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Ricardo Hallal Fakury

Engenharia Civil: Estrutura em Aço

Sobre a revisão da norma brasileira de


projeto de estruturas de aço e estruturas
mistas de aço e concreto, a NBR 8800
(The revision of the Brazilian Standard for design of steel
structures and composite steel and concrete structures,
NBR 8800)

Ricardo Hallal Fakury


Professor Doutor da Universidade Federal de Minas Gerais
E-mail: fakury@dees.ufmg.br

Resumo Abstract
Esse artigo apresenta, inicialmente, um breve histó- This paper starts with a historical account of the
rico dos trabalhos de revisão da norma brasileira de pro- revision work being done on the Brazilian Standard for
jeto de estruturas de aço e mistas de aço e concreto, que the design of steel structures and steel/concrete
culminaram no projeto de norma de setembro de 2006, structures. This revision led to the September 2006 draft,
denominado aqui de PR NBR 8800:2006. Em seguida, here referred to as PR NBR 8800:2006. The paper
procura fornecer as bases utilizadas na produção do then presents the basis for the development of
PR NBR 8800:2006, as diretrizes fundamentais seguidas e PR NBR 8800:2006, its main guidelines and the main
as principais mudanças ocorridas em relação à norma em changes in relation to the valid Standard, released in
vigência, datada de 1986. Finalmente, procura destacar a 1986. Finally, the importance of having an up to date
importância de se ter uma norma atualizada para o avanço norm for the consistent advance of the steel construction
consistente da construção metálica no Brasil. in Brazil is highlighted.
Palavras-chave: Estruturas de aço, estruturas mistas de Keywords: Steel structures, composite steel and concrete
aço e concreto, projeto estrutural, norma brasileira. structures, structural design, Brazilian Standard.

REM: R. Esc. Minas, Ouro Preto, 60(2): 233-239, abr. jun. 2007 233
Sobre a revisão da norma brasileira de projeto de estruturas de aço e estruturas mistas de aço e concreto...

