomanry, uma . revolução agrícola, e estamos nos ocupando apenas dos meios coer-
• classe de camponeses independentes. era mais numerosa que a dO!l civos utilizados para promovê-la. /
arrendatários. Constituíra a principal fôrça de Cromwell e, segundo Com a restauração dos Stuarts, os proprietários das terras,
reconhece o próprio Macaulay, contrastava vantajosamente com os • utilizando processos legais, levaram a cabo uma usurpação como
fidalgotes beberrões e seus lacaios, os párocos de aldeia, que ti. a .que se efetivou depois no Continente, mas sem qualquer forma-
nham de arranjar casamentos para as criadas preferidas dêsses . lidade jurídica. Aboliram as disposições feudais relativas ao solo.
gentis-homens. A essa época, os trabalhadores rurais ainda eram Transferiram para o estado deveres que estavam vinculados à pro-
• co-proprietários das terras comuns. ~or volta de 1750 desaparecera priedade do solo, "indenizaram" o estado com tributos incidentes
sabre os camponeses e sabre o resto do povo, submeteram ao re-
gi~ da moderna propriedade Drivada os bens em relação llQ.!.
soas que gostariam de viver sem trabalhar, mas não podem realizar quais possuíam apenas título feudal, e Impuseram, por fim, aque-
seu desejo por não disporem de recursos ou crédito suflciente para
arrendar terras ou conseguir um barco. Elas estariam Inclinadas a las leis de domicílio que,. com as variações impostas pelas cir-
fazer propostas vantajosas à paróquia. Se pobres morrerem aos cuida- cunstâncias. tinham sôbre os lavradores inglêses os mesmos efei-
dos do contratante, a fa.lta. recairá. sóbre êle uma. vez que a paróquia tos que o edito do tártaro Boris Godunow sabre os camponeses
já terá. cumprido seus deveres em reJ.a.çio a. êles. Receamos que a
lei em vigor, do a.no 43 de Elizabeth, não permita uma. solUção pru- russos.. '.,
dente como a. que estamos imaginando. Informamos-lhe, entretant{), A "gloriosa revolução" trouxe ao poder, com Guilherme lU',
que os demais proprietários alodials dêsse condado e dos adjacentes de Orange,200 os proprietários da mais valia. nobres e capitalistas.)
se juntarão a nós para. levar seus representantes na Câmara dos Inauguraram a nova era em que expandiram em escala colossal oS
Comuns a propor uma. lei que permita o enca.rcera.mento e o traba- , roubos às terras do estado, até então praticados em dimensões mais
lho compulsório dos pobres, de modo que ficará sem direito a qual- modestas. Essas terras foram presenteadas, vendidas a preços ir-
quer awdl.io aquêle que se opuser ao encarceramento. Com Isso. es-
peramos que pessoas na miséria se !!!.hstenbam de requerer socorro"
(R. Blali:ey, "The Hlstory ofPolitlcs.l Literature from the earllest 1" "A Letter to SIr T.C. Bunlrury, :art.: On the Rlgh Price of
times," Londres. 1855, v. n, págs. 114 e 85). Na Escócta. a S(>.rvidão Provfsions. Bf a SuffoIk Gentleman," Ipsw1ch 1'l95, p. 4. Mesmo
fol abolida séculos depois de ter sido ellmina.da na Inglaterra. Em defensor fanático do siStema de grandes arrendamentos. diz ri:
1698, declarava. Fletcher de Saltoun no Parlamento escocês: "E esti- ArbuthnotJ, autor do "Inqulry Into the Connectlon of large fuma
mado em pelo menos 200 000 o número de indigentes da Escócia. etc .... Londres, 1m, p. 139: ''Deploro a perda de nossa yeomanry,
Republicano por princípio, só vejo um remédio para essa situação: ·aquela classe de homens que suate.ntavam. na realidade, a indepen-
restaurar a velha servidão e transformar em escravos todos os que dência desta nação; e lamento ver suas terras, agora nas mãos mo-
sejam incapazes de prover a própria subsistência." No mesmo sentido nopolizadoras dos lordes, serem arrendadas a pequenos lavradores
escreve Eden, 1. c., v. r, cap. r, págs. 60 e 61: "O pauperismo surge em condições parecidas com as de va&Is.los que têm de atender a
• com a liberdade do lavrador... As manufaturas e o comércio são chamados em tMas as ocasiões criticas."
os pais dos nossos pobres." Eden comete o mesmo érro daquele 200 Ilustra a moral privada. dêsse heróI. burguêls o segumte: "As
It escocês, repUblicano !XJf principio, pOis o lavrador se torna proletá- grandes concessões de terras feitas a Lady Orimey na. Irlanda, no
rio oU indigente não por ter sido eliminada a servidão. mas por ter ano de 1695, são uma derr;onstração pública da afeição do rei e da
Sido suprimida a propriedade que tinha do solo que cultivaV'd. - influência -da lady ... Os serviços va.liosos de La.dy Orlmey consisti-
Na França onde a expropriação seguiu outro processo, a ordenança . ram, conforme é sabido, ém "foeda ·labiorum m1n1sterla.", os sujOS
de Moulln de 1566 e o edito de 1656 correspondiarn à.s leiS inglêsas serviços dos lábios. Extraído do "Sloane Manuscrlpt Collection", que
de assistência aos pobres. se encontra no Musea Britânico, n. 4224. Titulo do manus.crito: '''l''he
1118 Professor Rogers, embora tivesse eXerCido a cátedra de. econo- charakter and behavlour of K1ng W1l1iam. Stmderland etc. as repre-
mia POI!tica da Universidade de Oxford, o foco da ortodoxia protes- sented in 0rlg1ns.l Letters to tbe Duke of Shrewsbury frem Somers,
tante, acentua, em seu prefácio à. "History of Agrlculture." a paupe- Hs.l1fu:, Oxford. Secre.ta.ry Vemon etc." Está cheio cf!, coisas eurio-
rlzaçã.o da massa do povo pela reforma. na.

838 839
risórios, ou simplesmente roubadas mediante anexação direta a .independentemente seus pequenos métodos particulares. 20!\ O roubo
propriedades particulares.:!ol Tudo isso ocorreu sem qualquer obser- assume a forma parlamentar que lhe dão as leis relativas ao cerca-
vância da etiquêta legal. Essa usurpação das terras da COroa e o o mento das terras comuns, ou melhor, os decretos com que os se-
saque aos bens da Igreja, quando os detentores dêstes bens saquea- \. nhores das terras se presenteiam com os bens que pertencem ao
til d.os não os perder:am na revolução republicana, constituem a ori~ povo, tornando-Os sua propriedade particular, decretos de expro-
-gem dos grandes domínios atuais da oligarquia inglêsa.~O!l Os capi- priação do povo. Sir F. M. Eden se contradiz, em sua cavilosa
talistas burgueses favoreceram a usurpação, entre outros motivos, argumentação jurídica: configura na propriedade comunal a pro-
para transformar a terra em mero artigo de comércio, ampliar a priedade privada dos lordes latifundiários sucessores dos lordes feu-
área da grande exploração agrícola, aumentar o suprimento dos dais, e, ao mesmo tempo, pleiteia "lei geral do Parlamento para
roletários sem direitos. enxotados das terras etc. Além disso, a ,cercar as terras comuns". admitindo, portanto, ser necessário um
nova anstocracla das terras era a ãliada natural da nova banco- golpe parlamentar para transformá-las em propriedade privada. E
continua a contradizer-se, ao oedir ao legislador uma indenização
cracia, da alta finança que acabara de romper a casca do ôvo e da
para os pobres expropriado~
burguesia manufatureira que dependia então da proteção aduaneira.
9s yeqmen, os abastados camponeses independentes, joram
A burguesia inglêsa defendia seus interêsses tão acertadamente substituídos por pequenos arrendatários, com contratos anualmen-
quanto os burgueses suecos que, ao contrário, solidários com seu .. te rescindíveis, gente servil, dependente do arbítrio do grande pro-
baluarte econômico, os camponeses, apoiaram os reis na SUa re- prietário. Demais, o roubo sistemático das terras comuns, aliado
tomada violenta dos bens da coroa que se encontravam em mãos ao furto das terras da Coroa, contribuiu para aumentar aquêles
da oligarquia, luta que começou em 1604 e prosseguiu com Car- grandes arrendamentos, chamados. no século XVIII, de fazendas
los X e Carlos XI. ge capital205 ou fazendas comerciais,2fl6 e que tornavam a popula-
A propriedade comij.na!, isto é, as terras comuns. ahsolut;--·'\ ção agrícola disponível para a indústria.
• mentê diversa da propriedade da Coroa ou do estado. da qual fala- i O século XVIII não reconhecia ainda, na mesma extensão
mos, era uma. velha instituição germânica. que continuou a existir ~ .. que o XIX, a identidade entre riqueza nacional e pobreza do povo.
sob cobertura feudal. Conforme vimos, a violência que se a~senho­ Daí as polêmicas mais violentas na literatura econômica daquela
reia das terras comuns, seguida em regra pela transformação das época sôbre "o cercamento das terras comuns", Do abundante ma-
lavouras em pastagens, começa no fim do século X V e prossegue terial disponível sôbre a matéria apresento algumas passagens que
no século XVI, Mas, então, o processo se efetivava por meio da proporcionam uma impressão viva do que aconteceu.
" violência individual, contra a qual ,a legislação lutou em vão du-
rante 15Q anos O progresso do século XVIII consiste em ter.Lar- 2«! "Os arrendatários profuem aos que moram na área. arrendada.
manterem em suas habitações qualquer ser vivo além dêles, sob o
nado a própria lei o veículo do roubo das terras pertencentes ao pretexto de que, se êsses moradores tiverem gado ou aves, irão cevá-
.. 'po~, embora os grandes arrendatários empregassem simultânea e los com alimento furtado do celeiro. Os. arrenda.tários .dizem que 08-
moradores têm de ser pobres para trábalhar ativamente. A verdade.
·eritretanto. é que os arrendatários usurpam. por ésse modo, todos 08-
201 "A alienação ilegal dos bens da coroa, por venda ou por doação, direitos que os trabalhadores têm às terras comuns" (UA Political En-
constitui um capítulo escandaloso da história inglêsa ... uma. fraude quiry roto the Conse4uences of enclosing Wllste Lands" , Londres,
gigantesca contra a nação" (F. W. Newman, "Lectures on PoliticaI 1785, p. 75).
Econ.," Londres, 1851, págs. 129 e 130,. - (Quanto a pormenores @Eden, 1. C., Prefácio, [págs. XVII e XIX].
sÔbre a mane1rà como os atuais grandes proprietários de te.tT!!S se 205 "Capital farms." (UTwo Letters on the F10ur Trade a.nd the
apoderaram delas, vide "Qur OId Nobllity. By Noblesse ObJ.ige". de Dearness of Corn. By a Persan 1n Business", Londres. 1767, pâ.gs.
[N. H. Evansl, Londres, 1879. - F.E.) 19 e 20>-
202 Vide. por exemplo, o panfleto de E. Burke sôbre a c8sa. duca.l 20e ''Merchant-farms''. ("An Inqu1ry into the Present High Priceil
de BE'dford. Seu descendente é Lorei .Iohn Russell, "o cha.pim (tomt1t) of Provisions", Londres, 176'7, p. m, Nota). Essa obra excelente. que
do liberalismo". apareceu anOnimamente, é da autoria do Rev. Nathaniel Forster.

840 841
"Em muitas paróquias de Hertfordshire", escreve uma tes- se mantêm e sustentam suas {amilias com o produto da terra qu,"
temunha indignada, "24 arrendamentos, cada um com 50 a 1!50 ,cultivam, com as ovelhas, aves, parcos etc. que criam nas terras
acres em média, foram fundidos em 3 apenas". Em Northanip- "comuns, precisando poucas vêzes de comprar meios de subsistên-
tonsbire e Lincolnshire, cercaram as terras comuns na mais am- cia") "serão transformados em pessoas que terão de ganhar a vi-
pla escala e a maior parte dos novos senhorios daí surgidos estão ,da trabalhando para os outros e forçadas a ir ao mercado para
transformados em pasta.gens; por isso, muitos senhorios não têm .. comprar tudo de que precisam ... Haverá talvez mais trabalho,
50 acres arados onde existiam antes 1 500... Ruínas' de antigas pois a coação será maior... Aumentarão as cidades e as manu-
habitações, celeiros, estábulos etc." são os únicos vestígios dos faturas, pois mais gente afluirá para elas procurando emprêgo.
antigos habitantes. "Em muitos lugares, centenas de casas e fa- il:ste é o sentido em que o açambarcamento das terras naturalmen-
mílias foram reduzidas... a 8 ou 10... Os proprietários das ter- te atu~em que, há muitos anos, tem realmente atuado neste
ras, na maioria das paróquias onde o cercamento foi introduzido reino'~ .-f!,
há 15 ou 20 anos. são hoje em número bem menor em relação aos
que existiam antes. Não é raro ver 4 ou 5 ricos criadores que re-
centemente usurparam e cercaram terras que se encontravam em Resumindo os efeitos do cercamento, diz êle:
mãos de 20 a 30 lavradores arrendatários e outros tantos peque-
nos proprietários e colonos. !sses lavradores e suas famílias fo-
ram enxotados dos bens imóveis que possuíam, juntam~ com "De modo geral, a situação das classes inferiores do poyo...
muitas outras famílias que empregavam e mantinham'~ piorou em todos os sentidos: os pequenos proprietários de terra
e os pequenos arrendatários foram rebai.xados à condição de jor-
naleiros e assalariados, e, ao mesmo tempo,~ tomou mais difícil
o lorde latifundiário vizinho, sob o pretexto de cercamento. para êles ganharem a vida nessa situação'~..
• não anexava apenas a terra inculta, ma~ muitas vêzes a cultivada
em comum ou mediante arrendamento à comunidade.

"Falo aqui do cercamento dos campos e terras abertos que já


estão cultivados. Até os defensores do cercamento admitem, nes-
, . ~
~ L.
A usurpação das terras comuns e a revolução agrícola que a
acompanha agravaram de tal modo a situação do trabalhador agrí·

L. C.; págs. 14'7 e 148.


C., págs. 159 e 160. ,Lembra a velha. Roma. "Os ricos tinham
se caso, que êle uumenta o monopólio das terras, eleva os preços ..se apossado das telTas comuns. Confiando nas circunstâncias do
dos meios de subsi~ttlncia e produz o despovoamento... e mes- '. tempo, achavam que elas não lhes seriam retomadas, e por isso com-
mo o cercumento de terras incultas, como atualmente se pratica, ~V'IIim os lotes dos pobres nas proximidades, empregando a persua.-
rouba aos pobres parte de seus meios de subsistência e amplia as são' ou a violência. Dêsse modo, transformaram suas propriedades
em vastos domínios. Precisavam então de escra.vos para a lavoura
áreas arrendadas que já são grandes demais'~ "Se", diz dou- e para a pecuária, pois as pessoas livres foram retiradas do trabalho
tor Price, "tõdas as terras caírem nas mãos de alguns poucos gran- . para o serviço militar. Trazia-lhes grande lucro a propriedade de
.. des arrendatários, os pequenos lavradores" Çsegundo êle os defi- ';., escravos, pois êstes, isentos do serviço militar, podiam se multiplicar
ne, "uma multidão de pequenos proprietários e arrendatários que ,livremente, produzindo muitos filhos. Assim, os poderosos apodera-
..ram-se de tôda a riqueza e todo o pais estava cheio de escravos. Os
Halos, entretanto, foram sendo reduzidos, dizimados pela pobreza"
~Oi Thomas Wrlght, "A short address to the Public on the Mono- pelos tributos e pela gue.rra. Nas épocas de paz eram condenados à
poly of la.rge farms," 1779, págs. 2 e 3. completa inatividade, pois a posse das terras estava com os ricos
~ Rev. Addington, "Enqulry into the Rea.sons for or against en- e êstes não pl'ecisavam para a agricultura, de pessoas livres mas de
closing open fields", Londres, 1772, págs. 37 a 43 passlm. escravos" (Aplano, "Guerras Civis Romanas", l, 7). Essa passagem
~ Dr. R. Price, I. c., v. lI, págs. 155 e 156. Veja Forster, Adding- se refere ao tempo que precedeu a lei licinia. O serviço militar que
ton, Kent, Pl'ice E' James Anderson, e compare o que escrevem com tanto acelero", a decadência da plebe romana, foi o principal meio
a pobre tagarelice do sicofanta MacCulloch em seu catálogo "Thc utilizado por Carlos Magno para ,transformar os livres campones~
Llterature of Polítlcal Economy", Londres. 1845. germânicos' em servos e vassalQIL.

