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AA Literacia emergente

As civilizações desenvolvem-se com a escrita, e é a passagem da comunicação


oral para a palavra escrita que desenvolve uma civilização. Ao longo da história
da humanidade, muitos são os exemplos de desenvolvimento civilizacional
baseados nas aquisições literácitas das populações, e, consequentemente, das
sociedades.

A linguagem é uma ferramenta essencial ao pensamento. Sem a capacidade de


representar simbolicamente o que vemos e não vemos, os nossos pensamentos
não iriam alem do que é palpável: literatura, arte, filosofia, ciência e história
seriam impossíveis.

A linguagem facilita a relação com o mundo e com os outros.

Usando esta capacidade podemos comunicar, ordenar, controlar, perguntar,


criar.

A linguagem desenvolve-se em contexto de relação social: precisamos viver


com os outros para desenvolver a linguagem. As crianças desenvolvem a sua
linguagem ouvindo, observando, falando, provocando os adultos.

Aprender a ler, e a escrever, de forma integrada, é fundamental para, em


sociedade, aprender a aprender. Mas é fundamental que esta leitura também
permita aprender a saber.

Quase todo o nosso vocabulário cognitivo e teorético consiste em palavras


abstractas que não têm qualquer equivalente precioso em coisas visíveis, e cujo
significado não é reconduzível nem traduzível em imagens.

A primeira etapa da aprendizagem da leitura inclui a tomada de consciência da


linguagem escrita. Antes de se tornarem leitores, as crianças devem tomar
consciência porque é que as pessoas lêem e o que fazem durante esse
processo.

Contudo, palavra só deixa compreender se for compreendida, isto é, se


conhecermos a língua e o contexto a que pertence; de outro modo, é letra
morta, um signo ou um som qualquer.

Como já referido, a construção de um conhecimento literácito inicia-se bem


cedo, na infância. O desenvolvimento da literacia emergente depende mais das
práticas desenvolvidas em diversos contextos do que do nível de inteligência,
classe social, rendimento económico ou (dentro de determinados limites) da
formação dos progenitores.

Porque será, então, importante desenvolver esta competência?

A literacia, enquanto uma forma de "arrumar" o conhecimento linguístico,


permite extrair informação do impresso, converter linguagem sob a forma
impressa em situações de interacção social.
A literacia - e não a escolarização - determinam a estruturação neuronal e a
forma como o cérebro humano processa o sinal linguístico. Ninguém é o mesmo
depois de alfabetizado.

Nas sociedades modernas, o impresso é uma realidade incontornável: não é


possível viver, interagir a diverso níveis sociais sem o domínio básico das
ferramentas literácitas: compreender e produzir linguagem nas vertentes orais
e impressas.

Mas também, e cada vez mais, as mensagens (e imagens) que utilizam os


múltiplos meios (multimédia, televisão, etc.) são cada vez mais globais e
presentes no desenvolvimento social e humano das pessoas.

No entanto, a imagem é pura e simples representação visual. A imagem não se


vê em chinês, árabe ou inglês. Simplesmente vê-se.

Se olharmos para trás, e bastam apenas uns poucos anos, conseguimos


identificar o facto de que, até há poucos anos, o mundo e os acontecimentos
eram-nos relatados (por escrito) hoje são-nos mostrados, e o relato (a sua
explicação) é quase apenas em função das imagens. O computador e a
televisão, ao produzir imagens e apagar conceitos, podem atrofiar a nossa
capacidade de abstracção e, com ela, a nossa capacidade de compreender.

Aprender na Sociedade de Informação

A educação articula-se com a sociedade de informação, uma vez que se baseia


na aquisição, actualização e utilização dos conhecimentos. Neste modelo
multiplicam-se as possibilidades de acesso a dados e a factos. Assim, podemos
dizer também que a educação deve facultar a todos a possibilidade de terem ao
seu dispor, recolherem, seleccionarem, ordenarem, gerirem e utilizarem essa
mesma informação.

O desafio, para uma audiência qualificada que estará no cerne desta revolução
- o mundo da educação -, passa por, percebendo a dinâmica da Sociedade de
Informação, contribuir para traçar objectivos, estabelecer modelos e estimular
participações, ou seja, ser pró-activo, em vez de aguardar o rumo dos
acontecimentos.

Actualmente, assiste-se a um desenvolvimento significativo da informação


disponível para os cidadãos.

O aluno chega à escola transportando consigo a imagem de um mundo - real


ou fictício - que ultrapassa em muito os limites da família e da sua comunidade.

