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Rogério Nagamine Costanzi RSP

As novas formas de
exploração do trabalho no
capitalismo contemporâneo
e as políticas públicas de
combate à desigualdade
Rogério Nagamine Costanzi

“Há certos tipos de relações sociais e de contradições sociais, determinado


tipo de desigualdade que outrora se perpetuava no imobilismo, que agora se
reproduzem em e através do crescimento. Tal constatação exige outra perspec-
tiva acerca do crescimento. Não diremos como os mais eufóricos: ‘O cresci-
mento produz abundância e, portanto, igualdade’; também não aceitamos a
visão inversa extrema: ‘O crescimento é causa da desigualdade’. Invertendo o
falso problema – diremos que o crescimento em si é função da desigualdade. A neces-
sidade que a ordem social ‘desigualitária’ e a estrutura social de privilégio têm
de se manter é que produz e reproduz o crescimento como seu elemento
estratégico. Por outras palavras, a autonomia interna do crescimento
(tecnológico, econômico) é fraca e posterior em relação à determinada pela
estrutura social.”
(BAUDRILLARD, Jean. A sociedade de consumo, p. 52.)

Introdução

O capitalismo passou por profundas alterações desde o seu prelúdio, quando


Karl Marx (1818-1883) analisou-o em sua obra O capital. Atualmente, não existe
mais dualidade tão clara entre capitalistas, de um lado, e a massa homogênea
de operários, de outro, como havia em seu início. Os trabalhadores formam,
presentemente, um grupo heterogêneo. Houve, ademais, separação entre

propriedade e controle do capital, pelo menos nas grandes corporações.

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Em vista de tais mudanças, podemos exploração do trabalho do capitalismo e


comparar o mercado de trabalho, em seu impacto sobre a desigualdade, este
especial o qualificado, a uma verdadeira artigo buscará fazer uma revisão crítica da
loteria, em que os trabalhadores competem literatura sobre a desigualdade, seguindo-
entre si por ascensão profissional. Aqui, os se as considerações finais.
investimentos em capital humano torna-
ram-se os bilhetes desta loteria. E, de forma Revisão crítica da literatura
semelhante ao que acontece em uma loteria, sobre a desigualdade
há sempre vencedores e perdedores.
O capital humano também tornou-se No arcabouço da literatura econômica
instrumento para a exploração do trabalho, tradicional2 , as causas para explicar os
à semelhança do capital físico. Os vencedo- diferenciais de salários e a desigualdade
res exploram os perdedores, com os podem ser divididas em três grandes
primeiros apropriando-se do produto do grupos:
trabalho dos últimos. Tanto o capital a) diferenças nas preferências e carac-
humano quanto o tradicional, descrito por terísticas produtivas dos trabalhadores,
Marx, em O capital, passaram a constituir sejam aquelas natas ou adquiridas por meio
instrumentos de legitimação da apropriação de investimentos em capital humano;
do trabalho alheio e da exploração. Os traba- b) segmentação, normalmente credi-
lhadores, com baixo ou sem investimento tada a alguma imperfeição de mercado;
em capital humano, assim, já estão, a priori, c) discriminação (BARROS; MENDONÇA,
excluídos da loteria em que se transfor- 1995. BID , 1998. F ERNANDES , 2002.
maram os mercados de trabalho capitalistas; FERREIRA, 2000. RAMOS ; V IEIRA, 2000.
nesse sentido, já são perdedores. RAMOS; V IEIRA, 2001).
As formas de exploração introduzidas No caso de diferenças dos atributos
pelo capital humano, ao se somarem à tradi- produtivos dos trabalhadores, o mercado
cional exploração do trabalho pelo capital, de trabalho funcionaria como revelador de
reforçaram ainda mais a tendência inerente desigualdades. Nos casos de segmentação
à geração de desigualdades pelo capita- e de discriminação, o mercado de trabalho
lismo1. Os diferenciais de salários justificados funcionaria como gerador delas. Remune-
pelo capital humano tornaram-se elementos rações distintas como forma de compensar
adicionais à dicotomia capital-trabalho para diferenças não pecuniárias entre postos de
explicar a crescente desigualdade engendrada trabalho ou como decorrência de dotações
pelo modo de produção capitalista. desiguais de qualificações serviriam para
Dentro desse conceito teórico, revelar diferenças de qualidade entre postos
também surgem importantes implicações de trabalho e trabalhadores. Contudo, ao
para as políticas públicas de combate à remunerar, de maneira distinta, indivíduos
desigualdade. Diferentemente da tradi- que possuem, em princípio, o mesmo
cional visão econômica, na qual a potencial produtivo e trabalham em postos
desigualdade é fruto das diferenças de trabalho similares, tanto via segmentação
produtivas entre os trabalhadores, surge quanto sob a forma de discriminação, o
um quadro em que ela é resultado mercado de trabalho estaria funcionando
inerente ao capitalismo. como gerador de desigualdades.
Com o intuito de analisar, de modo A diferenciação entre os dois casos
mais detalhado, essa nova forma de seria importante, pois, além de implicarem

