You are on page 1of 30

Livro do Professor

Lite ratu ra
Volume 1
Dados Internacionais para Catalogação na Publicação (CIP)
(Maria Teresa A. Gonzati / CRB 9-1584 / Curitiba, PR, Brasil)
A474 Alves, Roberta Hernandes.
Literatura : ensino médio / Roberta Hernandes Alves ; ilustrações Daniel Klein, DKO Estúdio,
Guilherme Capriglioni – Curitiba : Positivo, 2015.
v. 1 : il.

Sistema Positivo de Ensino


ISBN 978-85-385-9353-9 (Livro do aluno)
ISBN 978-85-385-9354-6 (Livro do professor)

1. Literatura. 2. Ensino médio – Currículos. I. Klein, Daniel. II. DKO Estúdio. III. Capriglioni,
Guilherme. IV. Título.
CDD 373.33
©Editora Positivo Ltda., 2015

Presidente: Ruben Formighieri


Diretor-Geral: Emerson Walter dos Santos
Diretor Editorial: Joseph Razouk Junior
Gerente Editorial: Júlio Röcker Neto
Gerente de Arte e Iconografia: Cláudio Espósito Godoy
Autoria: Roberta Hernandes Alves
Supervisão Editorial: Jeferson Freitas
Edição de Conteúdo: Enilda Pacheco (Coord.) e Floresval Nunes Moreira Junior
Edição de Texto: Juliana Milani e Regina Souza
Revisão: Mariana Bordignon
Supervisão de Arte: Elvira Fogaça Cilka
Edição de Arte: Bettina Toedter Pospissil
Projeto Gráfico: YAN Comunicação
Ícones: ©Shutterstock/ericlefrancais, ©Shutterstock/Goritza, ©Shutterstock/Lightspring, ©Shutterstock/Chalermpol, ©Shutterstock/
Macrovector, ©Shutterstock/Jojje, ©Shutterstock/Archiwiz, ©Shutterstock/PerseoMedusa e ©Shutterstock/Thomas Bethge
Imagens de abertura: ©Shutterstock/Ollyy e ©Shutterstock/Samuel Borges Photography
Editoração: Flávia Vianna
Ilustrações: Daniel Klein, DKO Estúdio e Guilherme Capriglioni
Pesquisa Iconográfica: Janine Perucci (Supervisão) e Susan Oliveira
Engenharia de Produto: Solange Szabelski Druszcz

Produção
Editora Positivo Ltda.
Rua Major Heitor Guimarães, 174 – Seminário
80440-120 – Curitiba – PR
Tel.: (0xx41) 3312-3500
Site: www.editorapositivo.com.br

Impressão e acabamento
Gráfica e Editora Posigraf Ltda.
Rua Senador Accioly Filho, 431/500 – CIC
81310-000 – Curitiba – PR
Tel.: (0xx41) 3212-5451
E-mail: posigraf@positivo.com.br
2018

Contato
editora.spe@positivo.com.br

Todos os direitos reservados à Editora Positivo Ltda.


Sumário
Acesse o livro digital e
conheça os objetos digitais
e slides deste volume.

01 Introdução ao estudo da literatura .............. 4


Conceito de literatura ...................................................................................... 7
Linguagem literária ......................................................................................... 9
Literariedade I ................................................................................................. 12
ƒ Texto literário e texto não literário ........................................................................................................... 12
Literariedade II ................................................................................................ 14
ƒ Verossimilhança ....................................................................................................................................... 14
Literariedade III ............................................................................................... 16
ƒ Plurissignificação ..................................................................................................................................... 16
Origem da literatura ........................................................................................ 20
ƒ Passagem da oralidade para a escrita ....................................................................................................... 20
Oralidade nas literaturas brasileira e angolana ................................................ 21
Funções da literatura ....................................................................................... 21

02 Verso e prosa ............................................. 31


Verso e prosa ................................................................................................... 33
ƒ Poema em prosa ...................................................................................................................................... 34
Gêneros poéticos ............................................................................................. 41
ƒ Gênero lírico ............................................................................................................................................. 41
ƒ Gênero épico ............................................................................................................................................ 42
ƒ Gênero dramático ..................................................................................................................................... 43
Prosa de ficção ................................................................................................. 47
01
u çã o ao es tudo
Introd
da literatura

Ponto de partida
1

11.. Você já leu algum dos livros representados na imagem? Quais? Que outros livros você leu? De quais você mais
gostou?
2. Para você, a leitura é uma atividade prazerosa ou desagradável?
3. Na sua opinião, a leitura é sempre um ato individual ou pode ser coletivo?
4. Existe literatura sem ser na forma escrita?
5. Qualquer texto pode ser chamado de literário?

4
Objetivos da unidade:
ƒ conhecer aspectos da leitura literária;
a;
ƒ ampliar o repertório literário;
ƒ conhecer e discutir as principais características da linguagem literária;
ƒ discutir conceitos como o de verossimilhança e plurissignificação a fim de compreender
o discurso literário.

Lendo a literatura
Você vai ler agora uma crônica de Rubem Braga cujo tema é a criação de um texto literário.
2 Sugestão de encaminhamento da leitura.
Meu ideal seria escrever...
Meu ideal seria escrever uma história tão engraçada que aquela moça que está doente naquela casa cin-
zenta quando lesse minha história no jornal risse, risse tanto que chegasse a chorar e dissesse – “ai meu Deus,
que história mais engraçada!”. E então a contasse para a cozinheira e telefonasse para duas ou três amigas para
contar a história; e todos a quem ela contasse rissem muito e ficassem alegremente espantados de vê-la tão
alegre. Ah, que minha história fosse como um raio de sol, irresistivelmente louro, quente, vivo, em sua vida de
moça reclusa, enlutada, doente. Que ela mesma ficasse admirada ouvindo o próprio riso, e depois repetisse
para si própria – “mas essa história é mesmo muito engraçada!”.
Que um casal que estivesse em casa mal-humorado, o marido bastante aborrecido com a mulher, a mulher
bastante irritada com o marido, que esse casal também fosse atingido pela minha
história. O marido a leria e começaria a rir, o que aumentaria a irritação da
mulher. Mas depois que esta, apesar de sua má vontade, tomasse conhe-
cimento da história, ela também risse muito, e ficassem os dois rindo
DKO Estúdio. 2015. Digital.

sem poder olhar um para o outro sem rir mais; e que um, ouvindo
aquele riso do outro, se lembrasse do alegre tempo de namoro, e
reencontrassem os dois a alegria perdida de estarem juntos.
Que nas cadeias, nos hospitais, em todas as salas de espera a
minha história chegasse – e tão fascinante de graça, tão irresis-
tível, tão colorida e tão pura que todos limpassem seu coração
com lágrimas de alegria [...]. E que assim todos tratassem me-
lhor seus empregados, seus dependentes e seus semelhantes
em alegre e espontânea homenagem à minha história.
E que ela aos poucos se espalhasse pelo mundo e
fosse contada de mil maneiras, e fosse atribuída a um
persa, na Nigéria, a um australiano, em Dublin, a um
japonês, em Chicago – mas que em todas as línguas
ela guardasse a sua frescura, a sua pureza, o seu en-
canto surpreendente; e que no fundo de uma aldeia
da China, um chinês muito pobre, muito sábio e
muito velho dissesse: “Nunca ouvi uma história

ideal: a perfeição a ser atingida.


reclusa: recolhida, presa.
enlutada: entristecida.

5
assim tão engraçada e tão boa em toda a minha vida; valeu a pena ter vivido até hoje para ouvi-la; essa história
não pode ter sido inventada por nenhum homem, foi com certeza algum anjo tagarela que a contou aos ouvi-
dos de um santo que dormia, e que ele pensou que já estivesse morto; sim, deve ser uma história do céu que
se filtrou por acaso até nosso conhecimento; é divina”.
E quando todos me perguntassem – “mas de onde é que você tirou essa história?” – eu responderia que ela
não é minha, que eu a ouvi por acaso na rua, de um desconhecido que a contava a outro desconhecido, e que
por sinal começara a contar assim: “Ontem ouvi um sujeito contar uma história...”.
E eu esconderia completamente a humilde verdade: que eu inventei toda a minha história em um só segun-
do, quando pensei na tristeza daquela moça que está doente, que sempre está doenteente e sempre está de luto e
sozinha naquela pequena casa cinzenta de meu bairro.

Daniel
BRAGA, Rubem. Meu ideal seria escrever... In: SANTOS, Joaquim Ferreira dos.
As cem melhores crônicas brasileiras. Rio de Janeiro: Objetiva, 2007. p. 94-95.

Klein.
2015. D
Rubem Braga nasceu em Cachoeiro de Itapemirim, Espírito Santo, em 1913.  Trabalhouu em

igital.
eiros.
jornais e também para a televisão. É considerado um dos mais importantes cronistas brasileiros.
Morreu em 1990.

1. O narrador afirma no início da crônica que tem um 4. Muitos autores afirmam que baseiam seus
seeus escritos em
ideal: escrever um texto que alegrasse as pessoas. Ele histórias ouvidas nas ruas, em ônibus, salas de espe-
“escolhe” como primeira leitora uma moça doente e ra, etc. De acordo com a crônica, o narrador considera
triste. Qual o motivo, em sua opinião, dessa escolha? esse um recurso válido? Justifique sua resposta com
Pessoal. Sugestão: A escolha da moça doente e triste está rela-
uma passagem do texto.
Sim, o narrador afirma que, quando perguntassem a ele de onde
cionada ao poder da literatura (nesse caso, a história inventada tirou sua história, responderia: “ela não é minha, que eu a ouvi
por acaso na rua, de um desconhecido que a contava a outro
pelo narrador) de modificar o comportamento das pessoas, desconhecido, e que por sinal começara a contar assim: ‘Ontem
ouvi um sujeito contar uma história...’”.
por exemplo, transformando a tristeza em alegria.
5. Qual seria a “humilde verdade”, indicada pelo narrador
2. Que características o narrador gostaria que seu texto no último parágrafo do texto?
tivesse?
O fato de que a história tinha sido inventada por ele mesmo,
O narrador gostaria que seu texto fosse como um raio de sol,
inspirado pela jovem triste.
irresistivelmente louro, quente e vivo.
6. Com base em sua resposta para a questão anterior,
explique por que essa seria uma verdade “humilde”.
Trata-se de uma questão de modéstia. O narrador acaba va-
3. “Que nas cadeias, nos hospitais, em todas as salas de lorizando mais um texto elaborado com base em uma história
espera a minha história chegasse – e tão fascinante de contada oralmente por outra pessoa, e recriada por ele, do que
graça, tão irresistível, tão colorida e tão pura que todos um texto de sua própria autoria.
limpassem seu coração com lágrimas de alegria [...]”.
7. Os textos literários oferecem a possibilidade de o leitor
Qual relação podemos estabelecer entre os espaços
entrar em contato com diferentes realidades e visões
indicados nesse parágrafo?
de mundo distintas. Isso é possível na crônica lida?
Todos esses espaços estão relacionados à tristeza e ao sofri- Justifique sua resposta.
mento, ou seja, todos poderiam ser transformados pela história Sim. A crônica exprime a visão de mundo de um narrador que

inventada pelo narrador. deseja criar um texto literário que traga alegria e felicidade a

quem o ler, ou seja, que faça bem às pessoas.