As mensagens mais variadas - lúdicas, informativas ou publicitárias - que são


transmitidas pelos meios de comunicação social entram em concorrência ou
contradição com o que as crianças aprendem na escola.

O tempo despendido diante da televisão não lhes exige nenhum esforço, pois a
oferta instantânea da informação proporcionada pelos média é-lhes mais fácil e
gratificante do que o esforço exigido para alcançarem sucesso no ensino formal.

A este propósito, Geovanni Sartori avisa-nos que:


"a verdade maior, e global, é que a criança cuja primeira escola (a escola
divertida, que precede a escola aborrecida) é a televisão, é um animal
simbólico que recebe o seu inprint, o seu cunho formativo através das imagens
de um mundo todo ele centrado no ver (...) O problema é que a criança é uma
esponja que regista e absorve indiscriminadamente (visto ainda não ter a
capacidade de discriminação) tudo aquilo que vê" (2000, p. 29).

As tecnologias de informação e comunicação oferecem potencialidades


imprescindíveis à educação e formação, permitindo um enriquecimento
contínuo dos saberes, o que leva a que o sistema educativo e a formação ao
longo da vida tenham de ser reequacionados à luz do desenvolvimento destas
tecnologias.

Como uma espécie de "glossário" para a aprendizagem na sociedade da


informação, devemos entender que a formação ao longo da vida sustenta-se
em torno de quatro aprendizagens fundamentais, que se interligam e que
constituem os pilares dos conhecimentos, ou seja:

- aprender a conhecer, isto é, adquirir os instrumentos da compreensão,


combinando uma cultura geral, suficientemente vasta, com a possibilidade de
trabalhar em profundidade um pequeno número de matérias, o que também
significa, aprender a aprender, para beneficiar das oportunidades oferecidas
pela educação ao longo da vida;

- aprender a fazer, para poder agir sobre o meio envolvente, a fim de adquirir
não somente uma qualificação profissional mas também competências que
tornem a pessoa apta a enfrentar as mais diversas situações e a trabalhar em
equipa;

- aprender a viver em comum, a fim de participar e cooperar com os outros, no


respeito pelos valores duo pluralismo, da compreensão mútua e da paz; e,
finalmente,

- aprender a ser, via essencial que integra as três precedentes e que permite a
cada um desenvolver melhor a sua personalidade, ganhar capacidade de
autonomia, discernimento e responsabilidade.

Em qualquer dos modelos, o conhecimento só existe se for realizado pela


pessoa, que por sua vez deve ser intelectual e materialmente activa à escala
dos seus meios, logo, a utilização das novas tecnologias deve poder realizar-se
através do tempo e dos meios adequados.

Daí, e se não considerarmos desde já desnecessário fazê-lo, é importante que


possamos reflectir, paralelamente a muitas outras, sobre algumas questões
fundamentais.

(1) Como desenvolver nos futuros (e actuais) profissionais atitudes positivas,


numa perspectiva de abertura à mudança, receptividade e aceitação das
potencialidades das TIC, capacidade de adaptação ao novo papel do educador
como mediador e orientador do conhecimento face aos alunos estimulando o
trabalho em grupo?;
(2) Como promover valores fundamentais no uso das TIC, incluindo a atenção
às questões de segurança/vigilância sobre a informação na Internet, as
questões de direitos de autor e éticas relativas à utilização das TIC?;

(3) Como desenvolver competências de ensino genéricas sobre quando utilizar


e como integrar as TIC nas diferentes fases do processo de ensino, partindo do
planeamento até à avaliação e modo de usar as TIC para estimular as
dinâmicas da escola?;

(4) Como desenvolver competências para o ensino da área curricular (incluindo


o modo como integrar as TIC no curriculum), conhecer e avaliar software
educacional, explorar os recursos existentes na escola, estar familiarizado com
o equipamento e a questões relativas às condições de acessibilidade para
públicos com necessidades especiais?;

(5) Como desenvolver capacidades de manuseamento das ferramentas,


incluindo software utilitário e de gestão pedagógica, em contexto educativo?.

O Papel do Educador

A importância do papel do Educador como agente de mudança nunca foi tão


evidente como agora. Os educadores têm um papel preponderante na formação
da personalidade, na formação de atitudes, positivas e negativas face ao
processo de ensino-aprendizagem. Devem despertar a curiosidade, desenvolver
a autonomia, estimular o rigor intelectual e criar condições necessárias para o
sucesso da formação, seja a educação formal, seja a permanente. Com o
desenvolvimento de todas as novas formas de comunicação, o conhecimento
escolar deixou de se processar predominantemente através do educador na
sala de aula.

