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Docente: Dra. Ana Carla Tinoco
Discente: Maria Inês Silva
Modulo: Metodologias Cognitivo Comportamentais
Especialização em Clínica e Saúde - UIFF
Maria Inês Silva

História Clínica

DIAGNÓSTICO

FOBIA SOCIAL,
GENERALIZADA

TERAPEUTA
DR.ª ANA CARLA TINOCO

CO – TERAPEUTAS - ALUNOS
ANA ROMINA JACOB
SOFIA VASCONCELOS
ANA PEDROSO DE LIMA
MARIA INÊS SILVA
FERNANDO LOPES
(ANA MIGUEL)

INÍCIO DA PSICOTERAPIA
2005???

COM A CO-EQUIPA ACTUAL


12.07.08

CONSULTAS SEGUIDAS
?
FASE ACTUAL DA PSICOTERAPIA
SEGUIMENTO?

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Maria Inês Silva

DADOS BIOGRÁFICOS

Nome: Hugo Sampaio


Sexo: Masculino
Idade: 26 anos
Estado Civil: solteiro
Habilitações Literárias: 12º ano de escolaridade completo, desistiu do curso de electrotecnia
Profissão/ Ocupação: Desempregado – procura trabalho
Agregado Familiar: Vive sozinho desde o falecimento da avó
Residência e Naturalidade: Coimbra

MOTIVO DA CONSULTA

O Hugo dirigiu-se à consulta de Psicologia por após ter sido encaminhado pela sua médica de
família (que consultou por ter algo semelhante a “ansiedade” e apenas a consultou porque não
conseguia dormir. A médica de família encaminho-o para a psicóloga, pois caso não fosse, não
lhe daria mais comprimidos para dormir).
Toma medicamentos para dormir (têm impacto na primeira meia hora).
O Hugo descobriu que o problema que tinha se chamava crise de pânico na consulta do HUC.

DIFICULDADES ACTUAIS

Hugo apresentou-se à consulta com vestuário adequado à idade, nervoso, ansioso, um pouco
tímido e sem acompanhantes.

O doente adoptou uma postura um pouco retraída e tensa, mantendo-se cabisbaixo e com as
mãos entre as pernas. Num tom de voz muito baixo limitou-se a responder às perguntas que
lhe foram colocadas e raramente estabeleceu contacto visual com a equipa terapêutica, e o
seu discurso tem pausas frequentes o que o baralha.

O doente tinha uma motivação baixa para a terapia, e uma expectativa negativa acerca sobre
ela, afirmando ser até humilhante.

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Quando se perguntou ao Hugo o como eram esses ataques de pânico, ele explicou que o que
sentia era má disposição, cansaço, o aceleramento do ritmo cardíaco e desmaios (referindo
que, durante o período que frequentava a universidade acontecia quase todos os dias e com a
duração de cerca de uma hora).
A margem entre o primeiro e o segundo ataque foi de duas semanas (quando começaram as
aulas), descrevendo que numa sala de aula, a fazer um exame, tinha muito receio de ter um
ataque.

As estratégias que o Hugo utilizava quando começava a sentir o ataque, eram: o isolamento, o
deixar de comer, deixar de ir a convívios.

Hugo deixou de comer para não ficar mal disposto, tendo-se tornado uma pessoa habituada a
fugir às situações novas. A falta de controlo das situações causa-lhe muita ansiedade.

Estas crises acontece desde os 7/8 anos de idade sempre que presente a situações novas
(com medo de ter uma crise). Antes do inicio das crises de pânico o Hugo descreve-se como
sendo super extrovertido.

O Hugo fez o ensino básico em Anadia e que ele detestava pois não se dava bem com os
colegas, segundo este eles “tinham uma maneira de pensar diferente”.

A ansiedade começou por ocorrer na mudança de escola, e a pressão, provoca a má


disposição, e consequentemente sofre os ataques de pânico.
“Se o problema desaparecesse, passaria a ter uma vida social”. Tem medo da relação com os
outros, é inseguro e tem vergonha do que os outros possam estar a pensar dele.