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graus de indesejabilidade diferentes, 1995). As decisões são dinâmicas, por-


também demandam políticas de natureza que a variável relevante não é mais apenas
distinta para combatê-las. Se as principais o salário corrente dado pelo mercado, mas
causas da desigualdade fossem os diferen- também, ou mesmo principalmente, a
ciais compensatórios e aqueles decorrentes expectativa de renda futura. Os traba-
da heterogeneidade dos trabalhadores, lhadores esforçam-se de maneira intensa,
então elas não residiriam no funcionamento no início de suas carreiras, por salários
do mercado de trabalho, sendo fruto de apenas razoáveis, ou até mesmo
desigualdades preexistentes (BARROS ; pequenos, não pela irracionalidade, mas,
MENDONÇA, 1995. RAMOS; V IEIRA, 2000. sim, pela busca patológica3 de ascensão
RAMOS; V IEIRA, 2001). profissional, típica das atuais sociedades
A tradicional teoria econômica está capitalistas. As decisões individuais dos
focada, principalmente, nas diferenças trabalhadores sobre a oferta de trabalho
produtivas dos trabalhadores ou nos também se tornaram interdependentes,
distintos graus de acumulação de capital tendo em vista que a estrutura piramidal
humano para explicar os diferenciais de das organizações implica, necessariamente,
salários (BECKER, 1964). Em um mundo concorrência dos trabalhadores entre si
sem diferenças de produtividade entre os por sucesso profissional. Por sinal, essa
trabalhadores e de mercados em concor- disputa é uma das características mais
rência perfeita, não existiriam diferenciais marcantes do mercado de trabalho atual,
de salários. Nesse cenário, as decisões dos mas é negligenciada na teoria econômica
trabalhadores seriam independentes entre tradicional.
si e estáticas. Desse diagnóstico surgem importantes
Existem, todavia, profundas limitações implicações. Diante de uma situação de
nessa teoria. Esse modelo (neoclássico) é informação imperfeita a respeito do futuro,
condizente com os primórdios do capita- os trabalhadores que não tiveram sua
lismo, quando o mercado de trabalho era expectativa de ascensão profissional efeti-
mais homogêneo, com dualidade bem clara vada, até como conseqüência natural da
entre os capitalistas e a massa de operários, busca patológica de sucesso e da estrutura
homogênea, que realizavam tarefas piramidal das organizações, acabam tendo
repetitivas no processo de produção em ofertado mais trabalho do que efetivamente
série. Hoje, contudo, o mercado de traba- teria ocorrido na situação de conhecimento
lho é marcado por grande heterogenei- perfeito do futuro. Nesse caso, o excesso
dade, com agressiva competição entre os de oferta de trabalho, obviamente, deve ser
trabalhadores por ascensão profissional. absorvido pelos trabalhadores que tiveram
Essa transformação está ligada, entre ascensão profissional de acordo com o
outros fatores, à mudança de empresas esperado ou acima dele. A exploração do
familiares, de estrutura simples, a empre- trabalho não mais ocorre, exclusivamente,
sas com administração profissional, geren- pelo capital físico, mas, também, pela
ciadas por organizações complexas e de exploração dos vencedores pelos perde-
hierarquia piramidal. dores. Além do tradicional instrumento de
A atual heterogeneidade do mercado legitimação da exploração do capital físico,
de trabalho torna as decisões dos traba- o capital humano também se tornou uma
lhadores sobre a oferta de trabalho forma adicional de apropriação do trabalho
interdependentes e dinâmicas (COSTANZI , alheio.

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Nessa situação, a oferta de trabalho evidências empíricas contrárias, a literatura


seria, em algum grau, meramente uma econômica tradicional continua a justificar
loteria. Os trabalhadores ofertam trabalho, a desigualdade principalmente com base
não porque possuem certeza absoluta da no capital humano. Tanto é assim que uma
renda, mas porque esperam aumentar a visão predominante a respeito das causas
probabilidade de ganhar os prêmios da desigualdade crescente observada nas
destinados aos vencedores. Os prêmios em últimas décadas é a de que ela seria resul-
questão são a ascensão profissional e as tado de alterações ou mudanças tecno-
recompensas financeiras correspondentes. lógicas viesadas para trabalhadores
Contudo, como as organizações possuem qualificados, em detrimento dos não-quali-
estruturas piramidais, necessariamente ficados, o que teria incrementado a
haverá vencedores e perdedores nesse demanda dos primeiros em prejuízo dos
jogo, em que os primeiros apropriam-se últimos. Uma das causas para esse compor-
de parte do trabalho dos últimos. Os tamento da demanda seria a disseminação
bilhetes dessa loteria são os investimentos da tecnologia da informação, em especial
em capital humano. a revolução trazida pelos computadores.
Como citado anteriormente e de Essa teoria é conhecida como skill-biased
forma mais geral, a teoria econômica technical changes (BOUND; J OHNSON, 1992.
tradicional pode ser resumida como aquela J U H N; M URPHY ; PIERCE , 1993. K ATZ ;
que defende que o salário é determinado MURPHY, 1992. LEVY ; MURN ANE, 1992).
pela produtividade. Em um cenário em Além disso, no caso dos países em
que os trabalhadores têm a mesma desenvolvimento, o processo de abertura
produtividade, os salários seriam iguais e comercial teria levado a importação de
não existiria desigualdade entre os tecnologia complementar ao trabalho
trabalhadores. qualificado e/ou substituta do trabalho de
Caso os trabalhadores tenham dife- baixa qualificação, na chamada
renças na produtividade, o eficiente e justo skill-enhancing trade hypothesis (ARBACHE ;
mercado de trabalho capitalista apenas CORSEUIL, 2001. ROBBINS , 1996. SOARES;
traduziria tal fato para os salários. Nesse SERVO; ARBACHE, 2001).
contexto, é possível justificar os diferen- Alguns estudos empíricos também
ciais de salários e a desigualdade resultante, apontam para as diferenças nas caracte-
principalmente por conta das diferenças rísticas entre trabalhadores como o prin-
entre os trabalhadores, no tocante às suas cipal fator explicativo individual para a
características produtivas, sejam estas natas desigualdade, em especial a educacional
ou adquiridas por meio de investimentos (BARROS; M ENDONÇA, 1995. BID, 1998.
em capital humano, em especial pela FERREIRA, 2000; RAMOS ; V IEIRA, 2000.
educação. Um trabalhador pode ganhar RAMOS; VIEIRA, 2001). Contudo, como não
um milhão de vezes a mais que outro, há dados sobre a produtividade efetiva,
porque é um milhão de vezes mais esses trabalhos utilizam-se de características
produtivo. observáveis, como ocorre em educação,
Entretanto, é fato que alguns “trabalha- na forma de proxies da real produtividade,
dores” recebem remunerações, em curtos impondo sérias limitações às conclusões
períodos de tempo, que trabalhadores desses trabalhos.
médios jamais conseguirão ganhar em toda De qualquer forma, o diagnóstico da
a sua vida profissional. Mesmo com essas desigualdade como fruto de distintos

