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De saquarema a luzia:

sobre os (des)conceitos da política


Francisco Moraes paz **
Saquaremas e luzias, ou seja, COlI&eI'1'ador'es e liberais, respectivamente,
alternaram-se DOS gabinetes ministeriais do II Imp&lo, adolaDdo posturas
que não os diferenciavam politicamente. Disso resultou a Impressão de que
não havia nada mais parecido com nm conservador do que nm liberal no poder.
A partir dessa primeira constatação, pelc:orremos meandros da polftica brasUelra,
em especial os partidos, analisando pr6tlcas que vêm pervertendo-a. Do cariter
"artificiai" dos partidos nacionais aos expedientes autorll6rlos de subordlnaçio
das manifestações polfllcas, opousamos aIgnns (des)con<eltos da polfllca,
à luz das eleições municipais de I!I88.
A experiência parlamentarista do Império atribuiu ao imperador o poder
moderador e, por conseguinte, a competêocia paralIOIDOl8I" e demitir lIIÍPÍStérios. A estabilidade
política do fi Império parece, pois, depender da habilidade do chefe do estado
em alterar, em face daacrises e impasses, o chefe de governo e todo seu gabinete.
Saquaremas (conservadores) e luzias (liberais) sucedem-se à frente do executivo, na
tentativa de uma harmonia imperial.
O exato momento de formação desses, que foram os príIDeims partidos
políticos brasileiros, constitui uma questão controvertida. Os partidos políticos datam
da Rellêocla e. segundo Nabuco (1936. v. 1), estão associados à reação mon6rquica de
1837.1 Para Franco (l974b) e Chacoo (1985). o Partido Liberal definiu-se quando da
elaboração do anteprojeto do Ato Adicional, e o Conservador, quando da interpretaçio
desse Ato. De junho de 1840 a novembro de 1889. segundo Cb&con (1985), foram
constituídos 15 gabinetes: 7 liberais. 7 conservadores e l de conciliaçio (.•.) (p. 29).
• Este ...to integra 08 estudos desenvolvidos pela equipe de pc!oquiso "Eloiçdeo e partidos: Jritic:as

pollticas 00 Paran.(". do_tu., PlltlIIIllOD8O de Deoenvolvimeolo Ec:omlmico e Social (IPA!u>ES).


cm convtnio com a Universidade Estadual de Maringá e com o apoio do Conselho Estadual de
Cia.cia e Tecnologia (CONCITEC), do Plll'llD4.lotegratua equipe a1l!coica Mari8cManoeIe 08eslagimos
Ledoidas Rodrigues. Marcelo Weber, Mdrio Nodal e Soraya Gomes de Oliveira; e. como
COJISUl.,r, o Prof. Edgar de DeccaelaUnivenlidade Esladual de Campinas (UNlCAMP). Agradecemoa
_ comentitios e sugestões de Maria Cristina Co1oaghie Marionilde D. B. de Magalhfies. t6cDicas
do lPARDES.
•• Hisroriador. Professor Assistente ela Uaiveraidade Es1adualde Moringá.__no Ioatiluto
PlI1'lllIlleII8e de Deoenvolvimen" Ec:oa6micoe Social (IPARDES).
1 A cbamada resçio motUlrquicade 1837 está vinculada "'" movimentua de -'~ l Reg!oçia.

. . . .. ,I r .
f o i d e s encadeada por ocaaiAo da sueesslo do regente Feij6. A época, Odeputado VIeira Souto aprena
ctmara, um projeto de an1ecipaçio ela maioridade do pÓD<:ipe herdeiro. Mesmo _
pela imprensa,O projeto dividiaa oplniió dos depuladoo. foi contido pelaMaÇioeoérgica de ÃmIjo
Lima, presidente da mesa e futmo regente. Entretanto, a itNianio foi esquecida. originando clubes e
sociedades de apoio à antccipaçlo da maioridade de Pedro n, fato consumado em.1840.
Anál.• Conl., Belo Horizonte, ....5 • n.o 1 . lan., abr./1990

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Resumo
Trata-se de saquaremas e luzias, ou seja, conservadores e liberais, respectivamente, que alternaram-se nos gabinetes
ministeriais do II Império, adotando posturas que não os diferenciavam politicamente. Disso resultou a impressão de
que não havia nada mais parecido com um conservador do que um liberal no poder. A partir dessa primeira
constatação, percorremos meandros da política brasileira, em especial os partidos, analisando práticas que vêm
pervertendo-a. Do caráter ?artificial? dos partidos nacionais aos expedientes autoritários de subordinação das
manifestações políticas, analisamos alguns (des)conceitos da política, à luz das eleições municipais de 1988