6 Volume 1
Olhar literário
Conceito de literatura 3 Sugestão de encaminhamento para verificar a compreensão que os alunos
têm dos conceitos de língua e de linguagem.
A literatura é uma forma de expressão que estabelece um diálogo estético com a realidade. Com base no modo
com que o artista trabalha a linguagem, o texto literário possibilita ao leitor entender o real de diferentes formas, am-
pliando as possibilidades de o leitor perceber, pensar e interpretar fatos de seu próprio cotidiano. Faz também com
que ele entre em contato com outras realidades, fruto da visão e da criação do autor. Assim, a literatura rompe com os
modos estabelecidos por meio dos quais as pessoas compreendem o mundo ao seu redor. Nesse sentido, o texto lite-
rário não propõe uma cópia das coisas vistas, vividas ou sentidas, um retrato fiel e já sabido da realidade conhecida pelo
leitor, mas sim uma nova visão dela. A literatura sempre desperta a reflexão, uma vez que leva o leitor a reconsiderar
atitudes e conceitos, ou seja, repensar o senso comum.
Desse modo, o texto literário faz com que o leitor entre em contato com situações que dificilmente vivenciaria. A
leitura de uma narrativa ou de um poema, por exemplo, pode não somente ampliar seu conhecimento de mundo, mas
também fazer com que se imagine em outra vida, autônoma, independente da experiência de realidade de onde se
encontra e por onde tenha passado. Graças à criatividade do artista e também à imaginação do leitor, é possível ultra-
passar os fatos objetivos, os limites sociais, os conhecimentos históricos, as normas científicas que limitam a existência
humana. O contato com a literatura faz o leitor especular, sonhar, divertir-se, emocionar-se.
O escritor cria ou recria um mundo em que as realidades não são necessariamente mensuráveis pelos mesmos
padrões das realidades do mundo concreto. Mas a literatura não é somente devaneio, abstração. A linguagem literária
provém da linguagem social, da fala dos seres humanos que vivem em determinada circunstância histórica. Tanto o
autor quanto o leitor são seres situados em um tempo e um espaço. São seres que têm valores, crenças e visões de
mundo, que se comunicam e se expressam utilizando a palavra de modo característico.
A leitura de um texto literário é sempre desafiadora pelas infinitas possibilidades de utilizar a língua e a linguagem.
Pode haver uma diferença de tempo, ou seja, o autor escreveu em uma época muito distante da de seu leitor, ou em
um lugar com uma cultura muito diferente. Mesmo assim, o texto comunica algo, provoca uma reflexão, estimula
sensações e sentimentos. Um texto literário, portanto, pode ser lido em contextos bem diversos daqueles em que foi
criado e pode ter valor para o leitor, independentemente do meio em que ele esteja inserido. Seu sentido não tem
prazo de validade. A literatura estará sempre esperando um próximo leitor que lhe renove os significados, que leia o
que já foi lido de maneira diferente.
©Shutterstock/Sergey Nivens

Sugestão de atividade: questão 1 da seção Hora de estudo.


senso comum: opinião partilhada por grande parte das pessoas de uma comunidade ou de uma sociedade.

Literatura 7
Lendo a literatura
Leia com atenção os dois poemas a seguir e responda às questões propostas.
Texto 1

Daniel
Os poemas

Klein.
Os poemas são pássaros que chegam

2015. D
não se sabe de onde e pousam

igital.
no livro que lês.
Quando fechas o livro, eles alçam voo
como de um alçapão.
Eles não têm pouso
nem porto Mario Quintana nasceu em Alegrete, no
alimentam-se um instante em cada par de mãos Rio Grande do Sul, em 1906. Além de
e partem. escritor, trabalhou como tradutor e jor-
E olhas, então, essas tuas mãos vazias, nalista. Sua obra é marcada pelo olhar
no maravilhoso espanto de saberes voltado para o cotidiano e para as coisas
que o alimento deles já estava em ti... simples da vida, utilizando, em muitos de
QUINTANA, Mario. Antologia poética. Porto Alegre: L&PM, 1999. p. 104.
seus poemas, o humor e a ironia. Morreu
em 1994.
Texto 2

O poema
Um poema como um gole d’água bebido no escuro.
Como um pobre animal palpitando ferido.
Como pequenina moeda de prata perdida para sempre na floresta noturna.
Um poema sem outra angústia que a sua misteriosa condição de poema.
Triste.
Solitário.
Único.
Ferido de mortal beleza.

QUINTANA, Mario. Antologia poética. Porto Alegre: L&PM, 1999. p. 30.

a) Em “Os poemas”, há uma definição para o poema: “Os poemas são pássaros que chegam / não se sabe de onde e
pousam / no livro que lês”. Como você interpreta esses versos?
Pessoal. A interpretação deve estar relacionada à ideia de que os poemas seriam um tipo de escrita espontânea, que viriam de um lugar

desconhecido e se fixariam no livro do leitor, ou seja, se apresentariam a ele para a leitura/decifração.

b) Explique o que seria o “alimento” dos poemas, indicado no verso final do texto 1.
O alimento dos poemas seria a leitura, o leitor. Ou seja, a cada vez que um poema é lido, ele ganha vida e novos sentidos. Já um poema

que não é lido foge, vai buscar alimento em outro lugar, alguém para lê-lo e interpretá-lo.

alçapão: armadilha.

8 Volume 1
c) Na sequência desse mesmo poema, o eu lírico afirma f) Apesar de toda a angústia que o poema tem em si, ele
que, quando o leitor fecha o livro, os poemas voam, também carrega uma “mortal beleza”. Com base na
fogem. Por que isso ocorreria? leitura do poema como um todo, a que se deve essa
beleza?
Porque os poemas só teriam sentido quando lidos, decifrados
pelo leitor. Quando não há alguém lendo, o poema perde o seu Pessoal. A ideia é que o fato de cada poema ser único, mesmo
sentido e é como se deixasse de existir.
4 Sugestão para verificar se os alunos compreendem a dife- triste e solitário, dá a ele certa beleza, ainda que venha do
rença entre autor e eu lírico.
trabalho solitário e sofrido do poeta.
d) Nos três primeiros versos do texto 2, o eu lírico carac-
teriza o poema. O que os termos usados para se referir g) Como você estudou, a literatura pressupõe um leitor
a esse texto têm em comum? que se relaciona com o texto lido e renova os significa-
dos da obra literária cada vez que a lê. De que forma
São imagens que carregam em si certa dose de mistério, em
essa ideia é trabalhada nos textos 1 e 2? Explique com
um ambiente sombrio, noturno: a ideia de escuro, de um animal um exemplo.
Pessoal. Especialmente no texto 1, que apresenta a ideia de que
ferido, de uma floresta noturna.
o poema, cada vez que é lido, encontra seu alimento em quem

o lê, aparece simbolicamente a concepção de que é o leitor que,

com sua leitura, cria novos significados para o poema, dá vida


e) No quarto verso do texto 2, como é justificada a angús-
tia presente nessas imagens? ao texto. No texto 2, essas ideias estão implícitas na noção de

Pelo fato de que os poemas trazem em si uma angústia derivada que o poema é um texto cifrado, presente nas imagens do gole de

simplesmente de sua própria condição de poemas. água bebido no escuro, da floresta noturna, etc. Cabe ao leitor

significar e interpretar cada uma dessas imagens.

Olhar literário
Linguagem literária
A literatura é a arte da palavra. A matéria-prima da literatura, isto é, o elemento primordial de uma obra literária, é
a linguagem e a maneira como ela é utilizada para contar uma história. Um escritor, durante seu momento de criação,
busca nas possibilidades da língua as construções que esteticamente melhor compõem seu texto. Note, por exemplo,
quantas histórias de amor existem; um dos fatores que as diferenciam é o modo como cada autor constrói seus per-
sonagens, de que ponto escolhe começar a sua narrativa, o arranjo que faz com as palavras, o qual cria imagens que
podem ser belas, tristes, frustrantes, etc. Na produção literária, é possível tanto usar as palavras já existentes quanto criar
outras palavras ou mesmo outras relações entre elas de acordo com a inventividade do autor.
A linguagem tem inúmeras finalidades: informar, comunicar, convencer, argumentar, apresentar, contradizer, fun-
damentar, seduzir, etc. A literatura também pode apresentar esses objetivos, sem, porém, ficar focada em apenas um
deles. Assim, é possível encontrar várias formas de interpretação e vários sentidos em um único texto literário, o que
pode ser inadequado em outros contextos de uso da linguagem.
Na linguagem literária, há o predomínio da criação, da constante invenção de meios de expressão e/ou da nova
utilização dos recursos linguísticos disponíveis em uma determinada época.

Sugestão de atividades: questões 4, 13 e 14 da seção Hora de estudo.


Literatura 9
Lendo a literatura
Leia os textos a seguir. Eles apresentam um mesmo assunto, mas são escritos de modo bem diverso. Finalizada a
leitura, responda às questões propostas.
Texto 1

Poema tirado de uma notícia de jornal


João Gostoso era carregador de feira livre e morava no morro da Babilônia
[num barracão sem número
Uma noite ele chegou no bar Vinte de Novembro
Bebeu
Cantou
Dançou
Depois se atirou na lagoa Rodrigo de Freitas e morreu afogado.
BANDEIRA, Manuel. Estrela da vida inteira. 12. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1986. p. 107.

