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Patrícia Lauxen1
Angélica Vier Munhoz2
1 ABREM-SE AS CORTINAS!
Televisão ligada. Informações ao alcance dos telespectadores. Dança dos Famosos,
Dança das Crianças, Qual é o seu talento, Concurso de Dança, Caminho das Índias.
Telenovelas, filmes, programas de auditório, concursos, noticiários. A dança num
simples “click”. Um “click” que leva o telespectador a conhecer as diversas formas de dança
existentes. Conhecimento sobre dança em casa, no trabalho, no restaurante. Basta um
“click” e uma vasta gama de danças está à sua disposição. À disposição de uma variedade
Universitário UNIVATES/RS/BR.
Ca derno pedag ógico, L aje a do, v. 8, n. 1, p. 61-71, 2011 61
Essa dança eu vi na tv!
Dança e mídia. Tema que chamou a atenção após presenciar algumas cenas nas
aulas de educação física de uma escola. Após a morte do cantor Michael Jackson, os
alunos começaram a se interessar muito por ele, principalmente por sua dança. Eles
imitavam suas coreografias, assistiam aos shows, cantavam suas músicas. Essas crianças
de oito a 11 anos não são da época em que Michael Jackson era o “Rei do Pop”! O que
aconteceu para que o astro chamasse a atenção delas?
A morte do cantor Michael Jackson foi o assunto mais debatido nos canais de
televisão durante semanas após o acontecimento e esse aparecimento constante na mídia
chamou a atenção das crianças. Elas assistem televisão e conheceram a dança desse
astro pela “telinha”. Este foi o grande passo para o presente estudo: como as crianças
(público este que passa muitas horas em frente à televisão) estão recebendo essas
informações de/sobre dança da televisão? Essas informações estão sendo transformadas
em conhecimento de/sobre dança? A dança na televisão está sendo notada por estes
telespectadores?
2 COMEÇA O SHOW!
Acordar às seis horas da manhã. Tomar café assistindo ao telejornal. Fazer uma
leitura rápida dos principais acontecimentos noticiados no jornal. Ir trabalhar. Checar
os e-mails recebidos. Almoçar assistindo ao telejornal do meio-dia. Voltar ao trabalho.
Trabalhar com o rádio ligado para estar atento às novidades. Checar os e-mails. Acessar
a página de notícias do dia. Voltar para casa. Checar as ligações e mensagens do celular
realizadas e recebidas. Tomar um banho. Checar os recados no Orkut. Jantar assistindo
às telenovelas da noite. Checar os e-mails e os recados no Orkut. Dormir.
contatos pela internet e ao que acontece com maior frequência, não vivem sem o telefone
celular, pois é por meio desse pequeno aparelho eletrônico que fazem a maior parte dos
seus contatos com outras pessoas:
A menina de 12 anos, mal chega em casa, após um dia na escola (particular), e não consegue
sequer trocar de roupa: liga o computador e, olhos em brilho, conecta-se ao MSN. Em
segundos, estará em contato on line com cinco, dez, vinte amigos, a maioria dos quais colegas
com quem esteve há menos de uma hora, ao vivo. A mesma menina aguarda ansiosa o horário
da Novela das Oito: desde seu quarto, escuta a música-tema de abertura do folhetim eletrônico,
coloca-se temporariamente off line no MSN, vai até a sala, senta-se ao sofá, janta sob protestos,
está “vidrada” na tela. A seu lado, inseparável, o celular: é possível que algum torpedo chegue a
qualquer momento ou que alguém muito esperado ligue. O ouvido, de longe, continua atento
aos sinais emitidos pelas entradas de possíveis novos amigos no MSN. Hiper-conectada, isso
não a impede de conversar com a mãe, responder a perguntas sobre novidades na escola,
planejar o próximo fim de semana com o pai, a festa na noite de sexta-feira, o almoço com a
madrinha no domingo, ou combinar pelo telefone convencional a pesquisa escolar na Internet,
na casa de uma amiga (FISCHER, 2007, p. 1).
O trecho do texto de Fischer (2007) mostra que nem mesmo as crianças escapam
do grande poder que a mídia exerce sobre a vida das pessoas. Internet, MSN, Orkut,
televisão, rádio, celular. Objetos eletrônicos, instrumentos e produtos midiáticos que se
tornam parte do dia a dia de qualquer cidadão que quer estar “ligado” no mundo, que
quer estar “por dentro” dos acontecimentos e das novidades, independente de idade,
sexo, cor, raça. Todos os membros da sociedade estão expostos aos efeitos midiáticos
contemporâneos sendo estimulados a “consumir” esses produtos que lhes são colocados
à disposição.