1. Introdução proposto na Europa pelo ECCS (1976), e NBR 8800:1986 se encontrava tão obso-
dos anexos relacionados a valores de leta que o processo de revisão, na ver-
1.1 Breve histórico deformações, a vibrações em pisos, à dade, teria de ser transformado na ela-
A primeira norma brasileira que tra- consideração do efeito p-delta, à flam- boração de uma nova norma.
tava do projeto e da execução de estru- bagem de barras axialmente comprimidas
Em junho de 2003, foi concluído,
turas de aço de edifícios constituídas por por flexo-torção e a aberturas em almas
disponibilizado aos interessados via in-
perfis laminados e soldados à tempera- de vigas, que seguiram a norma cana-
ternet e encaminhado à ABNT para os
tura ambiente foi a NB-14 (1958), que dense CAN/CSA-S16.1 (1984), a ABNT
procedimentos formais de discussão e
sofreu uma revisão em 1968. Essa norma NBR 8800:1986 baseou-se nas recomen-
aprovação o primeiro texto-base de revi-
se baseava, principalmente, na norma ale- dações de uma versão preliminar da es-
são da ABNT NBR 8800:1986. Formou-
mã DIN 4114 (1952) e utilizava o método pecificação americana do AISC-LRFD
se a Comissão de Estudos CE-02:125.03,
de cálculo das tensões admissíveis, o (1986).
tendo sido eleito coordenador o Prof.
mais difundido na época, e, com o pas- Por volta de 1995, surgiu a necessi- Julio Fruchtengarten e nomeado secre-
sar dos anos, foi ficando ultrapassada, dade de se ter, no Brasil, uma norma de tário o autor do presente artigo. Três reu-
conduzindo, em certos casos, a estrutu- projeto de estruturas de aço de edifícios niões dessa Comissão foram realizadas
ras inadequadas. em situação de incêndio, um assunto em São Paulo, no Instituto de Engenha-
A partir dos anos 70, a falta de uma praticamente desconhecido no país. Al- ria, nos meses de novembro de 2003, fe-
norma brasileira atualizada forçava o uso gumas universidades, como a UFMG, a vereiro e abril de 2004, quando puderam
de normas e especificações estrangei- USP e a UFOP, começaram a desenvol- ser percebidas as expectativas dos inte-
ras. Tal fato prejudicava a difusão e o ver estudos e pesquisas sobre o assun- grantes com relação ao conteúdo que a
desenvolvimento das estruturas de aço to, a partir dos quais tornou-se possível norma deveria ter. Assim, decidiu-se ela-
no país, pois dificultava uma padroniza- a edição da norma brasileira que trata da borar um novo texto-base para o prosse-
ção do ensino oferecido nas escolas téc- questão, a ABNT NBR 14323:1999. Essa guimento das discussões.
nicas e superiores, impedia que profissi- norma, no entanto, inclui, também, ele-
O novo texto-base foi divulgado
onais de regiões distintas do Brasil, ou mentos estruturais mistos de aço e con-
pela internet em dezembro de 2005. Re-
mesmo de empresas distintas, pudessem creto, quais sejam, vigas mistas, pilares
solveu-se pedir à comunidade interes-
usar as mesmas referências e desestimu- mistos e lajes mistas, e, no caso dos dois
sada que se manifestasse sobre o mes-
