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EDUCAÇÃO E DIVERSIDADE: UMA ABORDAGEM SOBRE A

DIVERSIDADE ÉTNICA NA EDUCAÇÃO INFANTIL

Maria da Conceição M. Ribeiro/P.M.A.


conceicaoribeiro90@hotmail.com
Eleonora Félix da Silva/P.M.L.S.
eleonora.felix@hotmail.com

RESUMO: A presente comunicação tem como centro de interesse as possibilidades de


abordagens da diversidade étnica na Educação Infantil. O objetivo do nosso trabalho é
analisar as estratégias de inserção da cultura afro-brasileira no ensino infantil, com base
nas determinações da lei federal Nº. 10.639/03 que estabelece a obrigatoriedade de se
incluir as relações étnicas nos currículos escolares. A referida lei serve como incentivo à
valorização da diversidade étnico-cultural que existe em nossa sociedade, apesar do
predomínio de atitudes de discriminação e preconceitos no ambiente escolar. Valorizar
as influências afro-brasileiras na educação infantil é uma maneira de combater racismos
e preconceitos ainda na primeira fase de formação da identidade das crianças. A nossa
proposta metodológica consiste em pesquisa bibliográfica sobre o tema proposto,
relacionando com nossa prática pedagógica enquanto docentes nas redes públicas de
ensino.
Palavras-chave: Educação Infantil. Etnia. Diversidade.

A Educação Infantil é parte integrante da Educação Básica do sistema escolar


brasileiro conforme a LDBEN (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional) em seu
artigo 29:
“A Educação Infantil, primeira etapa da educação básica, tem como
finalidade o desenvolvimento integral da criança até seis anos de
idade, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social,
complementando a ação da família e da comunidade”. (Brasil,
LDBEN, 2006)

De acordo com a referida lei, a criança deve ser inserida na escola para ampliar
sua formação e seu desenvolvimento em diversos aspectos de sua dimensão humana.
Para uma formação social mais ampla, a criança precisa de uma educação que contribua
para a valorização do bom convívio com diversos grupos sociais, pois uma
característica marcante da sociedade brasileira é a diversidade cultural e étnica,
resultante do processo histórico de formação do Brasil. No entanto, verificamos que
essa diversidade étnica e cultural nem sempre é valorizada.
Conforme José Ricardo Oriá Fernandes apesar de sermos uma nação multirracial
e pluriétnica, em função de nossa formação histórico-social, a escola brasileira ainda
não aprendeu a conviver com essa realidade. (FERNANDES: 2005, p. 379). As ideias
do referido autor assentam-se na constatação da forte influência da cultura de matriz
europeia em detrimento das culturas afrodescendentes e indígenas nos currículos
escolares. A escola brasileira não escapa dessa realidade de supervalorização de um
grupo étnico sobre outros. Todavia, na tentativa de superar essa deficiência, o governo
brasileiro sancionou a lei federal nº. 10.639/03 tornando obrigatório o ensino e
valorização da cultura afro-brasileira nos estabelecimentos de ensino do país.
Então, enquanto docentes nos propusemos a problematizar esta questão no
âmbito da Educação Infantil, posto que esta seja uma educação voltada para a formação
de uma identidade para as crianças e, considerando ainda, que os valores apreendidos
pelas crianças nesta fase são fundamentais para o estabelecimento de suas relações com
outras crianças, bem com para as experiências de vida futura. Questionamos certas
práticas vigentes na educação infantil que reproduzem estereótipos sobre a população
negra ou mesmo submetem as crianças a situações de preconceitos. Desta maneira
consideramos que é fundamental um repensar da práxis na Educação Infantil e propor
possibilidades para uma educação das relações etnicorraciais que combata preconceitos
e racismos.
A Educação Infantil – primeira etapa da educação básica – não pode estar longe
dessa problemática, pois é uma fase em que a criança está em formação e por isso
devemos nos preocupar em fornecer conhecimentos para que elas possam desde cedo
aprender a não estranhar o outro, e no caso das crianças negras, aprender a se valorizar.
E preciso que desde cedo as crianças tenham a oportunidade de conhecer, de perceber a
relação entre os diferentes grupos étnicos que existem, pois nesse momento professores
e alunos passam a construir um currículo vivo, voltado no respeito e na valorização de
si mesmo e dos outros.
Concordamos com Roberta Bencini quando afirma que:

“O trabalho de educação antirracista deve começar cedo. Na educação


Infantil, o primeiro desafio é o entendimento da identidade. A criança
negra precisa se ver como negra, aprender a respeitar a imagem que
tem de si e ter modelos que confirmem essa expectativa”. (BENCINI:
2004, p. 51)

É esta nossa preocupação, de que a criança negra precisa ser valorizada para que
a própria tenha uma autoestima positiva de si mesmo. Para tanto ela precisa está
inserida num ambiente que valorize a negritude. Acreditamos que uma possibilidade
para isto é uma educação voltada para as relações etnicorraciais que se direcione para a
valorização do branco e do negro, afinal a criança dita branca igualmente precisa
apreender valores que desmistifique as referências ao povo negro como lugar do feio ou
inferior. Neste sentido é que acreditamos que a inserção das questões etnicorraciais
pode voltar-se tanto para a criança negra como para os não-negros, pois a diferença
pode ser identificada e valorizada. As crianças precisam perceber e entender as
diferenças existentes entre elas. Perceber a diferença é apenas um passo para a
compreensão de que todos devem ser tratados com igualdade e desta forma combater
preconceitos e estereótipos construídos no âmbito familiar – primeiro espaço de
formação de valores – que persistem igualmente no meio escolar.
Na Educação Infantil tem prevalecido um silêncio quanto às relações
etnicorraciais apesar das diversas situações de preconceitos vivenciadas pelas crianças
em creches e pré-escolas. No interior das instituições de Educação infantil, são inúmeras
as situações nas quais as crianças negras desde pequenas são alvo de atitudes
preconceituosas e racistas por parte tanto dos profissionais da educação quanto dos
próprios colegas e familiares”. (BRASIL: 2006, p.36)
Para Tomaz Tadeu da Silva, o texto curricular (livro didático, paradidáticos,
lições orais, orientações curriculares oficiais, rituais escolares, datas festivas e
comemorativas) vigente nas escolas brasileiras está cheio de narrativas nacionais étnicas
e raciais, confirmando identidades dominantes e desvalorizando as outras identidades
como exóticas ou folclóricas. (SILVA: 1999, p. 101)
Diante desta constatação a problemática que se apresenta refere-se às
possibilidades de se desconstruir os preconceitos existentes na escola com relação às
crianças negras e a cultura negra. Entre as situações cotidianas de preconceitos
vivenciadas pelas crianças estão os casos em que as crianças negras recebem menos
atenção que as brancas, fato que pode prejudicar a formação da identidade infantil.
Interessados em buscar alternativas para uma educação que valorize o negro e
que contribua para a formação de uma identidade positiva para a criança negra,
realizamos uma pesquisa bibliográfica onde identificamos possibilidades de valorização
da diversidade étnica na Educação Infantil. Identificamos uma legislação vigente no
Brasil que estabelece uma obrigatoriedade de uma educação para as relações
etnicorraciais, tais como a lei Nº.10.639 sancionada em 09 de janeiro de 2003 e a lei Nº.
11.645 aprovada em março de 2008. São leis que ampliam o debate sobre a questão
étnica e defendem a valorização de uma educação que destaque a história e as
contribuições dos afrodescendentes e indígenas no Brasil.
Em nosso estudo identificamos ainda uma publicação produzida para direcionar
a prática pedagógica em sala de aula no sentido de uma educação antirracista.
Referimos-nos a obra - publicada em 2006 - “Orientações e Ações para a Educação das
Relações Étnico-Raciais” uma produção da Secretaria da Educação Continuada,
Alfabetização e Diversidade (SECAD) integrante do Ministério da Educação. É um
trabalho interessante por fornecer subsídios para uma prática docente que combata
preconceitos contra a população negra.
As “Ações e orientações para a educação das relações étnico-raciais” orienta o
processo de aprendizagem na Educação Infantil no sentido de forjar nas crianças valores
que estão esquecidos, porém se fizeram presente ao longo da história da população
negra no Brasil. Exemplificando, a obra em questão destaca que na Educação infantil as
crianças devem aprender que as pessoas mais velhas devem ser valorizadas, e isto é uma
característica da cultura africana e indígena. Entendemos então que os profissionais da
educação infantil devem ter cuidado ao falar para as crianças ideias depreciativas quanto
aos idosos, do tipo “se você não se comportar o velho vai te pegar” ou ainda narrar
contos e histórias infantis em que os idosos são os feios e maldosos.
Outro valor importante a ser destacado é a solidariedade, pois não existe
educação sem solidariedade. A história do povo negro foi marcada pela solidariedade no
intuito de garantir a sobrevivência nos dias atuais e em outros momentos de sua história
no Brasil, como no contexto das ações individuais ou coletivas de resistência escrava.
(BRASIL: 2006, p. 39)
A valorização da família e seus diferentes tipos é outra questão relevante como
lugar de solidariedade e afetividade. Aqui também o papel do educador é fundamental
no sentido de que ele precisa ter noção de que há diferentes tipos de famílias e
relativizar a ideia de existência de “famílias desestruturadas”, compreendendo que não
existe um modelo perfeito de organização familiar.
“Alguns equívocos precisam ser superados. Um deles diz respeito à
ideia de que famílias pobres e negras não têm conhecimento, que não
sabem ensinar seus filhos, que não se preocupam com a educação dos
mesmos, que não tem noção de higiene, que não sabem como
alimentá-los, que são supersticiosas e que necessitam de alguém de
fora da família que os ensine a educar seus filhos”. (BRASIL, 2006,
p.42)

