Professional Documents
Culture Documents
ISBN 85.326.1992-4
98-0908 CDD-320.531
Em defesa do socialismo
por ocasião dos 150 anos do Manifesto
Ili EDITORA
Y VOZES
Petrópolis
1998
© 1998, Editora Vozes Ltda.
Rua Frei Luís, 100
25 689-900 Petrópolis, RJ
Internet: http://www. vozes.com.br
Brasil
PRESJDEl\íf'E
Gilberto f\1.S. Piscitelli, OFM
DIRETOR EDITORIAL
Avelino Grassi
EDITOR
Lídio Perctti
Edgar Orth
DIRETOR INDUSTRIAL
José Luiz Castro
EDITOR DE .4.RTE
Omar Santos
EDITORAÇÃO
Editoração e organização literária: Renato Kirchner
Revisão grá/rca: Revirei: S/C
Projeto gráfico e capa: Mariana Fix e Pedro Fiori Arames
Supervisão gráfica: Vruderes Rodrigues
ISBN 85 .326.1992-4
Este livro foi composto e impresso pda Editora Vozes Ltda. em março
<le 1998.
A Eugênio Bucci
SUMÁRIO
9 Prefácio
11 Em defesa do socialismo
13 1 - O legado de Marx
62 e) Fascismo
67 Agradecimentos
PREFÁCIO
Paul Singer
9
história e a mane i ra de en tend ê la Fernando Haddad
- .
10
Em defesa do socialismo
11
não só da perspectiva hoje hegemônica? Será que o pro
c e sso em m arch a não traz em seu bojo a abe rtura de
brechas que tornam possível a reorganização - a partir
do zero, bem entendido - daqueles que crêem na supe
ração p os itiva da ordem vigente?
Num momento de refluxo do mo vime nto socialista,
Marx foi lembrado por um ca m arada de que, em uma
de suas obras, Hegel observa que imediatamente antes
que sur j a algo de qualitativamente novo, o antigo estado
r ecu p e ra a sua es s ê nc ia originária, na sua totalidade sim
ples, u ltrap assando todas as diferenças que abandonara
enquanto era viável. Esse po de ser, precisamente, o caso
da "nova ordem" que aparece como a prova definitiva
da superioridade de uma determinada formação socia l
quando, na ve r dade , seria o sim ples anúncio de s eu es
gotamento históriCo. Não seria p or i sso que junto com
o neoliberalismo surge uma ap aixonada compulsão a
an u n c iar a m o rte do socialismo e do pens am e n to crítico?
Talvez tudo isso seja uma celebração, mas por que a pres
sa em encerrá-la, o nervo sismo estampado no rosto dos
convivas?
12
I - O legado de Marx
13
erro ao pr omover uma indevida extrapolação dessa me
cânica para a sociedade atual. Pois no caso do capi talis
mo, ao contrário, o desenvolvimento econômico, longe
de ameaçar, legitima o sistema, torna-o progressivamen
te· mais amoldável, amplia o grau de liberdade com que
seus gestores podem costurar acordos, alguns sólidos,
outros mais frágeis, mas ainda assim acordos, entre os
diferentes atores sociais. A luta de classes aguça, afr ouxa,
recrudesce e se volatiliza numa arena que é tão maior, e
portanto p e rmite movimentos menos circunscritos,
quanto mais intenso é o grau de desenvolvimento da
pro dução. Os limites do sistema são constantemente
alargados . A l ib erdade de ação, por certo, sofre sempre
o constrangimento do ciclo econ ômico, mas as crises
recorrentes, p elo menos até agora, nã o têm sido capazes
de romper o que parece ser o mau infinito da acumulação
capitalista.
Curiosamente, no plano estritamente econômico, a
teoria do maior pensador s ocialista era bastante flexível
ao formular as leis gerais do sistema capitalista. Toda lei
e conô mic a marxista admite contratendências importan
tes. Tomada em seu conjunto, a obra de Marx, ao mesmo
tempo em que indica a tese da pau perizaç ão crescente
das classes não-proprietárias, relativiza-a ao contemplar
a possibilid.ade de que a luta de classes provoque efeitos
'
distributivos; ao mesmo tempo em que propõe a tese da
proletarização das antigas classes sociais , aponta pa ra a
emergência e provável crescimento das camadas médias
como fruto do desenvolvimento do sistema; ao mes m o
14
tempo em que desnuda a lei tendencial de queda da taxa
de lucro, admite sua e vit abil i da de pelo barateamento dos
meios de produção conseqüente do progresso técnico.
C on tudo, no plano institucional, esse te óri co genial con
si de ra toda evolução, do sufrágio universal à s o cie dad e
por ações, co mo prenúncios da nova or dem socialista e
não como aperfeiçoamentos que vêm dar uma capacida
de ainda maior ao sistema de se adaptar às demandas de
or de m social e de ordem técnica. Essa deficiência, cer
tamente, não se deve a uma limitação do pensamento de
Marx ou do seu método de investigação, mas a uma li
mitação do seu pr ó p r i o tempo que não lhe p er mitiu com
prov ar em toda sua envergadura a negatividade da sua
dialética.
O mesmo t i po de r ac io cíni o se aplica à chamada acu
mulação primitiva de capital, "acumulação que não de
corre do modo capitali sta de produção, mas é se u ponto
de partida ". Acertadamente, Marx previu que o capita
lismo destruiria até as muralhas da China, obrigando
todos os povos periféricos ao sistem a a adotarem, sob
pena de perecimento, o modo burguês de produção. Mas
a forma como isso se deu nas diferentes regiões do pla
neta desrespeitou t o da lei e toda l ó gic a. Da m es ma forma
que os liberais americanos dos séculos XVIII e XIX foram
cap azes de con s e rvar a escravidão com vistas a acumular
o necessário para garantir as co ndiç õe s da futura ordem
capitalista, os stalinistas sovié tic os do século XX foram
capazes de exacerbar o des p otism o oriental com essa
mesma finalidade. O capital se apropriou de todo pas-
15
sacio da humanidade1 tomou suas institui ç ões como cáp
sulas vazias e lh es deu novos c on te údos , n ovas fun çõ es
e novos desígnios. Deu à luz a escravidão e o d e sp o ti s m o
oriental modernos que dos seus antepassados guar da
a aparência sem deles ter herdado um único gene. Todos
os caminh os levaram à Roma do capitalismo finalmente
mundializado, mas cada nação adotou seu passo e sua
trilha, sendo que c ada uma tem sua própria fábula para
narrar e deve fazê-lo sem esquecer, naturalmente, que a
época de transformação p el a qual passou não deve ser
julgada a par tir da sua própria consciência, mas sim a
p a rtir das contradições e constrangimentos reais da vida
material. Pouco importa o que os Pais Fu ndadores e o
Grande Irmão pensavam fazer se, na verdade, m anti
nham os grilhões m es mo que em nom e da liberdade.
Sob o capital, os vermes do passado, por vezes pre
nhes de fa lsas promessas, e os germes de um futuro que
não v i n ga, tudo concorre para convalidar o presente,
enredado nu m a eterna reprod ução am pli ada de si mes
mo, e que, ao se tornar finalmente onipresente, pretende
arrogantemente an ula r a própria História. Esse é o de
safio que s e põe aos socialistas. A tarefa, 15 O anos atrás ,
pare cia bem mais fácil. Pensava-se poder contar com o
curs o das coisas. Mas o curso das coisas só faz n os manter
sob seu império. O processo ch egou a tal ponto de tene
brosa sofisticação que envolveu o plano da cultura e do
comportamento. A todo movimento social contestador
de cunho particul ar corresponde o surgimento de uma
nov a indústría. Toda demanda social de transformação
16
cultural ou comportamental é satisfeita, não com o re
volucionamento dos hábitos e costumes sociais, mas com
a o fert a abundante qe mercadorias e a reificação das
consciências. O caso mais eloqüente dessa mecânica tal
vez seja o movimento de libertação sexual que, " vi torio
so", ao invés de gerar uma s ocie d ade genuinamente
erótica , deu ensejo a um duplo movimento de erotiz a ção
do consumo de b ens e de objetivação das relações se
xuais, dessublimação repressiva que desemboca na in
dústri a pornográfica. E o que aconteceu com a sexua
lidade é o paradigma para e n ten de r o que se passa com
o lazer, a espiritualidade, a ecologia a que corr espon dem
a indústria do entretenimento, a indústria da salvação, a
indú stria do turismo. O tempo livre, a alma e, quem
diria, uma p rótese de primei ra natureza, tudo é insumo
precioso na busca do lucro. Sob o pretexto de satisfazer
as necessidades humanas, a parafernália capitalista não
faz mais do que zelar pela sua perpetuação, rebaixando
os homens a meios de sua própria conserv ação . A saída
desse turbilhão capitalista, portanto, não passa por qual
quer ti po de reivindicação parcial, pelos chamados mo
vimen tos alternativos de protesto, que na melhor das
hipóteses " civilizam " o sistema sem superá-lo. Hoje,
como antes, continua valendo a velh a idéia de que "a
história de todas as sociedades que existiram até n ossos
dias tem sido a história das lutas de classes". Só que a
essa história há que se acrescentar um novo capítulo.
17
Poucas áreas do conhecimento alimentaram tantos
qüiproqu ó s conceituais qu a n t o as teorias de classes, de
18
que, aparentemente, não se verificou. Contudo, ela
borar uma teoria mais c o mp l ex a não p e r mite declará
la per se m ai s fiel a uma realidade mais complexa; ela
pode m u i to bem ser apenas mais confusa, se lhe falta
o método adequado.