842 843
cola que, segundo o pr6prio Eden, seu salário, entre 1765 e 1780, XVI a proporção mudou. havendo i acres de pastagem para ·2 dt'
começou a cair abaixo do mínimo e a ser complementado pela tImu de laVoura; mais tarde. 2 acres de pastagem para 1 acre
assistência oficial aos indigentes. Seu salário, diz êle, "bastava ape- de terra de lavoura, até que fmaImente se
fixou a justa propor-
nas para as necessidades absolutamente indispensáveis:. ção de 3 ~ para 1",
Ouçamos ainda um defensor do sistema de cercamento e
adversário de doutor Price.
No século XIX. perdeu-se naturalmente a lembrança da 00-
• nexão que existia entre agricultura e tem. comUDal. Para não falar
"Não é licito concluir que exista o despovoamento por não de tempos mais próximos, perguntariamos que indeDizaçio recebeu
haver mais gente trabalhando em campos abertos,.. Quando os a popuIaçio dos campos quando, entre 1810 e 1831, foi espoliada
pequenos lavradores se transformam em pessoas que têm de tra- • em 3. S11 .770 acres de terras comUIIS, com os quais, através do
balhar para os outros, mobiliza-se mais trabalho, uma vantagem 'Parlamento. os landIords presentearam os laDdJ.ords?
que a nação'~ (à qual naturalmente não pertencem aquêles lavra-
dores) "86 pode receber com agrado. ,. O produto é maior quan- [p último srande ~- de expropri~o dos camponeses é
do o traba1ho conjunto dêles se emprega num s6 arrendamento. finalmente a chamada limpeza das propriêadêS, a qual consiste
Forma-se assim produto excedente para as manufaturas, toman- em varrer destas os sares hWlWlOSJTodos os métodos ingleses até
do-se estas uma das minas de ouro dêste país, expandindo-se na agora observados culminaram nessa "limpeza". Conforme vimos
proporção da quantidade produzida de cereais".212 anteriormente, ~ descrever as condições modernas em que não
há mais campóneses independentes para enxotar, a limpeza pros-
SCiJUe para demolir as choupanas, de mod~ que os trabalhadores
A serenidade estóica com que o economista político presen- agrícolas não encontram mais na terra que lavram o espaço ne-
cia as violações mais cínicas do "sagrado direito de propriedade" cessário para sua propria babitação.~Mas li "limpeza das proprie-
e as violências mais contundentes contra as pessoas, desde que dades", no seu verdadeiro sentido, vamos encontrar mesmo 'Da re-
necessárias para estabelecer as bases do modo capitalista de pro- gião dileta da literatura novelesca moderna, a Esc6cia serrana. A
.ducão, encontramos configurada, por exemplo, no conservador e operação l_á. se destaca pelo caráter sistemático, pela magnitude
filantropo Sir F. M. Eden. Tôda a série de rapinas. horrores e da escala em que se executa de um só golpe (na Irlanda, houve
tormentos do povo, que ' acompanham as expropriações violentas proprietários que demoliram várias aldeias ao mesmo tempo:' na
do último têrço do, século XV aos fins do século xvm servem Esc~ia, houve casos de áreas do tamanho de ducados alemães),
apenas para levá-lo a essa "reconfortante" reflexão final: e finalmente pela forma peculiar da propriedade que é usurpada.
Os celtas da região montanhosa da Escócia estão organizados
em clãs, cada um dêles proprietário do solo que ocupa. O represen-
"A proporção adequada entre as terras de lavoura e as de
pastagem tinha de ser estabelecida. Ainda no decurso do século
tante do clã, seu chefe ou "grande homem", era apenas o proprie·
XIV e na maior parte do século XV, havia 1 acre de pastagem . tário titular· dêsse solo, como a Rainha da Inglaterra é a proprie-
para 2, 3 e até 4 acres de terras de lavoura. Em meados do século tária titular de todo o território inglês. Quando o govêrno inglês
conseguiu acabar com as guerras internas dêsses "grandes homens"
21~ [J. Arbuthnotl "An Inquiry fito the Connection between the e com suas incursões contínuas às planícies da Baixa Escócia, não
present Prices of Provisions etc.", pá.gs. 124 e 129. O~rvação se- renunciaramêles ao velho ofício de bandoleiro; mudaram apenas
melhante, mas de tendência oposta: "Os trabalhadores são expulsos a forma. Por conta própria, transformaram seu direito ntularao_.
de suas habitaçõe.s e forçados a procurar oeupação nas cidades; mas. solQ e~ direito d.ULo..p.rledª-º~...,Pri.vada. e, como encontrassem re·
obtém -se, então,' um excedente maior, aumentando assim o capital"
e[R. B. See1ey, 1 "The PerUs of the Nation", 2." ed .• Londres. 1843. sistência--iiõSlile"mbros do clã, resolveram enxotá-los com o em
p. XIV). prêgo direto da violência.

844 .'<45
"Um rei da Inglaterra poderia. com o mesmo direito, em pastagem de ovelhas todo o condado cuja população já fôra
pretender lançar seus súditos ao mar", reduzida antes, por processos semelhantes, a 15.000 habitantes.
De 1814 a 1820, êsses 15.000 habitantes, cêrca de 3.000 famí-
diz professor Newman.:l 1:l Essa revolução. que começou na Escócia lias, foram sistemàticamente enxotados e expulsos. Tôdas. as suas
depois do último levante dos partidários do pretendente à Coroa aldeias foram destruídas e reduzidas a cinzas, tôdas as suas lavou-
da Inglaterra, pode ser acompanhada em suas primeiras fases, atra- ras convertidas em pastagens. ~ldados britânicos intervieram para
vés de Sir James Steuart!!14 e James Anderson.!!lr. No século XVIII, executar a expulsão e entraram em choque com os nativos. Uma
foi proibida a emigração dos gaélicos expulsos de suas terras, a fim velha mOrreu no meio das chamas de sua cabana.. que se recusara
de tangê-los compulsoriamente para GIasgow e para outras cidades a abandonar. Assim, apossou-se essa fidalga de 794.000 acres de
industriais,216 Para ilustrar o método dominante do século XIX 217 terra que pertencia ao clã, desde tempos imemoriais. Aos aborí-
basta citar as "limpezas" levadas a cabo pela duquesa de Suther- gines expulsos mandou que se localizassem em 6.000 acres da orla
land. Econômicamente instruída, resolveu. ao assumir a direção mantima a 2 acres por família. &ses 6.000 acres tinham permane-
de seus domínios, empreender uma cura radical, transformando cido incultos até então, sem propOrCionar qualquer renda. Em sua
fidalguia.. a duquesa foi ao ponto de cobrar 2 xelins e 6 pence
de renda em média por acre, a ser paga por membros do clã, que,
213 "A kl.ng of England mlght as well clalm to drive 1ús subjeets
lnto the sea." (F. W. Newman, 1. C., p. 132). há séculos. tinham vertido seu sangue em defesa de seus nobres
214 Diz Steuart: "A renda dp.8SaS terras" (confunde, errOneamente
antepassados. Ela dividiu tôda a terra roubada ao clã em 29 gran-
essa categoria econõmica com o tributo que os taksmen, os vassalos. des arrendamentos para criação de ovelhas, cada um habitado ape-
pagam ao chefe do clã) Ué insignificante em relação a sua extensão. nas por uma famílià, em regra oriunda da criadagem dos arrenda-
Mas, se comparamos o número de pessoas alimentadas pela terra, tários ingleses. Em 1825, os 15.000 aborígines gaéticos estavam
veremos que uma propriedade da região montanhosa escocesa sus,.
tenta, talvez, dez vêzes mais gente que outra do mesmo valor nas substituídos por 131. 000 ovelhas. Os que foram lançados na orla
provincias mais férteis" (1. c., v. I, cap. XVI, pág. 104). marítima procuraram viver de pesca. Transformaram-se em anfí-
216 James Anderson. "Observations on the means of exelting a bios e, na expressão de um escritor inglês, viviam uma meia vida
splrit of National Industry etc. ," Edimburgo, 1m. constituída de duas partes, uma em água e outra em terra. 218
216 Em 1860, pessoas violentamente expropriadas foram exportadas
.Mas a brava gente gaélica devia· pagar ainda mais caro pela
para o canadá. sob falsas promessas. uns fUgiram para as montanhas
ou ilhas vizinhas. Foram perseguidOS pela policia, entraram em cho- idolatria que seu romantismo serrano votava aos "grandes homens"
que com ela e conseguiram escapar.
~17 "Nas terras altas da Escócia," diz' Buchanan, comentador de 011mongó!l 1nV'll.d1ram as provfnclas aetentrimWs da Obina, propc'}s-
Adam Smith, Ué diàriamente subvertida a antiga situação da proprie- em lIeU conselho, ·exterminar os habitantes e transformar suas
lIiI!,
dane ... O landlord. sem qualquer consideracão com os rendeiros he- terras em pastagens. Essa proposta foi posta em exeeuçio por muitos
reditários" (usa errOneamente essa categoria) "arrenda. a terra ao landlords ~ em suas próprias terras, contra seus pr6prios
que faz o maior lanço, e se êsse licitante é um inovador, introduz conterrlneoo" (George l!:ns<n', "An Inqu1ry concem1ng the Populll.tion
imediatamente nóvo sistema de cultura. A terra, antes coberta por oi NlI.tions", Londres, 18111, páp. 215 e. 216) .
pequenos lavradores, estava povoada na proporção do que produzia; :hs A atwll duqul!lSa de Sutherland recebeu em Londrell, faustosa-
no nOvo sistema de melhor cultivo e de maiores rendimentos, obtém- mente, 11. lI,utors. de "A Cabana do Pai Tomás", Harrlet Beecher
se a maior produção pOl>Sfve! com a menor despesa possível e, para. Stowe, s. fim de expre!I!lIar sua st!npatia. pela C&WIIII dos ~vos ne-
êsse fim. são afastados os braços que se tomaram inúteis... Os gros da República Ame'rican:a, st!npatia. que prudentemente ocultou.
que são enxotados da terra procuram sua subsistência IÍas' cidades como os d~ aristocratas, dure.nte a Guerra da. Secessão, quandO
Industriais etc." (Da.vid Buchanan, "Observations on etc. A. Smith's o coração dos nobres tnglêses pulava 11, favor dos escravocratas.
Wealth of Nations", Edimburgo, 1814, vaI. IV, p. 144. "Os grandes Naquela ocasiio, expus, no "New Yorll: Tribune", as condições dOI!
da Escócia expropriaram famílias como se fôssem erva ruim, tra- escravos de SUtherland <Carey incluiu alguns dados do meU trabalho
taram aldeiaS e suas populações como indianos enraivecidos atacam em sua obra "The Slave Trade", F11adéltta, 1853, p&gs. 202 e 2(3).
as feras acuadas em seus refúgios ... O ser humano vale uma. pele i~Um jornal escocês reproduziu meu artigo e teve de sustentar forte
de carneiro ou uma perna de carneiro ou menos ainda ... Quando .polêmica com os sicofantas dos Sutherlands.
,~46 847
I ."}'"' , , ''''''..-:::1

do clã. O cheiro de peixe chegou ao nariz dos grandes homens. não eram menos' cruéis que os impostos pelos reis oomlandos à
F arejaram algo lucrativo atrás dêle e arrendaram a orla marítima Inc1aterra. Os cervos dispõem de espaços livres. enquanto os S("-
aos grandes mercadores de peixe de Londres. Os gaélicos foram res humanos são aoossados para um circulo cada vez mais es-
enxotados pela segunda vez. 219 treito, .. Roubam ao povo uma liberdade atrás da outra... E li'
opressão cresce diàriamente. Expulsar e dispersar gente é· li nt
Por fim, uma parte das pastagens vem a transformar-se em
principio inabalável dos proprietários, que o consideram uma Ilt'·
reserva de caça. Sabemos que não há verdadeiras florestas na
cessidade agrícola igual à de extirpar as árvores e os arbustos
Inglaterra. A caça nos parques dos grandes senhores já se tornou Das florestas virgens da América e da Austrália; e a operação SE'-
gado doméstic9, gordo como os edis londrinos. Por isso, a Esc6cia gue sua l1UIlCba tranqüila como se fôsse um negócio regular" .:."':U
é o último asilo da "nobre paixão".
220 Robert aOmenl, "Letters from the Highlanda; or, the l"amJne 01
184.,.., !oDdreI, UMI, Na. 12 a 28 pauim. Easaa cartas apareceram
"Nas terras altas da Esc6cia", diz Somers em 1848, "aumen- OI'igiDalmente DO '''l'lmes'' . Os t\CODom1staa lntr1êse& ll&tura1mente
taram muito as florestas de caça. 211>a De 11m lado de Gaick en-
atribufram a epidemia de fome dos pélic08, em 184'1, a sua. super-
PQPuIaçio. Em todo o caso. fies "pressionavam" a6bre a oferta de
contra-se a nova floresta de Glenfesrue e, do outro, a de Ard- aUmentos. - A llinpeza. d&iI propriedades. ou a expropriaçl.o dos
verilcie. Continuando para a frente. temos o Bleak-Mount, um camponeses pelos nobres. Il& Alemanha, tomou-se sobretudo vigorosa.
vasto e imenso ênno, su~do recentemente. De leste para oeste, • Il& 'Guerra dos Trinta ADos e provocou, em 1'790, revoltas doi cam-
das vizinhanças de Aberdeen até aos penhascos de Oban, temos poneses no Eleitorado da SaxOnI&. A expropriaç§.o prevaleceu prin-
agora uma linha contínua de florestas, e, em. outras partes das cipalmente Il& Alemanha oriental. Na maior parte das. provfnclu da
terras altas, as novas florestas de Loch Archaig. Glengarry, Glen- ,. Prúsata., Frecier!oo n:: ~, peJa. primeira. vez, aos camponeses
o direito de propriedade. Depois de conquistar a SUésIa, obrigou os
moriston etc. '" A transformação de suas terras em pastagens ... proprietários du terras a reccmatru1rem u habltaç6es, os celeiros
expulsou os gaélicos para terras estéreis. Agora. a caça começa etc. e a proverem 011 campem_ de pdo e tnstrwnentos qricolas.
a substituir a ovelha e, por isso, ~les são empurrados para uma Precisava de soldados para o exército. e de contribuintes para. o te-
miséria mais triturante ... Essas florestas de caça e o povo não 8OU1'O. A vida agradável dos camponues sob a tirania f1nanceIra de
podem coexistir. Um dos dois tem de ceder. Se os campos de Frederico e sua mistura ele dellpOÜllmO, ~. e ~~daHsmo, pode
caça crescerem, no proximo quartel do século. na mesma propor. . . infertd.a através da sepinte ~ de ~Mfrabeau~ que tanto o
ção do passado, não sobrará mais nenhum gaélico em sua terra admirava: "O linho repreeenta, portanto, uma-dali' grandes riqueza.&
natal. ~sse movimento entre o.~ propriebí.rios das terras altas de. do Ja.ftador na Alemanha aetentrioDal. Infelizmente para a espécie
humana, 00Mt1tu1 apenas um recurso contra .. mWria e nio um
corre, nuns, de moda, de mania aristocrática. de \·ã paixão pela meto ele bem-estar. Os impostos diretos, ali corvéiu e os aervlçer,
caça etc.• e, noutros, do interêsse do lucro que auferem no negó- compuls6r1os de tôda espécie esmagam o camponês alemio, que a.Lnda
cio de caça. Em muitos casos, é incomparàvelmente mais lucra- pap Impostos indiretos em tudo que compra ... e para completat
tivo utilizar' uma área nas montanhas para caça do que reservá- sua ruíDa, não !IIe atreve a vender lIeWI produtos onde e como quer;
la para pastagem de ovelhas,.. O entusiasta que procura um nlo !IIe atreve a comprar o que preclsa nos comerciantes que podem
campo de caça s6 tem um limite para a sua oferta, o tamanho lhe vender m&I.!! barato. TMu eIIIU CIWll\lIIlI o amúwIm lenta mru
MlI!:tI%'lWlEeme. e !!em a fl:IiI,çio estarI.& 1mpolllrlblll.tado de pag&r os Im-
de sua bôlsa... Impuseram-se nas terras altas sofrimentos que
.~ no dia do vmclmento; ela lhe of~ uma ajuda.
~llAmdo' dtn ama mulher, l!IeWI filhos, SUM criadu.
219 Pormenores Interessantes 8Ôbre o assunto encontramos em "Port. eua criados e a ~. ~ d _ ajuda, que vida IIIIoCrlfica:'
1'0110, New Series", de David Urquhart. - Nassau W. Sentor, em da lllml. êle! No vedo, tnl.baIha como um cond.enado, Il& lavoura e na
sua obra PÓStuma já cita.da., classifica "os métodos utllizados em colhe1t1.; vai del.tar... u S horu da noite e Immtl.-1Ie u 2 da
Sutherland como uma das limpezas mais benéficas de que se tem manb!. para. dar conta de lIeUB tnl.bIJhos; no inverno, deveria. recupe-
memória" (1. c., Cp. 2821). . rar suu f6rou com um 10D10 repou!iIO; mu. fIIltar-lhe-Wn gri.oa
219& As florestas de caça da Escócia não possuem uma. única árvore, para o pio e para a. semeadura, !Ie os vendesae. para pap.r os Im-
As ovelhas expulsas são substituídas pelos cervos nas montanhas des- postoIiI. 'l'erWn de flUlll!l' Isso, !IIe nio houveae uma. 1llÚda, fiar... e
nudas que recebem então o nome de floresta de caça. Náo há. por- com o maior afinco. Aalm, no inverno, o camponês deitl.-se l meia-
tanto, nem mesmo sllvicultut'a. noiw ou à 1 da manM. e levanta-se u 5 ou 6. ou deit&-se U li da

