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FILOSOFIA DA EDUCAÇÃO: REFLEXÃO

CRÍTICA E O PROCESSO EDUCACIONAL

Caroline Barroncas de Oliveira

Roberto Sanches Mubarac Sobrinho

MANAUS-AMAZONAS

2016
N otas Sobre os Autores:

Caroline Barroncas de Oliveira: Possui graduação em Normal Superior pela


Universidade do Estado do Amazonas-UEA (2007). Especialização em Supervisão
Educacional pela Universidade Federal do Amazonas-UFAM (2008). Especialização
em Antropologia pela Universidade Federal do Amazonas-UFAM (2008). Mestrado em
Ensino de Ciências pela Universidade do Estado do Amazonas-UEA (2010). Professora
Assistente da Universidade do Estado do Amazonas - UEA. Tem experiência na área de
Educação e Ensino de Ciências, com ênfase em formação de professor, atuando
principalmente nos seguintes temas: formação de professores, educação científica,
estágio com pesquisa, identidade, cultura.

Roberto Sanches Mubarac Sobrinho: Possui graduação em Pedagogia pela


Universidade Federal do Amazonas (1994), Especialização em Educação Especial pela
Universidade Federal do Amazonas (1996), Mestrado Em Educação pela Universidade
Federal do Amazonas (2002), Doutorado em Educação pela Universidade Federal de
Santa Catarina (2009) com aprofundamentos de estudos em Sociologia da Infância no
Instituto de Estudos da Criança da Universidade do Minho, Braga-PT (2008), Bacharel
em Direito pela Universidade do Estado do Amazonas (2016). É professor Adjunto da
Universidade do Estado do Amazonas na área de concurso História da Criança,
Criança, Sociedade e Cultura e Teoria e Prática da Educação Infantil. Tem experiência
na área de Educação, com ênfase em Educação e Infância, Metodologia da Pesquisa
em Educação e com Crianças, Teoria Geral de Planejamento e Desenvolvimento
Curricular, atuando principalmente nos seguintes temas: Politica Pública e Currículo,
Educação Infantil, Ideologia, Metodologia, Formação de professores e Legislação
Educacional. Tem vários trabalhos publicados na área da Educação Infantil e projetos
de pesquisa na temática da infância indígena. Professor do Mestrado em Educação em
Ciências na Amazônia, na Universidade do Estado do Amazonas.
S UMÁRIO

INTRODUÇÃO

1 CAPÍTULO I: Elementos constitutivos do conhecimento


1.1 O ato de conhecer
1.2 Tipos de conhecimento
1.2.1 O Conhecimento Mítico
1.2.2 O senso comum
1.2.3 O Conhecimento Filosófico
1.2.4 O Conhecimento Religioso
1.2.5 O Conhecimento Científico
1.3 O cotidiano e a produção do conhecimento
1.3.1 A trajetória da Ciência e seus paradigmas
1.3.1.1 O que são paradigmas?
1.3.1.2 A crise paradigmática

2 CAPÍTULO II: Relações entre educação, filosofia e ideologia


3.1Trabalhando conceitos e definições
3.2 O que é Ideologia?
3.3 Filosofia, conhecimentos, ensino e aprendizagem
3.4 O Conhecimento e suas expressões

3 CAPÍTULO III: Contexto Histórico da Educação Brasileira e as matrizes


educacionais no País

4 CAPÍTULO IV: Análise crítica das principais tendências e correntes da filosofia


da educação no Brasil
5.1 A Questão Pedagógica e Didática
5.2 Resgate e promoção da qualidade educativa popular

5. REFERÊNCIAS
A PRESENTAÇÃO

Prezado Aluno!

Para ensinar, é preciso que o professor, em primeiro lugar, tenha claro para si
quais são seus anseios, suas metas, suas frustrações. Após olhar para bem dentro de si,
só então, é que o professor poderá olhar para o aluno como sujeito. Buscando o
potencial de cada criança, e expandindo seu potencial por intermédio de uma orientação
de acordo com a capacidade de cada um. O aluno deve ser convidado a refletir sobre o
mundo que o cerca o conhecimento de uma realidade da qual ele próprio faz parte. Faz-
se necessário ao educador o comprometimento como profissional durante as suas inter-
relações em que o compromisso não pode ser um ato passivo, mas sim a inserção da
práxis na prática educativa de professor e aluno.
Sendo assim, o objetivo da presente disciplina é evidenciar a importância da
Filosofia para a educação além de descrever, segundo opinião de autores da área, refletir
formas de expor estes conteúdos na prática pedagógica.
Talvez deva ser a escola o espaço privilegiado para a elaboração da existência
humana, hoje, mais do que nunca, dramática, principalmente na busca pela
sobrevivência. E a escola tem cumprido de forma alienante sua função ou disfunção
social de reproduzir os ideais de justiça e solidariedade humanas, sem contudo, romper
com o discurso ideológico que está impregnado no seio de suas práticas educativas.
Como é possível construir uma nova sociedade em bases tão arcaicas? É aqui que
precisamos aprofundar nossas discussões para que possamos realmente consolidar uma
prática de luta.
Acreditamos que é preciso romper com as estruturas de poder, mesmo que pelo
embate de forças. Precisamos definir novos ritmos e rumos para o direito à educação,
precisamos acima de tudo, alimentar nossas forças para que não caiamos no marasmo
socialmente construído pela classe dominante. É preciso levantar nossa bandeira em
prol da educação com qualidade, continuar fincando as bases e procurando erguer uma
nova estrutura, que possa contrapor todo esse arsenal presente no cotidiano social, e,
sobretudo, respaldados pelas leis. Acreditamos que nosso compromisso intelectual,
neste trabalho se reforça no sentido se acender novas chamas e propor novos olhares
para a situação vigente. O trabalho não se encerra, apenas está começando e quem sabe,
novos frutos possam brotar...

Os Autores

Caroline Barroncas de Oliveira


Roberto Sanches Mubarac Sobrinho
Componente Curricular: Filosofia da Educação Sigla:

Natureza: Obrigatória ( x ) Optativa ( ) Pré-Requisito:

Carga Horária: 60 Teórica: 60 Prática: 00 Créditos: 4

EMENTA
A Filosofia da Educação como conteúdo específico e como objeto de pesquisa que implica
metodologia e estudo científico próprio na dinâmica das ciências da Educação. O olhar dos
filósofos sobre as particularidades e horizontes do fenômeno educativo. As relações entre
Filosofia e pedagogia no processo de formação de professores. A Filosofia, educação, ideologia
e emancipação histórica no horizonte do sujeito e sua autonomia cidadã.

OBJETIVO

Analisar as relações entre ciência e educação, observando criticamente as concepções que


norteiam o ato educativo nas diferentes épocas das sociedades Desenvolver a atitude crítica e os
processos de reflexão sobre si mesmo, para a produção do conhecimento e análise das ciências
que fundamentam a educação.

BIBLIOGRAFIA BÁSICA

MORANDI, Franc. Filosofia da Educação. Bauru: Edusc, 2002.


MORIN, Edgar. O método 3: o conhecimento do conhecimento. Porto Alegre: Sulina,
1999REGO, Tereza Cristina. Vygotsky: uma perspectiva histórico-cultural da educação. 2000

BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR

ADORNO, Theodor W. Educação e emancipação. São Paulo: Paz e Terra, 1995.


BARBIER, René. A pesquisa-ação. Brasília: Plano, 2002.
HORKHEIMER, Marx. Eclipse da razão. São Paulo: Centauro, 2000.
ZUIN, Antônio Álvaro Soares; PUCCI, Bruno; RAMOS-DE-OLIVEIRA, Newton. Adorno: o
poder educativo do pensamento crítico. Petrópolis: Vozes, 2000.
I NTRODUÇÃO:

Começaremos nossas reflexões acerca da Filosofia da Educação, buscando,


primeiramente, compreender o que é a Educação em sentido Amplo (Assistemática e
Informal) e a Educação em sentido Estrito (Sistemática e Formal), pois a partir de tais
discussões, teremos condições de estabelecer um marco balizador do processo que
norteará e ampliará nossas discussões sobre a Filosofia da Educação.

 EDUCAÇÃO ASSISTEMÁTICA/INFORMAL

A educação informal ocorre na família, na igreja, com amigos, no bairro, ou seja,


através da interação com grupos sociais, os quais são carregados de valores e culturas
herdadas historicamente e que através dessas interações são repassados de uma geração
para outra e vice-versa. Tem o objetivo se socializar, desenvolvendo neles, hábito, que
contribuam no desenvolver de modos de pensar e agir frente aos obstáculos enfrentados
na vida. A educação não formal é aquela que ocorre no mundo, através da interação
com o cotidiano, nos momentos em que interagimos com as pessoas e o mundo que nos
cercam, neste processo o aprendizado se dá através de ações coletivas cotidianas, pois
tem como objetivo preparar o ser humano para a vida em sociedade.

A educação informal possui muitas significações distintas. Autores como


Brandão (1985), definem como sendo aquela que está relacionada com o processo
“livre” de transmissão de certos saberes, tais como: a fala comum a um dado grupo, as
tradições culturais e demais comportamentos característicos das diversas comunidades
presentes em uma sociedade. Outros como Furter (1978) definem como sendo todo e
qualquer processo educativo ocorrido em instituições que não pertençam as Redes
Escolares de Ensino (escolas federais, municipais e estaduais além de escolas privadas
credenciadas pelos órgãos educacionais competentes).

Educação informal abrange todas as possibilidades educativas, no decurso da


vida do indivíduo, construindo um processo permanente e não organizado. É
Assistemática e também conhecida como informal, não se tem um cronograma ou uma
intenção definida ela se dá de maneira aleatória (assistemática), ex.: na família, nas
igrejas na nossa comunidade, etc.

 EDUCAÇÃO SISTEMÁTICA/FORMAL

Embora a educação informal esteja sempre presente na vida do indivíduo, em


sociedades complexas ela não basta. A divisão do trabalho e a extrema especialização
exigem dos cidadãos a passagem pela escola, onde recebem educação sistemática ou
formal. Seu objetivo básico é a transmissão de determinados legados histórico-culturais,
isto é, de determinados conhecimentos, técnicas ou modos de vida. A educação formal
seleciona os elementos essenciais e sua transmissão se dá por pessoas especializadas.

Do ponto de vista sociológico e filosófico, a escola pode ser vista como grupo
social e instituição. Considerada uma reunião de indivíduos (alunos, professores e
funcionários) com objetivos comuns e em contínua interação, a escola é um grupo social
que transmite cultura. A escola pode também ser vista como uma instituição, ou seja,
um conjunto de normas e procedimentos padronizados, altamente valorizados pela
sociedade, cujo objetivo principal é a socialização do indivíduo e a transmissão de
determinados aspectos da cultura.

Neste sentido, a compreensão de que o ser humano aprende com as relações que
se estabelecem na vida cotidiana e nas intervenções da escola, temos que entender o
caráter provisório e em construção que o processo educacional. Isto posto,
começaremos nossas discussões a cerca da filosofia da educação, apontando questões
fundamentais para a sedimentação do pensar filosófico que tem como tríade a AÇÃO-
REFLEXÃO-AÇÃO, ou seja, o constante reconstruir dos distintos modos de pensar o
mundo, a sociedade, a natureza e os processos de ensino e aprendizagem.
1. E LEMENTOS CONSTITUTVOS DO CONHECIMENTO

A base do conhecimento é construída a partir da relação ontológica que se


estabelece entre o Sujeito (o Cognoscente) e um Objeto ( Objeto do conhecimento ou
Cognoscível). A relação Sujeito-Objeto constitui o problema fundamental da Filosofia.
Com base no seu estudo teremos acesso às várias fontes do conhecimento e então
poderemos optar por uma vertente filosófica para tentar responder os nossos problemas
de pesquisa, e as distintas formas de pensarmos o processo educativo. Vejamos agora,
com mais detalhes, como o conhecimento se constitui:

o a) O sujeito, aquele que determina o pensar e quer conhecer;


o b) O objeto, aquilo que o sujeito pretende conhecer;
o c) O conhecimento, o ponto de incidência entre o sujeito e o objeto.

A relação entre sujeito e objeto e as teorias da produção do conhecimento:

S+ O- = C
 Nesta teoria o Sujeito é ativo, o Objeto é passivo e o
conhecimento se produz definido pelo Sujeito.
 O conhecimento é fruto, exclusivamente, de quem o produz, ou
seja, o sujeito determina o objeto.

S- O+ = C
 Nesta teoria o Sujeito é passivo, o Objeto é ativo e o
conhecimento se produz definido pelo Objeto.
 O conhecimento é fruto, exclusivamente do local onde se produz,
ou seja, o Objeto determina o Sujeito.

S+ O+ = C
 Nesta teoria o Sujeito e o Objeto são ativos e desenvolvem um
processo de interação na produção do conhecimento
Se, no meu problema de pesquisa, eu priorizar o sujeito, o meu enfoque será
hermenêutico. Se eu priorizar o objeto, o meu enfoque será empírico- analítico. Se eu
priorizar a relação histórica entre os dois, sujeito e objeto, o meu enfoque será crítico-
dialético. A relação sujeito – objeto estabelece as bases da construção do conhecimento
e de acordo com o tipo de relação que estabelecemos teremos uma determinada postura
filosófica que ditará os rumos da pesquisa. Não podemos ser neutros em relação a
ciência, por isso é de fundamental importância que tenhamos clareza do enfogue que
vamos adotar no nosso caminhar científico, daí a necessidade de conhecermos como
conhecemos, os tipos de conhecimento e os paradigmas do conhecer.

1.1 - O ATO DE CONHECER

Você sabe de onde vem o conhecimento? Como ele surgiu?

A Neurociência nos diz que temos uma programação interna para conhecer.
Aliás, alguns teóricos se referem a introspecção que é o ato de conhecer através da
nossa experiência interna. Outros dizem que a nossa intuição é altamente reveladora.
Mas o conhecer perpassa por algumas fases utilizadas pela Neurociência que podem nos
esclarecer muita coisa no que tange ao conhecimento. Essas fases serão apresentadas a
vocês de forma piramidal não só como recurso didático, mas também devido a
hierarquia inicial entre elas. Vejamos:

Figura 01: A Pirâmide do Conhecer


Fonte: BARBBOSA; MUBARAC SOBRINHO (2010).
O processo de conhecer dá-se a partir de experiências que podem ser organizadas
em cinco níveis de crescentes graus de complexidade. São eles: Sensação - Percepção -
Formação de Imagens - Simbolização - Conceituação. A possibilidade da vivência de
cada uma destas experiências está atrelada à pré–existência do nível anterior,
revelando-se, assim, seu caráter hierárquico.

Os estudos com animais comprovam que algumas espécies podem chegar,


dependendo da escala evolutiva, a formação de imagens, como é o caso dos macacos,
elefantes, cavalos cachorros, gatos, dentre outros. Entretanto, só o ser humano simboliza
e conceitua. Mesmo assim, muitos humanos ainda têm problemas de abstração, o que de
certa forma dificulta a conceituação, definindo e explicando o mundo que o cerca num
plano concreto.

No processo de desenvolvimento cognitivo, todos os cinco níveis hierárquicos


que compõem a pirâmide acima são significativos e vão se conectando à medida em que
o ser humano atinge o nível seguinte. Portanto, a segmentação só existe em dado
momento do desenvolvimento, em conformidade com a faixa etária e evolução
cognitiva. Quando o indivíduo consegue conceituar, essa divisão hierárquica perde seu
caráter segmentado, pois a mente do indivíduo passa a se manifestar utilizando todos os
níveis ao mesmo tempo, de forma integrada.

Segundo Teixeira (2005, p. 81) “o conhecimento existe numa relação sui


generis entre consciência cognoscente e o objeto conhecido, visto que mediante a
imagem a consciência cognoscente se identifica com o objeto”. Dessa forma. Quem
conhece atinge a causa das coisas, pois conhecer sem pensar é se contentar com aquilo
que ver e não questionar ou não refletir a realidade. Entretanto, o ser humano tem a
capacidade de ultrapassar os limites daquilo que seu sentido corpóreo apreende e, assim,
passar a comparar, a classificar, a isolar, a abstrair, a conceituar, generalizar etc. Só o
ser humano consegue ir além dos sentidos e neste caso ele não se conforma com a
aparência, ele busca a imanência. Vejamos agora os tipos de conhecimento para irmos
ampliando nossa visão do assunto. Afinal, já vimos o quanto é significativo conhecer.
1.2. TIPOS DE CONHECIMENTO

O conhecimento é considerado como a totalidade de vida da ação humana e esta


ação se apresenta de várias formas, oriunda de múltiplos caminhos e dependendo desse
caminhar o ser humano constrói um tipo de conhecimento específico. É importante
compreender que apesar dessa divisão, que também foi construída pelo homem em sua
tentativa de sistematizar o conhecimento, todo e qualquer tipo de conhecimento é de
fundamental relevância para a compreensão e leitura do mundo.

