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Uma das características da vida contemporânea está relacionada, segundo o autor, Frank
Ankersmit, com o excesso de produção. Uma enorme quantidade de literatura histórica
que parece infiltrar-se em todas as áreas e disciplinas, que transporta consigo a sensação
de desalento e pouco civilizadora. Como tal, uma das soluções apontadas neste artigo,
relaciona-se com a constituição de uma ligação com o passado baseada no
reconhecimento honesto da posição que ocupamos no presente enquanto historiadores.
Esta atitude, este movimento, tem como ponto de partida uma visão estética
compartilhada pelos mais diversos autores, como por exemplo Jacques Derrida,
1
Sobre este tema ver J.F Lyotard, A Condição Pós-Moderna, Gradiva (2003), p. 17.
Friedrich Wilhelm Nietzsche, Hans Josef Gombrich e Artur C. Danto, e na comparação
de que uma obra de arte não é uma reprodução mimética da realidade mas um
substituto da realidade.
Assim, a linguagem e a arte não estão dispostas no lado oposto da realidade, mas numa
pseudorealidade e, consequentemente, dentro da realidade. Um segundo ponto
importante na abordagem do lado estético está relacionado o papel que o estilo deve
desempenhar, isto é, para os modernistas não teria qualquer papel de destaque, dado que
o estilo implica uma decisão sobre forma em vez do conteúdo. Por outro lado, os pós-
modernistas reconhecerão a importância do carácter estético da natureza da
historiografia através do estilo e da linguagem.
Estes autores reconhecem aquilo que a literatura compartilha com a historiografia, dado
que a sua natureza deste ofício (apresentar o passado), depende da sua definição de
linguagem. Neste seguimento, a historiografia possuiria o mesmo grau de opacidade e
dimensão intencional que a arte (ao contrario da linguagem cientifica que tende a ser o
mais clara e transparente quanto possível). Se para os modernistas uma prova é uma
revelação daquilo que aconteceu no passado, seguindo uma linha de raciocínio desde as
provas passadas até uma realidade histórica oculta nas fontes. Para os pós-modernistas,
as provas representarão apenas possíveis interpretações do passado.
Outra ponte que Ankersmit apresenta, está relacionada com a ligação entre a
historiografia e a psicanálise. Em ambos os casos lidamos com interpretações do sentido
do mundo, onde a psicanálise representa um reportório de estratégias de interpretação
dos traços. Enquanto o modernismo terá procurado, segundo o autor, a essência do
passado o pós-modernismo procuraria focar-se na história das mentalidades. Nesta
continuidade seremos alertados para estas novas tendências e não para uma quebra
radical com práticas antigas (sendo esta passagem uma característica pós-modernista).
Nesta nova visão o objectivo nunca será a integração, a síntese ou a totalidade, como
vimos com outros autores, mas sim focar a atenção em porções da história, num
movimento de abertura ao mundo.
Será, segundo o autor, a partir de Johann Goethe que se desenvolve um novo género de
escrita desapegado da história intelectual, filosófica, epistemológica, ou social, e ligado,
essencialmente, à interdisciplinaridade, abandonando qualquer contextualização
exacerbada. Tratar-se-á da entrada da Bildung na historiografia, num movimento de
aprendizagem com o passado, em vez de adequação. Desta forma, a historia deixará de
ser uma reconstrução de acontecimentos passados, e mais um jogo contínuo de
memórias.
«The time as come that we should think about the past, rather than investigate it»2
Em suma, o autor reiterará que nada do afirmado durante este artigo tem como objectivo
que a procura da verdade histórica seja abandonada. Tentará edificar um discurso onde a
dimensão metafórica e estética da historiografia se situa num campo mais vigoroso do
que a dimensão literal tida até ao momento. O pós-modernismo não rejeita por completo
a historiografia científica, apenas chama a nossa atenção para novas abordagens e novos
territórios que podem ser interpretados.
11 de Novembro de 2009
2
F. R. Ankersmit, “Historiography and Postmodernism,” History and Theory, 28 (1989), p. 152.