848 849
_.I, o roubo dos bens da Igreja, a alienação fraudulenta dos domí.
niOs-do estado. a ladroeira das terras comuns e a transformação
CD LEGISLAÇÃO SANGUINÁRIA CONTRA OS ExPROPRIADOS, A
PARTIR 00 SÉCULO XV. LEIS PARA REBAIXAR os SALÁRIOS
,/
da propriedade feudal e do clã em propriedade privada moderna,
\~ /.
Os qUe foram expulsos de suas terras com a dissolução das
• levada a cabo com terrorismo implacável, figuram entre os métodos
idílicos da acumulação primitiva] Conquistaram o campo para a vassalagens feudais e com a expropriação intermitente e violenta,
agricultura capitalista, incorporaram as terras ao capital e pro":" êsse proletariado sem direitos, não podiam ser absorvidos pela
porcionaram à indústria das cidades a oferta necessária de pro- manufatura nascente com a mesma rapidez com que se tornavam
, letários sem direitos.I
disponíveis. Bruscamente arrancados das suas condições habituais
de existência, não podiam enquadrar-se, da noite para o dia, na
noite e levanta-se às 2 da. manhã. E isso todos os dias de sua. vida, disciplina exigida pela nova situação. Muitos se transform~am em
exceto aos domingos. l!:sse excesso de vlgilia e de trabaJhos esgota. o mendigos, ladrões, vagabundos, .em parte por inclinação... mas na
ser humano. de modo que os homens e as mulheres envelhecem no maioria dos casas por fôrça das circunstâncias. Daí ter surgido
campo mUito mais ràpidamente do que na cidade" (Mirabeau, 1. c., • em tôda a ~uropa ocidental, na fim do século XV e no .decur~o
t. m, págs. 212 e seguintes) .
Adendo à 2.- edição. Em março de 1866, 18 anos a!)ÓS a. publica- çlo XVI uma legislação sanguinária contra a vadiagem. Os ances-
çio da. obra de Robert Somera citada, professor Leone Levi fêz uma trais da classe trabalhadora atual foram punidos inicialmente por
conferência na Society of Arts s6bre a. tra.nsformação das pastagens SE.' transfcrmarem em vagabundos e indigentes, transformação que
de ovelhas em campos de caça. descrevendo a. desolação crescente lhes era imposta. 4A legislação os tratava como pessOas que es-
e
das terras· altas da Escócia. DIsse êle: "O despovoamento a trans-
colhem propositalmente o caminho do cri~, como se dependesse
formaçli.o das lavouras em meros pastos de ovinos ofereceram o meio
mais cômodo para um rendimento sem despesas ... Tornou-se moda. da vontade dêles prosseguirem trabalhando nas velhas cond~
depois, transformar os pastos em campos de caça. As ovelhas são que não mais existiam.
expulsas pelos animais de caça. do mesmo modo que os aéres hu- Essa legislação começou na Inglaterra, no reinado de Henri-
manos foram enxotados antes para dar lugar às ovelhas ... Podemos
ir das propriedades do conde de Dalhou.sl.e em Forfarshire até Jobn que VII. JZ
o'Groats, sem perder de vista os campos de caça. - Em mUitos dêles Henrique VIII, lei de 1530. - Mendigos velhos e incapacita-
habitam a rapôsa, o gato selvagem, a marta, a fubIha. a doninha, dos para trabãIbar têm direito a uma licença para pedir esmolas.
a lebre alplrul.; chegaram depois o coelho, o esquilo e o rato do Os vagabundos sadios serão flagelados e encarcerados. Serão
mato. Imen.sa.s áreas que figuravam na _tfstica da Escócia como amarrados atrás de um carro e açoitados até que o sangue lhes
pastagens de excepcionais fertilidade e extensão nio são cultivadas
nem melhoradas, estando reservadas exclusivamente para algumas corra pelo corpo; em seguida prestarão juramento de voltar à sua
pessoas terem o prazer da caça em perfodo curto e determinado do terra natal ou ao lugar onde moraram nos últimos 3 anos, "para
ano." se porem a trabalhar" x Que ironia cruel! Essa lei é modificada,
O "Economist" de Londres, de 2 de junho de 1866, transcre.ve a com acréscimos ainda mais inexoráveis, no ano 27 do reinado de
segUinte noticia pUblicada num jornal escocês, na semana anterior: Henrique VIII. Na primeira reincidência de vagabundagem, além
"Uma das melhores pastagens de ovelhas em Sutherlandshire pela
qual se ofereceu recentemente uma renda anual de 1 200 libras es-
terlinas ao término do contrato de arrendamento, transforma-se em basta verificar que abrangem uma área muito maior que todo o
crunpo de caça." E comenta: "Manifestam-se os instintos feudais ... condado de Perth. Para se avaliar a perda causada à. produção do
como nos tempos dos conquistadores normandos... que destrUiram pais. por essa· devastação violenta. é suficiente observar que o cam-
36 aldeias para criar a Nova Floresta ... Dois milhões de acres que po de caça de Ben Aulder podia alimentar 15000 ovelhas e que êle
incluem algumas das terras mais férteis da Escócia se transformaram 1
em áreas incultas. As pastagens naturais de Glen T1It figuravam constitui aoenas - - das reservas de caça da Escócia ... Tõda e~a
- 30
entre as mais nutritivas do condado de Perto. o campo de caça de área de caça. é absolutamente improdutiva ... e poderia estar submer-
Ben Aulder era. a melhor pastagem do vasto distrito de Badenoch, gida no Mar do Norte sem fazer falta. É chegada a hora de a lei
uma parte da. área de, caça de Black Mount era a melhor pastagem intervir para acabar com essas áreas que se tornam propositalmente
escocesa para ovelhas de cara preta. Para se formar uma idéia da
extensão dos imensos espaços êrmos destinados à. pa1x1i.o da caça. incultas, com êsses êrmos improvisados."
851
850
..

da pena de flagelacão metade da orelha será cortada; na segunda. a ferro. se ninguém qt!iser tomá-los a serviço por 2 anos; em caso
o culpado será enforcado como criminoso irrecuperável e inimigo de reincidência. se têm mais de 18 anos. serão enforcados, se nin-
\ da comunidade. guém quiser tomá-los a serviço por 2 anos: na terceira velo serão
Eduardo VI. - Uma lei do primeiro ano de seu govêrno, enforcados, sem mercê. como traidores. Leis análogas_ a n.o 13
1547, estabelece que, se alguém se reCUSa a trabalhar, será con- do ano 18 do reinado de Elizabeth. e a do ano de 1597 .:!:!l a
• denado como escravo da pessoa que o tenha denunciado cOmo va- Jaime L - Quem perambule e mendigue será declarado vadio
dio. O dono deve alimentar seu escravo com pão e água, bebida~ e vagabundo. Osiuízes de Daz, em suas sessões, estão autorizados
fracas e restos de carne, conforme achar conveniente. Tem o di- fi a mandar açoitá-lo e encar~erá.-Io por 6 meses, na primeira vez e
reito de forçá-lo a executar qualquer trabalho, por mais repugnan: por 2 anos, na segunda. Na prisão, receberão tantas vêzes tantas
te que seja, flagelando-o e pondo-o a ferros. Se o escravo desapare chicotadas quantas os juízes de paz acharem adequadas... Os
cer por duas semanas, será condenado à escravatura por tôda a vi-
da e será marcado a ferro, na testa e nas costas, com a letra S:
221" Thomas Morus diz em sua "Utopia", [págs. 41 e 42]: "Um
se escapa pela terceira vez será enforcado como traidor. O dono voraz e insaciável avarento, terrível praga de sua terra natal, trama
pode vendê-lo, legá-lo, alugá-lo, como qualquer bem móvel ou ga·· t' consegue apossar-se de mUhares de acres, contorna-os e fecha-os
do. Se o escravo tentar qualquer coisa contra seu senhor, será com eêrcas e valados, expUlsa os lavradores que os ocupavam, utili-
também enforcado. Os juízes de paz quando informados, devem zando a fraude e a violência, ou os atormenta de tal modo que os
força a lhe venderem tudo. De um modo ou de outro, por bem ou
prcvidenciar a busca dos velhacos. Se se verifica que um vagabundo por mal, forçou-os a irem embora, pobres, simples e desventuradas
está vadiando há 3 dias, será êle levado à sua terra natal, marcado Almas! Homens, mulheres, esposos, espõsas, órfãos, viúvas, mães cho-
com ferro em brasa no peito com a inicial Velá pôsto a traba- rosas com crianças de peito, famílias Inteiras, pobres, mas numerosas,
lhar a ferros na rua ou em outros serviços. Se informar falsamen- poiS a lavoura. exigia muitos braços. Carregando seus haveres, afas-
tam-se lenta e penosamente dos lugares conhecidos e amados, e não
te o lugar de nascimento, será condenado a escravo vitalício dêsse encontram adiante onde repousar. A venda de todos os seus perten-
lugar, dos seus habitantes ou da comunidade e marcado cOm S. ces, embora de pouco valor, poderia lhes proporcionar certos recursos,
Tôdas as pessoas têm o direito de tomar os filhos dos vagabundos noutras circunstâncias; mas. subitamente, lançados ao ar, têm de se
e mantê-los como aprendizes. os rapazes até a idade de 24 anos desfazer dêles a preço irrisório. E quando vagueiam depois de con-
sumir o último ceitll, que poderão fazer além de roubar le então, meu
e as môças até 20. Se fugirem, 10rnaNe-ão, até essa idade, escra-
Devs, se.rem enforcados com tôdas as formalidades jurídicas) ou
vos do mestre, que pode pô-los a ferro, açoitá-los etc., conforme pedir esmolas? E se mendigarem serão lançados ao cárcere como
quiser. O dono pode colocar um anel de ferro no pescoço, nos vagabundos, por estarem perambulando sem tra.balhar; êles, a quem
braços ou pernas de seu escravo, para reconhecê-lo mais fàcilmen- ninguém quer dar trabalho por mais que implorem." Dêsses sêres
te e ficar mais seguro dêle. 221 A última parte da lei prevê que erradios compelidOS a. roubar segundo o depoimento de Thomas Morus,
"72000 foram enforcados como ladrões grandes e pequenos no reina-
certos indigentes podem ser empregados por comunidades ou peso do de Henrique VIII" CHolinshed, "Description of England", v. I,
soas que tenham a intenção de lhes dar de comer e de beber e p. 186). Na época dE Elizabeth "vagabundos foram enforcados em
de arranjar-lhes trabalho. Essa espécie de escravos de paróquia série e geralmente não havia um ano em que 300 ou 400 não fôssem
subsistiu por muito tempo. chegando até ao século XIX, sob o no- l"!vadc·J à fõrea" (strype, "Anna1s of the Reformation and Establish-
ment of Rel1gion, and other Various Occurrences in the Church of
me de rondantes (roudsmen). England during Queen Elizabeth's Happy Reign", 2.a ed., 1725, voI.
Elizabeth, 1572. - Mendigos sem licença e com mais de 14 IT) . Ainda segundo Strype, em Some.rsetshire, num único ano, foram
ê anos serão flagelados severamente e terão suas orelhas marcadas enforcadas 40 pessoas, ferreteadas 35, flageladas 37, e postos em
liberdade 183 "criminosos incorrigíveis." Apesar disso, observa êle:
221 O autor de "EEsay on Trade etc. ", 1770, observa: "No govêrno "Esse grande número de réus não compreende nem mesmo a quinta
de Eduardo VI. os inglêses parecem ter levado a sério fomentar as parte de todos os criminosos, em virtude da negligência dos juízes
manufaturas e empregar os pobres. É o que inferimos de uma lei de paz e da compaixão estúpida do povo. ,. Acrescenta: "Os demais
digna de reparo, a qual prevê que todos os vagabundos devem ser condados da. Inglaterra não estão em melhor situação que Somerset-
marcados a ferro" etc. (1. c .. p. 5). shlre e muitos até em pior."