1.2.1 O CONHECIMENTO MÍTICO

São as primeiras manifestações humanas para explicar a realidade. Os mitos têm


geralmente sequência lógica com início, meio e fim e tentam responder os mistérios da
natureza. A cultura grega é riquíssima em mitos, entretanto a nossa cultura não fica a
desejar, devido às diversas culturas dos povos da Amazônia.

Figura 02: O Muiraquitã Figura 03: A Cobra Grande


Fonte: elianepotiguara.blogspot.com Fonte: www.sohistoria.com.br
1.2.2 - O SENSO COMUM

Quando acordamos pela manhã e olhamos o sol surgindo no horizonte, olhamos


sua dimensão e pensamos: o sol é menor que a terra, ele se move em volta dela que
permanece imóvel. Nossa percepção nos leva a esse raciocínio e ele é reforçado com o
passar do dia, afinal “vimos o sol nascer, percorrer o céu e se pôr. A aurora não é o seu
começo e o crepúsculo o seu fim?” (CHAUI, 202, p.247). Certo ou errado? Errado. Essa
observação é típica do Senso Comum, um tipo de conhecimento baseado na experiência
sensorial, mas que não passa pelo crivo da criticidade, ou seja, do conhecimento
científico. Como diziam os gregos, é doxa. Vamos verificar porque?

Os estudos astronômicos já demonstraram que o Sol é muitas vezes maior que a


Terra. Alguns teóricos. afirmam que a massa do Sol é 333 mil vezes maior que a da
Terra, seu volume 1.400 milhão vezes maior e o seu raio possui 696 mil quilômetros
contra os 6.378,1 quilômetros de raio do nosso planeta. A distância desse astro até a
Terra é de 1 Unidade Astronômica (1 UA = 1,499 x 108km), ou seja, aproximadamente
150 milhões de quilômetros. Viajando a exatos 299.792,458 km/s, a luz do Sol demora
8 minutos e 18 segundos para chegar na Terra. (RESNICK & HALLIDAY, 1979)

Vamos adiante. Você está agora mais reflexivo e vai sentar a beira do rio ou do
lago e fica pensando nas nossas aulas. De repente você vê um peixe passeando tranqüilo
em busca de alimento e aí você pensa. Peixe é peixe, pássaro é pássaro, cada gênero e
espécie animal já surgiram como os conhecemos. Certo ou errado? Errado. Mas
também, alguém poderia imaginar um peixe se transformar em um pássaro ou em um
réptil? Pois é, parece numa primeira instância complicado, mas a Biologia demonstra
que os gêneros e as espécies de animais se formaram lentamente, no curso de milhões
de anos, a partir de modificações de micro-organismos extremamente simples (CHAUI,
2002).

Geralmente o conhecimento popular (senso comum) é transmitido de geração a


geração por meio da educação informal, baseado em imitação e experiência pessoal;
portando, empírico e desprovido de conhecimento técnico. Podemos citar como
exemplo o conhecimento de um barco popular. Na construção são aplicados
conhecimentos adquiridos por tradição oral, tais como: a madeira mais apropriada, a
largura, a altura e o peso do motor para que ele agüente os banzeiros etc. Ou seja, ele é
construído no “olhômetro”, portanto, de forma empírica. Mas, nem por isso deixa de ter
o seu valor, até porque muito dos conhecimentos ali aplicados são baseados em
observações e a ciência não é, como muitos pensam, o único caminho de acesso ao
conhecimento e a verdade.

Figura 04: Barco Regional


Disponível em:
https://www.google.com.br/search?q=barco+amazonico&source=lnms&tbm=isch&sa=X&ved=0ahUKE
wjqm52GycPMAhWFxpAKHVKeBQ4Q_AUIBygB&biw=1440&bih=789#imgrc=IKOEk6ldD2sDBM
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Um mesmo objeto pode ser matéria de observação tanto para o cientista quanto
para o um cidadão comum; o que leva um ao conhecimento científico e outro ao
conhecimento popular é a forma de observação.

Há nesse nosso saber cotidiano, algumas características que devem ser mencionadas.
Vejamos:

 É SUPERFICIAL, conforma-se com a aparência, não busca o que se oculta por


trás das coisas; Vimos o sol, observamos o seu movimento e julgamos que ele fosse
menor que a terra.
 É SENSITIVO, ou seja, referentes às vivências, estados de ânimo e emoções do
cotidiano; costumam projetar nas coisas ou no mundo sentimentos de angústia e de
medo diante do desconhecido. Assim, na Idade Média as pessoas viam o demônio em
toda parte e hoje veem os “chupa-chupa”, os “cabra-cega” e Objetos Voadores Não
Identificados – OVNIS.
 É SUBJETIVO, pois o próprio sujeito organiza suas experiências; exprime
sentimento e opinião individual ou de grupos, variando de uma pessoa para outra,
dependendo do contexto. Por exemplo, se eu vejo uma arvore frondosa e sou
ecologista, eu posso olhá-la como uma espécie em extinção; se eu for marceneiro
vislumbro a qualidade e a quantidade da madeira; se for um andarilho penso
imediatamente na sombra para repousar um pouco, se eu estiver com fome buscarei
seus frutos.

 É ASSISTEMÁTICO, pois está organizado nas experiências e não na


sistematização das ideias e / ou na forma de adquiri-las, muito menos na
tentativa de validá-las;
 É ACRÍTICO, pois não há preocupação com a veracidade dos fatos e sim
com a funcionalidade.

1.2.3– O CONHECIMENTO FILOSÓFICO

Segundo Marconi e Lakatos (2000) o conhecimento filosófico tem algumas


características específicas: é VALORATIVO, pois seu ponto de partida consiste em
hipóteses, que não poderão ser submetidas à observação. As hipóteses filosóficas
baseiam-se na experiência, portanto, este conhecimento emerge da experiência e não da
experimentação. Daí porque o conhecimento filosófico NÃO É VERIFICÁVEL, já que
os enunciados das hipóteses filosóficas, ao contrário do que ocorre no campo da ciência,
não podem ser refutados nem confirmados. É RACIONAL, pois consiste num conjunto
de enunciados logicamente correlacionados. Tem uma organização SISTEMÁTICA,
pois há coerências entre as hipóteses e enunciados. Finalmente, os autores referenciados
sinalizam para a questão da EXATIDÃO, uma vez que seus postulados e suas hipóteses
não são submetidos ao decisivo teste da observação (EXPERIMENTAÇÃO).
Figura 05 e 06 : Representação do Conhecimento Filosófico
Fonte: filosofandoehistoriando.blogspot.com; www.grupoescolar.com

1.2.4 CONHECIMENTO RELIGIOSO

O conhecimento religioso, também conhecido como teológico, apóia-se em teses


que contêm proposições sagradas, ou seja, VALORATIVAS, que por terem sido
reveladas pelo sobrenatural (INSPIRACIONAL) e por esse motivo, tais verdade são
consideradas EXATAS. É um conhecimento que tem SISTEMATIZAÇÃO, pois seus
relatos têm início, meio e fim, ou seja: introdução, desenvolvimento e conclusão, ou
melhor, já que estamos nos referindo ao conhecimento religioso: origem, significado,
finalidade e destino. Suas evidências NÃO SÃO VERIFICÁVEIS, pois são obras do
Criador Divino e, portanto, necessitam de crença, de fé, perante o conhecimento
revelado.

Figura 07 e 08: Símbolos Religiosos


Disponível em: br.pinterest.com
1.2.5- O CONHECIMENTO CIENTÍFICO

A produção do conhecimento está ligada a três referenciais: a concepção


dialética da realidade, o processo do pensar reflexivo e a problematização.
Problematizar é muito mais profundo do que a simples formulação do problema de
pesquisa, porque leva a pessoa a questionar. São tantas as interrogações: O quê? Como?
Por quê? Para quê? Onde? Quando? Quantos? Quais? Ou seja, problematizar é
interrogar o mundo, a realidade em que o pesquisador está inserido, ele próprio e mais
especificamente o seu objeto de estudo. Problematizar é interrogar em torno de si
mesmo e só o ser humano é capaz de fazê-lo.

Segundo Bunge (1965) somente o homem inventa problemas novos: é o único ser
problematizador, o único que pode sentir a necessidade e o gosto de acrescentar
dificuldades às que já se apresentam no meio natural ou no meio social.

Figura 09: Laboratório de Pesquisa


Disponível em: http://www.infoescola.com/materiais-de-laboratorio/tubos-de-ensaio/

O homem é um ser de criação, de produção, de evolução, de questionamentos.


Em sua trajetória de vida ele tem que interpretar a si e ao mundo em que vive,
atribuindo significado as coisas que o rodeia. Ele, também cria representações
significativas da realidade, as quais denominamos conhecimento.
Dependendo da forma pela qual se chega a essa representação, o conhecimento
pode ser classificado em diversos tipos (filosófico, mítico, dogmático, popular etc).
Já o conhecimento científico é aquele que é produzido pela investigação científica.
Portanto, ele é FACTUAL porque lida com ocorrências ou fatos reais. É
SISTEMÁTICO, pois ordena logicamente as ideais (teoria) e não conhecimentos
dispersos e desconexos. Possui a característica da VERIFICABILIDADE, de modo
que, as afirmações (hipóteses) que não podem ser comprovadas não pertencem ao
âmbito da ciência. Constitui-se em conhecimento FALÍVEL, em virtude de não ser
definitivo, absoluto ou final e, por este motivo, APROXIMADAMENTE EXATO:
novas proposições e o desenvolvimento de técnicas podem reformular o acervo de
teoria existente, portanto, nem sempre a verdade de ontem é a de hoje. O
conhecimento científico é um eterno construto.

1. 3 O COTIDIANO E A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO

O conhecimento, não importa qual tipo for, representa a apropriação da realidade


através de signos. Conhecer, saber e ter conhecimento é aprender os seres e as coisas.
Entende-se por ser tudo aquilo que existe ou se supõe existir e por coisa, tudo aquilo
que existe ou poderia existir. Dessa forma, a apropriação da realidade inclui o real,
isto é, o que existe realmente independente do nosso pensamento e o ideal, ou seja,
aquilo que existe apenas em nosso pensamento de modo imaginário. (TEIXEIRA,
2005).
O certo é que o ideal pode ser transformado em real. Isto ocorre quando um
produto sai do plano das ideais e passa para o plano do concreto. Vamos supor que
eu tenha na mente uma ideia de fabricar um descascador de tucumã e passe tal ideia
par a um engenheiro de produção que passa, então a desenvolver um novo utensílio
para minha cozinha: Um descascador de tucumã. Neste caso algo ideal transformou-
se em real.
Se olharmos ao nosso redor temos que reconhecer que a produção do
conhecimento permeia todos os aspectos da vida pós-moderna. O alimento que
consumimos é resultado de inúmeras pesquisas em agronomia, engenharia de pesca,
engenharia de produção, nutrição e outras aeras do saber que avançam dia após dia
em pesquisa genética para a produção de vitaminas, proteínas, carboidratos, sais
minerais e tudo o mais o que necessitamos para que possamos ter um corpo e um
mente sadios. A roupa que vestimos, os eletrodomésticos que utilizamos no cotidiano
(ferro elétrico, máquina de lavar, liquidificador etc.) são frutos da ciência e da
tecnologia. Quando passamos para os meios de comunicação, os avanços são mais
significativos ainda, o celular, a Internet, MP5, as TVs de 3D e outros produtos são
outros exemplos de que nossa rotina diária é repleta de frutos da evolução científica.
Segundo Bertoni-Ricardo (2009, p.10):

O conhecimento do mundo em que vivemos, a Terra e para além dela,


alterou-se profundamente com o desenvolvimento da astrofísica e da
tecnologia da exploração espacial. Da mesma forma, o conhecimento
do nosso corpo vem se beneficiando constantemente dos progressos
das ciências físicas e biológicas e do refinamento da tecnologia que
deles decorre. Também nosso conhecimento sobre as mais diversas
etnias que povoam a Terra vem se acumulando.

O avanço de que fala Bortoloni-Ricardo (2009) só é possível pelos esforços de


muitos, principalmente daqueles que se dedicam a produção científica. Entretanto, eles,
os cientistas, não são seres iluminados como muitos pensam. São pessoas iguais a
muitos de nós, isto é: comem, dormem, têm dor de cabeça, problemas existenciais etc.
O diferencial está na maneira como olham para a realidade e como se debruçam sobre
o objeto investigado. Eles e elas não descrevem a realidade na base do “achismo”,
usam para isso o método científico.

Em se tratando de ciência temos 3 (três) tipos de métodos. O Indutivo ( que vai


do particular para o geral); o Dedutivo ( que vai do geral para o particular e o
Abdutivo ( que mescla os dois primeiros).

1.3.1 A TRAJETÓRIA DA CIÊNCIA E SEUS PARADIGMAS

A ciência tem os seus caminhos e estes são bem delineados pelos


paradigmas que têm sustentado a ciência ao longo se sua trajetória. Mas antes de
adentrarmos neles convêm explicitarmos o conceito de ciência. São inúmeras as
definições de ciência, variando conforme o autor, mas optamos por definir ciência
como um conjunto de conhecimentos que se obtêm através da utilização de métodos
e técnicas considerados científicos, isto é, capazes de apreender, investigar, analisar,
interpretar e relacionar fenômenos, dados, fatos ou situações que envolvam a
realidade pesquisada.
Segundo Teixeira (2005) há dois tipos de Ciência. A Pura e a Aplicada. Pura,
quando a ciência se torna ciência pela ciência, ou seja, quando ela se torna desprovida
de objetivos para intervir na realidade e limita-se apenas a construção da Ciência em
nível teórico. Aplicada quando a ciência se torna conhecimento para ação, isto é,
objetiva um plano de intervenção, envolvendo técnicas para agir no contexto
pesquisado.

1.3.1.1 O QUE SÃO PARADIGMAS?

Segundo Kuhn (1995, p. 13) “paradigmas são as realizações científicas


universalmente reconhecidas, que durante algum tempo, fornecem problemas e soluções
modelares para uma comunidade”. Agora que já conhecemos a definição de paradigma
o que pensa Cardoso quando pressupõe a trajetória da ciência com base em três
paradigmas: Vejamos:

a) Paradigma Teocêntrico – Este é, segundo o autor supra mencionado, o


paradigma dos dois mundos, pois a verdade estaria no reino divino (mundo de
Deus). Foi o paradigma dominante na Antiguidade, suas principais fontes
primárias são os pensamentos de Orfeu, que viveu no século VI a. C. e a
doutrina judaico-cristã ou cristianismo. Tal paradigma também é conhecido
como escolástico aristotélico-tomista, sendo predominante até o final da Idade
Média, buscava uma conciliação entre razão e fé subordinada ao dogmatismo
cristão. É importante ressaltar que a concepção de universo neste paradigma é o
Geocentrismo.

b) Paradigma Antropocêntrico - Para este paradigma a verdade está neste mundo,


com o ser humano, trata-se em verdade da supremacia do ser humano sobre o
mundo. Este paradigma é o da Idade Moderna ou Modernidade. Suas bases estão
na Reforma de Lutero e Calvino e as ideias de Giordano Bruno , Copérnico
Kleper e Galileu Galilei. Neste paradigma a concepção de universo está baseada
no Heliocentrismo. Três grandes nomes merecem destaque neste modelo:
Francis Bacon, René Descartes e Isaac Newton.

