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ESTUDO DE CASO: ANÁLISE NUMÉRICA DE UM PROCESSO DE

TRATAMENTO DE EFLUENTE A PARTIR DE DILUIÇÃO EM TANQUES EM SÉRIE

Meury Joicy Biazatti

Introdução

Na indústria, a utilização de água ocorre de várias maneiras, desde lavagens em maquinários e


pisos, até incorporação em produtos, sistemas de resfriamento e geradores de vapor. Nesse contexto,
com exceção da água que é adicionada aos produtos ou perdida por evaporação, há um grande volume
de água que é contaminado pelos processos industriais, chamados de efluentes líquidos (GIORDANO,
2004).
Os efluentes líquidos, quando despejados sem nenhum tratamento para remoção de poluentes
característicos, modificam maleficamente os corpos de água. A introdução de matéria orgânica desses
corpos, para além da modificação de pH, temperatura, concentração de SST (Sólidos Suspensos
Totais), entre outros, influencia indiretamente no consumo do oxigênio dissolvido. Isso acontece em
razão do processo de estabilização da matéria orgânica realizado pelas bactérias decompositoras, que
utilizam o oxigênio disponível no meio líquido para respirarem. Do ponto de viste ambiental, o
decréscimo de concentração de oxigênio dissolvido tem várias implicações, caracterizando um dos
principais problemas de poluição de água (SOARES & FERREIRA, 2017).
Dentro desse cenário, a poluição é função das perdas de carga, produtos e matérias primas,
portanto, é resultado da ineficiência dos processos industriais, e a priori deve ser controlada pela
redução desperdícios no processo. Além disso, os efluentes gerados no processo devem ser levados
para sistemas de tratamento de efluentes que têm como principais fundamentos de projeto as variações
de fluxo e carga do poluente, calculados com base em um balanço de massa sobre a planta industrial.
Estes parâmetros são geralmente regularizados por lei (MORAM, 2018).
Um meio de tratar os efluentes quando os mesmos estão contaminados com resíduos químicos
é a diluição, um dos principais processos executados laboratorialmente ou industrialmente. A diluição
se baseia na adição de um solvente à um soluto até alcançar condições desejáveis de concentração
(CREMASCO, 2008). Em escala industrial, para avaliação das concentrações de poluentes de forma
dinâmica, são geralmente empregados modelos computacionais como ferramenta de análise
(METCALF, 2015).
Em vista da relevância do assunto, o presente trabalho teve como objetivo avaliar
numericamente uma estação de tratamento de efluentes dotado de dois tanques cilíndricos, destinada a
reduzir o teor de poluente orgânico, verificando se a mesma se encontrava dentro dos parâmetros
estabelecidos por lei. Para isso, a partir das equações do sistema, e utilizando-se o software SciLab,
avaliou-se o comportamento das concentrações de poluentes nos tanques em função do tempo.
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Metodologia

O problema proposto consistiu em uma estação de tratamento, destinada a diminuir a


concentração de um poluente orgânico presente no efluente líquido de um processo industrial. A
estação, por sua vez, era composta por dois tanques cilíndricos em série, com diâmetros de 1,2m e
1,6m, e de alturas iguais a 1m.
O primeiro tanque é alimentado por duas vazões: uma com a corrente industrial de 100L/h e
concentração de 500ppm de poluente, e outra de água de diluição de 2000L/h. O segundo tanque, por
sua vez, tem como entrada a vazão resultante do primeiro tanque e, simultaneamente, outra vazão de
efluente de 5500L/h a uma concentração de 90ppm.
A lei cinética para o consumo de poluente do processo foi dada como:
𝐸
𝐾 = 𝐾0 exp⁡(− 𝑅𝑇) (1)
Onde:
𝐾0 = 4,4*104 h-1, constante da taxa;
E=6000 cal/mol, Energia de ativação;
R=1,99 cal/mol K, constante universal dos gases.

O primeiro passo tomado foi escrever as equações que modelam o sistema para a concentração
de resíduo químico. Para este processo, em regime transiente, o balanço de massa global para o
tanque1 e 2, respectivamente, são:
𝑑𝑀1
𝑑𝑡
= 𝐹1̇ 𝜌 + 𝐹2̇ 𝜌 − 𝐹3̇ 𝜌 (2)
𝑑𝑀2
𝑑𝑡
= 𝐹3̇ 𝜌 + 𝐹4̇ 𝜌 − 𝐹5̇ 𝜌 (3)

Onde:
𝐹1̇ : Fluxo de entrada de poluente no tanque 1 (L/h);
𝐹2̇ : Fluxo de entrada de água no tanque 1 (L/h);
𝐹3:̇ Fluxo de saída no tanque 2 (L/h);
𝐹4̇ : Fluxo de entrada de água no tanque 2 (L/h);
𝐹5̇ : Fluxo de saída no tanque 2 (L/h);
𝜌: Densidade (kg/m3);
𝑑𝑀
𝑑𝑡
: Variação da massa em função do tempo, taxa de acúmulo (Kg/h).

