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O filme dirigido por Nicholas Hytner, com roteiro de Arthur Miller, escritor do
livro homônimo, trata do fatídico acontecimento em Salem, Massachusetts, quando
mais de 20 pessoas foram mortas acusadas de bruxaria, em sua maioria mulheres, no
ano de 1692.
Numa noite, um grupo de meninas e uma escrava negra chamada Tituba iniciam
um ritual de magia na floresta invocando o nome dos homens com quem desejavam se
casar. Entretanto, uma das jovens, a sobrinha do reverendo da cidade, faz um ritual de
magia negra, desejando a morte da esposa do homem que desejava. Os rituais são
interrompidos pelo reverendo, e as meninas fogem, entretanto duas delas ficam
paralisadas e, mesmo após serem levadas para casa, continuam sem exprimir qualquer
manifestação. Quando então um médico é chamado e as pessoas da cidade passam a
desconfiar e acusar outros de bruxaria.
Com medo da reação das pessoas da cidade, puritanos muito religiosos, as
meninas afirmam que Tituba praticou um ritual de magia negra e invocou demônios. A
mesma nega a acusação, entretanto após ser agredida e ameaçada afirma ter feito o
ritual e visto duas mulheres junto com o diabo, as duas parteiras da cidade. Essas
mulheres eram acusadas de atos de bruxaria que levaram a morte os filhos de Ann
Putnam ainda no parto, ficando a mesma extremamente perturbada pois sua única filha
sobrevivente era uma das meninas que estavam desacordadas. Por não terem confessado
a prática da bruxaria, as mulheres são condenadas a morte.
A partir de então, uma grande desconfiança paira sobre Salem, e todos os
acontecimentos estranhos, ainda que coincidência passam a ser tratados como bruxaria.
Se aproveitando da situação, os pais de algumas meninas, consideradas as vítimas do
crime de bruxaria, passam a usa-las para acusar seus inimigos e condena-los a morte em
uma acirrada disputa de terras, levando a morte dezenas de pessoas que se recusam a
confessar ter feito pactos satânicos.
Dois conceitos imagem podem ser destacados ao longo de todo o filme, o medo e
a religiosidade. A série de condenações se inicia pelo medo das meninas em serem
castigadas pelo ritual que iniciaram, numa sociedade ultraconservadora marcada pela
violência doméstica, onde mulheres eram comumente agredidas. Qualquer ato fora do
padrão de comportamento puritano era passível de condenação, pois atentava contra a
moral cristã e a própria religião, de forma que política e religião se confundem. O ritual
iniciado na floresta pelas meninas, ainda que inofensivo, era considerado uma grave
infração pela sociedade do local naquela época.
O tribunal montado para julgar os supostos crimes de bruxaria refletia o
maniqueísmo do pensamento da época. O juiz entende que por ser um crime invisível,
não há razão para a defesa produzir provas em favor do réu, apenas a vítima poderá
dizer o que de fato aconteceu. A única prova a ser produzida era a confissão, conduzida
pelo próprio juiz em julgamento. Se o réu confessar que estava em conluio com o
demônio, então seria livrado solto, entretanto se manter-se fiel a sua inocência, era
condenado a forca. Outro conceito imagem que pode ser destacado a partir disso é a
honra. O acusado que confessasse era obrigado a assinar o seu termo de confissão, o
qual era pregado nas portas da igreja para ser visto por toda população, tendo seu nome
para sempre maculado. Isso fica claro quando John Proctor, temendo por sua vida após
se acusado do crime de adultério, é obrigado a assinar sua confissão e a toma das mãos
dos acusadores alegando que única coisa que lhe restara era o seu nome e não o queria
ver manchado.
O filme nos leva a questionar os processos de produção de verdade. Na situação
narrada pelo filme, diversos motivos levaram a acusação criminal daquelas pessoas.
Medo, vingança, disputas de poder, comoção social. As pessoas acusadas não tinham
direito à ampla defesa e, conforme o modelo inquisitorial, a serem julgadas por um
julgador isento, uma vez que nesse modelo a figurado do julgador e do acusador se
misturam, podendo o juiz exercer ambas as funções.
Em nenhum momento houve a tentativa de se apurar o ocorrido por outras
perspectivas, e a sentença era dada ao início do julgamento, cabendo a defesa apenas
produzir forçadamente a confissão, única prova capaz de mudar a sentença. É difícil não
refletir sobre o processo judicial a partir da análise do evento histórico das Bruxas de
Salem. Ao observar o sistema jurídico brasileiro e os dados do sistema penitenciário,
percebemos um padrão de marginalização de pessoas de determinada classe social e cor
de pele, as quais muitas vezes não é dada o pleno direito de defesa e a simples notícia
do crime torna-se a sentença pela sociedade, antes mesmo da apreciação do judiciário,
perpetuando incidentes históricos.