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investimentos em capital humano tem de capital humano é inerente ao sistema


importantes implicações para o direcio- econômico capitalista. O capitalismo gera
namento das políticas públicas de combate desigualdade que, por sua vez, gera
à desigualdade. Se o principal fator indi- distintas oportunidades que reproduzem
vidual para os diferenciais de rendimentos a concentração de renda de uma geração
é a desigualdade educacional, é fundamental a outra, criando uma inércia intergeracional
que a busca por mais igualdade seja feita da desigualdade. Nesse sentido, a desigual-
primordialmente pela redução dos dife- dade derivada de diferenciais educacionais
renciais educacionais. De certa forma, a não pode ser considerada justa, mas um
redução da desigualdade seria, assim, grosso resultado inerente ao próprio funciona-
modo, um problema do Ministério da mento do capitalismo.
Educação, e não um resultado inerente ao
funcionamento do mercado de trabalho
capitalista, ou ao capitalismo.
Mesmo admitindo que a teoria do
capital humano pode ser considerada um “Os trabalhadores
avanço em relação à a teoria neoclássica esforçam-se de maneira
estática em concorrência perfeita, pois
incorporou questões dinâmicas e a hetero-
intensa, no início de
geneidade dos mercados e explica, parcial- suas carreiras, por
mente, os diferenciais de salários, ela salários apenas
também apresenta limitações e vem sendo razoáveis, ou até
contestada por vários autores, inclusive
com evidências empíricas (CARD; D INARDO, mesmo pequenos, não
2002. F RANK; COOK 1996. G ALBRAITH , pela irracionalidade,
2000. SNOWER, 1999). mas, sim, pela busca
Cabe aqui destacar as seguintes críticas.
Em primeiro lugar, a visão tradicional, ao
patológica de ascensão
colocar como a principal causa para a profissional, típica das
desigualdade os diferenciais de produti- atuais sociedades
vidade, acaba por legitimá-la. A desigual- capitalistas”
dade, como fruto de diferenciais de
produtividade, não pode, de acordo com
esse ponto de vista, ser considerada injus-
tiça inerente ao capitalismo; ao contrário, Além disso, mesmo reconhecendo que
os mercados de trabalho capitalistas são diferenças nos atributos produtivos dos
justos ao recompensarem cada trabalhador trabalhadores influenciam, em algum grau,
com a remuneração merecida pelo seu os rendimentos e a produtividade, os
potencial produtivo. salários dos trabalhadores variam, de
Mesmo que alguns autores tradicionais forma significativa, em relação ao que seria
reconheçam a questão da desigualdade de esperado por suas características produ-
oportunidades e os diferentes graus de tivas. Existem várias razões para tal fato.
acesso à educação e ao investimento em Voltamos a utilizar a metáfora da
capital humano4, o problema é que, na loteria. Conforme mencionado anterior-
realidade, a desigualdade de acumulação mente, o mercado de trabalho capitalista

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atual pode ser comparado a uma loteria, internos de trabalho dificulta o ajuste entre
na qual os bilhetes são os investimentos remunerações e produtividade6.
em capital humano. O mesmo investi- Também é questionável a hipótese de
mento em capital humano dá igualdade que o comportamento das firmas, em
de acesso aos bilhetes da loteria, mas não especial das grandes corporações, é voltado,
gera igualdade de resultados. Pelo contrá- única e exclusivamente, para a maximização
rio, já que há, necessariamente, vencedores de seus lucros, tendo em vista que elas
e perdedores. E nesse mercado, os traba- passaram a ser dirigidas por tecnoestruturas
lhadores que não têm investimento em que possuem outros incentivos que não
capital humano nem participam do jogo necessariamente, ou apenas, a maximização
já são, a priori, perdedores. Portanto, existe de lucros (GALBRAITH, 1982 e 1988).
confusão entre igualdade de acesso aos Como explicar que os trabalhadores
bilhetes de loteria e igualdade de resul- aceitariam remunerações inferiores a sua
tados, o que explica, por exemplo, que, produtividade ou ofertariam trabalho
mesmo que todos os gerentes de uma acima do que seria justificável pela remu-
empresa tenham uma mesma produti- neração efetiva, num comportamento
vidade potencial, apenas um deles será aparentemente irracional?
promovido a diretor. È necessário, inicialmente, notar que
Essa situação é absolutamente inconce- essa situação é dinâmica. Em um primeiro
bível para a teoria econômica tradicional5, momento, os trabalhadores investem em
pois o comportamento maximizador de capital humano com a expectativa de que
lucros das empresas não permitiria esse esses investimentos resultarão em ascensão
desvio entre produtividade e remuneração. profissional e em expressivas recompensas
De forma semelhante, os perdedores seriam financeiras. Para um trabalhador individual,
irracionais se aceitassem remunerações essas expectativas podem ou não se
abaixo do que seria justificável pela própria concretizar, mas, para os trabalhadores
produtividade. Assim, os mercados tende- como um todo necessariamente haverá
riam a eliminar desvios entre remunerações aqueles que terão suas expectativas
e produtividade. frustradas, em função da estrutura
Há, porém, várias razões para os piramidal. São os perdedores.
mercados não eliminarem esses desvios. Não há por que supor que os traba-
Em primeiro lugar, existe um conheci- lhadores possam, a priori, ter expectativa
mento imperfeito em relação à real produ- correta e certa a respeito da sua ascensão
tividade de cada um dos trabalhadores, até profissional, não apenas porque se trata de
mesmo dentro das firmas, problema ainda situação de conhecimento imperfeito, mas
mais grave entre elas. Além disso, na reali- também porque eles costumam mover-se
dade, a produtividade individual é por uma busca patológica por sucesso.
interdependente numa organização, assim Além disso, esse comportamento não pode
como existe divisão de trabalho que faz ser tomado como irracional, dado que,
com que os trabalhadores dediquem-se a por serem elevados os custos de ser
tarefas distintas, o que dificulta ou até perdedor e grandes os benefícios de ser
mesmo deixa sem sentido falar em vencedor, a competição vira um jogo
comparações de produtividade entre típico do dilema do prisioneiro.
trabalhadores. Além disso, a própria lógica Como explicar que os perdedores não
de funcionamento dos chamados mercados ajustam a sua oferta de trabalho ao longo