Por sua vez, os balanços de massa para o poluente nos tanques 1 e 2, além das taxas de entrada
e saída dos produtos, possuem um termo de reação, 𝑟𝑎 =K𝐶𝑝 , expressas nas equações 4 e 5.
𝑑𝑀𝑃1
𝑑𝑡
= 𝐹1̇ 𝐶𝑝1 − 𝐹3̇ 𝐶𝑝3 − 𝑉1 𝐾𝐶𝑝3 (4)
𝑑𝑀𝑃2
𝑑𝑡
= 𝐹3̇ 𝐶𝑝3 + 𝐹4̇ 𝐶𝑝4 − 𝐹5̇ 𝐶𝑝5 − 𝑉1 𝐾𝐶53 (5)

Onde:
𝐶𝑝1 : Concentração de poluente na entrada do tanque 1 (ppm);
𝐶𝑝3 : Concentração de poluente na saída do tanque 1 (ppm);
𝐶𝑝4 : Concentração de poluente na entrada do tanque 2 (ppm);
𝐶𝑝5 : Concentração de poluente na saída do tanque 2 (ppm);
V1: Volume do tanque 1 (L);
2
V2: Volume do tanque 2 (L);
𝑑𝑀𝑃1
𝑑𝑡
: Variação da massa de poluente no tanque 1 em função do tempo (ppm/h);
𝑑𝑀𝑃2
𝑑𝑡
: Variação da massa de poluente no tanque 2 em função do tempo (ppm/h).

Partindo da relação de que 𝑀𝑃1 = 𝑉1 𝐶𝑝3 e 𝑀𝑃2 = 𝑉2 𝐶𝑝5, reescrevem-se as equações:


𝑑(𝐶𝑝3 ) 𝐹1̇ 𝐶𝑝1 𝐹3̇ 𝐶𝑝3
𝑑𝑡
= 𝑉1
− 𝑉1
− 𝐾𝐶𝑝3 (6)
𝑑(𝐶𝑝5 ) 𝐹3̇ 𝐶𝑝3 𝐹4̇ 𝐶𝑝4 𝐹5̇ 𝐶𝑝5
𝑑𝑡
= 𝑉2
+ 𝑉2
− 𝑉2
− 𝐾𝐶𝑝5 (7)

A partir das equações 6 e 7, igualando o termo de acumulo a 0, as condições no estado


estacionário para a temperatura de 300K foram calculadas pelo método de Newton-Raphson. Após
isso, foi considerada uma perturbação na temperatura, alterando-a para 278K, e o sistema foi
modelado a fim de se obter a resposta de teor de poluente orgânico na saída dos tanques 1 e 2 em
função do tempo pelo método de Runge-kutta multivariável de 2º ordem. Ressalva-se que as vazões de
saída dos tanques 1 e 2 foram determinadas pelo balanço de massa global dos tanques.
O sistema proposto também foi modelado a partir da ferramenta de programação em blocos
Xcos, que se baseia na forma de espaço de estados, como mostrado nas equações 8 e 9, e verificam o
comportamento das variáveis desvio.
𝑥̇ = 𝐴𝑥 + 𝐵𝑢 (8)
𝑦 = 𝐶𝑥 + 𝐷𝑢 (9)
Onde:
𝑥: Vetor de variáveis de entrada
𝐴: Matriz jacobiana das equações que regem o modelo, determinando a estabilidade do
sistema de equações e a velocidade da resposta.
B: Derivada das equações com relação aos parâmetros de entrada, linearizadas conforme o
sistema analisado, no caso, a temperatura.
y: Vetor de variáveis de saída
C: Derivada das equações com relação aos parâmetros de saída.

Desta forma, o sistema em questão foi avaliado de acordo com a equação 10, sendo os
parâmetros calculados analiticamente no SciLab.
𝐸
(− )
𝐹̇ 𝐾 𝐸𝑅𝑒 𝑅𝑇 𝐶
̇
𝐶𝑝3 − 𝑉3 −𝐾 0 𝐶𝑝3 − 0 (𝑅𝑇)2 𝑝3′
1 ⌈ ⌉
⌈ ⌉=[ ]⌈
⌉+ ⌉[T’] (10)
𝐶𝑝5 ̇ 𝐹̇ 𝐹̇ 𝐶𝑝5 ⌈ 𝐾 𝐸𝑅𝑒 (−𝑅𝑇
𝐸
)
− 𝑉3 − 𝑉5 −𝐾 ⌈− 0 𝐶𝑝5′ ⌉
2 2
⌈ (𝑅𝑇)2 ⌉
Onde:
𝐶𝑝3 ′: Concentração de saída de poluente no estado estacionário do tanque 1 a 278K
𝐶𝑝5 ′: Concentração de saída de poluente no estado estacionário do tanque 2 a 278K
𝑇′: Diferença entre temperaturas antes e após perturbação

