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MESTRADO EM DIREITO
SÃO PAULO
2017
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO – PUC/SP
Dissertação apresentada à
Banca Examinadora da
Pontifícia Universidade Católica
de São Paulo, como exigência
parcial para obtenção do título
de MESTRE em Direito
Processual Civil, sob a
orientação da Professora
Thereza Celina Diniz de Arruda
Alvim.
SÃO PAULO
2017
Banca Examinadora
AGRADECIMENTOS
INTRODUÇÃO ................................................................................................... 1
1. CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA....................................................... 4
1.1. Cortes Superiores e a origem do recurso ............................................ 5
1.2. Evolução no Brasil ................................................................................. 7
1.3. Modelos de corte no direito comparado............................................. 13
1.4. Funções clássicas e contemporâneas do recurso especial ............. 19
1.4.1. Funções clássicas ................................................................................ 19
1.4.2. Funções contemporâneas ................................................................... 22
1.5. Função primordial do Superior Tribunal de Justiça .......................... 25
1.6. O que se espera do Superior Tribunal de Justiça ............................. 31
1.7. A análise de um caso concreto. Ilustração da atuação do Superior
Tribunal de Justiça ......................................................................................... 36
2. CABIMENTO E REGRAMENTO DO RECURSO ESPECIAL................ 44
2.1. Cabimento ............................................................................................. 44
2.2. Regramento do recurso especial ........................................................ 52
2.2.1. Impugnação da decisão negativa de admissibilidade ...................... 57
2.2.2. Escolha do recurso cabível quando não admitido o especial por
mais de um fundamento ................................................................................ 65
3. REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE ................................................... 71
3.1. Possibilidade de se sanarem vícios ou primazia do julgamento do
mérito recursal ............................................................................................... 73
3.1.1. Jurisprudência defensiva .................................................................... 76
3.2. Requisitos de admissibilidade formais .............................................. 85
3.3. Decisão de única ou última instância ................................................. 86
3.4. Matérias fáticas e probatórias ............................................................. 89
3.5. Análise de questões contratuais ......................................................... 93
3.6. Prequestionamento .............................................................................. 95
3.7. Repercussão Geral – Propostas de Emenda Constitucional (“PEC”)
209/12 e 17/2013 ........................................................................................... 100
4. EFEITOS DOS RECURSOS ................................................................ 107
4.1. Efeito obstativo ................................................................................... 108
4.2. Efeito suspensivo ............................................................................... 109
9
as quais não se poderia adentrar aos temas mais polêmicos nesse trabalho
abordados.
Superados tais pontos, passou-se a expor os requisitos de
admissibilidade, tanto aqueles comuns aos demais recursos, como os
particulares desse inconformismo excepcional, como o prequestionamento, a
decisão de última instância ou mesmo a impossibilidade de discussão de
matérias de fatos e provas na Corte Superior. Não se deixou de explorar — e
até criticar — a jurisprudência defensiva do Superior Tribunal de Justiça e os
importantes avanços nesta seara trazidos pelo novo Código de Processo Civil.
Depois de abordados os requisitos de admissibilidade e interessantes
controversas questões a eles inerentes, explorou-se outro ideal central do
presente trabalho: os efeitos do recurso especial e, em maior profundidade,
aqueles que influenciam precisamente nos limites da atuação do Superior
Tribunal de Justiça, quais sejam, o devolutivo e o translativo.
Especificamente para esses itens, o trabalho almejou abordar algumas
questões de manifesta relevância teórica, mas com grandes impactos na
prática, a fim de tratar dos possíveis limites de atuação do Superior Tribunal de
Justiça, o que deve ser avaliado, inclusive, com as premissas da função de tal
Corte, como uma daquelas de vértice do país.
Por tal razão, foram exploradas algumas conceituações de momentos de
atuação do Superior Tribunal de Justiça; de capítulos da decisão recorrida; e,
em conseguinte, dos limites de atuação da Corte no julgamento do caso
concreto: em resumo, humildemente tentou-se traçar alguns panoramas gerais
para saber exatamente até onde pode o Superior Tribunal de Justiça agir no
caso posto a ele para julgamento, considerando as limitações da Corte em sua
atuação e a função essencial que exerce no sistema judiciário, com evidentes e
grandes reflexos para a sociedade como um todo.
O trabalho não se pretende exaustivo e, muito menos, taxativo sobre as
opiniões que aqui são colocadas, mas, repita-se, intenta despertar a
curiosidade e alimentar o debate para um tema que não apenas é interessante,
como é de enorme relevância para todos que estudam, trabalham, exercem ou
simplesmente têm simpatia com o direito.
Afinal, como se comenta nas primeiras aulas da faculdade, o Direito
está, ainda que implicitamente, em cada ato que se pratica em sociedade. Não
3
1
“Embora os recorrentes os interponham com o indissimulável propósito de satisfazer suas
pretensões, os chamados recurso extraordinários foram criados pela Constituição com a
finalidade primordial de assegurar a hegemonia dela própria e do direito positivo federal.
Mediante o julgamento desses recursos, o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de
Justiça, se terminam revendo pronunciamentos contrários aos recorrentes, exercem a
jurisdição com o transcendental objetivo de indicar aos demais órgãos do Judiciário e à nação
o sentido, o alcance, a vontade das normas constitucionais e de direito federal, assegurando-
lhes interpretação e a consequente aplicação, tanto quanto possível, uniformes” (BERMUDES,
Sergio. Introdução ao Processo Civil, 5ª ed.. Rio de Janeiro: Forense, 2010).
5
4
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; DANTAS, Bruno. Recurso Especial, Recurso Extraordinário
e Ação Rescisória. Revista dos Tribunais, 3ª ed., 2016, p. 294.
5
“No regime federativo, ao lado da Justiça da União, há também a Justiça dos Estados. Essa
dualidade favorece a autonomia dos Estados-membros, que organizam o seu sistema de
justiça. Não se quer dizer com isso que existam jurisdições diversas - já que o Poder Judiciário
é nacional -, mas, sim, que há distribuição de competências.
Ao lado da distribuição de competência legislativa, na esfera federal, estadual e municipal, o
Poder Judiciário se encontra distribuído nos diversos Estados-membros da Federação, cujos
tribunais aplicam leis federais e estaduais.
Distribuída a Justiça dessa maneira, é praticamente impossível que haja uniformidade de
entendimento acerca do direito federal perante todos os tribunais locais. Daí a necessidade de
criar um meio através do qual se possa alcançar a unidade de interpretação do direito federal
aqui compreendidas as normas constitucionais e as normas federais infraconstitucionais”
(MEDINA, José Miguel Garcia. Prequestionamento e Repercussão Geral e outras questões
relativas aos recursos especial e extraordinário. 5ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009,
pp. 20/21).
7
No Brasil, Aliomar Baleeiro relata que “antes mesmo de ser feita nossa
primeira Constituição republicana, onde pontificava o grande Ruy, que
conhecia bem o papel da Suprema Corte americana, já se sonhava com um
tribunal capaz de equilibrar o Legislativo/Executivo e ser o guardião das
liberdades individuais. Assim, em maio de 1889, D. Pedro II recomendou a
Salvador Mendonça e ao Cons. Lafaiete, os quais estavam de malas prontas
para uma visita oficial aos Estados Unidos, que estudassem a Suprema Corte,
pois nela estava a chave do bom funcionamento da Constituição. Sua intenção
era a de substituir o Poder Moderador por um órgão judicial atuante”6.
Assim, é possível considerar que “o recurso extraordinário surgiu, no
Brasil, no momento histórico em que se estruturava juridicamente o Estado
brasileiro, instaurando o regime federativo, inspirado no sistema norte-
americano, e logo após a proclamação da república, através do Decreto 848 de
24 de outubro de 1890. Surgiu em razão da necessidade de se garantir a
supremacia da lei federal e da Constituição, em toda a Federação, e teve
inspiração no writ of error, criado nos Estados unidos da América pelo Judiciary
Act, de setembro de 1789”7.
Desde então, o recurso extraordinário passou por diversas modificações,
em especial com as Constituições promulgadas no grande intervalo de tempo
desde sua criação até hoje. Como o objetivo do presente trabalho, porém, é a
análise da extensão do efeito devolutivo do recurso especial e dos limites da
atuação do Superior Tribunal de Justiça, essa narrativa histórica será feita de
maneira sucinta, no limite para a compreensão das principais alterações
6
Aut. Cit. O Supremo Tribunal Federal, esse outro desconhecido. Rio de Janeiro:
Forense,1968, p. 19.
7
PINTO, Nelson Luiz. Recurso Especial para o Superior Tribunal de Justiça. São Paulo:
Malheiros, 1992, p. 38.
8
10
JORGE, Flávio Cheim. Recurso especial com fundamento na divergência jurisprudencial, in
Aspectos Polêmicos e Atuais dos Recursos Cíveis e de outras formas de impugnação às
decisões judiciais. Coord. Nelson Nery Jr e Teresa Arruda Alvim Wambier. Vol. 04. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2001, p. 375.
11
SILVA, José Afonso da. Do recurso extraordinário no direito processual civil brasileiro. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 1963, p. 476/479.
11
12
GALVÃO, Ilmar. Poder Judiciário. Reforma de 1988. O recurso especial no Superior Tribunal
de Justiça.Informativo Jurídico Biblioteca Min. Oscar Saraiva, v.2., n. 2, p. 73 – 167, jul./dez.,
1990, p. 119.
13
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; DANTAS, Bruno. Recurso Especial, Recurso Extraordinário
e Ação Rescisória. Revista dos Tribunais, 3ª ed., 2016.
14
A Emenda Constitucional 45/2004 trouxe mudanças relevantes para os recursos
extraordinário e especial, como, por exemplo, a correção de equívoco cometido pela
Constituição de 1988, devolvendo ao Supremo Tribunal Federal a competência para analisar a
validade de lei local contestada em face de lei federal.
15
ARRUDA ALVIM. José Manoel de. A EC n. 45 e o Instituto da Repercussão Geral in Reforma
do Judiciário. Primeiros ensaios críticos sobre a EC n. 45/2004, Coord. Teresa Arruda Alvim
Wambier, Luiz Rodrigues Wambier, Luiz Manoel Gomes Jr., Octavio Campos Fischer e Willian
Santos Ferreira. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, pp. 63/99.
12
16
ALVES, José Carlos Moreira. O Poder Judiciário na Nova Constituição. A nova ordem
constitucional – Aspectos polêmicos. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1988, p. 199.
17
BUZAID, Alfredo, Nova Conceituação do Recurso Extraordinário na Constituição do Brasil, in
Estudos de Direito, p. 183.
13
18
“(…) Cortes de Cassação, encarregadas, portanto, do só contraste objetivo entre a tese
albergada no julgado recorrido acerca da exegese de um texto legal, e aquela predominante no
âmbito do Tribunal, sem reformulação, portanto, de juízo de valor acerca do mérito, ou seja, do
acerto ou desacerto da decisão recorrida. (…) . Como se vê, a Cassação francesa é um
tribunal que, em boa medida, sobrepaira aos demais órgãos jurisdicionais singulares e
colegiados, nesse sentido de que não se destina a operar como mais um grau judiciário e,
menos ainda, como uma instância para revisão de matéria de fato ou para correção de
14
órgão a quo qual a interpretação da lei que deveria ser dada na situação
apresentada. Aqui parava a sua atuação, limitada a cassar a decisão recorrida,
mas já dando direções com caráter obrigatório de como o órgão de jurisdição
inferior deveria interpretar a norma (e o direito) no caso concreto.
Nesse sentido, conclui-se, então, que as Cortes de Cassação deixaram,
com a evolução de sua forma de atuação, de apenas verificar o caso concreto
a partir da análise fria da norma, passando a assumir a posição que se espera
de um órgão de Cúpula, no sentido de zelar pela uniformidade da interpretação
da lei. É o que o próprio Piero Calamandrei, primeiro autor a bem explorar o
tema, afirma ao dispor sobre a essencialidade e amplitude que as Cortes de
Cassação tinham21, inclusive em obra que direcionou a criação normativa
italiana, reconhecendo que a uniformidade de interpretação das leis é, em
paralelo, o meio para controle da legalidade das decisões dos tribunais.
Além das Cortes de Cassação, a Europa tinha também como relevantes
para o estudo e evolução do direito, as Cortes de Revisão, com seu maior
exemplo na Alemanha. Tais órgãos, “por aí se entendendo os chamados
Tribunais de grande instância, ou Cortes de Apelação, que, ao conhecer de
impugnações fundadas em divergência jurisprudencial, reexaminam o próprio
fulcro da controvérsia, assim rejulgando a causa”22.
Na Alemanha, esclareça-se, o órgão máximo é o seu Tribunal
Constitucional Federal, que não funciona como uma corte de revisão
propriamente dita, com competência ampla, mas tem a prerrogativa de analisar
e sempre rejulgar as lides que envolvam matérias constitucionais e ofensas à
legislação mais alta do país, a Grundgesetz.
21
“La Corte de casación, aunque forme parte del ordenamento judicial, y constituya incluso la
cúspide suprema de la jerarquia de órganos a los cuales está encomendada la administración
de la justicia, no há sido instituida para conseguir solamente aquella finalidad, en sentido
estrictamente jurisdiccional, para la consecución de la cual están instituidos todos los demás
jueces (a quienes, en contraposición a la Corte de casación, se les suele denominar jueces de
mérito), y que consiste en la actuación del derecho en concreto, mediante declaración de
certeza de las singulares voluntades de ley que emanan, para regular las relaciones
individuales, de la coincidencia de una hipótesis real con una hipótesis legal. También la Corte
de casación coopera, como diremos, a esta función jurisdiccional en sentido estricto, que
consiste en administrar justicia a los particulares; pero esta su cooperación es para ella un
medio, no un fin, puesto que el fin último que ella, como oficio suyo exclusivo, persigue, es un
fin más amplio, y que excede, como veremos, los límites de la controversia particular decidida.”
(CALAMANDREI, Piero. Casación Civil. Traducción de Santiago Sentís Melendo y Marino
Ayerra Redín. Buenos Aiures: Ediciones Jurídicas Europa América, 1959, p. 13).
22
MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Divergência jurisprudencial e Súmula vinculante, 4ª ed.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 238.
16
23
“Como é da natureza do Direito, em uma perspectiva lógico-argumentativa, a admissão de
uma pluralidade de significados oriundos da interpretação, é imprescindível que existe um meio
de institucional encarregado de concentrar o significado final em que esse deve ser tomado em
determinado contexto e de velar pela sua unidade. E é precisamente essa a função que a
Corte suprema deve desempenhar: dar unidade ao Direito mediante a sua adequada
interpretação a partir do julgamento de casos a ela apresentados. Com isso, a função da Corte
suprema é proativa, sendo sua atuação destinada a orientar a adequada interpretação e
aplicação do Direito por parte de toda a sociedade civil e de todos os membros do Poder
Judiciário. A sua função tem no horizonte o futuro: ela atua de maneira proativa com o fim de
guiar a interpretação do Direito, dando a ele unidade. A função da Corte Suprema, portanto,
está em promover a unidade do Direito mediante a sua adequada interpretação. Como, de um
lado, a interpretação jurídica pode dar lugar a uma multiplicidade de significados, e como, de
outro, o Direito encontra-se sujeito à cultura, a unidade do Direito que a Corte Suprema visa a
promover tem duas direções distintas: essa é tanto retrospectiva como perspectiva. Vale dizer:
a Corte Suprema visa à promoção da unidade do Direito tanto para resolver uma questão
jurídica de interpretação controvertida nos tribunais como para desenvolver o Direito diante das
novas necessidades sociais, outorgando adequada solução para questões jurídicas novas”
(MITIDIERO, Daniel. Cortes Superiores e Cortes Supremas. Do controle à interpretação, da
jurisprudência ao precedente. 3ª ed. São Paulo: Revista dos tribunais, 2017, p 79).
17
24
“Exposição feita na reunião da Comissão e justiça, em 02.4.97, aceca da Proposta de
Emenda à Constituição n. 554, de 1995, do Senador Ronaldo Cunha Lima, in Parecer do Sen.
Jefferson Peres”, in VELLOSO, Carlos Mário da Silva. Do Poder Judiciário: Como torná-lo mais
ágil e dinâmico: efeito vinculante e outros temas. In Revista de Direito Administrativo, Rio de
Janeiro, 212, 7-26, abr-jun/1998
18
25
DINAMARCO, Cândido Rangel. Fundamentos do Processo Civil Moderno. Tomo I. 6ª ed.,
São Paulo: Malheiros, 2010, p. 181.
19
central, exercido pela Suprema Corte de Justicia, que analisa os temas através
do chamado juicio de amparo.
No Brasil, como se sabe, a Constituição Federal outorga competência
para legislar sobre processo ao poder central, ou seja, à União, de modo que
resta efetivamente impossibilitada a existência de Cortes Superiores ou
Supremas regionais. Os Tribunais Estaduais e Regionais Federais analisam,
portanto, questões de direito municipal e estadual, além de temas federais sob
a batuta do Supremo Tribunal Federal para aspectos constitucionais e do
Superior Tribunal de Justiça para assuntos de legislação ordinária federal26.
26
Todas as referências extraídas de DINAMARCO, Cândido Rangel. Fundamentos do
Processo Civil Moderno. Tomo I. 6ª ed., São Paulo: Malheiros, 2010, pp. 183/187.
27
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; DANTAS, Bruno. Recurso Especial, Recurso Extraordinário
e Ação Rescisória. São Paulo: Revista dos Tribunais, 3ª ed., 2016, pp. 308/327.
28
CALAMANDREI, Piero. Casación Civil. Traducción de Santiago Sentís Melendo y Marino
Ayerra Redín. Buenos Aiures: Ediciones Jurídicas Europa América, 1959, pp. 45/60.
20
29
“A chamada função nomofilácica é aquela por meio da qual o recurso de cassação/revisão
tem o precípuo papel de buscar a interpretação exata, única e verdadeira da lei, a fim de
garantir a certeza e a estabilidade jurídica. A ideia da nomofilaquia nascei na França, onde,
durante a Revolução Francesa (1789/1799), com influência nas ideologias de Rousseau e
Montesquieu e dos ideais do Iluminismo, lutou-se pela onipotência da lei e pela igualdade dos
cidadãos perante essa lei. A lei passou a ser o centro de todo o sistema, de modo que era
necessária a criação de um mecanismo apto a protege-la de eventuais arbítrios dos
magistrados” (AZZONI, Clara Moreira. Recurso Especial e Extraordinário, Aspectos Gerais e
Efeitos. São Paulo: Atlas, 2009, p. 23).
30
SATTA, Salvatore. Direito processual civil. Trad. Ricardo Rodrigues Gama. Campinas: LZN,
2003, vol. 2, p. 39, apud WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; DANTAS, Bruno. Recurso Especial,
Recurso Extraordinário e Ação Rescisória. Revista dos Tribunais, 3ª ed., 2016, p. 298.
31
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; DANTAS, Bruno. Recurso Especial, Recurso Extraordinário
e Ação Rescisória. Revista dos Tribunais, 3ª ed., 2016, p. 311.
21
Essa função acabou por ganhar corpo com a autonomia que os órgãos
fracionados do Judiciário receberam, de modo que casos semelhantes
passaram a ser tratados de maneira distinta, a depender do local da decisão
(Comarca, Fórum, juiz, etc.). Não é natural que haja decisões conflitantes
dentro de uma estrutura única e a função uniformizadora busca exatamente
evitar que isto aconteça, privilegiando o princípio da igualdade perante a lei32.