O conceito de classe social em sentido pleno é cor
retamente definido, dentro do discurso materialista, pe
las relações de distribuição que são expressão imediata
das relações de produção. Quando Marx refere-se às três
grandes classes, a dos trabalhadores assalariados, a dos
capitalistas e a dos proprietários fundiários, não quer
dizer que existam outras pequenas c amadas dignas do
nome classe. Embora, por vezes, Marx use esta denomi
nação para se referir a 'outros grupos distintos dos três
grandes, do ponto de vista da dinâmica do sistema, a ele
só i nt e r es sava estudar as tendê ncia s relativas ao compor
tamento daqueles grupos imediatamente ligados ao pro
cesso de r e p ro d u ção material da sociedade. Esse é o
motivo pelo qual Marx, apesar de prever o aumento
numérico relativo dos serviçais domésticos ou dos fun
cionários de Estado, não lhes dedica atenção especial.
Ainda que assalariada, essa camada não vende sua força
de tr abalho diretamente ao capital , como é o caso dos
trabalhadores da indústria (da fábrica e do escritório),
do com é r c io e das finanças, e, como tal, não pertence
nem constitui propriamente uma classe social.
Quanto aos limites de uma dada c lass e , superior e
inferior, aqui também o critério para defini-los não pode
ser outro senão o materialista. No limite superior, inda-
19
ga-se até que ponto um trabalhador com alta qualificação
e alta remuneração pode ser considerado membro do
proletariado. No plano inferior, indaga- se até que ponto
o desempregado pode ser considerado membro do pro
letariado. Nos dois planos, a resposta só pode ser: até o
limite em que a d iferen ça entre essas camadas e o traba
l hador simp l e s empregado, determinada ou anula da pel o
p roce sso real d e produção, é d e tal ordem que ela se
transforme em contradição. O ge r e n te que é assalariado,
m as partiç:ipa ativamente da gestão da empresa, da sua
política de c or tes e contratações, da formulação do seu
organograma, da sua política salari a l, etc., e que submete
todas ess as decisões ao princípio da maximização do lu
cro, esse indivíduo, não por suas di sposi ções subjetivas,
mas p el o lugar que ocupa no processo de pro dução,
como funcionário do capital, ainda que não proprietário
dele, pertence à classe bu rgu esa. Correlativamente, o de
sempregado cuja força de trabalho não é mais útil ao
capital, ou seja, cujas habilidades tornaram-se uma mer
cad oria sem valor, esse p obre di abo , por não ter o que
v e nd e r, nem a si mesmo, n ão pe rtence ao proletariado.
O exér cit o industrial de reserva, não obstante, pela ex
pectativa de seus membros de ainda p ode rem vender sua
força de trabalho na fase exp ans iva do ciclo dos negócios,
compõe a c la sse dos trabalhadores assalariados. Resumi
d amente, portanto, a teori a m arxis ta de classe colocava
sob a rubrica de proletariado a massa de trabalhadores
que vendia sua for ç a de trabalho diretamente ao capital
- industrial, c om erc i al ou financeiro - e o exér c i to in-
20
dustrial de reserva; e colocava sob a rubrica de burguesia
os capitalistas, a alta g e rência e os proprietários fundiários.
21
trabalho, oconstante p rogre sso dos meios de comunica
ção e transporte, o surgimento dos grand es centros ur
banos e o esvaziamento do campo, a supressão da dis
persão dos meios de produção, concentrados e centrali
zados em grandes corporações, tudo foi visto e, de certa
forma, an te visto por Marx, que po de ria ser considerado
um visi o nár i o , não fosse o rigor do método que lhe p er
mitiu tais descobertas. Décadas se p ass a r am até que fi
n a l me nte um economista conservador se s e n t i s s e
o brigado a reconhecer o óbvio, mesmo que adotando; é
claro, pr emi ss as diferentes das de Marx.
Co ntu do, como· não poderia deixar de s er, foi esse
mesmo eco no mi s ta que, na d éca da de 1940, obsérvou
uma m udança na produção que viria jogar um papel
a
22
terior advento da Guerra Fria, a universalização do en
sino básico e, em seguida, nos países centrais, do ensino
superior, público ou não, tudo isso preparou e adubou
o terreno dessa transformação radical do processo de
produção.
Do ponto de vista estrito da teoria de classes, essa
transformação do processo produtivo não poderia dei
xar de trazer profundas conseqüências. A principal delas
foi a emergência de uma nova classe social, uma classe
associada a um novo fator de p rodução - a ciência-, ou
sej a, uma classe que, como as outras, é expressão ime
diata das relações de produção: a classe dos cientistas,
engenheiros, técnicos e consultores contratados pelo ca
pital para promover um contínuo processo de inovação
tecnológica e administrativa interno às empresas. Sob a
rubrica esdrúxula de capital humano, todo modelo teó
rico recente introduz como argumento da função de pro
dução o fator que essa classe controla. Dirão os menos
atentos que se trata de empregados do capital cujo ren
dimento tem a forma de salário e que, portanto, perten
cem à classe dos trabalhadores assalariados, ou seja,
trabalhadores qu alificados que compõem o chamado tra
b alha d o r coletivo. Contudo, essa classe difere da cate
goria dos trabalhadores qualificados por várias razões.
Em primeiro lu g a r, o rendimento de um agente
inovador, apesar da forma que assume, não é, a rigor,
salário. Esse rendimento, aliás, guarda algumas seme
lhanças com a renda fundiária. Da mesma forma que
a propriedade fundiária é, como seu pressuposto, o
23
outro do capital, e a renda fundiária é a contrapartida
do monopólio da classe p r o prietári a da terra , a ciência
como fator de produção é o outro do trabalho, e a renda
do saber é a co nt r aparti da da posse oligopolístíca de
conheciment o relativamente exclusível, para usar um
jargão dos economistas. O processo de inova ção tec
nológica que, nos tempos de Marx, podia ser visto
como uma sucessão de p onto s discretos relativamente
v is í veis , tornou-se, com a internalização da ciência
c omo fator de produç ão, um processo contínuo. Quan
do um certo quantum de c onhe c i men t o relativamente
exc l us íve l incorpora-se a uma nova mercadoria, ela
go z a do mesmo grau de irreprodutibilidade daquele
fator de p r o dução que a concebeu. Até que esse co
n he cimento relativamente e xclusív e l deixe de sê-lo, os
preços das novas mercadorias sofrem uma disto rção
na ex a ta medida do saber que elas comportam. Dessa
distorção apropriam-se os c api t a li st as proprietários
dos meios de produção da ciência e os agentes inova
dores que os põem em marcha.
Em segundo lugar, a ativi dad e inovadora, ao contrá
rio do trabalho qualificado, não produz valor. A inter
nalização da ciência ao processo produtiv o por meio da
contratação, p e lo capital, de agentes inovadores, fenô
me no estranho ao s é culo XIX, não muda o fato de que,
por exemplo, o " custo de concepção" de uma nova mti:r
cadoria não se co n fu n de com o " custo " , medido em tra
balho social, de reproduzi-l a industrialmente, que é a
única medida do seu valor. Sem dúvida, o resultado d a
24
atividade de pesquisa e desenvolvimento se incorpora às
mercadorias. Mas ela não é uma ativi dad e produtiva, 116
sentido exato da palavra. Ela não produz mercadorias,
embora funcione c o mo promotora do aperfeiçoamento
do processo de pr od uçã o de me rca dorias .
Em terceiro lu gar, a a ti vid a d e inovadora não tem
relação com o tempo de trabalho. Em outras palavras, o
agente inovador, ao contrário do t r abalha dor qualifica
do, não tem jornada de trabalho. Ele pode até ser obri
gado a bater o ponto, o q u e em ge r a l não acontece,
mas, a ri go r, não tem j or na da fixa. Isto só é possível
porque os agentes envolvidos com o processo de ino
vação exercem ativi dad e s de cunho teóri c o abstrato,
dos t écnicos até os cientistas, pas s an do p e los engenhei
ros e c o n s u l to res . Essas ativi da de s , como se sabe, não
têm ho r a . Se o trabalhador simples vende ao c apital
força física e o trabalhador qualificado, força mental,
os agentes inovadores vendem força anímica - criativa
- que, diferentemen- te, nã o está quase n u n c a sob seu
25
por certo, muitos agentes inovadores auto didatas ou que
não contaram com um apoio pessoal à moda da relação
mestre/aprendiz medieval ou, ainda, que não contaram
com nenhum apoio institucional, estatal ou privado . Esses
casos, não obstante, tendem a se tornar cada vez mais raros.
Há quem queira, pelas particularidades dessa cla s s e ,
defini-la co m o uma classe média. Certamente, a totali
dade dos agentes inovadores merece a denominação de
classe por deter aquil o que deixa de ser si mp les produ to
social para se tornar mais um fator de produção. Como
a s demais classes, ela é a expressão imediata de novas
relações de produção, postas pelo capi t al . Mas essa classe
é simpl esm ente outra classe e, a título nenhum, encon
tra-se no meio de q u a isqu e r outras duas. Há outro s que
pre ferem classificá-la como uma das categorias que com
põem uma suposta nova classe trabalhadora. Essa classe,
contudo, é distinta da classe dos trabalhadores assalaria
dos pe l o simples fato de não vender propriamente força
de trabalho - insumo que, ao contrário do que se a firma
atualmente, não desa p are ce do processo de produção. A
relação que esta classe estabelece com a classe dos capi
talistas é de outra natu reza : se, por um l ado, e la envolve
o conceito de alienação, tanto quanto a relação entre
capitalistas e trabalhadores, p ois esses agentes não co
mandam a utilização do saber de que dispõem; por outro,
ela não en vo lve a noção de exploração, tanto quanto a
relação entre capitalistas e proprietários fundiários, p ois
sua atividade não produz valor.
