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Alfredina Nery*
Especial para a Página 3 Pedagogia & Comunicação
Toda língua possui variações linguísticas. Elas podem ser entendidas por meio de sua história no tempo (variação
histórica) e no espaço (variação regional). As variações linguísticas podem ser compreendidas a partir de três
diferentes fenômenos.

1) Em sociedades complexas convivem variedades linguísticas diferentes, usadas por diferentes grupos sociais, com
diferentes acessos à educação formal; note que as diferenças tendem a ser maiores na língua falada que nalíngua
escrita;

2) Pessoas de mesmo grupo social expressam-se com falas diferentes de acordo com as diferentes situações de uso,
sejam situações formais, informais ou de outro tipo;

3) Há falares específicos para grupos específicos, como profissionais de uma mesma área (médicos, policiais,
profissionais de informática, metalúrgicos, alfaiates, por exemplo), jovens, grupos marginalizados e outros. São as
gírias e jargões.

Assim, além do português padrão, há outras variedades de usos da língua cujos traços mais comuns podem ser
evidenciados abaixo.

Uso de ³r´ pelo ³l´ em final de sílaba e nos grupos consonantais:


pranta/planta; broco/bloco.
Alternância de ³lh´ e ³i´: muié/mulher; véio/velho.
Tendência a tornar paroxítonas as palavras proparoxítonas:
arve/árvore; figo/fígado.
Redução dos ditongos: caxa/caixa; pexe/peixe.
Simplificação da concordância: as menina/as meninas.
Ausência de concordância verbal quando o sujeito vem depois do
verbo: ³Chegou´ duas moças.
Uso do pronome pessoal tônico em função de objeto (e não só de
sujeito): Nós pegamos ³ele´ na hora.
Assimilação do ³ndo´ em ³no´( falano/falando) ou do ³mb´ em ³m´
(tamém/também).
Desnasalização das vogais postônicas: home/homem.
Redução do ³e´ ou ³o´ átonos: ovu/ovo; bebi/bebe.
Redução do ³r´ do infinitivo ou de substantivos em ³or´:
amá/amar; amô/amor.
Simplificação da conjugação verbal: eu amo, você ama, nós ama,
eles ama.

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Se você fizer um levantamento dos nomes que as pessoas usam para a palavra "diabo", talvez se surpreenda. Muita
gente não gosta de falar tal palavra, pois acreditam que há o perigo de evocá-lo, isto é, de que o demônio apareça.
Alguns desses nomes aparecem em o "Grande Sertão: Veredas", Guimarães Rosa, que traz uma V   

 
 
    
      V:

Demo, Demônio, Que-Diga, Capiroto, Satanazim, Diabo, Cujo, Tinhoso, Maligno, Tal, Arrenegado, Cão, Cramunhão, O
Indivíduo, O Galhardo, O pé-de-pato, O Sujo, O Homem, O Tisnado, O Coxo, O Temba, O Azarape, O Coisa-ruim, O
Mafarro, O Pé-preto, O Canho, O Duba-dubá, O Rapaz, O Tristonho, O Não-sei-que-diga, O Que-nunca-se-ri, O sem
gracejos, Pai do Mal, Terdeiro, Quem que não existe, O Solto-Ele, O Ele, Carfano, Rabudo.
Drummond de Andrade, grande escritor brasileiro, que elabora seu texto a partir de uma variação linguística
relacionada ao vocabulário usado em uma determinada época no Brasil.

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"Antigamente, as moças chamavam-se mademoiselles e eram todas mimosas e muito prendadas. Não faziam anos:
completavam primaveras, em geral dezoito. Os janotas, mesmo sendo rapagões, faziam-lhes pé-de-alferes, arrastando
a asa, mas ficavam longos meses debaixo do balaio."

Como escreveríamos o texto acima em um português de hoje, do século 21? Toda língua muda com o tempo. Basta
lembrarmos que do latim, já transformado, veio o português, que, por sua vez, hoje é muito diferente daquele que era
usado na época medieval.


 

Nem todas as variações linguísticas têm o mesmo prestígio social no Brasil. Basta lembrar de algumas variações
usadas por pessoas de determinadas classes sociais ou regiões, para percebers que há preconceito em relação a elas.

Veja este texto de Patativa do Assaré, um grande poeta popular nordestino, que fala do assunto:

  
Sou fio das mata, canto da mão grossa,
Trabáio na roça, de inverno e de estio.
A minha chupana é tapada de barro,
Só fumo cigarro de paia de mío.

Sou poeta das brenha, não faço o papé


De argunmenestré, ou errante cantô
Que veve vagando, com sua viola,
Cantando, pachola, à percura de amô.
Não tenho sabença, pois nunca estudei,
Apenas eu sei o meu nome assiná.
Meu pai, coitadinho! Vivia sem cobre,
E o fio do pobre não pode estudá.