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do tempo? Claramente, os trabalhadores trabalhadores depende não da performance


poderiam tentar ajustar sua oferta de individual em termos absolutos, mas, sim,
trabalho e seus investimentos em capital da performance relativa de cada competidor
humano ao longo do tempo, de forma a em relação aos demais; b) a recompensa
adequá-los à ascensão profissional financeira fica concentrada nas mãos dos
efetivamente conseguida e à respectiva poucos indivíduos que tiveram a melhor
remuneração, caso sua ascensão tivesse sido performance, com pequenas diferenças no
menor que sua expectativa. Contudo, é talento e na produtividade, dando origem
preciso notar que a produtividade não é a enormes diferenciais de rendimentos.
apenas instrumento de ascensão profissional, Como exemplo de MWTA, poderiam ser
mas também de manutenção do status quo. citados os esportes profissionais, o
Por exemplo, suponha-se que determinado entretenimento, o mercado de altos
trabalhador tenha a expectativa de se tornar executivos. Contudo, os MWTA estão-se
presidente de uma corporação e sua dedi- disseminando e ganhando importância em
cação em investimento em capital humano toda economia.
e esforço tenha sido nesse sentido, mas, após Os MWTA seriam resultado de
vários anos de carreira, ele venha a perceber condições especiais pelo lado da oferta e/
que deve chegar, no máximo, a gerente ou ou da demanda. Pelo lado da oferta, existe
diretor. Apesar disso, o trabalhador não o fato de que os serviços dos melhores
poderá reduzir seus esforços de maneira podem ser reproduzidos a um baixo custo
significativa, pois tem de manter sua posi- adicional. Por exemplo, o custo marginal
ção de gerente ou diretor, que sempre estará de um DVD do filme vencedor do Oscar
ameaçada pelos demais concorrentes. Além é tão baixo quanto o de qualquer filme.
disso, o fato de que a ascensão profissional Portanto, existem economias de escala na
demanda longo tempo na carreira, em produção ou na distribuição que, por sua
vários torneios sucessivos, diminui o espaço vez, criam tendência para que um produto,
para o ajuste temporal. Nesse caso, haveria um distribuidor ou um serviço domine o
um problema de inconsistência temporal ou mercado. Pelo lado da demanda, um
dinâmica. produto torna-se mais valioso a partir do
Explicada as razões pelas quais os momento em que um grande número de
mercados não ajustam as remunerações à consumidores passa a utilizá-lo, como as
produtividade, é importante notar que a fitas de vídeo VHS vis-à-vis as fitas BHS ou
visão de loteria está presente em outras como ocorreu com os sistemas operacio-
teorias, como as dos mercados do tipo nais de computadores. São as chamadas
winner-takes-all (o vencedor leva tudo), para economias de rede.
a qual utilizaremos a sigla MWTA (FRANK; A tendência de incremento dos MTWA
COOK , 1996), e dos torneios (L AZEAR; seria a combinação de expressiva redução
ROSEN) 7. dos custos de transporte, de tendência de
Segundo a primeira teoria(FRANK ; declínio de barreiras tarifárias, de desenvol-
COOK, 1996), o incremento da desigualdade vimentos na área de comunicações e de
é resultado da crescente importância, na processamento de informações que tiverem,
economia como um todo, dos “mercados como impacto conjunto, a ampliação dos
onde os vencedores levam tudo”. As duas mercados acessíveis aos melhores produtos
principais características dos MWTA são ou produtores em nível internacional.
que: a) a recompensa ou o rendimento dos Enfim, o incremento dos MTWA seria