852 853
,.

limites convenientes à produção de mais valia, para prolongar a


vagabundos incorrigíveis e perigosos serão ferreteados com um R
sôbre o ombro esquerdo e condenados a trabalhos forçados; se jornada de trabalho e para manter o próprio trabalhador ,num .
novamente forem surpreendidos mendigando, serão enforcados sem grau adequado de dependência. Temos aí um fator fundamental
mercê.i}::ssas prescrições legais subsistiram até aO comêço da segun- da chamada acumulação primitiva.
li> da década do século XVIII, quando f!?ram revogadas pela lei' ,A classe dos, assalariados que -surgiu na segunda metade do
n. O 23 do ano 12 do reinado de Ana.: ,século XIV; constituía então, e ainda no século segUinte, apenas
Houve leis análogas na França. Nos meados do século XVII, • fração diminuta do povo, com sua posição protegida, no campo,
estabelecera-se em Paris um reino dos vagabundos. Ainda no início pela economia camponesa independente e, na cidade, pela organiza-
do reinado de Luiz XVI, pela ordenança de 13 de julho de 1777, ção oorporativa. Na cidade e no campo, patrões e trabalhadores
todo homem válido de 16 a 60 anos, sem meios de existência e estavam próximos socialmente. A subordinação do trabalho ao ;capÍL- .
sem exercer uma profissão, devia ser mandado para as galés. Eram " tal era apenas formal, isto é, o próprio modo de produÇão 010"
de natureza semelhante o edito de Carlos V, de outubro de 1537, possuia ainda carátér especlflcámente ,ca~tansta. 'A"pâ.rtevarl&vel
para os Países Baixos, o primeiro edito dos Estados e Cidades de • do capital predominava muito SÕbreã oonstante. Por isso, a pro-
Holanda, de 19 de março de 1614, e o das Provínc.ias Unidas, cura de trabalho assalariado crescia rápida com tôda acumulação,
de 25 de junho de 1649 etc. • e era seguida lentamente pela oferta. Grande parte do produto
I Assim, a população rural, expropriada e expulsa de suas ter- nacional, à qual se transforma mais tarde em fundo de acumulação
ras, compelida à vagabundagem, foi enquadrada na disciplina exi· do capital, ainda alimentava então o fundo de consumo do traba-
.1... gida pelo sistema de trabalho assalariado, por meio de um groteSco lhador.
. terrorismo ,legalizado que empregava o açoite, o ferro em brasa e rNa Inglaterra, começa pelo "Estatuto dos Trabalhadores" de
1'. tortura. _, '- ' Eduãrdo m, de 1349, a legislação sôbre trabalho assalariado.) a
Não basta que haja, de um lado, condições de trabalho sob a"'"'" qual desde a origem viSa explorar o trabalhador e prossegue sêÍn-
forma de capital, e, do outro, sêres humanOs que nada têm para pre hostil a êle. 222 Na França, êsse estatuto encontra seu cor-
.. vender além de sua fôrça de trabalho. Tampouco basta forçá-los a respondente na ordenança de 1350, publicada em nome do rei .João.
se venderem livremente. Ao progredir a produção capitalista, desen- . A legislação inglêsa e a francesa seguem os mesmos rumos e aio
. volve-se uma classe trabalhadora que por educação, tradição e idênticas em seU conteúdo. Não tratarei das disposições dessas íeis
.. costume aceita as exigências daquele modo de produção como leis quando se refiram ao prolongamento compulsório do dia de traba-
(
'naturais evidentes. 'A organização do processo de produção capi·· lho, matéria de que já nos ocupamos no capítulo VIII, 5.
talista, em seu pleno desenvolvimento, quebra tôda resistência, a '.' O Estatuto dos Trabalhadores foi aprovado em virtude das
produção contínua de uma superpopulação relativa mantém a lei ~ . queixas crescentes da Câmara dos Comuns.
da oferta e da procura de trabalho e, portanto, o salário em' harmo-
nia com as necessiáades de expansão do capital, e a coação surda
das relações econômicas consolida o domínio do capitalista sôbre "Outrora", diz íngênuamente um deputado tory, "os salários
o trabalhador. Ainda se empregará a violência direta, à margem exigidos pelos pobres eram tão altos que ameaçavam a indústria
das leis econômicas, mas doravante apenas em caráter excepcional. e a riqueza. Hoje, os salários estão tão baixos que ameaçam a
indústria e a riqueza igualmente Ou talvez mais, embora de outro
Para a marcha ordinária das coisas basta deixar o trabalhador
entregue às "leis naturais da produção", isto é, à sua dependência modo." 223
do capital, a qual decorre das próprias condições de produção,.
2!!:!"Sempre que 'a legislação procura regular as diferenças entre
e é assegurada e perpetuada por essas condições. Mas. as coisas patrões e trabalhadores. os conselheiros são os patrões," diz A. Smith.
corriam de modo diverso durante a gên(':se histórica da produção "O espirito das leis é a. propriedade," diz Linguet.
capitalista.. A burguesia nascente precisava e empregava a fôrça 223 [J. B. Byles,] "Sophisms of Free Trade. By a. Barr1ster", Lon-
do estado. para "regular" o salário. isto é. comprimi-lo dentro dor, '* dres, ls:50, p. 206. Mas, o deputado acrescenta. maliciosamente: Estl':'

854
855
Foi atab~lecida uma tarifa legal de salários para a cidade No período manufatureiro propriamente dito. o modo capitalis-
e ..ra o campo, para trabalho por peça e por diaJOs trabalhadores la de produção estaVa suficientemente forte para dispensar. por
ru.ru deviam alugar-se por ano, os da cidade "no mercado livre". .. impraticáveis e supérfluas, as leis reguladoras do salário. Entretan-
Proibiu-se, sob pena de prisão, pagar salários acima dos legais. e to, guardaram-se as armas do velho arsenal, para o caso de ne-
.. quem OS recebesse era punido mais severamente do que quem os cessidade, e ainda se promulgaram disposições sôbre remuneração
papJllllC. Assim, o Estatuto dos Aprendizes de Elizabeth, nas se- do trabalho. Jorge n, no ano 8 de seu reinado, proibiu que os ofi-
ções 18 e 19. impunha 10 dias de cadeia a quem pagasse salários ciais de alfaiataria recebessem um salário diário superior a 2 xelins
acima dos legais, e 21 dias a quem os recebesse. Uma lei de 1360 e 7Y2 pence excetuados os casos de luto geral: Jorge IH, pela lei
tomou as penas mais severas e autorizava o patrão a recorrer à n. O 68 do ano 13 de seu reinado. transferiu a regulamentação dos
coação f'1SK:a, para obter o trabalho de acôrdo com a tarifa legal. salários dos tecelões de sêda para os juízes de paz; em 1796, eram
Foram declarados nulos de pleno direito tOOas as combinações, n~essárias duas sentenças dos tribunais superiores para decidir se
contratos. juramentos etc. pelos quais pedreiros e carpinteiros esta- eram também aplicáveis aos trabalhadores não agrícolas as deter-
belecesretq_DOrmas comuns obrigatórias para o exercício de suas minações dos juízes de paz sôbre salário; em 1799. uma lei do
profissõesLA coligação de trabalhadores é considerada crime gra- Parlamento estabeleceu que o salário dos trabalhadores das minas
ve, desde «» século XIV até 1825, ano em que foram abolidas as na Escócia continuava a ser regulado pOr uma lei de Elizabeth e
leis contra a coligação ou associação dos trabalhado~ O espírito por duas leis escocesas de 1661 e 1671. Mas, a situação tinha mu-
do Estatuto dos Trabalhadores de 1349 e de seus rebentos poste- " dado muito. f: o que demonstra um acontecimento inaudito na
riores se patenteia na circunstância de o estado ditar um máximo Câmara dos Comuns. Aí, onde há mais de 400 anos se fabricavam
para os salários, mas nunca um mínimo. /I leis fixando o máximo que o salário em nenhuma hi~tese podia
Conforme sabemos, piorou muito a situação do trabalhad~?- ultrapassar, propôs Whitbread, em 1796, um salário mínimo le-
.. no século XVIII. Subiu muito o salário em dinheiro. mas não ) gal para o jornaleiro agrícola. Pitt opôs-se, embora reconhecesse
proporcionalmente à depreciação dêste e à correspondente eleva- J '"ser cruel a situação dos pobres". Em 1813, foram abolidas final-
ção dos preços das mercadorias. O salário real portanto caiu. Não v
• mente as leis que regulavam os salários. Eram uma anomalia ri-
obstante, continuaram em vigor as leis destinadas a rebai,xá-Io. dícula, uma vez que o capitalista passara a decretar nas fábricas
juntamente com as punições de cortar orelhas e de ferretear, apli- sua legislação particular e recorria à taxa de assistência aos po-
cadas Aqueles ."que ninguém queira tomar a seu serviço". O Estatu- bres para reduzir o salário do trabalhador agrícola ao mínimo
to dos Aprendizes de Elizabeth (lei n.o 3 do ano 5 do seu reinado)
autorizava os juízes de paz a fixar certos salários e modificá-los blu-se aos habitantes das aldeias alugarem quartos a homens e
de acôrdo com as estações do ano e os preços das mercadorias. mulheres solteiros. e todos êsses hóspedes deviam ser denunciados à
autoridade e. se recusassem emprégo de criado, postos na cadeia,
Jaime I estendeu essa disposição aos tecelões, fiandeiros e a tôdas alnda que tive~sem outra atividade, como a de trabalhar a jornal na
as categorias possíveis de trabalhadores,224 Jorge II submeteu tô- s~meadura para camponeses ou mesmo a de negociar com dinheiro
das as manufaturas às leis contra a coligação de trabalhadores. e trigo (Prívilégios e. Sanções Imperiais para a Silésl.a., I, 125). Du-
rante um século inteiro, nos decretos dos principes alemães, repetem-
se queixas amargas contra a ralé perversa e petUlante que não quer
vemos sempre prontos a interferir em defesa do empregador. E os se ajustar às condições severas que lhe são impostas nem se con-
I'!mpregados, não se pode fe.zer nada por êles?" tenta com o salário legal. l!: proibido ao proprietário da. terra pagar
224 De acôrdo com uma cláusula da lei n? 6 do ano 2 do reinado de salário superior ao fixado pela tarifa do estado. Apesar disso, as
.111.1me I, verifica-se que certos fabricantes de pano tomaram em condições de trabalho, depois da guerra, eram às vézes melhores do
!UM m.ios ditar, na qualidade de juízes de pe.z, a tarifa. oficial de que 100 anos depois; em 1652, na Silésia, os criados recebiam carne
sa.láIios a. vigorar em suas próprias oficinas. - Na. Alemanha. nota- duas vêzes por semana, qU:J.l1do, ainda em nosso século, havia lá
damente du.ra.nte a Ouerra dos Trinta Anos, eram freqüentes estatu- distritos em que êles só recebiam carne três vézes ao ano. Depois da.
tos para manter baixos os salá.rios. "Nas terras despovoadas, seus guerra, o salário diário era mais alto que os dos séculos posterio-
res" (O. Freytag).
proprietários sentiam multo a falta de criados e trabalhadores. Froi.- .•.
.~
~~:~,m :,:<~.
ser punido com a multa de 500 francos e a privação dos direitos
indispenSável. As disposições dos Estatutos dos Trabalhad~res. re- de cidadania por 1 ano. 225 Essa lei que, por meio da coação
lativas a contratos entre patrões e assalariados, a aviso prévio e policial, comprime a competição entre o capital e o trabalho den"
matérias análogas, e que, por quebra contratual, permitem ação tro de limites convenientes aO capital sobreviveu a revoluções e a
criminal contra o trabalhador em falta e apenas uma ação civil mudanças de dinastias. Mesmo o regime do terror deixou-a intacta.
contra o patrão que viola o contrato, continuam a.té hoje em pIe- Só recentemente, foi essa norma proibitiva excluída do código pe-
oo~~ . . nal. Nada caracteriza melhor a mentalidade burguesa do que o
As leis cruéis contra as coligações dos trabalhadores foram pretexto dêsse golpe de estado. Le Chapelier, o relator da lei; diz
abolidas em 1825 ante a atitude ameaçadora do proletariado. Mas, "$Crdesejável que o salário esteja mais alto do que está atualmen-
apenas em parte. Alguns belos resíduos dos velhos estatutos só te, a fm de que o assalariado não fique nessa dependência absoluta
desapareceram em 1859. Finalmente, a lei do Parlamento, de 29 i cãusada pela privação dos meios de subsistência indispensáveis,
de junho de 1811, pretendeu eliminar os últimos vestígios dessa ! e que é quase a dependência da escravidão." Entretanto, segurado
legislação de classe com o reconhecimento legal.das Trades' Unions. êle, não devem os trabalhadores ter a permissão de estabelecerem
Mas uma lei do Parlamento, da mesma data (destinada a modificar entendimentos entre si sôbre seus próprios interêsses. de agirem
a legislação criminal na parte relativa a violências, ameaças e em comum e assim moderarem sua "dependência absoluta que é
ofensas). restabelece na .realidade a situação anterior sob nova for- quase escravidão", pois sua coligação fere "a liberdade dos em-
ma. Com essa escamoteação parlamentar, os meios que podem presários. os antigos mestres corporativos" (a liberdade de man-
ser utilizados pelos trabalhadores em caso de greve ou lock-out terem os tràbalhadores na escravidão!), e uma associação contra
(greve feita pelos fabricantes fechando todos ao mesmo tempo suas o despotismo dos ex-mestres (adivinhem!) é uma restauração das
fábricas) foram subtraídos ao domínio do direito comum e coloca- corporações abolidas pela constitUição francesa. 226
dos sob uma legislação penal de exceção, a ser interpretada pelos
pr6prios fabricantes, na sua qualidade de juízes de paz. Dois anos
antes. a mesma Câmara dos Comuns e o mesmo GÍadstone, com 4. G~NESE 00 AUENDATÁRIO CAPJTAUSTA
a costumeira honradez: parlamentar, tinham elaborado projeto de
lei para abolir a legislação penal de exceção contra a classé traba- Vimos· como se processou a cnaçao violenta dos proletários
lhadcra. Mas, não se deixou o projeto chegar à segunda leitura, sem direitos, a disciplina sanguinária que os transformou em as-
e a coisa foi sendo protelada até que finalmente o "Grande Par- salariados, a ação grotesca e s6rdida que aumenta o grau de ex-
tido Liberal". aliado aos tories, resolveu voltar-se em cheio con-
tra o mesmo proletariado que o guindou ao poder. E não satisfei-
to com essa traição, o "Grande Partido Liberal" permitiu aos juí. 225 O artigo I!' dessa lei diz: "Sendo um:!. das bases !undamentllili;

zes inglêses, eternos serviçais das classes dominantes, desenterrarem da constitu1çli.o fra.ncesa. a. eliminação de tôdas as espécies de cor-
porações da mesma. classe e profissão, fica proibido restabeled-Ia.s
as leis arcaicas sôbre "conspirações" e aplicá-l.as às coligações dos sob qualquer pretexto ou qualquer forma." O artigo 4.° declara que
trabalhadores. Está claro: de má vontade e pressionado pelas mas- "se cidll.dãos da. mesma. profissli.o, arte ou oficio tomarem delibera-
sas, o Parlamento inglês revogou as leis contra as greves e a~ ções, fizerem convenções, com o fim de conjuntamente se recusarem
JJJ'~ges' J)nions, depois de fer, durante 5 séculos, com cínico egob- a. fornecer os serviços de sua indfultria ou seus trabalhos, ou de só
fornecê-los a um preço determinado, essas deliberações e conven-
:no, sustentado a posição de uma permanente Trades' Union do, ções .. , serão declaradas inconstituciona.is, atentatórias à. liberda.de
capitalistas contra os trabalhadores. ~ â declaração dos direitos do homem etc.,.. crimes contra o estado,
Logo no comêço da tormenta revolucionária, a burguesia fran- portanto, exatamente conforme já. prescreViam os velhos estatutos
cesa teve a audácia de abolir o direito de associação dos trabalha dos trabalhadores ("Révolutions de. Paris", Paris, 1'1'91, t, m. p.
523) •
dores, que acabara de ser conquistado. Com o decreto de I 4 de 226 Buch'ez et RaUl:, "Hlstolre Parlementaire", t. X, p. 193 a 195,
junho de 1191, declarou tôda coligação dos trabalhadores um passim.
"atentado à 'liberdade e à declaração dos direitos do homem", :l
859
858
1
"