O dia-a-dia do Hugo passa-se a maior parte do dia na cama para combater o cansaço e
também porque ao não comer não consegue ter forças (não tem uma alimentação correcta, por
inibição de crises). Tem dormido mal e tem muita dificuldade em adormecer.

Relativamente à interferência nas várias áreas de vida, o Hugo classifica de (0-10 ):


Família - 2
Amigos / Vida Social – 10 (Sem afecto, causando-lhe ansiedade)
Profissão - 7
Passatempos - 5
Actividade em Geral – 3

Sobre o impacto da fobia social, na perspectiva familiar, o Hugo refere que as irmãs e o pai não
mantinham uma boa relação e inclusive não sabem do problema dele, como ninguém sabe.

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Relativamente à opinião dos outros, sente-se perturbado, mas habitualmente confia nas
pessoas. O Hugo tem uma visão negativa de si próprio, humilhante, é pouco confiante em si
próprio e tem dificuldade em estabelecer uma relação.

Uma das últimas crises teria ocorrido à 2/3 semanas, numa altura em que se sentia bastante
pressionado/chantageado em casa de um amigo, mas notou-se que não queria falar sobre
isso, pois afirmou existirem algumas conotações ilegais envolvidas.

Outro episódio foi uma passagem de ano na Figueira da Foz na discoteca “Psidónio”, onde se
sentiu “deitado a baixo” pelos amigos mais próximos, inferiorizado (especifico a uma pessoa
amiga que ele vê como seu ídolo). E nesse dia tinha comido um doce (pastel) e com isso terá
ficado mal disposto, e consequentemente, terá tido uma crise, e os amigos não ajudaram, não
por lhe terem feito algum mal, mas porque o Hugo se sente inferior a todos eles, inclusive,
afirma que estando com eles faz que com se sinta mais triste, pois ele é muito mais feio.

A comida leva-o a pensar em coisas negativas “se eu como sinto me mal disposto”. (explicou
que neste dia de avaliação, não comeu, para não ter nenhuma crise).
A distracção no carro controla a ocorrência das crises de pânico, e direcciona os sentimentos.

O doente respondendo ao que mais gosta de fazer, responde que, gosta de viajar, de conduzir,
de fazer desporto (mas este especificamente, é caro de sustentar), e de ir à praia.

Relativamente às actividades que consegue realizar bem, O Hugo afirma que faz muitas coisas
bem, mas que não lhe dão prazer, nomeadamente, as lides domésticas e o trabalho (tem medo
de não ter estratégias de “combate às crises” em horário laboral).

Os objectivos do doente em relação à consulta psicológica baseiam-se em minimizar as crises


de pânico e os seus impactos (uma vez que, deixando de ter crises de pânico, teria uma
melhor qualidade de vida). No entanto encara a vinda à consulta como um acto de humilhação
ao expor-se, sempre achando que vai ser julgado pela terapeuta, sugerindo que existisse a
possibilidade de fazer um juízo menos profissional e mais pessoal, sempre a colocar-se numa
situação inferior, justiçando que tem tempo demasiado para pensar em todas estas
possibilidades. Esta situação deixa-o demasiado nervoso, pois não sabe o que irá acontecer
depois, mas sabe que será alguma coisa…

Neste dia da avaliação, estava tranquilo, mas não comeu para prevenção. No entanto, está a
sentir-se bem, a gostar os “avaliadores”, pois afirma serem simpáticos, caso contrário, iria
sentir-me muito mais inseguro. No entanto, afirma que NÃO confia em nós, assim como nas
pessoas no geral.

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Daqui a cinco anos o paciente imagina-se com: o curso acabado, a não existência de
relacionamentos positivos, mas vê uma melhoria na qualidade de vida, muito embora não muito
significativa.

Os três desejos do Hugo são: o de dizer adeus às crises de pânico, o aumento da vida social, e
ganhar o euro milhões com jackpot.

Em resumo, é possível perceber as situações sociais ou de desempenho são as que mais


teme.

INÍCIO E DESENVOLVIMENTO DAS DIFICULDADES

A primeira vez que teve um ataque foi na figueira, e sentia-se muito ansioso, com vómitos,
vinda de carro com um amigo e a sua mãe, e o que provocou o primeiro ataque foi a ansiedade
do inicio do novo ano lectivo.