Obviamente, a função busca a uniformização dos julgamentos, de modo
a permitir a previsibilidade de quem vai ao Judiciário sobre o seu caso. Afinal, a
propositura de uma ação não pode ser uma loteria a depender do foro ou do
sorteio no momento da distribuição. A igualdade perante a lei e a segurança
jurídica prezam pela previsibilidade, algo absolutamente essencial que o
Código de Processo Civil de 2015 tentou privilegiar ao atribuir mais
mecanismos de prevalência dos precedentes.
Claramente, no entanto, como se dirá diversas vezes ao longo desse
trabalho, o privilégio aos precedentes e a previsibilidade não significa — nem
pode significar — completo engessamento dos posicionamentos
jurisprudenciais. A sociedade está em constante mudança e, do mesmo modo,
deve estar o entendimento do Judiciário, ainda que ambos sejam
consideravelmente vagarosos.
É exatamente por causa dessa constante mudança que se diz ser a
diversidade sucessiva de entendimentos perfeitamente aceitável e até
desejável: “Devemos ressaltar que a diversidade de interpretações ao longo do
tempo é praticamente inevitável: no entanto, o que é importante observar é que
a diversidade simultânea de entendimentos é que é intolerável, ou, ao menos,
perturba seriamente a funcionalidade do direito, diferentemente do que se
32
“O princípio da legalidade, segundo o qual a conduta dos indivíduos é previamente rejulgada
e lhe é dado saber o que pode ou não fazer e as consequências de suas atitudes, deve ser
concretizado de modo engrenado com o princípio da igualdade ou da isonomia. Todos são
iguais perante a lei – havendo, portanto, previsibilidade e segurança jurídica -, se a lei for
compreendida e aplicada da mesma forma para todos. Se assim não for, esvaziam-se por
completo o sentido e a razão de ser desses princípios, base do Estado de Direito. E é a
correção de tais distorções que compõe a essência da função uniformizadora dos recursos
dirigidos aos tribunais de cúpula. Vale dizer, o que se persegue é a consagração de
mecanismo hábil a ensejar que, no curso do processo interpretativo que precede a solução de
um conflito levado ao Judiciário, haja a ‘prorrogação’ da segurança e da estabilidade geradas
no momento da edição da lei. Veja-se bem: não se trata de afirmar que a literalidade da lei
deve prevalecer. O que estamos asseverando é que essa função zela pela prevalência da
uniformidade interpretativa, que impede ofensas à igualdade e à legalidade, de modo que a lei,
que é vocacionada a ter uma única interpretação correta, deve receber sempre, dadas as
mesmas condições fáticas relevantes ao julgamento, a mesma interpretação” (ob. cit., p. 312).
22
33
ARRUDA ALVIM, Eduardo. Direito Processual Civil. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2008, p. 856.
34
“A palavra dikelógica, de origem grega, é composta pela partícula dike, que significa ‘justiça’,
e pelo pospositivo lógiko, cujo significado é ‘relativo à razão’. Assim, a função dikelógica está
associada à busca de justiça no caso levado ao tribunal, mediante a correta aplicação do
direito. Trata-se, pois, da tutela do chamado ius litigatoris" (ob. cit., p. 316).
23
suas posições e vem migrando pouco a pouco para dar mais ênfase para a
norma escrita.
O sistema jurídico brasileiro não se alinha, efetivamente, à corrente
estrita da função paradigmática, segundo a qual há uma obrigatoriedade
severa aos juízes de seguirem todas as decisões de órgãos superiores e,
ainda, algumas vezes, de órgãos de hierarquia equivalente. Também não se
amolda com perfeição à corrente atenuada, segundo a qual o juiz deve levar
“em consideração as decisões anteriores sobre a mesma controvérsia,
estatuindo que ele deve seguir tais decisões a menos que as considere erradas
o bastante para suplantar a presunção inicial a seu favor”35.
Nem lá, nem cá. O Código de Processo Civil busca dar prevalência aos
precedentes com caráter vinculante36, em uma tentativa de não apenas dar
maior segurança jurídica, mas até de fazê-lo dentro de um prazo razoável
(celeridade do processo). Muitas das decisões de órgãos hierarquicamente
superiores permanecem sem poder de persuasão e apenas sugerem uma
forma razoável de se agir, mas sistemas foram implementados para que, na
multiplicidade de casos, fixem-se precedentes a serem seguidos. O racional da
norma é lógico, resta ver se, na prática, funcionará como esperado.
É importante consignar ao final dessa sucinta exposição sobre as
funções dos recursos para as Cortes Superiores, que a atual sistemática
processual buscou, como se disse, dar relevância e criar mecanismos de
estabelecimento de precedentes, mas atuou para permitir que se mantenha a
segurança jurídica dos casos já julgados, em especial quando houver alteração
de entendimento anteriormente consolidado.
Trata-se da possibilidade de modulação de efeitos na hipótese dessa
alteração: “havendo alteração de entendimento, pode o tribunal decidir no
sentido de que só dali para frente é que as decisões se basearão no novo
entendimento, pelo que o cabimento da ação rescisória já estaria afastado (…).
O objetivo do instituto é neutralizar a ‘surpresa’ decorrente da nova posição dos
Tribunais, que equivale à mudança das regras no meio do jogo,
comprometendo fundamentalmente o valor previsibilidade. Trata-se de
35
Ob. cit., pp. 319/320.
36
Confiram-se, a título de exemplo, os artigos 932, IV e V; 976 e seguintes; e 1.030, todos do
Código de Processo Civil de 2015.
25
possibilitar que a nova regra incida dali para frente, como a lei, que rege o
presente e o futuro, mas não o passado”37.
As previsões legais nesse sentido38 são razoáveis e revelam a
importância de se trabalhar processualmente, em juízo especialmente, com o
conceito de previsibilidade, de evitar a surpresa para a parte, que deve saber
exatamente no que está litigando, inclusive quais as consequências e cenários
— até os piores — daquele processo em que é parte. A previsibilidade deve
estar presente e é ela que permite, em larga escala, o respeito ao princípio da
segurança jurídica.
37
Ob. cit., p. 325.
38 o
Sobre a modulação: “Art. 927 (…) § 3 Na hipótese de alteração de jurisprudência dominante
do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores ou daquela oriunda de julgamento de
casos repetitivos, pode haver modulação dos efeitos da alteração no interesse social e no da
o
segurança jurídica. § 4 A modificação de enunciado de súmula, de jurisprudência pacificada
ou de tese adotada em julgamento de casos repetitivos observará a necessidade de
fundamentação adequada e específica, considerando os princípios da segurança jurídica, da
proteção da confiança e da isonomia.”
39
MOREIRA, José Carlos Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil. 12 ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2005, vol. 5, p. 589.
26
42
JORGE, Flávio Cheim. Recurso especial com fundamento na divergência jurisprudencial, in
Aspectos Poêmicos e Atuais dos Recursos Cíveis e de outras formas de impugnação às
decisões judiciais. Coord. Nelson Nery Jr e Teresa Arruda Alvim Wambier. Vol. 04. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2001, p. 377.
28
43
AgRg no REsp n. 527.697, 1ª T., Rel. Min. Luiz Fux, Dje de 01.3.04.
44
“Art. 927. Os juízes e os tribunais observarão: (…) III – os acórdãos em incidente de
assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de
recursos extraordinário e especial repetitivo; IV – os enunciados das súmulas do Supremo
Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria
infraconstitucional. (…)”.
45
ASSIS, Araken de. Manual dos recursos. 8ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, p.
913.
46
CARNEIRO, Athos Gusmão. O Papel da Jurisprudência no Brasil. A súmula e os
precedentes jurisprudenciais. Relatório ao Congresso de Roma in Doutrina Superior Tribunal
de Justiça. Edição Comemorativa – 15 anos. Brasília: Editora Brasília Jurídica Ltda., 2005, pp.
343/344.
29
47
“Art. 998. O recorrente poderá, a qualquer tempo, sem a anuência do recorrido ou dos
litisconsortes, desistir do recurso. Parágrafo único. A desistência do recurso não impede a
análise de questão cuja repercussão geral já tenha sido reconhecida e daquela objeto de
julgamento de recursos extraordinários ou especiais repetitivos”.
30
48
DIDIER JR., Fredie. Curso de direito processual civil: o processo civil nos tribunais, recursos,
ações de competência originária de tribunal e querela nullitatis, incidentes de competência
originária de tribunal. Editora Jus Podivm. Salvador, 2016, p. 596.
49
Processo civil. Questão de ordem. Incidente de Recurso Especial Repetitivo. Formulação de
pedido e desistência no Recurso Especial representativo de controvérsia (art. 543-C, § 1º, do
CPC). Indeferimento do pedido de desistência recursal. - É inviável o acolhimento de pedido de
desistência recursal formulado quando já iniciado o procedimento de julgamento do Recurso
Especial representativo da controvérsia, na forma do art. 543-C do CPC c/c Resolução n.º
08/08 do STJ. Questão de ordem acolhida para indeferir o pedido de desistência formulado em
Recurso Especial processado na forma do art. 543-C do CPC c/c Resolução n.º 08/08 do STJ.
(QO no REsp 1063343/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, CORTE ESPECIAL, julgado em
17/12/2008, DJe 04/06/2009).
31
mar de recursos que lhes assola. O Código de Processo Civil, portanto, não
erra ao dar mais poderes ao Relator, em especial para fazer prevalecer
entendimentos já consolidados, como se vê, por exemplo, da disposição do art.
932 do Código de Processo Civil.
Ainda que vagarosamente, parece estar-se caminhando para privilegiar
corretamente os precedentes — sempre com a previsão de uma forma de
revisão pontual dos precedentes que venham a se revelar errados ou
ultrapassados frente à eventual nova realidade jurídica, social ou mesmo
econômica — e criar uma nova mentalidade, este ponto essencial, que busque
reduzir a interposição de infinitos recursos, principalmente os descabidos ou
protelatórios, a permitir a atuação dos Tribunais como deve ser e não mais na
busca incessante por números de recursos julgados.
As razões para essas limitações, como já abordado nesse trabalho, são
diversas e a essência delas pode ser extraída, mais uma vez, das lições do
Prof. Arruda Alvim: “Avulta, por tudo quanto se disse, enormemente de
importância o reflexo do conteúdo das soluções, em face de determinados
pronunciamentos jurisdicionais, diante da posição ocupada pelo Tribunal na
estrutura do Poder Judiciário, alojada no cume da sua pirâmide. Conquanto a
validade e a eficácia das decisões sejam, normalmente, circunscritas às partes,
as proferidas pelos Tribunais de cúpula transcendem o ambiente das partes e,
com isto, projetam-se o prestígio e autoridade da decisão nos segmentos
menores da atividade jurídica, de todos quantos lidam com o direito, e, mesmo
em espectro maior, para a sociedade toda. É nesta segunda perspectiva, em
grau máximo, que se inserem, por excelência, as decisões do Superior Tribunal
de Justiça. Sendo o mais elevado Tribunal em que se aplica o direito federal
infraconstitucional, ao afirmar a correta inteligência do direito federal – e é
sempre isso que afirma o STJ e não outra coisa -, o valor e o peso inerentes a
tais decisões é enorme, por causa da posição pinacular do STJ. Esta é a razão
em virtude da qual tais pronunciamentos exorbitam do interesse das partes,
projetando-se para toda a sociedade a verdade do seu entendimento e nesta
influindo”52.
52
ARRUDA ALVIM, José Manoel de. A alta função jurisdicional do Superior Tribunal de Justiça
no âmbito do recurso especial e a relevância das questões in Revista de Processo; vol. 96/199,
pp. 37/44; e in Doutrinas Essenciais de Processo Civil, vol. 7, pp. 625/636, out/2011.
34
53
MITIDIERO, Daniel. Cortes Superiores e Cortes Supremas. Do controle à interpretação, da
jurisprudência ao precedente. 3ª ed. São Paulo: Revista dos tribunais, 2017, pp. 17/18.
35
54
MITIDIERO, Daniel. Cortes Superiores e Cortes Supremas. Do controle à interpretação, da
jurisprudência ao precedente. 3ª ed. São Paulo: Revista dos tribunais, 2017, pp. 152.
37
55
"AÇÃO CIVIL PÚBLICA. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. POUPANÇA.
EXPURGOS. INDENIZAÇÃO POR LESÃO A DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS.
EXECUÇÃO INDIVIDUAL. JUROS MORATÓRIOS. MORA EX PERSONA. TERMO INICIAL.
CITAÇÃO NA FASE DE LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO
PROVIDO.
1. As ações civis públicas, em sintonia com o disposto no artigo 6º, VIII, do Código de Defesa
do Consumidor, ao propiciar a facilitação a tutela dos direitos individuais homogêneos dos
consumidores, viabilizam otimização da prestação jurisdicional, abrangendo toda uma
coletividade atingida em seus direitos, dada a eficácia vinculante das suas sentenças.
2. A sentença de procedência na ação coletiva tendo por causa de pedir danos referentes a
direitos individuais homogêneos, nos moldes do disposto no artigo 95 do Código de Defesa do
Consumidor, será, em regra, genérica, de modo que depende de superveniente liquidação, não
apenas para apuração do quantum debeatur, mas também para aferir a titularidade do crédito,
por isso denominada pela doutrina "liquidação imprópria".
3. Com efeito, não merece acolhida a irresignação, pois, nos termos do artigo 219 do Código
de Processo Civil e 397 do Código Civil, na hipótese, a mora verifica-se com a citação do
devedor, realizada na fase de liquidação de sentença, e não a partir de sua citação na ação
civil pública.
4. Agravo regimental a que se nega provimento." (AgRg no REsp 1348512/DF, Rel. Ministro
LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 18/12/2012, DJe 04/02/2013)
38
56
Esclareça-se que o julgamento ainda não é definitivo, pois opostos embargos de declaração,
estão eles ainda pendentes de julgamento. Muito embora não exista trânsito em julgado, uma
brevíssima pesquisa é suficiente para evidenciar que o precedente já vem sendo amplamente
aplicado.
57
No mesmo sentido a declaração de voto da Min, Nancy Andrighi: “A prevalecer a tese de que
os juros de mora devem ser contados da citação em cada execução individual da sentença
coletiva, estar-se-á incentivando a protelação da ação civil pública, sem que isso implique
qualquer ônus ao devedor, que acabará beneficiado por us própria torpeza, em detrimento do
credor, único prejudicado pela demora na conclusão do processo. Mas não é só! Essa situação
acarretará, como contrapartida, a rejeição e o descredito da ação coletiva pelas vítimas de
danos individuais homogêneos, que irão preferir a utilização da via individual, na qual os juros
serão computados desde a citação na ação de conhecimento. Em outras palavras, a se
confirmar o entendimento do voto condutor, o STJ estará incentivando a substituição do
julgamento de uma única ação coletiva pelo julgamento de milhares de ações individuais” (fls.
39
64/65 do acórdão) e também do Min, Herman Benjamin: “Em síntese, pretender que, na Ação
Civil pública, o termo inicial dos juros de mora seja a citação na fase de liquidação/execução
individual da sentença ocasionará tragédia processual decomposta em dois atos e uma
apoteose socialmente desonrosa: o abarrotamento do Judiciário com milhares de processos
tecnicamente desnecessários, veículos do único objetivo de antecipar o dies a quo do
acessório e, em regrassão da História, da (re)processualização individual do processo coletivo,
tudo desaguando, em ápice, no apequenar do acesso democrático e eficaz à Justiça” (fls.
75/76 do acórdão).
58
Confira fls. 38/39 do voto vencedor. REsp 1361800/SP, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, Rel. p/
Acórdão Ministro SIDNEI BENETI, CORTE ESPECIAL, julgado em 21/05/2014, DJe
14/10/2014.
59
Extraído da fl. 39 do voto vencedor, mas há ainda outro trecho relevante sobre o
entendimento do Relator, Min. Sidnei Benetti: “Além disso, evidente que a procrastinação do
início da contagem dos juros moratórios traria em seu bojo o efeito perverso de estimular a
resistência ao cumprimento da condenação transitada em julgado na Ação Coletiva, visto que é
claro que seria economicamente mais vantajoso, como acumulação e trato do capital, não
cumprir de imediato o julgado e procrastinar a efetivação dos direitos individuais, via incontida
recorribilidade, e, quiçá, a eternização da violação de direitos, como ocorre, aliás, na
atualidade, em que a judicialização pulverizada desempenha relevante papel no giro de
assuntos de diversas naturezas — não apenas os referentes a Cadernetas de Poupança e
Planos Econômicos, subjacentes ao caso, mas a todos os demais, que afligem a sociedade na
irrealização de direitos e afogam o Poder Judiciário me multitudinária massa de processos
individuais, para os quais se remeteriam todos os titulares e Cadernetas de Poupança, com
direito reconhecido no julgamento da ação Coletiva” (fl. 40 do voto).
40
60
Confira fl. 43 do voto vencedor.
61
Esclareça-se aqui que o autor deste trabalho não está afirmando a simplicidade do
cumprimento da sentença coletiva dos planos econômicos, ou atestando a correção do
julgamento feito pelo Superior Tribunal de Justiça, mas apenas fazendo uma avaliação partindo
dos pressupostos considerados pela maioria vencedora.
41
caso, ainda que a intenção tenha sido das melhores, essa indispensável
preocupação não existiu62.
O voto vencedor, na verdade, chegou a reconhecer que existiriam
impactos e o cumprimento imediato de sua ordem poderia não ser viável nem
no caso concreto, mas optou por nada avaliar no momento do julgamento:
“Problemas concretos, como o propalado temor de volume de grande monta
para satisfação dos créditos reconhecidos por sentenças condenatórias
proferidas em Ações Civis Públicas, bem que podem merecer o tratamento
adequado proporcional às respectivas dificuldades e peculiaridades, existentes
no sistema jurídico, mas não se irão, aqui, prematuramente indicar”63.
Aqui pecou o Superior Tribunal de Justiça em sua forma de atuação
como Corte Superior. Percebeu um problema no seu posicionamento, mas se
esquivou de dar a solução; preferindo jogar para frente até que chegue a ele
novamente a questão. Não é isto que se espera. Afinal, sendo inviável o
cumprimento da ordem genérica tal como emanada, serão novos recursos
interpostos até que o tema volte a ser analisado pela Corte. Logo, ao invés de
aliviar a carga judiciária, o posicionamento causa um impacto inverso, já que
apenas orienta a tese genérica e geral, sem especificar eventuais
particularidades que, já se sabia à época, existiam e seriam arguidas, o que
criará um novo ciclo recursal completo.
Dos 15 (quinze) Ministros que participaram da sessão de julgamento,
Herman Benjamin, estudioso do tema ação civil pública, foi o único que
demonstrou ampla preocupação com as consequências que a decisão ali
tomada poderia causar não apenas nas ações do tema, mas na sociedade e no
país como um todo. Foi por isso que sugeriu, na hipótese de oposição de
embargos de declaração, já que os votos proferidos até então nada falavam a
62
E não existiu nem no voto vencido, que se limitou a analisar a tese jurídica para chegar a
conclusão distinta, sem nada falar sobre as consequências ou a preocupação com o impacto
que eventual decisão poderia causar: “Desse modo, à guisa de resumo, verifica-se que, na
liquidação/execução individual de sentença genérica proferida em ação civil pública: (I) as
relações processuais são objetiva e subjetivamente distintas; (II) a atividade cognitiva é
desdobrada em duas fases, a primeira produzindo uma sentença genérica, e a segunda
realizando uma ‘liquidação imprópria’; e (III) no caso, a mora é ex persona, exigindo a
interpelação (citação) do devedor para sua caracterização. Logo, o termo inicial para incidência
dos juros moratórios deve ser a data da citação na liquidação/execução individual da sentença
genérica” (fl. 25 do acórdão).