26
H o je , essa classe, nos p aí ses desenvolvidos, já soma
milhões. Ainda que numericamente el a não possa ser
comparada à classe do proletariado, me smo se conside
rado o contingente científico de reserva alocado ius uni
versidades, o nde ela se r ep ro duz , seu fl1:0do de ser, seus
hábitos e sua visão de mundo imprimem cada vez mais
suas marcas na cultura contemporânea; en tre outras coi
sas, p o rq ue seus valores e interesses, relativamente J.os
27
farpado é a patente devidamente reconhecida e protegi
da. Sem a patente, o preço de um software c ai ri a a zer o ,
já que zero é a qu antida de de trabalho socialmente ne
cessário para r ep r odu zi - lo . A patente, h oj e mais do que
nunc a , assim como a cerca ontem são c o n di ç õ e s neces
sárias do capital. A elas o capital de ve sua emergência e
seµ dinamismo.
Ao esquema d e Marx, que descreve as etapas de de
senvolvimento da indústria capitalista, deve-se, p ortan
to, acrescentar um estágio adicional . No pri me ir o es
tágio, a manufatura substitui a a nti g a or ganização feudal
da indústria que, circunscrita a corporações fechadas, j á
não p o d i a atender à demanda que cre s c i a c o m a ab ertura
de novos me rcados . C om a ampliação desses, a própria
manufatur a to rnou -se insuficiente p a ra satisfazer as ne
c ess idad es que cresciam ainda m ais . A grande indústria
supera a manufatura. Posteriormente, contudo, observa
se a e me rg ê nc i a da su perin dú stri a capitalista, entendida
como aquela que internaliza o processo de inova ção tec
nológica, que, fi n alme nte , exponencia o desenvolvimen
to das forças produtivas e a am p li a ç ã o dos mercados
numa escala nunca ima gi nad a .
A cada etapa dessa evol u çã o corresponde, como sa
b i a Marx, uma etapa p olítica distinta: manufatura e mo
narquia absoluta; gr an de indústria e Estado de d i r eit o
representativo moderno. Q u ant o à su per í nd ú str i a, numa
primeira fase, nos chamados an o s dourados do capitalis
mo, a e la corresponde o Welfare State. A superindústria,
inicialme nte, é a base material que pe rmite um a vanç o
28
inaudit o das conquistas do movimento sindical. Ela ga'""
rante, pela r iqueza que p r o duz, a margem de manobra
n e ces s ári a para um c ompromiss o de c l as s e . Che g ou-se a
i m agi n ar que o cap ita lismo p o de ri a, p e lo menos nos cen
tros tecnologicamente di nâmi c o s , erradicar a mis é ri a e
até m e sm o a pobreza . Declarou-se, p o r conta da p acifi
cação d o conflito de classes o p e r a d a p elo Estado social,
que a te or i a de classes teria perdido suas referênci as em
p íricas . Mas, a superindústria nesse p e r íodo apenas es
boçava seus p ri m e i r o s movimentos . Ao contrário das
o u tr as formas de organização da i n dú st r ia , suas p re d e
cessoras, a superindústria p o ss u i uma característica que
a toma o modelo p o r excelência o mais adequado ao
m odo cap i tal i s ta de produção . Enquanto todos os outros
mo de l os tornam-se obsoletos com a a m p l iação dos mer
cados c o n sumi dor es , no caso da superindústria há uma
inversão dessa re g r a : os m er cad o s (nacionais) é que se
tornam c a da vez mais restritos para essa f orma de orga.,.
nização da p r o d u çã o . Se a grande in dú stri a criou o mer
ca do mundial, a superindústria acaba por destruir as
bases naci onais sobre as quai s ele se assentava, e, c o m
elas, a base formal do próprio Welfare Sta te que ai n d a
p odia o p e rar, p or vários m e c a ni s m os de gestão, a socia
lização de suas " conquistas materiais" .
A superindústri a enseja, então, u m p ro c ess o p eculiar
de internacionalização da e c o nomia, a imprecisamente
chamada "globalização " . A base técnica dessa o p e r açã o
é a t e lem ática, p rodu to dileto d o capitalismo sup erin
du str i al . A telem áti ca , em p rim eir o lugar, faz crescer a
29
escala ótima de produção de uma infinidade de merca
dorias num ritmo muito sup erior ao c r e scim ento dos
m ercados nacionais. A exp ansão do m e rcado interno dei
xa d e ser ga r a nti a de qu e uma dada economia p ossa ab
sorver mais e mais plantas indu str iai s de certos p r odutos .
A polític a i nterestatal d e formação de blocos ou mer ca
dos comuns bem como a p o líti ca interempresarial de
fusões e aquisições passa m a ser um imperativo da pró
pria dinâmica da acumulação . Por outro l ad o, a telemá
tica p e r m i t e , p el a ca p a c i d ad e d e g e r e n ci am ento e
m on i toramento que pr o p ici a, a descentralização da p ro
dução dos c o m p on ente s de um determinado bem p or
diversos países, reeditando uma nova versão da l ei das
vantagens c omp a rativas , que fav or e ce a t e rce i rizaçã o e
a ac u mu lação flexível internacionais, p rát i cas que s u r gi
ram no Extremo O r i e nte, na década de 1 950, e que hoj e
se generalizam. Po d e - s e agora co.ncentrar a p r o dução de
componentes me n os sofisticados n a q u e l e s países ou re
giõe s que ofer ec em baixos salários e pouca proteção so
cial p ara seus trabalhadores, de modo que é mu i to con
veniente para o c apita l que a formação de bloc o s econô
micos c o nte mp l e a p ar ti c ip ação de países ou regiões com
essas características. Po r fim, a t e le m átic a, pel a integra
çã o total dos mercados fin an c e i ro s d o mu ndo , p ermite
um mais fácil e esp eculativo processo de financiamento
externo das dívidas públicas i n t e rn as que custearam, no
perío d o anterior, os gastos mili t ar e s e sociais do Primeiro
Mundo e os gast o s com a industrialização do Terceiro
Mun d o sem iperiférico.
30
Diante di ss o tudo, a p osiçã o relativa de cada p aís no
c enário internacional muda a ca da rodada de transfor
mações conjunturais. O di nam i s m o tecnológico, a escala
de p r od u çã o p ermitida pe l o me r cad o pote nc i al , o p oder
de cada Estado na disputa pelo capital fi n anc e iro inter
nac i o n a l , etc. são as va r iáveis que determinam o nível de
a ti vid a d e e de competitividade de uma economia. Os
governo s neoliberais, expressão p o líti ca dessa nova fase,
menos re p resentativos e mai s d el egatár io s , disputam a
ta pa o título de melhor " c o m i t ê p ara gerir os negócios
c omu n s de toda classe b u rgue s a " . As múltiplas possibi
li d ades de manipulação das variáveis-chave da economia
impli cam diferentes man eiras de i ns e r çã o de uma eco
no mia nacional na ordem g l o balizad a, a l gu m as mais
bem-sucedidas, outras nem tanto. Entretanto, no agre
g ado , uma das conseqüências inevitáveis desse processo
é a emergência, em nível m u n di a l, de um lúmpen-pro
l e ta ria d o de tipo novo, camada que não é mais "o pro-:
duto pass ivo da p utrefação das camadas mais baixas da
velha s o c ie dade ;', como Marx a definiu, mas o r e su ltado
direto da nova forma de organização capitalista. Os des
classificados p e lo capital superin dustrial, nesse s ent i do,
elementos heterônomos a t iv o s da sociedade moder na ,
não podem mais ser vistos como u ma c ategoria qualquer
e de somenos impo rtâ ncia na ordem atual, mas devem
p assar a ser encarados como uma verdadeira c las se social,
como as demais, entre outras c oi sas porque o não-ren
d i m ento dessa categoria, ou seja, s e u rendimento extra
e con ô m i c o oriundo da crimi nalidade, da mendicância,
31
da p equena extorsão, da c hantagem familiar, de favores
do Estado, etc., é também uma conseqüência i mediata
das relações de produção - tanto quanto o salário - e se
generaliza assim que o salário de mercado atinge um
patamar inferior ao mínimo necessário, historicamente
determinado, para a rep ro du ção material dos indivíduos.
Tirante a burguesia, composta pelos proprietários e
funcionários do capital, temos, portanto, três classes so
ciais não-proprietárias. Durante o século XX, a cada uma
dessas classes, isoladamente ou não, foi atribuído o papel
de liderar a revolução das condições de existência. Mui
tos continuaram confiando na capacidade do proletaria
do de romper a o r d e m estabelecida. Outros preferiram
acreditar em quem nada tinha a perder, sequer um em
prego digno, c omo o lúmpen moderno. E um número
expressivo de teóricos depositou suas esperanças na clas
se dos agente s i n ova dor e s ou classe tecno-científica.
Contudo, na d a no capitalismo superindustrial é tão sim
ples assim . O fato é que a condição de vida e a posição
no processo produtivo dessas classes ensejam comporta
mentos diversos que se articulam ironicamente de tal
forma que acabam por dar uma certa estabilidade ao
siste ma Assim , o i n te resse particular de cada uma dessas
.