Para Francis Bacon a razão fica sempre subordinada e experimentação, foi ele
quem criou o método indutivo como caminho para o conhecimento científico, ou
seja: construção de leis gerais com base em fatos particulares. Apostou e
defendeu a ciência do homem contra a natureza, que deveria ser pressionada até
revelar tudo que nela continha.
Já René Descartes criou o método racionalista e é considerado o pai da dedução
como caminho para o conhecimento científico, ou seja, partir do geral para o
particular com base nos elementos matemáticos. Criou também a análise
(decomposição do objeto em seus elementos básicos). Definiu a causalidade
como resposta a ser definida pela ciência e contribuiu significativamente para a
separação matéria-espirito quando afirmou: Penso, logo existo. Para este
pensador a natureza era constituídas de dois polos excludentes: a mente (res
cogitans) e a matéria (res extensa). Com base nessa divisão, segundo Teixeira
(2005) as ciências humanas se dedicaram à mente e as ciências exatas à matéria.
Nosso terceiro nome na esfera do referido paradigma é Francis Bacon que foi o
idealizador da visão mecânica do mundo. Ele estudou profundamente os dois
métodos, isto é, o empírico-indutivo e o racionalista-analítico-dedutivo,
estabelecendo um link metodológico entre os dois. Surge, assim, o método
abdutivo.

c) Paradigma Ecocêntrico - Para este paradigma o homem é um fio na teia da


vida.( TEIXEIRA, 2005). Trata-se de uma visão holográfica em que a parte está
no todo e o todo está na parte, tudo está interligado. As fontes desse paradigma
são as grandes correntes espiritualistas orientais, os Pré-Socráticos e alguns
teóricos do nosso século, tais como: Jan Smuts, o primeiro a usar o termo
holismo e os teóricos da psicologia Carl Roger e C.C. Jung.
Para ampliarmos a questão paradigmática vamos abordar a visão de Santos
(1989) que em seu livro Um Discurso sobre a Ciência constrói seu discurso
demarcando três momentos.
1- Refere-se ao paradigma dominante ou paradigma da modernidade. As
principais características desse paradigma é que ele foi fundado nas
premissas das ciências sociais e impôs a todas as demais ciências sua
racionalidade experimental, quantitativa e neutra; Tal racionalidade é
mecanicista, pois entende o homem como máquina; É reducionista, pois
reduz o todo às partes; É cartesiano, pois separa o mundo natural-empírico
dos outros mundos não verificáveis-testáveis, como o espiritual-simbólico. É
esta racionalidade que está em crise.

2- Destaca a crise do paradigma dominante nos dias atuais. Para Santos


estamos vivendo uma outra revolução científica, tal qual aquela que rompeu
com o modelo geocêntrico e adotou o modelo antropocêntrico pautado na
racionalidade empírica, entre os séculos XVI e XVIII. Segundo este autor,
esta crise começou com Einstein e a mecânica quântica. A justificativa do
autor para a crise do paradigma dominante está assentada em vários marcos.
Vejamos o que diz Santos (1989, p.06):

 O primeiro, com Einstein e os conceitos de relatividade e


simultaneidade, que puseram o tempo e o espaço de Newton
em debate e alteraram profundamente o domínio da astrofísica
ou microfísica;
 O segundo, com Heisenberg e Bohr, que mudaram o domínio
da micro física, com os conceitos de incerteza e continuum,
abalando o rigor da medição;
 O terceiro, com Godel, que provou a impossibilidade da
completa medição e defendeu que o rigor matemático carece
ele próprio de fundamento;
 Quarto, com Ilya Prigogine, que inaugura a nova concepção da
matéria e natureza. Em vez de eternidade, a história; em vez do
determinismo, a impossibilidade; em vez do mecanicismo, a
espontaneidade e a auto-organização; em vez da
reversibilidade, a irreversibilidade e a evolução; em vez d
orem, a desordem; em vez da necessidade, a criatividade.
3- Aponta quatro aspectos essenciais de um paradigma emergente.

Santos (1989) defende que precisamos elaborar um novo modelo mais prudente,
mais digno de uma vida decente e que este modelo deveria assentar-se em quatro
aspectos. Vejamos quais seriam tais aspectos:

 Todo conhecimento científico – natural é cientifico-social:


Ou seja, ele defende a tese de um conhecimento não dualista,
que se funda na superação das distinções, que se funda na
complementaridade, na multidimensionalidade, que
revaloriza os estudos humanísticos e coloca a pessoa, e o
meio circundante no centro de tudo, em uma perspectiva
ecocêntrica.
 Todo conhecimento é local e total. Tal conhecimento vai
partir dos saberes locais (no caso a cultura de vocês) e migra
para outros lugares, podendo ser utilizado fora do seu
contexto de origem.
 Todo conhecimento é autoconhecimento. Ele defende a tese
de um conhecimento de caráter autobiográfico e auto
referenciável, compreensivo e intimo, mas contemplativo que
ativo.
 Todo conhecimento científico se constitui a partir do senso
comum. Ele defende o diálogo entre os conhecimentos,
deixando-os numa condição de receber novas formas de
conhecer. Seria o inverso do que ocorreu no passado quando
saltamos do senso comum para o conhecimento científico.
Aqui seria uma espécie de ruptura, uma revolução científica,
teríamos que saltar do conhecimento científico para o senso
comum, e, assim, construirmos outra racionalidade.
Segundo o autor referenciado vivemos em um tempo de mudanças velozes e em
relação ao progresso científico os avanços são tão significativos nos últimos trinta anos
que todo o período anterior parece uma pré-história longínqua da história da ciência e
no entanto os fundamentos basilares desse progresso foram construídos entre o século
XIII e os primeiros vinte (20) anos do século XX.
Vivemos uma era sem limites no que tange aos avanços da ciência e a da
tecnologia e apesar de todo esse avanço temos que conviver, segundo Santos (1989, p.
06), com “os perigos cada vez mais verossímeis da catástrofe ecológica ou guerra
nuclear”.
A sociedade pós - moderna caracteriza-se também pela complexidade da
comunicação e interação. Entretanto, há algo de paradoxal na sociedade em que
vivemos, pois nunca fomos tão próximos e ao mesmo tempo tão distantes.

1.3.2 A CRISE PARADIGMÁTICA

A crise paradigmática, segundo Teixeira (2005) ocorre de modo interessante e


pode ser explicada, como recurso didático, em seis passos: “A Ciência encontra-se
numa fase de normalidade. Seu paradigma, seus conceitos e suas leis explicam todos
os fatos e fenômenos (1). De repente, surge algo que é novo, diferente do já
conhecido e os conceitos e leis não conseguem mais explicar esse novo. Para Kuhn
(1995) aconteceu uma anomalia na ciência normal (2). Após essa anomalia vem a
crise do paradigma (3). Mediante a crise começam as pesquisas para saber e explicar
o que ocorreu (4). Quando se avança no sentido de elaborar novos conceitos e
princípios para explicar anomalia, emerge um novo paradigma da ciência (5). Neste
momento a ciência entre em estado de normalidade (6). E segue sua trajetória
dinâmica, sempre em evolução.
1.4 APROFUNDANDO O CONHECIMENTO

1.5.1 Exercícios de aplicação

Leia os excertos abaixo:

EXCERTO 01

Terra primeiro gerou igual a si mesma


Céu constelado, a fim de cobri-la toda ao redor
e de que fosse aos deuses venturosos sede segura para sempre
E gerou altas montanhas, belas moradas das deusas
Ninfas que habitam as montanhas frondosas.
E gerou também a infecunda planície impetuosa de ondas,
o Mar sem desejoso amor.
(HESÍODO. Teogonia, vv. 126-132)

EXCERTO 02

A água envolve a Terra, tal como ao redor daquela encontra-se a esfera de ar e, ao redor
desta, a esfera dita de fogo [...] por outro lado, o Sol, movendo-se do modo como ele o
faz, produz as mudanças da geração e da corrupção e, por causa disto, a água mais leve
e mais doce é aspirada todo dia e, uma vez dividida e vaporizada, é transportada para a
alta atmosfera; lá, ela é novamente condensada por causa do frio e desce então, mais
uma vez, para a Terra. E isto, como dissemos anteriormente, a natureza sempre quer
produzir deste modo.
(ARISTÓTELES. Metereológica, 354b23 – 32.)

Os dois excertos caracterizam formas distintas de conhecimento.

IDENTIFIQUE e CARACTERIZE o tipo de conhecimento representado em cada um


deles:

Excerto 01:

Excerto 02:
1.5.2 Questão para reflexão

LER: ESSE ATO SUBVERSIVO


Wilson Correa

Não me esqueço de como aprendi a ler. Foi mais iniciativa pessoal do que inserção em
um programa que promovesse a leitura. Política pública ou programas que
promovessem a leitura eram inimagináveis. Sequer sabíamos que isso existia, pois
morávamos no campo. Os livros que por lá surgiam eram aqueles utilizados na escola,
uma instituição tão carente quanto tudo ao redor.
O contexto condicionava os atos, as atitudes, as decisões e as ações. Logo, então, fui
atrevidamente explorando os livros didáticos. Porém, eles não me bastavam. E como
outros materiais eram escassos, sempre que ia à cidade, na condição de guarda-costas de
minhas irmãs mais velhas, ia rua afora recolhendo tudo o que pudesse ser lido. Nada
escapava: recortes de jornais, revistas, placas, papel de bala, tudo. Lia pelo prazer de ver
a letra impressa, a forma do sinal gráfico, a materialidade mesma da coisa.
Com o tempo, e à media que ia avançando no percurso curricular da educação formal,
fui notando que os textos tinham coisas mais intrigantes, desafiadoras e deliciosamente
abstratas às quais realmente importava: imagens mentais, opiniões, ideias, conceitos,
significações, sentidos e representações, qual um bando abençoado de “entes” como que
“ocultos” sob o entrelaçamento do alfabeto para nos dar a palavra, a oração, a frase, o
parágrafo, a página, o capítulo, o texto inteiro.
Então essa multidão de “seres” cognitivos, teóricos, ideativos, formadores de materiais
epistem
icos valiosíssimos, foi me seduzindo sempre e cada vez mais. Nesse ritmo, quando
terminei o então segundo grau, fui logo escolhendo fazer os estudos filosóficos na
universidade. Licenciei-me em filosofia e, imediatamente, comecei a lecionar as
disciplinas filosóficas.
Nesse percurso, fui o leitor que minhas condições me possibilitaram ser, mas sempre
apaixonado, amante dos textos, ciumento de livros e de outros materiais que me
inseriam naquela comunidade de “entes” intelectuais que sempre me fizeram bem. Eles
me ajudaram no meu desenvolvimento pessoal, profissional, social, cultural, político e,
também, ético.
Foi nesse último aspecto aí, o da ética, onde descobri que aquelas palavras, orações,
frases, parágrafos, páginas, capítulos e textos inteiros nada mais faziam do que me
transmitir princípios e valores, com os quais passei a entender que podia concordar, ou
não. Nisso, dei de cara com a ideologia, esse “ente” que impregna nossa cultura para
nos “formatar” de um jeito, e não de outro.
Perscrutando a ética e a ideologia, pude entender como os gregos começaram a
concepção de educação nomeada de “paidéia”, voltada para a formação de um homem
que se aproximasse do ideal de humano que eles legitimavam. Deparei, também, com a
maiêutica socrática, com o idealismo platônico e o empirismo aristotélico, de onde pulei
para os escritos helenistas e para a Idade Média, fundada no modo cristão de conceber a
vida e o mundo.
Dos humanistas do Renascimento cheguei mesmo a estudar sistematicamente um autor:
Thomas Morus. Dele aprendi o conceito de “utopia”, o “não-lugar feliz” a que todo
homem aspira como desejo de felicidade e plenitude. Adiante, os modernos, começando
por Descartes e fechando com Kant, entremeado por liberais e outros quetais,
impressionaram-me como os formuladores do antropocentrismo e do individualismo,
ancorado na tecnociência que nos rendeu a sociedade na qual hoje vivemos.
Ansioso pelo casamento entre justiça e liberdade, mais recentemente, autores críticos
como os filósofos Marx, Nietzsche, Foucault e Deleuze, entre tantos outros, cutucam-
me para que eu aprenda a ressiginificar a vida e todo o existente. E eu gosto desses
desafios, pois é no enfrentamento deles que posso recriar a vida e tentar vias de
afirmação de um estilo existencial baseado na autenticidade, simplicidade e
singularidade que a mim me cabe desfrutar e tocar adiante da melhor maneira possível.
De toda essa trajetória recolho a ideia de que ler é um ato subversivo. Ele nos lança no
caminho da criticidade, essa que busca o que, o porquê, o para quê, o quem, o onde, o
quando e o para que de tudo o que vem a ser colhido pelo nosso olhar. É dessa maneira
que aquelas palavras, orações, frases, parágrafos, páginas, capítulos e textos inteiros
continuam a me instigar e a me mostrar que a melhor vida não é a que nos querem
impor, que a melhor liberdade não é aquela que nos dão e que a melhor justiça não é
aquela que é ditada por terceiros, mas que o melhor em tudo isso é o que resulta de uma
conquista, de uma construção diuturna sem a qual nada pode valer a pena. A isso chamo
autonomia, para com a qual a leitura pode contribuir, subversivamente, ao contrário do
que tantos senhores do mundo insistem em difundir.

Fonte: CORREIRA, Wilson. Ler: esse ato subversivo. Revista Leitura & Crítica, ano
01, n. 02, set. 2009. Disponível em:
http://www.recantodasletras.com.br/ensaios/1740186 Acessado em 02.05.2016

1.5.3 Leitura indicada

CHARLOT, B. Da relação com o saber: elementos para uma teoria. Trad. B. Magne.
Porto Alegre: Artmed, 2000.

SAVIANI, Dermeval. Educação: do senso comum à consciência filosófica. 11.ed. São


Paulo: Autores Associados, 1996. Disponível em:
http://www.ead.ifba.edu.br/file.php/325/demerval_saviani_-
_do_senso_comum_consciencia_filosofica_1_.pdf

2. R ELAÇÕES ENTRE EDUCAÇÃO, FILOSOFIA E IDEOLOGIA

Nesta unidade trataremos de conceitos e definições da articulação entre filosofia,


educação, ideologia e emancipação histórica no horizonte do sujeito e sua autonomia
cidadã. Considerando as nuances da ideologia no espaço educativo e na “sociedade do
conhecimento”.

2.1 O que é Ideologia?

Durante a história da Filosofia, muitos foram os autores que trabalharam com a


noção de Ideia como sendo a base do pensamento e do conhecimento. Assim, Platão
pensava, como Parmênides, que a ideia era o ser em si, a coisa mesma que mantém
identidade consigo mesma, não muda, não se altera e permanece no tempo como sendo
sempre a mesma. Mais tarde, já na Renascença, Descartes compreendeu as ideias como
fundamento inteligível que era a base de toda cognoscibilidade. Já Kant entendia por
ideia tudo aquilo que a Razão poderia pensar, mas jamais conhecer, como Deus, Alma e
Mundo. Hegel pensava a ideia como o infinito (ARANHA, 2004).
No entanto, para Karl Marx, ideias são valores que os homens criam segundo as
suas condições materiais de existência. E esses valores são criados com um fim bem
específico, que não é o de explicar a realidade, mas manter o status da propriedade
privada e dos donos dos meios de produção. Daí deriva a noção de Ideologia
(GADOTTI, 2003).
Figura 11: Representação do conceito de Ideologia.
Fonte: umquedemarx.blogspot.com 2016.

HISTÓRICO DO TERMO IDEOLOGIA

O termo ideologia aparece pela primeira vez em 1801 no livro de Destutt de Tracy,
Eléments d'ldéologie (Elementos de Ideologia). Juntamente com o médico Cabanis, com De
Gérando e Volney,DeStutt de Tracy pretendia elaborar uma ciência da gênese das ideias,
tratando-as como fenômenos naturais que exprimem a relação do corpo humano, enquanto
organismo vivo, com o meio ambiente. Elabora uma teoria sobre as faculdades sensíveis,
responsáveis pela formação de todas as nossas ideias: querer (vontade), julgar (razão), sentir
(percepção) e recordar (memória). Os ideólogos franceses eram antiteológicos, antimetafísicos e
antimonárquicos.
Pertenciam ao partido liberal e esperavam que o progresso das ciências experimentais,
baseadas exclusivamente na observação, na análise e síntese dos dados observados, pudesse
levar a uma nova pedagogia e a uma nova moral. Contra a educação religiosa e metafísica, que
permite assegurar o poder político de um monarca, De Tracy propõe o ensino das ciências
físicas e químicas para “formar um bom espírito”, isto é, um espírito capaz de observar,
decompor e recompor os fatos, sem se perder em vazias especulações. Cabanis pretende
construir ciências morais dotadas de tanta certeza quanto as naturais, capazes de trazer a
felicidade coletiva e de acabar com os dogmas, desde que a moralidade não seja separada da
fisiologia do corpo humano.
Nos Elementos de Ideologia, na parte dedicada ao estudo da vontade, De Tracy procura
analisar os efeitos de nossas ações voluntárias e escreve, então, sobre economia, na medida em
que os efeitos de nossas ações voluntárias concernem à nossa aptidão para prover nossas
necessidades materiais. Procura saber como atuam, sobre o indivíduo e sobre a massa, o
trabalho e as diferentes formas da sociedade, isto é, a família, a corporação, etc. Suas
considerações, na verdade, são glosas das análises do economista francês Say, a respeito da
troca, da produção, do valor, da indústria, da distribuição do consumo e das riquezas.
No texto Influências do moral sobre o físico, Cabanis procura determinar a influência
do cérebro sobre o resto do organismo, no quadro puramente fisiológico. O ideólogo francês
partilha do otimismo naturalista e materialista do século XVIII, acreditando que a Natureza tem,
em si, as condições necessárias e suficientes para o progresso e que só graças a ela nossas
inclinações e nossa inteligência adquirem uma direção e um sentido.
Os ideólogos foram partidários de Napoleão e apoiaram o golpe de 18 Brumário, pois o
julgava um liberal continuador dos ideais da Revolução Francesa. Enquanto Cônsul, Napoleão
nomeou vários dos ideólogos como senadores ou tribunos. Todavia, logo se decepcionaram com
Bonaparte, vendo nele o restaurador do Antigo Regime. Opõe-se às leis referentes à segurança
do Estado e são por isso excluídos do Tribunado e sua Academia é fechada. Os decretos
napoleônicos para a fundação da nova Universidade Francesa dão plenos poderes aos inimigos
dos ideólogos, que passam, então, para o partido da oposição.
O sentido pejorativo dos termos “ideologia” e “ideólogos” veio de uma declaração de
Napoleão que, num discurso ao Conselho de Estado em 1812, declarou: “Todas as desgraças
que afligem nossa bela França devem ser atribuídas à ideologia, essa tenebrosa metafísica que,
buscando com sutilezas as causas primeiras, quer fundar sobre suas bases a legislação dos
povos, em vez de adaptar as leis ao conhecimento do coração humano e às lições da história.”
Com isto, Bonaparte invertia a imagem que os ideólogos tinham de si mesmos: eles, que se
consideravam materialistas, realistas e antimetafísicos, foram chamados de “tenebrosos
metafísicos”, ignorantes do realismo político que adapta as leis ao coração humano e às lições
da história.
O curioso, como veremos adiante, é que se a acusação de Bonaparte é infundada com
relação aos ideólogos franceses, não o seria se se dirigisse aos ideólogos alemães, criticados por
Marx. Ou seja, Marx conservará o significado napoleônico do termo: o ideólogo é aquele que
inverte as relações entre as ideias e o real. Assim, a ideologia, que inicialmente designava uma
ciência natural da aquisição, pelo homem, das ideias calcadas sobre o próprio real, passa a
designar, dar por diante, um sistema de ideias condenadas a desconhecer sua relação real com o
real.