Texto 2

QUASE 7 MILHÕES DE FAMÍLIAS VIVEM


EM MORADIAS PRECÁRIAS
Estudo que avaliou situação em todas as cidades brasileiras mostra que nenhum
Estado escapa ao índice negativo de moradia, concentrado em áreas urbanas no país
AGÊNCIA GLOBO

“Olho para as casas ao lado, de Censo 2010. O estudo, que pela pri- Nordeste e no Sudeste. Proporcio-
alvenaria, e sonho em ter um lar meira vez analisou todas as cidades nalmente, Manaus é a capital com
assim para meus filhos”, diz Marli do país, apontou déficit de 6 940 maior déficit (23% dos domicílios
Medeiros, de 36 anos. Desemprega- milhões de unidades, sendo 85% na enquadrados em uma das catego-
da, ela vive em Manaus, no Amazo- área urbana. Para os pesquisadores, rias de déficit habitacional). Entre
nas, com o marido e os três filhos. o conceito de déficit não significa os estados, o problema é maior no
Divide com eles a pequena casa de falta de casas, mas sim más condi- Maranhão (27% das habitações).
paredes de madeira, tomadas por ções, o que inclui desde moradias Na pesquisa, quatro componen-
cupins. A moradia da família é um precárias até aluguéis altos demais. tes somados formam o cálculo do
dos quase sete milhões de domicí- E uma política pública única não déficit habitacional. São eles: do-
lios brasileiros, ou 12,1% do total, resolverá a questão, já que existem micílios precários, isto é, os impro-
que se enquadram em uma das muitas diferenças entre regiões, es- visados (imóvel comercial, pontes,
quatro categorias do déficit habita- tados, áreas metropolitanas e até viadutos) e rústicos (palha e madei-
cional. Em 2010, dos 5 565 muni- entre as não metropolitanas. ra aproveitada); coabitação familiar,
cípios do país, todos tinham algum No Norte do país, no Maranhão quando há mais de uma família por
tipo de déficit. Desses, 28,5% – ou e no Piauí, por exemplo, os domi- domicílio; ônus excessivo com alu-
1 435 cidades – estavam acima da cílios precários são a maioria. Nos guel urbano, quando a família tem
média nacional. demais estados do Nordeste e nas renda de até três salários mínimos
Os dados são da pesquisa Défi- regiões Sul, Sudeste e Centro-Oes- e gasta 30% ou mais com aluguel;
cit Habitacional Municipal no Brasil te, a questão principal é o ônus ex- e ainda o adensamento excessivo
2010, da Fundação João Pinheiro, cessivo com o aluguel. Além disso, de domicílios alugados, que se ca-
em parceria com o Ministério das o estudo concluiu que 70% do dé- racteriza quando há acima de três
Cidades, a partir dos números do ficit nacional estão concentrados no moradores por dormitório.

Disponível em: <http://www.folhadoestado.com.br/2014/03/09/quase-7-milhoes-de-familias-vivem-em-moradias-precarias/#.U-9xN_ldV1Y>.


Acesso em: 16 ago. 2014.

10 Volume 1
1. No poema, como é caracterizado o personagem João 4. O texto 2 é uma notícia que trata de um tema social:
Gostoso? a defasagem de moradias nos centros urbanos e a
João é identificado por seu apelido, Gostoso, e não por seu nome
consequente existência de muitas habitações precá-
rias. De que modo é possível relacionar essa notícia
de registro. Mora em um espaço marginal da sociedade, o morro ao poema lido?

da Babilônia, em uma moradia precária, o que se confirma tanto No poema, o personagem João Gostoso exemplifica a questão

pelo lugar onde se situa, o morro, quanto pelo fato de não ter da moradia precária, já que vive no morro, em um barracão sem

número. Além disso, João tem uma ocupação informal, sem número, ou seja, uma habitação em más condições.

carteira de trabalho, é um carregador de feira livre. 5. Os textos 1 e 2 têm funções diferentes. Considerando
essa informação, responda aos itens a seguir, justifi-
2. Em “Poema tirado de uma notícia de jornal”, dois es- cando brevemente sua resposta.
paços extremos são destacados na trajetória de João
a) Qual a função da notícia?
Gostoso para a morte: o morro da Babilônia (lugar alto,
mas identificado com a camada pobre da população) A função da notícia é informar. No texto 2, os dados são
e a lagoa Rodrigo de Freitas (de localização baixa, apresentados para indicar a gravidade do problema da de-
fasagem de moradias, como a informação de que o maior
mas associado à camada social rica da população). problema entre os estados brasileiros ocorre no Maranhão,
Considerando o percurso do personagem entre esses que concentra 27% do déficit nacional.
extremos, como pode ser interpretado o bar Vinte de
Novembro?
Pessoal. Sugestão: O bar Vinte de Novembro desempenha o b) Qual a função do texto literário?
papel de ponto intermediário entre o alto do morro e o baixo da A função do texto literário é entreter, levar à reflexão. No
texto 1, a construção do personagem João Gostoso é traba-
lagoa Rodrigo de Freitas. Simboliza o ponto de passagem da vida lhada para emocionar o leitor, levando-o à reflexão sobre a
vida desse personagem e a aparente aleatoriedade de sua
para a morte. morte.

3. Assinale V, para as afirmativas verdadeiras, ou F, para


as falsas, e justifique suas respostas. 5 Relação entre a
atividade 3 e o conteúdo a ser trabalhado em seguida (literariedade). 6. Em “Poema tirado de uma notícia de jornal”, o título re-
a) ( F ) Um dos elementos textuais que permitem ao vela uma relação estreita com um jornal. Partindo dessa
leitor reconhecer o poema lido como um texto li- constatação, que informações Manuel Bandeira pode
terário é seu tema: a morte de um sujeito pobre. ter retirado da suposta notícia que lhe serviu de pretex-
to para a escrita do poema? E que outras informações,
Justificativa: O tema da morte pode aparecer também típicas de uma notícia, ele pode ter desprezado?
em textos que não sejam literários. As informações possivelmente retiradas de uma notícia são
mais circunstanciais: o acontecimento em si, onde morava
João Gostoso, seu trabalho, onde esteve antes de morrer e
em que lugar isso ocorreu. Já uma notícia apresentaria outros
b) ( F ) O texto de Manuel Bandeira não é necessa- detalhes a respeito das pessoas envolvidas na situação, como
riamente um poema, porque, como o próprio o que as teria motivado a agir, etc., e isso foi desprezado na
escrita do poema.
título diz, foi tirado de uma notícia de jornal.
6 Informações sobre a construção do poema.
Justificativa: O fato de a situação exposta no poema ter sido
7. Troque ideias com o professor e com os colegas: o que
“tirada” de uma notícia não determina se o texto é ou não
faz com que “Poema retirado de uma notícia de jornal”
um poema. seja um texto literário? Trata-se de um texto literário tanto
por sua forma (escrita em versos) quanto pelo fato de não apre-
sentar o caráter informativo da notícia, mas, sim, o arranjo estéti-
co das palavras e o convite à reflexão.

Literatura 11
Olhar literário
Literariedade I
No início do século XX, um grupo de estudiosos da literatura tentou identificar alguns elementos que estivessem
presentes em todas as obras literárias, independentemente do escritor, de sua nacionalidade e do período em que
foram escritas. Esses teóricos buscaram uma propriedade ou característica que permitisse ao leitor reconhecer e iden-
tificar uma obra literária. Essa característica foi denominada literariedade.
Apesar de alguns estudiosos defenderem que é possível definir o que confere literariedade a um texto, há outros
que não acreditam nessa definição, afirmando que não existe algo fixo que possa ser percebido em todos os textos
literários.
A discussão sobre a existência ou não de um fator que estaria presente em toda escrita literária nos permite
pensar nas seguintes questões: Quais os limites de um texto literário? Ou, ainda, o que faz um texto ser definido
como literatura? Seria o fato de ele usar imagens, metáforas? Ou o tratamento dado à linguagem, criando palavras e
atribuindo ao uso das palavras cotidianas novos e surpreendentes sentidos? Seria a ficcionalização, ou seja, a criação
de histórias usando personagens e enredos que podem ou não dialogar com o cotidiano? É importante lembrar
que alguns conceitos devem ser estudados para que o leitor possa desenvolver critérios para pensar o que é ou não
literatura. Desses conceitos, três serão abordados a seguir: as diferenças entre ficção e não ficção, a verossimilhança
e a plurissignificação.

Texto literário e texto não literário


Muitas vezes, o leitor pode ter dificuldade para identificar se determinado texto é literário. Textos não literários são,
em geral, instrumentos de situações de interação específicas e, por isso, pedem do leitor uma atitude interpretativa
diferente daquela que temos diante de textos literários.
Um texto típico do cotidiano, por exemplo, um recado deixado pela mãe para seu filho dizendo que saiu e que
chegará no final da tarde, pode ser compreendido considerando-se o contexto em que vivem mãe e filho. A notícia de
um jornal, para citar outro exemplo de texto presente no dia a dia das pessoas, tem sentido para seu leitor quando ele
considera o contexto dos fatos que envolvem o assunto dessa notícia. Se não estiver a par do problema abordado pela
notícia em questão, o leitor terá dificuldade para compreender sobre o que se fala.
Outro ponto que diferencia o discurso não literário do literário: o primeiro tem pretensão de ser claro, de comuni-
car algo que, geralmente, deve ser compreendido de uma forma específica; já o segundo, por ser um objeto estético,
representa novas realidades, algumas parecidas com a realidade concreta, outras bem diferentes, frutos da imaginação
do autor. Desse modo, as obras literárias carregam possibilidades de significação e sentidos diversos para quem as lê.
A literatura cria imagens, resgata lembranças e provoca sensações e sentimentos.
Sugestão de atividades: questões 2 e 3 da seção Hora de estudo.
©Shutterstock/Paket

12
Lendo a literatura
Leia agora o início da obra A metamorfose, de Franz Kafka. Depois, responda às questões propostas.

Quando certa manhã Gregor Samsa acordou de sonhos intranquilos, encontrou-se em sua cama
metamorfoseado num inseto monstruoso. Estava deitado sobre suas costas duras como couraça e, ao
levantar um pouco a cabeça, viu seu ventre abaulado, marrom, dividido por nervuras arqueadas, no
topo de qual a coberta, prestes a deslizar de vez, ainda mal se sustinha. Suas numerosas pernas, lasti-
mavelmente finas em comparação com o volume do resto do corpo, tremulavam desamparadas diante
dos seus olhos.
– O que aconteceu comigo? – pensou.
Não era um sonho. Seu quarto, um autêntico quarto humano, só que um pouco pequeno demais,
permanecia calmo entre as quatro paredes bem conhecidas. [...]