História do Brasil Império


Aula IX
Objetivo: analisar as forças políticas do Império.
A) Luzias e Saquaremas.
“Nada tão parecido com um saquarema como um luzia no poder” (provérbio
imperial).
As designações “luzias” e “saquaremas” surgiram para identificar as forças políticas no império,
principalmente, no segundo reinado, após a reordenação de forças ocorridas no período regencial. A
denominação luzia surge no cenário dos movimentos liberais de 1842. Idealizado pelos liberais como uma
revolução, que reuniria as províncias de Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro, o movimento seria
facilmente derrotado. Os liberais mineiros foram derrotados pelo barão de Caxias, na batalha de Santa
Luzia. Daí a denominação de santa-luzias, ou simplesmente, luzias. Já a denominação saquarema surge
em 1845, quando o subdelegado da vila de Saquarema, no afã de favorecer a vitória do governo (liberal)
nas eleições, expede uma ordem contra todos os que não obedecessem à lista do governo. Joaquim José
Rodrigues Torres e Paulino José Soares de Sousa, que possuíam interesses no local, livrariam os seus
protegidos dos desmandos do delegado. Deste modo, por saquaremas ficariam conhecidos os protegidos
deste grupo, principalmente, a parte fluminense do partido conservador, liderados por: Rodrigues Torres
(Visconde de Itaboraí), Paulino José Soares de Sousa (Visconde do Uruguai) e Eusébio de Queiroz; a
“Trindade Saquarema”.
Mais do que indicar igualdade de princípios entre as forças políticas, o provérbio demonstra a submissão
dos luzias aos saquaremas, resultado do processo de estabilização política efetuado sob a égide
conservadora.

B) “Um Império e três mundos”.


Apesar da diferença que os separava, luzias e saquaremas, comungavam a mesma análise do processo de
revoltas, que haviam conturbado as duas décadas que se seguiram a abdicação. Ambos separavam os
movimentos feitos pela “flor da sociedade brasileira”, no Rio Grande do Sul (1835-1845), em São Paulo e
Minas gerais (1842) e em Pernambuco (1848), dos efetuados pela “escória da população”. Partilhavam
um sentimento aristocrata que revelava o caráter essencial da sociedade do período, que a independência
não modificara. Era uma sociedade colonial e escravista, onde, além da
economia, as relações pessoais e raciais possuíam um importante papel. Essa visão de mundo aristocrática
percebia a sociedade imperial divida em três grupos: a “boa sociedade” (o mundo do governo), a gente
miúda (o mundo da desordem) e os escravos (o mundo do trabalho).
A “boa sociedade” era composta por aqueles que possuíam liberdade e
propriedade, constituindo-se em elementos desprestigiados aqueles que não possuíam nem uma coisa,
nem outra. Estes atributos encontravam-se tão intrinsecamente ligados a ponto do primeiro depender do
segundo. A constituição brasileira de 1824 consagraria esta relação. Apesar de na constituição em
nenhum momento, aparecer citada a palavra “escravo”, ao consagrar as idéias de liberdade e propriedade
como base da cidadania (artigo 179), esta excluía os cativos, sem a posse de uma ou de outra, de tal
classificação.
Excluídos de tais direitos (liberdade e propriedade) os escravos não eram considerados pessoas, mas sim
coisas. Não eram cidadãos.
Tomando-se somente o atributo da propriedade, percebe-se a divisão entre aqueles que são proprietários
somente de suas pessoas, e aqueles que são proprietários de outros. Entre cidadãos ativos e cidadãos não
ativos. Os que possuem e os que não possuem escravos. Ilmar Rohloff de Mattos sugere que o critério
censitário eleitoral, na constituição de 1824, de renda mínima, seria uma metáfora para esta situação.

Os cidadãos ativos, pertencentes à sociedade política, em contraposição à


sociedade civil, o conjunto dos cidadãos, seriam aqueles destinados ao governo da sociedade. Isto
significaria governar os escravos, vistos neste momento como o “inimigo inconciliável”, estabelecendo
uma relação entre o mundo do governo e o mundo do trabalho, baseada em um controle que se exercia
continuamente.