O desenvolvimento das novas tecnologias não diminui em nada o papel dos


educadores, antes o modifica profundamente: o educador deixa de ser o
transmissor do saber, tornando-se num elemento do conjunto, organizando o
saber colectivo.

Tendo em conta esta quantidade enorme de informação disponível través do


computador (Internet) ou através da televisão e do rádio, ou mesmo do jornal,
ser capaz de se orientar nesta teia imensa obriga a criar novas "alfabetizações",
novas formas de compreender o real, e, consequentemente, adquirir hábitos
sociais que levem à autonomia de indivíduos livres e esclarecidos.

As novas tecnologias colocam os educadores perante a "obrigatoriedade" de


adquirir competências e conhecimentos que também o tornem avaliador das
capacidades técnicas das "tecnologias". O educador deve saber, não só utilizar
os instrumentos, mas, acima de tudo, deve saber quando e como os utilizar, e
para isso deve ser "educado".

No processo de integração das novas tecnologias na escola, existem, de acordo


com Postman (1994, citado por Litti, F., 1994) "certas etapas, nomeadamente:
1) uma Zona de Conforto (período durante o qual se adquire o equipamento);
depois um estágio de 2) Uso Desconexo (quando o computador fica num
canto, como uma coisa extra, a ser usada quando as outras tarefas académicas
tiverem sido terminadas) e, consequentemente, há 3) um Uso
Coordenado (em que se tomam decisões em relação ao usar o computador) e,
finalmente, 4) Uso Transparente (quando não é mais um caso de uso de
tecnologia só pelo valor tecnológico em si, mas como suporte para uma
estratégia pedagógica).

Através desta divisão "temporal" do ritmo de integração do computador na


Escola, podemos, de certa forma, considerar quais os momentos em que o
educador se deve esforçar por motivar e favorecer a utilização de uma nova
técnica, ou "instrumento" de trabalho: a 3ª e a 4ª fase são aquelas em que o
Educador pode, e deve, orientar a definição de estratégias e actividades para
uma utilização efectiva do computador.

Esta estratégia deve surgir como a resposta às perguntas que a escola deve
fazer: O que queremos que os nossos alunos aprendam a fazer?

Antes de responder cabalmente a esta questão, a escola, e consequentemente


os educadores, devem reflectir sobre o modelo de formação que pretendem, e
que, para contrariar a tendência geral e crescente das sociedades que
sacrificaram os valores culturais e sociais à tecnologia, que dá ênfase à
eficiência em detrimento da reflexão moral ou da ética de funcionamento.

Tendo em atenção um novo paradigma de educação que tem vindo a crescer, o


educador deve adequar-se a um novo estatuto, onde será sempre mais
importante a capacidade do aluno pensar e expressar claramente as suas
ideias, solucionar problemas e tomar decisões em vez da memorização de
factos ou da repetição de respostas certas.

O educador deve ser, acima de tudo, um guia, aumentando a participação


activa da criança através de abordagens mais individualizadas e mais cuidadas,
de forma a que a motivação do aluno seja um fenómeno intrínseco e não algo
que vem de fora, do educador, dos pais ou dos amigos.

Claro que o educador, antes de utilizar o computador, deve fazer um


levantamento profundo das problemáticas nas quais esse instrumento de
trabalho pode dar uma contribuição importante. O Computador deve entrar no
fim de um processo de análise crítica dos problemas pedagógicos em vez de ser
uma solução a priori sem que haja um levantamento do problema. Desta
forma, o computador surge como mais um instrumento de ensino e aproveitado
por ele. O computador torna-se assim também um instrumento independente,
na medida em que serve várias matérias sem pertencer a um único campo
científico. Não produz obrigatoriedade e dependência exclusiva. Os
instrumentos que atraem o ensino são instrumentos de comunicação, e a
relação de ensino-aprendizagem é uma relação de comunicação.

No entanto, por ser um instrumento de comunicação por excelência, o


computador provoca problemas no campo da pedagogia: sendo a pedagogia a
"ciência" de transmitir conhecimentos tendo em conta uma teoria e uma
filosofia, o uso do computador, ou, num âmbito geral, o uso de qualquer
instrumento, pode influenciar este sistema, pois a utilização de instrumentos
modifica a relação aluno-conhecimento, a relação aluno-educador e a relação
escola-sociedade.