Nas duas semanas antes do recomeço das aulas sentia-se mal, mas depois de começarem,
era uma constante diária. Sabia que havia qualquer coisa, mas não o quê, e foi ao médico para
pedir alguma coisa que o fizesse dormir.

No 7º ano tinha crises, pois não se adaptava á nova escola (Anadia) pois os colegas eram
muito diferentes dele, e regressar a Coimbra seria melhor. Durante o ensino secundário, já em
Coimbra, no 10º ano o Hugo afirma que as crises foram mais intensas, no 11º ano reduziram,
mas voltaram a ser muito intensas no 12º ano, confessa serem crises por antecipação.

Na faculdade voltou tudo á estaca 0, especialmente nos exames isto porque “nos exames não
podia sair”. A pior coisa que podia acontecer para ele, era as pessoas notarem o que se estava
a passar, e não tanto a opinião delas.

O doente sente-se desconfortável e ameaçado em situações especificas, e as crises


acontecem com mais frequência ao pé das pessoas com quem mais se importa… “Aquelas
pessoas das quais não gosto não lhes dou importância”.

A memória mais antiga de situação de humilhação e vergonha foi a primeira consulta (presença
de estagiárias giras) - “Nunca me senti bem comigo próprio, com a minha aparência” (isto
desde a adolescência).

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Hugo faz pequenas coisas para que as pessoas tenham uma má imagem dele no inicio e
depois com o passar do tempo essa imagem é melhorada, notando-se aqui a necessidade de
aceitação pelos outros. Ou seja, a sua auto-apresentação é propositadamente negativa “se
eles me aceitam assim nada pior os afectará”. “Prefiro que pensem mal de mim no inicio e que
depois venham a mudar/alterar a opinião”. Revela a sua falta de confiança em si próprio.

Então, além de deixar de comer, de se isolar e evitar convívios, de vez em quando passa por
homossexual para ser mais facilmente aceite no seio de um grupo de amigos.

O Hugo alimentava-se praticamente só com bananas por serem energéticas e porque não
davam a sensação de estômago cheio.

O sítio que lhe dava mais segurança era a casa.

HISTÓRIA DESENVOLVIMENTAL E DAS APRENDIZAGENS PRÉVIAS

O Hugo é fruto de uma gravidez e parto normal. É o filho mais velho, teve um desenvolvimento
normal, no entanto, com problemas comunicacionais no seio familiar, que começaram a pela
primeira vez por volta dos 12/13 anos.

O pai passava muito na caça e na pesca, e quando era preciso dinheiro não havia. Por isso, o
Hugo assumiu a gestão da casa. Define o pai como: agressivo; intolerante; teimoso; e egoísta.

O doente não consegue definir a mãe justificando que não consegue aceitar carinho e afectos
de outros, nem mesmo, naquela altura da mãe, faleceu no 1º ano de Faculdade do Hugo, com
cancro.

As irmãs, o paciente defini-as por preguiçosas e cobardes.

A avó, já se refere a ela com mais carinho (menos desprezo), pois era ela quem lhe dava mais
atenção e até fazia mais sacrifícios por ele.

O Hugo identifica-se com a avó, diz que as irmãs são parecidas com o pai, e afirma que na
família havia um tratamento diferenciado, as irmãs não eram castigadas, pois eram raparigas
(isto era a desculpa que o pai utilizava).

Não tem ligação nenhuma com o pai pois têm opiniões muito divergentes. A família nunca
soube dos ataques de pânico, porque quando se sentia mal isolava-se.

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O paciente frequentou o infantário e as suas relações sempre foram boas.


Hugo afirma que teve uma Adolescência “passiva” – “era um banana”.

O Hugo não trabalha, mas trabalhou numa loja de electrodomésticos, no entanto não gostava
do que fazia nem do sítio, vive sozinho, sustenta-se com rendas de quartos da sua casa, e de
um hobby que não quis revelar (demonstra algum tabu, por questões ilegais).

