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Karl Marx e a História – Prof. Gonçalo Santa Cruz de Souza – Comentários para aula

KARL MARX: Contribuição à Crítica da Economia Política


(Berlim, 1859). IDEOLOGIAS INSTITUIÇÕES

Eis, em poucas palavras, o resultado geral a que cheguei e que, Idéias Políticas Estado
uma vez alcançado, serviu-me como fio condutor para meus Idéias Jurídicas Igrejas
estudos. Na produção social da sua existência, os homens Idéias Filosóficas Partidos Políticos
estabelecem relações determinadas, necessárias, Idéias Religiosas Escolas
independentemente da sua vontade. Essas relações de produção
correspondem a um certo grau da evolução das suas forças
produtivas materiais. O conjunto de tais relações forma a
estrutura econômica da sociedade, o fundamento real sobre o SUPERESTRTURA
qual se levanta um edifício jurídico e político, e ao qual
respondem formas determinadas da consciência social. O modo
de produção da vida material domina em geral o INFRA-ESTRUTURA
desenvolvimento da vida social, política e intelectual. Não é a
consciência do homem que determina sua existência, mas ao
contrário, é sua existência social que determina a sua
consciência. Num certo grau de desenvolvimento, as forças
produtivas materiais da sociedade colidem com as relações de Forças Produtivas Relações Sociais M
produção existentes ou com as relações de propriedade dentro de Produção O
das quais vinham se movimentando até aquele momento e que D
não passam da sua expressão jurídica. Essas condições, que Propriedade O
ainda ontem eram formas de desenvolvimento das forças Homens: Meios de Repartição Prod.
produtivas se transformam agora em sérios obstáculos. Começa Produtores de Produção Exploração D
então uma era de revolução social. A transformação dos bens materiais CLASSES E
fundamentos econômicos é acompanhada de mudança mais ou
menos rápida em todo esse enorme edifício. Ao considerarmos
tais mudanças, é preciso distinguir duas ordens de coisas. Há a P
transformação material das condições da produção econômica, Objetos de Meios de trabalho: R
que se deve constatar com o espírito rigoroso das ciências Trabalho: Instalações, fontes energia, O
naturais. Mas há também as formas jurídicas, políticas, Madeira D
religiosas, artísticas, filosóficas, em suma, as formas ideológicas Minério U
com as quais os homens tomam consciência desse conflito e o Pedra , Terra Instrumentos de Trabalho Ç
levam até o fim. Não se julga uma época de revolução de acordo Instrumentos Equipamentos Ã
com a consciência que ela tem de si mesma. Esta consciência O
pode ser melhor explicada pelas contrariedades da vida material,
pelo conflito que opõe as forças produtivas sociais e as relações
de produção. Nunca uma sociedade expira antes que se
desenvolvam todas as forças produtivas que ela pode comportar: FORMAÇÕES ECONÔMICO SOCIAIS
nunca se estabelecem relações de produção superiores sem que
as condições materiais de sua existência tenham nascido no
próprio seio da antiga sociedade. A humanidade nunca se
♦ SOCIEDADE PRIMITVA
propõe tarefas que não pode realizar. Considerando mais
atentamente as coisas, veremos sempre que a tarefa surge lá ♦ SOCIEDADE ESCLAVAGISTA
onde as condições materiais de sua realização já se formaram, ♦ SOCIEDADE FEUDAL
ou estão em vias de se criar. Reduzidos a suas grandes linhas, os ♦ SOCIEDADE CAPITALISTA
modos de produção asiático, antigo, feudal e burguês moderno
aparecem como épocas progressivas da formação econômica da ♦ SOCIEDADE SOCIALISTA
sociedade. As relações de produção burguesas são a última
forma antagônica do processo social da produção. Não se trata
aqui de um antagonismo individual: nós o entendemos antes
como o produto das condições sociais da existência dos
indivíduos: mas as forças produtivas que se desenvolvem no
seio da sociedade burguesa criam ao mesmo tempo as condições
materiais próprias para resolver esse antagonismo. Com esse
sistema social, encerra-se portanto a pré-história da sociedade
humana.
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1. A luta entre os idealistas pós-Hegel é, segundo os próprios, uma “revolução” mais importante do que a
Revolução Francesa e, apesar de curta (1842 a 1845), forma e faz desaparecer “heróis” e “impérios”,
embora tudo isso tenha “ocorrido nos domínios do pensamento puro”. Isto é, “O mundo exterior profano,
naturalmente, nada soube disso, pois esse acontecimento que abalou o mundo não se desenrolou no fundo
senão no processo de decomposição do espírito humano”.
2. “Os industriais da filosofia, que até então haviam vivido da exploração do espírito absoluto, lançaram-se
a novas combinações.” e, por força de exaustão do mercado, os negócios começam a se deteriorar e
iniciaram-se os processos de adulteração do produto. Esta concorrência é apresentada como uma
revolução histórico-mundial.