32
dos desclassificados, de outro. As duas primeiras se be
nefi ciam imediatamente do avanço tecnológico nos mol
des c api talís ta s : a pri meira, através da ap reensão do lucro
extraordinário, e a segunda, através da estabilidade e dos
privilé gios (status, m aior renda, etc.) que o processo con
tínuo de i novação lhe g ar an t e . É m u i to comum, também,
que muitos agentes inovadores não se encontrem exclu
sivamente nos departamentos de pesquisa e desenvolvi
mento; podendo ocupar, inclusive, p o s to s de gerência,
sej a na área administrativa, sej a na área produtiva. As
outras duas categorias vêem nesse mesmo processo de
inovação tecnol ógica, ou um estranhamento ou uma
ameaça : quantos e m pr e gos uma nova máquina subs titu i
rá ? ; que no vo s produtos s e rão dados à percepção, mas
não à fruição ? ; e tc.
No níve l prático-m oral, há uma comu nhão de valo
res entre a c lass e dos age nte s inovadores e dos trabalha
dores assalariados, de um lado, e entr e a classe dominante
e os desclassificados, de outro . No que se refere à l iber..:
d a d e , tanto os a g e nte s inovadores quanto os trabalhado
res e stã o subsumidos intel ectual e fisicamente aos im
p erativos da ac umu l aç ão de capital . A atividade criativa
do cie ntista e do técnico não está livre desses imperativos .
Muito menos o trabalho dos o p erár io s do processo de
p r o dução . Ao contrário, ta nto a classe dom in ante q u anto
a dos desclassificados gozam de uma certa l iberdade. Es
tes últimos, por não terem nada, não têm n ada a perder.
Marx costumava dizer, com ironia, que o proletário é
l ivre em dois sentidos: livre para vender sua fo rça de
33
trabalho e " livre" do s meios de produção . Mas eles não
estavam " li v r e s " de um emprego. Os de sc l as sifi cados es
tão " li vr e s " até mesmo disso . D e certa maneira, eles não
têm problemas m at e r i a i s porque não há solução p ara
eles. A classe dominante, num o utro sentido, es tá igual
mente l i v r e desses problemas, mas por e s tar e m todos
solucionados . Trata-se de uma liberdade diferen te, é cla
ro. Não obstante, o resu l tado prático-moral da " libe rda
de" de que goza o lúmpen e da liberdade de que goza o
b ur gu ê s é o mesmo : um d e s co m pro mi sso, tanto quanto
po ssível , com as regras jurídicas e morai s que garantem
a co e são social, particularmente as regras d em ocráti c as .
No nível estético-expressivo, há uma empatia entre
a classe dos agentes inovadores e os desclassificados, de
um lado, e a classe dominante e a dq s trabalhadores, de
outr o . A po s itivi dad e da atividade destes ú lti m os p rati
camente os e xcl ui desta dim ensão . No caso dos agentes
inovadores e dos desclassificados, sua posição está afe
tad a de negatividade . Os desclassificados são forças pro
dutivas que se transformam em forças destrutivas. Eles
m i m etizam os efe ito s destrutivos da . técnica ainda q ue
sem cons iderar o núcleo racional da m imese que, origi
nal mente, no trato com a n atu r e z a , buscava resultados
pro du tiv o s . Por outro lado, no caso dos a ge ntes i nov a
d ores , a neg a t iv i dad e da atividade téc nic a e c i e n tífica
está, em primeiro lugar, no seu efeito inegavelmente des
trutivo, conseqüência de seu caráter c r i ativo . Mas não é
só p o r esse caminho que os agentes i nov ad o res aproxi
mam-se dos desqualificados. Essa re lação é em gra n de
34
parte mediada por u m certo tipo de obra de arte. Embora
arte e técnica não se confunda m - não se pode desco
nhecer o valor posicional das ciências na realidade em
píric a que visa o domínio da natureza -, deve-se re
conhecer que tanto na arte qu anto na técn ica forç as idên
ti cas atuam em esferas não idênticas. Co m a superi n dús
tria, ess e vínculo entre arte e técnica se fortalece. Os
agentes p or tad ores da ciê n c i a , p ela primeira vez na his
tó ria, comp õem uma cl ass e , mas ao mesmo tempo, en
q u anto classe, estão inte l ectualmente s u bsu m id o s a o
c ap i t al . E s e algumas obras de arte denunciam o caráter
irracional da r eal i da de capitalista, o comportamento dos
desclassificados é a ex p ressão de s sa irracionalidade. Essa
irracionalidade, imediatamente, a m ed r onta e causa re
v olta em todas as camadas sociais, mas, uma vez m ediada
por certas obras de arte, ela aparece, aos olhos dos agen
tes inovadores, como uma espécie de reflexo no espelho.
Eles são cap azes de se reconhecer nela.
A teoria de classes prop osta, po rtanto, embora man
tenha, num pl ano mais geral, uma ce rta visão dicotômica
que coloca proprietários, de um lad o , e não-proprietá
rios, de outro, não deixa de a ssi n alar, entretanto, a he
terogeneidade que envolve esses úl timos, dividindo-os
em forças produtivas, forças destrutivas e forças criativas
c uja unidade de perspectivas, a i nda que possível, não
está garantida automaticamente. E c omo nenhuma das
classes não-proprietárias, na sua particularidade, carrega
consigo interesses universais, a única forma de constru
ção de um projeto alternativo de sociedade pass a pela
35
elaboração de um discurso comum que contemple as
peculiaridades de cada uma, mas que as lance para além
delas mesmas. O s o ciali smo , para de s p ertar o entusiasmo
desses ato r es sociais, não pode ser regressivo em nenhu
ma das três di mensões mencionadas. Caso contrár io,
nunca será p ossível isolar a classe dominante num p ól o
e as de mai s classes no outro, condição n e ce s s ári a da su
peração da ordem capitalista. Enquanto isso não se dá,
o neoliberalismo nos coloca à mercê de governos tecno
cráticos, autoritários ou fascistas, dependendo das força s
sociais que a classe dom inante co nse gue congregar. Po
rém, uma coisa é certa : a idéia de um congraçamento
universal de classe nos novos marcos políticos do ca p i
talism o parece, a essa al tura, pura fantasia.
36
II - Propostas de p olíticas
socializantes
37
miando o e m p re sári o e ficiente. O c ons u m o , p o r sua vez,
rege r - s e-i a também p e l as curvas de preferências indivi
duai s de cada consumidor que procurar ia maximizar sua
satisfação. Nesse r e i no fantástico onde o indivíduo seria
o senhor absoluto, até p r o b le m as como o desemprego
são vistos como uma opção, no caso, uma opção do tra
balhad o r que não aceitaria sujeitar-se a um sa l á ri o menor
compatível com sua produtividade. Alguns te ó ri c o s che
gam a e x p l or ar alguns paradoxos do sistema, m as no
geral concedem que o capitalismo seria o r e i no da l iber·
dade p o l ít i ca e da l i b e r d a de econômica. Uma vez que a
distribuição do p roduto é dada pela produtivi d ad e mar
ginal d o s fatores, a única acusação que se p oderia fazer
à burguesia é a de consumir s u p é r flu o s ou ent eso urar no
lugar de investir produtivamente, o qu e provoca cr i s es
e e vid e n c i a a des i g u a l d a d e social . Contudo, m e smo
quando o ciclo dos negócios provoca exclusão social até
o li m it e do coletivamente su po rt áv e l , haveria sempre o
mecanismo de redirecionar os gastos públicos, por m ei o
do sistema el ei t o r al , no senti do de minimizar o s efeitos
de uma retração e c on ô mica.
Assim, o p ro j e to socialista, nos dias que correm, apa
rece como algo mesquinho, fruto de ressentimento, que
p rete n d e ti rar a liberdade dos mais capazes. Um exa me
mais atento da sociedade cap i tal ista revela, entretanto,
u ma realidade oposta da apregoada. Numa passagem im
portante de sua obra, Marx afirma q u e , nos estágios pré
capital i stas, o homem era o objetivo da produção e n
quanto, no capit3lismo, a produção é o objetivo do ho-
38
mem, e a riqueza, o obj etivo da produção. À luz da in
versão promovida pelo capitalismo, aqueles estágios pas
sados ad qu irem uma aura de superioridade moral, p oi s
tinham a satisfação das necessidades humanas como fim .
Essa s e n s a ção s ó se esvai q u and o consi deramos o enorme
incremento que o capitalismo r ep re se n tou no intercâm
bio universal e n tr e homem e natureza. Nos estágios an�
teriores, dada sua técn i ca rudimentar, a s a ti s façã o das
necessidades humanas era l i mitada. O capitalismo supera
esse constrangimento. C o n t u d o, o dom ínio d a natureza
patrocinado pela técnica cap ita l i sta se dá à cu sta da total
al ien ação do fim, os homens, em benefício da lógica da
acumulação. E isso p or que a or d e m capitalista, p ara so
b r eviver, apóia-se num padrão tecnológico que cria mais
nece s si da d e s do que satisfaz, transformando-se n o r ei no
da insatisfação.
O proc e s s o de criação de n ec e ssi d ad es respe ita a se
guinte lógica : o con su mo põe i d ea lm ente o obj e t o da
produção como n e c essi da de ; mas q u an do o c onsu m o se
liberta d a sua r u deza primitiva e perde seu caráter ime
d iat o , o próprio cons umo é mediado pelo obj eto e a
necessidade que sente de s te objeto é criada pe l a percep
ção do mesmo. Assi m , a produção não cria somente um
objeto para o suj eito, mas também um suj e i t o p ara o
o b j et o . Isso significa que aquel e s que decidem o que será
p roduzido pela s o ci e d ad e decidem também o que será
dese j ad o por e la, aind a que de diferentes modos pel os
i ndivíduos isoladamente. A dec isã o do que pr o duzir, por
sua vez, leva em conta o p a drão de distribuição do pro-
39
duto p e l os indivíduos, mas a arti cul ação da distribuição
é i nte i ramen te determinada pela articulação da pro d u
çã o . A p r ó p r i a distribuição é um produto da p ro du çã o ,
p ois o modo pre c i s o d e p a r ti ci p a ção na produção de
t er min a as formas p articulares da distribuição. O pa
drão d e distribuição, p o r fim, circunscrito p e l o modo
de produção, c ont e mpl a mesmo assim inúmeras p os
sibil i dade s . Uma m e l hor distr i b u ição, resu ltante da
luta entre as cl asses, or i e n ta a pro dução n o s e n t i d o de
uma maior s a ti s fa çã o das necessi dad e s . Mas isso não
reso lve o pro b l e ma de que, s ob o capitalismo, dada a
gestão p.r ivada do processo de i n ovação tecnológica, a
correspondência entr e a p erc e p ção e a possível fruição
não acontece, e a própria luta de classes é alimentada
p e l o desej o ins ati sfei t o de t o d os .