Por todas estas razões anteriormente apontadas, o educador que utilize as


novas tecnologias, nomeadamente o computador, na sala de aula deve adequar
a sua atitude aos novos requisitos pedagógicos, ou seja, o educador consciente
da sua nova responsabilidade deve funcionar como um elemento promotor do
desenvolvimento pessoal do aluno, tornando-o uma pessoa crítica e activa
perante a sociedade, fomentando o desenvolvimento de uma consciência de
cidadania, nomeadamente, através da compreensão literácita.

Esta missão do educador só é possível se o próprio educador admitir a sua


necessidade de formação pessoal. Tal como cada aluno que se sente motivado
a aprender a utilizar novos instrumentos, a experimentar novos "cantinhos"
também o educador deve sentir-se atraído por novos desafios, e, acima de
tudo, deve sentir-se seguro na sua "insegurança" da novidade.

Formação literácita com recurso às tecnologias

O educador pode ser, ou antes, é o modelo de conquista, de apoio, de


experimentação que as crianças e os jovens alunos têm no seu dia a dia: o
educador tem a capacidade de levar os alunos a sentirem-se motivados e
despertos para novos desafios, e aprenderem muito com isso. Daí, a
necessidade do educador ocasionar novas e diferentes actividades de
aprendizagem que motivem o aluno e, sobretudo, que integrem conhecimentos
extracurriculares, muitas vezes mais interessantes para os alunos e mesmo
para as famílias.

O educador tem, como objectivo principal, neste novo paradigma de educação,


a tarefa mais importante: ser o condutor, mais do que ser o dono da razão, é
ele que deve motivar e favorecer a descoberta de novos modelos, de outras
informações e de outros métodos, sem nunca esquecer o desenvolvimento do
espírito crítico e analítico que deve florescer no aluno.

Como conclusão, ao definirmos que o termo 'sociedade da informação' é uma


das diversas designações para a sociedade em que vivemos - sociedade pós-
moderna, pós-industrial, global, etc. - com as suas especificidades culturais,
económicas, políticas e ideológicas que sugerem coisas muito diversas como:
tecnologias de informação, facilidade de comunicação, globalização,
interdependência, etc.

A sua forte conotação com as NTI reforça, por um lado, a ideia do homem
como criador e utilizador dessas tecnologias mas, por outro lado, atenua a ideia
do homem que pensa os efeitos do que criou: a complexidade da sociedade em
que vive, em mudança acelerada e marcada pela imprevisibilidade em que
cresce a possibilidade da separação entre o conhecimento e o pensamento.
Como refere Carlos Tedesco (1999):

"Os media não foram concebidos como entidades da formação moral e cultural
das pessoas... A sua concepção e evolução supõem que essa formação já é um
dado adquirido e a tendência actual dos meios de comunicação consiste em
deixar aos próprios cidadãos a responsabilidade de eleger as mensagens que
querem receber."

Esta natural ausência de dimensões morais e culturais, constitui um aspecto de


crucial importância a ter em conta no modo como as tecnologias devem ser
encaradas e integradas no processo de socialização literácita das crianças e dos
jovens e na preparação dos professores.
Mais do que ensinar o manuseamento técnico dos computadores, cabe à escola
e aos professores garantir que as abordagens das tecnologias sejam realizadas
de acordo com pressupostos morais, sociais e culturais e como vias de
formação cívica.

A falta destas referências pode gerar novas exclusões e agravar as existentes.


Por isso, a educação para as escolhas deverá ser uma incidência intencional da
acção das escolas e dos professores no contexto da sociedade da informação.
Esta tarefa exige que os professores, ainda antes de terem os conhecimentos
técnicos para lidar com as NTIs, tenham os conhecimentos, as atitudes e as
perspectivas ideológicas necessários para lerem a sociedade a que agora
chamamos da informação.

Trata-se de uma certa sabedoria integradora de conhecimentos acerca da


sociedade em que vivemos e de um conjunto de atitudes assentes na
experiência e na adesão a valores fundamentais que permitam, em cada
momento, assumir atitudes humanamente significativas.

Em resumo, o domínio técnico das tecnologias só por si, não é condição para a
integração e participação cívica na sociedade em que vivemos. A sociedade da
informação e as tecnologias que a suportam encerram promessas de maior
igualdade de oportunidades, mas também a possibilidade de novas exclusões.

É ao educador/profissional de educação que compete mediar as escolhas, e


dessa forma mobilizar para um desenvolvimento da literacia emergente que
dependa mais "das práticas desenvolvidas em diversos contextos do que do
nível de inteligência, classe social, rendimento económico ou (dentro de
determinados limites) da formação dos progenitores".