Fonte: CHAUÍ, Marilena. O que é Ideologia? 7. ed. São Paulo: Brasiliense, 1981.(Coleção
Primeiros Passos). p.10-11.

Há vários sentidos para a palavra ideologia. Em sentido amplo, é o conjunto de


ideias, concepções ou opiniões sobre algum ponto sujeito a discussão. Como explicita
Chauí:

O termo ideologia voltou a ser empregado em um sentido próximo ao do


original por Augusto Comte em seu Cours de Philosophie Positive. O termo,
agora, possui dois significados por um lado, a ideologia continua sendo
aquela atividade filosófico-científica que estuda a formação das ideias a partir
da observação das relações entre o corpo humano e o meio ambiente,
tomando como ponto de partida as sensações; por outro lado, ideologia passa
a significar também o conjunto de ideias de uma época, tanto como “opinião
geral” quanto no sentido de elaboração teórica dos pensadores dessa época
(CHAUÍ,1981, p.11) .

A ideologia tem como função assegurar uma determinada relação dos homens
entre si e com suas condições de existência, adaptando os indivíduos às tarefas
prefixadas pela sociedade. Portanto, a ideologia assegura a coesão dos homens e a
aceitação sem críticas das tarefas mais penosas e pouco recompensadoras, como se
fosse a coisa mais normal e natural do mundo, como se cada um de acordo com a sua
posição social, já tivesse seu lugar garantido. Passam como universais valores
individuais, valores que privilegiam certos grupos são passados como sendo benéficos à
todos.

A ideologia é, portanto, uma forma de produção do imaginário social que


corresponde aos anseios da classe dominante como meio mais eficaz de
controle social e de amenizar os conflitos de classe, seja invertendo a noção
de causa e efeito, seja silenciando questões que por isso mesmo impedem a
tomada de consciência do trabalhador de sua condição histórica, “formando
ideias falsas sobre si mesmo, sobre o que é ou o que deveria ser” (CABRAL,
2016, p.01).

O que existe são classes particulares com interesse divergentes, e a ideologia de


uma sociedade harmoniosa é passada justamente para ocultar a divisão e os conflitos
entre as classes, acalmando a população e mostrando que é assim que tem que ser.
Mészáros (2004, p.472-473) contribui para ampliar o foco de análise da
ideologia ao destacar que o poder ideológico da burguesia só prevalece graças à
mistificação que leva as pessoas a reforçar valores e práticas que são contrários aos seus
interesses. Já as ideologias críticas, segundo ele, não podem mistificar seus adversários,
pelo fato de que não têm nada a oferecer que atenda aos seus interesses imediatos. “Tal
circunstância, por si, já mostra o quanto é frustrante tentar explicar a ideologia
simplesmente sob o título de „falsa consciência‟, pois o que define a ideologia como
ideologia [...] é [...] sua situação real em um determinado tipo de sociedade.”
Mészáros (2004, p.57) destaca “[...] que em nossas sociedades tudo está
impregnado de ideologia‟, quer a percebamos, quer não.” Para o autor

[...] o que determina a natureza da ideologia, acima de tudo, é o imperativo de


se tornar praticamente consciente do conflito social fundamental – a partir
dos pontos de vista mutuamente excludentes das alternativas hegemônicas
que se defrontam em determinada ordem social – com o propósito de resolvê-
lo pela luta. Em outras palavras, as diferentes formas ideológicas de
consciência social têm (mesmo se em graus variáveis, direta ou
indiretamente) implicações práticas de longo alcance em todas as suas
variedades, na arte e na literatura, assim como na filosofia e na teoria social,
independentemente de sua vinculação sociopolítica a posições progressistas
ou conservadoras. (MÉSZÁROS, 2004, p.66).

A dominação política não se efetua unicamente por intermédio da repressão: a


dominação estatal implica a intervenção decisiva da ideologia que legitima essa
repressão. Elas realizam-se nas instituições ou aparelhos. A escola é a instituição
encarregada de reproduzir a ideologia dominante pelo conhecimento e valores que
transmite (ALTHUSSER, s/d). Para garantir a reprodução dos meios de produção, os
sistemas políticos precisam garantir também a reprodução da força de trabalho,
assegurada pelo sistema escolar, e pressupõe a submissão à ideologia dominante como
meio de preservar os lugares, de acordo com os seus interesses.
Desta forma, o que se percebe é uma influência muito grande da ideologia
dentro da educação. Podemos notar isso quando dizemos “A educação é um direito de
todos”. Essa afirmação é abstrata e deixa brechas, pois apresenta como universal um
valor que beneficia apenas uma classe. Quando observamos as estatísticas que mostram
a evasão e o baixo índice de frequência por parte das classes mais desfavorecidas, são
comuns as “explicações” em função das dificuldades de adaptação, do mercado de
trabalho e até do desinteresse ou preguiça. O que está oculto aí é que na sociedade de
classes há uma contradição entre os que produzem a riqueza material e cultural com seu
trabalho e os que usufruem essas riquezas, excluindo delas os produtores. Assim, a
educação é um dos bens a serem usufruídos pelos componentes da classe dominante. A
educação aparece como um direito de todos, mas, analisando a gênese da produção e
usufruto dos bens, descobre-se que de fato a educação de qualidade está restrita a uma
classe, que é a classe que continuará dominando.
Além disso, a ideologia mostra uma realidade invertida, ou seja, a burguesia
afirma que existem nos homens diferenças individuais e que determinam a desigualdade
social: a desigualdade natural seria a causa da desigualdade social. Ora, a sociedade é na
verdade resultado das desigualdades sociais estabelecidas pela divisão do trabalho e
pelas relações de produção que determinam as desigualdades individuais. Não podemos,
no entanto, desconsiderar as diferenças que de fato existem entre os indivíduos, como
interesses, aptidões, etc. Mas, grosso modo, a atividade a que cada um se submete
aparece como decorrente da competência e não como resultado da divisão de classes, as
pessoas pensando desse jeito ficam mais fáceis de continuar com essa reprodução
(DUARTE, 2003).
Mais um exemplo: se um filho de operário não melhora o padrão de vida, isto é
explicado como resultado da sua incompetência, falta de força de vontade ou disciplina
de trabalho, quando na realidade suas chances de melhorar não dependem só dele, mas
também da classe que detém os meios de produção. E o que as pessoas mais escutam é
que elas não são capazes, por diversos motivos e que precisam estudar, mas como se a
escola o preparará para continuar nessa situação.
Essa divisão hierárquica entre o pensar e o agir se encontra nitidamente na
divisão social do trabalho, pois alguns se dedicam ao trabalho intelectual e outros, ao
trabalho manual. Uma classe “sabe pensar”; a outra “não sabe pensar” e só executa.
Portanto, uma decide, porque sabe, e a outra obedece.
A ideia que nos passam é de que a escola sempre surge como uma possibilidade
de democratização, na medida em que promoveria a mobilidade social. Mas, ao
contrário, constatamos altas taxas de repetência e evasão escolar, sobretudo nas
camadas mais pobres da sociedade. Além disso, o próprio funcionamento da escola
repete a estrutura hierarquizada, reproduzindo muitas vezes as relações autoritárias
existentes fora dela.
Este texto procura discutir a questão da influencia da ideologia na educação.
Interessam-nos também, analisar como o texto didático veicula certos valores que visam
adequar o individuo à sociedade, integrando-o na ordem estabelecida.

Figura 2: Tirinhas da Mafalda.


Fonte: capbunifesp.wordpress.com. 2016.

Há um longo debate a respeito da possível ação transformadora da escola. Pela


análise de textos didáticos, recursos oferecidos, valorização do professor e demais
funcionários da área da educação etc, conclui-se que a escola tem função reprodutora,
isto é, ela é apenas uma peça da engrenagem do sistema político vigente e, portanto
passível da ação da ideologia (LUCKESI, 1994).
A escola deve ser um espaço de luta, de denuncia da domesticação, da
desalienação, da reflexão, do senso crítico, do aprendizado, da igualdade de direitos e da
procura de soluções para tantos problemas que temos encontrado na sociedade, na
família na escola, etc. Precisamos começar a pensar e a procurar caminhos para que a
escola cumpra seu papel, dando chances iguais para todos. Se amanhã uma educação
revolucionária for possível é porque, hoje, no interior de uma educação conversadora e
reacionária os elementos de uma nova educação libertadora e revolucionária se fizeram
presentes. Essa mudança de espaço dominado para espaço dominante não se fará nem
espontaneamente, nem de um momento para outro; por isso é necessário uma verdadeira
pedagogia do conflito que evidencie as contradições em vez de camuflá-las, com
paciência, ações revolucionárias e conscientes do que historicamente é possível fazer,
mas sem omitir, enganar ou camuflar.

2.2 Filosofia, conhecimentos, ensino e aprendizagem

A Filosofia é um saber que leva o homem a uma reflexão mais rigorosa e radical
sobre ele mesmo e sobre o mundo com o qual interage. Desta forma, ao apresentar uma
consciência filosófica ele se afasta do senso comum, caracterizado por não realizar uma
reflexão crítica à cerca da realidade, pois começa a questionar todas as verdades em que
acreditava, não aceitando-as como prontas e acabadas e procurando pensá-las de uma
nova forma, mais sistemática e coerente, encontrando então, respostas que não são
absolutas mas que apresentam um caráter provisório, já que seu pensamento se dá em
uma realidade histórica que sofre constantes mudanças. Assim Cartolano afirma:

A atividade filosófica (...) é trabalho do pensamento sobre a experiência real,


ou seja, negação da experiência imediata, empírica, não pensada, e criação de
saber, no interior do não-saber. Nesse sentido, as respostas que sugere e os
problemas que levanta são sempre provisórios, pois a realidade sobre a qual
trabalha é histórica e não permanente (CARTOLANO, 1985, p. 34).

Por ser a filosofia uma reflexão e por apresentar respostas provisórias aos seus
questionamentos, muitos acreditam que ela seja um saber puramente contemplativo, que
não apresenta resultados práticos logo, não tem valor, sendo portanto, um saber inútil e
dispensável para os propósitos atuais da humanidade pois esta procura saberes que
apresentem resultados imediatos que possam contribuir para o aprimoramento da
tecnologia.
Contudo mesmo que a Filosofia fosse inútil ela assim o seria porque sua
finalidade se encontra nela mesma, se apresentando como um saber que pode ajudar o
homem a se libertar das vendas que o deixa cego ou com uma visão distorcida da
realidade que o cerca.
Mendonça (1970) faz uma discussão interessante acerca da dita “inutilidade” da
Filosofia afirmando que se analisarmos a palavra útil perceberemos que seu significado
seria o de que é tudo o que tem finalidade no outro, assim inútil seria então, o que não
tem um fim no outro. Desta forma pode-se pensar o seguinte: não tem um fim no outro
porque não tem finalidade alguma ou não tem um fim no outro porque tem finalidade
em si mesma. E se for para pensar a Filosofia como inútil, voltamos a afirmar que ela o
é porque sua finalidade se encontra dentro dela.
Assim engana-se também, aquele que pensa na filosofia como um saber
contemplativo, ela é uma reflexão que visa a ação, pois ao pensar a realidade, ela a faz
de forma sistemática, se constituindo então em um entendimento coerente e crítico que
possibilita um direcionamento para a ação. Desta forma concordamos com Luckesi ao
afirmar que “A Filosofia é uma forma de conhecimento que, interpretando o mundo,
cria uma concepção coerente e sistêmica que possibilita uma forma de ação efetiva”.
(LUCKESI, 1994, p. 27).
Assim, no nosso entendimento todos estes problemas que vem ocorrendo com a
educação são decorrentes das políticas impostas pelo neoliberalismo, que visam a
privatização das escolas públicas. O que nos conduz a concordarmos com Gentili
quando afirma que o neoliberalismo pretende“...transferir a educação da esfera política
para a esfera do mercado, negando sua condição de direito social e transformando-a em
uma possibilidade de consumo individual”. (GENTILI, 1987, p. 25).

2.3 O Conhecimento e suas expressões

Quem não sabe pensar, acredita no que pensa. Quem sabe pensar, questiona o
que pensa. A lógica parece ser intrínseca á racionalidade humana, mas no concreto da
vida acarreta certa artificialidade, porque reduz a relações lineares, o que, de si, é
tremendamente complexo e interdisciplinar (SANTOS, 2004).
A Internet e as tecnologias digitais fizeram emergir um novo paradigma social,
descrito por alguns autores, como sociedade da informação ou sociedade em rede
alicerçada no poder da informação (CASTELLS, 2003), sociedade do conhecimento
(HARGREAVES, 2003) ou sociedade da aprendizagem (POZO, 2004). Um mundo
onde o fluxo de informações é intenso, em permanente mudança, e “onde o
conhecimento é um recurso flexível, fluido, sempre em expansão e em mudança”
(HARGREAVES, 2003, p. 33). Um mundo desterritorializado, onde não existem
barreiras de tempo e de espaço para que as pessoas se comuniquem. Uma nova era que
oferece múltiplas possibilidades de aprender, em que o espaço físico da escola, tão
proeminente em outras décadas, neste novo paradigma, deixa de ser o local exclusivo
para a construção do conhecimento e preparação do cidadão para a vida ativa.
Duarte (2003) considera que a “sociedade do conhecimento” é uma ideologia
produzida pelo capitalismo e sua função ideológica é desmobilizar as críticas radicais ao
capitalismo. A ênfase atribuída ao conhecimento como determinante no
desenvolvimento da sociedade revela o seu caráter ideológico na medida em que
mascara as contradições imanentes à sociedade.
Sob a perspectiva de Bell (1973, p.136), “na sociedade capitalista, a instituição
primordial tem sido a propriedade privada, e na sociedade pós-industrial é a
centralidade do conhecimento teórico.” O critério de propriedade para definição de
classe é diluído pelo critério de capacidade técnica e de posição política. Assim, a classe
mais importante é a profissional, baseada mais no conhecimento do que na propriedade
e o conflito entre capital e trabalho é, nessa perspectiva, suplantado pelo acesso à
educação. Partindo dessa análise, a expressão “sociedade do conhecimento” tem cada
vez maior importância na caracterização das mudanças sociais. Entretanto, Lojkine
(2002) questiona a validade da tese da sociedade pós-industrial e sustenta a ideia da
existência de uma sociedade pós-mercantil, já que, para ele, a informação não tem a
característica de uma mercadoria. A revolução informacional substitui, na acepção de
Lojkine, o proletariado como sujeito revolucionário pelo novo sujeito, ou seja, “todos”
os trabalhadores e empresários.
Figura 12: Tirinhas da Mafalda.
Fonte: pt.slideshare.net. 2016.