KAFKA, Franz. A metamorfose. Tradução e posfácio de Modesto Carone. São Paulo: Companhia das Letras, 1997. p. 7.

1. Nesse trecho do romance A metamorfose, há situações comuns do cotidiano? Quais?


Sim. O fato de um jovem acordar em seu quarto.

2. Nesse trecho, há situações que não poderiam ocorrer na realidade? Quais?


Sim, o fato de Gregor Samsa ter se transformado em um inseto monstruoso.

3. O que levou o personagem a concluir que não se tratava de um sonho?


Ele percebeu que estava em seu próprio quarto e que tudo no ambiente estava como ele conhecia.

4. Se você lesse uma notícia que contasse a história de um homem que se transformou em um inseto, você certamente
não acreditaria nela e provavelmente daria pouca credibilidade ao jornal que a publicou. Contudo, ao ler essa mesma
situação no romance de Kafka, você sentiu desconfiança em relação ao texto? Por quê?
Pessoal. O esperado é que os alunos respondam que não desconfiaram do texto por se tratar de uma ficção, na qual fatos como esse

são aceitáveis. Se houver respostas diferentes, indique aos alunos textos que eles provavelmente já tenham lido em que esse pacto de

confiança é requisitado, por exemplo, obras em que deuses gregos atuam na sociedade contemporânea.

5. Ao iniciar a leitura de um texto como esse e perceber que ele narra aconte-
Daniel

cimentos irreais e impossíveis, qual deve ser a postura do leitor?


Klein.
2015. D

Pessoal. O esperado é que, com base em seus conhecimentos sobre histórias que tra-
balham com elementos fantásticos, os alunos admitam esses elementos como pos-
igital.

síveis na literatura e, assim, continuem sua leitura movidos pela curiosidade sobre o
desfecho da história.

couraça: armadura, revestimento externo do corpo de alguns tipos de inseto. Franz Kafka
K fk nasceu em Praga,
P
abaulado: que tem a forma de um baú. capital da atual República Tcheca,
nervuras: ramificações nervosas presentes nas asas de insetos. em 1883. É considerado um dos
arqueadas: encurvadas.
mais importantes escritores do
sustinha: sustentava.
lastimavelmente: de maneira lastimável, digno de dó. século XX. Morreu em 1924.
autêntico: verdadeiro.

Literatura 13
Olhar literário
Literariedade II
Verossimilhança
A verossimilhança pode ser entendida, em uma obra literária ou artística, como aquilo que, de alguma forma, faz
referência à realidade concreta. Produto da invenção humana, um texto literário pode fazer referências diretas ou indi-
retas a fatos históricos ou rotineiros ou a lugares e comunidades que geograficamente existem ou existiram. Ao fazer
isso, a literatura não apenas busca reproduzir essa realidade, mas sim recriá-la, transformando-a em ficção.
Além disso, a verossimilhança verifica-se também quando o texto apresenta uma lógica própria, ou seja, mesmo
que os elementos imaginosos ou fantásticos (personagens, espaços, fatos, etc.) não sejam compatíveis com a realidade
concreta, a relação que se estabelece entre eles deve ser coerente.
Essa coerência interna possibilita que, no texto literário, nada pareça “solto” ou improvável e assim se instaure um
“pacto” entre o leitor e o texto.
Pense em uma narrativa de ficção científica, por exemplo. Nela, a atmosfera de realidade é rompida, em razão da in-
trodução de elementos ou fatos inusitados, muitas vezes baseados em descobertas científicas ou em projeções do que
pode ser descoberto ou desenvolvido no futuro. Porém, com o pacto de leitura estabelecido (a aceitação, por parte do
leitor, de que se trata de uma narrativa de ficção), tais fatos são aceitos como verossímeis, ou seja, possíveis e prováveis
dentro daquele universo literário específico.
Um texto literário, portanto, praticamente não tem limites quanto ao seu potencial de invenção. O fundamental,
contudo, é que sempre se desenvolva coerentemente, ou seja, que a sequência de situações que expõe faça sentido
com o todo do texto e que se estabeleça o pacto de leitura.
Sugestão de atividades: questões 5, 6 e 15 da seção Hora de estudo.

Lendo a literatura
Leia o texto a seguir e responda ao que se pede.

Tema para uma tapeçaria


O general só tem oitenta homens e o inimigo cinco mil. Em sua tapeçaria: é uma forma artística antiga de
e
tenda, o general blasfema e chora. Então escreve uma ordem do representação de cenas, pessoas, objetos
animais em uma superfície tecida em lã. Era
dia inspirada, que pombos-correio espalham sobre o acampamento
utilizada como um objeto de decoração de
inimigo. Duzentos infantes passam-se para o general. Segue-se uma
ambientes. No Ocidente, embora fosse um
escaramuça que o general vence facilmente, e dois regimentos se pas-
produto de ornamento fabricado por gregos
sam para o seu lado. Três dias depois o inimigo tem somente oitenta e romanos, foi no período do Renascimento
e
homens e o general cinco mil. Então o general escreve outra ordem que se tornou amplamente difundido. Entr
seus temas preferenciais estavam a repre-
sentação de cenas de batalhas e de lendas
tenda: barraca. relacionadas a confrontos entre grupos de
blasfema: insulta, xinga. cavaleiros.
ordem do dia: documento que contém todas as tarefas planejadas para o dia.
infantes: soldados da infantaria.
escaramuça: conflito, luta.

14 Volume 1
do dia e setenta e nove homens passam-se para seu
lado. Só resta um inimigo, cercado pelo exército do
general que aguarda em silêncio. Transcorre a noite e
o inimigo não passou para o seu lado. O general blas-
fema e chora em sua tenda. Ao amanhecer o inimigo
desembainha lentamente a espada e avança em di-
reção à tenda do general. Entra e olha para ele. O
exército do general se dispersa. Sai o sol.

CORTÁZAR, Julio. Tema para uma tapeçaria. In: ______. Histórias


de Cronópios e de Famas. Tradução de Gloria Rodríguez. 4. ed. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 1983. p. 84.

DKO Estúdio. 2015. Digital.


©Heirs of Julio Cortázar, 2015
Daniel Klei
n. 2015. D

Julio Cortázar nasceu na embaixada da Argentina em Bruxelas, em 1914, e viveu na Bélgica


igital.

até os quatro anos de idade, quando se mudou para a Argentina. Aos 37 anos, mudou-se
para Paris e lá permaneceu até sua morte, em 1984. É considerado um dos mais importantes
escritores latino-americanos do século XX.

1. Na narrativa de Julio Cortázar, o general inicialmente se encontra em desvantagem numérica para a batalha contra o
exército inimigo. Que estratégia ele utiliza para reverter essa situação?
O general escreve uma ordem do dia, a qual é espalhada pelos pombos-correio sobre o acampamento adversário.

2. Em sua opinião, o que poderia estar escrito na ordem do dia elaborada pelo general?
Pessoal. O esperado é que os alunos indiquem argumentos que poderiam ter convencido os inimigos a mudar de lado, tais como “juntos

podemos acabar com a guerra, separados ela não terminará nunca”, ou “juntem-se ao meu exército e terão muitas vantagens”, etc.

3. O conto termina com a frase “Sai o sol.”, que pode ser interpretada de várias maneiras. Em sua opinião, qual das
possibilidades a seguir interpreta mais adequadamente essa frase final do conto?
a) A chegada do sol pode estar relacionada à entrada do inimigo na tenda e à dispersão do exército do general: o sol
significa que a guerra acabou.
b) O texto apresenta uma moral no fim da história: mesmo nas dificuldades (o possível abandono do general pelo seu
exército), pode haver “uma luz”, ou seja, esperança.
c) Somente depois de termos enfrentado dificuldades é que podemos ver as coisas com clareza (representada
pelo sol).

desembainha: retira a espada da bainha.


dispersa: separa, desestrutura.

Literatura 15
t Você tem outra ideia sobre qual o sentido da frase final do conto? Escreva-a a seguir.
Essa questão pode ser interessante para que os alunos tenham a oportunidade de expor sua interpretação de uma passagem altamente

simbólica do texto.

t Justifique sua escolha da interpretação mais adequada para a frase final do conto.
Pessoal. 7 Alerta a respeito da resposta a ser dada pelos alunos a essa questão.

4. Compartilhe com os colegas sua resposta à atividade anterior. Todos os colegas da turma atribuíram o mesmo signi-
ficado para a frase “Sai o sol.”? Em sua opinião, por que houve interpretações diferentes?
Por se tratar de um texto literário, que possibilita múltiplas interpretações, cada leitor pode mobilizar seu repertório de leitura e sua

criatividade para interpretar o texto.

5. Em “Tema para uma tapeçaria”, os soldados do exército inimigo decidiram passar para o exército do general. A ideia
de “passar para o outro lado” pode ser entendida de outras maneiras, além da literal? Quais?
Mudar de opinião; rever uma atitude; trocar de pessoa a quem se deseja apoiar em determinada situação, etc.

6. No conto, em um primeiro momento, o general sai vitorioso porque, rapidamente, consegue convencer os infantes
do exército inimigo a mudar de lado. Discuta com os colegas se situações como essa são comuns ou incomuns em
nosso cotidiano. 8 Sugestões de atividades adicionais sobre o texto de Julio Cortázar.
Pessoal. A ideia é que os alunos reflitam sobre mudanças aparentemente surpreendentes de comportamento na sociedade

contemporânea: jogadores de futebol que passam rapidamente de ídolos a alvos de críticas ferozes; arranjos políticos que levam

candidatos a se unirem à oposição que anteriormente criticavam, entre outros exemplos possíveis.

Olhar literário
Literariedade III
Plurissignificação
A linguagem literária caracteriza-se pelo uso específico e complexo da língua. Em textos de caráter científico, por
exemplo, as palavras têm um significado único e preciso, que exige conhecimento prévio do leitor para ser entendido.
No texto literário, os termos, as frases, os parágrafos, etc. podem ser compreendidos de diversas formas, isto é, têm
significados múltiplos e variáveis.

16 Volume 1
Em geral, os textos não literários procuram privilegiar a clareza comunicacional. Contudo, na obra literária, o autor
pode criar expressões, dar novos significados para palavras conhecidas, compondo um texto que não demanda uma
única interpretação como verdadeira ou definitiva. A propriedade de um texto possibilitar diferentes interpretações é
denominada plurissignificação (pluri = vários; significação = sentidos).
Desse modo, para que a leitura de textos literários seja mais rica, é fundamental lermos esses textos tendo em
mente a plurissignificação das construções linguísticas que os compõem.
t O texto literário é sempre plurissignificativo. Releia o conto “Tema para uma tapeçaria” e indique exemplos de
plurissignificação. Justifique sua resposta.
Pessoal. 9 Explicação sobre a plurissignificação no texto de Julio Cortázar.