Rigorosamente, a correspondência entre p e r ce p ção
e fruição não está completamente desaparecida, ela per
manece confinada na dim e n s ão estética. Diante de uma
obra de arte, percepção e fruição coincidem, a necessi
dade da o b r a é simu ltâ nea ao prazer que ela p roporciona.
Já no âmbito da reprodu çã o material da vida, muito s
percebem e são car ente s daquilo de qu e só alguns u su
fruem. Nesse processo, o gozo de poucos perverte-se :
acaba tendo menos a fu nç ão de saciá-los e mais a finali
dade de ac en d er o desej o dos d em ais , subm eti d o s a uma
p rivaç ão que é afinal o que de fato faz com que os poucos
gozem. Não é por ou tr o motivo que o capital i smo supe
rindustríal "pacifica os es p ír itos " por meio de uma dup l a
estética : uma estética de "feira de exposição", o nde a
40
massa da população vai admirar, muitas vezes sem p oder
comprar, o belo i nc orpo rado aos p ro d utos l ançad o s pela
indústria, o que não deixa de ser uma forma sublimada
de consumo - aquilo que não pode ser comprado é c o n "
41
Desde que esse quadro foi pi ntado, a intervenção
estatal pla nifi cado ra na econo mia e as formas de dem o
cracia direta ou p artici pativa têm sido defe ndidas p elos
socialistas como mecanism o s progressistas de atenuar as
mazelas do livre - mer c ado e os pro b lemas da democracia
re p resentativa. E enquanto formas ne ga da s do mercado
e da representação p olítica, esses mecanismos têm cum
prido, por vezes, quando utilizados limitadamente, uma
importante função reguladora na ordem capitalista. Mas
quando, na luta pela superação do livre-mercado e da
democracia representativa, essas práticas são levad as ao
paroxismo, a quantid a de se transforma em má qualida
de : elas acabam por se interverter em inst i tuições regres
sivas que configuram o que se pode chamar de des
potismo moderno. Essa de-formação, que padece de uma
contradi ção interna de c urto prazo, se teve algum caráter
progressista, do p o nt o de vist a estritamente ec o nô m ico ,
foi em s o c i e d ades muito atr a s ad a s onde o c apitalismo
mal se form ara, no sen tido de a l avanc a r o proc esso de
acumulação primitiva. Prosperou na Ásia, cujo passad o
p olítico-econômico facilitou sua implantaçã o , e foi im
p osta, por razões mili tare s , em quase todo Leste Euro
p eu, causando os estragos conhecidos. Ruiu em boa hora,
ti rando dos ombros dos socialistas um fardo po l ítico des·
comunal, mas lhes impõe, ao m esmo tempo, a tarefa
absolutamente i mprescindível de re p ens ar os es t ági os , a
estratégia e as políti c as que nos conduzirão para for a da
lógica do ca p ital sem ab rir mão da funcionalidade do
42
aparato político e e c o n ômi co e da lib e r d a d e formal dos
indivíduos.
A s ubvers ão da lógica do capital p assa pelo m e r c ad o
assim como a subversão da lógica da democracia burgue
sa p a ss a pela representação p olítica, numa articulação
que não s im p l esme nt e faz de um o li m i te do outro por
meio de contrapesos e comp ensações, m a s numa articu
lação por meio da qual e le s se interpenetram, subverten
do-s e . As tarefas são a s s e gui ntes : no p lano econômico,
trata-se de reorientar a produção e a distribuição da ren
d a no âmbito do m e rcado ; no plano político, trata-se de
democratizar a d e fin i ção da pauta pol íti c a e a informação
a ela pertinente no âmbito da representação .
Ao invés de tomar o mercado como um prove dor de
s inai s que indica ao ca p it alis ta o que os indivíduos dese
jam, visão fantasiosa do processo real, os c i d ad ão s , atra
vés de seus representantes, devem e nco n t rar uma forma
de si n alizar os bens que d e sejam que sej am o bj etos de
desejo. Isso i mpli ca "politizar a economia" de uma ma
n eira particular. A realização prática dessa proposta passa
pela democratização da pol ític a tributária. A principal
função do si st e m a tributário é a arrecadação, resp eitada
a capac idade contributiva dos c i dadão s e d as empresas.
Por meio dos tributos, o Estado se habilita a prover aque
les bens pú b li co s materi ais e culturais indispensáveis à
reprodução d a sociedade. Uma função subsidiária, mas
não menos importante, é a utilização d o s impostos como
mecanismo de alocação d e fatores de p r o du ç ã o escassos,
ou sej a, como um e misso r de sinais orientadores da pro-
43
dução no sentido de aumentar o bem-estar social. Os
estudiosos de finanças públicas vêm dando ênfase cres
ce n te a esse aspecto da questão. Contudo, a cham a d a
Welfare Economics padece de um vício fundamental : to
mando as preferências dos consumidores como um dos
critérios de formulação tecnocrática de urna política tri
butária ótima, ela negligencia o fato de que, ao menos
potencialmente, a interação dos cidadãos na esfer a pú
blica po d e modificar as preferên c i as desses mesmos a gen
44
Essa medida, e ntretanto, que altera o padrão da ofer
ta de bens, teria um efeito p r áti co bastante limitado se
o pad r ão da demanda não fosse igualmente alterado por
uma melhor distribuição da renda. No quadro a tual , de
acirramento da competição e da corrida ao corte de cus
tos, isso só pode ser obtido por meio de uma modificação
daquilo que os economistas c h a m am de d o taçã o i n i c i al
d e fat o r e s, ou, d it o de outra forma, por m e i o da socia
lização da pr o p rie da d e privada, m anten d o-se, p e l os mo
tivos já expostos, a independência g e r e n ci al das unidades
p ro du ti vas, ou s ej a , mantendo-se o mercado. A r e a l iz a
ção p r ática dessa proposta p as sa p or a l g o próximo (e vai
além) da chamada pro p riedade cooperativa, algo que
difere da propriedade estatal e da propriedade p r i v a d a
e que tem chamado a ate n ç ão de importantes e c ono mis
tas e cientistas po l ític os contemporâneos. S em perda de
eficiência e de competitividade, a propriedade coopera
tiva, por razões óbvias, en s ej ari a uma melhor di str i bui
ção de r e n d a que trari a em seu boj o o resultado eco
nômico de modificar o padrão da demanda e o resultado
p olíti co de fortalecer a democracia.
A tr an siç ão do atual capitalismo de sociedade por
a çõ e sp ara uma esp écie de capitalismo co o p er ativo exi
giria : 1) estímulo à c o o p e r at i vação dos n ão -proprietá
rio s , p or m e i o da impl antação de novas u n i dades
produtivas sob esse regime , do estímulo técnico e fin an
ceiro p ar a que os trabalhadores das emp r e s as em crise
assumam seu comando, da d em o cr ati z aç ão da gestão dos
fundos de pensão, pú blicos ou não, o ri e n t a ndo seus re-
45
cursos para o fi nan ci am e nt o de proj etos dessa natureza,
de estímulos fiscais; 2) i m p osto progressivo sobre a pro
priedade e sobre sua tra ns m i ss ão inter-uivos e causa mor
tis; 3 ) centralização p rog r e s s iva nas mãos do Estado
democrático do processo de intermediação fina nc e i r a ,
garantindo-se, por meio do controle do crédito, recursos
para a cooperativação dos não-propri etários e c o n di çõe s
de monitoramento do ciclo dos negócios para o qual as
políticas ke y n e s ianas clássicas se mostram ineficazes.
Sem que seja ne c es sári o expropriar quem q u er que
sej a, o crédito se mostra um mecanismo eficiente de so
cialização. A co o p erati v a por ele financiada, seja agríco
la, com er c i a l ou industrial , conta c o m g ran d e s vantagens
com petitivas em relação à sociedade por ações. Embora
ela tenha que p agar os j ur o s à a gê nci a fi nanciadora, tanto
quanto esta última tem que distribuir dividendos, ela
p od e dispor daqu i l o que se ria o " lucr o do empresário"
p ara amortizar o " capital", para investir, ou para aumen
tar os salários, que seriam móveis tanto quanto a j orn ada
de trabalho. Aliás, a escala móvel de salários e a esc ala
móvel de j o rn ada de trabalho tornariam-na mais apta a
concorrer com a s oc i ed ade p or ações principalmente em
ép ocas de crise dur an te as quais a flexibilidade é um
trunfo imbatível.