Castells (2000) considera que a mudança do industrialismo para o


informacionalismo não é equivalente à transição das economias baseadas na
agropecuária para as industriais e ao surgimento da economia de serviços, pois, para ele,
coexistem a agropecuária informacional, a indústria informacional e as atividades de
serviços informacionais.
Castells (2000, p.78-79) aponta cinco características do paradigma da tecnologia
da informação: a) a informação é sua matéria prima, pois são tecnologias para agir sobre
a informação; b) todos os processos de nossa existência individual e coletiva são
moldados pelo novo meio tecnológico, uma vez que há uma grande penetrabilidade dos
efeitos das novas tecnologias; c) a lógica de redes é implantada em qualquer sistema ou
conjunto de relações para estruturar o não-estruturado; d) é baseado na flexibilidade,
promovendo a reconfiguração das organizações, pois a sociedade é caracterizada pela
constante mudança e fluidez organizacional; e) crescente convergência de tecnologias
específicas para um sistema altamente integrado (microeletrônica, telecomunicações,
optoeletrônica e computadores são integrados nos sistemas de informação).
A disseminação da sociedade do conhecimento como constructo teórico
explicativo das mudanças na sociedade demonstra ter um caráter ideológico que
legitima a lógica do capital, pois não desvela as contradições do modo de produção
capitalista. Para Ferreti (2008, p.644), o uso da expressão sociedade do conhecimento
“[...] homogeneíza sociedades heterogêneas, seja do ponto de vista econômico (ainda
que regidas pelo modo de produção capitalista), seja do ponto de vista social e cultural”.
A partir do exposto, questiona-se: Todos os países têm condições de produzir e
de ter acesso aos conhecimentos científicos? Os conhecimentos são aplicados para a
solução dos principais problemas sociais?
A partir de uma análise marxiana, é possível afirmar que o argumento de que o
acesso ao poder econômico se dá pela aquisição de conhecimento é inadequado. O
pressuposto de que a contradição entre capital e trabalho é fundante na sociedade
capitalista é desconsiderado, mascarando as diferenças de classe. Há um fetichismo da
tecnologia, pois a mesma assume, nos argumentos dos autores analisados, uma
predominância na sociedade que inverte as relações (relações materiais entre pessoas e
relações sociais entre coisas). A ideia de que a educação possibilita o acesso ao poder
econômico é uma inversão da realidade que precisa ser questionada.

2.4 Atividades de aprendizagem

EU ETIQUETA
Carlos Drummond de Andrade

Fonte: http://educador.brasilescola.com/estrategias-ensino/o-consumismo-
na-voz-carlos-drummond-andrade.htm. 2016.
Em minha calça está grudado um nome
que não é meu de batismo ou de cartório,
um nome... estranho.
Meu blusão traz lembrete de bebida
que jamais pus na boca, nesta vida.
Em minha camiseta, a marca de cigarro
que não fumo, até hoje não fumei.
Minhas meias falam de produto
que nunca experimentei
mas são comunicados a meus pés.
Meu tênis é proclama colorido
de alguma coisa não provada
por este provador de longa idade.
Meu lenço, meu relógio, meu chaveiro,
minha gravata e cinto e escova e pente,
meu copo, minha xícara,
minha toalha de banho e sabonete,
meu isso, meu aquilo,
desde a cabeça ao bico dos sapatos,
são mensagens,
letras falantes,
gritos visuais,
ordens de uso, abuso, reincidência,
costume, hábito, premência,
indispensabilidade,
e fazem de mim homem-anúncio itinerante,
escravo da matéria anunciada.
Estou, estou na moda.
É duro andar na moda, ainda que a moda
seja negar minha identidade,
trocá-la por mil, açambarcando
todas as marcas registradas,
todos os logotipos do mercado.
Com que inocência demito-me de ser
eu que antes era e me sabia
tão diverso de outros, tão mim mesmo,
ser pensante, sentinte e solidário
com outros seres diversos e conscientes
de sua humana, invencível condição.
Agora sou anúncio,
ora vulgar ora bizarro,
em língua nacional ou em qualquer língua
(qualquer, principalmente).
E nisto me comparo, tiro glória
de minha anulação.
Não sou - vê lá - anúncio contratado.
Eu é que mimosamente pago
para anunciar, para vender
em bares festas praias pérgulas piscinas,
e bem à vista exibo esta etiqueta
global no corpo que desiste
de ser veste e sandália de uma essência
tão viva, independente,
que moda ou suborno algum a compromete.
Onde terei jogado fora
meu gosto e capacidade de escolher,
minhas idiossincrasias tão pessoais,
tão minhas que no rosto se espelhavam
e cada gesto, cada olhar
cada vinco da roupa
sou gravado de forma universal,
saio da estamparia, não de casa,
da vitrine me tiram, recolocam,
objeto pulsante mas objeto
que se oferece como signo de outros
objetos estáticos, tarifados.
Por me ostentar assim, tão orgulhoso
de ser não eu, mas artigo industrial,
peço que meu nome retifiquem.
Já não me convém o título de homem.
Meu nome novo é coisa.
Eu sou a coisa, coisamente.

Fonte: ANDRADE, C. D. Obra poética. Volumes 4-6. Lisboa: Publicações Europa-América,


1989.

 A partir da poesia, analise-a correlacionando com os conceitos de Ideologia, Educação e


Conhecimento.

2.5 Aprofundando o conhecimento

2.5.1 Exercícios de aplicação

Qual tem sido a prática escolar com o conhecimento? Disserte sobre a atual prática do
conhecimento na atividade escolar, considerando a nossa denominada “sociedade do
conhecimento”.
2.5.2 Questão para reflexão

“Conclamar as pessoas a acabarem com as ilusões acerca de uma situação é conclamá-


las a acabarem com uma situação que precisa de ilusões” (MARX, 1993).

2.5.3 Leitura indicada

CHAUÍ, Marilena. O que é Ideologia? 7. ed. São Paulo: Brasiliense, 1981.(Coleção


Primeiros Passos). Disponível em: https://drive.google.com/file/d/0B9KQSm2-
3ng6YjRUazRaMmltdjA/view?pref=2&pli=1
3. C ONTEXTO HISTÓRICO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA E AS

MATRIZES EDUCACIONAIS NO PAÍS

A educação popular no Brasil sempre foi constituída a partir de um conceito


diferenciado de educação das elites. E quase a educação popular, em algum tempo, foi
mais assumidamente colocada como a proposta educacional que teve origem no seio da
população brasileira, no conjunto das forças sociais, contrárias à visão de educação
escolar, o escolacentrismo, que quase sempre teve origem nas propostas da sociedade
aristocrática ou das classes aristocráticas dominantes no Brasil. A educação popular,
quase sempre, foi reivindicação dos movimentos sociais no Brasil. E
predominantemente a educação escolar dominante foi proposta concessiva,
compensatória em determinados momentos históricos.

Mas para fazer uma análise dessa matriz histórica de educação para entendê-la
frente à globalização eu lembraria uma frase do teatrólogo brasileiro Odivaldo Viana
Filho, que dizia: “Olhar nos olhos da tragédia é começar a dominá-la.” Não é muito
fácil e não positivo você olhar historicamente o que foi feito à educação e participação
na história da sociedade brasileira. E aí é obrigação do pesquisador apresentar a todos,
os que estão vinculados à mesma perspectiva política que ele, matrizes de modo a
apontar os conflitos, ainda que despidos de agressividade, para que se possa depois
construir perspectivas de enfrentamento, proposituras políticas de ação, que são aquelas
que alteram o mundo, são aquelas que alteram a possibilidade histórica de nossa
intervenção.

Eu diria: a educação popular tem que ser hoje profundamente reavaliada e


reorientada porque numa sociedade de massas como a nossa aquilo que sempre foi o
núcleo da educação popular, os valores, as ideias emancipatórias, os valores
participativos, também hoje terão que ser outra vez relembrados, porque, como
lembrava o saudoso Paulo Freire, “Aquilo que é popular tem também a inclusão da
ideologia dominante na cabeça do dominado. E a consciência ingênua, alimentada de
maneira perversa se torna patológica.”. Não é porque é popular que é emancipatória.
Tem muita coisa popular que repete a barbárie dos dominantes; e é necessária que a
educação popular não seja educação popular para a alienação, para o mercado, para os
valores da competitividade, mas educação popular para a emancipação humana, para
libertação, para a igualdade.

É preciso um adjetivo para a educação popular. Só o popular hoje em dia não


sustenta muito porque o popular também hoje assiste o “Ratinho”, o “Big Brother” e
consome toda a padronização que a sociedade brasileira esta assistindo atualmente. E
quase sempre, mantido sob a alienação histórica, o popular tem sido massa de manobra
de todas as armadilhas e artifícios da classe dominante. Então, é preciso que a educação
popular seja realimentada para emancipação e não simplesmente aquele romantismo de
que tudo aquilo que vem do povo, seja, por si só, libertador. É preciso que a gente pense
nesse processo.

Eu diria que a palavra educação pode ser dividida em dois sentidos: educação
enquanto produção social do homem, formação para viver em sociedade (o sentido lato
da palavra) e educação no sentido escrito, como escolarização formal, letramento,
organização escolar. A educação como produção social do homem é endoculturativa
(endocultural vem da palavra grega endo – aquilo que está dentro, trazer para dentro da
cultura). Pela linguagem a mãe traz crianças para a cultura. Pelos papéis sociais a
família cria identidade. Então, educação no sentido amplo é toda intervenção da
sociedade na produção social do homem. Educação escolar tem uma certidão de
nascimento, tem um momento em que a escola nasceu, e que no Brasil, quase sempre a
escola, modelo dominante de educação escolar, esteve em contraponto com a educação
do povo. A escola era resultante de conjunto de forças; a educação informal, desde as
origens, tornou-se sempre uma educação resistente e contraproducente à educação
formal.

Gostaria de lembrar que esse fenômeno que é o processo de globalização que


assistimos hoje, o processo de expansão do capital, expansão das potencialidades
mercadológicas, do dinheiro e dos valores derivados da prática cumulativa do
capitalismo; esse processo de globalização econômica, de periferização da produção a
partir de novos modelos de produção, e de globalização cultural, de influência de um
tipo de vida; não é um outro modelo econômico de uma outra fase do mesmo
capitalismo que se estabeleceu desde 1500 em nossas terras, desde o começo dos
chamados 500 anos. Nós temos que entender que a globalização é o acentuado processo
que já permaneceu presente desde o modelo original que marcou o nosso país.

Para discutir as matrizes desse processo, eu vou trabalhar uma tipologia


cronológica, algumas datas e algumas diretrizes ético-formais de cada momento. Nós
sabemos que o Brasil foi conquistado. A palavra que se usa mais hoje é conquistada e
não descoberta (que é uma palavra que parece um acidente) e nem se usa achamento,
como usava Darcy Ribeiro (que parece uma outra expressão absolutamente genérica). A
expressão, cunhada a partir da obra de Sérgio Buarque de Holanda, é conquista; o Brasil
foi um processo de conquista.

O modelo que se estabeleceu sobre o nosso país de organização política e modelo


social demandou o modelo educacional. Nós sabemos que as nações europeias, todas
naquele momento viviam o renascimento das ideias burguesas: a afirmação do homem,
a afirmação da burguesia, a afirmação das grandes mudanças técnicas que depois se
transformarão em tecnológica. E aí, o movimento iluminista, o movimento protestante e
o movimento moderno na Europa, avançavam os valores daquele momento primário do
capitalismo. E na Europa juntou-se um conjunto de forças também para restaurar a
Idade Média.

As forças mais conservadoras, reacionárias, o que havia de mais atrasado na


Europa, reuniu-se ao redor da Companhia de Jesus. Os jesuítas, que foram o que havia
de mais atrasado do ponto de vista cultural e do ponto de visa institucional. Os jesuítas
foram para o Vietnã e na cultural milenar do Vietnã foram trucidados (foram os trinta
mártires do Vietnã). E eu estou fazendo uma análise histórica sem considerar o
envolvimento pessoal de cada um deles. Os jesuítas que foram para a China são os
mártires da China, os que foram para o Japão são os mártires do Japão. O Brasil foi o
primeiro país a receber os jesuítas. E foram recebidos aqui numa aliança mercantil
salvacionista.

O poder mercantil do Império Lusitano e o salvacionismo português, um


legitimava o outro, ao ponto das cartas de Anchieta e de Manuel da Nóbrega dizerem
sobre os índios: “São todos bestiais, andam com as partes pudendas expostas, são
selvagens, incapazes de trabalho. É preciso se lhe coibir a voluptuosidade pela
pedagogia do chicote e do castigo.” A tradição jesuíta estabeleceu a primeira matriz
educacional no Brasil. A tradição jesuíta, servindo ao império salvacionista português,
trazia os patifes (os meninos de rua de Portugal) para ganharem os curumins para traze-
los ao processo proselitista. Patifes eram meninos de rua abandonados que vinham com
os Portugueses para se tornar aqui os aliciadores particularmente das crianças, para o
enquadramento na lógica dominante lusitano-salvacionista.

O jesuíta criou no Brasil dois tipos de educação: a educação para a elite e a


catequese para o povo. As cartas dos teóricos jesuítas diziam: “Ao povo só é necessário
o aprimoramento moral, mas às elites, a instrução para que assuma o seu papel de
condutores da sociedade.”. E nessa dualidade educacional o jesuíta criou a primeira
forma elitizada de educação privada no Brasil. As escolas jesuítas, até
arquitetonicamente, são escolas góticas, bonitas, belas, para a elite. E aquilo que é
popular é assistencial, pequeno, porco, porque aquilo que era para manter a sua relação
na sociedade. Os jesuítas ficaram no Brasil educando de 1549 (quando chegaram) a
1759; duzentos e dez anos de monopólio absoluto no Brasil.

Quando foram expulsos pelo marquês de Pombal, numa lógica política de dois
grupos lusitanos em disputa (os esclarecidos contra os conservadores), os jesuítas
tinham 32 colégios, no Brasil contra 26 na Europa inteira. Por isso, a educação no
Brasil, além de ter sido uma veia ideológica, sempre foi um negócio proselitista e
mercantil, quase sempre qualificação das camadas dominante.

Aí, dessa primeira matriz, a Escola Convento, a escola que formou pessoas para
aceitar resignadamente o modelo, imposto para as comunidades indígenas. Como os
índios resistiam? Fugindo, correndo; e alguns índios, como lembram os antropólogos
que estudaram a resistência Guarani no Sul, matavam o terceiro filho. Um poema
registrado por Francisco Veti diz: “Porque matavam o terceiro filho? Porque na hora
de fugir, a mãe leva um, o pai leva outro e não tem quem carregue o terceiro.” Quer
dizer, chega ao nível até agressivo de uma imagem para mostrar a resistência pessoal,
grupal, cultural do indígena ao apresamento e à forma de controle de havia.

Não havia escola para os negros, na havia escola para os portugueses pobres que
lutavam em Quilombos, que lutavam na Confederação dos Tamoios, que lutavam em
resistência própria à cultura salvacionista mercantil portuguesa que aqui se estabelecera.
A escola jesuíta sempre esteve de mãos dadas com o processo colonial português.
Nunca foi escola popular, nunca trabalhou a questão popular.
Com a expulsão pelo marquês de Pombal, em 1759, essa escola convento é
superada. Marquês de Pombal “cria” a educação no Brasil. Se eu perguntasse aqui por
que o dia 15 de outubro é o Dia do Professor, pouca gente saberia responder. É porque
15 de outubro é o dia do decreto que o marquês de Pombal fez estabelecendo a
educação pública no Brasil, 15 de outubro de 1764. E estabeleceu a função do professor
público. É preciso perceber que a educação pública foi proposta por Pombal, mas não
foi efetivada, criando uma matriz no Brasil muito curiosa dos governos serem capazes
de destruir o que havia e incapaz de construir o que acontece depois.

É uma coisa muito comum dos governos que sucedem, destroem o modelo e
criam outro. O Marquês de Pombal criou uma escola que eu chamo Escola Fraude, a
escola que fraldava e somente servia para qualificar os interesses das classes
dominantes. A escola pombalina era uma escola de aulas avulsas, régias, aulas isoladas.
Vinha o professor que passava em várias capitais e emitia diplomas sem formação. As
elites recebiam o diploma, criando no Brasil um fenômeno chamado bacharelismo, que
dava acesso ao diploma sem que a pessoa tivesse formação. As pessoas tinham o
diploma como uma nobreza intelectual, mas sem a formação.

As classes dominantes quase sempre eram chamadas de doutores, quando não


tinham nenhuma titulação de doutorado, eram bacharéis e faziam da escola a
continuidade do coronelismo. O filho do latifundiário fazia com o diploma de médico o
“coronelismo intelectual” que ele podia produzir. Sempre a escola legitimava o poder
dominante também no período imperial pombalino. Eu chamo de Escola Diploma: 30
pessoas faziam a escola e saiam 120 diplomas, porque entregavam para os parentes. O
notário falsificava o diploma. Com o diploma, bacharelismo, se fraudou o segundo
modelo de escola no Brasil.

