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INSTITUTO FEDERAL DO CEARÁ

Campus Fortaleza
Departamento de Artes
Curso de Licenciatura em Artes Visuais
Filosofia da Arte
Prof. William Moreno
Aluna: Renata Andrade Frota
Matrícula: 20181014040320

1. INTRODUÇÃO

O presente trabalho, realizado para a disciplina de Filosofia da Arte, tem o intuito


de debater acerca das teorias do belo, tema trabalhado ao longo da realização da
disciplina. Para tal, sigo a referência do livro Belo Autônomo, organizado por Rodrigo
Duarte, e Iniciação à Estética, do Ariano Suassuna, para apresentar aqui uma síntese das
teorias de Platão, Aristóteles, Hume, Kant e Hegel – autores estudados ao longo deste
semestre – sobre o belo.
Após realizar a síntese e o debate teórico, tomo como base o pensamento kantiano
para discutir a obra Paratudo, do brasiliense Dalton de Paula. Paratudo é uma instalação
que integrou a exposição Histórias Afro-atlânticas, que esteve em cartaz neste ano, no
Museu de Arte Moderna de São Paulo, o MASP e Instituto Tomie Ohtake.

2. DESENVOLVIMENTO

“Estudar a Beleza é tocar, de maneira geral, em todos os problemas da Estética


(2013, p. 24)”, pontua Suassuna em seu brilhante, Iniciação à Estética. Portanto para
apresentar as concepções de belo para Platão, Aristóteles, Hume, Kant e Hegel, tomo
como seta a seguinte questão: do que se trata a Estética?
2.1 A Estética e o Belo
De acordo com Suassuna, nos períodos “clássicos”, da filosofia tradicional, dos
quais fazem parte Platão e Aristóteles, a Estética se trata de uma Filosofia do Belo (2013).
Nos primórdios da filosofia, entendia-se a beleza a partir de duas perspectivas: da arte e
da natureza, sendo a segunda colocada em primazia. Tal hierarquia tem fundamentos
platônicos, uma vez que ele concebe o mundo a partir de uma ótica dualista, que tem
sustentação no seu conhecido mundo das ideias. Segundo o filósofo, o mundo estaria
dividido entre ruína e forma.
O nosso mundo, este mundo sensível que temos diante dos nossos olhos, é o
campo da ruína, da morte, da feiura, da decadência. O mundo autêntico, o
mundo em forma do qual o nosso recebe existência e significação, é aquele
mundo das essências, das Ideias Puras, às quais acabamos de nos referir. É o
mundo eterno e imutável que existe acima do nosso e que chama o daqui para
seu seio. Nesse mundo, a Verdade, a Beleza e o Bem são essências superiores,
ligadas diretamente ao Ser.
(SUASSUNA, 2013, pg. 24)

Sendo assim, é a partir da verdade e do bem que se pode falar de beleza em Platão.
É um tripé que compõe o mundo das ideias, da forma: verdade, bem e beleza. O
conhecimento, a sabedoria é da ordem do que é verdadeiro, portanto é bom, logo, belo. A
beleza está na razão. “A Beleza é o brilho da Verdade” (PLATÃO apud. SUASSUNA,
2013, p. 28), pontua. Daí o problema de Platão com os artistas. Para o filósofo, a arte que
está atrelada a ordem do sensível, do mundo imperfeito, da ruína. Mundo ilusório, sombra
daquilo que real. Mentiroso, pois imita. Se é falso, não é belo. Por isso, em sua obra A
República, ele elenca uma série de restrições aos artistas e decide expulsar o poeta da
cidade.
(...) se viesse à nossa cidade algum indivíduo dotado da habilidade de assumir
várias formas e de imitar todas as coisas, e se propusesse a fazer uma
demonstração pessoal com seu poema, nós o reverenciaríamos como a um ser
sagrado, admirável e divertido, mas lhe diríamos que em nossa cidade não há
ninguém como ele nem é conveniente haver; e, depois de ungir-lhe a cabeça
com mirra e de adorná-lo com fitas de lã, o poríamos no rumo de qualquer
outra cidade. Para nosso uso, teremos de recorrer a um poeta ou contador de
histórias mais austero e menos divertido, que corresponda aos nossos
desígnios, só imite o estilo moderado e se restrinja na sua exposição a copiar
os modelos que desde o início estabelecemos por lei, quando nos dispusemos
a educar nossos soldados.
(DUARTE (org.), 2012, pg. 14)

Aristóteles, por sua vez, embora discípulo de Platão, vem quebrar a lógica de seu
mestre. Sua concepção de beleza não se atrelará a uma noção de sublime, ideal, mas a
noção de harmonia, proporção, grandeza. O belo para Aristóteles se dá numa perspectiva
realista, concreta. Dentro dessa lógica, em sua obra Poética, o filósofo vai pensar a
Estética tanto por meio da Tragédia, sendo esta relacionada ao belo, como, inclusive, pela
sua oposição, a Comédia, que trabalha a desordem, o feio.