Há m uit os casos recentes de coop erativação a serem
estudados, uns bem-sucedi dos, outro s não. Quem quer
que denuncie o caráte r retrógrado de um tal emp r e en
dimento simplesmente não sabe o que se passa no mun
do. Em vários p aíses desenvolvidos há exemplos de
46
trabalhadores que assumiram o controle ac io n á rio de
pequenas, médias e gr andes empresas. Há também exem
plos de gran d es empresas que foram originalmente or
ganizadas sob o regime d e cooperativa, por vezes fi
n ancia das p or bancos p o p u l ar es instituídos com o fim
específico de e st i m u l ar tais iniciativas. Co ntu d o , deve-se
observar que não há p recedente histórico de um governo
que tenha a dota do uma p olíti c a nacional deliberada de
estímulo à coo p erativação, m a nti d o s o mercado e a de
mocracia re p resentativa. Isso foi ape n as esboçado em
p aís e s escandinavos, mas nunca imp lementado.
Uma iniciativa dessa natureza, sem dúvida, contaria
com o apoio d as três classes sociais não�proprietár i as sem
o que o su cess o do e mpreendim ento e s tar i a comprome
ti d o . Um dado eloqüente é o apoio dado pelos não-pro
pri etários de uma maneira geral a um movimento tido
como radical como o Movimento dos Trabalhadores S em
Terra (MST) . Trata-se de um movimento que mudou
completam e nt e a pauta clássica de reivindicações : ele
não reivindica maior remuneração o u m e no r j or na da,
não reivindica igualmente favores do Estado, sej a renda
m íni ma ou seguro-desemprego, ainda que tudo i sso seja
muito j usto . Revolucionariamente, o MST quer crédito,
apoi o técnico e autonomia para organizar s uas coop era
tivas. Apesar do seu escopo limitadíssimo e ai n d a não
muito nítido, as demandas do MST têm caráter universal,
aplicável a todo ramo de atividade eco n ôm i c a, em pe
quena e em grande escal a. São iniciativas dessa n a tu re za,
progressivas em todas as di m e n s õ e s da vi d a social, que
47
devem sempre chamar a atenção dos socialistas e lhes
servir de inspiração p ara sua conduta política. Pois são
elas que congregam as três classes não- p roprietárias e
isolam a classe dominante de uma forma cristalina e p o
líticamente p rofícua.
Na persp ectiva prop osta, portanto, numa primeira
fase do proj eto socialista conviveriam propriedade so
cializada e mercado. Mas, p ara que este não pusesse a
p e r d e r a marcha do cooperativismo, nem aquela p u s es se
a pe rd er a funcionalidade do mercado - o que imp l i c a a
autonomia das unidades p r oduti vas e a concorrência en
tre elas -, far-se-ia necessário gar antir que a p ropri e da de
dos meios de pr o duç ão das empresas cooperativas per
t e nce ss e a um fundo pú b l i c o não-estatal : público por ser
ve dado aos trabalhadores c o op e r ativ a do s reprivatizar
tais meios de produção ; não-estatal por ser vedado à
autoridade do Estado ferir a autonomia da sua gestão,
que traria consigo ainda todos os vícios burgue s es : ma�
ximização do " lucro", p oderes ilimitados aos gerentes -
ainda que pudessem ser e s col hi do s p elo coletivo dos tra
balhadores -, div i s ã o autoritária do trabalho, etc . Numa
segunda fase do proj eto socialista, caso todos n ós apren
dêssemos, tal como os ar ti s tas , a inovar ou criar sem a
necessidade de estímulos pecuniários extraordinários,
p oder-se-ia c o nc eb e r a h i p ó te s e de superação do me r ca
do, não p elo planejamento burocrático, seu op osto, mas
por uma decorrência até certo ponto natural do proces
s o : sob o comando dos não-proprietários, as cooperati
vas, progressivamente, p assariam a coop erar entre si,
48
inclusive transnacionalmente, concorrendo para a supera
ção do sist em a produtor de mercadorias em escala global.
.
com a esfera p ública, des d e o seu surgimento com a as
c e n s ão do Terceiro Estad o, r evela, a qu i também, uma
outra realidade : a igualdade e a liberdade mencionadas
eram reais quando o acesso à esfera pública era restrito
ao círculo dos proprietários; a ulterio r am p l i a çã o desse
acesso aos não-proprietários por meio do sufrágio uni
versal o cor r e com o surgimento qu as e que co nc o m i t a n t e
dos modernos meios de comunicação de massa, sem os
49
quais a p o l ítica moderna é impensável. E esses m ei o s ,
possuídos p e l o círculo dos proprietári os_, são g e r i d o s se
gundo a l ógica p rivada qu e vai definir, e m última instân
cia, a pauta po lít i c a em d is c ussão numa esfera p ú b l ic a
que, na modernidade, está toda ela conti da na própria
mídia no lugar de abarcar-lhe.
A primeira conseqüência da lógica do mercado nesse
campo, fruto imediato da concorrência e ntre os diversos
meios de comunicação de massa, é justamente o baratea
m ento da informação. Só que e s se barateamento não diz
res p e it o unicamente ao preço, mas' particularmente ao
conteúdo da i n fo r m ação : esse é o aspecto relevante. Em
busca de escala de produção, as empresas de comunica
ção esforçam-se por c o n ce b er um p ro dut o p a dron iz a d o
e p razeroso. Para tanto, o produto não pode exigir gran
de esforço do co ns um idor que quer se informar. Deve
mover-se nos trilhos das assoc i aç ões habituais por meio
de uma busca compulsiva de c l a r eza. Isso só é poss íve l
se se isola a informação do proc ess o social em seu todo,
o que impõe aos meios de com unicação de massa o mero
registro dos fatos, ou seja, "a duplicação p arc e lada do
mund o com imparcialidade " , uma contradição e m ter
mos que se interverte em divi nização da realidade tal
como ela é. A ilusão do j ornalismo " progressista" está
em querer romp er essa lei de ferro, ouvindo "o outro
lado " de uma e stó r i a ou se p e rmiti n d o comentários crí
ticos, sem perceber que o produto atrofia e inibe a ima
ginação e a espontaneidade do c on su mi d or em virtude
de sua própria constituição o bj eti va . A única maneira d e
50
ganh ar quali dade crítica é p erd er mercado e de fi nh a r A .
51
tultice . Nesse plano tudo concorre para que a "reprodu
ção sim p l e s do espírito não leve à reprodução ampl iada" .
Além disso, um m ec ani sm o desse tip o no âmbito d a cul
tura p o d e r i a representar uma gr ave ameaça ao di rei to
da m i noria . Uma coisa é o c o r p o de representantes dos
ci dad ão s , por meio de uma p o l ítica tributária de mocra
tizada, orientar a utilização dos fato res de produção num
sentido o p o st o à da . c r i aç ão daquelas n e ce ss i da de s que
só uma minoria c o m recursos p oderia ver satisfeitas, ou
tr a coisa é esse mesmo corp o atribuir-se po d e r e s para
restringir o camp o de ação e p e r su asão de minorias po
lítico-culturais sem vez ou voz. A socialização dos m e i os
de comunicação, a partir da criação de cooperativas de
j o r n ali s t a s e a rt i sta s , autônomas frente ao E s ta do , sem
dúvida, alteraria esse quadro substancialmente. A refor
mulação do ensino básico e a universalização do e ns i no
su p e rio r também. Essas duas m e d i d as sem dúvida e l e va
riam o p ata ma r cultural da sociedade. Contudo, para o s
socialistas a qu est ão prévia que se coloca é a de como se
apresentar perante as três classes não-proprietárias e co n
quistar-lhes a confi a nç a para articular to das aquelas suas
iniciativas que concorrem para a sup eração da o r d e m ,
tanto no plano mate r i al como no cultural. Por tudo o
qu e se disse no p r i m e i ro capítulo, não nos bastaria con
fiar na co nsciênc i a de cl ass e dos não-proprietários, es
p on tân e a ou tr azida de fora p or uma vanguarda, nem
tampouco, p e l o que s e di sse n e sse ca p ítulo , confiar uni
c a m e nte num bom programa de transição, divul gado por
militantes aguerridos, em campanha cívica, emb o r a isso
52
seja muito importante. Restaria entregarmo-nos ao mar
keting, mas, nesse caso, é a forma qu e contaminaria a
compreensão do conteúdo libertário de um programa
radical. Ainda que o marketíng seja uma exi g ênci a in
contornável da m o d e rn a política de massa, ele só deve r i a
ser u t i li z a d o sob a con dição de se sujeitar a imperativos
de outra ordem que não os dele mesmo.
Os períodos eleitorais têm s i d o vistos como períodos
de a gitação i d e o l ógí ca nos quais os políticos se dão a
conhecer, esforçando-se por conquistar as simpatias dos
el e i to re s . O pro ce s s o é coroado p el a eleição, entendida
c o m o um método de seleção. Co ntu d o, o que e s cap a a
essa concepção de democracia é o fato de que o p eríodo
el ei t or al é um mo m e nt o riquíssimo no qual o e le i to r não
som ente c o n h e c e as p l a taf o r m as dos candidatos, mas
p rincipalmente se v al e de toda s ua dinâmica pa r a , num
certo sentido, conhecer a si mesmo e se fazer co n h e c e r .
O marketing político, e n tr e t an to , guiado p e l a s concep
ções rasteiras do el eitor-co nsumidor, só oferece as con
d i ç õe s p ara que ele c o nfi r m e o juízo que t e m de si e
re afirme suas convi cções e preconceitos. Os i m p ul s o s
lib ertários permanecem adormecidos no inconsci ente :
todos saem do processo como e n tr ar am . Uma r evira
volta po l íti c a e xi g iri a, portanto, uma forma de discur
so que desl ocasse os s uj e i t o s de suas p o s i çõe s habituais
mesmo que no interior de um unive rso lingüístico m a is
estreito, p ermitindo-lhes traz e r à consciência esses seus
imp ulsos. Nesse p onto, t e m os todos m u i t o a ap r e nder
com a p sicanálise.