O terceiro modelo de escola vai se constituir a partir da República. Esse do


marquês de Pombal vai continuar extensivo durante todo o império brasileiro até 1989.
a República brasileira cria o terceiro fenômeno educacional. É nomeado para o cargo de
ministro da Educação o tenente-coronel Benjamin Constant, militar positivista francês,
que vem para cá e se torna o ministro da Educação e da Instrução e Saúde Pública. No
seu discurso inaugural ele dizia assim: “A escola tem que ser como um quartel. Crie-se
a disciplina para que tiremos do povo os desvios atávicos próprios da cultura nativa e
da cultura negra, mas que pelo quartel façamos a eugenia.” Ou seja, a melhoria do
chamado padrão étnico brasileiro, transformando as pessoas europeizadas, voltadas para
a Europa.

Hoje, nós temos maior proximidade com a Europa e Estados Unidos do que com a
América Latina. Nós temos as costas viradas para a América Latina. Temos,
culturalmente, uma certa desagregação dos nossos irmãos latino-americanos. Quase
sempre o nosso olhar é europeu, e agora com o filhote da Europa, os Estados Unidos.
Não temos uma vinculação orgânica com a América Latina.

Os positivistas transformaram a Escola Convento em Escola Quartel. Educar na


perspectiva positivista era produzir corpos obedientes, de tal maneira que muitos
professores, direcionados do modelo dos jesuítas para o militar dizem que “...educar é
produzir obediência”. Uma grande e famosa afirmação de Rousseau afirma assim: “A
obediência é um valor medieval, o respeito é um valor moderno. As crianças não devem
ser educadas para ser obedientes, próprios da vassalagem, mas educadas para serem
respeitosas, próprio da autonomia.”. O respeito é diferente da obediência. Dessa forma,
nós não tivemos nenhum modelo pedagógico de educação moderna.

Disponível em: http://2.bp.blogspot.com/-


xwUB8seR7Qw/TyIFLjaUUtI/AAAAAAAAAFU/htYPzzLu_ww/s1600/Caetano+de+
Campos++(1).jpg

A escola positivista militar efetivou de vez, a pedagogia do controle, do medo e da


competição: quem é o primeiro, quem está mais adequado à ordem, quem é o que
compete melhor, o que tira a melhor nota e não todo o conjunto da sociedade voltado
para se qualificar escolarmente. Como é que o povo participou do período republicano
das demandas educacionais? Simplesmente por reivindicações. Até 1930 no Brasil não
havia ninguém das camadas populares na escola. Não havia nenhuma escola popular. As
mulheres não participavam nem da vida política (a mulher vai votar, por direito, a partir
de 1934). Não votavam os analfabetos, não participavam os pobres.

Até 1930 o voto era censitário: quem tinha uma renda de 100 mil réis é que podia
votar e ser votado no Brasil, o que significava que a República brasileira de 1989 a 1930
congregava 6% da população da elite brasileira contra 94% das classes populares. Era
uma cidadania chamada abstrata, na expressão de Hugo Lovisollo. Na cidadania
abstrata você tem o direito, mas não o exerce de fato, é apenas um direito formal. E a
cidadania abstrata fez com que a educação no período positivista fosse a qualificação
das camadas médias. Os positivistas, que são por natureza anticlericais, criaram escolas
voltadas à formação burguesa, mas com uma inspiração também clássica.

Foi através da educação positivista, no início da década de 1930 que a classe


média entrou na escola, sendo que esta escola era para as camadas médias republicanas,
os funcionários públicos. Nós tivemos a expansão dos colégios militares (os militares
entraram na Guerra do Paraguai, em 1864 a 1871, como bandidos e saíram como heróis)
e até hoje as escolas militares são belíssimas (os melhores lugares, bem organizados)
porque eram um fator de mobilidade social da classe média. O estilo gótico jesuíta para
a elite; as camadas médias faziam mobilidade pela Escola Quartel.

Getúlio Vergas inicia um novo modelo de escola no Brasil, a partir de 1930.


Getúlio Vargas em todas as coisas foi inovador, nacionalista, com as contradições desse
termo na época. Agora, na única coisa que ele foi mais conservador: na educação.
Chamou para ministro da Educação Francisco Campos, que era integralista, vice-
presidente do Partido Integralista, o partido que seguia no Brasil as ideias de Adolf
Hitler. Saudavam-se uns aos outros com o anauê (salve o chefe); tinham práticas
paramilitares, roupa verde, gravata preta; controle policialesco da vida das pessoas. No
seu discurso de posse Francisco Campos disse: “A escola brasileira tem que ser um
funil, com a boca enorme para que todos entrem, mas só os mais aptos cheguem ao
topo.” A escola convento, a escola fraude de diploma, a escola quartel e agora a
escola funil.

Como é que se chamou a escola de Francisco Campos? “Grupo Escolar”. Muitos


até fizeram grupo escolar. O grupo escolar tinha uma função curiosamente seletiva e
elitista. Todo mundo tinha que ir para a escola. Getúlio Vargas foi capaz de criar no
Brasil, através dos seus órgãos de propaganda, uma comoção de que todo mundo tinha
que ir para escola, mas os pobres tinham que fazer da 1ª à 4ª série, apenas; só aprender a
ler para poder votar e ter carteira de trabalho, porque o capitalismo que se implantava no
Brasil, com uma industrialização dependente e de base, necessitava de uma classe
operária, que através da escolarização, se adequasse estratificadamente no mundo do
trabalho. Então, nós passamos de uma cidadania abstrata a uma cidadania tutelar pela
forma de entrada no mercado de trabalho.

Com Getúlio Vargas nós temos o grupo escolar, de inspiração arquitetônica que
representou a ideologia fascista. Como eram as escolas do grupo escolar. Uma grande
escada (lugar de bandeiras), a sala da direção (com o globo, o crucifixo e o esqueleto do
lado: ciência, religião e poder, militar, representando o poder institucional), do outro
lado a inspetora para controlar os alunos, as salas todas nos corredores e um pátio
enorme (num país tropical, sem nenhuma árvore). Nessa escola não tem lugar para você
ficar escondido. É a arquitetura da vigilância: de qualquer lugar que a diretora estiver
está vigiando o pátio. Os alunos vêm, ficam em fila e se transformam em cantores do
hino nacional, cantores dos símbolos pátrios, quando o Brasil inteiro estava sendo
entregue ao capital internacional, num nacionalismo ufanista e completamente hipócrita
naquele momento.

A ESCOLA DEVERIA
ESTAR ABERTA PARA
MUITOS ENTRAREM, MAS
SOMENTE OS
“MELHORES”
CONSEGUIRIAM CHEGAR
AO FIM.

Disponível em: https://s3-sa-east-1.amazonaws.com/leroy-


production//uploads/img/products/funil_plastico_laranja_bricolagem_2_unidades_impo
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A escola grupo escolar foi uma escola que Getúlio Vargas expandiu e que durou
de 1931 (com Francisco Campos) até 1961(com as leis tecnicistas). Então notem bem:
Escola Convento dos jesuítas (elitizadas), Escola Fraude no marquês de Pombal (do
diploma), Escola Quartel do Benjamin Constant, Escola Funil do Francisco Campos.
Escola Funil por que Francisco Campos prescreveu o seguinte: “a escola tem que ser
um lugar de competição intelectual para que os mais aptos cheguem ao topo”. Então, a
cada semana tinha uma sabatina, uma prova; a cada fim de mês, uma prova mensal,
bimestral; ao final do ano um outro exame e ao final de quatro anos o Exame de
Admissão para quem fosse para o ginásio. Era cheio de seletividade.

Isso mostra que os mecanismos internos da escola sempre voltados para a seleção
social. Até 1930, quando a escola brasileira era para qualificar as camadas dominantes,
não havia reprovação na escola: eram dez vagas, todo mundo entrava e todo mundo era
aprovado. Só vai começar a reprovação, exclusão pelo suposto fracasso escolar a partir
de 1930 para cá. Porque com êxodo rural, as camadas populares, os herdeiros das
senzalas, os abandonos dos seus sítios, os colonos pobres vêm para a cidade e a
escola tem que ser seletiva. Ela expulsa sempre os mais pobres, os mais sofridos,
aqueles que não podem galgar pelo espaço público a mobilidade social necessária para o
capitalismo estratificado.

Essa escola de Francisco Campos vai até 1961. Com as leis tecnicistas que
preparam a ditadura militar, os militares fazem, a meu ver, uma outra escola, que eu
chamo de Escola Limbo (é uma expressão popular que não era nem o céu nem o
inferno. Você não ia para o céu por que o céu era o paraíso, lugar do gozo eterno; nem
ia para o inferno porque no inferno era a condenação, mas ia para o limbo, que se
imaginava como um negócio meio viscoso, cheio de criança querendo sair). Eu chamo
de limbo porque os militares expandiram fisicamente a instituição escolar, mas tiraram
da escola sua finalidade qualificativa.

A escola no governo militar virou centro de controle nutricional, virou lugar de


merenda (compensação para um povo que tem menor índice de consumo de calorias do
que o Paraguai, que tem 3.000 calorias / dia, contra 2.620 do Brasil); virou centro de
controle de zoonoses (vacina o cachorro, vacina o gato); virou centro médico
suplementar (com fonoaudiólogo, psicólogo); virou centro comunitário (quadras na
escola, competições) quando não é essa a sua função. A função da escola é formar para
a vida em sociedade, produzir socialmente o homem ético, estético, capaz de falar a
língua mãe, capaz de identificar-se geograficamente, ter raiz histórica, elevar o seu
padrão de criatividade e de ser solidário com os seus companheiros. A educação para o
trabalho social e ser produtivo: ter uma profissão com a qual ele vai sustentar-se a si e
aos demais.

A escola militar virou tudo, mas mesmo arquitetonicamente fizeram uma


mudança. Quando a escola pertenceu a elite era a gótica dos jesuítas, era a escola militar
da classe média, era o grupo escolar até arquitetonicamente um pouco mais adequado. A
escola de 1960 para cá é uma escola feia, baixinha, com salas abafadas, com torneiras
que não funcionam, banheiros abandonados, quebrada, sem controle nenhum porque é
uma escola para as camadas populares. Tudo que é para o povo o Estado brasileiro
deixa ser o mais feio. E o que é para o povo no Brasil? Escola pública, rodoviária,
delegacia e posto de saúde. São feios, abandonados, inócuos, ineficientes, porque a elite,
aquilo que é para ela faz funcionar bem. A Infraero é uma empresa que coordena os
aeroportos, é pública, mas funciona direitinho, organiza bem aquilo que é necessário
para elites do Brasil. O que é popular, quanto mais popular for, mais desqualificado
será.

Os militares fizeram a escola limbo e agora, quebrados na nossa forma


nacionalista-desenvolvimentista, nós estamos assistindo a um outro quartel econômico
social. O Estado brasileiro, particularmente na década de 1980 sucateou o patrimônio
publico em processos espúrios de privatização. Sabemos o quanto foi entregue nesse
processo. Sequer se conseguiu dar conta do básico. A Educação básica quer dizer:
Educação Infantil (0 a 5), Ensino Fundamental (6 a 14) e Ensino Médio (15 a 18). A
educação básica já está universalizada já está universalizada em quase todos os países
do mundo, enquanto que no Brasil ainda não conseguimos, ainda garantir essa
universalização.

E agora, a partir da globalização dos anos de 1990, da inserção no mercado


internacional, o nosso país assiste a uma destruição do seu equipamento público, e eu
lembro uma frase também evangélica que diz: “No fim dos tempos aqueles que pouco
têm, o pouco que lhes será tirado; aqueles que muito têm, ao muito que têm lhes será
acrescentado.” Então, o neoliberalismo, que é a ideologia política do processo de
globalização torna-se o Robin Hood às avessas, que rouba dos pobres para entregar aos
ricos. Quem acompanha qualquer estatística econômica sabe que das 200 maiores
empresas mundiais hoje somente três são da América Latina e uma delas é a Petrobrás.
As demais estão todas nos países centrais e são chamadas hoje de transnacionais e não
mais multinacionais porque multinacional dá uma ideia de que serve a muitas nações.
Elas estão numa sede de um país, mas passam por outros países “vampirescamente”
captando, especulando e voltando para o país central, que fica cada vez mais rico ao
ponto de a renda per capta americana ser 36 mil dólares a renda per capta brasileira
2.800 dólares. É enorme hoje a distância entre os países ricos e os países pobres.

Agora, notem bem: a escola globalizada, a escola que se anuncia de 1996 para cá
está prefigurada na LDB. A Lei 9394/96 de Diretrizes e Bases da Educação Nacional,
foi uma traição aos movimentos populares dos anos de 1980, lamentavelmente
protocolado por Darcy Ribeiro e sustentada sobre o então vice-presidente Marco Maciel
com os grupos mercenários que estabeleram a lei à ideologia. A LDB é pré-
estabelecedora do sistema educacional, é neoliberal, é uma lei que desmantela o serviço
público em todos os níveis para preparar o Brasil ao último assalto internacional do
capital. E a LDB não mais assume a educação como obrigatória do Estado; é do Estado
e da família, criando essa forma ambígua de responsabilidade as famílias pauperizadas
nesse processo.

A LDB criou o último modelo de escola que está se desenhando agora, que eu
brinco chamando Escola Cassino, essa escola que fica sorteando vagas, uma escola que
ainda não chegou a equalizar a demanda social básica. A Escola Parabólica, aquela que
acha que vai melhorar a educação colocando uma antena parabólica e uma televisão,
substituindo a relação pessoal por uma forma desescolorizada de educação que se
chama informática ou tele-educação. Ou Escola Computador, achando que o
computador vai salvar a escola. O Japão, na década de 1980, fez uma conferência
mundial de educação e os japoneses, numa das conclusões, disseram: “Nós poderíamos
e gostaríamos de colocar o equipamento tecnológico (o computador) em cada sala de
aula e até em cada carteira para cada aluno, mas faremos do aparato tecnológico um
subsídio à educação, porque nada substitui a educação que é essencialmente uma
relação humana professor-aluno.” Não se muda essa relação por um equipamento
tecnológico.

E essa Escola Parabólica fica com engodos. O vídeo-escola, aquela professorinha


ingenuamente diz agora eu aprendi a dar aula com o vídeo-escola. Ora, quem aprendeu
no vídeo não merecia o nome de professor. É mentira porque ninguém aprende com o
vídeo. Aprende a ser professor por manipular subsídio didático. Professor é aquele que
professa. Mas professar o que? A crença num tipo de homem, de mundo, num tipo
de ciência, num tipo de cultura. E deve ser ele o apanágio e aquele que garante numa
relação institucional escolar ou não escolar, popular, aquele processo com o qual ele
trabalha.

Eu diria: a globalização dilacera e dilapida a nossa sociedade. Um país que não


tem mais nenhum analfabeto, como a França, como a Inglaterra, os Estados Unidos, no
modelo liberal capitalista; países do bloco socialista, como a Rússia, com suas
contradições, e Cuba, como um exemplo mais próximo de nós, sem nenhum analfabeto
mais, universalizando a Educação Básica e massificando o Ensino Superior, investem
de 12% a 15% do PIB para manter o sistema educacional. O Brasil investe 4,2% do PIB
em educação. Então, com 4,2% do PIB você não faz milagre em lugar nenhum.

A escola brasileira ou a sociedade brasileira congrega ainda 19% de analfabetos e


70% da classe operária brasileira não tinha terminado ensino fundamental nos anos
2000. São com essas categorias que eu digo: a educação no Brasil sempre foi privilégio
das elites. A educação no Brasil é o maior símbolo do apartaid social desse país: tem
escola para rico e tem para pobre. A escola para rico é de um jeito para prepará-lo para
as funções qualificadas; a escola para pobre é para prepará-lo tuteladamente para o
ingresso caricato na sociedade de classes como trabalhador manual, manipulando e
alienando (NUNES, 2000).

E essa educação elitizada que não atingiu o estágio consensual do modelo é o


modelo atual que está, se preparando pela globalização e pelo neoliberalismo. Eu diria:
quem é que no Brasil reivindicou educação em escola? Sempre foram as camadas
populares. Sempre foram os grupos sociais. E aí, partiria de uma análise secundária para
chegar depois num ponto de propositura.