lava a pesquisa científica e tecnológica últimos, também as prescrições para o
mo, de preferência por escrito. Muitas
e a produção de textos e artigos técni- projeto à temperatura ambiente (isso,
sugestões de melhoria foram encaminha-
cos. Adicionalmente, não eram devida- embora pareça estranho, foi feito porque
das, a grande maioria acatada pela coor-
mente contempladas as particularidades não existia norma brasileira que tratasse
denação dos trabalhos de revisão da
da construção metálica nacional. de pilares mistos e lajes mistas à tempe-
norma. Em abril de 2006, foi divulgada
ratura ambiente, etapa inicial do projeto
No início dos anos 80, especia- pela internet uma nova versão do texto-
em situação de incêndio).
listas começaram a trabalhar na pro- base, incorporando as citadas sugestões
dução de uma nova norma brasileira Em maio de 2001, um grupo de es- e, mais uma vez, solicitou-se aos interes-
para estruturas de aço de edifícios. pecialistas das áreas de estruturas de aço sados que se posicionassem. Adicional-
Como resultado, foi editada a norma e estruturas mistas, formado por profes- mente, palestras e discussões foram fei-
ABNT NBR 8800:1986, trazendo um im- sores e pesquisadores de importantes tas em entidades representativas da área
portante avanço na questão da seguran- universidades, representantes de órgãos de engenharia, como o Instituto de En-
ça estrutural, ao substituir o método das de classe e da ABNT e engenheiros es- genharia de São Paulo, o Clube de Enge-
tensões admissíveis pelo método dos pecializados, com apoio do IBS (Institu- nharia do Rio de Janeiro e a ABECE, As-
estados-limites, ou seja, trocava-se um to Brasileiro de Siderurgia), sob coorde- sociação Brasileira de Engenharia e Con-
método de cálculo antigo, de base deter- nação do autor deste artigo e subcoor- sultoria Estrutural, sediada em São Pau-
minística, que se encontrava em desuso denação do professor Gílson Queiroz, co- lo. De novo, dezenas de comentários
em grande parte do mundo, por outro meçou a produzir um texto-base de revi- chagaram à coordenação dos trabalhos,
mais moderno, de base probabilística. A são da norma ABNT NBR 8800:1986. os quais foram devidamente avaliados
ABNT NBR 8800:1986 incluía, ainda, Novos processos e produtos haviam e, muitas vezes, incorporados ao texto-
como grande novidade, prescrições para surgido no mercado, novos conhecimen- base. Finalmente, foi produzido e divul-
o projeto vigas mistas de aço e concre- tos técnicos e científicos estavam dis- gado pela internet um último texto-base,
to, que começavam a ser cada vez mais poníveis, inclusive produzidos por cen- versão de setembro de 2006, que, acredi-
utilizadas no Brasil. tros de pesquisas brasileiros, e novas ta-se, deverá ser aprovado em futuras
normas e especificações de reconheci- reuniões da Comissão de Estudos da
Com exceção das curvas múltiplas mento internacional foram editadas. ABNT e submetido à consulta pública
de flambagem, que seguiram o modelo Logo de início se constatou que a ABNT sem alterações substanciais.