Finalmente, analisou-se a concentração final de poluente no ponto de vista legal, e foram


propostas alternativas de melhorar os resultados.
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Resultados e Discussões

Inicialmente, a partir do método de Newton-Raphson, as concentrações de saída dos tanques 1


e 2, no estado estacionário a 300K, foram calculadas como 102,46ppm e 65,04ppm, respectivamente.
Num segundo momento, para avaliar como o sistema se comportava após uma perturbação na
temperatura para 278K, foram obtidos gráficos da concentração de saída de poluente dos tanques 1 e
2, representado na figura 1.
A partir do perfil construído, verificou-se que as concentrações de saídas de ambos os tanques
aumentaram com o passar ao tempo, até mais ou menos 1,5h, onde as concentrações não atingiram um
novo estado estacionário, refletindo a restauração da estabilidade do sistema, com valores de 130,06
ppm para o tanque 1 e 86,58 ppm para o tanque 2.

Figura 1 Perfis de variação de concentrações de saída dos tanques

Vale ressaltar que os valores das concentrações de saída nos tanques tiveram um aumento de
28ppm para o tanque 1 e de 21ppm para o tanque 2. Isso pode ser explicado pela diminuição da
temperatura do sistema, que é uma relação diretamente proporcional com a taxa de consumo do
poluente. Portanto, quando mais poluente reagir, menor será a concentração que sairá do tanque.
No que diz respeito a forma de espaço de estados, obtiveram-se os seguintes resultados, que
serviram como base pra implementação na ferramenta xcos:
̇
𝐶𝑝3 −4,96 0 𝐶𝑝3 −6,49
⌈ ⌉=[ ] ⌈ ⌉+⌈ ⌉[-22] (11)
𝐶𝑝5 ̇ 1,4928 −6,139 𝐶𝑝5 −4,15

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A partir dos parâmetros obtidos, a ferramenta Xcos forneceu o perfil de variação nas variáveis
desvio, representado na figura 2:
Figura 2 Perfis das variáveis desvio dos tanques 1 e 2

Tanque 1

Tanque 2

As variáveis de desvio são de interesse em estudos de sistemas de controle, pois emitem as


respostas de sistemas em função das variáveis de entrada (distúrbios e variáveis manipuladas), fazendo
desta forma que se tenha a eliminação do efeito das condições iniciais sobre as respostas. Para o caso
observado, verificou-se que o comportamento das concentrações de saída dos tanques apresentaram
diferenças entre si menores do que a observada no gráfico 1, fato que pode ser justificado em função
da geração de um erro na linearização do sistema para a construção da matriz B (equação 8).

Conclusões

Os métodos numéricos de Newton-Raphson e Runge Kutta de 2º ordem foram eficientes para


a determinação das concentrações de saída dos tanques 1 e 2 no estado estacionário, e para analisar a
variação dessas concentrações em função do tempo. Por sua vez, a ferramenta Xcos se mostrou útil
para analisar as variáveis de desvio do problema proposto.
Verificou-se também que após a perturbação degrau, a concentração de saída do tanque 1
aumentou cerca de 30%, caracterizando então essa alteração na temperatura um fator bastante
significativo para a eficiência na remoção dos poluentes orgânicos do efluente.
Finalmente, a partir do estudo realizados, constatou-se que a concentração de saída do tanque
2, de 86,58ppm, é superior as especificações da legislação brasileira para esse componente (85 ppm),
logo, devem ser tomadas providencias. Como sugestões de alteração na estação de tratamento de
efluentes, tem-se a elevação da temperatura, que, pela relação já explicada, implica no aumento de
poluente que é consumido; e o aumento da vazão de água de diluição, que também diminuiria a
concentração de saída de poluentes. Ademais, mudanças estruturais também podem ser realizadas,
como o aumento do volume dos tanques e adição de um sistema de agitação nos mesmos, que também
resultaria em uma melhor diluição de poluentes, e a adição de mais tanques à série.

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Referências

CREMASCO, Marco Aurélio. Fundamentos de transferência de massa. Campinas:


UNICAMP, 2008.
GIORDANO, Gandhi et al. Tratamento e controle de efluentes industriais. Revista ABES, v.
4, n. 76, 2004.
METCALF, Leonard; EDDY, Harrison P. Tratamento de efluentes e recuperação de recursos.
McGraw Hill Brasil, 2015.
MORAN, Sean. An Applied Guide to Water and Effluent Treatment Plant Design.
Butterworth-Heinemann, 2018.
SOARES, Elisa Mercês; FERREIRA, Rafael Lopes. Avaliação da qualidade da água e a
importância do saneamento básico no Brasil. Revista Meio Ambiente e Sustentabilidade, v. 13, n. 6,
2017.

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