Penso eu que a educação ressente-se do modelo econômico adotado


particularmente neste século, quando se implanta aqui o modelo capitalista. Até 1930
podemos, dizer que o Brasil vive sob relações pré-capitalistas: relações de acúmulo de
capital, acúmulo mercantil, formas de capital que depois serão desenvolvidas na
industrialização. O capitalismo começa com Getúlio Vargas. Começa supostamente
como modelo dominante. Getúlio Vargas cria o primeiro surto de produção do
capitalismo no Brasil: financia com o dinheiro público a base da metalurgia e da
siderurgia para as grandes empresas nacionais. Cria, portanto o substrato da captação
das forças materiais básicas regulamenta o mundo do trabalho com legislações
trabalhistas, cria regras usuais de capitação de capital e a base de capitalismo.

Com a saída de Getúlio de 1945 até 1954 o Brasil fica uma tensão vai para o
caminho nacionalista ou vai para o caminho de internacionalização do capital que queria
abrir o Brasil às multinacionais? O Brasil sofre essa tensão. Quando Getúlio suicida-se,
em 1954, começa o segundo capitulo do capitalismo brasileiro: a internacionalização
plena do capital. Jucelino Kubischek , cantando “peixe vivo”, abre o Brasil às
multinacionais: traz a Volkwagem, traz as grandes empresas, e a partir daí, o nosso
capitalismo, supostamente nosso, perde a conotação nacionalista e se abre ao interesse
internacional. Aí o que acontece? Nós temos uma industrialização dependente
tecnologicamente e uma industrialização quantitativa.

Esta industrialização com Jucelino é quebrada com a renúncia de Jânio Quadros,


em 1961, e faz com que o modelo de internacionalização fique bloqueado. João Goulart
representava o retorno ao nacionalismo. Os militares quebram a ordem vigente para
escancarar o terceiro capítulo do Brasil ao capital internacional. A ditadura militar abre
o Brasil ao capital internacional, criando aeroportos, estradas, hidrelétricas,
comunicações, preparando o terceiro capítulo para que o Brasil se insira na ordem
mundial. E aí, os governos Fernando Collor e Fernando Henrique fazem o quarto
capítulo, que é a desagregação completa do resquício de nacionalista que havia.

A globalização é o quarto capítulo de um processo que se inicia de 1930. É a


entrega completa do aparato industrial, a entrega completa do equipamento público e ao
mesmo tempo é acentuada cada vez mais a guerra civil que estabelece no país pela
diferença de apropriação dos bens socialmente produzidos. A educação é um deles e a
saúde é outro.

O Canadá que diminuiu sua taxa de investimento em saúde. Hoje investe 1.770
dólares per capta em saúde. Os Estados Unidos investem 1.200 dólares, e querem
baixar para 1.000 dólares, que é uma média de investimento. O Brasil investia nos anos
2000, 50 dólares per capta em saúde. Privatizar o sistema com 50 dólares per capta é
diferente de privatizar o sistema com 1.700 dólares. Então, o que se está querendo fazer
aqui é um estrangulamento, é quase um genocídio feito pelas armas da política, tirando
educação e saúde.
Eu imagino, nesse processo de globalização acentuada de pauperização, nós
sofremos uma segunda ruptura. Os valores que sempre sustentaram a evolução
econômica e cultural do Brasil agrário são valores que foram profundamente abalados
com a urbanização industrial dos últimos anos. Nós vivemos no Brasil de relações
agrárias e de um controle comunitário na família em que a gente era quase sempre
reconhecido na comunidade pela sua tipologia na família. Quando se ia entregar pão na
vizinha, a mulher falava: — Você é o mais velho; — Você é o do meio. Todo mundo se
conhecia na comunidade. Entregava-se o pão e a senhora dizia: — Eu vou te dar um
docinho para você não voltar de mão abanando. Então trocavam produtos porque não
tinha geladeira para guardar.

Essa sociedade agrária do Brasil tinha valores, como a hospitalidade. Quem


chegasse na casa de alguém e não parasse para comer alguma coisa era uma ofensa. E
colocavam doces, traziam pão, coalhada, queijo, colocava-se na mesa e todo mundo
tinha de comer. Era uma sociedade que respeitava os mais velhos, até de maneira rude:
“se você estivesse sentado e o mais velho de pé, o pai dava um tapa — sai daí menino!
E sentava o mais velho”. Era rude mais tinha respeito ao mais velho. Era uma sociedade
que respeitava a morte se alguém morresse tirava-se um dia de luto, visitava-se a
família, fazia-se orações, as condolências necessárias. Então, havia hospitalidade, havia
superstição, patriarcalismo, rudeza, cooperação: se alguém tinha um feijão em risco de
perde-se com a chuva, todo mundo tirava um dia de trabalho para guardar o feijão;
depois a pessoa dava uma festa para que todo mundo se conhecesse. As crianças
participavam primeiro. Eram identificadas afetivamente com o núcleo familiar. As
pessoas se visitavam, quando conversavam falavam de coisas do seu passado, trocavam
fotos antigas. Era um Brasil comunitário que em 50 anos evaporou-se. Acabou.

Hoje nós perdemos os valores do campo. Velho passou a ser um espantalho


humano na família. Não tem mais identidade, não tem o respeito das crianças e
adolescentes, não tem identidade social. O adolescente, particularmente, premido pelas
condições de sobrevivência é vítima de um consumismo ganancioso de cobiça, de uma
sexualização precoce e uma tentativa de vencer na vida a qualquer preço, de maneira
que a gente fala de lei de Gerson (uma lei de uma propaganda dos anos 70: “eu gosto de
levar vantagem em tudo”). A família está abalada no seu diálogo, na sua autoestima, a
sociedade está abalada nos seus canais de participação e o Brasil vê hoje os valores
sendo massificados pela televisão, voltados para a competição e para o mercado, de
modo que as pessoas dizem: você tem de ir para a escola para se vender melhor no
mercado de trabalho e não para a produção de uma ética emancipatória.

Eu diria: a educação popular não pode aceitar a lógica do sistema globalizado. A


educação popular tem que continuar como um núcleo sadio de resistência política, de
ampliação de participação cultural, de participação coletiva, de recuperação da fala
autêntica, de relações de respeito, de familiaridade, de diálogo. Não pode ser
burocrática, formal, academicista. A educação popular não pode simplesmente querer
substituir a escola formal. A escola formal é dever do Estado e todo mundo tem que
lutar para que o estado garanta essa educação. A educação popular tem que, sim,
promover os valores solidários que foram solapados por esta inserção perversa do Brasil
à ordem internacional. O bom senso da educação popular, que é o seu núcleo sadio, tem
que promover participação de todos, decisão coletiva sem clientelismo e
assistencialismo, responsabilidade no que se decide, solidariedade orgânica e afetiva,
fraternidade, consciência crítica, palavra autêntica e coração solidário: são essas
categorias que a educação popular tem que resistir e fazer com que o núcleo popular
venha a ser um dia o modelo hegemônico a se inserir na escola brasileira, que nunca foi
escola para o povo, que nunca foi voltada para o povo. Quando foi aberta para o povo
perdeu a alma de escola e se tornou um centro compensatório.

Somente nós poderemos construir a educação cidadã, seja fora dela, se nós
produzirmos, tal como preconiza este seminário, novas relações econômicas, novas
relações sociais, novas relações culturais. Fazer isso hoje é um gesto revolucionário,
cristão e que se articula com aquilo que a humanidade de mais profundo constituiu
como utopia. Por isso que, num seminário como este, nós devemos deixar de lado o
modelo de educação jesuíta, o modelo pombalino, o modelo de educação da escola
quartel, o modelo da escola seletiva funil, o modelo da escola compensatória da escola
cidadã, não aceitar esse modelo de tecnologização e voltar para a educação capaz de
ensinar a ler, escrever, participar, recuperar a originalidade, elevar o seu padrão estético,
ter criatividade, sonhar novos mundos e propor novas práticas de solidariedade. Essa
educação só pode nascer do seio do povo, porque na lógica do Estado e das categorias
que ali estão presentes hoje ela está riscada e não está no modelo do Paulo Renato
(ministro da Educação) e de todas as formas que hoje foram apresentadas aqui.
3.1 Aprofundando o conhecimento

3.1.1 Exercícios de aplicação

Considerando o contexto histórico brasileiro e as matrizes educacionais no país, faça


uma reflexão critica e escreva: que consequências essas práticas pedagógicas trazem
para a educação e para a sociedade?

3.1.2 Questão para reflexão

Fonte: trakkinnas.blogspot.com

3.1.3 Leitura indicada

SAVIANI, Dermeval. Escola e Democracia. 32.ed. Campinas, SP: Autores


Associados, 1999. Disponível em: http://ebooks-
academicos.blogspot.com.br/2014/05/dermeval-saviani-escola-e-democracia-1999-
livros-online-pdf-gratis.html
4. A NÁLISE CRÍTICA DAS PRINCIPAIS TENDÊNCIAS E CORRENTES
DA FILOSOFIA DA EDUCAÇÃO NO BRASIL

4.1 A Questão Pedagógica e Didática

Fazer uma reflexão crítica sobre a questão pedagógica e didática ocupa no


espaço educativo é, antes, refletir sobre as formas de agir do professor no contexto das
práticas pedagógicas. A formação docente precisa incluir, cada vez mais, a crítica
epistemológica (BECKER, 2001) em suas práticas profissionais, a fim de pensar o seu
papel na escola contemporânea e a sua ação enquanto agente social ativo.
Uma das práticas mais destacadas que diferenciam o homem de outros animais é
a longa duração da infância. Delval (1998), sobre a função do ensino, dispõe que,
embora o homem nasça em estado de imaturidade, possui uma disposição para aprender.
Nascemos com uma série de disposições inatas que serão desenvolvidas dependendo do
meio, tanto físico quanto social, em que seremos criados, logo, “o desenvolvimento
humano não pode ser concebido sem a existência de uma sociedade” (DELVAL, 1998,
p.17).
Nas sociedades primitivas, a educação ficava por conta dos adultos, que eram
responsáveis por transmitir a cultura da sociedade aos jovens que, por sua vez,
tornavam-se adultos tão iguais aos seus "educadores" quanto possível. Assim, a
educação tinha um papel de manutenção da ordem social, cuidando para que a
sociedade mudasse o mínimo possível. As mudanças passam a ocorrer somente em
função do progresso, que mais tarde surge e reflete na educação.
Durante séculos a cultura foi patrimônio de poucos. As escolas primeiras eram
frequentadas somente por aqueles predestinados a ocupar determinadas funções sociais
e, além de transmitir conhecimentos, era função da escola, preservar os valores e os fins
da sociedade, objetivando que cada indivíduo ficasse limitado a ocupar as posições
sociais em que nasceram. Pensando assim, acreditavam que a educação igualitária e
abrangente seria prejudicial à sociedade e, somente com o Iluminismo, no século XVIII,
passa-se a pensar em igualdade entre os homens e, consequentemente, em um ensino ao
alcance de todos. Tais ideais não foram possíveis na época, pois não correspondiam às
necessidades sociais do momento, mas serviram para que, nos fins do século XVIII,
muitas vozes se levantassem a favor da implementação de um ensino institucionalizado
para todos (ARANHA, 2004).
Mas somente no início do século XIX é que começa a implantação do ensino
obrigatório, e ainda em meio a muita polêmica. Muitos argumentavam que, quando são
proporcionados conhecimentos a indivíduos de classe baixa, a tendência provável é que
esses aspirem modificar o lugar que lhes cabe na sociedade acarretando conflitos e
alterações na ordem social. Com a industrialização, a jornada de trabalho, assim como a
necessidade de mão de obra, aumenta, e as crianças e jovens tornam-se um problema,
pois precisam de um lugar para ficar e algo com o que se ocupar enquanto seus pais
trabalham. Assim, preocupados em não conseguir controlar a esses grupos de crianças e
adolescentes "desocupados", largados a própria sorte, e, percebido que a escola, ao
contrário do que se pensava, poderia ser um utilitário institucional mantenedor da
'ordem social', é implantado o ensino obrigatório.

A escola que surge não é a aceitação das ideias e dos ideais


vislumbrados por filósofos e pedagogos, é antes o resultado das
necessidades econômicas e sociais. O conhecimento ocupava um lugar
secundário na escola, ficando a transmissão de valores morais e
religiosos em primeiro plano, predominando, ainda, o papel da escola
como instrumento de solidificação da ordem social (DELVAL, 1998,
p.20-21).

Nos fins do século XIX, iniciou-se o movimento de reforma da escola. O


pressuposto era que a escola atendesse às necessidades das crianças e se preocupasse em
transmitir os conhecimentos científicos e tecnológicos, capacitando a sociedade para as
novas linhas de trabalho. Em outras palavras, a reforma constituía um movimento de
ajuste social. Surgem, conseguintemente, outros movimento de evolução educacional,
entre ele, a "educação libertadora" que critica a ação passiva dos alunos que, dentro da
escola, ficam restritos a posição de simples ouvintes - a função da escola é formar
indivíduos livres, a educação deve libertar o indivíduo (DELVAL, 1998).
A educação, podemos inferir, está eivada de sentidos, valores, conceitos e
finalidades que a norteiam desde os seus primórdios. O sucinto estudo diacrônico
representado até então, torna visível, e óbvia, a compreensão da interligação consonante
entre ensino e sociedade no seu percurso evolutivo. Mas que sentido pode ser dado à
educação, como um todo, dentro da sociedade? A resposta a essa indagação configura
os diferentes grupos, ou melhor, as diferentes tendências filosóficas de interpretação do
papel da educação na sociedade, nos seus diferentes estágios evolutivos. As principais
tendências são expressas pelos seguintes conceitos: educação como redenção; educação
como reprodução; e educação como transformação da sociedade (SAVIANI, 1987).

 Educação como Redenção da Sociedade

A primeira tendência - a educação como redentora social - concebe a sociedade


um todo orgânico que deve ser mantido e restaurado através da educação, pois o que
importa é conservar e consolidar os conceitos, crenças e valores éticos que tornam
possível a convivência em sociedade.
A educação, nessa tendência, tem por finalidade a adaptação do individuo a
sociedade. É preciso, pela educação, amar a sociedade, restabelecer a ordem e integrar
os indivíduos no todo social anteriormente definido, ou seja, a educação deve servir
para reforçar os laços sociais, promover a coesão social e garantir a integração de todos
os indivíduos no corpo social (SAVIANI, 1987).
A educação, nesse contexto, tem poderes quase que absolutos sobre a sociedade,
uma vez que a ela é atribuída, além da capacidade de direcionar a vida social, a força de
redimir a sociedade. Um modelo clássico do pensamento de educação como redenção,
encontra-se em Comênio - educador considerado o pai da educação, autor da clássica
obra "Didática Magna: tratado da Arte Universal de Ensinar Tudo a Todos", publicada
em 1657.
Comênio parte da compreensão de que o mundo foi criado bom e harmônico por
Deus e que, pela desobediência, o homem gerou o desequilíbrio e introduziu o pecado,
desviando-se da harmonia primitiva do paraíso. O rompimento e a quebra do equilíbrio
ecoaram na sociedade, a qual o autor julgava viver em meio à desordem e o caos. Mas
nem tudo estaria perdido, pois a harmonia divina poderia ser restabelecida a partir da
regeneração e da redenção da sociedade. Mas como iniciar esse processo de
recuperação? Comênio aponta, então, que a educação, de crianças e jovens (a nova
geração), é o meio mais eficaz para a redenção da sociedade, a fim de restabelecer,
investindo e ensinando gerações futuras, a moral entre os homens (LUCKESI, 1994).

Figura 14: Educação como redenção.


Fonte: docplayer.com.br 2016.

Esse formato de sala de aula, concepção de educação e de postura do professor,


como demonstra a figura 3, perdurou por épocas. Como vimos, até o início do século
XIX ainda se temia a adesão ao ensino obrigatório, estendido a todos, por medo de que
a educação transgredisse a sua função original de mantenedora da ordem social.
Acreditava-se, até o início do século XIX, que a educação igualitária e abrangente seria
prejudicial à sociedade, pois, ao estudar, os indivíduos passariam a almejar posições
outras na sociedade de classes, causando conflitos e alterações na ordem.
Para finalizar, vale ressaltar que a tendência redentora da educação não está
erradicada. Ainda hoje se faz presente a ideia de redenção social através do ensino.
Basta observar criticamente às escolas contemporâneas e a seus professores, para
identificarmos resquícios da "educação redentora". Quantas escolas públicas, mantidas
pelo Estado, ainda conservam o chamado "ensino religioso” em seus currículos?
Quantos educadores ingenuamente acreditam que, através de suas ações e de seus
métodos de ensino, estão contribuindo para a restituição moral e o restabelecimento da
ordem social? Para Dermeval Saviani, essa tendência de atribuir à educação a finalidade
de redenção social é a adoção de uma teoria não crítica da educação, uma vez que não
leva em conta a contextualização crítica da educação dentro da sociedade da qual
participa (SAVIANI, 1987, p.9).
 Educação como Reprodução da Sociedade

A segunda tendência de que trataremos, compreende que a educação é parte da


sociedade e a reproduz como tal, ou melhor, compreende a educação como instância
dentro da sociedade e exclusivamente ao seu serviço. Podemos dizer que a diferença
fundamental entre essa e a tendência anterior, é que a tendência redentora atua sobre a
sociedade a fim de corrigi-la, enquanto a tendência reprodutora entende a educação
como um elemento próprio da sociedade e de seu seus condicionantes (econômicos,
sociais, culturais e políticos), portanto a educação atende à sociedade e aos seus
condicionantes.
Saviani denomina a tendência reprodutora de teoria crítico-reprodutivista da
educação, uma vez que aborda a educação a partir de seus determinantes, mas a vê
somente como elemento destinado a reproduzir seus próprios condicionantes, sem agir
ou propor ações à educação (1987, p. 19-20).
A educação reprodutora exibe como atua a educação dentro da sociedade e não
como ela deve atuar, como podemos visualizar na figura 4.