ploração do trabalho por métodos policiais li fim de acelerar a No século XVI. intervém ainda outro fator de decisiva impor-
acumulação do capital, mas precisamos agora saber como se ori- tância. Os COntralos de arrendamento da época tinham prazo muito
.. ginaram os capitalistas. "A expropriação da população rural cria .. longo. muitas vézcs 99 anos. A depreciação contínua dos metais
• imediatamente apenas grandes proprietários de terras. Quanto à. preciosos e em conseqüência do dinheiro trOUXe ao arrendatário
origem do arrendatário, podemos por assim dizer senti-Ia com o .. pomos dourados. Rebaixou os salários, independentemente de tôtias
tato, pois evolveu lentamente através de muitos séculos. Os pró- aquelas circunstâncias que já foram examinadas. O montante de
prios sen'os, do mesmo modo que os pequenos proprietários li- redução real dos salários serviu então para acrescer os lucros dos
.. vres, tinham a posse da terra a títulos os mais diversos e por isso arrendatários. fà elevação contínua dos preços do trigo, da lã, da
emanciparam-se sob aS condições econômicas mais diversas carne, enfim tíe todos os produtos agrícolas, dilatou o capital mo-
Na Inglaterra, o ponto de partida das transformações que netário do arrendatário sem qualquer intervenção de sua parte,
culminam com o aparecimento da figura do arrendatário capitalis- • enquanto a renda que tinha de pagar ao dono da terra estava
lO ta, seu germe mais primitivo, é o bailiff, ainda servo. Sua posição fixada pelo valor ;monetário antigo.2:!s)Assim, enriqueceu.-se às
é análoga à do vitlicus da velha Roma. embora com uma esfera • custas dos assalariados e do landlord. Não admira portanto que a
• menor de atribuições. Durante a segunda metade do século XIV, Inglaterra possuísse nos fins do século XVI uma classe de capitalis-
é substituído por um colono a quem o landlo~d fornece sementes, tas arrendatários, ricos em face das condições da época.2~'1f
gado e instrumentos agrícolas. Sua situação não é muito diferen-
228 Sõbre a influência da depreciação da moeda no Século XVI nu
te da do camponês. Apenas explora mais trabalho assalariado. Logo
diversas clas.ses soc1a.1s, vide: "A CompencUous or Br!efe Examination
se torna parceiro, um tipo que se parece mais com o verdadeiro of Certayne Ordinary Complaints of Diverse of our Countrymen in
arrendatário. O parceiro fornece uma parte do capital, o landlord these our DayS. By W. S. Gentleman", Londres, 1581. A forma.
a outra. Ambos dividem o produto total em proporção contratual- dialogada dê.sse trabalho contribuiu durante multo tempo para que
mente estabelecida. E.~sa forma desaparece ràpidamente na Ingla- se atribuf.sse sua autor1a. a Shak:espeare e fôsse re~utado em seu
nome, a1ncla em 1751. Seu autor é William Stafford. Num trecho
terra. ~para dar lugar aO arrendatário propriamente dito, que pro- um personagem, o cavaleiro, raciocina como segue:
cura expandir scuprÓ.orio capital empregando trabalhadores a'l- O cavaleiro: "Você, vizinho lavrador, você negociante, você com-
salariados e entrega ao landlord uma parte do produto excedente, padre latoeiro, vocês como todos os artesãos, sabem se defender mUito
em dinheiro ou em produtos, como renda da terra.] bem. Quando as coisas sobem de preço, vocês aumentam propor-
i}lo século XV, enquanto o camponês independente e, ao seu cionalmente os preços das mercadorias e dos serviços que vendem.
Mas nós nada temos para vender, e não podemos contrabalançar
lade. o trabalhador do campo trabalhando para si mesmo e por com. o aumento do preço do qUe vendêssemos as maiores despesas
salário se enriquecem com seu labor, a situação do arrendatário com as coisas que temos ne.oessàriamente de comprar." Noutra pas-
e sua escala de produção permanecem num nível monotonamente sagem, o cavaleiro pergunta ao doutor: "Por favor, de que espécie
modesto.)das, a revolução agrícola .do último têrço daquele sécUlo, de gente o senhor está falando?" - Doutor: "Refiro-me àqueles que
. vivem de comprar e vender, pois na. medida em que compram caro,
que prossegue por todo o século XVI com exceção de suas últimas também vendem caro." - O cavaleiro: "E qual é o outro grupo que,
dé::adas, enriqueceu o arrendatário com a mesma rapidez cOm que a seu ver, sai ganhando nesta situação?" _ O doutor; "TOdos os
empobreceu a população rural.22~ A usurpação das pastagens co- arrendatários que cultivam as terras arrendadas de acôrdo com a
muns etc. permitiu-lhe aumentar muito seu gado quase sem des- renda antiga, pois enquanto pagam esta, vendem na base da renda
nova, isto é, a terra lhes sai barata e vendem caro tudo o que nela
pesas, ao mesmo tempo que o gado lhe fornecia maior quantidade cresce ... " - O cavaleIro: "E quem, na sua opilúáo. sai perdendo
de adubos para o cultivo da terra._ enquanto êsses ganham?" - O doutor: "Todos os nobres, gentis-ho-
mens, e tôdas as demais pessoas que vivem de. uma renda fixa ou
227 Em sua "Description of England" diz Harrison: "Arrendatários de um estipêndio, ou que não cultivam a terra ou que não exercem
que antes tinham dificuldades em pagar uma renda. de 4 libras es- o ofíCio de comprar e vender."
terlinas. pagam hoje 40, 50, 100 libras esterlinas e acham que fize- 229 Na França, o regisseur, administrador e coletor dos tributos de-
ram um mal ne.g6cio quando no fim do contrato não economizaram vidos ao senhor feudal e que aparece nos primórdios da Idade Média,
o eqUivalente a 6 ou 7 anos de renda." logo se tornl1. um homme d'affaires que se transforma em capitalista,

860 861
5. REPERCUSSÕES DA REVOLUÇÃO AGRícOLA NA INDÚSTRIA.
FORMAÇÃO DO MERCADO INTERNO PARA O CAPITAL IN- pria cultura correspondia ao adensamento do proletariado indus-
DUSTRIAL trial, do mesmo modo que, segundo Geoffroy Saint-Hilaire, a con-
'yensação da matéria num ponto explica sua rarefação noutro.230
•.Apesar da diminuição de seus cultivadores, o solo proporcionava
Conforme vimos, a expropriação e a expulsão da população
a mesma quantidade de produção ou maior, porque a revolução
rural, renovadas, intermitentes, proporcionaram à indústria urbana
• no regime de propriedade territorial corria paralela com a melho-
massas sempre novas de proletários inteiramente desligadQs~~_da ',!,-

ria dos métodos de cultura, com maior cooperação, concentração


esfera corporativa. Em sua história do comércio, o velho A. An-
dos meios de produçüo etc., e porque os assalariados tinham de
derson (que não se deve confundir com James Anderson) vê nesse
trabalhar mais intensivamente,!m dispondo de uma área cada vez
fato uma intervenção direta da Providência. Devemos deter-nos
menor em que podiam trabalhar para si mesmos:-:Parte dos habi-
um pouco no exame dêsse fator da acumulação primitiva. O escas-
tantes rurais se torna disponível e se desvincula cros meios de sub.
- seamento dos camponeses independentes que mantinham sua pró-
sistência com que se abastecia. ~sses meios se transformam então
em elemento material do capital variável. Os camponeses expulsos
por meio de extorsões, fraudes etc. As vêzes, êsses l"CIlisseurs eram
npbres. Exemplo: "Contas que o senhor Jacques de Thoraisse, go- das lavouras têm de comprar o valor dêsses meios, sob a forma
vernador do castelo de Besançon, presta ao nobre senhor que em de salário, a seu nôvo senhor. o capitalista industrial. O que sucede
D1jon administra os bens do senhor duque e conde, de Bargonha, com os meios de subsistência, ocorre com as matérias-primas que
contas relativas às rendas da referida castelania, de 25 de dezembro a agricultura indígena fornece à indústria. Elas se transformam
de 1359 até 28 de dezembro dE'. 1360" (Alpxis Monteil, "H1stoire des em elemento do capital constante.
Matériaux manuscr1ts etc. ", pAgs. 234 e 0;35). A parte de leão já se
encaminha aí Dara o intermediário, co~forme se observa em tôdas Imaginemos que uma parte dos camponeses da Westfalia que,
as e.;feras da Vida social. No domínio econômico, os agentes finan- no tempo de Frederico lI, fiavam todo o linho que produziam.
ceiros, os especuladores de bóIsa, os comerciantes, os vendelros tiram fôsse violentamente expropriada e expulsa de suas terras, sendo os
para si a melhor parte; no direito burguês, o advogado tosquia seu
cliente; na polftica, o representante é mais imoortante que seus elei- restantes que lá ficassem transformados em íornaleiros de grandes
tores, o ministro mais que o soberano; na religião, o "mediador" põe arrendatários. Suponhamos ainda que se construam grandes fia.
Deus em segundo plano, sendo aquêle por sua vez empurrado para ções e tecelagens. onde êsses expropriados passem a trabalhar como
trás pelo cura, o intermediário indispensável entre o "bom pastor~ assalariados. O linho não mudou materialmente em nada. Não se
e suas ovelhaS. Na França, como sucedeu na Inglaterra, os grandes
territórios feudais foram repartidos em inúmeras pequenas explo- modificou nenhuma de suas fibras, mas uma nova alma social en.
rações agncolas, mas em condições incomparàveJmente mais desfa- IfOU no seu corpo. Constitui agora parte do capital constante do
voráveis para a população rural. No século XIV, apareceram os ar- patrão manufatureiro, Antes. repartia-se ,entre os inumeráveis pe
rendamentos ou terrlers. Seu número aumentou continuamente, indo quenos produtores que o cultivavam e fiavam em pequenas por-
muito além de 100000, Pagavam em dinhe,iro ou em produtos uma ções com suas famílias; agora, concentra-se nas mãos de um capi-
1 1
renda. que variava de - - a - - da produção. Os terriers ou arreI!- talista para quem outras pessoas o fiam e tecem. Antes. o traba-
12 fi lho extra despendido na fiação do linho se concretizava em ren-
damentos eram divisões e subdivisões de feudos etc., havendo muit.os dimento extra de inúmeras famílias camponesas e, no tempo de
que, de acôrdo com o valor e a extensão do domínio, continh::tm Frederico H. também em impostos para o rei da Prússia. Agora.
apenas poucos arpents.I Todos êsses terriers possuíam um grau qual-
quer de jurisdIção sôbre a população; havia quatro graus. Compreen- se concretiza em lucro de alguns capitalistas. Os fusos e teares,
de-se a opressão em que vivia o. população rural sob o domínio de antes espalhados pelos campos. estão agora reunidos em algumas
tantos tlranetes. Montei! diz que havia, então. na França, 160000 , grandes casernas de trabalho. o mesmo ocorrendo com os trabalha-
jurisdições, onde hoje bastam 4000 jurlsdições inclusive as dos juizes dores e a matéria--prima. Os fusos. os teares e as matérias-prima,;;
de paz.
I Arpent, antiga. medida agrária francesa cUjo valor variava, con-
forme a. região, de 50 a 51 ares. ~"" Em suas "Notions de Philosophie Naturelle", Paris. 1838.
~:: I Um pontà salientado por Sir James Steuart.
862
fl63
~-A expropriação e a expulsão de uma parte da pu pu/ação rural
,r J, mC'il" dr exi,t':m:iü indepemJ,nlr de fiündei
Iralh"'rlll:lral1l libero trabalhadores, seus meios de subsistência e seus meios de
ro, c tccc/àe,. em meios Je comündá-/os~"~ e de extrair dêles traba- " trabalho, em benefício do capitalista industrial; alél11 disso, cria ()
Ih(1 nüo pago. A~ grande, manufaturas e os grandes arrendamen- mercado internol
Im não mostram ú primeira vista que são uma soma de numero- Na realidade, os acontecimentos que transformam os pequenos
sos centres diminutos de produção. tendo sido formados pela ex- lavradores em assalariados e seus meios de subsistência e meios de
propriação de muitos produtores pequenos e independentes_ Mas, trabalho em elementos materiais do capital, criam ao m'!smo tempo
a observação imparcial não se deixa enganar. Ao tempo de Mira- para êste o mercado interno. Antes, a família camponesa produzia
beau, o leão revolucionário, as manufaturas ainda eram chamadas • 'e elaborava os meios de subsistência e matéria~-primas, que eram,
de manufactures réunies. oficinas reunidas como as terras que fó~ ._-- na sua maior parte, consumidos por ela mesma. 2sses meios de
ram expropriadas. .. subsistência e matérias-primas transformam-se agora em mercado-
rias; o arrendatário vende-as no mercado gerado !>C1as manufaturas.
Fios, tecido de linho, panos grosseiros de lã - coisas cujas ma-
"Só se dá atenção", diz Mirabeau, "às grandes manufaturas,
onde centenas de pessoas trabalham sob uma única direção, co-
térias-primas estavam ao alcance de tôda família camponesa, fia-
mumente chamadas de manufaturas reunidas. Mas ninguém dá das e tecidas por esta para o próprio consumo - são agora artigos
imp<1Thlllcia àquelas em que trabalham dispersos, cada um por de manufatura que encontram seu mercado exatamente nos distri-
suu L~mta, um número muito grandt- dto obreiros. São colocadas tos rurais. A numerosa clientela antes extremamente fragmentada,
a lima distüncia infinita das manufaturas reunidas. :E: um grande dependente de uma quantidl:de imensa de pequenos produtores que
,'rro, pois só as manufaturas individuais dispersas constituem um
trabalhavam por sua própria conta, concentra-se agora num vasto
<.~)mr(}nentt- rpalmentt' importantt' da riqueza do povo... A fá-
I brieu reuniua (fahrique réunie) enriquece maravilhosamente um
mercado, abastecido pelo capital industrial. 234 Assim, à .expropria-
I 011 dois empresários, mas os trabalhadores não passam de jorna- ção dos camponeses que trabalhavam antes por conta própria e
I leiros, com seus pobres salários variáveis, e não participam do 1:0 divórcio entre êles e seus meios de produção correspondem a
bem-estar do empresário. Na fábrica separada (fabrique sépa- ruína da indústria doméstica rural e o processo da dissociação .~
rée), ao contrário, embora ninguém se tome rico, um bom nú- entre a manufatura e a agricultura. E só a destruição da indústria-
mero de trabalhadores alcança uma boa situação... Aumenta o
número dos industriosos e dos econômicos, pois vêem na conduta
. tloméstica rural pode proporcionar ao mercado interno de um país
extt!n~ão' e a solidez exigidas pelo modo capitalista de produção.
prudente, na atividade, um meio de melhorar substancialmente
sua situação, e não de ganhar um pequeno aumento de salário, Todavia, o período manufatureiro propriamente dito não che-
que nunca tem importância para o futuro, mas na melhor hipó- ga a rcnlizar uma transformação radical. Recordemos q~e a ~a.
tese capacita ao trabalhador viver um pouco melhor imediata- nufatura só se apodera da produção nacional de maneira mUito
mente. AI; manufaturas individuais' dispersas, geralmente conju- fragmentária, encontrando sua base principal nos ofícios urbanos
gadas com uma pequena exploração agrícola, é que são as li- e na indústria doméstica rural. Quando destrói uma forma dessa
vres. "238 indústria doméstica num ramo específico, em determinados luga-

232 "Concedo-vos." diz o capitalista. "a honra de me servir desde ~34 "Vinte libras-péso de lã imperceptivelmente transformadas pela i
que me deis o pouco que vos resta pelo trabalho que tenho de vos familia de um trabalhador em roupas que preenchem suas necessi- :
comandar" (J. J. Rou~seau. "Discours sur l'l!:conomie Politique.". dades anuais, nos intervalos de outras tarefas. não causam assombro. '
f Genebra, 1760, p. 70)). Mas, se a lã é levada ao mercado, encaminhada à fábrica, daí aO
:!:,;, Mirabeau. 1. c., p. In, págs. 20 a 109, passim. A situação de ataca.dista e depois ao -(olista, teremos grandes operações comerciais.
grande parte das manufaturas continentais naquela época explica a e o capital nominal nelas envolvido representará Vinte vêzes o valor
razão de Mirabeau ter consideI'ado as manufaturas separadas mais da lã ... A classe trabalhadora é explorada para manter uma popuJ.i-
ção operária miserável, lojistas e vendeiros parasitas e um sistem3.
eco:Jómicas f" produtivas do que as "reunidas", e ter visto nesta um comercial, monetário e financeiro absolutamente fíc tício " (David
produto meramente artificial da intervenção do estado. Urquhart, 1. c., p. 120).