Assim, resumindo, pode-se dizer que, para Aristóteles, a Beleza é uma


propriedade do objeto e consiste, principalmente quando aparece como Belo,
na harmonia das partes de um todo que possua grandeza e medida. As três
características principais da Beleza são, portanto, harmonia, grandeza e
proporção. A fórmula que traça as fronteiras da Beleza é “a unidade na
variedade”. Aristóteles pressente, pelo menos, a fragmentação do campo
estético, tanto assim que considera a Comédia como uma Arte do feio mas,
mesmo assim, não se furta a incluí-la no campo estético. O realismo não se
confunde com nenhum pensamento estreito, pois o que ele empreende é a
revelação da própria essência das coisas. Sob o ponto de vista da fruição, da
contemplação do sujeito, a Beleza é aquele bem que é aprazível porque é bem.
A Arte não é uma forma de conhecimento, a não ser que se entenda o
conhecimento, aqui, como aquilo que os estetas modernos chamam de
“conhecimento poético”. Apesar disso, o espírito, ao ser movido pela Beleza,
normalmente se põe a refletir sobre aquilo que viu e lhe causou prazer. A Arte
é, mais, um depoimento do mundo, contido numa outra realidade,
transfigurada.
(SUASSUNA, 2013, p. 31)

A relação que Aristóteles faz da Comédia, que é da ordem do feio, com a Estética
dá indícios, bem como início, de uma fissura no campo estético, compreendido apenas
como o campo do belo. Aqui se começa uma virada na compreensão de Estética.
Salto agora da História Antiga para início da Modernidade. Esse salto, longo,
prevê uma mudança significativa na forma de se compreender o mundo, portanto, a
Estética aqui já não é mais a mesma dos períodos clássicos. A partir da rachadura
provocada por Aristóteles, que ficará mais evidente em Kant (que tratarei na sequência),
o belo passará a ser entendido como uma das categorias da Estética. Esta, por sua vez,
mais adiante será pensada não mais enquanto filosofia, porém, enquanto ciência.
Mas para conseguir se apreender Kant é preciso percorrer outro pensador, David
Hume. O filósofo irá pensar estética a partir de uma abordagem cética sobre a questão de
juízo de gosto (DUARTE [org.], 2012). Em sua obra Do padrão do gosto, Hume colocará
que tanto a noção de beleza quanto a noção de deformidade se darão de modo singular
para cada pessoa, a partir do modo cada um sente em relação a tais noções. Se dará a
partir do gosto, que é heterogêneo, diverso. Sendo assim, nada poderia ser absolutamente
classificado como belo ou como feio. Tais concepções são relativas.
Por sua vez, os mil e um sentimentos diferentes despertados pelo mesmo objeto
são todos certos, porque nenhum sentimento representa o que realmente está
no objeto. Ele se limita a assinalar uma certa conformidade ou relação entre o
objeto e os órgãos ou faculdades do espírito, e, se essa conformidade realmente
não existisse, o sentimento jamais teria sido despertado. A beleza não é uma
qualidade das próprias coisas; ela existe apenas no espírito que as contempla,
e cada espírito percebe uma beleza diferente.
(2012, pgs. 74 e 75)

É a partir dessa noção de gosto esboçada por Hume que será possível compreender
a virada violenta que Kant dará no campo estético. A partir dessa noção de gosto que
Hume fala, Kant colocará que os problemas apresentados pela Estética são
insolucionáveis, uma vez que o juízo estético é relativo. Ele se dá de acordo com o gosto,
com a apreciação de cada sujeito. A forma como este sujeito reage a determinado objeto,
para Kant, não emite conceito, decorre “(...) de uma simples reação pessoal do
contemplador diante do objeto, e não de propriedades deste.” (SUASSUNA, 2013, p. 38).
Somente emite um conceito o juízo do conhecimento, uma vez que este, sim, diz respeito
a uma propriedade do objeto. Como por exemplo: “a bola é azul”.
A partir daí, Kant emite quatro paradoxos, que caracterizarão o que ele conceitua
como Beleza: ela é universal sem conceito (uma vez que seu julgamento é relativo); ela
é uma necessidade subjetiva, que aparece como objetiva; trata-se de um prazer
desinteressado e é “a satisfação determinada pelo juízo de gosto é uma finalidade sem
fim” (KANT apud SUASSUNA, 2013, p. 41).
Em suma: a Beleza, de modo livre, é desinteressada, não se propõe assinalar uma
propriedade do objeto, se dá de modo objetivo por uma relação de prazer com o objeto
que se contempla.
Por fim, na via oposta de Kant e em uma crítica a este, temos o pensamento de
Hegel. Seu trabalho resgata uma perspectiva platônica da Beleza ao relacioná-la com a
Verdade e por pensá-la por um viés racionalista, bem como idealista extremado. No
entanto, sua concepção de Beleza, bem como de Verdade difere bastante da esboçada pelo
grego. Para Hegel, a beleza artística se sobressai à beleza natural – noção completamente
oposta a visão platônica -, uma vez que esta se trata de uma produção do espírito e na
produção deste espírito, no caráter de Ideia e é na Ideia (ou espírito Absoluto) que mora
a Verdade.
A arte é a manifestação sensível do espírito absoluto. Obviamente, não toda a
arte manifesta-o no mesmo grau. Algumas são limitadas por sua própria
natureza expressiva. Por outro lado, o fato mesmo de a arte estar circunscrita
ao sensível impõe a sua superação por outra manifestação do espírito com um
grau mais elevado de abstração (a saber, a filosofia).
(DUARTE [org.], 2012, p. 133)