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reflexo do processo de globalização e/ou tividade dos trabalhadores, mas, sim, com
tendência de concentração. base no desempenho do trabalhador em
A teoria dos superstars (ROSEN, 1981)8 relação ao dos demais trabalhadores, o que
também aponta fatores semelhantes para se aproxima, novamente, de uma loteria.
explicar o surgimento da concentração da Segundo essa visão, apesar da tradicional
renda em alguns poucos trabalhadores. O visão econômica de que os trabalhadores
fenômeno dos superstars seria aquele em que devem ser pagos de acordo com o valor
um relativamente pequeno número de do seu produto marginal, as loterias
agentes recebem enormes remunerações competitivas também podem levar a uma
e dominam as atividades em que estão estrutura de incentivos eficiente.
engajados, que estão-se tornando cada vez Nesse sistema de premiação, a remu-
mais importante no mundo moderno. neração da classificação seria baseada no
Na economia dos superstars (ROSEN, ranking, e não na diferença absoluta de
1981), haveria uma imperfeita substituição produtividade. Sob determinadas circuns-
entre os diferentes vendedores. Vendedores tâncias, seria ótimo fixar as remunerações
de menor talento seriam fracos substitutos dessa forma. Mais especificamente, quando
em relação àqueles de maior talento. A os custos de monitoramento são elevados
demanda pelos mais talentosos cresceria ou o monitoramento é difícil, incentivando
de forma mais que proporcional ao incre- o shirking ou problemas de moral hazard,
mento do talento. Assim, ouvir uma pagar os trabalhadores com base no ranking
sucessão de cantores medíocres não seria tem-se mostrado uma eficiente estrutura de
igual a ouvir um cantor excepcional, ou, se incentivos. Além disso, esse tipo de esquema
um cirurgião for 10% mais bem sucedido de compensação altera a natureza de risco
em salvar vidas que seus demais concor- enfrentado pelos trabalhadores.
rentes, a maioria das pessoas estará O salário do vice-presidente de uma
disposta a pagar mais que 10% de prêmio particular corporação é bem inferior ao
pelos seus serviços. do presidente e, geralmente, os presidentes
Além disso, haveria, pelo lado da oferta, são escolhidos pelo ranking dos vice-presi-
uma forma de consumo conjunto, não dentes. Assim, num dia, um determinado
muito diferente dos chamados bens vice-presidente pode ser promovido a
públicos. Dessa forma, um artista deve fazer presidente e seu salário ser triplicado. É
o mesmo esforço tanto para dez quanto difícil argumentar que sua habilidade ou
para mil pessoas que estejam assistindo ao produtividade tenha triplicado de um dia
seu show. Assim também deve proceder um para outro, tornando complicada a tarefa
autor com os compradores de seu livro. De de compatibilizar tal fato com a teoria
forma mais geral, os custos de produção tradicional, que diz que os salários nas duas
não crescem na proporção do tamanho do ocupações, presidência e vice-presidência,
mercado do vendedor ou mesmo não deveriam ser aproximadamente iguais. Na
crescem, havendo, portanto, economias de realidade, a presidência é o prêmio de um
escala na produção. torneio, de forma que o salário do presi-
Também a teoria de torneios, ou dente não é fixado de forma a refletir a
tournaments (L AZEAR; ROSEN, 1981), admite corrente produtividade dele, mas, sim, a
a possibilidade, em determinadas circuns- induzir a todos os competidores a se
tâncias, de que a remuneração não seja feita esforçarem para obter a promoção. Essa
com base na medida absoluta da produ- interpretação sugere que presidentes de

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grandes corporações ganham grandes Nesse sentido, a desigualdade deixa de


salários, não necessariamente porque são ser resultado de imperfeições de mercado
mais produtivos como presidentes, mas, e passa a ser uma tendência inerente ao
sim, porque essa particular estrutura de capitalismo, pois as forças que favorecem
salários torna-os mais produtivos ao longo a concentração não são exceções, mas
das carreiras profissionais. Então, a presi- tendências naturais do funcionamento do
dência é como um torneio que fornece o sistema econômico capitalista atual.
incentivo apropriado à aquisição do capital A teoria econômica também costuma
humano prévio para se atingir tal posição. relacionar o comportamento da desigual-
Do ponto de vista dos objetivos deste dade ao grau de desenvolvimento e/ou
artigo, cabe notar que tanto a teoria dos ao processo de crescimento econômico.
MWTA quanto a dos torneios descrevem
o mercado de trabalho, em algum grau,
como uma loteria, em que a remuneração
não é dada pela produtividade absoluta,
mas pelo ranking. Em especial, a teoria dos “O objetivo microeco-
MWTA denota que pequenos diferenciais
de produtividade geram enormes dife-
nômico que gera o
renças de rendimentos. crescimento macroeco-
Também é necessário notar que as nômico é a busca pela
forças que dão origem à concentração de
renda, tanto no MWTA quanto no
desigualdade. Como
fenômeno dos superstars, não podem ser esperar a igualdade do
consideradas exceções às regras de processo de crescimento
mercado, mas, pelo contrário, são muitas
vezes tendências naturais do capitalismo. macroeconômico, se o
Pelo lado da demanda, por exemplo, a objetivo microeconô-
diferenciação de produtos no capitalismo, mico que o gera é a
longe de ser uma exceção, é uma tendência
natural. Os vendedores buscam diferenciar desigualdade?
seus produtos dos demais, pois sabem que,
dessa forma, poderão cobrar preços
maiores. Portanto, a hipótese da teoria
econômica tradicional, de que produtos
homogêneos são perfeitos substitutos entre Existem teorias que defendem que a
si, não é apenas irrealista, como é, acima desigualdade tende, naturalmente, a se
de tudo, contra uma tendência natural ou reduzir, à medida que vai ocorrendo o
esperada do próprio capitalismo. desenvolvimento ou crescimento econô-
Além disso, a imperfeita substituição mico (BID, 1998).
entre os vendedores pode prescindir de Tal tendência decorreria de vários
diferenças de talento ou produtividade. Por fatores. Em primeiro lugar, nas etapas
exemplo, a lista de best-sellers sempre contará iniciais de desenvolvimento ou acumulação
com número limitado de livros, os quais, capitalista, a escassez de capital implica
mesmo existindo outros com a mesma retornos muito elevados para esse fator de
qualidade, terão a preferência do público. produção relativo ao trabalho, fator que é

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abundante. Mas, à medida que vai ocor- educação, às possibilidades de emprego