Sim! Consumir esses produtos, pois a cultura da mídia é uma forma de cultura
comercial e seus produtos são mercadorias que buscam atrair lucro. A mídia produz
conceitos, modas, atitudes, crenças, valores, símbolos, tratando de assuntos relativos à
vida cotidiana para atrair a atenção das pessoas e vender seus produtos:
Contudo, em certo sentido, a cultura da mídia é a cultura dominante hoje em dia; substitui
as formas de cultura elevada como foco da atenção e de impacto para grande número de
pessoas. Além disso, suas formas visuais e verbais estão suplantando as formas da cultura
livresca, exigindo novos tipos de conhecimento para descodificá-las. Ademais, a cultura
veiculada pela mídia transformou-se numa força dominante de socialização: suas imagens
e celebridades substituem a família, a escola e a Igreja como árbitros de gosto, valor e
pensamento, produzindo novos modelos de identificação e imagens vibrantes de estilo, moda
e comportamento (KELLNER, 2001, p. 27).
São imagens e figuras que a cultura da mídia coloca à disposição e com as quais
as pessoas podem se identificar, utilizando-as de modelo para sua vida, imitando-as.
Assim, ela acaba por exercer efeitos socializantes e culturais por meio destes modelos
que se criam: modelos de papéis, sexo, atitudes e comportamentos.
Muitas pessoas tomam como verdades absolutas aquilo que veem na mídia,
construindo sua identidade por meio dessas verdades, acreditando ser o melhor para
si. São simbolismos produzidos pela mídia com os quais as pessoas de identificam e se
afirmam como pessoa. De acordo com Thompson citado por Gallardo e Sborquia (2002),
em todas as sociedades os seres humanos utilizam-se da produção e do intercâmbio de
informações e de conteúdos simbólicos. Isso faz parte da vida social. Utilizar-se das
informações que a mídia oferece e apropriar-se das verdades e dos modelos que ela cria
faz parte da vida das pessoas.
Magalhães (2008) relata que durante seu estudo, em que foram visitadas casas de
famílias de uma cidade do interior do Rio Grande do Sul, encontraram um número
significativo de aparelhos de televisão, em média três em cada unidade doméstica.
Aparelhos grandes e sofisticados em diversos lugares das casas: na sala de estar, na sala
de TV, nos quartos, na cozinha e até mesmo no banheiro. Isso mostra como as pessoas
dão importância para a televisão dentro de suas casas e também nas suas vidas. Além de
ser um eletrodoméstico muito cobiçado, elas se inspiram nos artistas mais “badalados”
para se vestir, para mudar o visual como o corte de cabelo, falam as gírias que surgem
nas telenovelas, fazem a dieta que apareceu no Programa da Ana Maria Braga e assim
por diante:
As pessoas assistem com regularidade a certos programas e eventos; há fãs de várias séries e
estrelas com um grau incrível de informação e conhecimento sobre o objeto de sua fascinação;
as pessoas realmente modelam comportamentos, estilos, atitudes pelas imagens da televisão;
os anúncios por ela veiculados de fato desempenham certo papel na manipulação da demanda
do consumidor (KELLNER, 2001, p. 303).
A televisão tem a preocupação de produzir algo atrativo para as pessoas, para que
elas possam assistir a um determinado programa e se identificar diante de alguma
situação. As novelas, por exemplo, na maioria das vezes retratam a vida de pessoas de
diversas classes sociais, diferentes realidades de famílias, algumas bem estruturadas
outras não, com problemas com filhos adolescentes, casais que se separam, casais
que casam e constituem lindas famílias, casais homossexuais, pessoas que sofrem
preconceitos (negros, pessoas com necessidades especiais, homossexuais), pais que
sofrem com filhos usuários de drogas, adolescentes rebeldes ou com dificuldades de
socialização, enfim, casos da vida diária dos brasileiros. Dessa forma, a novela abrange
um público diversificado, pois seus assuntos são atrativos para todas as classes sociais e
para todas as faixas etárias.
4 PROTAGONISTAS DE SHOW
Discovery Kids, Nickelodean, Cartoon Network, TV globinho, TV Xuxa, Malhação,
Computador, Orkut, MSN, The Sims, Mp3, Mp4, IPod, Playstation, celular. Atrativos
midiáticos para crianças e adolescentes. Programas e objetos eletrônicos cada vez mais
consumidos por este público em questão.
Muitas crianças, ainda na sua mais tenra idade, não têm mais na sua lista de
presentes as bonecas, os carrinhos, um jogo para jogar com os amigos ou os brinquedos
do momento. Eles querem um celular, um Mp3, um Playstation ou um computador. A
vida atrelada aos meios midiáticos já afetou as crianças. Atualmente, os pais têm dado
preferência em deixar os filhos dentro de casa, assistindo televisão, jogando videogame,
ou utilizando o computador, pois acreditam que dessa forma estarão mais seguros e
protegidos da violência, da criminalidade e do perigo das ruas.
parecem estar cada vez mais vivendo “infâncias midiáticas”, em que suas experiências
diárias são repletas de narrativas, imagens e mercadorias produzidas pelas grandes
corporações globalizadas de mídia. É possível dizer que hoje o próprio significado
da infância nas sociedades contemporâneas está sendo criado e definido por meio das
interações das crianças com as mídias eletrônicas.