Sugestão de atividades: questões 7, 8 e 12 da seção Hora de estudo.

Atividades
1. Leia os dois poemas a seguir e responda às questões sobre eles.

Infância (1) Infância (2)


submarino é um avião que nada Eu matei minha saudade mas depois
e tem olho de peixe veio outra
BRITO, Antônio Carlos de. Lero-lero. São Paulo: Cosac Naify, 2012. p. 29.

a) O poema “Infância (1)” apresenta uma definição. Essa definição pode ser encontrada em dicionários? Por quê?
Não, essa definição não é referencial, ou seja, não usa o sentido denotativo das palavras, mas, sim, imagens poéticas para definir a

palavra submarino.

b) Que elementos possibilitaram ao eu lírico definir a palavra submarino como “um avião que nada / e tem olho de
peixe”?
Assim como o avião, o submarino também é um meio de locomoção, que pode transportar cargas e pessoas, só que na água, por

isso seria um avião que “nada” e, por se mover debaixo da água, teria “olho de peixe”.

c) No poema “Infância (2)”, a forma verbal “matei” pode ser entendida em seu sentido literal? Por quê?
Sim, uma das possibilidades de leitura desse poema é considerando o sentido literal da forma verbal “matei”. No entanto, é

extremamente importante que os alunos compreendam que essa é apenas uma das leituras possíveis para esses versos, ou seja,

a forma verbal também pode ser entendida em sentidos não literais.

Literatura 17
d) Qual o jogo de ideias presente nos versos “Eu matei b) Na definição de grilo, é utilizada uma palavra que
minha saudade mas depois / veio outra”? está no dicionário, mas é pouco usual na língua.
O eu lírico propõe uma brincadeira com a expressão “matar Identifique-a e explique por que ela ajuda a caracte-
rizar esse bichinho.
a saudade”. Ao afirmar que matou sua saudade, mas que
A palavra é “inencontrável” e ajuda a caracterizar o grilo,
depois veio outra, ele indica a infinitude da saudade,
pois ele é um inseto noturno, portanto, é quase impossível
especialmente aquela ligada à infância, como se pode
localizá-lo durante o dia.
deduzir pelo título do poema.

2. Agora, leia as definições poéticas a seguir.


c) Na leitura da definição poética de sapo, o leitor deve
mobilizar seu repertório sobre contos de fadas para
Bichos convidados (de a a z)
entender o que o sapo deseja. Que desejo seria esse?
[...]
O desejo de ser beijado por uma princesa e tornar-se um
grilo: pastor de estrelas. embalador de noites.
de tanto grilar seus sons, conhece cada curva príncipe, como no conto “A princesa e o sapo”.
de um silêncio. bichinho quase inencontrável
de dia. d) Explique, com base na definição dada ao sapo, o
[...] jogo de palavras criado com a palavra "sapiência".
libélula: mestranda em liberdade e voo livre. A palavra “sapiência”, além de seu sentido de sabedoria,
também chamada de helibélula, ganhou aver-
erudição, pode se remeter a uma sabedoria dos sapos ou
são à pacatez.
[...] ainda a uma paciência que seria própria desses animais.
sapo: vive em ânsias de ser beijado por prin-
cesas. acredita em vidas passadas, onde julga ter
sido príncipe. mestre de cantoria e sapiência.
pratica a perigosa arte de encher balões com
suas próprias bochechas. gosta de quebrar si- e) Nas três definições dadas no trecho lido, há plu-
lêncios da noite. rissignificação. Escolha uma das três definições e
[...] explique por que a plurissignificação está presente.
Na definição de grilo, a plurissignificação está presente no
ONDJAKI. Há prendisajens com o xão: o segredo húmido da lesma &
outras descoisas. Rio de Janeiro: Pallas, 2011. p. 54-58. duplo sentido da palavra “grilar”, que pode significar agir

a) Releia a definição de libélula. Para realizá-la, foi como um grilo ou ficar preocupado com algo; na definição
criada uma palavra. Qual é essa palavra e que sen-
tido ela pode ter? de libélula, a plurissignificação está em associar a palavra

Helibélula. A helibélula seria uma junção das palavras “libélula” com liberdade e com helicóptero, dando a ela o

helicóptero e libélula, ou seja, ela voa como um helicóptero. sentido de “liberdade em voo”; na definição de sapo, a plu-

rissignificação está na aproximação das palavras sapo e sa-

ber, presente em “sapiência”.

aversão: antipatia, horror.


pacatez: qualidade de alguém pacífico, tranquilo.
sapiência: sabedoria.

18 Volume 1
3. A letra da canção a seguir foi escrita por Chico Buarque, quem manda / Falou, tá falado / Não tem discussão
no final da década de 1960. Leia-a para refletir sobre ela. / A minha gente hoje anda / Falando de lado / E
olhando pro chão, viu”.
Apesar de você
Nesses versos, estão expressos tanto o caráter autoritário
Hoje você é quem manda
Falou, tá falado da ditadura – há uma voz de mando que se impõe
Não tem discussão
A minha gente hoje anda pela força (não tem discussão) – quanto o fato de as pessoas

Falando de lado perceberem isso e se submeterem, serem obrigadas a isso


E olhando pro chão, viu
Você que inventou esse estado (olhando pro chão).
E inventou de inventar
c) Como você estudou, a plurissignificação é um re-
Toda a escuridão curso bastante usado em textos literários. Por vezes,
Você que inventou o pecado ela é também um recurso presente em canções.
Esqueceu-se de inventar Considerando a leitura da canção como um todo,
O perdão você identifica sua plurissignificação? Explique bre-
vemente.
Apesar de você
A plurissignificação presente na canção de Chico Buarque
Amanhã há de ser
Outro dia consiste no fato de ser possível entendê-la como uma
Eu pergunto a você
canção de superação amorosa, de esquecimento de quem
Onde vai se esconder
Da enorme euforia fez o sujeito poético sofrer; e como uma canção de protesto,
Como vai proibir
de superação da ditadura, indicando que, em algum
Quando o galo insistir
Em cantar momento, seria possível viver rindo daqueles que
Água nova brotando
E a gente se amando acreditaram que poderiam governar por meio da força.
Sem parar
d) Observe com atenção os versos reproduzidos abai-
xo e indique a plurissignificação neles presente.
[...]
t Você que inventou esse estado (1.ª estrofe)
100% ©by MAROLA EDIÇÕES MUSICAIS LTDA. Todos os direitos reservados.
BUARQUE, Chico. Apesar de você. Disponível em: <http://www. A palavra estado significa tanto o estado em que a
chicobuarque.com.br/construcao/mestre.asp?pg=apesarde_70.
htm>. Acesso em: 13 dez. 2014. pessoa se encontra, triste, mal, quanto o Estado

a) Um dos temas frequentemente presentes nas can- governamental, numa alusão à ditadura.
ções de Chico Buarque é o amor. Retire da canção
trechos que indiquem que ela pode ser lida como t Apesar de você / Amanhã há de ser / Outro dia
uma canção de amor. (2.ª estrofe)
Os versos iniciais da segunda estrofe podem ser entendidos A expressão “apesar de você” se remete tanto ao sofrimento

como se o eu lírico estivesse falando de amor (“Apesar de amoroso, ou seja, apesar de a pessoa amada ter magoado

você / Amanhã há de ser / Outro dia”). o eu lírico, será possível ser feliz de novo quando a mágoa

passar, quanto à superação da ditadura: apesar do estado

b) Considerando que na década de 1960 o Brasil se de coisas vivido, da censura e das perseguições políticas,
encontrava sob a ditadura militar após o golpe de a vida segue e esse sofrimento será superado.
1964, interprete o sentido dos versos: “Hoje você é

Literatura 19
Olhar literário
Origem da literatura
A LITERATURA ERA
ORAL: CANTADA OU
Guilherme Capriglioni. 2015. Digital.

RECITADA.

EM SUA ORIGEM, A
LITERATURA ESTAVA
LIGADA A UMA VISÃO
RELIGIOSA DO MUNDO.
A LITERATURA AJUDAVA
A PRESERVAR TRAÇOS
A POESIA FUNCIONAVA DE IDENTIDADE ENTRE OS
COMO UMA MEMÓRIA DOS MEMBROS DA COMUNIDADE.
FATOS IMPORTANTES DAS
COMUNIDADES.

10 Explicação sobre as origens da literatura e o papel da poesia em sociedades an


antigas.
ntiigaas.
s
Passagem da oralidade para a escrita
As primeiras manifestações literárias foram realizadas na lin-
guagem oral, uma vez que a escrita surgiu muito mais tarde. Para
alguns estudiosos, isso ocorreu como resultado da necessidade
de aproximação e troca de conhecimentos entre as comunidades
DKO Estúdio. 2015. Digital.

separadas pelo espaço e pelo tempo, ou seja, para que as socie-


dades deixassem registros que pudessem ser consultados por
gerações seguintes e por pessoas de outras localidades.
A escrita é uma invenção relativamente recente, praticada há
aproximadamente cinco mil anos. Em um primeiro momento, as
informações eram representadas por meio de símbolos visuais e
figuras. Com o tempo, sistemas mais complexos foram comparti-
lhados pelas sociedades até o surgimento das primeiras manifes-
tações da linguagem verbal escrita.

20 Volume 1
Entrelaçamentos
Oralidade nas literaturas brasileira e angolana
As literaturas desenvolvidas nos cinco países africanos colonizados por Portugal, quando comparadas à literatura
brasileira, apresentam uma série de marcas que as singularizam por razões culturais e de distância geográfica. Apesar
disso, podemos aproximar obras literárias africanas e brasileiras, a fim de refletir sobre seus pontos comuns.
Como ocorreu com grande parte das literaturas espalhadas pelo mundo, a origem da produção literária dos países
lusófonos do continente africano se deu pela prática de uma literatura oral, chamada pelos estudiosos de oratura ou
oralitura.
A literatura oral africana tinha como função garantir um vínculo
entre os membros das comunidades. As narrativas, os provérbios, as
lendas, as canções, as adivinhas, os contos e outros muitos gêneros
literários produzidos pelos povos africanos ensinavam e divertiam
seus ouvintes, fazendo circular valores sociais importantes para a
conservação da unidade entre os componentes de um grupo.
O papel de narrador das histórias ficava a cargo do griô, uma
espécie de contador profissional que utilizava recursos gestuais,

DKO Estúdio. 2015. Digital.


musicais, entonação de voz, etc. para estimular seu público e, com
isso, fortalecer a unidade simbólica da comunidade. Mesmo com o
passar do tempo e com os países africanos inseridos no processo da
mundialização, esse artista, dotado de muitos talentos, não desapa-
receu da cultura africana: pelo contrário, ele ainda é um dos elos que
garantem a circulação de saberes entre os povos.
No Brasil, assim como na maior parte do mundo, também convi-
vem as literaturas oral e escrita. Ao mesmo tempo que causos, repen-
tes e narrativas de cordel aparecem em publicações, costumam ser
transmitidos oralmente por contadores e repentistas.
Sugestão de atividade: questão 9 da seção Hora de estudo.