63
Confira fl. 60 do acórdão.
42
64
Confira fl. 78 do acórdão (destaques no original).
65
Confira fl. 79 do acórdão.
43
tal modo genérico como o ocorrido no caso, sem qualquer tipo de modulação
de efeitos.
Nessa linha de raciocínio, portanto, espera-se estejam alinhadas as
duas relevantes e essenciais atuações do Superior Tribunal de Justiça, isto é, a
orientação de interpretação legislativa na esfera federal, ao lado da
preocupação com as consequências que a sua decisão gerará, no intuito de
não apenas uniformizar os entendimentos na esfera do direito, mas manter a
razoabilidade e a ordem na aplicação da posição por ele adotada, evitando-se
consequências catastróficas que poderiam ser geradas em uma análise
exclusivamente jurídica e que não eliminariam, ademais, novos recursos à
Corte. Não se pode deixar de lado, portanto, as peculiaridades que podem vir a
existir no cumprimento casuístico do precedente vinculante.
44
2.1. Cabimento
66
PINTO, Nelson Luiz. Recurso Especial para o Superior Tribunal de Justiça. São Paulo:
Malheiros, 1992, pp. 108/109.
67
Compartilhando o entendimento: “O art. 105, III, a, prevê o cabimento do recurso especial
contra tais decisões quando elas tiverem contrariado ou negado vigência a tratado ou lei
federal. ‘Negar’ vigência consiste em totalmente desconsiderar, não aplicar, uma norma
jurídica. ‘Contrariar’ significa aplicar mal equivocadamente. A rigor, bastaria o emprego desse
segundo termo para abranger as duas hipóteses, como se fez relativamente ao recurso
extraordinário”. WAMBIER, Luiz Rodrigues; TALAMINI, Eduardo. Curso Avançado de Processo
Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 16ª ed., vol. 2, 2016, p. 606.
45
68
Vale fazer a observação de que o teor da Súmula 400 ia de encontro à disposição da alínea
“d” do art. 119, III, da Constituição de 1967, haja vista que previa exatamente o cabimento de
recurso extraordinário quando fosse dada “à lei federal interpretação divergente da que lhe
tenha dado outro Tribunal ou o próprio Supremo Tribunal Federal”. Afinal, razoável ou não a
interpretação, se era ela divergente daquela do Supremo ou de outro tribunal, era cabível o
recurso extraordinário.
69
THEODORO JR., Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Rio de Janeiro: Forense, 48ª
ed., 2016, p. 1.121.
70
ob. cit., p. 1.121.
46
c) der a lei federal interpretação divergente da que lhe haja atribuído outro
tribunal.
71
Inclusive, a Súmula nº 203 do Superior Tribunal de Justiça, assim prevê: “Não cabe recurso
especial contra decisão proferida por órgão de segundo grau dos Juizados Especiais”.
72
MARQUES, José Frederico. Manual de Direito Processual Civil. Atualizado por Vilson
Rodrigues Alves, 2ª ed., vol. III. Campinas: Millennium, 1998, p. 250.
47
73
Aqui se deve considerar lei complementar federal, lei ordinária federal, lei delegada federal,
decreto-lei federal, medida provisória federal e decreto autônomo federal para fins de
cabimento da violação contida no art. 105, III, “a”, da Constituição Federal.
74
Constituição Federal: “Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a
guarda da Constituição, cabendo-lhe: (…) III – julgar, mediante recurso extraordinário, as
causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida: (…) d) julgar válida
lei local contestada em face de lei federal”.
48
75
ARRUDA ALVIM, Eduardo. Direito Processual Civil. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2008, p. 865.
76
Súmula 13 do Superior Tribunal de Justiça: “A divergência entre julgados do mesmo tribunal
não enseja recurso especial”.
77
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; DANTAS, Bruno. Recurso Especial, Recurso Extraordinário
e Ação Rescisória. Revista dos Tribunais, 3º ed., 2016, pp. 327/328. Na mesma linha: Flavio
Cheim Jorge. Recurso especial com fundamento na divergência jurisprudencial. In: Nelson
Nery junior e Tereza Arruda Alvim Wambier (coord.). Aspectos polêmicos e atuais dos recursos
49
cíveis e de outras formas de impugnação às decisões judiciais – 4ª série. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2001.
78
“Tem-se em princípio que as hipóteses de cabimento das alíneas b e c constituem-se, na
generalidade dos casos, em subespécies daquela albergada na alínea a. Com efeito, nessas
hipóteses é possível falar em contrariedade à lei federal” ARRUDA ALVIM, Eduardo. Direito
Processual Civil. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 865.
50
79
Ob. cit. Pp. 117/118.
80
MOREIRA, José Carlos Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil. 6ª ed. Rio de
Janeiro: Forense, 1994, vol. 5, pp. 163/164.
51
81
DIDIER JR, Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da. Curso de Direito Processual Civil.
Salvador: JusPodivm, 2016, 13ª ed., p. 349.
82
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. DANTAS, Bruno. ob.cit., p. 334.
52
83
Súmula nº 284 STF: “é inadmissível recurso extraordinário, quando a deficiência na sua
fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia”.
53
84
“PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.
OFENSA AO ART. 126, § 4º, DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE SÃO PAULO. SÚMULA
280/STF. VIOLAÇÃO AO ART. 620 DA CLT. ALUSÃO DE FORMA VAGA AO DISPOSITIVO.
SÚMULA 284/STF. SIMPLES REITERAÇÃO DAS ALEGAÇÕES VEICULADAS NO RECURSO
ANTERIOR. (…)
II - A ausência de demonstração precisa de como a violação ao dispositivo de lei federal teria
ocorrido, limitando-se a parte recorrente em, apenas citar, de forma vaga, o aludido dispositivo,
impede o conhecimento do recurso especial, pela aplicação, por analogia, do entendimento da
Súmula 284, do Colendo Supremo Tribunal Federal. II - O Agravante não apresentam
argumentos capazes de desconstituir a decisão agravada. III - Agravo regimental improvido.”
(AgRg no AREsp 185.799/SP, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA,
julgado em 03/03/2015, DJe 11/03/2015).
85
A considerar a sistemática do Código de Processo Civil de 1973, o recurso de apelação
também se submetia ao duplo juízo de admissibilidade: em 1º Grau e no Tribunal. O projeto do
novo CPC havia excluído a dupla admissibilidade de todos os recursos, mas a Lei nº 13.256/16
o estabeleceu novamente para o especial e o extraordinário.
54
86
“Interposto o recurso excepcional, perante o tribunal a quo, o recorrido é intimado para
apresentar resposta e, finalizado esse prazo, os autos do processo são conclusos ao
presidente ou vice-presidente para adotar uma das providências previstas nos incisos do art.
1.030 do CPC/2015, dentre as quais a de realizar o primeiro juízo de admissibilidade dos
recursos excepcionais. Verifica-se, assim, que esse dispositivo, incluído pela Lei 13.256, de 04
de Fevereiro de 2016, reintroduziu o duplo juízo de admissibilidade dos recursos excepcionais
que não constava do texto original do Código de Processo Civil de 2015, pois primeiramente o
Código de Processo Civil de 2015 determinava a interposição do recurso excepcional no
tribunal a quo e sua remessa imediata às Cortes Superiores, sem realizar qualquer juízo de
admissibilidade. O art. 1.030 do CPC/2015, entretanto, estabelece uma série de possíveis atos
que devem ser concretizados ainda no tribunal recorrido, prescrevendo a prática de atos que
otimizam a uniformização da jurisprudência dos Tribunais Superiores” (AURELLI, Arlete Inês.
CIMARDI, Cláudia Aparecida. O juízo de admissibilidade dos recursos excepcionais no Código
de processo Civil de 2015, in Questões Relevantes sobre Recursos, Ações de Impugnação e
Mecanismos de Uniformização da Jurisprudência após o primeiro ano de vigência do novo
CPC. Coord. Bruno Dantas, Cassio Scarpinella Bueno, Cláudia Elisabete Shwerz Cahali e Rita
Dias Nolasco. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017, p. 180).
87
Ob. citada, p. 177.
88
RISTJ. “Art. 255. O recurso especial será interposto na forma e no prazo estabelecido na
legislação processual vigente, e recebido no efeito devolutivo, salvo quando interposto do
julgamento de mérito do incidente de resolução de demandas repetitivas, hipótese em que terá
efeito suspensivo. § 1º Quando o recurso fundar-se em dissídio jurisprudencial, o recorrente
fará a prova da divergência com a certidão, cópia ou citação do repositório de jurisprudência
oficial ou credenciado, inclusive em mídia eletrônica, em que houver sido publicado o acórdão
divergente, ou ainda com a reprodução de julgado disponível na internet, com indicação da
respectiva fonte, devendo-se, em qualquer caso, mencionar as circunstâncias que identifiquem
ou assemelhem os casos confrontados. § 2º revogado. § 3º São repositórios oficiais de
jurisprudência, para o fim do § 1º deste artigo, a Revista Trimestral de Jurisprudência do
Supremo Tribunal Federal, a Revista do Superior Tribunal de Justiça e a Revista Tribunal
55
alterado para ficar justamente alinhado com o novo processo civil pela Ementa
Regimental nº 22 de 2016.
Especificamente com relação à obrigação contida na parte final dos
dispositivos, legal e regimental, deve a parte recorrente expor em suas razões
recursais, detidamente, que o acórdão recorrido deu à lei federal interpretação
divergente da que lhe haja atribuído outro tribunal, explorando as semelhanças
fáticas e a conclusão distinta. É o que se chama de cotejo analítico dos
acórdãos, não bastando a mera transcrição das ementas do julgado recorrido e
do paradigma, como entende pacificamente o próprio Superior Tribunal de
Justiça:
90
De um modo geral, o autor cita precisamente os seguintes pontos para a viabilidade da
interposição do recurso especial pela alínea “c” do art. 105, III, da Constituição Federal, além
do já mencionado acima: “A divergência de interpretação dada a norma federal, para que seja
relevante, para fins de recurso especial, deve obedecer aos seguintes requisitos: 1) o acórdão
confrontado não pode ser do mesmo tribunal em suas câmaras, turmas ou seções. A
divergência interna não enseja recurso especial, exigindo-se decisão de outro tribunal; 2) o
acórdão confrontado deve ter sido proferido em última instância ordinária, não valendo como
divergente a decisão se no tribunal ainda poderiam caber, por exemplo, embargos infringentes
[não mais existentes]. A divergência pode ser, contudo, com decisão do próprio Superior
Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal, porque são outros tribunais. 3 a
interpretação dada à lei federal pelo acórdão que serve de paradigma não pode encontrar-se
superada no próprio tribunal de origem ou pela jurisprudência dos tribunais superiores (…) 4)
ainda, a divergência deverá estar explícita no corpo do acórdão e não na ementa, que é
meramente explicativa, devendo, também, ter sido a interpretação a razão de decidir; 5)
finalmente, para que a divergência seja considerada, é necessário que o acórdão divergente
esteja comprovado por certidão ou esteja transcrito em repertório oficial ou reconhecido cuja
referência deve ser expressa, transcrevendo-se os trechos conflitantes” (GRECO FILHO,
Vicente. Direito Processual Civil Brasileiro. 20ª ed., vol. 2. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 374).
91
“Art. 489, § 1º. não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela
interlocutória, sentença ou acórdão, que: I - se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase
de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida; II - empregar
conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso;
III - invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão; IV - não enfrentar
todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão
adotada pelo julgador; V - se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem
identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se
ajusta àqueles fundamentos; VI - deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou
precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em
julgamento ou a superação do entendimento”.
57
92
BARBOSA MOREIRA, José Carlos. O Juízo de Admissibilidade no Sistema dos Recursos
Civis. Imprenta: Rio de Janeiro, 1968, pp. 33/34.
93
“(…) a lei distingue as hipóteses em que o presidente ou vice-presidente do tribunal a quo
‘nega seguimento’ (CPC 1.030, I) ao recurso, dos casos em que ele ‘profere juízo de
admissibilidade’ (CPC, 1.030, V). Na verdade, negar seguimento significa proferir juízo negativo
de admissibilidade, pois tranca a via recursal e impede o recurso seja julgado pelo mérito. (…)
Doutra parte, não é ocioso dizer que, como negativa de seguimento (CPC, 1.030, I) caracteriza
situação detrimentosa, restritiva do direito do recorrente, as hipóteses em que a lei prevê deva
o tribunal a quo negar seguimento ao recurso são de interpretação estrita, vedada a aplicação
analógica ou extensiva a situações assemelhadas” (NERY JR. Nelson; ANDRADE NERY, Rosa
Maria. Código de Processo Civil Comentado. 16ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016,
p. 2.330).
58
94
“Art. 1.030. Recebida a petição do recurso pela secretaria do tribunal, o recorrido será
intimado a apresentar contrarrazões no prazo de 15 (quinze) dias, findo o qual os autos serão
conclusos ao presidente ou ao vice-presidente do tribunal recorrido, que deverá: (…) § 1º Da
decisão de inadmissibilidade proferida com fundamento no inciso V caberá agravo ao tribunal
superior, nos termos do art. 1.042”.
95
“Art. 1.030. § 2º Da decisão proferida com fundamento nos incisos I e III caberá agravo
interno, nos termos do art. 1.021”.
96
“O distinguishing expressa a distinção entre casos para o efeito de se subordinar, ou não, o
caso sob julgamento a um precedente. A necessidade de distinguishing exige, como
antecedente lógico, a identificação da ratio decidendi do precedente. Como a ratio espelha o
precedente que deriva do caso, trata-se de opor o caso sob julgamento à ratio do precedente
decorrente do primeiro caso.
Assim, é necessário, antes de mais nada, delimitar a ratio decidendi, considerando-se os fatos
materiais do primeiro caso, ou seja, os fatos que foram tomados em consideração no raciocínio
judicial como relevantes ao encontro da decisão. De modo que o distinguishing revela a
demonstração entre as diferenças fáticas entre os casos ou a demonstração de que a ratio do
precedente não se amolda ao caso sob julgamento, uma vez que os fatos de um e outro são
diversos. (...)
Diferenças fáticas entre casos, portanto, nem sempre são suficientes para se concluir pela
inaplicabilidade do precedente. Fatos não fundamentais ou irrelevantes não tornam casos
desiguais. Para realizar o distinguishing, não basta o juiz apontas fatos diferentes, cabendo-lhe
argumentar para demonstrar que a distinção é material, e que, portanto, há justificativa para
não se aplicar o precedente. Ou seja, não é qualquer distinção que justifica o distinguishing. A
distinção fática deve revelar uma justificativa convincente, capaz de permitir o isolamento do
caso sob julgamento em face do precedente. Note-se que exatamente pela circunstância de
que o distinguishing depende de justificativa, há que se ter uma pauta racional uniforme na
identificação dos seus critérios. Ou melhor, há que se uniformizar a aplicação dos próprios
critérios para a realização do distinguishing, criando-se aí também uma obrigação de se
respeitarem as decisões passadas.” (MARINONI, Luiz Guilherme. Precedentes obrigatórios.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, pp. 326/327).
59
97
MENDES, Gilmar Ferreira. A ação declaratória de constitucionalidade: a inovação da EC 2,
de 1993 in Ação Declaratória de constitucionalidade, coord. Ives Gandra Martins e Gilmar
Mendes Ferreira. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 57, nota de rodapé 25 apud MANCUSO,
Rodolfo de Camargo. Divergência jurisprudencial e Súmula vinculante, 4ª ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2010, p. 197.
98
Apud MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Divergência jurisprudencial e Súmula vinculante, 4ª
ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 197/198.
60
99
“Desse modo, é competente, de modo definitivo, para proferir os juízos de admissibilidade e
de mérito dos recursos, o tribunal ad quem, isto é, o tribunal destinatário do recurso, aquele a
quem a CF (LGL\1988\3) e a lei conferem a tarefa de julgar o inconformismo manifestado por
meio do recurso. O STF e o STJ, a quem a CF (LGL\1988\3) confere competência para julgar
RE e REsp, respectivamente, não podem declinar desse mister constitucional. Também não se
pode ‘delegar’ para outro tribunal, a competência para proferir definitivamente os dois juízos
(admissibilidade e mérito) – ou apenas um deles (admissibilidade) – do recurso. Ao determinar
a tão só impugnabilidade por agravo interno para o próprio tribunal a quo, da decisão do relator
que nega seguimento ao RE/REsp com fundamento no CPC (LGL\2015\1656) 1030 I e III, o
CPC (LGL\2015\1656) 1030 § 2º praticamente obstaculiza a via recursal para os Tribunais
Superiores, fazendo com que a causa termine definitivamente no tribunal local, sem que tenha
havido oportunidade de a mesma causa, recorrível por RE/REsp, ser analisada pelo STF e/ou
STJ. Não se pode impedir que o tribunal competente (STF e STJ) julgue a admissibilidade
definitiva dos recursos que, pela CF 102 III e 105 III, têm eles a competência para julgar”.
(NERY JR., Nelson. ABBOUD, Georges. Recursos para os Tribunais Superiores e a Lei
13.256/2016 in Revista de Processo, vol. 257/2016, p. 217-235, jul/2016, pp. 10/11).
100
“Art. 988. Caberá reclamação da parte interessada ou do Ministério Público para: (…) IV –
garantir a observância de acórdão proferido em julgamento de incidente de resolução de
demandas repetitivas ou de incidente de assunção de competência; (…) § 4º As hipóteses dos
incisos III e IV compreendem a aplicação indevida da tese jurídica e sua não aplicação aos
casos que a ela correspondam”.
61
101
NERY JR., Nelson. ABBOUD, Georges. Recursos para os Tribunais Superiores e a Lei
13.256/2016 in Revista de Processo, vol. 257/2016, p. 217-235, jul/2016, pp. 11/12.
62
102
“O cabimento do agravo do CPC 1042 contra a decisão colegiada do TRF ou TJ que, ao
julgar o agravo interno, mantém a decisão do Presidente ou Vice-Presidente do tribunal que
negou seguimento ao RE/REsp ou julgou a questão do sobrestamento, é conclusão que se
extrai do sistema constitucional, para que se dê ao CPC 1030 parágrafo 2.° e CPC 1042 caput,
que esteja em conformidade com o texto constitucional, que fixa a competência do STF e do
STJ para julgar o RE ou REsp, respectivamente. Isto significa que a sistemática trazida pela
reforma constante da L 13256/2016 (DOU 5.2.2016) só não será inconstitucional se se der aos
dispositivos aqui mencionados interpretação conforme a Constituição. Criou-se, na verdade,
mais uma etapa para o juízo de admissibilidade de RE/REsp: negado seguimento ao recurso
ou julgada a questão do sobrestamento, o recorrente não poderá interpor agravo diretamente
no STF/STJ, mas sim deverá interpor agravo interno (CPC 1021) para o colegiado tribunal
local. Este é o passo criado pela L 13256/2016. O entendimento contrário, de que não caberia
nenhum recurso do acórdão que resolver o agravo interno, estaria sendo subtraída a
competência constitucional do STF/STJ, ou, caso os tribunais superiores concordem com esse
sistema, estariam renunciado à competência constitucional, o que é inadmissível. O sistema do
CPC foi todo criado e concebido para que o juízo de admissibilidade do RE/REsp fosse feito
diretamente no tribunal competente: STF/STJ. Ao modificar-se o sistema originário pela L
13256/2016, onerou-se sobremodo os tribunais regionais federais e os tribunais de justiça, cujo
colegiado terá de resolver número considerável de agravos internos interpostos contra decisão
proferida pelo Presidente ou Vice-Presidente. (…) Contra a decisão monocrática do presidente
ou vice-presidente do tribunal de origem que negar seguimento a RE e/ou REsp, nos casos do
CPC 1030 I (negar seguimento ao RE e/ou REsp) e III (sobrestar o andamento do RE e/ou
REsp), não cabe, pela via direta, agravo para o STF e/ou STJ, mas agravo interno para órgão
colegiado do próprio tribunal a quo (CPC 1021). Contra a decisão do colegiado do tribunal a
quo proferida no julgamento do agravo interno, se não conhecido ou negado provimento ao
agravo, subsistindo, portanto, a decisão do Presidente ou Vice-Presidente do tribunal local,
cabe o agravo do CPC 1042. Além do agravo do CPC 1042, pode caber, em tese, outro RE ou
REsp, conforme o caso e se preenchidos os pressupostos constitucionais da CF 102 III e 105
III, respectivamente” (NERYJR, Nelson. NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo
Civil Comentado. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016, página 2.390/2.391 e 2.334).