rendo o desenvolvimento econômico, o mais limitadas e ao menor acesso ao
estoque de capital tende a se elevar, e a financiamento. Ainda, de forma estereo-
tendência é de redução do retorno do fator tipada, a renda e o nível educacional seriam
produtivo do capital. menores no campo que na cidade e as
Um mecanismo semelhante ocorre no famílias tenderiam a ser mais numerosas
caso da educação. Com níveis muito no campo que na cidade. Nas etapas iniciais
baixos de escolaridade, os poucos que têm do processo de urbanização, as diferenças
maior grau de escolaridade tendem a ter de renda entre o campo e a cidade contri-
rendimentos muito elevados. À medida buiriam para elevar a desigualdade de
que o nível educacional de toda a popu- rendimentos. Entretanto, à medida que vai
lação economicamente ativa vai crescendo, avançando o processo de urbanização, o
a tendência é, ceteris paribus, que o retorno diferencial de rendimentos entre o campo
dos trabalhadores com escolaridade mais e a cidade afetará apenas pequena fração
elevada reduza-se em relação ao dos da população e sua contribuição para a
trabalhadores com escolaridade menos desigualdade seria reduzida. O mesmo tipo
elevada e, assim, poder-se-ia esperar de raciocínio aplica-se ao processo de
menor desigualdade educacional entre os formalização das atividades produtivas.
trabalhadores. Então, o progresso educa- Em um primeiro momento da formali-
cional tenderia a contribuir com a redução zação das relações trabalhistas, os privi-
da desigualdade ao longo do tempo. légios de poucos assalariados formais
Os padrões demográficos também seriam fonte de desigualdade, mas, à
criam uma tendência de redução da medida que a formalização avança, esse
desigualdade, à medida que o desenvolvi- processo converte-se em fator de eqüidade.
mento vai evoluindo. Taxas de crescimento De modo geral, pode-se dizer que a
da população mais elevadas implicam formulação teórica que predomina na
maior heterogeneidade no tamanho das literatura sobre desenvolvimento
famílias. Nas famílias mais numerosas, econômico defende que, nos estágios
origina-se uma pior distribuição da renda iniciais e intermediários do desenvolvi-
per capita, além de a mulher participar menos mento – medidos pela renda per capita –,
do mercado de trabalho e de os filhos o mecanismo que promove o crescimento
tenderem a receber menos educação. À acarreta também piora na distribuição de
medida que a taxa de fecundidade cai, em renda. O fator que explica tal fato é a
especial para as famílias mais pobres, tende transferência da população do meio rural
a haver melhora da renda per capita, maior para o urbano, o que induz ao surgimento
participação da mulher no mercado de de atividades produtivas cuja complexi-
trabalho e maiores avanços educacionais dade exige mão-de-obra mais especia-
dos filhos. lizada e remuneração mais elevada, em
Outra razão pela qual tenderia a se função de sua melhor e/ou maior
reduzir a desigualdade à medida que vai qualificação. Somente nos estágios mais
evoluindo o desenvolvimento seria a tran- avançados do desenvolvimento econô-
sição do campo para o meio urbano. No mico é que a distribuição de renda tornar-
campo, as oportunidades seriam menores, se-ia mais igualitária. Tal teoria é conhecida
devido à pequena integração dos mer- como a curva de Kuznets, sugerindo
cados, às maiores dificuldades de acesso à padrão de desigualdade que acompanha

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Rogério Nagamine Costanzi RSP

o desenvolvimento dos países, que pode públicas tenham algum “espaço” para
ser caracterizado como U invertido. Con- influenciar a relação entre crescimento e
tudo, essa teoria vem sendo rejeitada por desigualdade, existem razões para que haja
um número crescente de autores limitações nessa influência. Com isso, não
(L OCATELLI, 1988). se quer negar que a desigualdade possa
No Brasil, também o trade-off entre influenciar negativamente o crescimento
crescimento e igualdade ficou marcado, na econômico ao trazer prejuízos ao investi-
política econômica, pela política do “cres- mento em capital humano, contudo é
cer o bolo primeiro, para depois distribuir” importante salientar que, em algum grau,
ou, na sua versão de nouvelle cousine, “crescer, o tradicional trade-off entre eficiência e
crescer e crescer” (HENRIQUES, 2000). De igualdade é inerente às motivações
certa forma, a piora na desigualdade, nas econômicas dos agentes individuais em um
fases iniciais e intermediárias do desenvol- sistema econômico capitalista ou, pelo
vimento econômico, seria uma necessidade, menos, exacerbadas pelo capitalismo.
pois permitiria a geração de poupança, tão Primeiramente, ressalta-se que a
fundamental para o processo de acumu- principal motivação dos agentes econô-
lação de capital e crescimento econômico. micos individuais para ações ou tomada
Vários autores contestam a visão de de decisões que geram crescimento econô-
que, necessariamente, para países em mico, como acumulação de capital físico e
desenvolvimento, o crescimento e a igual- humano, é, em geral, a busca pela desigual-
dade são objetivos conflitantes entre si. dade de renda, mais especificamente, é ter
Seria bastante questionável a interpretação padrão de renda igual ou melhor à média
que assegura que a distribuição de renda da sociedade. Nesse sentido, o objetivo
deve piorar antes de se tornar mais igua- microeconômico que gera o crescimento
litária. De forma semelhante, contudo, não macroeconômico é a busca pela desigual-
se poderia postular a existência de relação dade. Como esperar a igualdade do
direta entre crescimento e melhora na con- processo de crescimento macroeconômico,
centração de renda, pois, entre os países se o objetivo microeconômico que o gera
em desenvolvimento que apresentaram é a desigualdade?
altas taxas de crescimento, alguns apresen- Nesse sentido, a desigualdade reproduz-
taram piora e outros, melhora na distri- se não mais no imobilismo, mas no
buição de renda. Na realidade, haveria crescimento e por meio dele. O crescimento
espaço para as políticas públicas influírem passa a ser função dela ou forma de repro-
na relação entre crescimento e desigualdade duzi-la. Mostra que a necessidade de a ordem
(LOCATELLI , 1988). social “desigualitária” e a estrutura social de
Vários outros autores também ques- privilégio manterem-se é que produz e
tionam o suposto trade-off entre eficiência reproduz o crescimento como seu elemento
e igualdade. Na realidade, alguns autores estratégico (BAUDRILARD, 1995).
argumentam que, ao contrário da visão A desigualdade é fruto inerente ao
tradicional, a desigualdade pode trazer funcionamento dos sistemas econômicos
efeitos negativos para a eficiência econô- capitalistas e a busca por desigualdade de
mica, pois prejudica, por exemplo, os renda dos agentes econômicos individu-
investimentos em capital humano ais está por detrás do fenômeno do cres-
(FERREIRA , 2000). cimento macroeconômico. Os mecanis-
Do ponto de vista deste trabalho, cabe mos de mercado e a sua “mão invisível”9
destacar que, mesmo que as políticas não são capazes de atenuar, de forma
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RSP As novas formas de exploração do trabalho no capitalismo contemporâneo e as políticas públicas de combate à desigualdade