Morelia 2006

Henrique Santos

Literacia emergente

As civilizações desenvolvem-se com a escrita, e é a passagem da comunicação


oral para a palavra escrita que desenvolve uma civilização. Ao longo da história
da humanidade, muitos são os exemplos de desenvolvimento civilizacional
baseados nas aquisições literácitas das populações, e, consequentemente, das
sociedades.

A linguagem é uma ferramenta essencial ao pensamento. Sem a capacidade de


representar simbolicamente o que vemos e não vemos, os nossos pensamentos
não iriam alem do que é palpável: literatura, arte, filosofia, ciência e história
seriam impossíveis.

A linguagem facilita a relação com o mundo e com os outros.

Usando esta capacidade podemos comunicar, ordenar, controlar, perguntar,


criar.
A linguagem desenvolve-se em contexto de relação social: precisamos viver
com os outros para desenvolver a linguagem. As crianças desenvolvem a sua
linguagem ouvindo, observando, falando, provocando os adultos.

Aprender a ler, e a escrever, de forma integrada, é fundamental para, em


sociedade, aprender a aprender. Mas é fundamental que esta leitura também
permita aprender a saber.

Quase todo o nosso vocabulário cognitivo e teorético consiste em palavras


abstractas que não têm qualquer equivalente precioso em coisas visíveis, e cujo
significado não é reconduzível nem traduzível em imagens.

A primeira etapa da aprendizagem da leitura inclui a tomada de consciência da


linguagem escrita. Antes de se tornarem leitores, as crianças devem tomar
consciência porque é que as pessoas lêem e o que fazem durante esse
processo.

Contudo, palavra só deixa compreender se for compreendida, isto é, se


conhecermos a língua e o contexto a que pertence; de outro modo, é letra
morta, um signo ou um som qualquer.

Como já referido, a construção de um conhecimento literácito inicia-se bem


cedo, na infância. O desenvolvimento da literacia emergente depende mais das
práticas desenvolvidas em diversos contextos do que do nível de inteligência,
classe social, rendimento económico ou (dentro de determinados limites) da
formação dos progenitores.

Porque será, então, importante desenvolver esta competência?

A literacia, enquanto uma forma de "arrumar" o conhecimento linguístico,


permite extrair informação do impresso, converter linguagem sob a forma
impressa em situações de interacção social.

A literacia - e não a escolarização - determinam a estruturação neuronal e a


forma como o cérebro humano processa o sinal linguístico. Ninguém é o mesmo
depois de alfabetizado.

Nas sociedades modernas, o impresso é uma realidade incontornável: não é


possível viver, interagir a diverso níveis sociais sem o domínio básico das
ferramentas literácitas: compreender e produzir linguagem nas vertentes orais
e impressas.

Mas também, e cada vez mais, as mensagens (e imagens) que utilizam os


múltiplos meios (multimédia, televisão, etc.) são cada vez mais globais e
presentes no desenvolvimento social e humano das pessoas.

No entanto, a imagem é pura e simples representação visual. A imagem não se


vê em chinês, árabe ou inglês. Simplesmente vê-se.

Se olharmos para trás, e bastam apenas uns poucos anos, conseguimos


identificar o facto de que, até há poucos anos, o mundo e os acontecimentos
eram-nos relatados (por escrito) hoje são-nos mostrados, e o relato (a sua
explicação) é quase apenas em função das imagens. O computador e a
televisão, ao produzir imagens e apagar conceitos, podem atrofiar a nossa
capacidade de abstracção e, com ela, a nossa capacidade de compreender.

Aprender na Sociedade de Informação

A educação articula-se com a sociedade de informação, uma vez que se baseia


na aquisição, actualização e utilização dos conhecimentos. Neste modelo
multiplicam-se as possibilidades de acesso a dados e a factos. Assim, podemos
dizer também que a educação deve facultar a todos a possibilidade de terem ao
seu dispor, recolherem, seleccionarem, ordenarem, gerirem e utilizarem essa
mesma informação.

O desafio, para uma audiência qualificada que estará no cerne desta revolução
- o mundo da educação -, passa por, percebendo a dinâmica da Sociedade de
Informação, contribuir para traçar objectivos, estabelecer modelos e estimular
participações, ou seja, ser pró-activo, em vez de aguardar o rumo dos
acontecimentos.

Actualmente, assiste-se a um desenvolvimento significativo da informação


disponível para os cidadãos.

O aluno chega à escola transportando consigo a imagem de um mundo - real


ou fictício - que ultrapassa em muito os limites da família e da sua comunidade.