63
103
“Já contra as decisões indicadas nos itens i, ii, iii e v, acima, caberá agravo interno, no prazo
de quinze dias, a ser julgado pelo órgão colegiado indicado como competente no regimento
interno do tribunal a quo (art. 1.030, § 2º, na redação dada pela Lei 13.256/2016). Essa regra
reflete uma orientação jurisprudencial adotada pelo STF e o STJ ainda na vigência do
CPC/1973. Só se justifica pela perspectiva desses tribunais de tentarem diminuir um pouco de
sua avassaladora carga de trabalho, pois: (1º) o presidente ou vice presidente do tribunal local,
ao proceder ao exame de admissibilidade do recurso extraordinário ou especial atua por
delegação do STF ou STJ, respectivamente — e não por delegação de qualquer órgão
colegiado de seu tribunal. Sob esse aspecto, não se justifica remeter o reexame da questão a
um órgão interno do tribunal local; (2º) a decisão do agravo interno será retratada em um
acórdão, contra o qual poderão caber, novamente, recursos especial e extraordinário. Ou seja,
sob a perspectiva do judiciário como um todo, trata-se de solução antieconômica e que
conspira para uma duração ainda maior do processo” (WAMBIER, Luiz Rodrigues; TALAMINI,
Eduardo. Curso Avançado de Processo Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 16ª ed., vol. 2,
2016, p. 615).
64
104
MEDINA, José Miguel Garcia. Novo Código de Processo Civil Comentado, com remissões e
notas comparativas ao CPC/1973. 4ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, p. 1.551.
65
105
“Agravo para o STF/STJ (CPC 1042) e agravo interno (CPC 1021). Caso o recurso
excepcional seja interposto com vários fundamentos (v.g. CF 102 III a e b, CF 105 III a e c) e
haja a decisão de negativa do seguimento ao RE/REsp com base, e.g., no CPC 1030 I e V,
parte da decisão é impugnável por agravo interno e parte pelo agravo do CPC 1042.
Consideram-se os capítulos da decisão para efeito de recorribilidade, de sorte que o recorrente
deverá interpor os dois agravos simultaneamente. O agravo da decisão denegatória com base
no CPC 1030 V é dirigido ao STF/STJ (CPC 1042), ao passo que o capítulo da decisão que
denegou o recurso excepcional com fundamento no CPC 1030 I é impugnável por agravo
interno (CPC 1021), conforme determinam os parágrafos 1° e 2° do CPC 1030. O recorrente
não pode interpor somente o agravo do CPC 1042 para o tribunal superior abarcando todos os
capítulos, porque não terá sido esgotada a via recursal ordinária, já que previsto o agravo
interno contra o capítulo da decisão denegatória fundada no CPC 1030 I. Da decisão do
tribunal a quo no agravo interno, se improvido, caberá o agravo do CPC 1042 para o STF/STJ.”
(NERYJR, Nelson. NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil Comentado. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016, página 2.334)
66
106
NERY JR., Nelson. ABBOUD, Georges. Recursos para os Tribunais Superiores e a Lei
13.256/2016 in Revista de Processo, vol. 257/2016, p. 217-235, jul/2016, p. 13.
107
STJ, AgRg nos Edcl no AREsp 574.189/SC, 4ª T., j. 03/03/2015, Rel. Min. Marco Buzzi.
67
108
MEDINA, José Miguel Garcia. Novo Código de Processo Civil Comentado, com remissões e
notas comparativas ao CPC/1973. 4ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, p. 1.549.
109
Nesse sentido o AgRg no AREsp 260.033/PR, Corte Especial, j. 05/08/15, Rel. Min. Raul
Araújo.
68
110
Reproduza-se a ementa do julgado: “AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1.168.877 -
RS (2017/0233861-5) RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO AGRAVANTE :
BANCO DO BRASIL S/A ADVOGADO : RAFAEL SGANZERLA DURAND E OUTRO (S) -
RS080026A AGRAVADO : CANISIO ZIMERMANN ADVOGADOS : RENZO THOMAS -
RS047563 ROGERS WELTER TROTT - RS065022 RENAN THOMAS E OUTRO (S) -
RS074371 DECISÃO 1. Cuida-se de agravo do BANCO DO BRASIL S/A contra decisão que
(a) negou seguimento a recurso especial no que se refere à questão do termo inicial dos juros
de mora, com base no art. 1.030, I b, do CPC/2015, tendo em vista que o acórdão recorrido
está em consonância com tese firmada em sede de recurso repetitivo e (b) inadmitiu o recurso
especial em relação à prescrição, em face da aplicação da Súmula 282/STF. (…). 2. A decisão
agravada foi publicada já na vigência do atual Código de Processo Civil, o qual prevê, em seu
art. 1.030, I, b, § 2º, do CPC/2015, que cabe agravo interno contra a decisão que nega
seguimento a recurso especial interposto contra acórdão em conformidade com entendimento
do STJ em recurso repetitivo. Confira: Art. 1.030. Recebida a petição do recurso pela secretaria
do tribunal, o recorrido será intimado para apresentar contrarrazões no prazo de 15 (quinze)
dias, findo o qual os autos serão conclusos ao presidente ou ao vice-presidente do tribunal
recorrido, que deverá: I negar seguimento: [...] b) a recurso extraordinário ou a recurso especial
interposto contra acórdão que esteja em conformidade com entendimento do Supremo Tribunal
Federal ou do Superior Tribunal de Justiça, respectivamente, exarado no regime de julgamento
de recursos repetitivos; [...] § 2º Da decisão proferida com fundamento nos incisos I e III caberá
agravo interno, nos termos do art. 1.021. Diante da expressa previsão legal do cabimento de
agravo interno, a interposição de agravo em recurso especial constitui falha inescusável que
impede a aplicação do princípio da fungibilidade recursal. (…). Em relação à prescrição,
verifica-se que o Tribunal de origem não enfrentou o tema no acórdão recorrido, carecendo,
portanto, a matéria do indispensável prequestionamento. 4. Ante o exposto, conheço em parte
do agravo em recurso especial e nego-lhe provimento. Publique-se. Intimem-se. Brasília, 26 de
setembro de 2017. MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO Relator” (STJ - AREsp: 1168877 RS
2017/0233861-5, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Publicação: DJ
29/09/2017).
69
3. REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE
111
BERMUDES, Sergio. Introdução ao Processo Civil, 5ª ed.. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p.
165.
112
BARBOSA MOREIRA, José Carlos. O Juízo de Admissibilidade no Sistema dos Recursos
Civis. Imprenta: Rio de Janeiro, 1968. p. 130.
72
113
E mais adianta complementa o autor: “A verdade é que ali, ocorre flagrante invasão da
competência do Supremo Tribunal Federal, a que pertence, com exclusividade, julgar o recurso
no mérito, pela autoridade judiciária inferior, à qual defere a lei tão somente, competência para
denegar recursos inadmissíveis, e não infundados”. (BARBOSA MOREIRA, José Carlos. O
Juízo de Admissibilidade no Sistema dos Recursos Civis. Imprenta: Rio de Janeiro, 1968, pp.
37/38).
73
114
“Art. 1.029. O recurso extraordinário e o recurso especial, nos casos previstos na
Constituição Federal, serão interpostos perante o presidente ou o vice-presidente do tribunal
recorrido, em petições distintas que conterão: (…) § 3º O Supremo Tribunal Federal ou o
Superior Tribunal de Justiça Poderá desconsiderar vício formal de recurso tempestivo ou
determinar sua correção, desde que não o repute grave”.
115
“Art. 4º. As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito,
incluída a atividade satisfativa”.
116
“Art. 932. Incumbe ao relator: (…) Parágrafo único. Antes de considerar inadmissível o
recurso, o relator concederá o prazo de 5 (cinco) dias ao recorrente para que seja sanado vício
ou complementada a documentação exigível”.
74
117
DIDIER JR, Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da. Curso de Direito Processual Civil.vol. 3,
Salvador: JusPodivm, 2016, 13ª ed, pp. 318/319
118
MIRANDA, Pedro Miranda de Oliveira in Breves Comentários ao Código de Processo Civil.
Coord. Teresa Arruda Alvim Wambier; Fredie Didier Jr.; Eduardo Talamini e Bruno Dantas. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 2.299/2.300.
119
Aut. cit. Curso de Direito Processual Civil.vol. 3, Salvador: JusPodivm, 2016, 13ª ed, pp.
318/319
75
120
MEDINA, José Gabriel Garcia. Pelo fim da jurisprudência defensiva: uma utopia?.
Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2013-jul-29/processo-fim-jurisprudencia-defensiva-
utopia>.
77
campo minado no caminho para o julgamento do mérito recursal. Não basta ter
um bom direito para vencer, é necessário um advogado treinado para vencer
as verdadeiras armadilhas que esse sistema vem criando e, além disso, uma
boa dose de sorte”121.
O Código de Processo Civil tentou mitigar a situação, como já
ponderado no capítulo precedente e, para iniciar o tema, vale citar as previsões
dos arts. 1.032122 e 1.033123, que trazem importante inovação no sistema dos
recursos especial e extraordinário ao prever que, na hipótese de se interpor um
recurso especial e o Superior Tribunal de Justiça entender ser a matéria
constitucional ou na hipótese de se interpor um recurso extraordinário e o
Supremo Tribunal Federal entender ser a matéria infraconstitucional, não se
deixar de julgar a pretensão da parte posta em juízo, mas sim converter o
recurso interposto no cabível, com as respectivas formalidades, a fim de que o
Tribunal efetivamente competente julgue a questão controvertida.
Está-se diante, portanto, de mais uma das previsões da atual sistemática
processual, que busca evitar a jurisprudência defensiva dos tribunais, em
detrimento do julgamento do direito da parte posto em juízo. Evita-se, assim,
corretamente, que se deixe de julgar um recurso por um eventual vício formal,
que é perfeitamente passível de ser sanado.
Reproduzam-se, pela precisão, as ponderações da Prof.ª Teresa Arruda
Alvim nos Primeiros Comentários ao Novo Código de Processo Civil: “Trata-se
de inovação com diversos objetivos, mas o principal é o de evitar um dos casos
de jurisprudência ‘defensiva’, consubstanciado em acórdãos em que um
Tribunal diz que a competência é do outro. E nenhum dos dois julga. Diz este
artigo que, se o relator do recurso especial entender que a questão sobre a
qual versa este recurso é constitucional, em vez de, pura e simplesmente, não
apreciar o mérito do recurso, deve remetê-lo ao STF. Antes disso, deve dar à
121
DINAMARCO, Cândido Rangel. Fundamentos do Processo Civil Moderno. Tomo II. 6ª ed.,
São Paulo: Malheiros, 2010, p. 1.073.
122
“Art. 1.032. Se o relator, no Superior Tribunal de Justiça, entender que o recurso especial
versa sobre questão constitucional, deverá conceder prazo de 15 (quinze) dias para que o
recorrente demonstre a existência de repercussão geral e se manifeste sobre a questão
constitucional”.
123
“Art. 1.033. Se o Supremo Tribunal Federal considerar como reflexa a ofensa à Constituição
afirmada no recurso extraordinário, por pressupor a revisão da interpretação de lei federal ou
de tratado, remetê-lo-á ao Superior Tribunal de Justiça para julgamento como recurso especial.
78
***
124
Ob. cit., p. 1.499.
125
O entendimento chegou até a ser Sumulado no verbete 418: “É inadmissível o recurso
especial interposto antes da publicação do acórdão dos embargos de declaração, sem
posterior ratificação”.
79
126
AgRg no Ag 655610/MG, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, Rel. p/ Acórdão Ministro
FRANCISCO PEÇANHA MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 05/04/2005, DJ
01/08/2005, p. 399.
80
127
Requisitos de admissibilidade dos recursos: entre a relativização e as restrições indevidas
(jurisprudência defensiva), in RePro, vo. 217/2013, p. 13 – 39, Mar/13, DTR\2013\1834.
128
TUCCI, José Rogério Cruz e. Um basta à perversidade da jurisprudência defensiva.
Disponível em:
http://www.conjur.com.br/2014-jun-24/basta-perversidade-jurisprudencia-defensiva
81
129
"AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. INTERPOSIÇÃO DO
RECURSO ESPECIAL ANTES DA PUBLICAÇÃO DO ACÓRDÃO RECORRIDO EM ÓRGÃO
OFICIAL. TEMPESTIVIDADE. HOMICÍDIO QUALIFICADO NA FORMA TENTADA E LESÕES
CORPORAIS GRAVES. PRONÚNCIA. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA. LEGÍTIMA
DEFESA. IMPOSSIBILIDADE. REEXAME DE PROVAS. SÚMULA 7/STJ. RECURSO
IMPROVIDO.
1. O Superior Tribunal de Justiça no julgamento dos Embargos de Divergência n. 492.461/MG,
modificando entendimento há muito consolidado, passou a considerar tempestivo o recurso
especial interposto antes da publicação oficial, haja vista a nova realidade da publicidade das
decisões judiciais em meio eletrônico que possibilitam às partes o conhecimento prévio do
acórdão antes mesmo de sua veiculação oficial. Tal orientação foi novamente alterada pela
Corte Especial no julgamento dos EDcl na SEC 3660/GB, no sentido de ser intempestivo o
especial interposto antes da publicação do acórdão recorrido no Diário Oficial.
2. Contudo, imperiosa a revisão desse último entendimento, visto que o Superior Tribunal de
Justiça, como Tribunal da cidadania, não pode se dissociar da realidade, notadamente da
grande evolução dos meios de comunicação e informação nos dias atuais, em obediência aos
princípios da instrumentalidade das formas, da igualdade, da boa-fé objetiva, celeridade e
lealdade processuais.
3. Entretanto, apesar de se constatar a tempestividade do especial, o recurso não comporta
provimento quanto ao seu mérito. Isso porque, para o acolhimento da tese da legítima defesa,
com a consequente absolvição sumária do ora agravante, seria imprescindível exceder os
fundamentos do acórdão impugnado e adentrar no exame do conjunto fático-probatório, o que
é vedado no recurso especial, consoante o que dispõe o enunciado n. 7 da Súmula do Superior
Tribunal de Justiça.
4. Agravo regimental a que se nega provimento." (AgRg no AREsp 399.793/PR, Rel. Ministro
MARCO AURÉLIO BELLIZZE, QUINTA TURMA, julgado em 12/08/2014, DJe 21/08/2014)
82
130
"QUESTÃO DE ORDEM. RECURSO ESPECIAL. PROCESSO CIVIL. CORTE ESPECIAL.
RECURSO INTERPOSTO ANTES DO JULGAMENTO DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO.
NÃO ALTERAÇÃO DA DECISÃO EMBARGADA. DESNECESSIDADE DE RATIFICAÇÃO.
INSTRUMENTALISMO PROCESSUAL. CONHECIMENTO DO RECURSO. INTERPRETAÇÃO
DA SÚMULA 418 DO STJ QUE PRIVILEGIA O MÉRITO DO RECURSO E O AMPLO ACESSO
À JUSTIÇA.
1. Os embargos de declaração consistem em recurso de índole particular, cabível contra
qualquer decisão judicial, cujo objetivo é a declaração do verdadeiro sentido de provimento
eivado de obscuridade, contradição ou omissão (artigo 535 do CPC), não possuindo a
finalidade de reforma ou anulação do julgado, sendo afeto à alteração consistente em seu
esclarecimento, integralizando-o.
2. Os aclaratórios devolvem ao juízo prolator da decisão o conhecimento da impugnação que
se pretende aclarar. Ademais, a sua oposição interrompe o prazo para interposição de outros
recursos cabíveis em face da mesma decisão, nos termos do art. 538 do CPC.
3. Segundo dispõe a Súmula 418 do STJ "é inadmissível o recurso especial interposto antes da
publicação do acórdão dos embargos de declaração, sem posterior ratificação".
4. Diante da divergência jurisprudencial na exegese do enunciado, considerando-se a
interpretação teleológica e a hermenêutica processual, sempre em busca de conferir
concretude aos princípios da justiça e do bem comum, é mais razoável e consentâneo com os
ditames atuais o entendimento que busca privilegiar o mérito do recurso, o acesso à Justiça
(CF, art. 5°, XXXV), dando prevalência à solução do direito material em litígio, atendendo a
melhor dogmática na apreciação dos requisitos de admissibilidade recursais, afastando o
formalismo interpretativo para conferir efetividade aos princípios constitucionais responsáveis
pelos valores mais caros à sociedade.
5. De fato, não se pode conferir tratamento desigual a situações iguais, e o pior, utilizando-se
como discrímen o formalismo processual desmesurado e incompatível com a garantia
constitucional da jurisdição adequada. Na dúvida, deve-se dar prevalência à interpretação que
visa à definição do thema decidendum, até porque o processo deve servir de meio para a
realização da justiça.
6. Assim, a única interpretação cabível para o enunciado da Súmula 418 do STJ é aquela que
prevê o ônus da ratificação do recurso interposto na pendência de embargos declaratórios
apenas quando houver alteração na conclusão do julgamento anterior.
7. Questão de ordem aprovada para o fim de reconhecer a tempestividade do recurso de
apelação interposto no processo de origem." (REsp 1129215/DF, Rel. Ministro LUIS FELIPE
SALOMÃO, CORTE ESPECIAL, julgado em 16/09/2015, DJe 03/11/2015);
83
133
BUENO, Cassio Scarpinella. Manual de Direito Processual Civil. São Paulo: Saraiva, 2016,
2ª ed., p. 673
86
134
Englobando esses 7 (sete) requisitos é o que defende Fernando Anselmo Rodrigues: “Os
requisitos de admissibilidade dos recursos são aqueles elencados no Código de Processo Civil,
quais sejam: cabimento, legitimação para recorrer, interesse em recorrer, tempestividade,
preparo, regularidade formal e inexistência de fato impeditivo ou extintivo do poder de recorrer”
(RODRIGUES, Fernando Anselmo. Requisitos de Admisssibilidade do Recurso Especial e do
Recurso Extraordinário, in Aspectos Polêmicos e Atuais do Recurso Especial e do Recurso
Extraordinário, coord. Teresa Arruda Alvim Wambier. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997,
p. 186).
135
“Parece-nos preferível alinhar, de um lado, os requisitos intrínsecos, e de outro os requisitos
extrínsecos da admissibilidade. Entre os primeiros, examinaremos o cabimento, a legitimação
para recorrer, o interesse em recorrer e a inexistência de fato impeditivo ou extintivo do poder
de recorrer. Na segunda classe, a tempestividade, a regularidade formal, o pagamento das
custas e o preparo” (BARBOSA MOREIRA, José Carlos. O Juízo de Admissibilidade no
Sistema dos Recursos Civis. Imprenta: Rio de Janeiro, 1968, p. 46).