864 865
res, a manufatura provoca seu renascimento em outros, pois pre-
6. G~NI'!SE DO CAPITALISTA INDUSTRIAL
cisa dela dentro de certos limites, para a preparação de matérias·
primas.I'Ã manufatura produz, por isso, uma nova classe de pe-
quenos iavradores, para os quais o cultivo do 80J9 é a atividade A gênese do capitalista' industrial 238 (~o se processou de ma-
acessória, sendo a principal o trabalho industrial," cujas produtos neira gradativa como a do arrendatário. Sem"dúvida, certo níiInero
a ela são vendidos diretamente ou por meio déum negociante. de mestres de corporações, número maior de artesãos independen-
Isto é causa, mas não a principal, de um fenômeno que confunde tes e, ainda, assalariados se transformaram em capitalistas rudimen-
o pesquisador da história inglêsa. Do último têrço do século XV tares e, através da exploração progressivamente mais ampliada do
em diante, encontra êle queixas contínuas, interrompidas apenas trabalho assalariado e da correspondente acumulação, chegam a
em certos intervalos, contra a crescente exploração capitalista da
assumir realmente a figura do capitalista. Na infância da produção
terra e a destruição progressiva dos camponeses. Por outro lado.
capitalista, as coisas se passaram, muitas vêzes, como nos primór.
essa classe camponesa reaparece constantemente, embora mais re-
dios das cidades medievais, onde a classificação das foragidos da
duzida e em pior situaçãO.235 Causa principal: na Inglaterra ora
gleba em mestres e criados era decidida em grande parte pelo
predomina a produção de trigo, ora a criação de gado, em períodos
alternados, variando com êstes a extensão da atividade rural.[ Só tempo decorrido após a fuga. A marcha lenta do período infantil
a indústria moderna, com as máquinas, proporciona a base sólida do capitalismo não se coadunava com as necessidades do nôvo
da agricultura capitalista, expropria radicalmente a imensa maio- mercado mundial criado pelas grandes descobertas dos fins do
ria dos habitantes do campo e consuma a dissociação entre agri- século XV. A Idade Média fornecera duas formas de capital que
cultura e indústria doméstica rural cujas raízes, a fiação e a tecela- • amadurecem nas mais diferentes formações econõmico-sociais e
gem. são extirpadas. 236 Por isso, só ela consegue se apoderar do foram as que emergiram como capital antes de despontar a era
mercado interno por inteiro para o capital industrial.2S'I' capitalista, a saber, ~ capital usurário e o capital mercantil. '
235 O tempo de Cromwell é uma exceçio a êsse respeito. Enquanto
durou a república, a massa do povo inglês, em tMas as suas cama.-
das, ergueu-se acima. da degradação a que fOra lançada. pelos Tudors. "Atualmente, t6da a riqueza da sociedade vai para as mãos
238 Tucltett sabe que a moderna indústria de li surgiu das manu.- do capitalista •.. ~le paga a renda da terra ao proprietário, o sa-
.. faturas. propriamente ditas e da destruição das ind11stria.s ruraiS ou lário ao trabalhador, os tributos ao coletor de impostos e de dí-
domésticas (TUcltett, 1. c., v. I, páp. 139 a 144). "O arado, o jugo
eram invenções dos deuses e Instrumentos de trabalho dos heróis. zimos e guarda para si mesmo grande parte do produto anual
O tear, o fUso e a roca. serão por acaso de origem menos nobre? do trabalho, na reatidade a parte maior que aumenta cada dia.
'Separa! a roca e o arado, o ft:'JO e o jugo, e tereis fábricas e asilos Hoje, pode-se dizer que o capitalista é quem primeiro se apro-
de Indigentes, crédito e pânico, duas nações inimigas, uma agricola pria de tôda li riqueza social, embora nenhuma lei lhe tenha con-
e outra comercial" (David Urquha.rt, 1. c" p. 122). Aparece entá.o cedido ê5se direito. " Essa mudança na propriedade ocorreu em
Carey e acusa a Inglaterra. com razão, de procurar transformar os
demais paíSes em nações puramente agrícolas, das quais a Inglaterra
panhia, lembram Deus interrOgando Cairo a respeito do irmão Abel
é o fornecedor industrial, Sustenta êle que a Turqufa. foi por Isso
desaparecido, ao perguntarEm aos aristocratas inglêses, donOs daa
arruinada. pois a Inglaterra impediu "aos proprietários e cultivado-
terras, para onde foram os milhares de freeholders (proprietáriO!!! de
res do solo turco fortalecerem-se por meio da alianÇa natural entre s16dio) que existiam antigamente. Seria. melhor que êsses filantro-
o arado e o tear, o martelo e a grade ("'I'he Slave 'rrade", p. 125), pos e liberais perguntassem a 51 mesmos de onde é que vieram, &e-
Segundo êle, o próprio Urquhart é um dos principais agentes da ruí- não da destruição daqueles freeholders, e que fôssem mais adiante,
na da. Turquia., onde fêz propaganda do livre-cambiamo para servir procurando saber para onde foram os tecelões, fiandefros e artesãos
aos interêsses da Inglaterra.. O melhor é que Carey, aliás um grande independentes .
russófilo, quer impedir com o sistema de proteção aduaneira o pro-
cesso de dissociação, que o sistema protecionista. acelera.. 238 Industrial aqUi se opõe a agricola. Mas, o arrendatário agricola
237 Os filantropos da economia inglêsa, como MiIl, Rogers. Goldwin .. se inclui na categoria de capitalista industi:'ial, do mesmo modo que
Smith e Fawcett, e os fabricantes liberais, como John Bright e com- o fabricante.

866
867
virtude da cobrança de juros s&re o capital~ .. e admira que os
legisladores de tóda a Europa tenham procurado impedir Isso por v-r ,{ ti';' " _ ». .... ~ ,J :: I ') ~ (~y : '1 ._~ r,,, ~
meio de leis contra a usura... O poder do capitalista sabre t6da
terra. Na Inglaterra, nos fins' do ~culo XVII, são coordenados
a riqueza do país significa uma revolução completa DO direito de
-1través de vários sistemas: o colonial, o das díVldas '-ptiblic~_o,__
• mcderno regime tributário e o protecionismo. f:sses métOdos S~
propriedade; mas, por que lei ou por que série de leis foi ela
efetivada?" 239
baseiam em parte na violência màis brutal, como é o caso do
sistema COlonial. Mas, todos êles utilizavam o poder do estado, a
o autor deveria ter visto que revoluções não se fazem com fôrça concentrada e organizada da sociedade para ativar artificial.
leis. mente o processo de transformação do modo feudal de produção
00 modo capitalista, abreviando assim as etapas de transição. A
rã capital dinheiro formado por meio da USUfa e do comércio força é o parteiro de tôda SOCiedade velha que traz uma nova em
li era 1inpedido de se transformar em capital industrial pelo sistema
suas entranhas. Ela mesma é- uma potência econômica.
feudal no campo e pela organizaçio corporativa na cidade~1jsses
entraves caíram com a dissolução das vassalagens feuda1i, com a A propósito do sistema colonial cristão, diz W. Howitt, que
se especializou em cristianismo:
expropriação e a ex.pulsão parcial das pOpUlações rurais':}As novas
manufaturas instalaram-se nos portos marítimos ligados' ao comér-
cio de exporta.çl.o ou em pontos do interior do país fora do contrale
do velho sistema urbano e da organização corporativa. Verificou- "As barbaridades e as implacáveis atrocidades praticadas p{'_
se, então, na Inglaterra, uma luta exasperada entre as cidades Jas chamadas nações cristãs, em tôdas as regiões do Inundo e con-
corV9rativas e êsses novos centros manufatureiros. tra todos os povos que elas conseguem submetar, não encontram
.fts descobertas de ouro e de prata na América, o extermínio, paralelo em nenhum período da história universal, em nenhuma
a escravização das populações indígenas, forçadas a trabalhar no -velado.por
raça, mais feroz, ignorante, cruel e cínica que se tenha T{'-
"241
., interior das minas, o inicio da conquista e pilhagem das lndias
Orientais e a transformação da África num vasto campo de caça-
da lucrativa são os acontecimentos que marcam os albores da era
• da produção capitalistaJ:esses ~Jdllicos ~º- ..fª~~_hfu.:n­ A história da colonização holandesa, e a Holanda foi a na-
damcntais da acumul~o _primitiva. Logo segue a guerra comer- ção capitalista modelar do século XVII, "desenrola aos nossos olhos
Cial entre âS naÇões emc;Péias, tendo o mundo por palco. IDiciHe Um quadro insuperável de traições, corrupções, massacres e vile-
cc'm a revolução dos Países Baixos contra a Espanha, assume enor- zas. "242 Caracteriza bem essa colonização o sistema de roubo de
mes dimensões com a guerra antijacobina da Inglaterra, prossegue sêres humanos em Célebes, a fim de prover Java com escravos.
com a guerra do ópio contra a China etc. Os raptores eram treinados para essa profissão. O raptor, o intér-
Os diferentes meios propulsores da acumulação primitiva se prete e o vendedor eram os agentes principais dêsse comércio.
repartem numa ordem mais 01.1 mellOs cronológica DOr diferentes sendo os prínCipes nativos os. principais vendedores. Os menino~
países, Espanha, Portugal, HOlanda, F~a e raptados eram escondidos nas cadeias secretas de Célebes até q U~

239 "The Na~ Imd Art1f1cl.al Rlghts of ~ ~". 241 William Howitt. "Colonlzatíon and Chrlstianity. A Popular His-
Londres, 18.2. páp. 98 e 911. Obra Imõmma, mas CUjo autor é 'l'h. tory of the Treatment of the Nat1ves by the Europeans in aI! theír
Hodpk1n. Colonies", Londres, 1838, p. 9. Encontra-se uma boa comollação sóbre
240 Ainda. em 1"194, OS pequenos fabricantes d.e panos, da cidade de o tratamento dado aOs escravos, em Charles Comte, "Tralté de la
Leeds, mandlmlm uma delepçi.o ao Parlamento pcIn. pedir uma. lei Législation". 2.- ed., Bruxelas, 1837. Temos de {'studá-Ia detidamen_
que prmb1sae todo comerciante de se tnnaformar em f~te (dou- te, para ver o que o burguês faz de .si mpsmo e do trabalhador,
tor ~ 1. c.). Quando fica à sua vontade para mOdelar o mundo li. sua imagem e
semelhança.

868 "I" "The History of Java". Londres, 1817, rv. n, Págs. CXC e CXCIJ.
por Thomas Stamford Raffles, mais tarde gOVernador des~.a ilha.

869
estivessem na idade de serem expedidos para os navios de escra- esterlinasl 13ntre 1769 e 1770, os inglêses fabricaram na lndia uma
vos. Diz um relatório oficial: epidemia de fome, açambarcando todo o arroz e retardando de
pois sua. venda, de modo a obter preços fabulosos. 243
O tratamento que se dava aos nativos era naturalmente mais
"Só a cidade de Macassar, por exemplo, está cheia de pri- terrível nas plantações destinadas apenas aO comércio de exporta-
sões secretas, uma mais horrenda que a outra, entulhadas de mi- ção, como as das lndias Ocidentais, e nos países ricos e densamen-
seráveis, vítimas da cupidez e da tirania, postos a ferros, violen- te povoados, entregues à matança· e à pilhagem, como México e
tamente arrancados de suas famílias". índias Orientais. Todavia, mesmo nas colônias propriamente ditas,
não se desmentia o espírito cristão da acumulação primitiva. Aquê-
les protestantes virtuosos e austeros,os.puritanos d~.Noyl'l.lngla.-
Para se apoderar de Malaca, os holandeses subornaram o go- ·.lerra, estabeleceram, em 1703, por deliberação de . sua assembléia,
vernador portu~uês que, em 1641, os deixou entrar na cidade. prêmio de 40 libras esterlinas por cada escalpo. ~.~. j>elc;::.vermelha
Correram logo a sua casa, assassinaram-no, a fim de "se absterem .:.Qu por çaqa pele-vermelha feito prisioneiro;. em 1720, Um prêmio
de lhe pagar a soma do subômo, 21.875 libras esterlinas. Onde . ~e 100 libras por cada escalpo; em 1744, depois de Massachuseus..
punham o pé, vinham a devastação e o despovoamento. Banjuwangi, Bay ter declarado certa tribo em rebelião, os seguin~es preços:
província de Java, tinha, em 1750, 80.000 habitantes e, em 1811,'" 100 libras de nova cunhagem por escalpo masculino, de 12 anos
apenas 8. 000. ~te era o doce comércio. ou mais; 105 libras por homem capturado e 50 libras por mulher
A Companhia Inglêsa das índias Orientais, como se sabe, obte". ou criança capturada; por escalpo de mulheres ou de crianças. 50
ve, além do poder político na índia, o monopólio exclusivo do \, /' libras! Algumas décadas mais tarde, o sistema colonial descarregou
" comércio de chá, do comércio chinês em geral e do transporte de \ . sua ferocidade sõbre os descendentes dêsses piedosos colonizadores.
mercadorias da Europa e para a Europa. Mas, a navegação cos- . os Pilgrim Fathers. Instigados e pagos pelos inglêses. os índios
teira da índia e entre as ilhas, o comércio do interior da índia.· empenhavam-se em matá-los com seus machados de guerra. O Par-
se tornaram monopólio dos .altos funcionários da companhia. Os lamento inglês considerou o cão policial e o escalpo. "meios que
li monopólios de sal, ópio, ,.!>éter. e de outras mercadorias eram minas Deus e a natureza puseram em suas mãos."
inesgotáveis de enriquecimento. Os pr6prios funcionários fixavam O sistema colonial. fêz prosperar o comércio e a navegação;'.
os preços e esfolavam a seu bel-prazer os infelizes hindus. O gover- • ~~.Qciedade.sJ:lotadas demonopQlio, de que já falava lutero,_er~; '}
nador-geral tomava parte nesses negócios particulares. Seus favori- eoderosas alavancas de conc€:!ntI:ação....d'LÇ~pi.tªl. As colônias as-···
a tos obtinham contratos sob condições em que, . mais sagazes que .. seguravam mercado às manufaturas em expansão e. graças ao mo-
cs alquimistas, faziam ouro de nada.· Grandes fortunas brotavam nopólio, uma acumulação acelerada. As riquezas apresadas fOra
num dia como cogumelos; processava-se a acumulação primitiva da Europa pela pilhagem, escravização e massacre refluíam para
sem ser necessário desembolsar um centavo. O processo judi- a metrópole onde se transformavam em capital. Â __ !:!ol.an4a._qgç..l
cial contra Warren Hastings está repleto dêsses exemplos. Cita- pe~1iOOeira.vez, desenvolveu plenamente o sistema colonial atin-
remos apenas um caso. Certo Sullivan conseguiu um contrato de grr.aJ...?ml648, o apogeu de sua grandeza comercial. Tinha então·
ópio no momento em que tinha de viajar em função oficial para
uma parte da lndia muito afastada das zon~ onde se produz a
mercadoria. Sullivan vende seu contrato por 40.000 libras esterli- "a posse quase exclusiva do comercIO das índias Orientais <-
nas a Binn, êste transfere-o no mesmo dia por 60.000 libras e o do intercâmbio entre o sudoeste e o nordeste da Europa. Sua in.
último cessionário e executor do contrato declara que ainda con-
seguiu um lucro descomunal. Segundo uma lista apresentada aO 243 Em 1866, morreram de fome mais de um milhão de hindus numa
Parlamento, a Companhia e seus funcionários, de 1757 a 1766, única. provincia, R de OmsR. Não obstante, procurou-se enriquecer
conseguiram que os hindus lhes presenteassem 6 milhões de libras o erário com os preços R que se vendiam os gêneros à. gente faminta.