A problemática étnica na Educação Infantil nos propõe muitos desafios, entre


eles a formação dos professores da Educação Infantil, pois esses profissionais precisam
conhecer a história dos povos afrodescendentes para que possam ter um compromisso
com uma educação que valorize os negros e indígenas e que permita desconstruir
preconceitos.
Mas, voltando para as práticas nas salas de aula de Educação Infantil,
questionamos que possibilidades e estratégias podem ser acionadas nas aulas para a
valorização do negro, favorecendo a construção de uma identidade positiva para as
próprias crianças negras.
Uma das possibilidades é incorporar no calendário da Educação Infantil datas e
comemorações que abordem e valorizem a história do povo negro. Questionando porque
nas datas comemorativas do calendário escolar só destacam personagens brancos e da
elite da sociedade brasileiro. Porque o negro só aparece de forma folclórica como no
caso do Saci ou do negrinho do pastoreio e muitas vezes nem se destaca que esses
personagem são negros. O dia da consciência negra e a história de Zumbi também
devem chegar para as crianças da Educação Infantil, caso contrário elas não acreditar
que no Brasil os herois também são negros e não apenas a princesa Isabel.
Nas histórias e poesias contadas para as crianças o negro e cor preta devem ser
valorizadas e narrativas literárias e poéticas que depreciem o negro e a cor preta devem
ser questionadas. Sobre o uso dessas metodologias, as “Ações e Orientações”,
consideram que “os contos e as histórias povoam o universo infantil. Principalmente
com relação aos contos, sempre se enfatizam aqueles da tradição europeia, como Branca
de Neve”. (BRASIL: 2006, p.171). Uma outra possibilidade seria a substituição dessas
histórias por contos africanos, como “Kiriku e a feiticeira” ou as obras “Tranças de
Bintou”, “Menina do Laço de Fita”, Racismo no galinheiro, etc. Outra orientação refere-
se ás músicas cantadas para as crianças onde as pessoas negras são depreciadas, a
exemplo de “Escravos de Jô” e “boi da cara preta”. (BRASIL: 2006, p. 171).
O ambiente escolar para uma Educação Infantil voltada para a valorização do
negro é outro detalhe que não pode ser esquecido. Que tal, cartazes com pessoas negras
e não apenas com figuras de bebês lourinhos de olhos verdes? Devem ser visualizadas
nas escolas e nos livros didáticos e paradidáticos, usados na Educação Infantil, crianças
e famílias negras. Porque nos livros os personagens só podem ser brancos? E quando
aparecem negros é no sentido pejorativo. Eles não são os personagens centrais, são
tristes e sofridos, etc. De tal maneira só é possível construir uma imagem negativa do
povo negro. Romper com esta identidade e construir uma imagem positiva do negro,