A “boa sociedade” dividia então o foco de sua atuação entre o governo da casa e o governo do Estado.
Governar a casa consistia no governo da família, tendo em vista o controle da terra e da escravaria;
promover a interiorização das relações de poder vivenciadas por dominadores e dominados. Deter o
monopólio da violência no mundo privado. Governar o Estado consistia em trazer ordem às relações do
mundo do governo com o mundo do trabalho. Garantir a situação que lhe conferia o status de classe
dominante, jogando com a pressão inglesa pelo fim do tráfico e com os levantes de escravos.

Sem pertenceram ao mundo do governo, nem ao mundo do trabalho, os homens livres e pobres, em sua
maioria mulatos e negros forros, vagavam desordenadamente pela terra, aumentando a sensação de
insegurança da “boa sociedade”, reforçando o discurso da ordem. Agregados, vadios, moradores; “a
pobreza” era vista pelos membros da “boa sociedade”, pelo mundo do governo, como a “mais vil canalha
aspirante”, que se aproveitava dos movimentos das elites para colocar idéias de igualdade social.
Produtos do sistema colonial, de base mercantil escravista, esses homens livres e pobres habitavam entre
o mundo do governo e o mundo do trabalho, não possuindo lugar na sociedade, que lhes negaria a
humanidade, atribuindo a eles a barbárie e a animalidade.

As fronteiras entre os três mundos seriam mantidas, e reforçadas, como elemento básico de constituição
de um projeto de nacionalidade. A idéia de nação dos fundadores do Império, não era aquela do “conjunto
dos indivíduos, livres e iguais”. A nação destes compreendia a manutenção e a hierarquização dos três
mundos. Fundar o império, consolidar a monarquia e garantir a separação dos mundos foram as etapas do
processo, em que os setores dominantes da sociedade colonial viriam a constituir uma identidade
enquanto classe social. Os elementos constituintes dos mundos do governo, da desordem e do trabalho,
respectivamente, o povo, a plebe e os escravos, comporiam uma sociedade singular, pois somente ao povo
caberia a sua direção.
A consolidação monárquica, garantia da unidade, se apoiava assim na defesa da permanência dos três
mundos. Os fundadores do império brasileiro, no dizer de Ilmar R. de Mattos, “tinham os olhos na Europa
e os pés na América”. “Olhos na Europa” porque ambicionavam construir uma sociedade “civilizada”,
semelhante àquelas, e de serem reconhecidos como pertencentes ao mundo civilizado. Mantendo,
portanto, a relação como curso das mudanças ocorridas na Europa, tentando vincular-se a elas, mesmo
que apenas no campo do discurso, e da forma de governo. Os “pés na América” porque implantavam
medidas que visavam manter a divisão entre os mundos, frente às pressões
externas (Inglaterra) e internas (as revoltas populares e de escravos), visto que, sobre esta divisão estava
alicerçada a manutenção da dominação econômica e social.

VÇÇÇÇÇÇÇÇÇÇÇÇÇÇÇÇÇÇÇÇÇÇÇÇÇÇÇÇÇÇÇÇÇÇÇ

Natureza do livro:
A importância do Partido e classe dirigente dos Saquaremas nesta construção e a maneira como consolidou-se um
Estado cuja direção estava sob o constante domínio conservador, neutralizando as forças sociais e políticas
progressistas e anulando as insurreições populares.

Tese Central: Defende a idéia de que o Estado Imperial, após passar pela fase da Reação, tem uma direção definida
pelo Partido Conservador e, dentro dele, pelo grupo Saquarema do Rio de Janeiro. Sua construção política teve como
base a inclusão dos Luzias, mas de maneira hierárquica, ou seja, não permitindo a estes o poder de direção,
aproveitando-se para fazer isto das tensões sociais entre Casa – Governo – Rua existentes na sociedade brasileira.