3. A crítica alemã não consegue ultrapassar Hegel e se mantém no terreno da Filosofia. As respostas
alcançadas se encontram cheias de mistificação porque as questões propostas já o estavam. A
dependência do sistema de pensamento hegeliano é a razão pela qual nenhum dos críticos faz mais do que
isolar um aspecto do sistema, para daí produzir críticas contra o sistema inteiro. Mesmo as categorias de
pensamento mais puras de Hegel (substância e autoconsciência) são profanadas com a mistificação de
nomes como O Homem, o Único, o Gênero, etc.
4. Todos os críticos se limitam à crítica das representações religiosas. A consciência humana é transformada
em uma consciência religiosa, cultuadora de uma relação dominante eminentemente religiosa: o culto ao
Estado, o culto do Direito, o culto da Filosofia, etc. Entretanto, a crítica dos jovens hegelianos (neo-
hegelianos), assim como todo o sistema “idealista” do qual Hegel é paradigma, está completamente
despegado da realidade, do mundo real, do homem real. A nenhum desses filósofos ocorreu perguntar
qual era a conexão entre a filosofia alemã e a realidade alemã, a conexão entre sua crítica e seu próprio
meio material.
5. Os pressupostos da crítica marxista são pressupostos reais. São indivíduos reais, suas ações e suas
condições materiais de vida, tanto as herdadas como as produzidas por suas ações. Desta forma, são
pressupostos não dogmáticos e verificáveis pela experiência, pela prática.
6. O primeiro pressuposto diz respeito ao modo de vida: Os homens se distinguem dos animais não pelo ato
de pensar, mas porque produzem seus meios de vida. Deve-se, pois, partir da organização corporal dos
indivíduos e da sua relação dada com o resto da natureza. Toda a historiografia deve partir dos
fundamentos naturais e de sua modificação, no curso da história, pela ação do homem.
7. O modo pelo qual os homens produzem seus meios de vida depende, antes de tudo, da natureza dos meios
de vida já encontrados e que têm que reproduzir. Não se deve considerar tal modo de produção de um
único ponto de vista, a saber: a reprodução da existência física dos indivíduos.
8. O que os indivíduos são coincide, portanto, com sua produção, tanto com o que produzem, como com o
modo como produzem. O que os indivíduos são, portanto, depende das condições materiais de sua
produção. Tal como manifestam suas vidas, assim eles são.
9. A produção aparece inicialmente como aumento da população. Um intercâmbio entre os indivíduos que é
determinado pela produção. Do mesmo modo como as relações entre as nações dependem do estado de
desenvolvimento em que se encontra cada uma delas, as r relações entre os indivíduos depende do que
concerne às forças produtivas, à divisão do trabalho e ao intercâmbio interno e externo.
10.O grau de desenvolvimento de uma nação é demonstrado pelo desenvolvimento de suas forças
produtivas, que, por sua vez, é relacionado ao grau de desenvolvimento atingido pela divisão do trabalho
(e dos bens resultantes do mesmo) entre os membros da mesma. Entretanto, não se trata unicamente de
uma extensão quantitativa de forças produtivas, cada nova força produtiva traz como conseqüência um
novo desenvolvimento da divisão do trabalho.
11.A divisão de trabalho no interior de uma nação se dá, inicialmente, entre o trabalho do campo (agrícola) e
o trabalho da cidade (industrial e comercial), levando a uma separação entre os indivíduos da cidade e do
campo, que opõem seus interesses. Ao mesmo tempo, ocorre uma divisão entre os indivíduos dentro dos
diferentes ramos de trabalho, comercial e industrial. As divisões de trabalho entre esses indivíduos
determinam as posições deles em relação aos outros e esta é condicionada através do modo pelo qual se
exerce o trabalho agrícola, industrial e comercial (patriarcalismo, escravidão, estamentos e classes). Com
estas mesmas condições se desenvolvem as relações entre as nações.
12.As diversas fases de desenvolvimento da divisão do trabalho representam as formas de propriedade
existentes; cada nova forma de divisão do trabalho determina as relações dos indivíduos entre si, no que
se refere ao material, ao instrumento e ao produto do seu trabalho.
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13.A primeira forma de propriedade é a propriedade tribal que corresponde a uma fase não desenvolvida da
produção. Os indivíduos se alimentam de caça, pesca, da criação de gado e, no máximo , de uma pequena
agricultura. A propriedade é tribal e pressupõe uma grande quantidade de terra inculta para a divisão
natural no seio da família ou tribo. A estrutura social limita-se a uma extensão da família: os chefes
patriarcas da tribo, abaixo deles os membros da tribo e, finalmente, os escravos. A escravidão latente
desenvolve-se paulatinamente com o crescimento da população e das necessidades e também com o
aumento do intercâmbio externo, tanto na guerra como na troca.