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Ricardo Hallal Fakury

1.2 Sobre o presente trabalho NBR 14931:2004 trata de execução. A se-


gunda é a inclusão dos elementos estru-
Esse artigo procura apresen- 3. Formato e filosofia turais mistos de aço e concreto que não
tar as bases utilizadas na produ- O PR NBR 8800:2006 é constituído constavam da norma de 1986, caso de
ção dos textos-base de revisão da por um corpo principal e um número pilares e lajes, e, ainda, de ligações mis-
ABNT NBR 8800:1986, as diretrizes muito grande de anexos, a rigor dezoito tas. Com isso, a futura ABNT NBR 8800
fundamentais seguidas e as principais normativos, portanto de uso obrigató- pode ser considerada, de fato, uma nor-
mudanças ocorridas em relação à nor- rio, e um informativo. Na verdade, esse ma de estruturas de aço e mistas. Essas
ma em vigência, datada de 1986. Pro- formato já é adotado pela ABNT NBR duas mudanças se refletiram, diretamen-
cura, também, destacar a importância 8800:1986 e simplesmente foi mantido, te, no seu próprio título, que passa a ser
de se ter uma norma atualizada para o considerando que: (a) os usuários já es- Projeto de Estruturas de Aço e Mistas
avanço consistente da construção tão habituados ao mesmo, e; (b) apre- de Aço e Concreto de Edifícios (a pala-
metálica no Brasil. Por simplicidade, senta a vantagem de permitir que sejam vra Execução foi eliminada e acrescen-
todas as citações aos textos-base de compartimentadas, em uma mesma parte tada a referência às estruturas mistas).
revisão estão relacionadas às prescri- da norma, todas as regras relacionadas a
ções do último texto-base divulgado, Uma outra mudança importante é
um determinado assunto.
ou seja, o de setembro de 2006, que o acréscimo de um anexo relacionado
será tratado nesse trabalho de PR Procurou-se, na medida do possí- à durabilidade das estruturas de aço,
NBR 8800:2006, onde a sigla inicial PR vel, produzir uma norma aberta, não res- que é o único anexo informativo do
significa Projeto de Revisão. tritiva, permitindo que os projetistas PR NBR 8800:2006. Esse anexo trata da
usem os seus melhores conhecimentos questão da proteção do aço frente à cor-
técnicos para que as estruturas de aço e rosão atmosférica, não apenas para ga-
2. Compatibilidade mistas sejam exploradas em todas as rantir sua durabilidade, mas, também, por
suas potencialidades. Por exemplo, há razões estéticas.
com outras Normas
autorização explícita para que, nas situa- Outras mudanças são a inclusão de
Brasileiras ções não cobertas pela norma, o proje- um anexo com os requisitos para dimen-
Procurou-se, sempre que tista empregue um procedimento aceito sionamento de barras de aço de seção
possível, manter a compatibilida- pela comunidade técnico-científica, variável em formas de I, H ou caixão, ten-
de do PR NBR 8800:2006 com todas acompanhado de estudos para manter o do em vista o uso crescente das mes-
as normas brasileiras correlacionadas. nível de segurança previsto. Nas situa- mas, e a eliminação do anexo relaciona-
Esse procedimento abrange desde os ções cobertas de maneira simplificada, o do à determinação da força cortante re-
símbolos gráficos utilizados para re- projetista poderá usar um procedimento sistente levando em conta o efeito do
presentar as diversas grandezas, que mais preciso. campo de tração (atual anexo G da ABNT
obedecem à ABNT NBR 7808:1983, até NBR 8800:1986), pelo fato de esse pro-
os critérios de segurança adotados, cedimento encontrar-se em desuso nas
que seguem fielmente a norma ABNT 4. Principais mudanças vigas de edifícios.
NBR 8681:2003. Assim, por exemplo, em relação à ABNT
os coeficientes de ponderação da re-
sistência, ao invés de terem valores NBR 8800:1986 4.2 Análise e estabilidade
inferiores ou iguais a 1,0 e aparecerem 4.1 Conteúdo estrutural
nas expressões dos esforços resisten-
tes de cálculo no numerador (multipli- Em termos de conteúdo, merecem, Uma mudança importante diz res-
cando os esforços nominais), como na inicialmente, destaque duas mudanças peito ao procedimento para análise es-
ABNT NBR 8800:1986, agora situam- marcantes. A primeira é a eliminação no trutural. Optou-se por utilizar as prescri-
se no denominador das expressões e PR NBR 8800:2006 da parte relacionada ções da norma americana ANSI/AISC
são, evidentemente, superiores ou à execução de estruturas (atual anexo P 360-05, com inserções adicionais para
iguais a 1,0. Também segue fielmente da ABNT NBR 8800:1986). Considerou- facilitar o entendimento e algumas sim-
a ABNT NBR 8681:2003 toda a parte se que esse assunto, presentemente, é plificações para tornar a análise mais ex-
relacionada a ações e suas combina- bastante amplo e deve constituir uma pedita. Em linhas gerais, a análise estru-
ções. No caso das estruturas mistas norma própria. Dessa forma, a futura tural deve ser feita em teoria de segunda
de aço e concreto, as referências a este ABNT NBR 8800 passará a ser uma nor- ordem, em regime elástico, levando-se
último material são direcionadas à ma exclusivamente de projeto de estru- em conta as influências das imperfeições
ABNT NBR 6118:2003, com exceção do turas. Tal procedimento já é seguido pe- iniciais geométricas e de material. É for-
concreto de baixa densidade, que não las normas de concreto, onde a ABNT necido um método simplificado para a
é previsto pela mesma. NBR 6118:2003 trata de projeto e a ABNT análise de segunda ordem, chamado de