136
Súmula 281 do Supremo Tribunal Federal: “É inadmissível o recurso extraordinário, quando
couber na justiça de origem, recurso ordinário da decisão impugnada”.
87
137
MEDINA, José Miguel Garcia e WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Recursos e Ações
Autônomas de Impugnação. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 216.
138
“Também são impugnáveis via recurso extraordinário as decisões proferidas em única
instância, Contudo, a meu ver, não seria necessário o texto constitucional fazer menção às
causas de única instância. Afinal, se é única é também última. Em outras palavras, o adjetivo
única é, na verdade, supérfluo, até porque não pode deixar de ser última uma instância que
efetivamente seja única. Bastaria, portanto, ao legislador constituinte referir-se à decisão de
última instância” (OLIVEIRA, Pedro Miranda de. Novíssimo Sistema Recursal, conforme o
CPC/2015. 3ª ed., Florianópolis: Empório do Direito, 2017, pp. 320/321).
88
cabível o recurso per saltum, ou seja, aquele interposto direto para a Corte
Suprema, antes de esgotadas as demais vias. Seria como interpor um recurso
extraordinário de uma sentença, se ela violasse a Constituição Federal, ao
invés de se apresentar o competente recurso de apelação. Cumpre ressaltar
que a doutrina esmagadoramente majoritária, em consonância com o que
prevê os arts. 102 e 105, entende não ser cabível o recurso per saltum (é o
caso da Prof.ª Teresa Arruda Alvim Wambier, do Prof. Arruda Alvim e de Fredie
Didier Jr., por exemplo). Há uma minoria, porém, como Pedro Miranda de
Oliveira que defende o oposto, acreditando ser possível o recurso per saltum,
pois isto traria maior efetividade ao processo, além de auxiliar em sua duração
razoável (defende, inclusive, a possibilidade por acordo entre as partes que
assim preveja)139.
O atual Código de Processo Civil, por outro lado, eliminou a discussão
que havia no diploma de 1973 em relação ao cabimento de recurso especial
contra decisões do relator, proferidas com base no art. 557 do código então
vigente, mas que eram irrecorríveis. Agora, com a previsão de cabimento de
agravo interno contra toda decisão do Relator, como prevê o art. 1.021, as
decisões monocráticas não serão proferidas em caráter de última instância,
havendo a possibilidade de, caso interposto o agravo interno, haver
pronunciamento do colegiado previamente à interposição de recursos para as
Corte Superiores.
Com relação ao tema, além disso, na hipótese de julgamento de
embargos de declaração quando já houver sido interposto o recurso pela outra
139
“Se os recursos, de um lado, compõem a gama de direitos processuais que visam à
segurança jurídica, de outro, a sobreposição de sucessivos graus de jurisdição acarreta
demora na entrega da prestação jurisdicional. É nesta perspectiva que muitos países
instituíram a inovadora figura do recurso per saltum da primeira instância para o Tribunal
Superior (de sobreposição) quando as partes apenas tiverem suscitado questões de direito. A
possibilidade de utilização desse recurso constitui uma forma atípica de invocação e ordenação
dos graus jurisdicionais. Com o aludido instrumento, admite-se a interposição de um recurso
contra decisão judicial de primeiro grau, diretamente para a Corte Especial (tribunal de
sobreposição), sem a intervenção do tribunal de segunda instância. (…) Para que tenha
cabimento o recurso per saltum impõe-se que não haja discussão de matéria fática, ou que
sobre ela não tenha havido controvérsia, restando controvertidas apenas as questões jurídicas,
pois, apenas estas permitem saltar um grau de jurisdição, ou mais de um, permitindo o seu
conhecimento e julgamento pelo tribunal ad quem. Esse recurso funda-se num suposto lógico,
de que toda questão de direito é sempre uma questão de direito, seja na primeira, segunda ou
nas instâncias especiais, pelo que, julgada essa questão, não precisa passar pelo reexame dos
tribunais inferiores, pois quem dá a última palavra sobre questões de estrito direito no Brasil
são os Tribunais Superiores (STJ e STF).” (OLIVEIRA, Pedro Miranda de. Novíssimo Sistema
Recursal, conforme o CPC/2015. 3ª ed. Florianópolis: Empório do Direito, 2017, pp. 314/316).
89
140
“Art. 1.024. O juiz julgará os embargos em 5 (cinco) dias. (…) § 5º. Se os embargos de
declaração forem rejeitados ou não alterarem a conclusão do julgamento anterior, o recurso
interposto pela outra parte antes da publicação do julgamento dos embargos de declaração
será processado e julgado independentemente de ratificação”.
90
141
MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo Curso de
Processo Civil. Vol. 2. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, pp. 544/545.
91
142
DIDIER JR., Fredie. CUNHA DA, Leonardo José Carneiro. Curso de Direito Processual Civil.
Salvador: JusPodivm, 2016, 13ª ed., p. 308.
143
ARRUDA ALVIM, Eduardo. Direito Processual Civil. 2ª ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2008, p. 883.
144
Súmula 7 do Superior Tribunal de Justiça: “A pretensão de simples reexame de prova não
enseja recurso especial”.
92
Súmula 7 do STJ). Vale dizer: o recorrente tem que trabalhar com o caso em
seu recurso partindo da narrativa fática estabelecida pela decisão recorrida.
Consequentemente, o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de
Justiça não podem considerar existente fato considerado inexistente e
considerar inexistente fato considerado existente pela decisão recorrida. Essa
perspectiva teórica explica a razão pela qual, por exemplo, é possível obter do
Superior Tribunal de Justiça pronúncia voltada ao adequado dimensionamento
da reparação de danos civis, notadamente de danos morais. Em situações
dessa ordem, discute-se o caso em todos os seus aspectos, mas não se
interfere na conformação do caso outorgada pela decisão recorrida”145.
Nesse sentido, parece que o objetivo de se vedar a análise das provas,
é evitar que o Superior Tribunal de Justiça tenha que se debruçar sobre os
autos novamente para fins de verificar a existência de tal ou qual prova,
necessária para o julgamento da lide. Esta não é, nem deveria mesmo ser, a
função de qualquer das Cortes Superiores, o que as tornaria efetivamente em
uma 3º instância, meramente revisora dos atos dos tribunais.
O que lhe é permitido fazer é, a partir do quadro fático e probatório
delineado pelo acórdão recorrido, revalorar o quanto posto. Isto é, poderia o
Superior Tribunal de Justiça reavaliar o valor que foi dado a determinada prova,
como o reconhecimento de um contrato, incontroversamente existente, como
título executivo. Ou, então, questionar se determinada testemunha deveria
receber tanta credibilidade como a ela concedida pelo julgado objeto do
recurso146.
Nestas hipóteses, não estaria o Tribunal Superior revolvendo o conjunto
fático-probatório dos autos, mas apenas fazendo uma nova valoração das
provas reconhecidamente existentes e dos fatos incontroversos ou delimitados
145
MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel, ob. cit., p. 546.
146
“O mero reexame da prova seria o exame mais minucioso, atento e vagaroso das provas
constantes dos autos, que deveria levar ao mesmo resultado: à solução de que a subsunção
deu-se de modo equivocado. Mas no mero reexame as provas seriam examinadas e
reavaliadas individualmente. Não se trata, como no caso da revaloração, de alterar ou inverter
a carga valorativa que a instância ordinária tenha atribuído às provas, mas de se perguntar, por
exemplo, se seria merecedor de credibilidade o depoimento de tal testemunha que teria
empregado termos denotativos de pouca firmeza. Essa atividade, que a jurisprudência chama
de (mero) reexame de provas, não se admite realize-se em recurso especial ou recurso
extraordinário” (WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Recurso Especial, Recurso Extraordinário e
Ação Rescisória. Revista dos Tribunais, 2ª ed., 2008, p. 378).
93
pelo Tribunal a quo, o que parece ser perfeitamente possível e razoável. Faz-
se aqui, ainda, referência ao item 5.6 do presente trabalho, em que o tema é
abordado ainda mais detidamente para se verificar os limites da atuação do
Superior Tribunal de Justiça.
A diferenciação acerca dos limites da matéria de direito e da matéria de
prova, no entanto, não é tão simples. Afinal, ainda que permitam “o recurso
extraordinário e o especial tão somente a revisão in iure, ou seja, a
reapreciação de questões de direito enfrentadas pelo órgão a quo”, isto “não
esgota as dimensões de um problema bem mais complexo do que à primeira
vista se afigura: a própria distinção entre questões de fato e questões de direito
nem sempre é muito fácil de traçar com perfeita nitidez”147.
É claro que os fatos, assim como as suas provas, devem ser
sucintamente expostos no recurso interposto, inclusive como manda o art.
1.029, I148, do Código de Processo Civil, para que o Tribunal Superior possa ter
real conhecimento da lide no julgamento do direito, entretanto, como dito, é
vedado a ele que reanalise as questões fática e de provas como um todo,
devendo se restringir às considerações postas pela decisão (acórdão)
recorrida, ou seja, aos limites da moldura traçada pelo julgado objeto do
recurso.
147
MOREIRA, José Carlos Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil. 7ª ed. Rio de
Janeiro: Forense, vol. 5, 1995, pp. 580/581.
148
“Art. 1.029. O recurso extraordinário e o recurso especial, nos casos previstos na
Constituição Federal, serão interpostos perante o presidente ou o vice-presidente do tribunal
recorrido, em petições distintas que conterão: I – a exposição do fato e do direito”.
149
Súmula 5 do Superior Tribunal de Justiça: “A pretensão de simples reexame de prova não
enseja recurso especial”.
94
150
DIDIER JR., Fredie. CUNHA DA, Leonardo José Carneiro. Curso de Direito Processual Civil.
Salvador: JusPodivm, 2016, 13ª ed., p. 306/307.
95
3.6. Prequestionamento
151
COSTA, Guilherme Recena. Superior Tribunal de Justiça e recurso especial: análise da
função e reconstrução dogmática. Dissertação de mestrado. São Paulo. Universidade de São
Paulo. 2011, pp. 203/208.
152
“Sendo a norma, em tais casos, uma manifestação acentuadamente jurispruidencial, para
que a aplicação de cláusulas gerais, standards e conceitos jurídicos indeterminados seja
consistente, é enorme a importância do estudo dos casos. Seu desenvolvimento ocorre, assim,
sobretudo por meio de um raciocínio tópico, e não por um pensamento axiomático-dedutivo, já
que o texto legal, por si só, diz pouco ao julgador. No entanto, a partir da análise de problemas
concretos, vão sendo tomadas decisões que concretizam, pouco a pouco, as normas vagas, de
acordo com os valores a que elas remetem. A partir daí, cabe comparar as rationes decidendi
dos precedentes pertinentes, podendo-se induzir regras que vão progressivamente delimitando
os contornos da cláusula”. (COSTA, Guilherme Recena. Superior Tribunal de Justiça e recurso
especial: análise da função e reconstrução dogmática. Dissertação de mestrado. São Paulo.
Universidade de São Paulo. 2011, p. 213).
153
“O requisito do prequestionamento é da própria essência do recurso especial. Com efeito,
não é possível cogitar-se tenha havido ofensa a tratado ou lei federal (de molde a ser cabível o
recurso especial pela alínea a do inc. III do art. 105 do texto constitucional), por parte do
acórdão local, se a decisão não tiver ferido a questão federal sob foco. Igualmente, não é
concebível recorrer pela alínea c do inc. III do art. 105 (divergência jurisprudencial), se o
tribunal proferiu o acórdão recorrido não tiver tratado da questão federal, pois não haverá
divergência jurisprudencial” (ALVIM, Eduardo Arruda. ALVIM, Angélica Arruda. Recurso
especial e prequestionamento, in Aspectos Polêmicos e Atuais do Recurso Especial e do
Recurso Extraordinário, coord. Teresa Arruda Alvim Wambier. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1997, p. 160).
96
que essa exigência tem origem na expressão causa decidida constante do art.
105, III, da Constituição Federal154. O raciocínio formado pela jurisprudência
tem razão de ser, afinal, para que a causa seja decidida previamente, deve ela
ser objeto de análise pelo Tribunal a quo. Daí teria se originado o requisito do
prequestionamento para abrir a via do recurso especial155.
Como bem ponderam, novamente, Fredie Didier Jr. e Leonardo Carneiro
da Cunha, “para que haja pré-questionamento, não basta a simples indicação
ou menção a dispositivo ou a preceito normativo; é preciso haver manifestação
sobre o tema, debate ou discussão. A discussão, a manifestação ou o debate
sobre o tema configura o pré-questionamento, ainda que não tenha sido
mencionado ou indicado o dispositivo ou preceito normativo”156.
Inicialmente há, desse modo, duas formas de prequestionamento: (i) o
expresso ou explícito, em que a decisão recorrida menciona expressamente o
dispositivo de lei ou constitucional tido como violado; e (ii) o implícito, em que a
decisão, apesar de tratar da matéria em discussão, não menciona qualquer
dispositivo. Ainda nesta hipótese tem-se por prequestionados os artigos de lei
federal que fundamentem o eventual recurso.
Muito embora com posição controversa sobre a possibilidade de análise
da prescrição pelo Superior Tribunal de Justiça, ainda que não prequestionada,
o que será objeto de capítulo pertinente, Alexandre Câmara, bem define o
requisito de admissibilidade ora explorado: “Prequestionamento é a exigência
de que o recurso especial ou extraordinário verse sobre matéria que tenha sido
expressamente enfrentada na decisão recorrida. É que só se admite o recurso
extraordinário (ou o recurso especial) a respeito de causas decididas (para se
usar aqui a terminologia empregada no texto constitucional). Significa isto dizer
que o RE e o REsp só podem versar sobre o que tenha sido decidido, não
sendo possível, nestas duas espécies recursais, inovar suscitando-se matéria
154
“Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça: (…) III – julgar, em recurso especial, as
causas decididas, em única ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos
tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando a decisão recorrida (…)”.
155
“O prequestionamento foi consolidado jurisprudencialmente, por tradição histórica. A
expressão ‘causa decidida’ (arts. 102, III e 105, III, da CF) conteria tal exigência” (MANCUSO,
Rodolfo de Camargo. Recurso extraordinário e recurso especial. 10ª ed., São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2007, pp. 308/309).
156
Ob. cit., p. 311.
97
157
CÂMARA, Alexandre Freitas. O Novo Processo Civil Brasileiro. São Paulo: Atlas, 2016, 2ª
ed., pp. 540/541.
158
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonardo
Ferres da Silva; MELLO, Rogério Licastro Torres de. Primeiros Comentários ao Novo Código
de Processo Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, 2ª ed., p. 401.;
98
159
Aut. cit., Sobre a necessidade de cooperação entre os órgãos do Judiciário para um
processo mais célere – ainda sobre o prequestionamento, in Direito e Democracia, Canoas,
vol. 7, n. 2, 2º semestre de 2006, p. 407/426 – trecho da p. 9 do artigo.
160
Anos antes o Superior Tribunal de Justiça chegou a entender que a oposição de embargos
de declaração poderia até ser dispensada se a questão foi suscitada pela parte, ainda que não
constasse expressamente do acórdão: “Adotando o posicionamento que, modo geral, vem
sendo prestigiado neste Superior Tribunal de Justiça, não levo a rígidos balizamentos o
pressuposto, que mantenho, de a matéria haver sido questionada no decorrer do processo.
Assim, em linha de princípios, admitido o questionamento implícito, decorrente do conjunto das
alegações formuladas pela parte. Ainda em linha de princípios, dispenso, nos casos de
omissão do acórdão, deva ser a matéria reavivada em embargos declaratórios, quando se
cuide de tema já claramente questionado no decorrer do contraditório; diga-se que outros são
os objetivos processuais dos embargos de declaração, os quais podem suprir omissão nos
fundamentos da sentença ou do acórdão quando tal omissão seja suscetível de prejudicar a
execução do julgado, ou de prejudicar a compreensão do conteúdo e extensão do ‘decisum’,
hipóteses estas que refogem, vênia máxima, ao tema dos pressupostos constitucionais de
admissibilidade do apelo extremo” (RSTJ 15/233, citação p. 242, voto do Min. Athos Carneiro).
161
Súmula 211 do Superior Tribunal de Justiça: “Inadmissível recurso especial quanto à
questão que, a despeito da oposição de embargos declaratórios, não foi apreciada pelo
Tribunal a quo”.
162
Súmula 356 do Supremo Tribunal Federal: “O ponto omisso da decisão, sobre o qual não
foram opostos embargos declaratórios, não pode ser objeto de recurso extraordinário, por faltar
o requisito do prequestionamento”.
99
163
GOÉS, Gisele Santos Fernandes. As questões de ordem pública nos recursos excepcionais,
in Questões Relevantes sobre Recursos, Ações de Impugnação e Mecanismos de
Uniformização da Jurisprudência após o primeiro ano de vigência do novo CPC. Coord. Bruno
Dantas, Cassio Scarpinella Bueno, Cláudia Elisabete Shwerz Cahali e Rita Dias Nolasco. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2017, p. 250.
164
“Art. 489. São elementos essenciais da sentença:
I - o relatório, que conterá os nomes das partes, a identificação do caso, com a suma do pedido
e da contestação, e o registro das principais ocorrências havidas no andamento do processo;
II - os fundamentos, em que o juiz analisará as questões de fato e de direito;
III - o dispositivo, em que o juiz resolverá as questões principais que as partes lhe submeterem.
o
§ 1 Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença
ou acórdão, que:
I - se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua
relação com a causa ou a questão decidida;
II - empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua
incidência no caso;
III - invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão;
IV - não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a
conclusão adotada pelo julgador;
V - se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos
determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos;
VI - deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte,
sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do
entendimento.”
100
165
Texto da PEC 17/2013: “Art. 105 (…) § 1º No recurso especial, o recorrente deverá
demonstrar a relevância das questões de direito federal infraconstitucional discutidas no caso,
nos termos da lei, a fim de que o Tribunal examine a admissão do recurso, somente podendo
recusá-lo pela manifestação de dois terços dos membros da Corte Especial”.
166
“Art. 102, § 3º, Constituição Federal: “No recurso extraordinário o recorrente deverá
demonstrar a repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso, nos termos
da lei, a fim de que o Tribunal examine a admissão do recurso, somente podendo recusá-lo
pela manifestação de dois terços de seus membros”.
101
167
NERY JR., Nelson. Teoria Geral dos Recursos. 7ª Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2014, p. 392.
168
Carlos Mário da Silva Velloso, em artigo que versa exatamente sobre a morosidade do
Poder Judiciário diz sobre a falta de senso lógico no sistema recursal que obriga as Cortes
mais altas do país a intervir em questões que assim não deveriam demandar: “O sistema
recursal, com um número muito grande de recursos, é irracional. O despejo de um botequim
pode chegar ao Superior Tribunal de Justiça e ao Supremo Tribunal Federal. O superior
Tribunal de Justiça tem decidido recursos sem nenhuma relevância jurídica ou social, como,
por exemplo, recursos em que se discute se é possível a criação de cães em condomínios de
apartamentos. Dizia que que o despejo de um botequim pode chegar ao Superior Tribunal de
Justiça e ao Supremo Tribunal. Exemplifico e demonstro a afirmativa: a sentença de 1º grau
decreta o despejo. A apelação para o tribunal de 2º grau é perfeitamente cabível, dado que o
requisito do cabimento desse recurso é o sucumbimento, apenas. Interposta a apelação, é ela,
meses depois — ou até anos depois — improvida. A parte vencida interpõe, então, recurso
especial para o STJ e recurso extraordinário para o STF. Ambos os recursos, de regra, são
incabíveis. O presidente do tribunal vai inadmiti-los, certamente. Serão interpostos, então, dois
agravos, um para o STJ, primeiro. Lá, o Relator nega-lhes provimento. Segue-se a interposição
de agravo para a Turma, que, meses depois, confirma a decisão. Publicado o acórdão, o que
demanda algum tempo, é interposto o recurso de embargos de declaração, que serão
rejeitados. A publicação do acórdão vai demorar mais algum tempo. Muita vez são interpostos
embargos de declaração. Encerrada a questão no STJ, segue-se a repetição de tudo o que se
narrou no Supremo Tribunal Federal”. (VELLOSO, Carlos Mário da Silva. Do Poder Judiciário:
Como torná-lo mais ágil e dinâmico: efeito vinculante e outros temas. In Revista de Direito
Administrativo, Rio de Janeiro, 212, 7-26, abr-jun/1998, pp. 10/11).