14. A Segunda forma de propriedade é a propriedade comunal e estatal da Antigüidade, oriunda da reunião de
muitas tribos em torno de uma cidade, seja por contato e troca, seja por conquista, e na qual subsiste a
escravidão. Ao lado da propriedade comunal, desenvolve-se a propriedade móvel e mais tarde a imóvel,
embora ainda subordinada à propriedade comunal. Os cidadãos possuem poder sobre seus escravos
trabalhadores apenas na sua coletividade. (escravos coletivos) estrutura social baseada nesta propriedade
coletiva tende a desaparecer com o desenvolvimento da propriedade privada, e com ela o poder do povo.
Inicia-se uma divisão do trabalho mais desenvolvida e encontra-se uma oposição entre a cidade e o
campo. Mais tarde, desenvolve-se uma oposição entre estados com interesses rurais e os com interesses
das cidades. No interior das próprias cidades começa a se desenvolver a oposição entre o comércio
externo (marítimo) e a indústria. Completa-se o desenvolvimento das relações de classe entre cidadãos e
escravos. Há também o desenvolvimento de uma oposição entre patrícios (possuidores de terras e donos
do poder) e os plebeus, que ocupavam uma posição entre livres e escravos.
15. A terceira forma é a propriedade feudal ou estamental. Enquanto a Antigüidade partia da cidade e de seu
pequeno território, a Idade Média partia do campo. A população dispersa, disseminada por uma vasta
superfície, condicionou essa mudança de ponto de partida. As condições preexistentes e o modo de
organização das conquistas desenvolvem, sob a influência da organização militar conquistadora, a
propriedade feudal. Não há mais escravos e sim servos de gleba aos quais se obrigam tributos e que são a
base da produção. A estrutura de poder era uma associação contra a classe que produzia, variando apenas
a forma de associação e a relação (melhor ou pior) com os produtores diretos. Nas cidades, esta estrutura
feudal de posse de terras tem seu equivalente na estrutura feudal de organização dos ofícios, uma vez que
aqui a propriedade consistia unicamente no trabalho de cada indivíduo. A necessidade de proteção contra
a nobreza que rapinava, a necessidade de locais de troca comuns e a concorrência crescente dos servos
que se evadiam para as cidades deram origem às corporações de ofício. O número de artesãos
(industriais) vai se manter estável pelo controle das condições de oficiais e aprendizes, formando uma
hierarquia. Assim, na época feudal, a propriedade se constituía, de um lado, pela propriedade rural
mantida pelo trabalho dos servos de gleba e, por outro, no trabalho próprio de artesão que, com pequeno
capital e associações, controlavam o trabalho de oficiais e aprendizes.
16.Cada país trazia em si a oposição entre a cidade e o campo; a estrutura estamental estabeleceu-se
profundamente e fixa-se a divisão entre príncipes, nobres, clero e campesinato, no campo; e mestres,
oficiais, aprendizes e uma emergente plebe de trabalhadores assalariados ocasionais, nas cidades. A
reunião de grandes territórios em reinos feudais foi uma necessidade, tanto para a nobreza rural como
para as cidades. Por conseguinte, a organização da classe dominante (a nobreza) vai ser sempre chefiada
por um monarca, Juiz supremo indicado pela religiosidade do povo (via tradição cultural ou imposição de
dogmas religiosos).
17.O fato é que indivíduos determinados, que como produtores atuam de um modo determinado,
estabelecem entre si relações sociais e políticas determinadas. É preciso que uma observação empírica
coloque necessariamente em relevo a conexão entre a estrutura social e política e a produção. A estrutura
social e o Estado nascem do processo de vida de indivíduos, mas não de indivíduos como podem aparecer
na imaginação própria ou alheia e sim como realmente eles o são, isto é, tal como atuam e produzem suas
vidas, sob determinados limites, pressupostos e independente de suas vontades. A produção de idéias, de
representações, da consciência está, deste modo, entrelaçada com a atividade material e com o
intercâmbio material dos homens. A consciência jamais pode ser outra coisa do que o ser consciente, e o
ser dos homens é o seu processo de vida real.
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18. Totalmente ao contrário do que acontece na filosofia alemã, que desce do céu à terra, aqui se ascende da
terra ao céu. Não se parte do homem pensado, imaginado para chegar ao homem de carne e osso, parte-se
do homem real e de seus processos de vida para expor também seu desenvolvimento dos reflexos
ideológicos e dos ecos desse processo de vida. A moral, a religião e qualquer outra ideologia, assim como
as formas de consciência que a elas correspondem não têm autonomia. Não têm história, nem
desenvolvimento como os homens reais. Não é a consciência que determina a vida, mas a vida é que
determina a consciência.