Olhar literário
Funções da literatura
Em sua relação com o leitor, a literatura pode desempenhar uma série de funções. Vejamos algumas delas:

t Dar acesso ao conhecimento – a literatura pode, como produto cultural, favorecer o acesso a conhecimen-
tos relacionados a determinada sociedade na qual surgiu. Nesse sentido, o texto literário cumpre um papel
de documento histórico, sociológico, antropológico e psicológico a respeito de uma comunidade.

lusófonos: elementos que determinam uma identidade cultural partilhada por países falantes da língua portuguesa.

Literatura 21
t Ser fonte de divertimento – desde suas origens, a literatura está associada ao prazer, ao entre-
tenimento. Para os gregos, por exemplo, ela deveria, como as demais artes, retratar o belo. Na
modernidade, a representação da beleza deixou de ser o foco principal da literatura (e das artes
em geral). O grotesco e o assustador passaram a integrar o interesse de autores e leitores, o que
não significa que o texto literário tenha deixado de ser uma possibilidade de distração. Muitas
vezes, uma obra é lida pela curiosidade de descobrir o seu desfecho.

t Fazer pensar – a literatura é uma ponte que liga dois mundos: o ficcional, inventado pelo escri-
tor e recriado pelo leitor, e o não ficcional. Muitos dos valores, ideologias e concepções sobre
o ser humano e a sociedade em que está inserido estão simbolicamente expressos nos textos
literários.

Portanto, a leitura literária propõe reflexão sobre o mundo e sobre a condição humana, levando o leitor a se deparar
com crenças e opiniões iguais ou diferentes das suas. Sugestão de atividades: questões 10 e 11 da seção Hora de estudo.

Atividades
Leia o poema abaixo e reflita sobre as funções da literatura.
ura.

Esperemos
Eu ia fazer um poema para você
mas me falaram das crueldades
nas colônias inglesas
e o poema não saiu

ia falar do teu corpo


de suas mãos
amada
quando soube
que a polícia espancou um companheiro
al.
e o poema não saiu i git
5. D
201
st údio.
E
DKO
ia falar em canções
no belo da natureza
nos jardins
Daniel Kl

Solano Trindade  nasceu em Recife,


nas flores em 1908. De origem humilde, exerceu
ein. 2015

quando falaram-me em guerra várias profissões: operário, trabalhador


. Digital.

e o poema não saiu do comércio e da imprensa. Participou


também de diversas atividades políti-
perdão amada
cas voltadas à libertação de países da
por não ter construído o seu poema
América do Sul do domínio de ditadu-
amanhã esse poema sairá ras militares. Morreu em 1974.
esperemos.

TRINDADE, Solano. Poemas antológicos. São Paulo: Nova Alexandria, 2008. p. 30.

22 Volume 1
1. O eu lírico afirma não conseguir escrever um poema para sua amada por conta de problemas que ocuparam sua atenção.
O que esses problemas apresentam em comum?
Os problemas estão relacionados à violência.

2. As adversidades apontadas pelo eu lírico não deixam espaço para que ele dedique atenção à sua amada. Pode-se
dizer que o desejo de escrever para a amada e os problemas indicados se opõem? Justifique sua resposta.
Sim, eles pertencem a universos antagônicos, opostos. Dessa maneira, o eu lírico não consegue escrever sobre a amada, uma vez que

isso exigiria sentimentos de amor e, ao seu redor, a violência está impregnada.

3. Em relação às funções que um texto literário pode exercer, qual das três possibilidades (dar acesso ao conhecimento,
ser fonte de divertimento, fazer pensar) pode ser atribuída ao poema “Esperemos”? Justifique sua resposta.
Pessoal. É possível que a literatura como função de pensar seja a selecionada pela maioria dos alunos. Nessa pergunta,

mais importantes do que propriamente a possibilidade atribuída por eles ao poema são as justificativas que darão para suas escolhas.

11 Explicação de como o poema “Esperemos” cumpre as funções da literatura estudadas..

Organize as ideias
Complete o esquema com as informações adequadas sobre os conceitos estudados.

A literatura pode ser definida como

uma forma de expressão artística que um rompimento com modos um questionamento


estabelece um diálogo com a realidade preestabelecidos do senso comum

texto literário admite várias interpretações

aquilo que, de alguma forma, está


literariedade verossimilhança
relacionado à realidade concreta

os vários sentidos que os arranjos


plurissignificação
linguísticos podem levar o leitor a construir

Literatura 23
Hora de estudo
1. O poema a seguir foi escrito pelo português Fernando 2. (ENEM)
Pessoa (1888-1935). Leia-o e responda ao que se pede.
Dario vinha apressado, guarda-chuva no
Autopsicografia braço esquerdo e, assim que dobrou a esqui-
O poeta é um fingidor. na, diminuiu o passo até parar, encostando-se
Finge tão completamente à parede de uma casa. Por ela escorregando,
Que chega a fingir que é dor sentou-se na calçada, ainda úmida da chuva,
A dor que deveras sente. e descansou na pedra o cachimbo.
Dois ou três passantes rodearam-no e in-
E os que leem o que escreve, dagaram se não se sentia bem. Dario abriu a
Na dor lida sentem bem,
boca, moveu os lábios, não se ouviu resposta.
Não as duas que ele teve,
O senhor gordo, de branco, sugeriu que devia
Mas só a que eles não têm.
sofrer de ataque.
E assim nas calhas de roda TREVISAN, D. Uma vela para Dario. Cemitério de elefantes.
Gira, a entreter a razão, Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1964 (adaptado).
Esse comboio de corda No texto, um acontecimento é narrado em linguagem
Que se chama coração. literária. Esse mesmo fato, se relatado em versão jor-
PESSOA, Fernando. Obra poética. Rio de Janeiro: Nova nalística, com características de notícia, seria identifi-
Aguilar, 1987. p. 98-99. cado em:
a) Explique, com suas palavras, a definição de poeta a) Aí, amigão, fui diminuindo o passo e tentei me
presente na primeira estrofe. apoiar no guarda-chuva... mas não deu. Encostei
O poeta seria aquele que finge, que imagina uma dor que
na parede e fui escorregando. Foi mal, cara! Perdi
os sentidos ali mesmo. Um povo que passava falou
não sente, mas que, por criar com tamanha força e comigo e tentou me socorrer. E eu, ali, estatelado,
sem conseguir falar nada! Cruzes! Que mal!
imaginação essa dor, é como se ela tivesse existido e ele
X b) O representante comercial Dario Ferreira, 43 anos,
a tivesse sentido. não resistiu e caiu na calçada da Rua da Abolição,
quase esquina com a Padre Vieira, no centro da ci-
b) Na segunda estrofe, é trabalhada a reação do leitor
dade, ontem por volta do meio-dia. O homem ainda
diante do poema. Que reação é essa?
tentou apoiar-se no guarda-chuva que trazia, mas
O leitor compartilha o fingimento do poeta, ou seja, ao ler, não conseguiu. Aos populares que tentaram socor-
rê-lo não conseguiu dar qualquer informação.
também finge sentir a dor que o poeta fingiu sentir.
c) Eu logo vi que podia se tratar de um ataque. Eu vi-
c) Qual a relação prevista, no poema, entre o poeta e o nha logo atrás. O homem, todo aprumado, de guar-
leitor? da-chuva no braço e cachimbo na boca, dobrou a
Uma relação de diálogo, em que um escreve sobre um tema e esquina e foi diminuindo o passo até se sentar no
chão da calçada. Algumas pessoas que passavam
o outro compartilha essa escrita, ressignifica o que foi escrito. pararam para ajudar, mas ele nem conseguia falar.
d) Qual o tema do poema de Fernando Pessoa? d) Vítima
A escrita poética, o processo de composição literária. Idade: entre 40 e 45 anos
Sexo: masculino
deveras: verdadeiramente. comboio: trem. Cor: branca
calhas: trilhos.
24 Volume 1
Ocorrência: Encontrado desacordado na Rua da Ambos os textos exaltam o brilho, a beleza, a tradição e o
Abolição, quase esquina com Padre Vieira. Ambu- compromisso dos dirigentes e de todos os componentes
lância chamada às 12h34min por homem desco- com a escola de samba Estação Primeira de Mangueira.
nhecido. A caminho. Uma das diferenças que se estabelece entre os textos é
que
e) Pronto-socorro? Por favor, tem um homem caído na
calçada da Rua da Abolição, quase esquina com a a) o artigo jornalístico cumpre a função de transmi-
Padre Vieira. Ele parece desmaiado. Tem um grupo tir emoções e sensações, mais do que a letra de
de pessoas em volta dele. Mas parece que ninguém música.
aqui pode ajudar. Ele precisa de uma ambulância
b) a letra de música privilegia a função social de comu-
rápido. Por favor, venham logo!
nicar a seu público a crítica em relação ao samba e
3. (ENEM) aos sambistas.
Texto I X c) a linguagem poética, no Texto I, valoriza imagens
metafóricas e a própria escola, enquanto a lingua-
Chão de esmeralda gem, no Texto II, cumpre a função de informar e en-
Me sinto pisando volver o leitor.
Um chão de esmeraldas d) ao associar esmeraldas e rosas às cores da escola,
Quando levo meu coração o Texto I acende a rivalidade entre escolas de sam-
À Mangueira ba, enquanto o Texto II é neutro.
Sob uma chuva de rosas
e) o Texto I sugere a riqueza material da Mangueira,
Meu sangue jorra das veias
enquanto o Texto II destaca o trabalho na escola de
E tinge um tapete
samba.
Pra ela sambar
É a realeza dos bambas 4. (UERJ)
Que quer se mostrar
Soberba, garbosa Sobre a origem da poesia
Minha escola é um cata-vento a girar A origem da poesia se confunde com a ori-
É verde, é rosa gem da própria linguagem.
Oh, abre alas pra Mangueira passar Talvez fizesse mais sentido perguntar
quando a linguagem verbal deixou de ser
BUARQUE, C.; CARVALHO, H. B. Chico Buarque de poesia. Ou: qual a origem do discurso não
Mangueira. Marola Edições Musicais Ltda. BMG. 1997.
Disponível em: <www.chicobuarque.com.br>. poético, já que, restituindo laços mais ínti-
Acesso em: 30 abr. 2010. mos entre os signos e as coisas por eles desig-
nadas, 1a poesia aponta para um uso muito
Texto II
primário da linguagem, que parece anterior
Quando a escola de samba entra na Mar- ao perfil de sua ocorrência nas conversas, nos
quês de Sapucaí, a plateia delira, o coração dos jornais, nas aulas, conferências, discussões,
componentes bate mais forte e o que vale é a discursos, ensaios ou telefonemas.
4
emoção. Mas, para que esse verdadeiro espe- Como se ela restituísse, através de um
táculo entre em cena, por trás da cortina de uso específico da língua, a integridade entre
fumaça dos fogos de artifício, existe um ver- nome e coisa − que o tempo e as culturas do
dadeiro batalhão de alegria: são costureiras, homem civilizado trataram de separar no de-
aderecistas, diretores de ala e de harmonia, correr da história.
pesquisador de enredo e uma infinidade de A manifestação do que chamamos de
profissionais que garantem que tudo esteja poesia hoje nos sugere mínimos flashbacks
perfeito na hora do desfile. de uma possível infância da linguagem, an-
tes que a representação rompesse seu cordão
AMORIM, M.; MACEDO, G. O espetáculo dos bastidores. umbilical, gerando essas duas metades − sig-
Revista de Carnaval 2010: Mangueira. Rio de Janeiro: Estação
Primeira de Mangueira, 2010. nificante e significado.