O Hugo sente-se muito mais ansioso perante mulheres do que de homens.


A primeira namorada do Hugo foi aos 20 anos. Confessou terem existido umas “curtes” sem
importância antes desta. “Eu era muito Banana” – demonstra sentimentos frios em relação ao
primeiro beijo aos 12 anos.
Assume que não consegue assumir relações íntimas porque: “ não sei o que falar com elas”.
O Hugo utiliza «máscaras» com determinadas pessoas (por exemplo, o relacionar-se com
alguém, para ajudar um “amigo” a conseguir o que pretende da pessoa em causa, ou seja,
quase que se presta a “mediador” de uma futura relação, onde ele não está envolvido).
A primeira relação sexual foi aos 19 anos e não foi capaz de a descrever. (chegando a chorar
ao abordar esta questão).
O Hugo rejeita as relações íntimas pois não tem à vontade com mulheres, excepto se for para
fazer algum favor a um “amigo”, e aí já não é ele, já é ele, mas para outro.

O Hugo auto define-se como: vingativo (não gosta que o tratem mal e que o pisem);
persistente; divertido; orgulhoso; teimoso; ciumento; sensível; inseguro…
(O Paciente teve muita dificuldade em se definir).
Quando sente vontade de vingança, não se sente inferior, assumindo que: “Não gosto de ceder
pois é um sintoma de inferioridade”.

Com o aparecimento das crises de pânico, o paciente confessa: “Perdi parte da minha vida”.
Relativamente ao se auto-conceito: acha-se desadequado em determinadas situações; acham
se os outros pensam que ele é um sacana; relativamente ao que sente sobre a opinião dos
outros a ele, o Hugo diz sentir vergonha e introversão.

A avaliação termina com a seguinte pergunta: Como gostaria de ser? O Hugo responde, “sem
ataques de Pânico, mas acho que poderiam gostar de mim como sou”.
Hugo demonstra-se nostálgico.

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FORMULAÇÃO COGNITIVO-COMPORTAMENTAL

Perante a informação recolhida e segundo os critérios do DSM-IV podemos afirmar que


estamos na presença de uma Fobia Social, Generalizada.
Sobre o diagnóstico de Fobia Social, devido ao seu medo acentuado e persistente de várias
situações sociais e de desempenho (relacionadas não somente com o seu comportamento
isolativo) nas quais está exposto a pessoas desconhecidas ou à possível observação de outras
principalmente se forem conhecidas, temendo entrar em crise (ou mostrar sinais de ansiedade)
de modo humilhante ou embaraçador (critério A). Quando exposto a uma situação social
temida sente quase sempre ansiedade elevada (critério B – Ex.: “o coração bate mais
depressa”; “fico a suar das mãos”) e reconhece que o medo é excessivo ou irracional (critério
C). As situações fóbicas são evitadas ou enfrentadas com intensa ansiedade ou mal-estar
(critério D). O evitamento, antecipação ansiosa ou mal-estar nas situações sociais ou de
desempenho interferem significativamente com as suas rotinas normais, funcionamento
académico, relacionamentos ou actividades sociais ou mal-estar acentuado por ter a fobia
(critério E ).
Consideramos o subtipo Generalizada, pois o Hugo receia sentir-se humilhado e avaliado
negativamente num amplo espectro de situações de interacção social (ir às aulas, falar e
conviver num grupo de conhecidos, sair à noite) e de desempenho (realizar exames sem entrar
em crise).

Para a compreensão deste caso, saliento a existência de múltiplos factores e a sua interacção
na etiologia da fobia social do paciente.

Apesar da escassa informação relativamente à história de desenvolvimento e das


aprendizagens do Hugo, parecem existir alguns factores predisponentes que tornaram o
paciente vulnerável à criação de determinado tipo de crenças.

A dinâmica familiar à qual o paciente foi exposto na sua infância parece não ter facilitado o
desenvolvimento de uma identidade estável, de autonomia e de sentimentos de auto-eficácia.

Ao nível das suas relações interpessoais isto ter-se-á traduzido no estabelecimento de ligações
de dependência com os outros e na sua conformidade e submissão excessivas, de forma a
prevenir a desaprovação e rejeição.