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Método da Amplificação dos Esforços à distância entre os pontos nos quais de instabilidade e das dimensões das
Solicitantes, que conduz a resultados essas contenções estejam presentes, de mesas, passam da curva c ou d para cur-
considerados bons na prática. As imper- maneira similar à ANSI/AISC 360-05. Isso va b. Tal mudança é justificada por es-
feições geométricas iniciais podem ser é muito importante para um projeto es- ses perfis apresentarem tensão residual
consideradas assumindo para a estrutu- trutural mais consciente, pois evita a de tração nas bordas das mesas, o que
ra um desaprumo especificado ou subs- necessidade de avaliações subjetivas os torna mais resistentes à instabilidade
tituindo esse desaprumo por forças ho- como as que, normalmente, são feitas por flexão, o que foi comprovado em pes-
rizontais equivalentes, chamadas de for- para se saber se determinada contenção quisas feitas no Brasil. Observa-se que
ças nocionais. As imperfeições de mate- é ou não efetiva. a permissão para uso dessas curvas mais
rial são consideradas reduzindo-se a ri- favoráveis para os perfis soldados não
gidez axial e a rigidez à flexão das barras. consta do EN 1993-1-1:2005, que serviu
A intensidade da consideração das 4.3 Dimensionamento de de referência para o PR NBR 8800:2006.
imperfeições iniciais geométricas e de barras de aço Nas barras fletidas, a maior novida-
material depende da sensibilidade da No dimensionamento de barras axi- de é a adoção do mesmo fator de mo-
estrutura a deslocamentos laterais. Se, almente tracionadas, a única alteração diz mento equivalente, Cb, instrumento im-
em todos os andares, a relação entre o respeito ao coeficiente de redução da portante no cálculo de determinadas vi-
deslocamento lateral obtido na análise área líquida de seções abertas, Ct, no gas à flambagem lateral com torção, indi-
de segunda ordem e o obtido na análise estado limite último de ruptura da seção cado pela ANSI/AISC 360-05, mais pre-
de primeira ordem for igual ou inferior a líquida. Ao invés de se usarem valores ciso e abrangente que o existente na
1,1, a estrutura é classificada como de fixos de 0,90, 0,85 ou 0,75, de precisão ABNT NBR 8800:1986. Por ser mais pre-
pequena deslocabilidade, se a relação for discutível, como na ABNT NBR 8800:1986, ciso, torna possível obter vigas com se-
superior a 1,1 e igual ou inferior a 1,5, de esse coeficiente no PR NBR 8800:2006 é ção transversal mais leve, especialmen-
média deslocabilidade e, se a relação fornecido por uma expressão igual à da te aquelas com cargas transversais atu-
superar 1,5, de grande deslocabilidade. ANSI/AISC 360-05, que leva em conta o antes ao longo dos comprimentos des-
Nas estruturas de pequena deslocabili- efeito favorável do comprimento da liga- travados e com grandes comprimentos
dade, pode-se dispensar a consideração ção e o efeito desfavorável da excentri- destravados. A maior abrangência impli-
das imperfeições iniciais de material. Nas cidade da ligação. Essa expressão é em- ca a possibilidade de se tratarem situa-
estruturas de pequena e média desloca- pírica e fornece resultados com desvios ções anteriormente não previstas na nor-
bilidades, as imperfeições geométricas máximos da ordem de 10% em relação ma, como a de vigas com uma das mesas
não precisam ser consideradas em con- aos ensaios até então realizados. Uma livre para se deslocar lateralmente sub-
junto com o vento. Nessas últimas es- outra vantagem da mesma é a possibili- metida à tensão normal de compressão
truturas, no entanto, permite-se que seja dade de seu emprego à ruptura da seção em algum trecho de seu comprimento e a
feita análise de primeira ordem, desde líquida de seções fechadas, como as tu- outra mesa com contenção lateral contí-
que as forças axiais de compressão nas bulares retangulares, quando a força de nua contra esse tipo de deslocamento.
barras não superem certos limites e que tração for transmitida por meio de uma Um exemplo dessa situação, muito co-
sejam aplicadas forças nocionais de va- chapa de ligação concêntrica ou por cha- mum na prática, ocorre nos pórticos rígi-
lores mais elevados. pas de ligação em dois lados opostos da dos em que as vigas de aço são sobre-
Com a análise estrutural sendo fei- seção, e as tubulares circulares, quando postas por laje de concreto solidarizada
ta em segunda ordem, ou mesmo em pri- a força de tração for transmitida por meio à mesa superior (a mesa superior fica com
meira ordem caso isso seja permitido, o de uma chapa de ligação concêntrica. deslocamento impedido e a inferior apre-
coeficiente de flambagem das barras senta compressão nos trechos junto às
Nas barras axialmente comprimidas,
comprimidas pode ser tomado igual a ligações com os pilares).
não existem grandes alterações. As mais
1,00 no dimensionamento. Isso facilita, significativas são as mudanças na curva Outra mudança importante nas bar-
enormemente, o cálculo estrutural, pois de resistência à compressão de algumas ras fletidas foi um ajustamento geral das
evita que o projetista tenha de fazer es- seções transversais. É o caso das canto- equações que fornecem os momentos
tudos complexos e de resultados, às ve- neiras laminadas, que passam da curva c resistentes e as forças cortantes resis-
zes, pouco precisos para obtenção do para a curva b, em decorrência de pes- tentes, seguindo em grande parte as
citado coeficiente. quisas recentes, seguindo o EN 1993-1- prescrições da ANSI/AISC 360-05. No
No PR NBR 8800:2006 foram incluí- 1:2005. É, também, o caso dos perfis I ou caso do momento resistente, as equa-
das exigências de resistência e rigidez H soldados, fabricados por deposição ções referentes ao estado limite de flam-
que as contenções (escoras) devem pos- de metal de solda e com chapas cortadas bagem lateral com torção se aplicam a
suir para que o comprimento destravado a maçarico, comuns na construção me- cargas aplicadas na semi-altura da se-
de pilares e vigas possa ser tomado igual tálica nacional, que, dependendo do eixo ção transversal, mesmo nas seções mo-