Literatura 25
Houve esse tempo? Quando não havia a poesia aponta para um uso muito primário da
poesia porque a poesia estava em tudo o que linguagem, que parece anterior ao perfil de sua
se dizia? Quando o nome da coisa era algo ocorrência nas conversas, nos jornais, nas au-
que fazia parte dela, assim como sua cor, seu las, conferências, discussões, discursos, ensaios
tamanho, seu peso? Quando os laços entre os
ou telefonemas. (ref.1)
sentidos ainda não se haviam desfeito, então
A comparação entre a poesia e outros usos da lingua-
música, poesia, pensamento, dança, imagem,
cheiro, sabor, consistência se conjugavam em gem põe em destaque a seguinte característica do dis-
experiências integrais, associadas a utilidades curso poético:
práticas, mágicas, curativas, religiosas, se- a) revela-se como expressão subjetiva;
xuais, guerreiras?
2
Pode ser que essas suposições tenham algo b) manifesta-se na referência ao tempo;
de utópico, projetado sobre um passado pré-ba- X c) afasta-se das praticidades cotidianas;
bélico, tribal, primitivo. Ao mesmo tempo, cada
novo poema do futuro que o presente alcança d) conjuga-se com necessidades concretas.
cria, com sua ocorrência, um pouco desse pas- 5. Imagine que você terminou a leitura de dois textos lite-
sado. rários: um deles é o conto Os três porquinhos, em que
Lembro-me de ter lido, certa vez, um co- os animais conversam e têm comportamento parecido
mentário de Décio Pignatari, em que ele cha- com o dos humanos; o outro, um romance que conta
mava a atenção para o fato de, tanto em chinês a história de um jovem que sobrevive a um acidente
como em tupi, não existir o verbo ser, enquanto
aéreo e consegue acionar o socorro, ativando, sozinho,
verbo de ligação. Assim, o ser das coisas ditas
um complexo sistema de navegação aérea, usando
se manifestaria nelas próprias (substantivos),
5
não numa partícula verbal externa a elas, o para isso apenas a bateria de seu celular. Consideran-
que faria delas línguas poéticas por natureza, do esses aspectos dos dois enredos, explique a veros-
mais propensas à composição analógica. similhança nesses textos.
3 O conto Os três porquinhos pode ser considerado verossímil,
Mais perto do senso comum, podemos aten- pois, mesmo os personagens sendo animais, os fatos vividos
tar para como colocam os índios americanos fa- por eles têm relação direta com fatos que podem ocorrer no
lando, na maioria dos filmes de cowboy − eles mundo concreto. Além disso, no universo dos contos de fada,
dizem “maçã vermelha”, “água boa”, “cavalo ve- uma história em que porquinhos falam e constroem casas é
loz”; em vez de “a maçã é vermelha”, “essa água aceitável. No caso do romance, ele pode ser considerado ve-
é boa”, “aquele cavalo é veloz”. Essa forma mais rossímil se os acontecimentos narrados forem coerentes entre
si, ainda que seja impossível de eles acontecerem realmente.
sintética, telegráfica, aproxima os nomes da pró-
pria existência − como se a fala não estivesse se
referindo àquelas coisas, e sim apresentando-as
(ao mesmo tempo em que se apresenta).
6
No seu estado de língua, no dicionário, as
palavras intermedeiam nossa relação com as 6. (UERJ)
coisas, impedindo nosso contato direto com
elas. 7A linguagem poética inverte essa relação, Ciência e Hollywood
pois, vindo a se tornar, ela em si, coisa, oferece Infelizmente, é verdade: explosões não
uma via de acesso sensível mais direto entre fazem barulho algum no espaço. Não me
nós e o mundo. lembro de um só filme que tenha retratado
[...] isso direito. Pode ser que existam alguns,
Já perdemos a inocência de uma linguagem
mas se existirem não fizeram muito suces-
plena assim. As palavras se desapegaram das
coisas, assim como os olhos se desapegaram so. Sempre vemos explosões gigantescas,
dos ouvidos, ou como a criação se desapegou estrondos fantásticos. Para existir ruído é
da vida. 8Mas temos esses pequenos oásis − os necessário um meio material que transpor-
poemas − contaminando o deserto da referen- te as perturbações que chamamos de ondas
cialidade. sonoras. Na ausência de atmosfera, ou água,
ou outro meio, as perturbações não têm
ARNALDO ANTUNES
www.arnaldoantunes.com.br onde se propagar. Para um produtor de ci-

26 Volume 1
nema, a questão não passa pela ciência. Pelo não deve ser levado ao pé da letra. A arte dis-
menos não como prioridade. Seu interesse é torce para persuadir. E o cinema moderno,
tornar o filme emocionante, e explosões têm com efeitos especiais absolutamente espeta-
justamente este papel; roubar o som de uma culares, distorce com enorme facilidade e po-
grande espaçonave explodindo torna a cena der de persuasão.
bem sem graça. O que os cientistas podem fazer, e isso
Recentemente, o debate sobre as liber- está virando moda nas universidades norte-
dades científicas tomadas pelo cinema tem -americanas, é usar filmes nas salas de aula
aquecido. O sucesso do filme O dia depois de para educar seus alunos sobre o que é cienti-
amanhã (The day after tomorrow), faturando ficamente correto e o que é absurdo. Ou seja,
mais de meio bilhão de dólares, e seu cenário usar o cinema como ferramenta pedagógica.
Os alunos certamente prestarão muita aten-
de uma idade do gelo ocorrendo em uma se-
ção, muito mais do que em uma aula con-
mana, em vez de décadas ou, melhor ainda,
vencional. Com isso, será possível educar a
centenas de anos, levantaram as sobrancelhas
população para que, no futuro, um número
de cientistas mais rígidos que veem as distor-
cada vez maior de pessoas possa discernir o
ções com desdém e esbugalharam os olhos
real do imaginário.
dos espectadores (a maioria) que pouco ligam
MARCELO GLEISER
se a ciência está certa ou errada. Afinal, cine-
Adaptado de www1.folha.uol.com.br.
ma é diversão.
Até recentemente, defendia a posição mais A oposição entre “ciência” e “Hollywood”, expressa no título
rígida, que filmes devem tentar ao máximo ser do artigo de Gleiser, corresponde a outra oposição bastan-
fiéis à ciência que retratam. Claro, isso sempre te estudada no campo da literatura, que se verifica entre:
é bom. Mas não acredito mais que seja abso- a) acontecimento e opinião;
lutamente necessário. Existe uma diferença
crucial entre um filme comercial e um do- b) historicismo e atualidade;
cumentário científico. Óbvio, documentários X c) verdade e verossimilhança;
devem retratar fielmente a ciência, educando d) particularização e universalismo.
e divertindo a população, mas filmes não têm
necessariamente um compromisso pedagógi- 7. Leia o trecho da letra da canção a seguir, escrita por
co. As pessoas não vão ao cinema para serem Djavan.
educadas, ao menos como via de regra. Faltando um pedaço
Claro, filmes históricos ou mesmo aque- O amor é um grande laço
les fiéis à ciência têm enorme valor cultu- Um passo pr’uma armadilha
ral. Outros educam as emoções através da Um lobo correndo em círculo
ficção. Mas, se existirem exageros, eles não Pra alimentar a matilha
deverão ser criticados como tal. Fantasmas [...]
não existem, mas filmes de terror sim. Pode- O amor é como um raio
-se argumentar que, no caso de filmes que Galopando em desafio
versam sobre temas científicos, as pessoas Abre fendas, cobre vales
vão ao cinema esperando uma ciência crível. Revolta as águas dos rios
Isso pode ser verdade, mas elas não deve- [...]
riam basear suas conclusões no que diz o fil- E o coração de quem ama
me. No mínimo, o cinema pode servir como Fica faltando um pedaço
mecanismo de alerta para questões científi- Que nem a lua minguando
cas importantes: o aquecimento global, a in- Que nem o meu nos seus braços
teligência artificial, a engenharia genética, as
DJAVAN. Faltando um pedaço. Disponível em: <http://www.
guerras nucleares, os riscos espaciais como djavan.com.br/site/cds/seduzir>. Acesso em: 11 set. 2014.
cometas ou asteroides, etc. Mas o conteúdo 100% ©Luanda Edições Musicais LTDA

Literatura 27
a) A definição de amor presente na primeira estrofe é X d) Com mais de um sentido, cuja alteração se faz per-
feita com linguagem literária ou não literária? Justi- ceber pelos recursos linguísticos e visuais que ser-
fique sua resposta. vem de pistas para o entendimento do texto.
Literária, pois a definição presente nesse texto não pretende e) De forma equivocada, pois não existe um destinatá-
rio declarado a quem se dirige a mensagem.
expressar o sentido literal da palavra amor; trata-se de uma
9. Você verificou que a literatura escrita convive com
definição que faz uso de uma linguagem plurissignificativa, manifestações da literatura oral. Pesquise sobre uma
dessas manifestações e registre aqui um exemplo.
que leva o leitor ou ouvinte dos versos a atribuir diferentes
Pessoal. Algumas possibilidades: causos caipiras; repentes;
sentidos às palavras e expressões empregadas.
canções populares; cantigas de roda; desafios de hip-hop;
b) Escolha uma das definições de amor presentes na
letra da canção e interprete seu sentido. trava-línguas, etc.