102
169
“Art. 1.035. O Supremo Tribunal Federal, em decisão irrecorrível, não conhecerá do recurso
extraordinário quando a questão constitucional nele versada não tiver repercussão geral, nos
o
termos deste artigo. § 1 Para efeito de repercussão geral, será considerada a existência ou
não de questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico que
o
ultrapassem os interesses subjetivos do processo. § 2 O recorrente deverá demonstrar a
existência de repercussão geral para apreciação exclusiva pelo Supremo Tribunal Federal. §
o
3 Haverá repercussão geral sempre que o recurso impugnar acórdão que: I - contrarie súmula
ou jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal; II – (Revogado); III - tenha
reconhecido a inconstitucionalidade de tratado ou de lei federal, nos termos do art. 97 da
o
Constituição Federal. § 4 O relator poderá admitir, na análise da repercussão geral, a
manifestação de terceiros, subscrita por procurador habilitado, nos termos do Regimento
o
Interno do Supremo Tribunal Federal. § 5 Reconhecida a repercussão geral, o relator no
Supremo Tribunal Federal determinará a suspensão do processamento de todos os processos
pendentes, individuais ou coletivos, que versem sobre a questão e tramitem no território
o
nacional. § 6 O interessado pode requerer, ao presidente ou ao vice-presidente do tribunal de
origem, que exclua da decisão de sobrestamento e inadmita o recurso extraordinário que tenha
sido interposto intempestivamente, tendo o recorrente o prazo de 5 (cinco) dias para
manifestar-se sobre esse requerimento. § 7º Da decisão que indeferir o requerimento referido
no § 6º ou que aplicar entendimento firmado em regime de repercussão geral ou em
o
julgamento de recursos repetitivos caberá agravo interno. § 8 Negada a repercussão geral, o
presidente ou o vice-presidente do tribunal de origem negará seguimento aos recursos
o
extraordinários sobrestados na origem que versem sobre matéria idêntica. § 9 O recurso que
tiver a repercussão geral reconhecida deverá ser julgado no prazo de 1 (um) ano e terá
preferência sobre os demais feitos, ressalvados os que envolvam réu preso e os pedidos
de habeas corpus.§ 10. (Revogado). § 11. A súmula da decisão sobre a repercussão geral
constará de ata, que será publicada no diário oficial e valerá como acórdão.”
103
170
“Art. 987. Do julgamento do mérito do incidente caberá recurso extraordinário ou especial,
conforme o caso. § 1º O recurso tem efeito suspensivo, presumindo-se a repercussão geral de
questão constitucional eventualmente discutida”.
104
171
O exame dos números de recursos na atuação do Supremo Tribunal Federal e os efeitos da
implantação da repercussão geral como requisito do recurso extraordinário é bem exposto em
trabalho de Eduardo Cambi e Aline Regina das Neves (aut. cit. Repercussão geral e PEC
209/2012 in Revista de Processo, vol. 220/2013, pp. 183/206, jun/13).
105
172
Embora falando da Crise do Supremo, a situação é idêntica e se aplica com perfeição ao
cenário atual do Superior Tribunal de Justiça. WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; DANTAS,
Bruno. Recurso Especial, Recurso Extraordinário e Ação Rescisória. Revista dos Tribunais, 3ª
ed., 2016, p. 454.
173
Sobre o tema, ler SERAU JR., Marco Aurélio. DONOSO, Denis. Relevância da questão
federal como filtro de admissibilidade do recurso especial: análise das propostas de emenda
constitucional n. 209/2012 e n. 17/2013., in Revista de Processo, vol. 224/2013, pp. 241/251,
out/2013.
174
“O número de ministros do STJ é reduzido, se o compararmos com tribunais que, em outros
países, exercem função parecida. A Corte de Cassação italiana, por exemplo, tinha no ano de
2010, 360 juízes. A Corte de Cassação francesa tem 120 Conseillers e 70 conseillers
référendaires. Evidentemente, há diferenças entre as estruturas do Judiciário brasileiro e a dos
106
175
THEODORO JR., Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Vol. III. Rio de Janeiro:
Forense, 48ª ed., 2016, p. 1.005.
176
Há quem defenda, como Alexandre Freitas Câmara (O Novo Processo Civil Brasileiro. São
Paulo: Atlas, 2016, 2ª ed., p. 504), que o efeito devolutivo é também originado pelo simples ato
de interpor o recurso, haja vista que a mera interposição seria capaz de devolver a análise da
matéria. Essa hipótese não é 100% verdadeira, já que o recurso pode vir a não ser admitido, o
que não devolveria, efetivamente, a análise da matéria recorrida.
108
parágrafo único do art. 995 do Código de Processo Civil 177, ou ser uma
consequência automática da própria interposição, para aqueles casos em que
o recurso já é dotado do efeito suspensivo por força de lei, como a apelação, a
título exemplificativo178.
Feita essa brevíssima introdução sobre os efeitos dos recursos, assim
como do objetivo do presente capítulo, passa-se a tratar de cada um dos seis
efeitos aqui considerados.
180
CÂMARA, Alexandre Freitas. O Novo Processo Civil Brasileiro. São Paulo: Atlas, 2016, 2ª
ed., pp. 504/505.
181
MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Recurso extraordinário e recurso especial. 10ª ed., São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p. 199.
110
182
“Os recursos não impedem a eficácia da decisão, salvo disposição legal ou decisão judicial
em sentido diverso. Parágrafo único. A eficácia da decisão recorrida poderá ser suspensa por
decisão do relator se da imediata produção de seus efeitos houver risco de dano grave, de
difícil ou impossível reparação ,e ficar demonstrada a probabilidade de provimento do recurso”.
183
“Art. 1.012. A apelação terá efeito suspensivo. § 1º Além de outras hipóteses previstas em
lei, começa a produzir efeitos imediatamente após a sua publicação a sentença que: I –
homologa divisão ou demarcação de terras; II – condena a pagar alimentos; III – extingue sem
resolução do mérito ou julga improcedentes os embargos do executado; IV – julga procedente
o pedido de instituição de arbitragem; V – confirma, concede ou revoga tutela provisória; e VI –
decreta a interdição.”
184
Sobre o tema: “(…) o efeito suspensivo (impedimento da imediata execução do decisório
impugnado), que era a regra geral para o Código de 1973, passou a ser a exceção no novo
CPC, prevista apenas para a apelação (art. 1.012, caput). Assim é que o art. 995 dispõe que
‘os recursos não impedem a eficácia da decisão, salvo disposição legal ou decisão judicial em
sentido diverso’. Apenas excepcionalmente a decisão será suspensa, ‘se da imediata produção
de seus efeitos houver risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação, e ficar
demonstrada a probabilidade de provimento do recurso’ (parágrafo único do art. 995). Isto,
todavia, dependerá sempre de decisão do relator” (THEODORO JR., Humberto. Curso de
Direito Processual Civil. Vol. III. Rio de Janeiro: Forense, 48ª ed., 2016, p. 1.005).
111
185
“Aliás, a expressão ‘efeito suspensivo’ é, de certo modo, equívoca, porque se presta a fazer
supor que só com a interposição do recurso passem a ficar tolhidos os efeitos da decisão,
como se até esse momento estivessem eles a manifestar-se normalmente. Na realidade, o
contrário é que se verifica: mesmo antes de interposto o recurso, a decisão, pelo simples fato
de estar-lhe sujeita, é ato ainda ineficaz, e a interposição apenas prolonga semelhante
ineficácia, que cessaria se não se interpusesse o recurso”. (MOREIRA, José Carlos Barbosa.
Comentários ao Código de Processo Civil. 7ª ed. Rio de Janeiro: Forense, vol. 5, 1995, p. 255).
112
186
CÂMARA, Alexandre Freitas. O Novo Processo Civil Brasileiro. São Paulo: Atlas, 2016, 2ª
ed., p. 507.
187
“Art. 987. Do julgamento do mérito do incidente caberá recurso extraordinário ou especial,
conforme o caso. § 1º. O recurso tem efeito suspensivo, presumindo-se a repercussão geral de
questão constitucional eventualmente discutida.
113
188
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. DANTAS, Bruno. Recurso Especial, Recurso
Extraordinário e a nova função dos Tribunais Superiores no Direito brasileiro. 3 ª edição. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, p. 386.
189
Ob. cit. p. 386/387.
114
autos, para que outra ali se profira. Salvo nessa hipótese, o acórdão do tribunal
ad quem, seja qual for o sentido em que este se pronuncie, substitui, na
medida em que se conheça da impugnação, a decisão contra qual se
recorreu”190.
Há prevalência da decisão do recurso mesmo em hipótese de error in
procedendo se, no caso de recurso apelação, por exemplo, o Tribunal optar por
analisar imediatamente o mérito com fundamento no art. 1.013, § 3º, do Código
de Processo Civil.
Esse particular efeito dos recursos ocorre quando, por algumas das
razões previstas na lei processual, o julgamento do recurso acaba por envolver
questões que vão além da matéria estritamente ventilada no inconformismo da
parte levado ao órgão ad quem. É o caso de se afastar uma preliminar e julgar
o mérito, ou acolher uma questão de ordem pública ou, ainda, o acolhimento de
uma preliminar que afeta a sentença como um todo, ainda que parte dela não
tivesse sido objeto de recurso.
A conceituação de Nelson Nery Junior é precisa: “Depois de proferido
juízo de admissibilidade positivo do recurso, com seu conhecimento, o órgão
ad quem deve apreciar-lhe o mérito, na extensão em que lhe foi devolvida a
matéria objeto da impugnação. O julgamento do recurso pode ensejar decisão
mais abrangente do que o reexame da matéria impugnada, que é o mérito do
recurso. Dizemos que, nesse caso, existe o efeito expansivo (…)”191.
Diz-se que o efeito expansivo é objetivo interno quando,
exemplificativamente, acolhe-se uma preliminar que, por consequência, afeta a
sentença como um todo, tornando-a supérflua no que toca às questões de
mérito que foram analisadas. Outro exemplo, citado pelo i. Professor, se dá em
analise do an debeatur pelo Tribunal, o que tornaria prejudicada a questão
seguinte, que é o quantum debeatur.
190
MOREIRA, José Carlos Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil. 7ª ed. Rio de
Janeiro: Forense, vol. 5, 1995, p. 584.
191
NERY JR., Nelson. Teoria Geral dos Recursos. 7ª Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2014, p. 456.
115
192
“O objeto da devolutividade constitui o mérito do recurso, ou seja, a matéria sobre a qual
deve o órgão ad quem se pronunciar, provendo-o ou improvendo-o. As preliminares alegadas
normalmente em contrarrazões de recurso, como as de não conhecimento, por exemplo, não
integram o efeito devolutivo do recurso, pois são matérias de ordem pública a cujo respeito o
tribunal deve ex officio se pronunciar. Seria mais apropriado dizer que esse tipo de questão fica
ao exame do tribunal pelo denominado efeito translativo do recurso (abaixo, n. 3.5.4),
porquanto o efeito devolutivo, como já vimos, é manifestação do princípio dispositivo: somente
se devolve ao tribunal a matéria que o recorrente efetivamente impugnou e sobre a qual pede
nova decisão” (NERY JR., Nelson. Teoria Geral dos Recursos. 7ª Ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2014, pp. 402/403.
193
THEODORO JR., Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Rio de Janeiro: Forense, 48ª
ed., 2016, pp. 1.007.
194
“O que rege o âmbito da devolutividade de todos os recursos — e, no caso de apelação, por
excelência — é o princípio dispositivo, expressado na máxima latina tantum devolutum
quantum appellatum” (ARRUDA ALVIM, Eduardo. Direito Processual Civil. 2ª ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2008).
195
Sobre o assunto, confira-se novamente THEODORO JR., Humberto. Curso de Direito
Processual Civil. Rio de Janeiro: Forense, 48ª ed., 2016, pp. 1.007, além de NERY JR., Nelson.
Teoria Geral dos Recursos. 7ª Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 462 e
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; DANTAS, Bruno. Recurso Especial, Recurso Extraordinário e
Ação Rescisória. Revista dos Tribunais, 3ª ed., 2016, p. 401/402.
117
196
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; DANTAS, Bruno. Recurso Especial, Recurso
Extraordinário e Ação Rescisória. Revista dos Tribunais, 3ª ed., 2016, p. 401.
197
Tanto é assim que o mestre dá um conceito genérico de efeito devolutivo como aquele que
“consiste em transferir ao órgão ad quem o conhecimento da matéria julgada em grau inferior
de jurisdição” (MOREIRA, José Carlos Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil. 7ª
ed. Rio de Janeiro: Forense, vol. 5, 1995, p. 256).
198
“O exame das questões de ordem pública, ainda que não decididas pelo juízo a quo, fica
transferido ao tribunal destinatário do recurso de apelação por força do CPC 515, § 1º a 3º. Da
mesma forma, ficam transferidas para o tribunal ad quem as questões dispositivas que
deixaram de ser apreciadas pelo juízo de primeiro grau, nada obstante tenham sido suscitadas
e discutidas no processo” (NERY JR., Nelson. Teoria Geral dos Recursos. 7ª Ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2014, p. 461).
118
199
CÂMARA, Alexandre Freitas. O Novo Processo Civil Brasileiro. São Paulo: Atlas, 2016, 2ª
ed., pp. 505/506. Com exemplo bastante semelhante, vale citar BONDIOLI, Luis Guilherme
Aidar. Dos Recursos. Arts. 994 a 1.044. In: Comentários ao Código de Processo Civil. Coord.
José Roberto F; Gouvêa. Luis Guilherme A. Bondioli e João Francisco N. da Fonseca. São
Paulo: Saraiva Jur. 2ª ed. 2017, pp. 24/25.
119
que era quem detinha, desde o início, a competência originária para julgar o
assunto. Daí viria a razão de devolver a matéria a ser julgada200.
Talvez por isso, inclusive, possa se afirmar que a expressão efeito
devolutivo não é 100% precisa, já que não se devolve à apreciação da matéria
à mesma pessoa, mas sim leva a sua análise a outro magistrado, de órgão
hierarquicamente superior, ou melhor, transfere ao órgão ad quem a análise201.
Não se pode deixar, porém, de registrar que se devolve a análise dos
fundamentos postos ao Poder Judiciário, de modo que não parece
completamente inadequada a expressão comumente utilizada.
Fechando-se os parêntesis sobre a origem da nomenclatura do efeito
ora exposto, é importante ressaltar que a doutrina costuma expor a existência
de dois vetores que compõem o efeito devolutivo, a profundidade e a extensão
ou, então, com nomes diferentes, mas mesmo racional, as dimensões
horizontal e vertical.
A extensão do efeito devolutivo é limitada pela parte recorrente e reflete
com precisão a conceituação no início deste capítulo. Explica-se: a extensão
da devolução ao órgão ad quem se restringirá ao quanto impugnado no
recurso, especificamente com relação aos capítulos tratados. Cumpre
mencionar que, em toda e qualquer situação, a limitação do efeito devolutivo é
feita efetivamente pelo pedido de nova decisão formulado no recurso, “daí a
razão pela qual o efeito devolutivo pressupõe sempre o ato de impugnação – a
interposição do recurso -, não se podendo falar em efeito devolutivo na
remessa necessária do CPC 475, mas sim de consequência análoga ao
denominado efeito translativo”202.
Após essa delimitação é que entraria o fator profundidade, pois dentro
dos limites estabelecidos no recurso, pode o Tribunal, por exemplo, analisar
outros temas suscitados no processo, ainda que não constantes
expressamente da decisão recorrida, ou mesmo por ela não julgados. Logo, “o
recurso abrange não somente as questões decididas na sentença, mas
200
LIMA, Alcides de Mendonça. Introdução aos recursos cíveis. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1976, p. 286.
201
LUCON, Paulo Henrique dos Santos, Art. 515, § 3º, do Código de Processo Civil e recurso
especial (ordem pública e prequestionamento).
202
NERY JR., Nelson. Teoria Geral dos Recursos. 7ª Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2014, p. 402.
120
também todas aquelas que poderiam ter sido (questões de ofício e aquelas
suscitadas e discutidas pelas partes, mas que deixaram de ser apreciadas pelo
órgão jurisdicional)”203.
Obviamente, porém, se o recurso é parcial, a devolução pela
profundidade se limita aos capítulos impugnados no recurso, não alcançando
aqueles pontos decididos, mas que não foram alvo do inconformismo da parte,
já que sobre eles se operou, efetivamente, a coisa julgada204.
É exatamente isso que reflete o art. 1.013 do Código de Processo Civil,
quando dispõe que “a apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da
matéria impugnada”, continuando em seu § 1º, “serão, porém, objeto de
apreciação e julgamento pelo tribunal todas as questões suscitadas e
discutidas no processo, ainda que não tenham sido solucionadas, desde que
relativas ao capítulo impugnado”.
Quando se fala em recursos de fundamentação vinculada, por outro
lado, há uma limitação dos vetores do efeito devolutivo, que ficará restrito
exatamente à extensão e profundidade colocada no recurso, nada além disso.
É o caso dos recursos excepcionais, dentre eles o especial, objeto desse
trabalho. A razão para tanto é bastante simples: se a matéria não constou do
acórdão recorrido, ainda que debatida em 1º Grau, por exemplo, não terá sido
preenchido o requisito do prequestionamento. Matérias de fato, ou contratuais,
também não poderão ser analisadas pelo Superior Tribunal de Justiça, ainda
203
LUCON, Paulo Henrique dos Santos, Art. 515, § 3º, do Código de Processo Civil e recurso
especial (ordem pública e prequestionamento), p. 5.
204
Vale citar elucidativo exemplo: “Exemplificamos para facilitar a compreensão desse
relevante ponto: se numa ação indenizatória o autor cumula pedidos de reparação de danos
morais e materiais e o juiz julga ambos improcedentes, cabe exclusivamente ao autor decidir
se deseja recorrer em relação ao dano moral, ao dano material ou a ambos. Aqui fica evidente
o vetor extensão, expressão do princípio dispositivo: o recurso pode ser total ou parcial, e essa
definição cabe ao recorrente. Delimitada a extensão do recurso, passa a incidir –
exclusivamente sobre a zona impugnada – o vetor profundidade, que exprime o princípio
inquisitório e, desse modo, independe de menção expressa nas razões do recurso, desde que
a matéria tenha sido discutida no juízo a quo, ainda que não tenha sido decidida (CPC, art.