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nossimétricas, o que fica mais próximo te, o PR NBR 8800:2006 apresenta, como fis I ou H com concreto entre as faces
do que ocorre na prática. Embora a ANSI/ novidade, prescrições para o dimensio- internas das mesas), tubulares retan-
AISC 360-05 apresente uma formulação namento de barras de seção fechada gulares preenchidas com concreto e
que incorpora o estado limite de flamba- quando um dos esforços solicitantes é o circulares preenchidas com concreto.
gem local da alma na flambagem lateral momento de torção, também seguindo o Essas quatro seções são previstas
com torção, optou-se, no PR NBR 8800:2006, ANSI/AISC 360-05. Trata-se, sem dúvi- também pelo EN 1994-1-1:2004, mas a
por manter esses dois estados-limites da, de um avanço que vem solucionar ANSI/AISC 360-05 não trata das seções
separados para efeito de dimensiona- um problema muitas vezes enfrentado parcialmente revestidas com concreto,
mento, preservando uma forma de trata- pelos projetistas, que tinham grandes justamente as mais utilizadas no Brasil.
mento familiar aos profissionais brasilei- dificuldades para efetuar o dimensiona- Para a verificação dos efeitos da força
ros e facilitando o entendimento dos fe- mento, quando atuava sobre a barra um axial de compressão e dos momentos fle-
nômenos de flambagem. Uma outra dife- momento de torção. tores, são oferecidos dois modelos de
rença entre a ANSI/AISC 360-05 e o PR cálculo, um mais simples, baseado na
NBR 8800:2006 é que o primeiro utiliza ANSI/AISC 360-05 e outro mais rigoro-
um valor único de tensão residual de 4.4 Dimensionamento de so, baseado no EN 1994-1-1:2004. O mo-
compressão nas mesas de perfis I, igual ligações metálicas delo mais simples, denominado Modelo
a 30% da resistência ao escoamento do de Cálculo I, utiliza as mesmas expres-
aço, enquanto o segundo procura con- No dimensionamento de ligações sões de interação entre esforços solici-
templar melhor a realidade brasileira, metálicas, foi feita uma atualização ge- tantes desenvolvidas para os pilares
assumindo um valor de 70 MPa nos neralizada dos procedimentos, seguin- puramente de aço. O modelo mais rigo-
perfis laminados e perfis soldados fabri- do as prescrições da ANSI/AISC 360-05. roso, Modelo de Cálculo II, baseia-se
cados por deposição de metal de solda Chama-se a atenção para a permissão, na obtenção do diagrama de interação
com chapas cortadas a maçarico e igual não existente na ABNT NBR 8800:1986, dos esforços solicitantes considerando
a 115 MPa nos demais perfis soldados, o para o uso de parafusos de alta resistên- uma distribuição plástica das tensões,
que permite chegar, em alguns casos, a cia sem protensão inicial, em algumas com as imperfeições ao longo do pilar
um momento resistente um pouco supe- situações. tratadas como excentricidades proporci-
rior. Merecem, também, ser menciona- onais ao comprimento destravado da
das as novas prescrições para conside- peça. Embora o Modelo de Cálculo I seja
Para as barras submetidas à combi-
ração do efeito de alavanca, na determi- mais fácil de usar, fornece resultados
nação de esforços solicitantes, no caso
nação da força de tração de cálculo em conservadores nos pilares com esbeltez
comum da atuação conjunta de força axi-
parafusos e barras redondas rosquea- baixa e pequena contribuição do perfil
al e momentos fletores em relação aos
das, produzido pelas deformações das de aço na capacidade resistente.
eixos centrais de inércia, o modo de di-
mensionamento previsto pela ABNT partes ligadas. Trata-se de prescrições Nas vigas mistas, destacam-se três
NBR 8888:1986 foi, significativamente, al- simplificadas, de uso bastante simples, grandes novidades, que, certamente,
terado no PR NBR 8800:2006. Pela norma que substituem, com bons resultados, contribuirão para o uso cada vez maior
de 1986, deveriam ser atendidas duas verificações complexas e de uso compli- desses elementos estruturais em nosso
expressões de interação relacionando os cado na prática. país. A primeira são prescrições para o
esforços solicitantes e resistentes de emprego de treliças mistas biapoiadas,
cálculo, uma ligada ao colapso por esco- elemento estrutural com enorme poten-
amento da seção transversal e outra ao 4.5 Dimensionamento de cial de uso, baseadas na norma cana-
colapso por instabilidade. O projeto de elementos estruturais mistos dense em vigor, CAN/CSA S16-01:2001.
revisão adota o mesmo procedimento da A segunda novidade é a permissão para
Conforme já foi exposto, o PR NBR emprego de conectores de cisalhamento
ANSI/AISC 360-05, que resume a verifi-
8800:2006 trata de pilares mistos, vigas constituídos por perfis C formados a frio,
cação ao atendimento de uma única ex-
mistas, incluindo o controle de fissuras fundamentada em pesquisas realizadas
pressão de interação e que consegue re-
do concreto nessas vigas, lajes mistas e no Brasil, uma vez que tal prática não
presentar adequadamente a curva de re-
ligações mistas de aço e concreto. existe nos países europeus e da América
sistência das barras, considerando a
possibilidade de ruína por escoamento O PR NBR 8800:2006 fornece pres- do Norte. Curiosamente, esse tipo de co-
ou instabilidade. Na verdade, apenas crições para pilares mistos submetidos nector já é muito empregado, especial-
uma expressão de interação é utilizada, à força axial e a momentos fletores, com mente em pequenas obras, mesmo sem o
mas esta deve ser escolhida entre duas, seções transversais totalmente revesti- necessário amparo normativo. E a ter-
em função do valor da relação entre a das com concreto (perfis I ou H com- ceira novidade é a introdução no PR
força axial solicitante de cálculo e a força pletamente envoltos por concreto), par- NBR 8800:2006 de procedimentos que
axial resistente de cálculo. Adicionalmen- cialmente revestidas com concreto (per- permitem o uso de vigas mistas contínu-