Concluo então que no âmbito destas relações o doente terá tido experiências significativas de
humilhação (por exemplo no contacto com os seus amigos “ídolos” e, principalmente, no
relacionamento com pessoas do sexo oposto) que terão acentuado a sua vivência de
inferioridade e perpetuado um sentimento de defeito físico, intelectual, social e afectivo.

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Deste modo ter-se-ão formado crenças nucleares do tipo “sou incapaz”, “sou fraco”, “sou
inferior”, “sou burro”, “sou um banana”, “não tenho valor”, “sou feio”, “sou vingativo”, “sou
desintegrado”, às quais se associam determinadas crenças condicionais como: “se eu fizer o
que devo vou falhar”, “se me mostrar como sou as outras pessoas vão-me rejeitar” e “se as
outras pessoas me aprovarem, então eu tenho valor”. Destas crenças parecem derivar regras
do tipo: “não posso mostrar o que sinto”, “tenho que fingir ser algo que não sou” etc.

Este perfil cognitivo, aliado a uma constelação de aspectos (variáveis individuais, socioculturais
relacionadas com a importância do aspecto físico como inferência de valor e eficácia pessoal
em comparação com os amigos, e acontecimentos geradores de afecto negativo), faz reunir as
condições para que, num determinado momento da sua vida, o Hugo visse no isolamento a
solução para não voltar a sentir-se humilhado e que controlava alguma coisa na sua vida.

A Fobia Social, tem interacção de vários factores.


Hipotetizo que características temperamentais de inibição comportamental existentes no
doente terão sido acentuadas por um conjunto de experiências de vida (geradoras de
ansiedade e desconforto) e de outros factores familiares e ambientais.

Em termos familiares novamente parece-me ser importante o facto de o Hugo ter tido a
necessidade de assumir a gestão da casa e do dinheiro, o que não terá fomentado a
socialização dele com os outros (a sua vida social era restrita ao ambiente familiar, que por
sinal era mau). Na medida em que esta família não parece ter favorecido a regulação do
comportamento do Hugo na manutenção da ligação aos outros (até porque era ele que tinha
que assumir todas as lides domesticas), poderá desta forma ter contribuído para experiências
de isolamento do doente e para o desenvolvimento de um padrão passivo e não assertivo de
relacionamento interpessoal.

Por outro lado parece ter ficado claro um padrão comportamental na família onde sobressai a
inibição e poderá sobressair a timidez (por exemplo o pai é descrito como um homem “de
poucas falas”, distante e pouco afectuoso), o que sugere a possibilidade de ter havido no Hugo
algum tipo de aprendizagem por modelamento na forma de lidar com as situações sociais (na
caça e na pesca, não existe interacção social).

O desempenho do doente no papel de agente responsável pela gestão de uma casa, de uma
família, contribuiu para uma vivência de fracasso e poderá ter fomentado a magnificação das
consequências deste fracasso, gerando simultaneamente uma enorme insegurança no Hugo
acerca das suas competências e o receio de falhar ou de se continuar a comportar de uma
forma ridícula/ incompetente.
Na medida em que o Hugo pode ter passado a duvidar da sua capacidade de transmitir uma
impressão favorável de si aos outros, por manter uma visão de si socialmente desvalorizada

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socialmente (ineficaz, incompetente, diferente, desinteressante e desintegrada), aparecem as


crises, os ataques de pânico e assim, as situações sociais poderão então ter-se tornado
altamente ameaçadoras para o doente, dada a sua hipersensibilidade à avaliação dos outros e
a hipervigilância cognitiva à rejeição (anteriormente explicadas e advindas principalmente das
suas crenças de defeito). Neste sentido acho que o isolamento social do Hugo contribuiu para
a ausência de reforço social, o que por sua vez poderá ter reforçado o evitamento social e
acentuado o medo de avaliação negativa dos outros (possivelmente percebidos como críticos)
bem como as suas dificuldades interpessoais.

PROPOSTAS E ESTRATÉGIAS TERAPÊUTICAS

A. Estabelecimento de uma relação terapêutica empática e colaborativa, baseada na


aceitação, confiança, honestidade e respeito.