significativa, a tendência natural à desigual- o fim do dualismo caracterizado, por um


dade. Na realidade, a desigualdade pode lado, pelos capitalistas e, de outro, por uma
ser considerada externalidade negativa10 massa homogênea de trabalhadores.
inerente a um sistema econômico capita- Presentemente, os trabalhadores formam
lista em que os indivíduos agem por uma massa heterogênea e competem entre
interesse próprio. si por ascensão profissional em organi-
Além disso, cumpre lembrar também zações complexas e de estrutura piramidal,
que a velha máxima de Adam Smith (1723- em uma busca patológica por sucesso. O
1790), em sua clássica obra A riqueza das controle do capital está associado cada vez
nações – segundo a qual os indivíduos, menos à sua propriedade e cada vez mais
agindo por conta do seu próprio interesse, ao capital humano.
geram como resultado, pelas forças de Essas transformações tornaram o mer-
mercado ou da “mão invisível”, o máximo cado de trabalho uma loteria, em que os
bem-estar social –, descarta importantes bilhetes são os investimentos em capital
externalidades negativas do comporta- humano. Nessa loteria, os vencedores apro-
mento individualista, que comprometem, priam-se do trabalho dos perdedores. Os
de forma significativa, esse bem-estar social. trabalhadores com baixo ou nenhum investi-
Nesse contexto, é dissimulada a análise mento em capital humano estão excluídos
liberal que reforça a eficácia do auto-inte- dela e, por essa razão, são, a priori, perde-
resse no crescimento econômico, mas dores. Como a estrutura das organizações
despreza justamente a busca pela desigual- e dos mercados de trabalho é piramidal,
dade movida pelo auto-interesse que gera necessariamente, haverá vencedores e
externalidades negativas inerentes, como a perdedores. O caráter de loteria do mercado
corrupção e a falta de coesão social. de trabalho também é encontrado nas
Análises preconceituosas e estereotipadas teorias dos MWTA e dos torneios.
em relação à intervenção do Estado na Conseqüentemente surge, ao lado da
economia tendem a vê-las como nocivas tradicional apropriação do trabalho pelo
e procuram enfatizar o caráter corrupto capital, descrita por Karl Marx, em O
do governo. Entretanto, o Estado não é capital, nova forma de exploração do
um ente estranho à sociedade, mas, pelo trabalho, que reforça a tendência inerente
contrário, faz parte dessa mesma socie- à desigualdade do capitalismo. Essa nova
dade. A corrupção do Estado não decorre forma de exploração tem como
de ele ser Estado, mas de ser instituição de instrumento o capital humano e ocorre de
sociedade movida pelo auto-interesse. forma semelhante à exploração feita pelo
A teoria econômica tradicional capital físico. Assim, o capital físico e o
também exalta a competição de forma capital humano são instrumentos de
positiva, como instrumento essencial para legitimação da exploração do trabalho.
a eficiência, desprezando seus efeitos Essa nova forma de exploração do
colaterais negativos inerentes, como a trabalho reforça a tendência inerente ao
referida falta de coesão social e a violência capitalismo de geração de desigualdade pela
a ela associada. dicotomia capital–trabalho e impõe impor-
tantes limitações nas tradicionais políticas
Considerações finais públicas de combate à desigualdade,
baseadas na democratização dos
O capitalismo passou por profundas investimentos em capital humano. Mesmo
transformações desde seu prelúdio, com que todos tenham o mesmo capital humano
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ou a mesma produtividade, dada a atual es- querem ficar ricos, querem ser desiguais.
trutura piramidal do mercado de trabalho, A busca individual microeconômica e auto-
sempre haverá vencedores e perdedores. interessada da desigualdade é que gera o
Todos os gerentes de uma firma podem crescimento macroeconômico. Portanto, o
ter a mesma produtividade potencial, mas comportamento individual que produz o
apenas um será promovido a diretor. crescimento macroeconômico é, na
De outra parte, a lógica de intensa realidade, uma busca pela desigualdade. Se
especialização e divisão do trabalho, do a busca individual e auto-interessada pela
ponto de vista tanto social quanto de intra- desigualdade é que gera o crescimento,
firma, tornam complexas ou mesmo sem como conciliar crescimento e igualdade?
sentido comparações de produtividade, Como conseguir igualdade a partir do
tendo em vista que os trabalhadores
executam tarefas distintas. Existe, ademais,
interdependência entre as produtividades
individuais. Mesmo que todos na sociedade
tivessem curso superior completo, pela lógica “Políticas públicas
da divisão do trabalho alguém qualificado de combate à
teria de executar as tarefas de baixa quali-
ficação. É uma divisão que não decorre dos desigualdade baseadas
diferenciais de produtividade, e, sim, de na democratização
diversos fatores que transcendem a lógica do capital humano
econômica, como aspectos sociais, culturais
e mesmo questões operacionais.
apresentam impor-
A desigualdade deixa de ser resultado tantes limitações, pois
das diferenças nos atributos produtivos dos o mercado de trabalho
trabalhadores e passa a ser resultado capitalista está
inerente aos mercados de trabalho capita-
listas e ao capitalismo. Em primeiro lugar, organizado de
porque a própria desigualdade nos inves- forma que existam
timentos em capital humano, em especial vencedores e
em educação, é fruto inerente ao capita-
lismo. O capitalismo gera desigualdade, que
perdedores”
origina diferentes investimentos em capital
humano, os quais, por sua vez, ajudam a
reproduzir a desigualdade.
O crescimento macroeconômico crescimento, se o crescimento resulta da
também tem importantes limitações no busca pela desigualdade?
combate à desigualdade, na medida em que O sistema econômico capitalista
essa desigualdade é a finalidade microeco- movido pelo auto-interesse gera, como
nômica, que gera o crescimento macroeco- externalidade negativa inerente à desigual-
nômico. O crescimento em si é função da dade, o tradicional trade-off entre cresci-
desigualdade, ou a desigualdade é a mento econômico e igualdade em nível
finalidade do crescimento. microeconômico, que nunca foi resolvido,
Na realidade, os indivíduos esforçam- em nível macroeconômico, pelo funcio-
se para ser extremamente produtivos, namento dos mercados. Os economistas
investem em capital humano, porque tradicionais, contudo, jamais procuram
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RSP As novas formas de exploração do trabalho no capitalismo contemporâneo e as políticas públicas de combate à desigualdade

