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All content following this page was uploaded by Silvia Ester Orrú on 25 November 2016.
Resumo
A educação é um direito fundamental do cidadão. Para garantir esse
direito, legislações foram feitas para que alunos com deficiências
tivessem acesso e permanência nas escolas. A esse movimento deu-
se o nome de inclusão. Contudo, apesar das legislações instituídas,
muitos alunos sofrem uma pseudoinclusão, pois, embora tenham
acesso físico à escola, o acolhimento que promove o sentimento
de pertencimento ao grupo inexiste. O objetivo deste texto é dar a
conhecer o conceito de “inclusão menor”, inspirado na leitura de
“Kafka, por uma literatura menor”, de Deleuze e Guattari. Foram
realizadas duas entrevistas, com uma diretora e uma professora,
além de uma roda de conversa com uma turma de crianças do
primeiro ano. Como resultados, são apresentadas experiências
nas quais a inclusão faz parte da filosofia pedagógica e de vida
da comunidade escolar. Por fim, conceitua-se inclusão menor
como aquela que acontece na diferença que se diferencia, e sem a
imposição legal como sua motivação.
Abstract
1 Introdução
2 Optamos pela escrita das palavras com ênfase no prefixo “re”. “Re”, prefixo
2 Procedimentos métodológicos
que todos ouvem o que cada um tem a dizer sobre o tema abordado,
sendo, ao mesmo tempo, instigado a se colocar sobre o assunto. Esse
processo dialógico, favorecido pelas rodas de conversa, é próprio das
metodologias participativas de abordagem qualitativa.
Para esta pesquisa, a roda de conversa foi um recurso que possibilitou
o diálogo, de maneira que as crianças pudessem se enunciar sobre
o tema. Por meio da roda de conversa, ao mesmo tempo em que as
crianças enunciavam suas vozes sobre “diferença”, também tiveram
a oportunidade de perceber o enunciar e o pensar compartilhado
pelos demais colegas, tendo a possibilidade de dar significação aos
acontecimentos.
Sobre a metodologia qualitativa, foram realizadas, em uma escola
de ensino fundamental situada no Sul do Estado de Minas Gerais, duas
entrevistas: uma entrevista com a diretora da escola e outra, com uma
professora do primeiro ano. A seleção dessa escola se deu pelo fato de
ser a única da cidade com Projeto Político Pedagógico fundamentado
na aprendizagem por projetos, avessa ao sistema apostilado, e por se
caracterizar como uma escola com princípios inclusivos.
As entrevistas abertas ocorreram da seguinte forma: à diretora da
escola, foram apresentadas as palavras “diferença – inclusão – gestão”,
e, à professora, foram apresentadas as palavras “diferença – inclusão –
aprendizagem”. As entrevistas foram gravadas e não tiveram intervenção
da pesquisadora.
Também foi realizada uma roda de conversa com a turma da
professora entrevistada, com crianças entre 6 e 7 anos de idade3. A turma
é constituída por 25 crianças, sendo que duas possuem o diagnóstico
de autismo, e uma possui comprometimentos motores e de fala, além
de outras quatro crianças advindas de culturas distintas, três delas,
filhos de imigrantes. As crianças fizeram uma roda e se sentaram uma
ao lado da outra. Explicamos que gostaríamos de conversar com elas
sobre o conteúdo de um vídeo musical. Às crianças, foi apresentado
o vídeo com a música “Você vai gostar de mim”, cantada por Xuxa
Meneguel. A letra da música aborda a diferença entre as pessoas, e as
4 Entre muitos, a Constituição Federal (1988), a Declaração de Jomtien (1990), a Declaração de Salamanca
(1994) e o Estatuto da Pessoa com Deficiência (2015).
5 Para Deleuze, a única identidade que realmente temos é a de Ser humano, de sermos da própria espécie.
6 A diferença aqui citada diz respeito às pessoas classificadas e nomeadas como diferentes a partir
do diagnóstico. A exemplo, a trissomia do cromossomo XXI é concebida como uma diferença, uma
anormalidade em relação ao que é considerado normal pela literatura científica. No entanto, essa
diferença (trissomia do cromossomo XXI) se diferencia em sua própria diferença, ou seja, nunca haverá
pessoas semelhantes ou iguais pelo diagnóstico desta trissomia que se repete. A trissomia se repete,
mas as pessoas não se repetem, mas se diferenciam e se multiplicam.
7 Significa separação. Citamos o termo pelo significado histórico, cultural e social que nos traz.
O apartheid trouxe violência e um significativo movimento de resistência interna na África do Sul,
tendo como seu maior representante Nelson Rolihlahla Mandela, sobrevivente desse regime excludente
e segregador.
5 Inclusão e diferença
6 Resultados
E ela me fez pensar muito e eu recebi este recado e falei “nossa!” acho
que nós temos que cada vez mais a aperfeiçoar a ideia de que quanto
menos exclusão, menos inclusão também. A hora que você começa com
as especificidades é que você percebe as diferenças. (Entrevista com a
Diretora – dados da pesquisa).
A inclusão menor se constitui naturalmente no seio da escola.
O pertencimento do aluno com paralisia cerebral ao grupo é um
acontecimento tão vital que sua colega responde à mãe que ali não havia
inclusão. Isso, no sentido de que não havia para aquela aluna o encontro
binário exclusão/inclusão orbitando no mesmo centro em comum.
Percebe-se o acontecimento da inclusão menor na voz da diretora da
escola: “Quando o professor aposta, ele aposta em todos, naquele que é
mais tímido, naquele que precisa de um atendimento especial, naquele
que é mais disperso, naquele que é mais agressivo, ele aposta em todos”
(Entrevista com a Diretora – dados da pesquisa). Ela não se remete apenas
aos alunos com algum tipo de deficiência, embora esses estejam presentes
pelas suas singularidades, que exigem um “atendimento especial”, como
é dito por ela. Ao revés, ela menciona alunos com diferenças próprias do
ser humano. O sentido do verbo “apostar” se engaja com o substantivo
“acolhimento”. Aposta-se, investe-se, acredita-se em quem se acolhe; em
sua voz, é notável que todos os alunos são acolhidos e respeitados em
suas diferenças. Ou seja, a inclusão menor acontece na própria inclusão
maior (inclusão prevista e obrigatória pela legislação vigente) e para
além dela.
7 Considerações finais
radical. Para que aconteça a inclusão, a diferença precisa ser seu par.
Inclusão e diferença, em suas incompletudes, só podem existir na própria
diferença. A inclusão nunca será estática, nunca se repetirá. Jamais
acontecerá no meio termo. E não se pautará na homogeneidade.
A inclusão menor, por sua vez, é um acontecimento pleno no qual
os sujeitos-atores a vivenciam, promovem-na em razão da organização
de crenças que geram e que estão muito além das imposições legais.
É aí que a diferença é compreendida em sua própria diferença, que
sempre se diferencia, nunca se repete, pois somos seres singulares, e os
acontecimentos nunca são iguais.
É na inclusão menor que encontramos uma infinita possibilidade de
sermos todos aprendizes, para que a inclusão seja sempre re-inventada,
de modo a beneficiar todos à sua volta, por uma sociedade cada vez
menos excludente.
Referências
sobre%20os%20Direitos%20das%20Pessoas%20com%20
Defici%C3%AAncia%20Comentada.pdf>. Acesso em: 02 set. 2016.
Recebido em 19/05/2016
Aprovado em 27/08/2016