516, art. 1.013, § 1º, do CPC). No exemplo proposto, supondo que o autor tenha apelado da
sentença exclusivamente em relação ao dano moral, o tribunal pode apreciar, no âmbito
delimitado pela extensão do recurso, as mais diversas questões agitadas no primeiro grau
como fundamentos do pedido ou da defesa, ainda que não constem da decisão recorrida ou
das razões de recurso. Não poderá, todavia, se pronunciar sobre quaisquer fundamentos
atinentes ao dano material, uma vez que este se encontra fora dos limites horizontais do
recurso, e assim já estará submetido ao efeito da preclusão” (WAMBIER, Teresa Arruda Alvim;
DANTAS, Bruno. Recurso Especial, Recurso Extraordinário e Ação Rescisória. Revista dos
Tribunais, 3ª ed., 2016, p. 389).
121
205
“(…) Significa que o resultado do processo não pode ser, para o réu, pior do que aquele que
decorrerá do acolhimento in totum do pedido. Essa é, creio eu, a razão fundamental da política
legislativa de toda essa sistemática: sempre a questão da previsibilidade. É preciso que o réu
possa prever quais as piores consequências concebíveis para ele no caso de derrota, a fim de
orientar-se, de tomar a decisão sobre a atitude que deve assumir em face da propositura da
ação” (MOREIRA, José Carlos Barbosa. Correlação entre o pedido e a sentença in Revista de
Processo, ano 21, n. 83, julho-setembro de 1996, p. 211).
122
206
MOREIRA, José Carlos Barbosa. Correlação entre o pedido e a sentença in Revista de
Processo, ano 21, n. 83, julho-setembro de 1996, pp. 214/215.
123
207
“Para se caracterizar o efeito devolutivo, não há necessidade de que a matéria objeto do
recurso seja de mérito, sendo suficiente que a matéria impugnada seja submetida ao órgão ad
quem para novo julgamento. Os recursos têm a finalidade de provocar o reexame de decisões
em geral (embargos de declaração), de decisões interlocutórias (agravo), de sentenças
(apelação), de acórdãos (embargos infringentes, embargos de divergência, recurso especial,
recurso extraordinário, recurso ordinário). O efeito devolutivo existe, portanto, em todos os
recursos” (NERY JR., Nelson. Teoria Geral dos Recursos. 7ª Ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2014, pp. 403/404). Muito embora o autor consigne no trecho destacado que a
matéria deva ser submetida ao órgão ad quem, em trecho pouco anterior em seu livro, faz
ressalva que parece ser mais assertiva: “A aptidão para provocar o reexame da decisão
impugnada por meio do recurso já é suficiente para caracterizar o efeito devolutivo do recurso.
Não há necessidade de que o órgão destinatário seja diverso daquele que proferiu o ato
impugnado. Assim, mesmo os embargos de declaração e os embargos infringentes da LEF 34,
dirigidos ao mesmo órgão de onde proveio a decisão recorrida, têm efeito devolutivo, que é
comum e existe em todos os recursos no sistema processual brasileiro, seja o da CF, do CPC
ou, ainda, o de leis processuais extravagantes” (ob. cit., p. 403).
124
Muito se tratou ao longo deste trabalho sobre a função que deve ser
exercida pelo Superior Tribunal de Justiça na qualidade de Corte que deve
zelar pela higidez e aplicação das leis pelos Tribunais Estaduais e Regionais
Federais, sempre atuando de modo a orientar a melhor forma de interpretação
da legislação federal infraconstitucional.
Já se abordou, também, a conceituação dos efeitos inerentes ao recurso
especial, inclusive o próprio devolutivo e o translativo, este que, de certa forma,
também permite ao Tribunal Superior a análise de determinadas questões em
sede de recurso especial.
É nesse momento, porém, que serão abordadas especificamente
questões que se entendem como polêmicas, ao se traçar, ou ao menos se
imaginar, os limites da atuação do Superior Tribunal de Justiça no caso
concreto posto a julgamento.
208
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; DANTAS, Bruno. Recurso Especial, Recurso
Extraordinário e Ação Rescisória. Revista dos Tribunais, 3ª ed., 2016, p. 403.
209
“Seja na admissibilidade do recurso extraordinário, seja na admissibilidade do recurso
especial, é vedado o não conhecimento do recurso com base em fundamento genérico.
Embora o art. 1.029, § 2º, tenha sido revogado, permanece semelhante vedação. Trata-se de
solução decorrente do direito ao contraditório com direito de influência e do dever de
fundamentação como dever de debate (arts. 93, IX, CF e 7º, 9º, 10, 11 e 489, §§ 1º e 2º, CPC).
Assim, note-se que não é apenas no caso de recurso especial fundado em dissídio
jurisprudencial que existe vedação à inadmissibilidade genérica. Em todo e qualquer caso de
interposição de recurso extraordinário ou de recurso especial, a admissibilidade deve ser
examinada levando em consideração as peculiaridades do caso. Se, porém, o recorrente
alegar violação à Constituição ou à legislação federal apoiando-se em precedentes
constitucionais ou precedentes federais, a vedação à inadmissibilidade genérica ganha
contornos ainda mais precisos: nessa hipótese, a proibição de não conhecimento genérico
significa que o órgão jurisdicional tem o dever de examinar as circunstâncias fático-jurídicas do
caso para demonstrar a existência de distinção que impede o conhecimento do recurso. Trata-
se de decorrência dos arts. 93, IX, CF e 7, 9, 10, 11 e 489 § 1, CPC, do qual o art. 1.029, § 2º,
CPC, constituía simples explicitação” (MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz;
MITIDIERO, Daniel. Novo Curso de Processo Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, pp.
564/565).
210
STF, Pleno, RE 298.695/SP, rel. Min, Sepúlveda Pertence, j. 06.08.2003. No exato mesmo
sentido o RE 298.694/SP, de mesma relatoria, j. 10.5.01.
126
211
Essa prática era bastante usual na vigência do Código de Processo Civil de 1973, mas
ainda não se sabe se será mantida com o atual diploma, que prevê o julgamento do recurso
imediatamente após a sua admissão (art. 1.034).
212
THEODORO JR., Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Vol. I, Ed. 52ª. Rio de
Janeiro: Forense, 2011, pp. 670 e 674.
127
213
“Há basicamente dois modelos, diferenciados pela função, de cortes de superposição no
mundo: as que cassam e substituem (chamadas de cortes de revisão) e as que cassam sem
substituir (daí, meras cortes de cassação). As primeiras enunciam a tese jurídica correta e, no
julgamento da causa, aplicam-na elas próprias ao caso concreto. As cortes de cassação, por
sua vez, após fixarem a solução jurídica a prevalecer no caso, devolvem os autos à instância
de origem ou os remetem a outro órgão judiciário de mesma hierarquia que a sua, para que a
tese fixada seja aplicada concretamente. No Brasil, como já dito, a Constituição Federal
determina a natureza de corte de revisão do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal
de Justiça, na medida em que prevê o julgamento da causa, em recurso extraordinário (art.
102, inc. III) e especial (art. 105, inc. III). Por isso, a princípio, se o tribunal de superposição
conhece e dá provimento a um recurso, ele deve (a) anular a decisão impugnada e remeter o
caso para a instância de origem, se verificar vício de inobservância de exigência processual
(erro in procedendo; vício de atividade); ou (b) julgar a causa, substituindo o acórdão recorrido,
se corrigir erro relativo a norma de direito material (erro in iudicando, vício de juízo”. FONSECA,
João Francisco Naves da. A profundidade do efeito devolutivo nos recursos extraordinário e
especial in Processo nos Tribunais e Meios de Impugnação às Decisões Judiciais, Coord.
Fredie Didier Jr. Salvador: JusPodivm. 2ª ed., livro 6, 2016, p. 1.011.
214
NERY JR., Nelson. Teoria Geral dos Recursos. 7ª Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2014, p. 422.
215
Há quem defenda ser, inclusive, desnecessária a previsão do art. 1.034 de que o Superior
Tribunal de Justiça aplicará o direito à espécie, já que é isso que ele, invariavelmente, fará ao
julgar o mérito do recurso: “O art. 1.034 fala apenas em admissão do recurso, sem declarar,
por desnecessário, os modos pelos quais se afirma a admissão. Ao juízo positivo de
admissibilidade segue-se o julgamento do mérito do recurso, que pode constituir, não apenas a
reforma da decisão recorrida como ainda a anulação dela com a ordem de que outra se profira.
É dispensável a gerundial ‘aplicando o direito’ por que isto sempre fará a corte ao julgar o
recurso” (BERMUDES, Sergio. CPC de 2015 Inovações, vol. 1. Rio de Janeiro: GZ Editora,
2016).
128
218
“(…) É verdade que somente as quaestiones iuris é que podem ser objeto de RE e REsp, ou
seja, podem se constituir no mérito desses recursos. Daí o acerto do STF 279 e do STJ 7, que
proíbem a interposição de RE e do REsp para simples reexame da prova. Essa matéria –
exame da prova – não pode ser objeto do juízo de cassação dos recursos excepcionais. O
juízo de cassação é o juízo de censura que sofre a decisão ou acórdão impugnado quando, por
exemplo, negar vigência a dispositivo constitucional ou de lei federal. O provimento do RE ou
REsp, no que tange a esse juízo de cassação, implica a rescisão da decisão inconstitucional ou
130
ilegal. No entanto, esses recursos têm, também, o juízo de revisão, que se constitui no
segundo momento do julgamento do RE e do REsp, ou seja, na consequência do provimento
dos recursos excepcionais. Provido o recurso com a cassação da decisão ou acórdão, é
necessário que o STF ou STJ passem a julgar a lide em toda a sua inteireza (revisão).” (NERY
JR., Nelson. Teoria Geral dos Recursos. 7ª Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, pp.
422/423 – destaques no original).
219
Ob. Cit., p. 423.
220
Ob. Cit., p. 466.
131
221
“A solução contrária, data máxima vênia, implicaria impor ao Tribunal – ao qual se confiou,
‘precipuamente, a guarda da Constituição’ (CF, art. 102) – constrangimento ao qual não se
submetem outras instâncias. Basta pensar no caso do Superior Tribunal de Justiça, como
recordei ao indicar o adiamento desta decisão. Com efeito, não cabe àquela alta Corte superior
julgar o recurso fundado na arguição de inconstitucionalidade de lei. Não obstante, no
julgamento do recurso especial por contrariedade à lei federal, se o STJ, malgrado o
reconhecimento de sua violação, entender que a norma ordinária é incompatível com a
Constituição, ninguém lhe contesta a autoridade para declarar incidentemente a
inconstitucionalidade da lei invocada e, por isso, manter a decisão recorrida. Constituiria
paradoxo verdadeiramente ‘Kafkaniano’ que, diferentemente, ao STF – guarda da Constituição
– não fosse dado, no julgamento do RE, declarar que a lei questionada é, sim, inconstitucional,
embora por fundamento diverso do acolhido pelo acórdão recorrido, e, em consequência,
estivesse vinculado a aplicar a norma legal que considera incompatível com a Carta Magna”
(STF, Pleno, RE 298.695/SP, rel. Min, Sepúlveda Pertence, j. 06.08.2003 – destaques no
original).
132
222
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; DANTAS, Bruno. Recurso Especial, Recurso
Extraordinário e Ação Rescisória. Revista dos Tribunais, 3ª ed., 2016, p. 388.
223
Ob. Cit., p. 388/389
134
224
“(…) supondo que o autor tenha apelado da sentença exclusivamente em relação ao dano
moral, o tribunal pode apreciar, no âmbito delimitado peal extensão do recurso, as mais
diversas questões agitadas no primeiro grau como fundamentos do pedido ou da defesa, ainda
que não constem da decisão recorrida ou das razões de recurso. Não poderá, todavia, se
pronunciar sobre quaisquer fundamentos atinentes ao dano material, uma vez que este se
encontra fora dos limites horizontais do recurso, e assim já estará submetido ao efeito da
preclusão” WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; DANTAS, Bruno. Recurso Especial, Recurso
Extraordinário e Ação Rescisória. Revista dos Tribunais, 3ª ed., 2016, p 389).
225
Com exceção das matérias de ordem pública, como será abaixo exaustivamente tratado.
135
226
MOREIRA, José Carlos Barbosa. Correlação entre o pedido e a sentença in Revista de
Processo, ano 21, n. 83, julho-setembro de 1996, p. 208.
227
“Permite-se, no CPC atual, que o próprio Tribunal Superior decida as demais causas de
pedir. Assim como se permite expressamente que se analise eventual outro fundamento de
defesa. Portanto, se o réu alega pagamento e prescrição, em ação em que lhe é cobrada
determinada quantia, e o juiz acolhe o pagamento, julgando improcedente a ação, e o Tribunal
de segundo grau confirma integralmente esta sentença, sem analisar o outro fundamento da
defesa, o Tribunal Superior pode, para suprir a falha do segundo grau, segundo o CPC
projetado, afastado o pagamento, conhecer da prescrição.” (OLIVEIRA, Pedro Miranda de.
Breves Comentários ao Novo Código de Processo Civil, coord. Teresa Arruda Alvim Wambier,
Fredie Didier Jr., Eduardo Talamini e Bruno Dantas. 3ª Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2016, p. 2.568).
228
“Fala-se que o tempo é a dimensão fundamental da vida humana, desempenhando no
processo idêntico papel. Sendo o processo uma entidade da vida social, a demora em sua
conclusão corre em detrimento da própria eficácia do direito material que visa proteger. Na
verdade, a tutela jurisdicional dos direitos e interesses legítimos não é útil senão quando obtida
em espaço razoavelmente rápido de tempo, sendo por isso indiscutível que a lentidão do
aparelho judiciário provoca o que se tem chamado de fenômeno da compressão dos direitos
fundamentais do cidadão. O fato tempo sobressai como elemento determinante para garantir e
realizar o acesso à justiça.” (MELO, Gustavo de Medeiros, O acesso adequado à justiça na
perspectiva do justo processo, in Processo e Constituição, Estudos em Homenagem ao
136
Professor José Carlos Barbosa Moreira, coordenado por Luiz Fux, Nelson Nery Jr. e Teresa
Arruda Alvim Wambier. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 691).
229
Art. 356. O juiz decidirá parcialmente o mérito quando um ou mais dos pedidos formulados
ou parcela deles: (…) § 2º. A parte poderá liquidar ou executar, desde logo, a obrigação
reconhecida na decisão que julgar parcialmente o mérito, independente de caução, ainda que
haja recurso contra essa interposto. § 3º. Na hipótese do § 2º, se houver trânsito em julgado da
decisão, a execução será definitiva”.
230
LIEBMAN, Enrico Tullio. Manuale di diritto processuale civile. Sexta Edizione. Milano: Goiffrè
Editore, 2002, p. 265.
231
Como é sabido e ressabido, as matérias de ordem pública podem e devem ser conhecidas
ex officio pelo órgão jurisdicional, não se operando a preclusão (CPC, art. 301, § 4º e art. 303,
137
inc. II). O fenômeno da preclusão nada mais é que (i) um acontecimento ou, simplesmente, um
fato ‘resultado de outro (inércia durante o tempo útil destinado ao desempenho de certa
atividade)’ – preclusão temporal; ou (ii) a ‘consequência de determinado fato que, por ter sido
praticado na ocasião oportuna, consumou a faculdade (para a parte) ou o poder (para o juiz) de
praticá-lo uma segunda vez’ – preclusão consumativa; ou ainda (iii) a ‘decorrência de haver
sido praticado (ou não) algum fato, incompatível com a prática de outro’ – preclusão lógica”.
232
ASSIS, Araken de. Manual dos recursos. 8ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, p.
286.
233
A título exemplificativo: “As matérias de ordem pública, ainda que desprovidas de
prequestionamento, podem ser analisadas excepcionalmente em sede de recurso especial,
cujo conhecimento e deu por outros fundamentos, à luz do efeito translativo dos recursos, (…)
Superado o juízo de admissibilidade, o recurso especial comporta efeito devolutivo amplo, já
que cumprirá ao Tribunal ‘julgar a causa aplicando o direito à espécie’ (Art. 257 do RISTJ;
Súmula 456 do STF)” (STJ, Edcl no AgRg no REsp 1.043.561/RO, rel. p/ acórdão Min. Luiz
Fux, 1ª T., j. 15.02.11).
234
Trecho do voto no AgRg nos EREsp 947.231/SC, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE
NORONHA, CORTE ESPECIAL, julgado em 23/04/2012, DJe 10/05/2012. No mesmo sentido:
AgRg nos EAg. N. 723.222/SP, relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, Terceira Seção, DJe de
17.6.2008; AgRg nos EDcl nos EREsp n. 508.173/SC, relator Ministro Teori Albino Zavascki,
Primeira Seção, DJ de 15.5.2006.
138
235
“Questão interessante é a de saber como se coloca a exigência do prequestionamento em
face de questões de ordem pública, que devam ser conhecida ex officio pelo juiz. Tal é o caso,
por exemplo, da falta de condições da ação, vício que, segundo preceitua o art. 267, § 3º, do
CPC, deve ser conhecido de ofício e em qualquer tempo e grau de jurisdição, enquanto não
proferida sentença (ou acórdão, em se tratando de tribunal). Parece-nos que, também neste
caso, haverá a necessidade de prequestionamento, porque, caso contrário, não se fará
presente o requisito constitucional ensejador do cabimento do recurso especial pela alínea a do
inc. III do art. 105 da CF/88, que alude a ‘causas decididas’. Ou seja, será sempre preciso que
o tribunal local tenha apreciado a questão federal objeto do recurso, para viabilizar o acesso ao
Superior Tribunal de Justiça pela via do recurso especial” ARRUDA ALVIM, Eduardo. Direito
Processual Civil. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 876/877).
236
Os incisos mencionados são os seguintes: “Art. 485. O juiz não resolverá o mérito quando:
(…) IV – verificar a ausência de pressupostos de constituição e desenvolvimento válido e
regular do processo; V – reconhecer a existência de perempção, de litispendência ou de coisa
julgada; VI – verificar a ausência de legitimidade ou de interesse processual; (…) IX – em caso
de morte da parte, a ação for considerada intrasmissível por disposição legal”.
237
O Código de Processo Civil de 1973 previa o seguinte em seu art. 267: “§ 3º O juiz
conhecerá de ofício, em qualquer tempo e grau de jurisdição, enquanto não proferida a
sentença de mérito, da matéria constante dos ns. IV, V e VI”.
238
MEDINA, José Miguel Garcia. Novo Código de Processo Civil Comentado, com remissões e
notas comparativas ao CPC/1973. 4ª Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016; p. 1.559.
139
239
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonardo
Ferres da Silva; MELLO, Rogério Licastro Torres de. Primeiros Comentários ao Novo Código
de Processo Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, 2ª ed., p. 861, destaques o original.
240
“Sempre entendi, a despeito da literalidade do enunciado [Súmula 456 do STF] e, mais do
que ele, da própria textualidade do novel art. 1.034, que a questão só pode ser analisada na
perspectiva constitucional. Os incisos III dos arts. 102 e 105 da CF são limites intransponíveis
para o legislador infraconstitucional: o recurso extraordinário e o recurso especial pressupõem
causa decidida, razão pela qual entendo que questões não decididas, ainda que de ordem
pública, não podem ser julgadas ex novo pelo STF e pelo STJ naquelas sedes recursais.
Não se trata de sustentar a aplicação do princípio da eficiência processual
expressamente agasalhado no inciso LXXVIII do art. 5º da CF. Trata-se, bem diferentemente,
de invocar regra de competência estrita, que preserva, como escrevo no n. 9, supra, a
competência recursal extraordinária e especial do STF e do STJ e, em última análise, o papel
que se espera daqueles Tribunais no modelo constitucional que, nesses casos, não são e não
podem se comportar como órgãos de revisão ampla.