Fichamento:
É apresentado o projeto de direção Saquarema. Estes conseguem manter uma posição de vencedores para manter a
direção do governo. Apesar de pertencerem ambos, Luzias e Saquaremas ao Mundo do Governo, eles estão nivelados
e presos a uma relação hierárquica. Os três mundos do Império é descrita no capítulo anterior Um Império e Três
Mundos.
Os dois partidos são semelhantes no que se diz à defesa da Liberdade Negativa, e portanto possuem duas faces
contraditórias: a Casa e o Estado. Até aonde o governo interfere na área privada. É isto que impulsionou a luta contra
a metrópole e o absolutismo de Pedro I.
Casa = Liberdade e Colono = Liberal – Liberdade Negativa

Estado = Ausência de liberdade e Colonizador = Não Liberal


X

Rua = Revolução – Liberdade Positiva

A luta pela liberdade foi fundamental na construção do Estado. Havia uma diferença entre os exaltados e moderados,
e esta era marcada pela presença do povo. Para os membros da boa sociedade, a presença do povo e da igualdade
tornava muito tênue a linha entre a ordem e a desordem. Este discurso do medo foi usado amplamente, pois ficou
claro que os Luzias pertenciam ao Mundo da Casa, e não ao Mundo da Rua.

“Neste ponto, podemos estabelecer uma primeira conclusão, a qual nos conduz ao abandono de nossa proposição
inicial: os Liberais – ou para garantir a Liberdade da Casa ou para assegurar a Igualdade entre o Povo – devem
estar no governo do Estado. E dizer isto significa dizer também que não mais devemos considerar as relações entre
Liberdade e Autoridade apenas em termos de oposição.”
As forças do Regresso ganharam força após a consolidação do Império, e isto não implicou em um retorno do
absolutismo, mas sim em uma requalificação da liberdade. É aqui que delimita-se até onde ou como irá a liberdade
chegar, dependendo da classe social atingida. Importante fator no projeto Saquarema e conservador.

Afinal, com os limites da Casa ameaçados, a liberdade acaba sendo requalificada e os Luzias aderem a este projeto.
“Praticamente imobilizados desde a renúncia do primeiro regente uno, incapazes de conter as sucessivas rebeliões e
inssurreições que ocorriam fora dos limites da Casa [grifo meu], eles acabariam por aderir ao discurso da ordem.”

Os liberais viam-se presos na defesa da liberdade, mas ligados à Monarquia e à Ordem. Uma contradição muito bem
explorada pelos Saquaremas.
Começa a ser trabalhado, portanto, o conceito de liberdade qualitativa., que substitui a liberdade revolucionária,
igualitária e quantitativa.
Qualitativa – liberdade atrelada a quem você é e até que ponto está preparado para ter uma “responsabilidade”

Além disso, a liberdade passa a ter cada vez mais uma outra utilidade. Isto ocorre pelo fato de que discussões
políticas, que é um dos grandes pilares da liberdade moderna, são substituídas no mundo da economia mercantil por
uma política onde não há embate, apenas administração.

Momento da Reação criou, através de uma rede hierárquica de privilégios e favores, lugares para todos os homens
livres no “cosmos social”. Lugar não atribuído aos cidadãos não-ativos devido à ameaça a fronteira da Casa, onde os
liberais “se comportavam como um despotés à maneira dos gregos(...)”

“Todavia, quando dizemos – estar no governo do Estado – estamos nos referindo também à capacidade de exercer
uma direção: uma direção política, uma direção ‘intelectual e moral’, [Antonio Gramsci]”

[A direção política, intelectual e moral imprimida na Casa e no Governo foram ditadas pelos Saquaremas, que
buscaram em sua autoridade na Casa a força de coerção usada para direcionar a autoridade do Estado.]

No governo do Estado, os Saquaremas reprimiram os liberais, garantiram antigos monopólios, incorporam outros
monopolizadores e trouxe, verticalmente outros empregados a serviço do Estado.

“Com efeito, se os Saquaremas conseguem estar no governo do Estado e no governo da Casa, é porque eles também
forjaram a Coroa em Partido, a quem incumbe organizar a Casa e conter como aliados aqueles homens livres cuja
aspiração é tornarem-se proprietários em condições monopolistas. À Coroa incumbe ainda tornar cada um dos Luzias
parecido com todos os Saquaremas.” [O Soberano neutro representando
interesses partidários foi a grande conquista dos Saquaremas.]

Casa – Governo = monopólios de grandes famílias no mundo dos negócios no governo.


Monopólio do discurso – Gerado na Casa passado pelas Academias e Tribunais. [O Monopólio do discurso é gerado
na Casa.]

Controle da Casa e fortalecimento de monopólios e da família, gera também o


fortalecimento do Estado – intimamente ligado à estas famílias.

O Imperador possuía o monopólio da Responsabilidade, afinal estava longe das disputadas partidárias regionais.

Importância para a pesquisa:


A principal importância é a descrição das relações sociais e políticas entre o mundo da Casa, do Governo e da Rua..

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