19. HISTÓRIA: 1) Os homens devem estar em condições de viver para poderem fazer história. O primeiro
ato histórico é a produção de meios que permitam a satisfação das necessidades, a produção da própria
vida material. 2) A ação de satisfazer a primeira necessidade e o instrumento de satisfação conduzem a
novas necessidades. A produção das novas necessidades é o primeiro ato histórico. 3) Os homens, que
diariamente renovam sua vida, começam a criar outros homens, isto é, a procriar, formando a relação
entre homem e mulher, pais e filhos: a família. Esta família (que de início é a única relação social e que
depois se torna uma relação secundária) deve ser tratada segundo os dados empíricos existentes e não
segundo um conceito dogmático de “família”. Além do mais, estes três aspectos da atividade social
devem ser considerados como três momentos que coexistem desde os primórdio da história e que ainda se
fazem valer.
20.A produção da vida aparece como dupla relação: a relação natural e a relação social. Social no sentido
que se entende por isto as várias formas de oposição e cooperação dos indivíduos, qualquer que sejam as
condições, o modo e a finalidade. Há então uma ligação entre um determinado modo de produção e uma
determinada fase de relações sociais e que este determinado modo de produção é, em si mesmo, uma
força produtiva que condiciona o estado social e deve ser estudada e elaborada em conexão da história da
humanidade com a história da indústria e das trocas, a história dos meios de produção material.

DESDE O INÍCIO MOSTRA-SE, PORTANTO, UMA CONEXÃO MATERIALISTA DOS HOMENS


ENTRE SI, CONDICIONADA PELAS NECESSIDADES E PELO MODO DE PRODUÇÃO, CONEXÃO
ESTA QUE É TÃO ANTIGA QUANTO OS PRÓPRIOS HOMENS – E QUE TOMA,
INCESSANTEMENTE, NOVAS FORMAS E APRESENTA, PORTANTO, UMA “HISTÓRIA”, SEM
QUE EXISTA QUALQUER ABSURDO POLÍTICO OU RELIGIOSO QUE TAMBÉM MANTENHA OS
HOMENS UNIDOS.

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