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A crise financeira global que vivemos hoje é mais um desses fenômenos, e em suas
raízes o que encontramos é uma crise de gestão. Para corroborar minha tese, cito recente
pesquisa com executivos de grandes empresas nacionais realizada pela consultoria Booz
& Company. Dos 90 entrevistados, 73% admitem que suas empresas adotaram ações
inapropriadas que aceleraram o crescimento, mas queimaram reservas. Em outra
enquete da consultoria, que envolveu 828 executivos de empresas instaladas em 65
países, os entrevistados questionam a própria capacidade gerencial para encontrar
soluções para crise e conduzir suas organizações a um porto seguro.
General Motors – Um dos motivos para seu rombo financeiro é o alto custo do plano
de previdência e saúde, que garante aos aposentados os mesmos direitos dos
trabalhadores na ativa e consome 5% do faturamento líquido da companhia. Na
década de 60, quando o plano entrou em vigor, a expectativa de vida da população
era de 50 anos e sistema de saúde não eram muito onerosos. Mas hoje, com o
aumento da expectativa de vida para pelo menos 70 anos e a elevação dos gastos em
saúde, manter os benefícios aos aposentados é extremamente custoso. Além disso, a
GM cometeu um erro estratégico ao resistir em fabricar carros com baixo consumo
de combustível. O erro lhe custou a perda da liderança de 77 anos no mercado
americano para a Toyota.
Empresas brasileiras – O grupo Votorantim foi um dos que sofreu duros golpes com
a crise. Seu banco adotou uma estratégia de captação de recursos de curto prazo, em
24 meses, e financiou automóveis em 72 meses; ficou sem liquidez com a crise
global, que provocou o fechamento das linhas de crédito. Outra empresa do grupo
adotou estratégias financeiras de alto risco, apostando em derivativos com a
expectativa de queda do dólar; como o dólar disparou, teve prejuízo de milhões de
reais. Apostaram também em operações com derivativos Sadia e Suzano, e
igualmente amargaram prejuízos milionários.
Setor sucroalcooleiro
A indústria nacional de açúcar e álcool também tem lições a tirar da crise financeira
global. Usinas venderam safras futuras, captando recursos através de operações de curto
e médio prazos como ACC – Adiantamento de Contrato de Câmbio, para financiar
novos projetos e ampliação de produção. A política adotada levou as usinas a utilizar
seu capital de giro, o que as obrigou a postergar pagamentos de fornecedores de cana,
insumos e salários.
Outro erro estratégico do setor foi entrar na “bolha do etanol” sem saber qual seria a
demanda efetiva pelo produto e acreditar que o governo americano iria abrir as portas
dos EUA para o etanol brasileiro. Em janeiro de 2007, o departamento de agricultura
dos Estados Unidos aprovou subsídios de US$ 87 bilhões aos produtores de milho do
país. O subsídio vai até 2012 e reforça a concorrência do etanol de milho americano
com o da cana-de-açúcar do Brasil.
Esses são equívocos de gestão pontuais e recentes. Mas, a rigor, os problemas de gestão
no setor sucroalcooleiro vêm de longa data – assunto que eu, como economista agricola
que acompanha de perto o setor, não me canso de abordar. Vou me aprofundar um
pouco nesse assunto para ilustrar como a qualidade da gestão pode ser a diferença entre
o bom e o mau desempenho de uma empresa, ainda mais em tempos de crise mundial.
O problema das usinas é que embora invistam milhões de reais em tecnologia avançada,
do plantio à obtenção do produto final, são administradas como os antigos engenhos,
com práticas de gestão que estão muito aquém de suas necessidades. Por incrível que
pareça, a maioria dessas empresas não conhece seus custos de produção
agrícola/industrial, seja porque seus controles são ineficientes ou não dominam uma
metolodologia básica para apuração dos custos. Ou seja: sua gestão é baseado no fluxo
de caixa.