As mensagens mais variadas - lúdicas, informativas ou publicitárias - que são


transmitidas pelos meios de comunicação social entram em concorrência ou
contradição com o que as crianças aprendem na escola.

O tempo despendido diante da televisão não lhes exige nenhum esforço, pois a
oferta instantânea da informação proporcionada pelos média é-lhes mais fácil e
gratificante do que o esforço exigido para alcançarem sucesso no ensino formal.

A este propósito, Geovanni Sartori avisa-nos que:

"a verdade maior, e global, é que a criança cuja primeira escola (a escola
divertida, que precede a escola aborrecida) é a televisão, é um animal
simbólico que recebe o seu inprint, o seu cunho formativo através das imagens
de um mundo todo ele centrado no ver (...) O problema é que a criança é uma
esponja que regista e absorve indiscriminadamente (visto ainda não ter a
capacidade de discriminação) tudo aquilo que vê" (2000, p. 29).

As tecnologias de informação e comunicação oferecem potencialidades


imprescindíveis à educação e formação, permitindo um enriquecimento
contínuo dos saberes, o que leva a que o sistema educativo e a formação ao
longo da vida tenham de ser reequacionados à luz do desenvolvimento destas
tecnologias.

Como uma espécie de "glossário" para a aprendizagem na sociedade da


informação, devemos entender que a formação ao longo da vida sustenta-se
em torno de quatro aprendizagens fundamentais, que se interligam e que
constituem os pilares dos conhecimentos, ou seja:
- aprender a conhecer, isto é, adquirir os instrumentos da compreensão,
combinando uma cultura geral, suficientemente vasta, com a possibilidade de
trabalhar em profundidade um pequeno número de matérias, o que também
significa, aprender a aprender, para beneficiar das oportunidades oferecidas
pela educação ao longo da vida;

- aprender a fazer, para poder agir sobre o meio envolvente, a fim de adquirir
não somente uma qualificação profissional mas também competências que
tornem a pessoa apta a enfrentar as mais diversas situações e a trabalhar em
equipa;

- aprender a viver em comum, a fim de participar e cooperar com os outros, no


respeito pelos valores duo pluralismo, da compreensão mútua e da paz; e,
finalmente,

- aprender a ser, via essencial que integra as três precedentes e que permite a
cada um desenvolver melhor a sua personalidade, ganhar capacidade de
autonomia, discernimento e responsabilidade.

Em qualquer dos modelos, o conhecimento só existe se for realizado pela


pessoa, que por sua vez deve ser intelectual e materialmente activa à escala
dos seus meios, logo, a utilização das novas tecnologias deve poder realizar-se
através do tempo e dos meios adequados.

Daí, e se não considerarmos desde já desnecessário fazê-lo, é importante que


possamos reflectir, paralelamente a muitas outras, sobre algumas questões
fundamentais.

(1) Como desenvolver nos futuros (e actuais) profissionais atitudes positivas,


numa perspectiva de abertura à mudança, receptividade e aceitação das
potencialidades das TIC, capacidade de adaptação ao novo papel do educador
como mediador e orientador do conhecimento face aos alunos estimulando o
trabalho em grupo?;

(2) Como promover valores fundamentais no uso das TIC, incluindo a atenção
às questões de segurança/vigilância sobre a informação na Internet, as
questões de direitos de autor e éticas relativas à utilização das TIC?;

(3) Como desenvolver competências de ensino genéricas sobre quando utilizar


e como integrar as TIC nas diferentes fases do processo de ensino, partindo do
planeamento até à avaliação e modo de usar as TIC para estimular as
dinâmicas da escola?;

(4) Como desenvolver competências para o ensino da área curricular (incluindo


o modo como integrar as TIC no curriculum), conhecer e avaliar software
educacional, explorar os recursos existentes na escola, estar familiarizado com
o equipamento e a questões relativas às condições de acessibilidade para
públicos com necessidades especiais?;

(5) Como desenvolver capacidades de manuseamento das ferramentas,


incluindo software utilitário e de gestão pedagógica, em contexto educativo?.

O Papel do Educador
A importância do papel do Educador como agente de mudança nunca foi tão
evidente como agora. Os educadores têm um papel preponderante na formação
da personalidade, na formação de atitudes, positivas e negativas face ao
processo de ensino-aprendizagem. Devem despertar a curiosidade, desenvolver
a autonomia, estimular o rigor intelectual e criar condições necessárias para o
sucesso da formação, seja a educação formal, seja a permanente. Com o
desenvolvimento de todas as novas formas de comunicação, o conhecimento
escolar deixou de se processar predominantemente através do educador na
sala de aula.