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Sobre a revisão da norma brasileira de projeto de estruturas de aço e estruturas mistas de aço e concreto...
as e semicontínuas, que apresentam em aceitáveis para os deslocamentos da es-
diversas situações a vantagem de levar trutura sofreu substancial mudança em
a perfis de aço mais leves. Esses proce- relação à ABNT NBR 8800:1986. Embora
5. A importância da
dimentos são baseados no EN 1994-1- o PR NBR 8800:2006 indique valores li- Norma Brasileira
1:2004 e incluem um processo para veri- mites para os deslocamentos, cabe ao Ao longo dos trabalhos de revisão
ficação da flambagem lateral com distor- projetista definir quais combinações de da ABNT NBR 8800:1986, certos setores
ção, estado limite último relacionado às serviço devem ser usadas no cálculo dos da comunidade de estruturas de aço che-
regiões de momentos negativos das vi- deslocamentos (quase permanentes, fre- garam a discutir a conveniência da ado-
gas. qüentes ou raras), conforme o elemento ção, no Brasil, da norma americana ANSI/
estrutural considerado, as funções pre-
O PR NBR 8800:2006 fornece regras AISC 360-05, que poderia, inclusive, ser
vistas para a estrutura, as característi-
para o dimensionamento de lajes mistas traduzida para a língua portuguesa. Os
cas dos materiais de acabamento vincu-
de aço e concreto, apoiadas na direção defensores da idéia alegavam, até com
lados à mesma e a seqüência de constru-
perpendicular às nervuras, tendo por certa dose de lógica, que ficaríamos li-
ção. Trata-se de um procedimento ino-
base o EN 1994-1-1:2004. Embora o di- vres da desgastante, demorada e onero-
vador no Brasil, que segue a filosofia do
mensionamento desses elementos não sa missão de “fazer norma” e estaríamos
EN 1993-1-1:2005. Os valores limites ta-
seja simples, dependendo de parâmetros inseridos em um cenário internacional,
belados se basearam nessa norma euro-
obtidos experimentalmente, sua inclusão ainda mais que, possivelmente, a ALCA,
péia e também na experiência brasileira.
na norma tem o importante papel de di- Associação de Livre Comércio das Amé-
fusão do uso e de servir de base para A avaliação da vibração em pisos ricas, em breve poderia alcançar o Brasil,
indicar os parâmetros que devem ser é sempre um problema complexo, que levando a uma inevitável padronização
obtidos nos ensaios. A realidade mostra depende de análise dinâmica, devendo- das normas técnicas no continente ame-
que a prática usual consiste em os pró- se levar em conta fatores como as ca-
ricano.
prios fabricantes encomendarem os en- racterísticas e a natureza das excitações
saios e, com os parâmetros relevantes dinâmicas, os critérios de aceitação para Caso esse pensamento prevaleces-
obtidos, fazerem tabelas de uso prático conforto humano em função do uso e se, certamente a construção metálica
específicas para seus produtos. ocupação, a razão de amortecimento brasileira sofreria um baque, uma vez que
modal e os pesos efetivos do piso. O a norma americana não atende, totalmen-
PR NBR 8800:2006 fornece uma biblio- te, às necessidades nacionais. Os se-
4.6 Ligações mistas grafia referencial para uma avaliação con- guintes inconvenientes, entre outros, se
siderada precisa da questão e regras de fariam presentes:
De forma completamente inédita no
uso imediato para uma avaliação simpli-
Brasil, o PR NBR 8800:2006 apresenta as a) As particularidades do comporta-
ficada nos casos de atividades humanas
prescrições necessárias para o dimensi- normais, como o caminhar de pessoas e mento dos perfis I ou H soldados,
onamento de ligações mistas, que são movimentos rítmicos de salto ou dança. fabricados por deposição de metal de
ligações em que a laje de concreto parti- solda e com chapas cortadas a maça-
cipa da transmissão de momento fletor Da mesma forma que a vibração em
rico, largamente utilizados no Brasil,
de uma viga mista para um pilar ou para pisos, o movimento causado pelo vento
não seriam contempladas.
outra viga mista no vão adjacente, em em estruturas de edifícios de andares
região de momento negativo. São abor- múltiplos ou outras estruturas similares b) Não haveria regras referentes aos
dadas ligações mistas com três configu- pode gerar desconforto aos usuários. O estados-limites de serviço, tendo em
rações predefinidas, pertencentes a vi- PR NBR 8800:2006 fornece indicações vista que a ANSI/AISC 360-05 não
gas mistas semicontínuas que não parti- para uma avaliação mais rigorosa do pro- contém limitações para deslocamen-
cipam do sistema de estabilidade lateral blema e providências que devem ser to- tos e procedimentos, mesmo que sim-
da edificação. madas na fase de projeto para sua mini- plificados, para avaliação de vibra-
mização. ções em pisos devidas ao vento, e,
O estado limite de serviço relacio- também, regras para controle de fis-
4.7 Estados-limites de serviço nado à fissuração do concreto deve ser, suras do concreto em vigas mistas. É
O PR NBR 8800:2006 trata dos se- obrigatoriamente, verificado nas regiões de se imaginar, por exemplo, a inten-
guintes estados-limites de serviço: des- de momento negativo ou com tendência sidade dos problemas que surgiriam
locamentos excessivos, fadiga, vibrações de continuidade das vigas mistas, como quando houvesse alguma discussão
inaceitáveis em pisos, vibrações inacei- por exemplo, junto aos apoios de vigas sobre qual seria a melhor limitação
táveis devidas ao vento, fissuras inacei- biapoiadas. Para esse estado limite, o para a flecha de determinada viga.
táveis do concreto em vigas mistas. PR NBR 8800:2006 tomou, como base, a
c) Não haveria possibilidade de uso de
ABNT NBR 6118:2003.
A forma de verificação dos limites procedimentos simplificados, exis-