87() 871
dústria de pesca, a marinha e as manufaturas ultrapassavam as
de qualquer outro pais. Os capitais da república holandesa eram .se fôssem dinheiro. A dívida pública criou uma classe de capitalis-
talvez superiores aos de tôda a Europa reunidos". tas ociosos, enriqueceu, de improviso, os agentes financeiros qlle
\ ..:;: servem de intermediários entre o govêrno e 11. nat;ã.o. As parcelas,
de sua emissão adquiridas pelos arrematantes de impostos, coma-
Gülich esquece de acrescentar que, em 1648, o povo holand&' ..c')
" ciantes e fabricantes particulares lhes proporcionam o serviço de
era o mais sobrecarregado de trabalho, o mais pobre e o mais brutal~
um capital caído do céu. Mas, além de tudo isso, a dívida pública
mente oprimido de tôda a E u r o p a . '
fêz prosperar as sociedades anônimas, o comércio com os títulos
. Hei!.
.em dia, a supremacia industrial ~ a supremacia co-
negociáveis de tôda espécie, a agiotagem, em suma, o jôgo de bôlsa
~: mercialJJ.!0 periodo manufatureirt), ao contrário, é a supremacia e a moderna banc::ocracia. .
comercial que proporciona o predomwo industriáQ
Entio, o siste-
ma colonial desempenhava o papeLpre~~~te~, Era O' "deus Desde sua origem, os grandes bancos omadOs com títulos na-
estraDFtro" que subiu aõãr'tü' o . se encontravam os velhos cionais não passavam de sociedades de especuladores particulares
ídolos da Europa e, um belo dia, com um empurrão, joga a todos que cooperavam com os governos e, graças aos privilégios recebi-
"
êles por terra. Procl8.mÓU a produçio da mais valia último e único dos, ficavam em condições de' adiantar-lhes dinheiro. Por isso. a

,.,. 'º.
objetivo da bumanidade.
sistema de crédito público, isto é. da dívida pública, cujas
origens j' vamos encontrar na Idade Média, em Ganova e Veneza,
acumulação da dívida pública tem sua mensuração mais infalível
nas altas sucessivas das ações dêsses bancos, que se desenvolvem
plenamente a partir da fundação do Banco da Inglaterra, em J 694.
apoderou-se de tôda a Europa durante o período manufatureiro. O Banco da Inglaterra começou emprestando seu dinheiro ao go-
ImpuIsionava-o o sistema colonial com seu comércio I;IWinmo e vêrno a juros de 8%; ao mesmo tempo foi autorizado pelo .Par-
,.
.. - , suas guerras comerciais. O regime de dívida pública implantou-se lamento a cunhar moedas utilizando o capital emprestado ao go_
primeiro na Holanda. A dívida do estado, a venda dêstC, seja êle vêrno. Passou então a emprestar o mesmo capital ao público sob
'"" despótico, constitucional ou republicano, imprime sua marca à era
capitalista. A única parte dacha!n.ada _riqlleZll n~~º~Lque é real-
a forma de bilhetes de banco, tendo sido autorizado a utilizar êsses
bilhetes para descontar letras, emprestar com garantia de mercado-
mente objetO '~põiSê' êO~8.~oo.._povosmõdemos é... la.' diVifi' rias e comprar metais preciosos. Não passou muito tempo para
·púbfiéà.2Caa Por isso, a doutrina moderna .revela _coerênci~_~!Íei~ o banco fazer empréstimos ao estado neSSa moeda fiduciária que
ao sustentar que uma nação é tanto. mais _!i~.Jl~t~L.!D~ está. fabricava e para pagar com ela, por conta do estado, os juros da
endividada. O crédito público toma-se o credo do capital. Ir o dívida pública. Não bastava que o banco recebesse muito mais
pecado contra o Espírito Santo, para o qual não há perdio, é do que dava; ainda recebendo, continuaVa credor eterno da nação
substituído pelo de não ter f~ na dívida pública. até o último centavo adiantado. Progressivamente tornou-se o
., '\ r A dívida pública converte-se numa das alavancas mais pode-
rosas da acumulação primitiva:'1 Como uma varinha de condão, ela
guardião inevitável dos' tesouros metálicos do país e o céntro de
gravitação de todo o crédito comercial. Na Inglaterra, quando dei-
dota o dinheiro de. capacidacIe criadora, transformando-o assim xaram de queimar feiticeiras, começaram a enforcar falsificad~res .
em capital, sem ser necessário que seu dono se exponha aOS abor- de bilhetes de banco. Os documentos da época, notadamente os
recimentos e riscos das aplicações industriais e mes- .escritos de Bolingbroke, põem em evidência a impressão causada
mo usurárias. Os credores do estado nada dão· na realidade, pois lIÔbre seus contemporâneos por essa fauna, que aparece subitamen-
a soma emprestada converte-se em títulos de dívida pública freil- te, de bancocratas, agentes financeiros, rentiers, corretores, agiotas
mente transferíveis, que continuam a funcionar em suas mãos como e Iôbos de bôlsaJM3b

243" WW!am Cobbett observa que na Inglaterra. chamam de' "~..


tódu u fnstitu.lç6es ptíbllcas. mas em compensação chamam. de "na-- %43b "Se os tártaros inundassem hoje a Europa seria. muito difícil
clonsl" a. divida. púbLica . explicar-lhes o que é entre nós um. agente !1na.nceiro" (Montesquieu.
"Esprit des lois", t. IV, p. 33, ed. Londres, 1769).
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Com a dívida pública nasceu um sistema internacional de O grande papel que a dívida pública e o' correspondente re-
crédito, que freqüentemente dissimulava uma das fontes da acumu- gime fiscal desempenham na capitalização da riqueza e na ex-
lação primitiva neste ou naquele país. Assim, as vilezas do sistema li propriação das massas levou muitos escritores, como Cobbett,
veneziano de rapina constituíram uma das bases ocultas dos Doubleday e outros, a procurarem erradamente nêles li causa fun-
abundantes capitais da Holanda, a quem Veneza decadente em- damental da miséria dos povos modernos .
prestou grandes somas de dinheiro. O mesmo aconteceu entre ã\ ..~ @ sistema protecionista era um meio artificial de fabricar
Holanda e a Inglaterra. Já no comêço do século XVIII. as ma- fabricantes, de expropriar trabalhadores independentes. de capitalizar
nufaturas da Holanda tinham sido bastante ultrapassadas, e a meios de produçio e meios de subsistência. de encurtar a transição
Holanda cessara de ser a nação dominante no comércio e na indús- do velho modo de produção para o modemo]esse invento lcriOU
tria. De 1701 a 1776, um de seus negócios principais é, por isso, uma grande disputa entre OS estados europeus. que, uma vez colo-
emprestar epormes capitais, especialmente a seu concorrente mai!\J cadQS a serviços dos fabricantes de mais valia. do se limitaram a
I=0deroso, a Inglaterra. Fenômeno análogo sucede hoje entre Ingla- espoliar seu próprio povo, indiretam~nte através de impostos adua-
terra e Estados Unidos. Muito capital que aparece hoje nos Esta- neiros e diretamente através de premios à exportàçio etc. Nos
dos Unidos, sem certidão' de nascimento, era ontem, na Inglaterra, países secundários deles dependentes, extirparam violentamente ta ..
sangue infantil capitalizado. da indústria. como foi o caso por exemplo da manufatura de Jã
Apoiando-se a dívida pública na receita pública, que tem irlandesa eliminada pela Inglaterra. No continente europeu o. pro-
de cobrir os juros e demais pagamentos anuais, tornou-se o mo- cesso foi muito mais simplificado, de acaróo com o modêlo de
derno sistema tributário o complemento indispensável do sistema Colbert. Aí o capital primitivo do industrial flui em parte direta-
de empréstimos nacionais. Os empréstimos capacitam o govêmo mente do erário público,
a enfrentar despesas extraordinárias, sem recorrer imediatamente
ao contribuinte, mas acabam levando o govêrno a aumentar pos-
teriormente c.s impostos. Por outro lado, o aumento de impostos, "Por que", pergunta 'Mirabeau, "jr tio longe procurar a cau-
sa do esplendor manufatureim da Sax6nia antes da Guerra dos
<::ausado pela acumulação de dívidas sucessivamente contraídas,
Sete ÂnOS? 180 mi1hões de dívidas contraídas pelos IIOberanos'''2U
força o govêrno a tomar novos empréstimos sempre que aparecem
novas despesas extraordinárias. O regime fiscal moderno encontra
seu eixo nos impostos que recaem sôbre o meios de subsistência O sistema colonial. a dívida pública, os impostos pesados, o
mais necessários, encarecendo-os portanto, e traz em si mesmo o protecionismo, as guerras comerciais etc., êsses rebentos do perío-
germe da progressão automática. A. tributação exceJsiv.a_..pãº.J_ ., do manufatureiro desenvolvem-se extraordinAriamente no período
_tlm incidente; é um princípio. Na Holanda onde se implantou êsse infantil da indústria moderna. Festeja-se o nascimento desta com
regfnie pela primeira vez, o grande patriota de Witt louvou-o em '_/'ó grande rapto herodiano de crianças. As fábricas, como a marinha
suas máximas, proclamando-o o melhor sistema para manter o real, recrutam seus contingentes à fôrça. Embora indiferente aos
assalariado submisso, frugal, ativo e... sobrecarregado de traba- horrores da expropriação da gente do campo, desde o útimo têrço
lho. Mas não é a influência destruidora que exerce sôbre a situa- do século XV até sua época, fins do século XVIII, embora se sen-
ção dos trabalhadores o que mais importa ao estudo do tema que tisse feliz considerando êsse pr0<::es50 "necessário" para estabelecer
estamos considerando, e sim a violência com que expropria o cam- a a.gricultura capitalista e "a correta proporção entre terras de la-
ponês. o artesão, enfim todos os componentes da classe média in- voura e da pastagem" - Sir F. M. Eden jánio utiliza o mesmo
ferior. Sôbre o assunto não há duas opiniões, nem mesmo entre raciocínio econômico relativamente à necessidade do· roubo e da
os eccnoÍnistas burgueses. Sua eficácia expropriante é ainda for-
talecida pelo sistema protecionista, que constitui uma de suas par- 244 ''PotIl'qUOi &!.ler chercher ai 10m la cauáe de l'éclat msmutacturiet
tes integrantes. de la SUe avant la gue.rre? Cent quatre-vingt milUona de WiIttes
flÚtes par lei souverains'" (Mirabeau, 1. c .• t. VI, p. 1(1).