B. Avaliação Cognitivo-Comportamental.

- Recolha de informação relativa a:


o Comportamentos compensatórios inapropriados;
o Dados psicológicos, interpessoais e familiares.
o Identificação de pensamentos automáticos negativos (antes, durante e
depois da situação social);
o Sintomas fisiológicos e cognitivos de ansiedade;
o Existência de comportamentos de segurança;
o Conteúdos relativos ao processamento do Eu como um objecto social.

- Realização da prova da realidade

C. Socialização com o Modelo Cognitivo-Comportamental idiossincrático da Fobia


Social do doente.

D. Promoção do auto-conceito e da auto-estima: planear com o doente actividades


que proporcionem sensação de bem-estar; elaboração de um projecto de vida,
através da definição de objectivos a curto e longo prazo.

E. Eliminação dos comportamentos de segurança.


- Construção de situações de experiência comportamental e/ou dramatização
comportamental, que permitam ao doente testar este efeito e tirar as suas

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conclusões (comparando os efeitos da utilização e não utilização dos


comportamentos de segurança habituais – ex.: evitar o contacto visual, adoptar
uma postura retraída e passiva - nos níveis de ansiedade, visibilidade dos
sintomas, impressão que pensa ter provocado nos interlocutores e eficácia
geral do desempenho geral);
- Estratégias paradoxais (intensificar a utilização de comportamentos de
segurança e concluir acerca dos seus resultados);
- Incentivo à eliminação dos comportamentos de segurança nas situações
sociais.

F. Estratégias para a mudança do foco de atenção.


- Discussão do papel do auto-focus na manutenção e agravamento do
isolamento (impeditivo do processamento do feedback interpessoal e da
desconfirmação da expectativa de avaliação negativa pelos outros);
- Treino da focagem da atenção em factores externos da situação e de
processamento do feedback interpessoal.

G. Reatribuição das auto-avaliações negativas e reestruturação de pensamentos


acerca das avaliações e reacções negativas dos outros.
- Implementação de técnicas de reatribuição verbal: identificação e modificação
dos pensamentos automáticos negativos; identificação e correcção de erros no
processamento de informação; ajuda para a obtenção de pensamentos
racionais alternativos.
- Implementação de estratégias comportamentais: exposição, estratégias
paradoxais, elaboração de inquéritos.

H. Terminar com a autópsia das interacções sociais.


- Discussão do racional do papel desta na manutenção e agravamento da
fobia;
- Incentivo à sua eliminação.

I. Modificação do auto-esquema e das suposições condicionais.

- Implementação e estratégias cognitivas para a modificação de crenças


condicionais e incondicionais (questionamento dos dados que apoiam as
crenças do doente e reunião de evidências que as desconfirmam; identificação
e correcção do processamento enviezado; formulação de informação
alternativa; desafio das crenças através de predições e experiências
desconfirmatórias).

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J. Desenvolvimento e fomentação de comportamentos de cooperação e de


expressão emocional positiva que tendam a evocar respostas de aceitação e
reforço social nos outros (ex.: participação em grupos culturais, desportivos ou de
ajuda social).

K. Manutenção e generalização dos ganhos terapêuticos e prevenção de recaídas.

- Avaliação das possíveis dificuldades que possam surgir após o final da


terapia, identificando os obstáculos à manutenção dos ganhos adquiridos, e os
modos aprendidos de os enfrentar.

"O começo é a parte mais difícil do trabalho"

Platão

BIBLIOGRAFIA:

DSM-IV — Diagnostic and statistical manual for mental disorders. (4ª Ed.). Washington:
American Psychiatric Association.

Apontamentos da docente/terapeuta (aulas).

Anotações de TODOS os Co-Terapeutas – ALUNOS.

(Uma vez que a entrevista de avaliação, e recolha de dados foi em grupo, e partilha a de todos
esses dados pelo grupo, foi indicação da docente, conclui-se que o resultado e a conclusão
da história clínica é a mesma para todos os que “intervieram” e “conheceram” o Hugo).

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