53
A r e c ep ç ã o da psi canálise pelos socialistas foi bastan
te conturbada. Inicialmente as ten tati va s de c o ncili ar a
p s i c a n ál i s e com o m a rx i s m o foram ridicularizadas. Fal
taria a o freudismo, principalmente, a compreensão do
c a r át e r histórico da repressão sexual, i mpossibi litando-o
de vislumbrar as possibilidades de mudança social . Mas
alguns s o c i al i s tas não tar da ri a m a p erceber o p ot e nc ial
crítico da nova ciência. O caráter materialista da teoria
da libido e o desmascaramento d a unidade da persona
lidade p ermitiam um a leitura dial étic a da e s tr utu r a psí
q u i c a d o s i n d i v í d u o s em t e r m o s d e a p ar ê n c i a (a
c on sc i ê n c i a) e essência (o inconsciente), tal como a te o r i a
crítica tratava os fen ô men o s socíais. A psicanálise viria
assim su p r i r, no seio do marxismo, o degrau faltante
entre b ase econômica e superestrutura ideológica. Além
disso, a psicanálise poderia aj u da r a exp lic ar a est ab il i
dade da ordem cap ita l ista num momento em que sua
necessidade obj etiva já havia passado. Numa o u tra chave,
procurou-se extrair dessa teoria sua força crítico-utópi
ca, m algrado o p e ss im ismo exp r es so p elo seu fundador,
e n fati zan do -s e aqueles e le m e nto s que efetivamente p r o
j etavam-se para lá do sistema p resente, na di r eç ã o de
um a civilização erótica. Tanto na ve r s ão crítico-resigna
da como na v e r s ã o crítico-utópica da recepção marxista
da psicanálise, a terapia jamais foi p l en ame nte aceita pois
sempre esteve ass ociad a à i déia de que seria im p ossíve l ao
indivíduo alcançar a cura numa s oc iedade irracional co mo
a capitalista. Quando, finalmente, a te rapia é reconsiderada
pelo membro mais i mp ortante da segunda geração dessa
54
tradição, ela é e nten dida "idealisticamente" como mero
re apren di zado de uma gram áti c a, como recomposição
possível de um i nco ns c iente gramaticalmente deteriora
do , p e r d endo - s e dessa forma todo potencial materialista
d e crítica social.
O que parece não ter sido suficientemente ex plor ado
ainda é o potencial emancipador da forma di scur s i va da
psicanálise e m política como contrap onto do marketing.
Emb o r a a te or i a crítica j amais tenha deixado de reco
nhecer o caráter individual da psique, rejeitando o es
forço revisionista de so ci olo gi z ar o indivíduo, e l a nunca
perdeu de vista que tanto a força das erupções psíquicas
como seu p róp r i o conteúdo estavam condicionados pela
lógica da reprodução material. S e mp re reconheceu que
uma s e l e ção de traços, o núc le o essencial da estrutura
psicológica da maioria dos membros de um grupo, de
senvolve-se como resultado de exp eriências básicas e do
m o d o de vida c o m um . A rigor, o indivíduo, para o m ar
x ismo, nem sequer chegou a se constituir historicamente,
p oi s o caráter de classe da s o c i e d a d e fixou cada um n o
estágio do mero ser genérico. O marketing, de certa for
ma, r e c onhe c e isso, mas c o m o " psicanálise deteriorada"
que se preocupa com o " bem-estar do cliente " e não com
a sua "cura". Uma mudança radical dessa p ostura p a s sa �
ria por t o m a r os eleitores não-proprietários como suj ei
tos ativos que, na sua particularidade, estão dispostos a
fazer c on he ce r e da r vazão a impulsos emancipatóri os
qu e , em grande p arte, são comuns. O desafio está em
e nco nt r ar a fo rma discursiva que un i fic a essa disposição,
55
respeitàdas as diferenças existentes entre as três classes
dominadas.
O Partido dos Trabalhadores, nos anos 8 0, conse
guiu, em parte, ess a proeza. S em um programa definido,
num país semi-analfabeto, pela simples forma como se
apresentava ao e l e i t o r a do, conheceu um c re sc i m e nt o
vertiginoso e um p r e s tígi o social espantoso. Não vinha
com fórmulas prontas, mas observava o movi men to so
c ial mais arrojado, o rga ni zava sua pauta e eventualmente
dava caráter geral a reivindicações particulares. Onde
havia um s op ro de vida social criativa, lá e sta va o PT,
ap r e n dend o a ouvir. Com método, extraía das experiên
c i as de que participava a qu i l o que tinha força transfo r
56
del e que se encontrará o caminho de eliminação de todo
mecanismo de coerção estatal sobre a s ociedade : esse é
o único significado plausível p ara a expressão Estado
evanescente . Enquanto isso, cabe aos soci alis t as revitali
zar a c o mb al i d a democracia representativa que, no pre
sente contexto, é a melhor forma de defesa das classes
não-propri etárias e de acomodação dos seus discrepantes
interesses. Mas, tudo dando certo, tão logo a coerção se
mostrasse desnecessária, a própria representação política
p oderia ser sup erada, com a redução do Estado a um
m ero ofertante de bens públicos, m a t e riais e culturais,
desprovido de todo conteúdo p olítico, caso em que não
s e ria mais um corpo destacado que paira por sobre a
sociedade, mas como algo que se con fun diria com el a .
Nesse caso, no lugar dos atuais Estados nacionais con
correntes , ter-se-ia, finalmente, o advento de uma ver
dadeira comunidade internacional.
57
Ill - Perspectivas Concorrentes
59
extraordinário da p eriferia e da semiperíferia para o cen
tro ; e o endividamento público, que é o mecanismo pelo
qual o Estado socializa esses ganhos sem a necessidade
de taxar o capital ou o trabalho, postergando in d efini
b) Neonazismo
60
alcance e sentido não r a r o c ol idem com os o rigi n ais . Tal
ve z o ne o n azis mo s e nos apresente como mais u m c aso,
uma vez que se u fun damento mate rial , psicológico e ex
i ste n ci al difere radicalmente daqu e l e em que se apoiou
o mo vim ent o nazista, ainda que os skinheads a dotem
como símbolo a suástica, como ídolo, Hitler, e, como
doutrina, a tese do espaço vital .
No p e r í o do p ós- 1 945 , a manutenção d e uma situa
ção i nternaci o na l confortável para as e co n o m i as c e n
trai s tinha p e l o m e nos dois p ressuposto s : 1 ) um m a i s
ou menos livre trânsito de mercadori as e 2) a i n exis
tên c ia , tanto quanto possível, de um fluxo de p essoas.
Se a mercadoria deixa um crédito no país de ori ge m
que será tanto maior quanto mais " ciência" ela tiver
em si incorp orada, o i m i grant e desqualificado l eva
consigo um débito, uma vez que s eu trab alho exceden
te s erá, muito provavelmente, menor do que os b e n e
fícios q u e receberá do Welfare State.
Num momento em que este último perde sua base for
mal como conseqüência da própria lógica de acumulação
de c apital , é justamente em relação a este segundo pressu
posto que o discurso neonazista en co ntra o seu eixo. O
neo nazism o assume integralmente o que o neoliberalismo
não diz, mas p r ati ca com reservas. E aí encontra-se o pri
meiro traço distintivo fundamental entre nazismo e neo
nazismo. Se o primeiro é sinto ma da "pobreza" (alemã) em
me i o à aflu ê ncia, o s e gun do é s in toma da afluência (ame
ricana e européia) em meio à pobreza. Disso de co rr e a
diferença entre as concepções nazista e ne onazi sta de es-
61
paço vital : o conceito nazista implica a expansão do es
paço vital e, n este sentido, ele é totalizante ; o conceito
neonazista implica a delimitação do espaço vital e, neste
sentido, ele é simplesmente excludente. O neonazismo,
em contraponto ao nazismo, pretende mais preservar o
igual do que eliminar o diferente. Prefere expulsá-lo, o
que é ou tr a coisa, por sutil que seja.
Uma conseqüência marcante disso tudo é que o neo
nazismo não ex i ge necessariamente a figura do líder ca
ris m áti c o . A mera delimitação do espaço vital p ode ser
fe i ta de forma d i sp e rs a e, em grande p ar te , anônima. A
ausência do Führer é sintomática. A estatização da di
mensão estética promovida p elo irracionalismo n azi sta
lhe dava ar e s "pós-modernos" . O neonazismo, ao co n
trário, é m ais moderno, mais técnico, mais mesquinho
e, por isso, mais "inofensivo " . Ele não poderia p rovocar
a m or te de 60 m i lh õ e s de seres humanos a bala. Sua
defesa intransigente da ordem econômica vigente p o d e rá
provoc ar a m orte de U:m número ainda maior de p e ss o as,
mas de fom e . Por fim, é p re c iso salientar que o neona
zismo não é nem será um fenômeno l ocalizado. Ele é
possível onde quer que populações relativamente abas
tadas convivam com a pobreza etnicamente delimitável,
seja em S ão Paulo ou Berlim.
e) Fascismo
62
acima do lucro médio proporcionado p e las atividades
rotineiras. Contudo, o que poucos economistas obser
vam é que, do mesmo modo que se supõe que as inova
ções orientadas para o lucro extraordinário e seus efeitos
s e agrupam no tempo, por força da concorrência inter
capitalista, o que exp licaria a alternância de longas fases
de prosperidade e depressão, poder-se-ia sup or que essas
inovações também se agrupam no espaço, por força da
concorrência interestatal, o que explicaria a divisão da
economia mundial em núcleo orgânico e periferia. Como
essa segunda hip ótese violava as leis do modelo de equi
líbrio geral wal rasiano, transp osto para o p l ano interna
cional, os economistas negligenciaram completamente
essa possibilidade. Pregaram que as economias nacionais
convergiriam rumo ao seu paraíso liberal e, quando os
dados lhes negavam cré dito, os acusados eram os gover
rios e os p ovos dos p aíses atrasados e não suas sacrossan
tas leis econômicas .