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tra~ dtO tortura e muitas vêzes dt' morte!... Os lucros dos fabri-
escravização das crianças para transformar a exploração manufa- mntes eram enormes, mas isto apenas aguçava-lhes a voracidade
tUJeira em exploração industrial e estabelecer assim a COrreta pro- lupina. Começaram então a prática do trabalho noturno, reve-
pOrção entre capital e fôrça de trabalho. Diz êle: zandu. sem solução de continuidade, a turma do dia pela da noi-
te; (J gnlpo diurno ia se estender nas camas ainda quentes que
o grupo noturno acabara de deixar, e vice-versa. Todo mundo
":E; uma qüestão fJlle pmvàvelmente merece a consideração • diz em Lancashire q~e as camas nunca t'sfriam".246
rln pílblico, a de saber se pode aumentar a soma de felicidade na-
cional e individual uma manufatura que, para funcionar com su-
cesso, precisa arrancar pobres crianças de choupanas e de asilos, Com o desenvolvimento da prodUção capitalista durante o
empregá-las em turmas que se revezam durante a maior parte da período manufatureiro perdeu a opinião pública européia o que
noite, roubando-lhes o repouso indispensável e, além disso, tem lhe restara de pudor e de consciência. As nações se jactavam cinica-
de juntar pessoas de sexo, idade e inclinações diferentes, de tal mente com cada ignomínia que lhe servisse para acumular capital.
maneira que o convívio com os maus exemplos impele-as neces- Vejamos, por exemplo, os ingênuos anais do comércio. do probo
sàriamente à depravação e à libertinagem". 245 "Em Derbyshire, 'A. Anderson. Aí trombeteia-se como triunfo da sabedoria política
Nottinghamshire e sobretudo em Lancashire", diz Fielden, "a
ter a Inglaterra, na paz de Utrecht, extorquido dos espanhóis, com
maquinaria recentemente inventada foi utilizada em grandes fá-
hricas construídas à margem de correntes capazes de fazerem o tratado de Asiento, o privilégio de explorar o tráfico negreiro
funcionar a roda hidráulica. Milhares de braços tornaram-se de entre África e América Espanhola, o qual ela realizara até então
súbito necessários nesses lugares, distantes das cidades; e Lan- apenas entre África e lndias Ocidentais Inglêsas. A Inglaterra con-
cashire, em especial, até então relativamente pouco povoada e im- seguiu a cOncessão de fornecer anualmente à América Espanhola,
produtiva, tinha necessidade premente de uma população. Procura-
vam-se principalmente dedos pequenos e ágeis. Por isso surgiu logo
o costume de requisitar aprendizes (!) dos diversos asilos paro- ~.8 Jobn Fielden, 1. c., páp. 5 e 6. Sóbre as to~ lniciaJa do aia-
quiais dt' pobres, em Londres, Birmingham e em outras cidades. tema fabril, 'lide doutor Aikin. 1795, 1. c., p. 219, e Giabarne, "En-
Muitos, muitos milhares dêsses pequenos sêres infelizes, de 7 a quJ.ry into tbe dutie.! of men", 1795, v. Ir. - Tendo a máquina. a
13 ou 14 anos, foram despachados para o Norte. O costume era vapor transplantado as fábricas das zonas ruraia onde havia. qUedM
o mestre" (o ladrão de crianças.> "vesti-los, alimentá-los e alojá- d'água para. as cidades, o produtor da. maia vaUa. com seu espfrito
de renúncia., abSteve-se de requisitar como escravos as crta.nçaa doa
los na casa de aprendizes junto à fábrica. Foram deSignados su-
asilos, tIm1i vez que passou a ter à mio o material infantil. - Quan-
pervisores para lhes vigiar o trabalho. Era interêsse dêsses feitores
do, em uns. Sir R. Peel, pai do ministro da pla.us1bUldade, apre-
de escravos fazerem as crianças trabalhar o máximo possível, pois
sentou seu projeto de lei de proteção à criança. F. Homer, o lúmen
sua remuneração era proporcional à quantidade de trabalho que
do comitê monetário e íntimo amigo de Ricardo, declarou ns. Oi-
delas podiam extrair. A conseqüência natural disso era a cruelda- mara. dos Comuns: "Em certa. falência, e êsse fato é público e no-
de ... Em muitos distritos industriais, especialmente Lancashire, em- tório. uma malta.. se me permitem usa.r a palavra, de crianças de
pregavam-se torturas de dilacerar o coração, contra essas crianças fábricas foi anunciada e leiloada em hasta. pública. como parte da.
inofensivas e desamparadas, conSignadas ao dono da fábrica. Es- massa falida. m dois anos. em 1813. foi à Côrte Suprema. um sórdi-
gotadas por excesso de trabalho até à morte ... eram açoitadas, do C!lIlO de meninos aue uma naroouta. de Lonfires entrega.ra. como
postas a ferro e torturadas com esquisitos requintes de perversi- anrendizes a. um fabricante e êste os trlULc;ferra a outro. Foram nor
dade; em muitos casos ficavam à míngua de alimentos até apa- fim encon~dos em estAdo de comolp.ta manlcão nor neR<:oas dota,.
recerem os ossos, sendo obrigadas a trabalhar a chicote... Sim, das de sentimento de humanidade .. 011tro cuo. mais Sórrilrln alnt1a.
em alguns casos as crianças foram impelidas ao suicídio!... Os chP"O'ou a meu conhecimento. auando membro de uma. coml.ssão nar-
belos e românticos vales de Derbysnire, Nottinghamshire e Lan- lllmenta.r de inauérito. Não há muitos anos, uma. pai6quia. de Lon-
drf'S e um fabricante de Lancashire fizeram um contrato em Que se
cashire, segregados ao público, converteram-se em solidões sinis-
estlnulava que uma cT1!l.nça idiota seria Incluída. em cada lote de
20 sadias."
~4:, Eden. 1. c. v. II. capo I. p. 421.
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87f1
até o aoo de 1743, 4.800 negros. Isto servia, aO mesmo tempu, "vem ao mundo com uma mancha natural de sang"Je numa de sua;;
para encobrir sob o manto oficial o contrabando britânico. Na ... faces",249 o capital, ao surgir, escorrem-ihe sangue e sujeira por
base do tráfico negreiro. l-iverpool teve um grande crescimento. O lodos os poros, da cabeça aOs pés. 250
tráfico constituía seu método de .acumulaçã9primítiy~.: E até hoje
a "gente respeitável" de Liverpcol canta Ioas aO tráfico negreiro
(vide a obra do doutor Aikin. de J795. já citada), o qual "incen. 7. TENOÊNCIA HISTÓRICA OA ACUMULAÇÃO CAPITALISTA
tiva até à paixão o espírito de empreendimento comercial. gera
famosos marinheiros e traz grandes fortunas". Liverpool emprega-
li A que se reduz, em última análise, a acumu.la~ão primitiva,
va 15 navios no tráfico negreiro, em 1730; 53, em 1751; 74, em
a origem histórica do capital? Quando não é transformação direta
1760; 96, em 1770, e 132. em 1792.
de escravos e servos em assalariados, mera mudança de forma,
A indústria algodoeira têxtil, aO introduzir a escravidão in··
., significa apenas a expropriação dos produtores diretos. isto é, a
fanti! na Inglaterra impulsionava ao mesmo tempo a transfo~
dissolução da propriedade !>rivada baseada no trabalho pessoal,
., ção da escravatura negra dos Estados Unidos que, antes, era mallt
próprio.
ou menos patriarcal, num sistema de exploração mercantil,. De fa-
A propriedade privada. antítese da propriedade coletiva, so-
to, a escravidão dissimulada dos assalariados na Europa precisava
• dal, só existe quando o instrumental e as outras condições exter-
fundamentar-se na escravatura. sem rebuços, no Nôvo MundO. 247
nas do trabalho pertencem. a particulares. Assume caráter diferen-
Com tão imenso custo. estaheleceram..se as "eternas leis na ..
te conforme êsses particulares sejam trabalhadores ou não. Os ma-
lurais" do modo capitalista de produção. completou-se o processo
.tizes inumeráveis que a propriédadc privada oferece à primeira
de dissociação entre trabalh3.dore~ e suas condições de trabalho,
vista refletem apenas os estados intermediários que existem entre
os meios sociais de produção e de subsistência se transformaram
• êsses dois extremos, a propriedade privada de trabalhadores e a
em capital, num pólo, e. no p610 oposto, a massa da população se
de náo-trabalhadores.
ccnverteu em assalariados livres. em "pobres que trabalham", essa
cbra..prima da indústria moderna.~~' Se_ o dinheiro, segundo Augier, A propriedade privada do trabalhador sôbre os meios de pro-
.dução serve de base à pequena indústria, e esta é uma condição ne-
~H Em 1790, havia, nas índias Ocidentais InglêBas, 10 escravos par~ cessária para desenvolver-se a produção social e a livre individuali-
I homem livre; nas france:;:ts. 14 para 1; nas holandesas, 23 para 1
IHenry Brougham, "An Il1qulry Into the Colonial Policy of the Eu- admira. que se vendesse pelo melhor preço do mercado! O Rev. Tu-
rcpean Powers", Edimburgo. 1803. V. IT, p. 74). ker, pastor protestante e tory, homem honesto e competente econo-
~{" A expressão "labouring poar" (pobres que trabalham) aparece mista político, apresenta. em seus escritos. um bom retra.to de Edmund
na legislação inglêsa desde quando a classe dos trabalhadores assala- Burke, no tempo em que. êste era paladino do liberaJ.ismo. Em face
riados começa a despertar ateonçáo. Os "Iabouring poor" se distin- da vergonhosa falta de caráter que reina hoje em dia e da. devoção
guem dos "jdle poor", mendigos etc., e dos trabalhadores que ainda total às "leis do comércio", é necessário estigmatizar os burkes que só
não foram despojados, proprletár:os. portanto, do seu lnstrument'il "fi se distinguem de seus sucessores por uma coisa: o talento.
de trabalho. Do domínio legal, a expressão "Iabourtng poor" passou ~t~ Marie Augler, "Du Crédit Public", [Paris, 1842, p. 265].
para a economia pol!tica e foi sendo utilizada por CUlpe.per, J. Child ~,,() "O Quarterly Reviewe.r diz que o capital foge à turbUlência e à.
etc. até A. Smith e Eden. Por ai se vê a "boa fé" 00 "execrável cizânia, sendo tímido por natureza. Isto é apenas parte da verdade.
embusteiro político"~dmund Bllrl!:~, quando classifica a expressão O capital tem horror à auSência de lucro ou ao lucro muito pequeno,
"labounng poor'>dé "execrável embuste politico". l!:sse sicofa.nta, que como a natureza tem horror ao vácuo. Com lucro adequado, o capi-
a sôldo da oligarquia inglêsa ba.ncou o adverSário romântico da tnl cria coragem. Dez por cento certos, e fica as..ooegurado seu emprê-
revolução francesa, do mesmo modo que, a sôldo das colônias norte~ go em qualquer parte; com 20%, infla-se de entusiasmo; com 50%,
americanas, no início dos tumultos que lá se desencadearam, desem- é positivamente audacioso; com 100%, calca a seus pés tôdas as leis
penhou o papel de liberal contra a oligarqUia inglêsa, não passava, humanas; com 300%, não se detém diante de nenhum crime, mesmo
-\ de um burguês ordinário e completo: "As leis do comércio são as sob o risco da fôrca. Se a turbulência e a cizânia. produzem lucros,
...\ leis da natureza e conseqüentemente as leis de Deus" (E. Burke, 1. encorajará a ambas. Prova: contrabando e tráfico de escravos" (T.
c., )JiigS. 31 e 32). Sendo fiel às leis de Deus e da natureza. não J. Dunning, 1. c., págs. 35 e 36) .

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dade do traballwlor. Sem dúvida, encontramos essa pequena m-
dústria nos sistemas de escravatura, servidão e em outras relações DesinteJfada a velha sociedade, de alto a baixo, por êsse pro-
de dependência. Mas, ela só floreSce, só desenvolve tôdas as suas celSO de tnmsformação, comertidos os trabalhadores em proletá-
energias, só conquista a adequada forma clássica quando o traba. ri~ e suas condições de trubafuo em capital, pôsto o modo capi.
Ihador é o proprietário livre das condições de trabalho (meios e talista de produção a andlu' com seus próprios pés, passa a des-
objeto de trabalho)· com as quais opera, a saber, o camponês i'1 dobrar-se outra etapa em qlle prosseguem, sob nova forma, a so-
cialização do trabalho, a conversão d~ solo e de outros meios de
dono da terra que cultiva, o artesão, dos instrumentos que maneja!
com perícia. produção em meios de produção coletivamente empregados, em
&se modo de produção supõe parcelamento da terra e disper- comum, e, conseqüentemente, a expropriação dos proprietários par-
são dos demais meios de produção. Exclui. além da concentração ticulares. O que tem de ser expropriado agora não é mais aquêle
• trabalhador independente e sim o capitalista que explora muitos
dêsses meios, a cooperação, a diVisão do trabalho .dentro do mes·
mo processo de produção, o domínio social e o contrôle da nature- trabalhadores.
za, o livre desenvolvimento das fôrças produtivas da sociedade. Só Essa expropriação se opera pela ação das leis imanentes à r,
é compativel com lámitaçóes estreitas e ingênuas à produção e à própria produção capitalista, pela centralização dos capitais. Cadi'
soc:i.edade. Pretender eternizá-lo significaria, conforme a acertada • capitalista.elimina.~ui~os .outros capitalistu. Ao lado dessa cen-
expressio de Pec::quer, "decretar a mediocridade universal". Chega~ tralização oU da expropriação de muitos capitalistas por poucos.
• do a certo grau de desenvolvimento, êsse modo de produção gera/, desenvolve-se, cada vez mais, a forma cooperativa do processo de
os meios materiais de seu próprio aniquilamento. A partir dêsse trabalho, a aplicação consciente da ciência ao progresso tecno· ~.-<

momento agitam-se no seio da sociedade fôrças e paixões que se lógico, a exploração planejada do solo, a transformação dos meios I
• sentem acorrentadas por êle. Tem de ser destruído e é destruído. de trabalho em meios que só podem ser utilizados em comum,. ..J
Sua destruição, a transformação dos meios de produção individual·~ o empr!go econômico de todos os meios de produção manejados
mente dispersos em meios socialmente concentrados, da proprie- pelo trabalho combinado, social, o envolvimento de todos os po-
dade minúscula de muitos na propriedade gigantesca de poucos; ) vos na rêde do mercado mundial e, com isso, o caráter internacio-
a expropriação da grande massa' da pOptdação, despojada de suas v nal do regime capitalista. À medida que diminui o número dos
terras, de seus meios de subsistência e de seus instrumentos de • magnatas capitalistas que usurpam e monopolizam tôdas as wan-
.. trabalho. essa temvel e difícil expropriação, constitui a pré-hist6- tqettS dêsse Processo de transformação, aumentam a miséria, a
ria do capital. Ela se realiza através de uma série de métodos vio- a
opiessio, escravização, a degradação, a exploraçãe; mas. cresce
lentos dqs quais examinamos apenas aquêles que marcaram sua .. t1mlbém li revolta da classe trabalhadora,~ada vez. m~n~~r~.~
época como processos de acumulação primitiva do capital. A ex· disciplinada, umida e organizada peÍo mecanismo do pr6prio pro-
propriação do produtor direto é levada a cabo com o vandalismo Cesso capitalista de produção.[O monopólio do capital passa a eri~
mais implacável, sob o impulso das paixões mais infames, mais travar o modo de produção que floresceu com êle e sob êleJ A
vis e mais mesquinhamente odiosas.(A propriedade privada, ob.tida centralização dos meios de produção e a socialização do trabalho
I> alcançam um ponto em que se tomam incompatíveis com o envol-
com o esfôrço pessoal, baseada por assim dizer na identificação J
do trabalhador individual isolado e independente com suas condi- tório capitalista. O inv61ucro rompe-se. Soa a hora fin~l da proprie-
ções de trabalho, é implantada pela propriedade capitalista, fun- dade particular capitalista. Os expropriadores são expropriados.
damentada na exploração do trabalho alheio, livre a~nas for- O modo capitalista de apropriar-se dos bens, decorrente do
IIlIlIAmente. 2111 ] modo capitalista de produção,. ou seja a propriedade privada capi-
talista, é a primeira negação da propriedade privada individual·
211 "Chep.mos &. uma situação inteiramente nova. na sociedade ... baseada no tra.balho pr6prio; Mas, a produção capitalista gera sua
Teu4emos &. .eparar toda espécÍ! de propriedade de tMa. espécie de própria negação, com a fatalidade de um prOcesso natural. ~ a
tr.aDalho" (Bismond!, "Nouveaux Princ!pes de. 11tcon. Polit. ", t. n,
p_ 434). negação da negação. Esta segunda negação não restabelece a pro-
priedade privada, mas a propriedade individual tendo por fundamen-
880
881
to a conquista da era capitalista: a cooperação e aposse comum
do solo e dos meios de produção gerados pelo próprio trabalho.
A transformação da propriedade particular esparsa, baseada
no trabalho próprio dos indivíduos, em propriedade privada capi-
li! talista, constitui naturalmente um processo muito mais longo, mais
duro e mais difícil que a transformação em propriedade social da
propriedade capitalista que efetivamente já se baseia sôbre um
modo coletivo de produção. Antes, houve a expropriação da massa
do povo por poucos usurpadores, hoje, trata-se da expropriação
de poucos usurpadores pela massa do poVO. 252 CAPíTULO XXV

Teoria Moderna
da C olonização253

POR. PR.INdPIO, a economia política confunde duas espec1t~s


252 "O progresao industrial - e a burguesia é o portador inconscien- muito diferentes de propriedade: a que se baseia sôbre o trabaUÍo
te e pe.ssivo dêsse progresao - tra.nsmuta. a s'eparação dos traba- ., do próprio produtor e, a sua antítese direta, a que se fundamenta
lhadores pela concorrência na. sua unificação revolucloná.ria através
da associação. Ao desenvolver-se a grande indústria, a burguesia na exploração do trabalho alheio. Esquece que esta s6 cresce sôbre
sente que lhe foge aos pés o fundamento da produção capitalista, o túmulo daquela. /'"
em v1rtude do qual se apropria dos produtos. Ela !)roduz. antes de Na Europa ocidental, o berço da economia política, o pro-
tudo, seus próprios coveiros. Sua ruina e o triunfo do proletariado cesso da acumulação primitiva está mais ou menos concluído. Aí
são igualmente inevitáveis ... Entre tódas as classes que hoje se con-
frontam com a burguesia, a única realmente revolucionária é o pro- o regime capitalista ou apoderou-se diretamente de tôda a produção
letariado. As outras decaem e desaparecem com a expansão da gran- nacional, ou, onde as condições econômicas estão menos desen-
de indústria, enquanto o proletariado é desta o prOduto mais autên- volvidas, controla pelo menos indiretamente aquelas camadas da.
tico. Todos os setores da classe média, o pequeno industrial, o pe-
queno comerciante, o artesão, o camponês, combatem a burguesia 253 Tn.tamos aqui das verdadeiras co1OniaB. terras 'l'irgens, coloniza-
para. assegurar sua existência como classe média. em· face da. extin- das por imigrantes livres. Do ponto de vista econômico. os Estados
ção que os ameaça... São reacionálios, pois procuram fazer andar i
Unidos ainda são uma colônia da Europa. Incluímos também nesaa.
para tráa a roda da história (Karl Marx e F. Engels. ''ManI.festo do clI.tai;orll1. IIS velhas plantações onde as condições foram Inteiramente
Partido Comunista", Londres, 1848, págs. 11 e 9). modificadas com a abolição da escravatura.

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