5 IMAGENS EM MOVIMENTO
Dança. Uma forma de comunicação e manifestação cultural que surge nos
primórdios da vida humana. Antes mesmo de utilizar as palavras, o homem primitivo
já se servia do movimento corporal para manifestar as suas emoções, da mesma forma
que se utilizava da dança para marcar os acontecimentos importantes da vida cotidiana,
como o nascimento, casamento, morte, caça, guerras, iniciação dos adolescentes,
doenças, cerimoniais tribais, vitórias, paz, estações do ano, sementeira, colheita, festas
do sol, da lua e da fertilidade (FAHLBUSCH, 1990).
Uma dança envolve valores, envolve cultura. Para entender uma dança, é preciso
entender o meio cultural no qual ela está inserida, os movimentos dançados contam
histórias, apresentam problemas ancestrais, místicos ou mesmo de origem urbana
contemporânea. Dança de salão, dança de rua, dança do ventre, danças folclóricas, dança
clássica, jazz, dança moderna, dança contemporânea, sapateado, dança aeróbica, dança
do créu, dança rebolation, dança da cordinha, dança da garrafa, dança do quadrado,
dança do entope e desentope, dança da gordura, dança da galinha, dança da bundinha.
São muitas as danças que surgem nas telas da TV.
A dança vem participando deste processo de midiatização via televisão desde o seu advento
no Brasil. Das antológicas performances de Rita Cadillac, na Buzina do Chacrinha, às
antigas coreografias da abertura do Fantástico, ou ainda da Dança da Galinha Azul, que o
apresentador Gugu Liberato ensinava no programa Viva a Noite e que expressa nos versos da
música a febre na qual a coreografia se transformou: “De Leste a Oeste, de Norte a Sul / A
onda é a dança da galinha Azul” (SANTOS, 2005, p. 77).
Daniel Filho, ator, diretor e produtor, chama a televisão de circo eletrônico, por considerar
que é do circo que a televisão retira suas características de grande show de variedades pelo
qual desfilam curiosidades, personalidades, músicos e verdadeiros mágicos do entretenimento
(COSTA, 2005, p. 128).
6 PASSOS COREOGRAFADOS
Por meio de pesquisa qualitativa, o estudo produziu dados descritivos, que foram
abordados subjetivamente, observando em cada um deles a significância quanto ao
problema levantado, sem haver preocupação com generalizações e em quantificar os
resultados.
fato de serem alunos que nunca participaram de uma aula de dança; dessa forma, suas
experiências com dança eram de outras formas.
7 FECHAM-SE AS CORTINAS...
O estudo mostrou que essas crianças atualmente estão muito ligadas à televisão.
Os momentos de lazer delas crianças são ocupados basicamente por brincadeiras com os
amigos mais próximos de suas casas, algumas atividades domésticas e assistir televisão.
Este “assistir televisão” também não é orientado, ou seja, elas assistem com diferentes
pessoas da família e às vezes sozinhas, escolhendo elas mesmas os programas desejados,
inclusive programações que não são recomendadas para crianças, como as novelas. Essas
crianças mostraram um interesse muito grande pelas novelas, todas relataram assistir
todos os dias. São crianças de 10 e 11 anos que nem poderiam estar vendo novelas, pois
geralmente a faixa etária permitida para essa programação é a partir dos 12 anos. Mas
sabe-se que no Brasil as novelas são campeãs de audiência, é uma rotina muito comum
nas famílias brasileiras sentar-se à frente da televisão para assistir à novela. A família
toda se reúne, inclusive as crianças.
O estudo, de modo geral, mostrou que essas crianças têm percebido as danças que
estão surgindo na televisão e também têm sido estimuladas a vivenciarem na prática
essas danças, porém, não estão tendo essa oportunidade. Faltam iniciativas políticas ou
até mesmo educativas no contexto onde estão inseridas para que tenham acesso à dança.
As cortinas se fecham, mas ainda permanecem muitas dúvidas sobre como essas
crianças podem ter acesso à dança, como a vivência prática da dança pode chegar até
elas, que estão vivenciando a dança pela televisão.
REFERÊNCIAS
MOURA, Alex. Crianças brasileiras são as que mais assistem TV. 2005. Disponível
em: <http://contido.com.br/?aid=73>. Acesso em: 15 fev. 2010.