tanto para as crianças negras, como para as ditas como brancas, é uma forma de educar
para a diversidade e para as relações etnicorraciais. E nesse contexto que o Educador
deve aproveitar essas literaturas que só valorizam o branco para socializar e envolver
seus alunos nas diferentes situações do cotidiano, reescrevendo as literaturas infantis, e
valorizando a cultura de todos.
Por fim, as sugestões existem para a abordagem étnica no âmbito escolar, mas
assim ditas neste pequeno espaço não é suficiente. É necessária a criatividade dos
educadores, porém mais importante é uma política educacional que reveja o currículo
adotado nas redes educacionais, responsáveis pela Educação Infantil, e dotá-lo de uma
proposta que quebre os silêncios sobre as experiências negras e combata o preconceito
desde os anos iniciais da criança na escola. Além do mais, sabemos que o desafio é
grande dada à questão da formação docente e a disponibilidade de recursos didáticos.
Documentos elaborados pelas secretarias já existem tais como o RCNEI
(Referências Curriculares Nacionais para o Ensino Infantil), Os PCN’s (Parâmetros
Curriculares Nacionais) e as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das
Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e
Africana.
Por tanto, se faz necessário que escola, professores e comunidade escolar
busquem ter objetivos específicos para criar, planejar, promover e valorizar a
diversidade cultural, embasado numa nova concepção de educação, pautada no respeito
e promoção da igualdade étnica, cultural e racial.

Referências

BENCINI, Roberta. Educação não tem cor. In Revista Nova Escola. Ano XIX. Nº 177.
São Paulo: Abril, 2004, p. 44-53.

BRASIL. Lei 10.639, de 9 de janeiro de 2003. D.O.U. de 10/01/2003.

_______.Ministério da Educação/Secad. Diretrizes Curriculares Nacionais para a


Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-
brasileira e Africana.

_______. Ministério da Educação/Secad. Orientações e Ações para a Educação das


Relações Étnico-Raciais. Brasília: SECAD, 2006.

_______. Secretaria de Educação Fundamental. Referencial Curricular Nacional para


a Educação Infantil. Brasília: MEC/SEF, Volume 2, 1998.

DIOUF, Sylviane A. As tranças de Bintou.

FERNANDES, José Ricardo Oriá. Ensino de História e diversidade cultural: desafios


e possibilidades. Cad. Cedes. Vol. 25, n. 67, set./dez. Campinas: 2005, p. 378-388.
Disponível em http://www.cedes.unicamp.br . Acesso em 06 out. 2010.

Filme Kiriku e a feiticeira

MACHADO, Ana Maria. Menina Bonita de Laço de Fita. São Paulo: Ática.

SILVA, Tomaz Tadeu da. Documentos de identidade: uma introdução às teorias do


currículo. Belo Horizonte: Autêntica, 1999, p. 99-104.

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