238 REM: R. Esc. Minas, Ouro Preto, 60(2): 233-239, abr. jun. 2007
Ricardo Hallal Fakury
tentes apenas no PR NBR 8800:2006, EN 1994-1-1:2004 e a americana ANSI/ Brasileira de Normas Técnicas, Rio de
para tratar, de forma segura, situações AISC 360-05 são muito recentes. A adap- Janeiro, Brasil.
tação à realidade brasileira foi feita com AISC-LRFD-1986. Load and resistance
complexas, como o efeito de alavan-
factor design specification for structural
ca na determinação da força de tra- cuidado, procurando tratar, com consci-
steel buildings. American Institute of
ção de cálculo em parafusos e barras ência, situações comuns em nosso país, Steel Construction, Chicago, USA.
redondas rosqueadas. que não têm paralelo em outros lugares, ANSI/AISC 360-05. Specification for
e procurando fornecer procedimentos structural steel buildings. American
d) Não haveria possibilidade de uso de simplificados para situações complexas, Institute of Steel Construction, Chicago,
conectores de cisalhamento consti- com objetivo de tornar o cálculo estru- USA.
tuídos por perfis U formados a frio. tural acessível ao maior número possí- CAN/CSA S16.1:1984. Steel structures for
buildings - limit states design. Canadian
e) Não haveria procedimentos para di- vel de profissionais.
Institute of Steel Construction, Rexdale,
mensionamento de pilares mistos Ontario, Canadian.
parcialmente revestidos com concre- CAN/CSA S16-01:2001. Limit states design
to, de vigas mistas contínuas e semi-
7. Agradecimentos of steel structures. Canadian Institute
contínuas, de treliças mistas, de la- Ao CBCA, Centro Brasileiro da of Steel Construction, Rexdale, Ontario,
jes mistas e de ligações mistas. Construção Metálica, e ao CNPq, Con- Canadian.
DIN 4114 (1952). Berechnungsgundlagen für
selho Nacional de Pesquisa, que torna-
f) Não haveria um anexo relacionado à stabilitätsfälle in stahlbau. Deutsche
ram possível a elaboração desse traba- Industrie Normen, Knickung, Kippung,
durabilidade das estruturas, de gran-
lho. Beulung, Germany.
de importância para orientação dos
ECCS (1976). Manual on the stability of steel
profissionais no quesito referente à
structures. European Convention for
corrosão.
8. Referências Constructional Steelwork - Committee
Adicionalmente, as estruturas de 8, 2a. Ed.
bibliográficas EN 1993-1-1: 2005. Design of steel
aço e mistas de aço e concreto não teri-
ABNT NBR 6118:2003. Projeto de estruturas structures-Part 1.1: General rules and
am, no Brasil, uma norma compatível com de concreto. Associação Brasileira de rules for buildings. EUROCODE 3,
as demais normas brasileiras. No mais, a Normas Técnicas, Rio de Janeiro, Brasil. European Committee for
ausência de uma norma genuinamente ABNT NBR 7808:1983. Símbolos gráficos Standardization, Brussels, Belgium.
nacional inibiria as pesquisas científicas para projetos de estruturas. Associação EN 1994-1-1:2004. Design of composite steel
e tecnológicas feitas nas universidades Brasileira de Normas Técnicas, Rio de and concrete structures: Part 1.1: General
e centros de pesquisa. Janeiro, Brasil. rules and rules for buildings.
ABNT NBR 8681:2003. Ações e segurança EUROCODE 4, European Committee
nas estruturas. Associação Brasileira de for Standardization, Brussels, Belgium.
Normas Técnicas, Rio de Janeiro, Brasil. NB 14-1952 (revisada em 1968). Cálculo e
6. Conclusões ABNT NBR 8800:1986. Projeto e execução execução de estruturas de aço (edifícios).
O PR NBR 8800:2006 é um texto atu- de estruturas de aço de edifícios. Associação Brasileira de Normas
Associação Brasileira de Normas Técnicas, Rio de Janeiro, Brasil.
alizado, que, certamente, vai contribuir
Técnicas, Rio de Janeiro, Brasil. PR NBR 8800:2006. Projeto de estruturas
para o avanço da construção metálica e de aço e de estruturas mistas de aço e
mista de edifícios no Brasil, uma vez que ABNT NBR 14323:1999. Dimensionamento
de estruturas de aço de edifícios em concreto de edifícios, Projeto de Revisão,
incorpora o que existe de mais moderno Versão Setembro de 2006. Associação
situação de incêndio. Associação
no mundo sobre o dimensionamento Brasileira de Normas Técnicas, Rio de
Brasileira de Normas Técnicas, Rio de
dessas estruturas. As normas interna- Janeiro, Brasil.
Janeiro, Brasil.
cionais usadas como principais referên- ABNT NBR 14931:2004. Execução de Artigo recebido em 07/12/2006 e
cias, as européias EN 1993-1-1:2005 e estruturas de concreto. Associação aprovado em 08/12/2006.

REM - Revista Escola de Minas


71 anos divulgando CIÊNCIA.
REM: R. Esc. Minas, Ouro Preto, 60(2): 233-239, abr. jun. 2007 239

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