2.2 A obra e o belo


Tendo uma dimensão geral do debate entorno da Estética, bem como das noções
de e belo e da arte, me proponho, agora, a realizar uma análise crítica sobre uma obra.
Ainda que não me identifique completamente com as noções aqui apresentadas sobre a
Beleza, dentre tais perspectivas a que eu acredito mais se aproximar daquilo que penso
sobre belo seja a perspectiva kantiana. Por isso, analisarei a obra Paratudo, do brasiliense
Dalton de Paula sob a ótica do filósofo alemão.
Para falar da obra é necessário conhecê-la. Paratudo é uma instalação que
integrou a exposição Histórias Afro-atlânticas, que esteve em cartaz neste ano, 2018, no
Museu de Arte Moderna de São Paulo, o MASP e Instituto Tomie Ohtake.
A obra do brasiliense, que data de 2015, é composta por 13 garrafas de cachaça
da marca homônima do título da obra. As garrafas, que possuem em seu rótulo um índio
norte-americano, trazem partes distintas da erva-da-Guiné. São pedaços de suas folhas,
bem como pedaços de sua raiz. Também conhecida como amansa-senhor, a planta era
utilizada pelos negros escravizados como forma de defesa contra os abusos dos senhores
de engenho. Em forma de pó, a planta era colocada, de modo fracionado, na comida
desses senhores, causando uma série de efeitos colaterais, e, em muitos casos, levando-
os à óbito. Mas além de ser utilizada como veneno, a erva-da-Guiné também possui
características curativas e utilizada com finalidades terapêuticas, usada largamente dentro
da umbanda.
Além das garrafas, outro elemento presente em Paratudo é a forca, que dá, a obra,
o caráter de armadilha, remetendo as torturas e as penas de morte dos períodos de Brasil
colônia e império, bem como o terror que ainda gera no imaginário de nossa sociedade.
Acredito ser inviável falar de belo nessa obra por uma perspectiva clássica. O
olhar de Kant, que não delineia uma forma de beleza, mas que propõe uma construção de
vinculada a ideia de subjetividade me parece dialogar com a experiência estética
provocada por esta obra. Em Paratudo, não me parece haver uma construção voltada para
um fim, mas para uma finalidade – em termos kantianos. Será principalmente a partir das
referências históricas apresentadas pelos materiais, a sua composição do que a sua
utilização que será possível se construir uma sensação sobre ela. Ela não é de fato uma
armadilha, não é uma forca, nem um conjunto de garrafas, nem apenas as poções que seus
frascos carregam. Ela é o conjunto e o diálogo desse conjunto.
O entendimento de tal composição enquanto obra de arte inclusive é uma
construção possível pelas contribuições kantianas no campo do estético, uma vez que o
seu pensamento será fundamental para deslocar a noção do que é arte. Vai fugir das
dicotomias de intelecto e sensível e trabalhar um entre.

3. CONCLUSÃO

Por meio do debate teórico percebe-se que a noção de estética se altera ao longo
da história. Do seu início grego, no qual estava apenas atrelada somente a um conceito de
filosofia da beleza, do belo, em que a beleza da natureza se sobressaia a beleza da arte, a
noção de estética foi sendo associada a um saber científico e abrangendo não somente a
noção de belo, mas a noção do disforme, do feio, da desordem do desprazer. Após Kant,
a estética vai saindo do lugar de filosofia da arte e do belo e se colocando enquanto
ciência.
Tais mudanças nas concepções estéticas influenciam diretamente na fruição da
arte, como se pode perceber por meio da obra aqui analisada. Conforme pontuei
anteriormente, Paratudo só pode ser entendida enquanto arte justamente por esse
deslocamento de perspectiva do que se trata a beleza, a arte, enfim a estética.

4. REFERÊNCIAS

DUARTE, Rodrigo (org.). O Belo Autônomo. Textos clássicos de estética. Belo


Horizonte: Ed. UFMG, 2012. Disponível em:
< http://www.exatas.ufpr.br/portal/degraf_adrianavaz/wp-
content/uploads/sites/17/2014/12/BAUMGARTEN_Est%C3%A9tica_Belo-
Autonomo.pdf> Acesso em: 3 de dezembro, 2018

SUASSUNA, Ariano. Iniciação à Estética. 12a. edição. Rio de Janeiro:José Olympio,


2013.

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