Nem mesmo a lembrança do § 3º do at. 485 que, também na sua literalidade, insinua
que questões de ordem pública são cognoscíveis ‘em qualquer tempo e grau de jurisdição
enquanto não ocorrer o trânsito em julgado’. Evidentemente, não nego que o texto da regra
permite infirmar o que acabei de criticar. Nego, contudo, que ela possa querer significar o que,
na perspectiva do que aqui defendo, é inviável sem agredir o modelo constitucional”. (BUENO,
Cassio Scarpinella. Manual de Direito Processual Civil. São Paulo: Saraiva, 2016, 2ª ed., p.
720).
140
241
Ainda que se trate de matéria de ordem pública, não deve ser ignorado o princípio do
contraditório: “Entretanto, mesmo quando é o caso de conhecer e decidir questão de ordem
pública, o que o juiz ou o tribunal têm o dever de ofício de resolver, com ou sem provocação da
parte, não lhe será lícito fazê-lo, sem antes cumprir o contraditório, assegurado aos litigantes
pela Constituição como direito fundamental (CF, art. 5º, LV). Por isso, deparando-se com o
problema dessa natureza, cabe ao julgador abrir oportunidade para prévia manifestação das
partes, para só depois pronunciar-se. Assim, no art. 9º do NCPC vem disposto que ‘não se
proferirá decisão contra uma das partes sem que esta seja previamente ouvida’. O art. 10, por
sua vez, aduz que ‘o juiz não pode decidir, em qualquer grau de jurisdição, com base em
fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar,
ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício’. Dessa maneira, o
contraditório efetivo (assegurado pelo art. 7º) é visto, além de sua dimensão tradicional, como
garantia de não surpresa, seja no tocante às questões novas, seja em relação aos
fundamentos novos aplicados à solução das questões velhas”. (THEODORO JR., Humberto.
Curso de Direito Processual Civil. Rio de Janeiro: Forense, 48ª ed., 2016, pp. 966).
242
“Assim, poderá o STF ou STJ analisar matéria que não foi examinada na instância a quo,
pois o pré-questionamento diz respeito apenas ao juízo de admissibilidade. O juízo de
142
246
Exige-se, nos recursos excepcionais, o pré-questioanamento da questão de direito que se
pretenda levar à apreciação dos tribunais superiores, conforme já visto. Sucede que, se o
recurso extraordinário ou especial for interposto por outro motivo, e for conhecido, poderá o
STF ou STJ, ao julgá-lo, conhecer ex officio ou por provação de todas as matérias que podem
ser alegadas a qualquer tempo (aquelas previstas no § 3º do art. 485, além da prescrição ou da
decadência), bem como de todas as questões suscitadas e discutidas no processo,
relacionados ao capítulo decisório objeto do recurso extraordinário (art. 1.034, par. ún., CPC),
mesmo que não tenham sido enfrentadas no acórdão recorrido. (…) Para fins de impugnação
(efeito devolutivo), somente cabe recurso extraordinário ou especial se for previamente
questionada, pelo tribunal recorrido, determinada questão jurídica. Para fins de julgamento
(profundidade do efeito devolutivo), porém, uma vez conhecido o recurso extraordinário ou
especial, poderá o tribunal examinar todas as matérias que possam ser conhecidas a qualquer
tempo, inclusive a prescrição, a decadência e as questões de que trata o § 3º do art. 485 do
CPC, ‘porque não é crível que, verificando a nulidade absoluta ou até a existência do processo
[ou do próprio direito, acrescente-se], profira decisão eivada de vício, suscetível de
desconstituição por meio de ação rescisória ou declaratória de inexistência de decisão judicial’”
(DIDIER JR, Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da. Curso de Direito Processual Civil.
Salvador: JusPodivm, 2016, 13ª ed., pp. 321/323).
247
E continua o autor: “Na segunda fase do julgamento, vale dizer, no juízo de revisão, os
tribunais superiores passam a ter a mesma competência dos tribunais de apelação (TJ e TRF),
podendo rejulgar a causa inclusive com reexame de prova, do direito local (estadual e
municipal). No juízo de revisão incide o regime jurídico da teoria geral dos recursos como um
todo, inclusive com a incidência do efeito translativo: exame pelo STF e STJ, ex officio, das
matérias de ordem pública” (NERY JR., Nelson. Teoria Geral dos Recursos. 7ª Ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2014, pp. 465/466).
144
250
MIRANDA, Gilson Delgado. SHIMURA, Sergio. Há vedação à reformatio in pejus no novo
CPC? in Questões Relevantes sobre Recursos, Ações de Impugnação e Mecanismos de
Uniformização da Jurisprudência após o primeiro ano de vigência do novo CPC. Coord. Bruno
Dantas, Cassio Scarpinella Bueno, Cláudia Elisabete Shwerz Cahali e Rita Dias Nolasco. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2017, p. 73.
251
“A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada. (…) § 3º Se o
processo estiver em condições de imediato julgamento, o tribunal deve decidir desde logo o
mérito quando: I – reformar sentença fundada no art. 485 (…)”.
146
causa madura, ainda que o resultado possa vir a prejudicar a parte recorrente.
Veja-se um julgado bastante exemplificativo:
254
Há ainda diversos outros precedentes como, por exemplo: AgRg no REsp 1117861 / SC,
Ministro RAUL ARAÚJO (1143), T4 - QUARTA TURMA, j. 10/05/2016, DJe 30/05/2016; AgRg
no REsp 704218 SP 2004/0164627-3, Relator Ministro Luis Felipe Salomão, T4 – Quarta
turma, j. 15/03/2011, DJe 18/03/2011; Apelação Cível Nº 70060380698, Décima Oitava Câmara
Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Heleno Tregnago Saraiva, Julgado em 17/07/2014.
255
AgRg no Ag 867885/ MG, Quarta Turma, j. 25/09/2007, DJ 22/10/2007, p. 297).
148
sentença, o autor apelasse contra esta e ele, tribunal, afinal voltasse a julgar o
mérito”256.
O entendimento não deve se aplicar de maneira indiscriminada.
Hipóteses em que o beneficiado pela sentença recorre, por exemplo, para
majorar ou buscar a fixação de honorários, se a outra parte não recorreu, ele
não pode ver julgado contra si qualquer dos demais aspectos da sentença,
como o reconhecimento de sua ilegitimidade passiva ou a improcedência dos
pedidos, por exemplo. Aqui se aplica estritamente a definição de capítulos da
sentença: se apenas se recorreu dos honorários, os demais capítulos da
decisão transitaram em julgado e, portanto, não podem alterados, nem em se
tratando de matéria de ordem pública. É o que se passa a tratar.
256
DINAMARCO, Cândido Rangel. Nova Era do Processo Civil. 2. ed. São Paulo: Malheiros,
2007, pp. 177/181.
149
257
“Outro princípio importante para o sistema processual brasileiro diz respeito à proibição de
que o julgamento do recurso, interposto exclusivamente por um dos sujeitos, venha a tornar a
sua situação pior do que aquela existente antes da insurgência. Ora, se o recurso é mecanismo
previsto para que se possa obter a revisão de decisão judicial, é intuitivo que sua finalidade
deve cingir-se a melhorar (ou pelo menos manter idêntica) a situação vivida pelo recorrente.
Como remédio voluntário, o recurso é interposto no interesse do recorrente. Não pode, por
isso, a interposição do recurso piorar a condição da parte, trazendo para ela situação mais
prejudicial do que aquela existente antes do oferecimento do recurso. Tal é a formulação do
princípio em exame, que proíbe a reformatio in pejus” (MARINONI, Luiz Guilherme;
ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo Curso de Processo Civil. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2015, p. 514).
258
THEODORO JR., Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Vol. III. Rio de Janeiro:
Forense, 48ª ed., 2016, pp. 965/966.
259
MIRANDA, Gilson Delgado. SHIMURA, Sergio. Há vedação à reformatio in pejus no novo
CPC? in Questões Relevantes sobre Recursos, Ações de Impugnação e Mecanismos de
Uniformização da Jurisprudência após o primeiro ano de vigência do novo CPC. Coord. Bruno
Dantas, Cassio Scarpinella Bueno, Cláudia Elisabete Shwerz Cahali e Rita Dias Nolasco. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2017, p. 75.
260
“(…) é perfeitamente lícito ao tribunal, por exemplo, extinguir o processo sem resolução de
mérito, em julgamento de apelação contra sentença de mérito interposta apenas pelo autor,
não ocorrendo aqui a reformatio in peius proibida: há, em certa medida, reforma para pior, mas
permitida pela lei, pois o exame das condições da ação é matéria de ordem pública a respeito
da qual o tribunal deve pronunciar-se ex officio, independentemente de pedido ou requerimento
da parte ou interessado (CPC 267 VI e § 3º). Dizemos em certa medida porque, na verdade,
nem se poderia falar em reformatio in peius, instituto que somente se coaduna com o princípio
dispositivo, que não é o caso das questões de ordem pública transferidas ao exame do tribunal
destinatário por força do efeito translativo do recurso” (NERY JR., Nelson. Teoria Geral dos
Recursos. 7ª Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, pp. 462/463).
150
Logo, se ajuizada uma ação por “A” contra “B”, pleiteando danos
materiais e morais, ambos procedentes em 1º Grau de jurisdição, mas estes
em valor menor do que o requerido inicialmente, em um recurso interposto
apenas por “A”, seria permitido ao órgão ad quem simplesmente extinguir a
ação, contrariamente ao recorrente, por força de alguma matéria de ordem
pública, como coisa julgada ou prescrição, por exemplo.
Questão bastante ilustrativa do tema se refere à matéria reconhecível de
ofício, que é a prescrição. Muito se explora, na linha das questões de ordem
pública em essência, que a prescrição deve ser reconhecida de ofício a
qualquer tempo e momento, ainda que implique, na prática, em reformatio in
pejus. Na verdade, entendimento intermediário caminha no sentido de que o
seu reconhecimento pode ocorrer de ofício, ainda que em prejuízo ao
recorrente, mas o seu afastamento não. Isto é, se extinta ação pela prescrição,
com fundamento, portanto, no art. 485, II, do Código de Processo Civil, mas
apenas o réu recorrer com o intuito de majorar os honorários, o
reconhecimento da prescrição não pode ser de ofício afastado pelo Tribunal
para julgar o mérito propriamente dito da ação.
Com o devido respeito aos entendimentos divergentes, ainda que
majoritários, a permissão indiscriminada para julgamento por órgãos superiores
de matéria de ordem pública em prejuízo do recorrente (ou seja, independente
da vedação à reformatio in pejus) não parece ser a melhor solução. Todo o
processo civil é construído pautado no princípio da segurança jurídica que se
constitui, muito basicamente, pela previsibilidade. Ora, a parte litigante deve
saber o que esperar do Poder Judiciário e, mais do que isso, deve ter
consciência de qual seria a pior situação a que ela poderia restar submetida ao
praticar determinado ato em juízo.
Em exemplo muito didático, embora feito para hipótese de 1º Grau, o
mestre Barbosa Moreira ilustra a questão: “Se me permitem comparação muito
atual, um técnico de futebol que esteja preparando a sua seleção para
determinado jogo precisa saber o que está em disputa naquele jogo. Se se
trata de jogo meramente classificatório, ele vai preparar a equipe de certa
maneira; se se trata de jogo eliminatório, poderá adotar outra tática. O mesmo
acontece com o réu: é preciso que ele possa avaliar quais são as suas chances
e qual a pior coisa que lhe pode acontecer se for derrotado. Dependendo das
151
261
MOREIRA, José Carlos Barbosa. Correlação entre o pedido e a sentença in Revista de
Processo, ano 21, n. 83, julho-setembro de 1996, p. 209.
262
“Mesmo a constatação da existência de questões de ordem pública contrárias ao recorrente
não permite a reformatio in pejus. A profundidade do efeito devolutivo opera nos limites da sua
extensão. Isso está claramente explicitado no art. 1.013, § 1º, parte final, do CPC/2015 (‘desde
que relativas ao capítulo impugnado’). Se, no exemplo que se acabou de dar, o tribunal
constatasse existir coisa julgada material advinda de uma anterior sentença que havia rejeitado
todos os mesmos pedidos do autor, ainda assim, esse fundamento apenas serviria de base
para o desprovimento do recurso interposto, ou seja, apenas ensejaria a negativa de ampliação
do valor condenatório que havia sido recursalmente pleiteada. Os capítulos condenatórios que
não foram objeto de recurso pelo réu permaneceriam incólumes, por estarem fora da extensão
do efeito devolutivo do recurso interposto pelo autor”. (WAMBIER, Luiz Rodrigues; TALAMINI,
Eduardo. Curso Avançado de Processo Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 16ª ed., vol. 2,
2016, pp. 492/493).
263
“Art. 356. O juiz decidirá parcialmente o mérito quando um ou mais dos pedidos formulados
ou parcela deles: I - mostrar-se incontroverso; II - estiver em condições de imediato julgamento,
o
nos termos do art. 355. § 1 A decisão que julgar parcialmente o mérito poderá reconhecer a
o
existência de obrigação líquida ou ilíquida. § 2 A parte poderá liquidar ou executar, desde logo,
a obrigação reconhecida na decisão que julgar parcialmente o mérito, independentemente de
o o
caução, ainda que haja recurso contra essa interposto. § 3 Na hipótese do § 2 , se houver
o
trânsito em julgado da decisão, a execução será definitiva. § 4 A liquidação e o cumprimento
da decisão que julgar parcialmente o mérito poderão ser processados em autos suplementares,
o
a requerimento da parte ou a critério do juiz. § 5 A decisão proferida com base neste artigo é
impugnável por agravo de instrumento.”
152
264
Nesse sentido, Humberto Theodoro Júnior: “Discute-se sobre ser, ou não, o
prequestionamento condição para que o Superior Tribunal de Justiça examine questão de
ordem pública não enfrentada pelo acórdão impugnado por meio de recurso especial, havendo
correntes em ambos os sentidos. O entendimento que se coloca numa posição intermediária
parece ser bem mais razoável: o STJ poderia apreciar de ofício, questão de ordem pública
como as condições da ação, desde que tenha sido conhecido o especial em que lhe cabe
aplicar o direito à espécie. O tema incluir-se-ia no efeito devolutivo em profundidade, que
153
diploma processual, mas naqueles autos o tema não mais poderá ser
analisado.
Esse entendimento, inclusive, já vinha sendo refletido por parte da
doutrina na vigência do Código de Processo Civil de 1973, como se vê do
seguinte exemplificativo e elucidativo trecho: “(…) se houver recurso especial
versando apenas o mérito, o STJ não poderá apreciar questão preliminar,
ainda que essa fosse apreciável de ofício pelas instâncias ordinárias, tal como
sucede no caso do recurso de apelação, por exemplo. E não poderá fazê-lo
mesmo que essa preliminar se encontre decidida pelo acórdão, salvo recurso
que, contra essa parte da decisão, se dirija. Às instâncias extraordinárias não
se aplica o § 3º do art. 267 (…). Por isso mesmo, se houver recurso especial
versando a questão de mérito, o recorrido, que alegara preliminar, rejeitada, se
pretender o prevalecimento eventual dessa preliminar (pois o julgamento de
mérito, em tese, pode ser invertido em seu desfavor), deverá interpor recurso
especial sob a forma adesiva (condicionada)”267.
VI - for fundada em prova cuja falsidade tenha sido apurada em processo criminal ou venha a
ser demonstrada na própria ação rescisória”;
VII - obtiver o autor, posteriormente ao trânsito em julgado, prova nova cuja existência ignorava
ou de que não pôde fazer uso, capaz, por si só, de lhe assegurar pronunciamento favorável;
VIII - for fundada em erro de fato verificável do exame dos autos.
267
ARRUDA ALVIM, Eduardo. Direito Processual Civil. 2ª ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2008, pp. 883/884.
155
268
CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de Direito Processual Civil. 2ª ed. São Paulo: Saraiva,
1965, pp. 175/176.
269
OLIVEIRA, Pedro Miranda de. Breves Comentários ao Novo Código de Processo Civil,
coord. Teresa Arruda Alvim Wambier, Fredie Didier Jr., Eduardo Talamini e Bruno Dantas. 3ª
Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, p. 2.568.
156
270
Vale transcrever trecho de voto do Min. Vicente Cernicchiaro que, muito embora antigo, bem
aborda o assunto: A valoração da prova é relativa ao ato jurídico perfeito. A adequação da
prova à Constituição e à lei ordinária. Compreende admissibilidade de formação consoante o
ordenamento jurídico. A primeira é consentimento, constatável em plano meramente normativo.
A segunda porque relacionada com os princípios de realização, própria também da experiência
jurídica, não se confunde com a interpretação da prova, ou seja, a avaliação dos dados fáticos
elaborados pelo Magistrado. (...) A valoração da prova distingue-se da análise da prova. essa
distinção amolda-se perfeitamente ao campo teorético. O instituto, porém, na experiência, para
caracterização fenomênica pode exigir análise, realização de provas. Sem dúvida, confissão é
narração, reconhecimento de autoria de fato. Por sua natureza, reclama espontaneidade,
deliberação sem qualquer constrangimento. Com efeito, confissão e tortura são termos
contraditórios. Todavia, a livre opção ou a coação dependem de prova. em sendo assim, a
confissão ou a extorsão de palavras no campo fático, não pode ser dirimida na ação de habeas
corpus” (REsp. 112087/DF; 6ª Turma; DJ 27.10.1997; p. 54.843). Reproduzam-se, ainda,
outros julgados do Superior Tribunal de Justiça que refletem o entendimento: Consoante
jurisprudência da Corte, ‘a revaloração da prova delineada no próprio decisório recorrido,
suficiente para a solução do caso, é, ao contrário do reexame, permitida no recurso
especial”(REsp 723147/RS, Relator Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, DJ de 24.10.2005;
AgRg no REsp 757012/RJ, desta relatoria, Primeira Turma, DJ de 24.10.2005; REsp
683702/RS, Relator Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, DJ de 02.05.2005; “AGRAVO
REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL - ROUBO DE CARGA - DEMANDA REGRESSIVA
DE SEGURADORA CONTRATADA PELO PROPRIETÁRIO DOS BENS EM FACE DA
TRANSPORTADORA - DECISÃO MONOCRÁTICA PROVENDO O RECLAMO DA
DEMANDADA, PARA ISENTA-LA DO DEVER DE INDENIZAR. INSURGÊNCIA DA AUTORA -
1. A REDEFINIÇÃO DO ENQUADRAMENTO JURÍDICO DOS FATOS EXPRESSAMENTE
MENCIONADOS NO ACÓRDÃO HOSTILIZADO CONSTITUI MERA REVALORAÇÃO DA
PROVA - DELIBERAÇÃO UNIPESSOAL EM CONFORMIDADE AO ENTENDIMENTO
CRISTALIZADO NA SÚMULA N. 7 DO STJ - 2. SUBTRAÇÃO DA CARGA, MEDIANTE AÇÃO
ARMADA DE ASSALTANTES - CAUSA INDEPENDENTE, DESVINCULADA À NORMAL
EXECUÇÃO DO CONTRATO DE TRANSPORTE, QUE CONFIGURA FATO EXCLUSIVO DE
TERCEIRO, EXCLUDENTE DA RESPONSABILIDADE CIVIL - ENTENDIMENTO
CONSOLIDADO NESTE SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - ALUSÃO, ADEMAIS, NO
ARESTO ATACADO, DA ADOÇÃO DE PROVIDÊNCIAS CONCRETAS POR INICIATIVA DA
TRANSPORTADORA VISANDO À PREVENÇÃO DA OCORRÊNCIA - 3. RECURSO
DESPROVIDO.” (AgRg no REsp 1036178/SP, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA,
julgado em 13/12/2011, DJe 19/12/2011).
157
CONCLUSÃO
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