O desenvolvimento das novas tecnologias não diminui em nada o papel dos


educadores, antes o modifica profundamente: o educador deixa de ser o
transmissor do saber, tornando-se num elemento do conjunto, organizando o
saber colectivo.

Tendo em conta esta quantidade enorme de informação disponível través do


computador (Internet) ou através da televisão e do rádio, ou mesmo do jornal,
ser capaz de se orientar nesta teia imensa obriga a criar novas "alfabetizações",
novas formas de compreender o real, e, consequentemente, adquirir hábitos
sociais que levem à autonomia de indivíduos livres e esclarecidos.

As novas tecnologias colocam os educadores perante a "obrigatoriedade" de


adquirir competências e conhecimentos que também o tornem avaliador das
capacidades técnicas das "tecnologias". O educador deve saber, não só utilizar
os instrumentos, mas, acima de tudo, deve saber quando e como os utilizar, e
para isso deve ser "educado".

No processo de integração das novas tecnologias na escola, existem, de acordo


com Postman (1994, citado por Litti, F., 1994) "certas etapas, nomeadamente:
1) uma Zona de Conforto (período durante o qual se adquire o equipamento);
depois um estágio de 2) Uso Desconexo (quando o computador fica num
canto, como uma coisa extra, a ser usada quando as outras tarefas académicas
tiverem sido terminadas) e, consequentemente, há 3) um Uso
Coordenado (em que se tomam decisões em relação ao usar o computador) e,
finalmente, 4) Uso Transparente (quando não é mais um caso de uso de
tecnologia só pelo valor tecnológico em si, mas como suporte para uma
estratégia pedagógica).

Através desta divisão "temporal" do ritmo de integração do computador na


Escola, podemos, de certa forma, considerar quais os momentos em que o
educador se deve esforçar por motivar e favorecer a utilização de uma nova
técnica, ou "instrumento" de trabalho: a 3ª e a 4ª fase são aquelas em que o
Educador pode, e deve, orientar a definição de estratégias e actividades para
uma utilização efectiva do computador.

Esta estratégia deve surgir como a resposta às perguntas que a escola deve
fazer: O que queremos que os nossos alunos aprendam a fazer?

Antes de responder cabalmente a esta questão, a escola, e consequentemente


os educadores, devem reflectir sobre o modelo de formação que pretendem, e
que, para contrariar a tendência geral e crescente das sociedades que
sacrificaram os valores culturais e sociais à tecnologia, que dá ênfase à
eficiência em detrimento da reflexão moral ou da ética de funcionamento.
Tendo em atenção um novo paradigma de educação que tem vindo a crescer, o
educador deve adequar-se a um novo estatuto, onde será sempre mais
importante a capacidade do aluno pensar e expressar claramente as suas
ideias, solucionar problemas e tomar decisões em vez da memorização de
factos ou da repetição de respostas certas.

O educador deve ser, acima de tudo, um guia, aumentando a participação


activa da criança através de abordagens mais individualizadas e mais cuidadas,
de forma a que a motivação do aluno seja um fenómeno intrínseco e não algo
que vem de fora, do educador, dos pais ou dos amigos.

Claro que o educador, antes de utilizar o computador, deve fazer um


levantamento profundo das problemáticas nas quais esse instrumento de
trabalho pode dar uma contribuição importante. O Computador deve entrar no
fim de um processo de análise crítica dos problemas pedagógicos em vez de ser
uma solução a priori sem que haja um levantamento do problema. Desta
forma, o computador surge como mais um instrumento de ensino e aproveitado
por ele. O computador torna-se assim também um instrumento independente,
na medida em que serve várias matérias sem pertencer a um único campo
científico. Não produz obrigatoriedade e dependência exclusiva. Os
instrumentos que atraem o ensino são instrumentos de comunicação, e a
relação de ensino-aprendizagem é uma relação de comunicação.

No entanto, por ser um instrumento de comunicação por excelência, o


computador provoca problemas no campo da pedagogia: sendo a pedagogia a
"ciência" de transmitir conhecimentos tendo em conta uma teoria e uma
filosofia, o uso do computador, ou, num âmbito geral, o uso de qualquer
instrumento, pode influenciar este sistema, pois a utilização de instrumentos
modifica a relação aluno-conhecimento, a relação aluno-educador e a relação
escola-sociedade.