Meu verso rastero, singelo e sem graça,


Não entra na praça, no rico salão,
Meu verso só entra no campo e na roça
Nas pobrepaioça, da serra ao sertão.
(...)

Você acredita que a forma de falar e de escrever comprometeu a emoção transmitida por essa poesia? Patativa do
Assaré era analfabeto (sua filha é quem escrevia o que ele ditava), mas sua obra atravessou o oceano e se tornou
conhecida mesmo na Europa.

Leia agora, um poema de um intelectual e poeta brasileiro, Oswald de Andrade, que, já em 1922, enfatizou a busca por
uma "língua brasileira".

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Para dizerem milho dizem mio
Para melhor dizem mió
Para pior pió
Para telha dizem teia
Para telhado dizem teiado
E vão fazendo telhados.

Uma certa tradição cultural nega a existência de determinadas variedades linguísticas dentro do país, o que acaba por
rejeitar algumas manifestações linguísticas por considerá-las deficiências do usuário. Nesse sentido, vários mitos são
construídos, a partir do preconceito linguístico.

@  Professora universitária, consultora pedagógica e docente de cursos de formação continuada para
professores na área de língua/linguagem/leitura.

http://educacao.uol.com.br/portugues/ult1693u60.jhtm
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@V              V  V  
 

       
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V     V  
                    
  V ?

Ao trabalhar com o conceito de variação lingüística, estamos pretendendo demonstrar: ?

R que a 
portuguesa, como todas as línguas do mundo, não se apresenta de maneira uniforme em
todo o território brasileiro; ?

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(Celso Cunha, em Ö V 


   )?

R que a variação lingüística manifesta-se em todos os     



 ;?
R que a variação da língua se dá em função do  e em função do   ; ?
R que diversos fatores, como 
  !  "   , são responsáveis pela
variação da língua; ?
R que não há hierarquia entre os usos variados da língua, assim como não há uso lingüisticamente
melhor que outro. Em uma mesma comunidade lingüística, portanto, coexistem usos diferentes, não
existindo um padrão de linguagem que possa ser considerado superior. O que determina a escolha de
tal ou tal variedade é a situação concreta de comunicação. ?
R que a possibilidade de variação da língua expressa a       existente em qualquer grupo.
Basta observar, por exemplo, no Brasil, que, dependendo do tipo de colonização a que uma
determinada região foi exposta, os reflexos dessa colonização aí estarão presentes de maneira
indiscutível.?

   
#   ?

l importante observar que o processo de variação ocorre em todos os níveis de funcionamento da linguagem, sendo
mais perceptível na pronúncia e no vocabulário. Esse fenômeno da variação se torna mais complexo porque os níveis
não se apresentam de maneira estanque, eles se superpõem. ?

 O   - por exemplo, o final de sílaba é pronunciado como consoante pelos gaúchos, enquanto em quase
todo o restante do Brasil é vocalizado, ou seja, pronunciado como um ; o caipira; o  chiado do carioca. ?

 Ô O  

 - muitas vezes, por 
 , por exemplo, algumas pessoas conjugam verbos irregulares como
se fossem regulares: "manteu" em vez de "manteve", "ansio" em vez de "anseio"; certos segmentos sociais não
realizam a concordância entre sujeito e verbo, e isto ocorre com mais freqüência se o sujeito está posposto ao verbo.
Há ainda variedade em termos de regência: "eu lhe vi" ao invés de "eu o vi".?

     - algumas palavras são empregadas em um sentido específico de acordo com a localidade.
Exemplos: em Portugal diz-se "miúdo", ao passo que no Brasil usa-se " moleque", "garoto", "menino", "guri"; as 
são, tipicamente, um processo de variação vocabular. ?

r  
#   ?
r 
 $%&&'(, discutindo questões relativas ao ensino da gramática no primeiro e segundo graus, apresenta, com
base em Halliday, McIntosh e Strevens (1974), um quadro bastante claro sobre as possibilidades de variação
lingüística, chamando a atenção para o fato de que, apesar de reconhecer a existência dessas variedades, a escola
continua a privilegiar apenas a norma culta, em detrimento das outras, inclusive daquela que o educando já conhece
anteriormente. ?

Existem dois   


#   os    (variedades que ocorrem em função das pessoas que
utilizam a língua, ou seja, os emissores); os 
 ( variedades que ocorrem em função do uso que se faz da língua,
as quais dependem do receptor, da mensagem e da situação).?

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 BRANDÃO, Sílvia F. @)   * + 


   V. Ática, São Paulo, 1991. ?
 CALLOU, D. c   ,-@  ,,.  
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@0**. Rio de Janeiro, UFRJ/CNPQ., 1995, pp 79-83. ?
 TRAVAGLIA, Luiz Carlos .) &
   -       &
   
    . S.P. Cortez, 1996. pp 41-66 ?

http://acd.ufrj.br/~pead/tema01/variacao.html

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