Pessoal. Sugestão: O amor é um passo para uma armadilha: 10. (UERJ)


apaixonar-se pode ser algo perigoso, pois facilita a perda do
Por que ler?
controle emocional. Outra interpretação possível é a de que Certas coisas não basta anunciar, como uma
verdade que deve ser aceita por si só. Precisa-
o amor é como um raio que atinge os amantes de modo
mos dizer o porquê. Se queremos fazer os bra-
fulminante, não sendo possível resistir a ele. sileiros lerem mais de um livro por ano, essa
trágica média nacional, precisamos de fato con-
c) Proponha uma definição para o amor nos mesmos quistar o seu interesse.
moldes da canção. Explique sua escolha. Listo os três benefícios fundamentais que a
Pessoal. leitura pode trazer.
O primeiro: (1) ler nos faz mais felizes.
É um caminho para o autoconhecimento, e
o exercício constante de autoconhecimento
é um caminho para a felicidade. (2) A vida,
também no plano individual, é mais intensa na
busca. Os personagens de um livro de ficção,
8. (UEPB) Do texto, abaixo, é possível concluir que o termo
os fatos de um livro-reportagem, as ideias de
chatear foi usado:
um livro científico, interagem com os nossos
sentimentos, ora refletindo-os, ora agredindo-
-os, e, portanto servindo de parâmetro para
sabermos quem somos, seja por identidade ou
oposição.
O segundo benefício: ler nos torna aman-
tes melhores. Treina nossa sensibilidade para o
contato com o outro. Amores românticos, amo-
res carnais, amores perigosos, amores casuais,
amores culpados, todos estão nos livros. A sen-
sibilidade do leitor encontra seu caminho. E
a) De maneira ambígua, sem nenhuma pista que pos-
quanto mais o nosso imaginário estiver arejado
sa ajudar na busca dos sentidos do termo.
pelas infinitas opções que as histórias escritas
b) De forma figurada, exemplificando unicamente a nos oferecem, sejam elas factuais ou ficcionais,
polissemia da linguagem. com mais delícia aproveitamos os bons mo-
c) Com o sentido literal do termo, ocasionando uma mentos do amor, e com mais calma enfrenta-
redundância. mos os maus.

28 Volume 1
Por fim: ler nos torna cidadãos melhores. (3) Desde que, adulto, comecei a escrever roman-
Os livros propiciam ao leitor um ponto de vista ces, tem-me animado até hoje a ideia de que o
privilegiado, de onde observa conflitos de inte- menos que o escritor pode fazer, numa época de
resses. No processo, sua consciência é estimula- atrocidades e injustiças como a nossa, é acender
da a se posicionar com equilíbrio. (4) Tendem a a sua lâmpada, fazer luz sobre a realidade de seu
ganhar forma, então, princípios de “honestida- mundo, evitando que sobre ele caia a escuridão,
de”, “honra”, “justiça” e “generosidade”. Guiado propícia aos ladrões, aos assassinos e aos tiranos.
por estes valores, o leitor pode enfim ultrapas- Sim, segurar a lâmpada, a despeito da náusea e
sar as fronteiras sociais, e ver a humanidade do horror. Se não tivermos uma lâmpada elétri-
presente em todos os tipos, em todas as classes. ca, acendamos o nosso toco de vela ou, em último
Teríamos menos escândalos de corrupção, caso, risquemos fósforos repetidamente, como um
se lêssemos mais; (5) construiríamos uma so- sinal de que não desertamos nosso posto.”
ciedade menos injusta, se educássemos me-
VERISSIMO, Erico. Solo de Clarineta. Tomo I. Porto Alegre:
lhor os nossos espíritos; eu acredito nisso. Editora Globo, 1978.

RODRIGO LACERDA Neste texto, por meio da metáfora da lâmpada que


Adaptado de rodrigolacerda.com.br.
ilumina a escuridão, Erico Verissimo define como uma
O texto do escritor Rodrigo Lacerda sugere que, por das funções do escritor e, por extensão, da literatura,
meio da literatura, o leitor pode acompanhar perspec- a) criar a fantasia.
tivas diferentes da própria.
b) permitir o sonho.
O trecho que explicita o contato do leitor com perspec- X c) denunciar o real.
tivas distintas é:
d) criar o belo.
a) A vida, também no plano individual, é mais intensa
na busca. (ref. 2) e) fugir da náusea.

X b) Os livros propiciam ao leitor um ponto de vista pri- 12. (ENEM)


vilegiado, de onde observa conflitos de interesses.
(ref. 3)
c) Tendem a ganhar forma, então, princípios de “hones-
tidade”, “honra”, “justiça” e “generosidade”. (ref. 4)
d) construiríamos uma sociedade menos injusta, se
educássemos melhor os nossos espíritos. (ref. 5)
11. (ENEM) Erico Verissimo relata, em suas memórias, um
episódio da adolescência que teve influência significa-
tiva em sua carreira de escritor.

“Lembro-me de que certa noite – eu teria uns


quatorze anos, quando muito – encarregaram-me O efeito de sentido da charge é provocado pela com-
de segurar uma lâmpada elétrica à cabeceira da binação de informações visuais e recursos linguísticos.
mesa de operações, enquanto um médico fazia os No contexto da ilustração, a frase proferida recorre à
primeiros curativos num pobre-diabo que solda- X a) polissemia, ou seja, aos múltiplos sentidos da ex-
dos da Polícia Municipal haviam “carneado”. [...] pressão “rede social” para transmitir a ideia que
Apesar do horror e da náusea, continuei firme pretende veicular.
onde estava, talvez pensando assim: se esse cabo- b) ironia para conferir um novo significado ao termo
clo pode aguentar tudo isso sem gemer, por que “outra coisa”.
não hei de poder ficar segurando esta lâmpada
para ajudar o doutor a costurar esses talhos e sal- c) homonímia para opor, a partir do advérbio de lugar,
o espaço da população pobre e o espaço da popula-
var essa vida? [...]
ção rica.

Literatura 29
d) personificação para opor o mundo real pobre ao b) da crítica aos ricos que possuem joias, mas não têm
mundo virtual rico. herança.
e) antonímia para comparar a rede mundial de compu- c) da maldade do povo a perguntar sobre a honestidade.
tadores com a rede caseira de descanso da família.
d) do privilégio de alguns em clamar pela honestidade.
13. (ENEM)
e) da insistência em promover eventos beneficentes.
Texto I 14. Abaixo, você lerá definições dicionarizadas, não literá-
rias. Reescreva-as utilizando uma linguagem metafóri-
Onde está a honestidade? ca, comum na escrita literária.
Você tem palacete reluzente
Tem joias e criados à vontade a) Tristeza: estado ou qualidade de quem está triste.
Sem ter nenhuma herança ou parente Falta de alegria; abatimento.
Só anda de automóvel na cidade... Pessoal. Sugestão: Tristeza é perder você; tristeza é o nó na

E o povo pergunta com maldade: garganta que não cede.


Onde está a honestidade?
Onde está a honestidade? b) Medo: perturbação diante de um perigo real ou apa-
O seu dinheiro nasce de repente rente. Pavor, susto, terror.
E embora não se saiba se é verdade Pessoal. Sugestão: Medo é o lugar obscuro onde nos
Você acha nas ruas diariamente
escondemos; medo é o não à espreita.
Anéis, dinheiro e felicidade...
c) Sonho: situação ideal que queremos alcançar; ideia
Vassoura dos salões da sociedade
que alimentamos; pensamento dominante que se-
Que varre o que encontrar em sua frente
guimos com interesse ou paixão.
Promove festivais de caridade
Em nome de qualquer defunto ausente... Pessoal. Sugestão: Sonho é o arco-íris no fim do dia; sonho

ROSA. N. Disponível em: <http://www.mpbnet.com.br>. é a felicidade plena.


Acesso em: abr. 2010.
d) Vida: espaço de tempo compreendido entre o nasci-
Texto II mento e a morte do ser humano.
Um vulto da história da música popu- Pessoal. Sugestão: vida é a irmã do tempo; vida é o temor
lar brasileira, reconhecido nacionalmente, é
da morte.
Noel Rosa. Ele nasceu em 1910, no Rio de Ja-
neiro; portanto, se estivesse vivo, estaria com- 15. O conceito de verossimilhança indica que, em um texto
pletando 100 anos. Mas faleceu aos 26 anos literário, o autor deve trabalhar com o que é provável e
de idade, vítima de tuberculose, deixando um possível, a fim de convencer o leitor de que a história
acervo de grande valor para o patrimônio cul- que ele está acompanhando, apesar de ficcional, pode-
tural brasileiro. Muitas de suas letras repre- ria ter ocorrido de verdade. Escolha um objeto artístico
sentam a sociedade contemporânea, como se (filme, livro, novela de televisão, etc.) e indique se ele é
tivessem sido escritas no século XXI. ou não verossímil. Justifique sua resposta.
Disponível em: <http://www.mpbnet.com.br>. Acesso em:
abr. 2010. Pessoal. O importante é a argumentação. Vários filmes, romances

Um texto pertencente ao patrimônio literário-cultural e novelas apresentam muitas falhas de verossimilhança (o herói
brasileiro é atualizável, na medida em que ele se re- sobrevive a tiroteios intensos, mas os antagonistas morrem todos;
fere a valores e situações de um povo. A atualidade
da canção "Onde está a honestidade?", de Noel Rosa, histórias de amor impossível se resolvem sem muita explicação;
evidencia-se por meio
tramas novelescas cheias de reviravoltas improváveis, etc.). O
X a) da ironia, ao se referir ao enriquecimento de origem
duvidosa de alguns. esperado é que os alunos apontem esses problemas.

30 Volume 1

You might also like