Figura 15: Prática pedagógica do professor na Educação reprodutora.


Fonte: fabianomartatobias.com.br. 2016.
A educação constitui, então, um processo de transmissão cultural no sentido
amplo do termo (valores, normas, atitudes, experiências, imagens, representações) cuja
função principal é a reprodução do sistema social. Isto é claro no pensamento
durkheimiano, ao afirmar:

Em resumo, longe de a educação ter por objeto único e principal o


indivíduo e seus interesses, ela é antes de tudo o meio pelo qual a
sociedade renova perpetuamente as condições de sua própria
existência. A sociedade só pode viver se dentre seus membros existe
uma suficiente homogeneidade. A educação perpetua e reforça essa
homogeneidade, fixando desde cedo na alma da criança as
semelhanças essenciais que a vida coletiva supõe. (DURKHEIM,
1973, p. 52).

Outro autor importante, entre tantos que assumem essa concepção, é Louis
Althusser, em sua obra "Ideologia e aparelhos ideológicos de Estado". A obra configura
um estudo sobre o papel da escola como um dos aparelhos do Estado, como uma das
instâncias da sociedade que veicula a sua ideologia dominante para reproduzi-la. Para
Althusser toda a sociedade, para perenizar-se, necessita reproduzir-se em todos os seus
aspectos, do contrário desaparece. A reprodução cultural de que nos fala o autor, é a
reprodução de um dos aspectos mantenedor da sociedade classicista: as classes sociais.
Para que a classe dominante assegure a sua dominação, é necessário, por exemplo, a
reprodução da força de trabalho, ou seja, reprodução de mão-de-obra, tal como Marx
preconizava.
A escola, segundo Althusser, é o instrumento criado para otimizar o sistema
produtivo e a sociedade a que ele serve. Em sua análise, o autor explica que a escola ao
tempo que qualifica para o trabalho (socialmente pré-definido), a escola se ocupa em
introjetar os valores que garantirão a reprodução comportamental compatível com a
ideologia dominante. Assim, a educação como reprodução, na visão do autor, é o
instrumento de manutenção do sistema social vigente e o poder do sistema dominante é
tão forte na sociedade que não há como a escola trabalhar sua transformação.

peço desculpa aos professores que, em condições terríveis, tentam


voltar contra a ideologia, contra o sistema e contra as práticas em que
este os encerra, as armas que podem encontrar na história e no saber
que "ensinam". Em certa medida são heróis. Mas são raros e quantos
(a maioria) não têm sequer vislumbre de dúvida quanto ao trabalho
que os sistema (que os ultrapassa e esmaga) os obriga a fazer; pior,
dedicam-se inteiramente e em toda consciência à realização desse
trabalho (os famosos métodos novos). Têm tão poucas dúvidas, que
contribuem até pelo seu devotamento a manter e a alimentar a
representação ideológica da Escola que a torna hoje tão "natural",
indispensável-útil e até benfazeja aos nossos contemporâneos, quanto
a Igreja era "natural", indispensável, para os nossos antepassados de
há séculos (ALTHUSSER, s/d, p. 67).

Então, na visão um tanto quanto pessimista do autor, o trabalho dos professores


é em vão. Por mais que tentem, se esforcem, busquem alternativas e pensem ações que
possibilitem a transformação do ensino, de nada adianta, pois na concepção da
tendência reprodutivista, estão fadados a reproduzir a ideologia dominante e, por
consequência, legitimar a sociedade vigente.

 Educação como Transformação da Sociedade

A terceira tendência não redime nem reproduz a sociedade, serve de meio para
realizar um projeto de sociedade, uma transformação social. Acredita que é possível
compreender a educação dentro da sociedade, considerando os seus determinantes e
condicionantes, e ainda trabalhar pela sua democratização.
A tendência transformadora é crítica. Propõe-se descortinar a sociedade e
utilizar-se das próprias contradições dessa para trabalhar, a partir da realidade concreta,
pela sua transformação. Assim, quando bem direcionada, poderá estar a serviço de um
projeto de libertação das maiorias dentro da sociedade.
A aplicabilidade dessa tendência na sociedade capitalista, não é tarefa simples,
segundo o professor Saviani que indica a necessidade de se cuidar daquilo que é
específico da escola, para que essa venha a cumprir um papel de mediação num projeto
democratizador da sociedade. Assim afirma:

Do ponto de vista prático trata-se de retomar vigorosamente a luta


contra a seletividade, a descriminação e o rebaixamento do ensino das
camadas populares. Lutar contra a marginalidade, através da escola,
significa engajar-se no esforço para garantir aos trabalhadores um
ensino da melhor qualidade possível nas condições históricas atuais. O
papel de uma teoria crítica da educação é dar substância concreta a
essa bandeira de luta, de modo a evitar que ela seja apropriada e
articulada com os interesses dominantes. (SAVIANI, 1987, p.36)
As três tendências apresentadas mostram as diferentes concepções acerca da
função da escola e torna inquestionável a inter-relação entre escola e sociedade. Tomar
consciência de tais práticas, ser capaz de reconhecer seus pressupostos é fundamental
para que se realize a mudança, a transformação. Concluir que a escola está, e sempre
esteve, ligada à sociedade e a seus constituintes, é o que nos permite acreditar que
mudar a escola pode, de alguma forma, influenciar na situação social. Eis a justificativa
para a luta em prol da realização de reformas na escola, pois não devemos “esperar de
braços cruzados que a sociedade se modifique para, só então, modificar a
escola” (DELVAL, 1998, p.29).

É na escola pública que as classes dominadas estão buscando seu


lugar ao sol. Queremos que elas deixem de sê-lo ou que, pelo menos,
tomem consciência do seu poder de transformar a realidade
estabelecida. Tal realidade está assim porque a maioria dominadora o
quer, mas se eu acreditar que posso modificá-la, eu o farei. Nunca só,
mas com aqueles que compartilham dos mesmos ideais de
transformação (BARBARA, 2003, p.202).

A necessidade de se reformar o sistema de ensino não é mera fantasia-utópica. O


fracasso da escola não está ligado a um único fator e sim a um conjunto de fatores,
ainda que não se possa defini-los a todos. Fala-se em fracasso da escola, por exemplo,
ao constatar-se que os indivíduos, depois de muitos anos dentro do sistema de ensino,
sabem muito pouco sobre o que lhes foi ensinado. O principal motivo para tal, na
opinião de Delval, é que a escola, ainda hoje, tem por prioridade a moral e a ordem, a
obediência à autoridade e o respeito às normas, esquecendo-se da contrução de
conhecimento. Assim, a escola que temos hoje está em conformidade com o seu
objetivo histórico que não tem compromisso com o saber ou com o conhecimento e sim
com a obediência a autoridade e o respeito às normas (DELVAL, 1998).
A sociedade contemporânea ainda exige que a escola tenha como meta a
preparação do aluno para o mercado de trabalho. Dessa forma, o desenvolvimento de
ideias, conhecimentos, habilidades e comportamentos, têm de estar em consonância
com as exigências da coletividade capitalista que considera a propriedade e não o
indivíduo como cidadão. Mas, nos últimos anos há um movimento de mudança e de
transformação do papel da escola, que está contrariando as concepções conservadoras
impostas pela sociedade, pois:
a escola como espaço privilegiado de educação, deve assumir seu
papel garantindo o desenvolvimento de ideias, de atitudes e de
conhecimentos que proporcionem ao aluno, "sua incorporação eficaz
no mundo civil, no âmbito da liberdade de consumo, da liberdade de
escolha e participação política, da liberdade e responsabilidade na
esfera da vida familiar e pública (GOMES, 2000, p.15).

Ainda que diagnosticado o fracasso da escola e conscientes de que a sua reforma


não é ação de resultados imediatos, defendemos a sua importância e a sua existência
contínua. Além do ensino curricular conteudista, devemos considerar o "currículo
oculto" da escola, que trata de tudo o que não está explicitado como função distinta da
instituição de ensino. O "currículo oculto" cuida, então, daquilo que é vivenciado pelo
aluno nas relações interpessoais e é na vivência coletiva travada dentro da escola que o
aluno toma consciência de si como agente social que é (BUNZEM; MENDONÇA,
2007).
Para falarmos de reforma da escola, primeiro propomo-nos a uma reflexão
crítica sobre a função e o papel que a escola ocupa na sociedade contemporânea.
Destarte, a escola é um sistema composto de regras sociais condicionantes e de agentes
sociais que atuam em tal campo. Logo, para uma efetiva ação transformadora, também
se faz necessário repensarmos sobre as formas de agir do professor no contexto das suas
práticas pedagógicas.

Figura 16: Repensando as práticas pedagógicas.


Fonte: docplayer.com.br 2016.

4.2 Resgate e promoção da qualidade educativa popular


Como se poderia traduzir, hoje, o direito de todas as crianças e jovens não
somente de terem acesso à escola de nove anos, mas nela permanecerem cursando nove
diferentes séries em nove anos? Como fazer da escola um local privilegiado para a
construção de um instrumental científico, literário, artístico e tecnológico,
possibilitando a formação do pensamento crítico de seus atores? Como fazer da escola
um local de práticas sociais transformadoras? Responder a essas questões exige uma
discussão sobre a função e a qualidade da escola frequentada pela maioria da população
brasileira: a escola pública. É, pois, a qualidade desta escola que tem de ser
questionada? A quem serve sua qualidade? Sua função responde aos interesses das
classes trabalhadoras? O projeto destas escolas tem em mira um projeto de
transformação da sociedade?
Em seu significado histórico e social mais próprio, a educação é um fenômeno
político que atinge mais a dimensão do ser do que a do ter (DEMO, 1994). Daí a
afirmação de que o desenvolvimento da cidadania básica de um povo depende de
processos educativos adequados dentre os quais o mais reconhecido é a universalização
da educação básica. Na medida em que não conseguimos sua universalização retratamos
a nossa pobreza política. Porém, não queremos estabelecer uma linearidade mecânica e
automática entre anos de estudos, de escolaridade e democracia, pois podemos incorrer
no erro de certas formas ingênuas de lidar com questões mais complexas para as
conquistas democráticas.
Assim, a universalização da educação básica é uma condição indispensável para
a conquista da democracia. A educação básica está intimamente relacionada com o
processo histórico de formação de um povo. Entendido esse processo como
desenvolvimento da qualidade política, ou seja, a capacidade histórica de ocupar espaço
político e cultural, de se definir e planejar, de se emancipar como sujeito histórico
(DEMO, 1988). Refletir sobre a democratização do ensino básico implica refletir a sua
qualidade, pois não basta ter o acesso à escola, mas permanecer nela e ter um ensino de
boa qualidade nos termos em que fala Demo.
Nos últimos anos, o conceito de qualidade de ensino vem gerando polêmica
entre os educadores e pesquisadores preocupados com a precariedade da escola
brasileira. Todos concordam que a escola que temos precisa elevar a sua qualidade,
porém há divergência quanto aos indicadores de qualidade, o que implica uma
compreensão do papel da educação no processo de desenvolvimento do país. Se para
alguns, seu papel é de formar cidadãos conscientes e participativos capazes de ajudar a
transformar as estruturas injustas da sociedade, para outros, a educação é concebida
como a possibilidade do país sair da crise em que se encontra e como estratégia de
desenvolvimento econômico. Segundo Enguita (1994) é possível se discutir o conceito
de qualidade de ensino a partir de três lógicas.
Num primeiro momento, a qualidade de ensino foi identificada com a dotação de
recursos humanos e materiais dos sistemas escolares ou suas partes componentes: gastos
públicos aplicados, custos por aluno, por professores, duração da formação escolar,
nível do salário dos professores, etc. Esta é a lógica do “Bem-Estar”, a lógica dos
serviços públicos, que, em síntese, pretende medir a qualidade tendo como referência os
gastos públicos aplicados à educação.
Num segundo momento, as análises sobre a qualidade do ensino voltam sua
atenção não mais para os gastos em recursos (humanos e/ou materiais), mas para os
processos: conseguir o máximo resultado com o mínimo custo. Essa é a lógica da
produção empresarial privada.
Hoje, predomina a lógica da competição no mercado e a qualidade do ensino
passa a ser identificada com os resultados obtidos pelos estudantes, tais como: taxa de
evasão e repetência, egressos dos cursos superiores, taxas de aprovação, comparações
internacionais do rendimento escolar, etc.
Todos os que se debruçam sobre estas questões são unânimes em afirmar a
necessidade de uma escola de qualidade que forme cidadãos capazes de participar da
vida política, social e econômica de uma sociedade moderna. Em síntese, uma escola
cidadã como a chama Saviani (1986). O simples ler e escrever já não atende às
exigências e desafios do mercado de trabalho, da vida em sociedade. Mais do que
nunca, é imprescindível que a escola brasileira assuma sua função básica que é ensinar,
lidar com o conhecimento e habilidades necessárias para uma vida cidadã, o que inclui
entender a escola como um lugar de práticas sociais democráticas. Exige-se que a escola
prepare as novas gerações com conhecimentos e habilidades cognitivas que lhes
possibilitem entender e interpretar toda a gama de valores e informações que lhes são
transmitidas no cotidiano, nas suas práticas sociais, nas suas relações com o mundo,
habilitando-as para uma participação mais ativa e crítica da vida social e política.
Só assim entendemos os vínculos estreitos entre educação, democracia e
qualidade do ensino, porquanto só se pode viver democraticamente quando se é
respeitado nos seus direitos, direitos estes que não se restringem ao acesso à escola de
qualidade, mas que através desta, é possível a tomada de consciência de tantos outros.

4.3 Aprofundando o conhecimento

4.3.1 Exercícios de aplicação

NUNCA DIGAM - ISSO É NATURAL!


Bertolt Brecht (1898-1956)

"Nós vos pedimos com insistência:


Nunca digam - Isso é natural!
Diante dos acontecimentos de cada dia,
Numa época em que corre o sangue
Em que o arbitrário tem força de lei,
Em que a humanidade se desumaniza
Não digam nunca: Isso é natural
A fim de que nada passe por imutável."

Relacione este trecho da poesia de Bertolt Brecht com a questão pedagógica e


didática, considerando as concepções filosóficas.

4.3.2 Questão para reflexão

“O que se coloca à educadora ou ao educador democrático, consciente da


impossibilidade da neutralidade da educação, é forjar em si um saber especial, que
jamais deve abandonar, saber que motiva e sustenta sua luta: se a educação não pode
tudo, alguma coisa fundamental a educação pode. Se a educação não é a chave das
transformações sociais, não é também simplesmente reprodutora da ideologia
dominante. (FREIRE, 2004, p.112).

4.3.3 Leitura indicada

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. 29.


Ed. São Paulo: Paz e Terra, 2004. Disponível em:
http://www.apeoesp.org.br/sistema/ck/files/4-
%20Freire_P_%20Pedagogia%20da%20autonomia.pdf

4.3.4 Filme indicado

Escritores da Liberdade (2007) – Direção Richard LaGravenese

Sinopse: Uma jovem e idealista professora chega à uma escola de um bairro pobre, que
está corrompida pela agressividade e violência. Os alunos se mostram rebeldes e sem
vontade de aprender, e há entre eles uma constante tensão racial. Assim, para fazer com
que os alunos aprendam e também falem mais de suas complicadas vidas, a professora
Gruwell (Hilary Swank) lança mão de métodos diferentes de ensino. Aos poucos, os
alunos vão retomando a confiança em si mesmos, aceitando mais o conhecimento, e
reconhecendo valores como a tolerância e o respeito ao próximo.
R EFERÊNCIAS

ALTHUSSER, L. Ideologia e Aparelhos Ideológicos de Estado. São Paulo: Martins


Fontes, s/d.

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Formação do Professor. SP: Parábola, 2007.

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