Por todas estas razões anteriormente apontadas, o educador que utilize as


novas tecnologias, nomeadamente o computador, na sala de aula deve adequar
a sua atitude aos novos requisitos pedagógicos, ou seja, o educador consciente
da sua nova responsabilidade deve funcionar como um elemento promotor do
desenvolvimento pessoal do aluno, tornando-o uma pessoa crítica e activa
perante a sociedade, fomentando o desenvolvimento de uma consciência de
cidadania, nomeadamente, através da compreensão literácita.

Esta missão do educador só é possível se o próprio educador admitir a sua


necessidade de formação pessoal. Tal como cada aluno que se sente motivado
a aprender a utilizar novos instrumentos, a experimentar novos "cantinhos"
também o educador deve sentir-se atraído por novos desafios, e, acima de
tudo, deve sentir-se seguro na sua "insegurança" da novidade.

Formação literácita com recurso às tecnologias

O educador pode ser, ou antes, é o modelo de conquista, de apoio, de


experimentação que as crianças e os jovens alunos têm no seu dia a dia: o
educador tem a capacidade de levar os alunos a sentirem-se motivados e
despertos para novos desafios, e aprenderem muito com isso. Daí, a
necessidade do educador ocasionar novas e diferentes actividades de
aprendizagem que motivem o aluno e, sobretudo, que integrem conhecimentos
extracurriculares, muitas vezes mais interessantes para os alunos e mesmo
para as famílias.

O educador tem, como objectivo principal, neste novo paradigma de educação,


a tarefa mais importante: ser o condutor, mais do que ser o dono da razão, é
ele que deve motivar e favorecer a descoberta de novos modelos, de outras
informações e de outros métodos, sem nunca esquecer o desenvolvimento do
espírito crítico e analítico que deve florescer no aluno.

Como conclusão, ao definirmos que o termo 'sociedade da informação' é uma


das diversas designações para a sociedade em que vivemos - sociedade pós-
moderna, pós-industrial, global, etc. - com as suas especificidades culturais,
económicas, políticas e ideológicas que sugerem coisas muito diversas como:
tecnologias de informação, facilidade de comunicação, globalização,
interdependência, etc.

A sua forte conotação com as NTI reforça, por um lado, a ideia do homem
como criador e utilizador dessas tecnologias mas, por outro lado, atenua a ideia
do homem que pensa os efeitos do que criou: a complexidade da sociedade em
que vive, em mudança acelerada e marcada pela imprevisibilidade em que
cresce a possibilidade da separação entre o conhecimento e o pensamento.
Como refere Carlos Tedesco (1999):

"Os media não foram concebidos como entidades da formação moral e cultural
das pessoas... A sua concepção e evolução supõem que essa formação já é um
dado adquirido e a tendência actual dos meios de comunicação consiste em
deixar aos próprios cidadãos a responsabilidade de eleger as mensagens que
querem receber."

Esta natural ausência de dimensões morais e culturais, constitui um aspecto de


crucial importância a ter em conta no modo como as tecnologias devem ser
encaradas e integradas no processo de socialização literácita das crianças e dos
jovens e na preparação dos professores.

Mais do que ensinar o manuseamento técnico dos computadores, cabe à escola


e aos professores garantir que as abordagens das tecnologias sejam realizadas
de acordo com pressupostos morais, sociais e culturais e como vias de
formação cívica.

A falta destas referências pode gerar novas exclusões e agravar as existentes.


Por isso, a educação para as escolhas deverá ser uma incidência intencional da
acção das escolas e dos professores no contexto da sociedade da informação.
Esta tarefa exige que os professores, ainda antes de terem os conhecimentos
técnicos para lidar com as NTIs, tenham os conhecimentos, as atitudes e as
perspectivas ideológicas necessários para lerem a sociedade a que agora
chamamos da informação.

Trata-se de uma certa sabedoria integradora de conhecimentos acerca da


sociedade em que vivemos e de um conjunto de atitudes assentes na
experiência e na adesão a valores fundamentais que permitam, em cada
momento, assumir atitudes humanamente significativas.

Em resumo, o domínio técnico das tecnologias só por si, não é condição para a
integração e participação cívica na sociedade em que vivemos. A sociedade da
informação e as tecnologias que a suportam encerram promessas de maior
igualdade de oportunidades, mas também a possibilidade de novas exclusões.

É ao educador/profissional de educação que compete mediar as escolhas, e


dessa forma mobilizar para um desenvolvimento da literacia emergente que
dependa mais "das práticas desenvolvidas em diversos contextos do que do
nível de inteligência, classe social, rendimento económico ou (dentro de
determinados limites) da formação dos progenitores".

Morelia 2006

Henrique Santos

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