Assim, deixaram de p erceber o óbvio . Quando as
empresas de uma determinada jurisdição política c ome
çam a inovar, elas acabam fortalecendo indiretamente o
poder político onde operam que, por sua vez, terá maior
liberdade para criar um ambiente jurídico-institucional
e de infra-estrutura econômica mais favorável para a ati
vidade inovadora, gerando um processo circular e cu
mulativo. Dito de outra maneira, o processo de inovação
não só gera lucros · extraordinários para as empresas,
como também, através de uma relação simbiótica com o
Estado, gera as externalidades que o retroalimentam. Os
63
páísei tâ�italistas pioneiros formam então um n úcl eo
· ()tgâilicC>que goza de uma riqueza "oligárqu ica" não uni
.
.• vé:rsalizável. Ao contrário, as tendências do pr oc ess o irn
. p licam uma polarização c res ce n te da ec o n o mi a mundial
numa zona p e r ifér i c a e numa zona de núcleo o rgân ico
de cuj a rigidez raríssimos p a ís e s conseguem escap ar.
Tudo faz lem b rar um fenômeno físico elementar: soltem
s e dois corpos l a d eira abaixo, um imediatamente após o
outro, e se perceberá que, quanto maior a distância per
corrida pe l os mesmos, m ai o r a distância que os separa.
A observação das traj etórias das economias p e riféri
cas, entretanto, revela a existência de países que c omp õem
um grupo intermediário relativamente e s táv el que con
s e gu i u até aqui resistir à t en dên ci a de periferização, em
b o r a n ã o t e n ha c o ns e g u i d o acumu l ar fo r ç as p ara
sup e rá -l a . Esses Esta d o s semiperiféricos, de alguma for
ma, conseguem i s o la r as atividades inovadoras local i za
d as dentro de suas jurisdições d as pressões com p eti ti vas
mun diais, mas, ao fazê-lo, privam-nas de possíveis eco
nomias de escala e daqu ele ambiente comp etitivo mais
agre s siv o que favo r e ce a continuidade do processo de
inovação. D e s sa forma, os países semiperiféricos cons e
guem industrializar-se sem se desenvolver, conseguem
cres c er, mas apenas para p er m ane c er no mesmo lugar,
relativamente aos países do núcleo orgânico.
As duas estratégias de " desenvolvimento" semiperi
férico que marcaram o século foram a e str até gi a pró-sis
têmica, exp erimentada p elos países da América Latina e
do Sul da E u ro p a , e a estratégia anti-sistêmica, que pre-
64
valeceu na URS S e n o Leste Eu r op e u . A primeira p rese r
vou as extremas desigualdades de distribuição da riqueza
e a c e i to u desempenhar funções subordinadas nos pro
cessos globais de acumulação de capital. A segunda con
si stiu no c o n t r ár i o : numa mai s ou m e no s completa
distribuição de r i q u e z a e nu m a recusa em desempenhar
o tip o de p a p e l subordinado nos p ro ce ss o s globais de
acumulação de capital. .A mb as as estratégias imp l i caram
o uso da coerção sobre o c r e s c e n te proletariado que
e m e rg ia dos processos de industrial ização, e amb as as
estratégias, por razões d i fere n te s , entraram em c r ise no
p resente mo m e nt o histórico .
O colapso do S istema S oviético e a desarticulação do
Estado Desenvolvimentista p o d e m trazer graves conse
qüências p olíti c a s para as sociedades semiperiféricas do
p l a n e ta . Aque l a s sociedades que não ace i tam os efeitos
nefastos da p eriferização p ode m inclinar-se para a ado
ção de práticas do velho fascismo, adequando-as à sua
posiçã<? na hi e rarqui a mundial. A hostilidade étnica ou
reli g io s a co ntra p aís e s viz inhos ou contra minorias den
tro das suas próprias fronteiras acirra-se, bem como o
terrorismo, não raramente a po i ado por go ve rn o s da se
mi p eriferia contra cidadãos do núcleo orgânico. O mun
do p e n s o u que não mais conviveria com atrocidades
iguais às cometi das na Segunda Guerra Mundial. A guer
ra civi l decorrente da desintegr ação da ex-Iugoslávia
mostrou-nos que o mundo se enganou.
65
Agradecimentos
67
16 EDITORA
Y VOZES
SEDE JUIZ OE FORA, MG
PETRÓPOLIS, RJ Alocado e voreio
(36010-041) Ruo Espírito Sonto, 963
lntern•t: htlp://www.vozas.com.br lei. o Fox: {032) 2 1 5 - 8 0 6 1
(25689-900) Rua Frei Luls, 100
Coiico Pos1ol 90023 LONDRlNA, PR
T•1.: 1024) 237-51 1 2 Varejo
FO!<: (024) 2 3 H676 (860 l 0-3 90) l\ua Piouí. 72 - loja 1
E-moil: •endas@vozes.corn.br lei.: (0.43) 337-3129
Fax: (043) 325-7 1 6 7
U NIDADES CE VENDA MANAUS, AM
BELO HORIZONTE, MG Varejo
Atucado é voreia {69020-030) Av. Jooquim Nobuco, 1 02 3
{30 l 3 0 - 1 70) Ruo Sergipe, 1 20 - leio 1 Ceritro
Tel.: (03 1 1 2 26-901 O · olacodo Tel. e Foxc (092) 233·0 1 54
{03 1 ) 222-7797 - voreio
PORTO ALEGRE. R S
Fox: (03 1 ) 226-9269
Atocodo
Vorsio
(90035-000) Ruo R"miro Barcelos, 386
(30 1 90-060) l\ua Tupi;, 1 1 4
Tel . c (05 1 ) 2 25-4 879
lel . : (03 l) 273-2538
Fox: (05 l ) 22 5-4977
Fax: (03 1 1 2:22-4482
BRASÍLIA, DF
Voreio
Atacado 1 voreio
(900 l 0-2 73) Ruo Riochuelo, l 280
Tel.: (05 1 ) 226-391 1
(70730-5 1 6) SCLl\/Norte, Q 704, BI. A, n' l 5
Tel .: (06 1 ) 223 -2�36
Fox: (05 1 ) 226-3 7 \ 0
Fax: (06 1 ) 223-2282 RECIFE, PE
CAMPINAS, SP Atacado e varejo
Varei o (50050-4 10) Ruo do Ptfricipe, 482
( 1 30 1 5-0021 RlJCJ B.-. de fogueira, l l 6A lei.: (08 1 ) 423-4 1 00
Tel.: (Ol 9) 23 1 - 1 323 Fax: (OS 1 \ 4 23- 757 5
Fo"' {0 1 9) 2 3 4 -93 1 6 RIO DE JANEIRO, RJ
CUIABÁ, MT Arocodo
Atacado e voreia (2 2280-060) Rua Elvira Mochodo, 3
f78045-750) Ruo Marediol Florigna, 6 1 1 · •I. 2 Bolafogo
Tel. e Fo.: (065} 322-8791 Tel.: (02 1 ) 224-0W
CURITIBA, PR Fox: (02 1 ) 252-6678
Alocado Varejo
(80060- 1 40) Rua Dr. Foi....-e , 1 27 1 (2003 1 -201 ) Rua Senador Donlo•, 1 1 8-1
Tel.: (04 l ) 264-9 1 1 2 Tel.c (02 l ) 220-8546
Foi!: (04 1 ) 264-9695 Fax: (02 1 ) 220-64A5
Varejo SALVADOR, BA
(S0020-000) Ruo Volunl6rios do P61ria, 4 1
Ato eodo e vereio
laia 39
(40060-4 1 O) Ruo Coei o• Gamei, 698 ·A
Tel.: {04 l) 2 3 3 - 1 392
Tel .: (07 1 ) 3 29-5466
Fax: (04 1 1 233- 15 70
Fox� (07 1 1 3 2 9 - 4 7 4 9
FLORIANÓPOLIS, se
Atocada e ..-orejo SÃO PAULO, SP
(8801 5- l 00) Ruo Osmar Cunho, l 83 • loja 1 5 Ataco do
Centro (0 1 4 J 5.QOO) Ruo Belo Cintra, 9 67 - 8° andor
Tel. • Fax: (0481 222-4 1 1 2 Coniunlo B l - Corqueiro Cernr
Tel.: (Ol l) 3 1 59 - 1 236
FORTALEZA, CE
Alocaáo e var�/o Fa�: ( 0 1 1 ) 257-0452
{6002 5- 100) Ruo Maior facundo, 730 Varejo
T1L (085} 2 3 1 -9321 (01 006-000i Rua Senodar Feijó, l 68
F"": (085) 22 1 -4238 lel.: {01 l ) 605-7 144
GOIÂNIA, GO Fax: (Ol l) 607-79�8
AJacado e voreio Vorejo
(74023-0lO) Ruo 3, 11• 291 (O l 4 1 4-000i Ruo Hoddock lobo. 360
Tel.: í062) 225-3077 Tel.: (01 l) 256-Ü{,l 1
Fox: 1062) 225-3994 fox: (O 1 1 ) 258-2841
Oi �.todos do ACRE, MWONAS, AMA.PÁ. MATO GROSSO DO SUL, PAAA, RONDÔNIA e ROR.AllM estOo
,.ndo atendidos pelo •ede, Petr6palis. Tele (024) 237-5 1 1 2, ramol 205 - Fax: {024) 23 1 -0226