A questão dos custos é um tabu no setor sucroalcooleiro, e isso se deve ao seu próprio
modelo de desenvolvimento. Até 1997, o Governo Federal era quem determinava o
preço de venda do açúcar e do álcool e a quantidade a ser produzida. Somente a partir
desse ano é que o preço passa a ser determinado pelo mercado. Isso exige que os
usineiros tomem conhecimento dos custos operacionais, desde a formação de um
viveiro de mudas de cana até os processos de produção, levando em conta também os
fatores ambientais (solo e clima, por exemplo) que influenciam as atividades dessa
indústria.
A “bolha do etanol” provocou, nos últimos sete anos, o aumento de até 90% do
valor das terras para o cultivo da cana. Uma variação dessa magnitude tem
significativo impacto no desembolso de dinheiro da empresa. Se uma usina que mói
2 milhões de toneladas necessita para isso 25 mil hectares, um aumento de 4
toneladas por hectare ao preço de R$ 32 significa um gasto extra de R$ 3,2 milhões
por ano. Este foi um dos impactos no capital de giro das Usinas, alem do acréscimo
de custos nos insumos agrícolas, maquinas e implementos e mão de obra.
Taxa de crescimento % pago pelo arrendamento de terras por região entre 2002/2006
70,00
59,03
60,00
50,00
40,00 37,17
%
29,13
30,00
20,00 15,39
9,38
10,00 4,88
3,60
-
Jaú Barretos Ourinhos Catanduva Araçatuba S.José Rio Avaré
Preto
O preço dos insumos iniciou uma tendência de alta em janeiro de 2000, que se
acentuou a partir 2007, elevando significativamente o custo da tonelada de cana. No
período entre janeiro/07 a junho/08, há insumos que encareceram até 100%.
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R$ 2.000,00
R$ 1.500,00
R$ 1.000,00
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R$ 60,00
R$ 50,00
R$ 40,00
R$ 30,00
R$ 20,00
R$ 10,00
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CUSTO DE PRODUÇÃO - CANA DE AÇÚCAR
SAFRA 2008/2009
Insumos e
Festilizantes e
MO Muda
24% 34%
Custos Overhead
Operacionais 8%
Industriais
22%
Matéria Prima
70%
Esses são alguns dos problemas que encontramos na gestão das empresas do setor
sucroalcooleiro. A partir de um efetivo turnaround, já utilizado por grandes grupos
sucroalcooleiros, separando claramente o que é gestão e o que é propriedade, a
profissionalização com planejamento e controle de custos aliado ao uso de novas
tecnologias colocará o setor novamente em um patamar de destaque no cenário mundial
em função dos varios fatores que possibilitam ao Brasil ser um dos grandes players no
mercado internacional do agronegócio através principalmente de ganhos expressivos de
produtividade.
Melhorias na gestão das empresas em geral, com ações mais conscientes e ponderadas,
podem ajudar as empresas a enfrentar a crise global. Afinal, se na raiz da crise estão os
erros de gestão, é pelos acertos que poderemos superar a atual situação. Vale
acrescentar que os pilares da economia brasileira são sólidos, com livre movimento de
capitais internacionais; câmbio flutuante com mínima intervenção governamental;
política monetária ativa, com base nas metas de inflação adotada pelo Banco Central; e
política fiscal com dívida pública da ordem de 35% do PIB, bem abaixo do máximo
recomendável de 50%.
A conta pelos estragos da crise será paga pela sociedade como um todo - governos,
empresas e trabalhadores. Mas a tarefa será mais amena se, em vez de cortar custos
indiscriminadamente, buscarmos principalmente eficiência e eficácia operacionais,
aumento de produtividade e conquista de novos mercados. O Brasil pode sair
fortalecido da atual situação, pois tem um mercado interno muito grande e uma
agroindústria com potencial de crescimento capaz de atenuar os impactos da crise
mundial. Basta que cada empresa faça sua lição de casa corretamente.
Para concluir este artigo, faço um alerta aos colegas executivos e empresários: quando
estiver pensando em cortar funcionários, pondere se você esta realmente preparado para
o cargo ou tomando a decisão mais simples.