explicitar que esse trade-off decorre de análise expressivas, como a corrupção, a falta de
que toma como implícita uma natureza coesão social e a violência a elas associada.
humana egoísta e auto-interessada. O combate à desigualdade demanda,
A máxima de Adam Smith, em sua então, teoricamente, mudanças no
obra A riqueza das nações, segundo a qual o comportamento humano, de forma que
sistema econômico capitalista, caracte- o motor do crescimento macroeconômico
rizado por indivíduos movidos pelo auto- não seja a busca microeconômica pela
interesse, geraria o máximo bem-estar desigualdade de renda entre os indivíduos,
social, despreza importantes externalidades assim como a alteração dos valores sociais,
negativas inerentes a esse tipo de com- culturais e demais fatores que tornaram o
portamento. mercado de trabalho capitalista uma insti-
Em primeiro lugar, a própria questão tuição em que, necessariamente, há vence-
já colocada da desigualdade. Mais estranho dores e perdedores. Enquanto a motivação
que esse lapso, porém, é a análise liberal para produzir for o auto-interesse, a busca
que reforça a eficácia do auto-interesse no pela desigualdade, pelo sucesso profissional
crescimento econômico, mas despreza e pela riqueza, de forma inerente, haverá
justamente a busca pela desigualdade contradição entre eficiência e desigualdade.
movida pelo auto-interesse, que gera outras O trabalho não será a satisfação de neces-
expressivas externalidades negativas, como sidade, mas, sim, um meio de satisfazer
a corrupção e a falta de coesão social. A outras necessidades11. Será possível conciliar
teoria econômica tradicional também exalta eficiência e eqüidade apenas se a motivação
a competição, de forma positiva, como para a produção for o bem-estar coletivo.
instrumento essencial para a eficiência, Dado o “receituário” recomendado
desprezando suas externalidades negativas. para o combate à desigualdade, fica implí-
Políticas públicas de combate à desi- cito que este trabalho aceita que o
gualdade baseadas na democratização do comportamento humano e os valores
capital humano, mesmo sendo desejáveis podem ser objeto de transformação, pois,
e positivas, apresentam importantes limi- caso se adotasse a posição determinista de
tações, pois o mercado de trabalho que a natureza humana é imutável, não
capitalista está organizado de forma que haveria motivos para intervenções sociais.
existam vencedores e perdedores, havendo Contudo, é necessário reconhecer que
ou não diferenciais de produtividade. esse diagnóstico levanta importantes
As novas formas de exploração do indagações: Como são determinados o
trabalho explicitam uma relação de comportamento humano e os valores e
causalidade em que o crescimento macro- como eles podem ser alterados? Até que
econômico é gerado pela busca da desi- ponto o comportamento humano é
gualdade microeconômica. Como o cresci- influenciado pelo sistema econômico
mento pode reduzir a desigualdade, se é capitalista e é independente da conjuntura
gerado pela busca da desigualdade? As sócio-histórica? Embora essas questões
forças de mercado, em nível macroeco- sejam relevantes, este artigo não as discutirá,
nômico, mostram-se incapazes de reverter pois são tão complexas que fogem ao
esse trade-off. Mais do que isso, o compor- escopo deste trabalho, merecendo discussão
tamento microeconômico auto-interes- específica, impossível de ser feita neste paper.
sado, que gera o crescimento econômico,
torna inerente ao funcionamento do (Recebido em janeiro de 2005. Versão definiti va em
capitalismo externalidades negativas março de 2005)

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Rogério Nagamine Costanzi RSP

Notas

1
Por tradicional exploração do trabalho pelo capital, entenda-se aquela descrita por Marx em O capital.
2
Por literatura econômica tradicional, deve ser entendida a chamada teoria econômica neoclássica
e a teoria do capital humano, que, grosso modo, defendem que os salários são determinados pela
produtividade (marginal). Para uma visão da teoria tradicional, ver Borjas (2000) e Bosworth, Dawkins
e Stromback (1996).
3
Por b usca patológica por sucesso, este artigo refere-se a uma busca obsessiva por sucesso
profissional e financeiro, que coloca o mencionado objetivo como o principal sentido da vida e a falta
dele como o resultado inaceitável e psicologicamente insuportável.
4
Ver Ferreira (2000), Barros e Mendonça (1995), Bar ros, Henriques e Mendonça (2000, 2000a) e
Ramos e Vieira (2000).
5
Entende-se a teoria econômica tradicional como a teoria microeconômica neoclássica, que
defende não apenas que o salário seja determinado pela produtividade marginal, mas também que
a maximização dos lucros seja o único e exclusivo objetivo das firmas.
6
Sobre mercados internos de trabalho, ver Doeringer e Piore (1971).
7
Os criadores da teoria dos MWTA foram Frank e Cook (1996). Para ter uma idéia da teoria dos
torneios, ver Lazear e Rosen (1981).
8
Para conhecer a teoria dos superstars, ver o trabalho de Rosen (1981).
9
A “mão invisível” do mercado é a referência feita à expressão criada por Adam Smith, em A
riqueza das nações.
10
A expressão “externalidade negativa”, na literatura econômica, pode ser entendida como
efeito colateral negativo.
11
Ver MARX, Karl, 1963, p. 162.

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RSP As novas formas de exploração do trabalho no capitalismo contemporâneo e as políticas públicas de combate à desigualdade

Resumo - Resumen - Abstract

As novas formas de exploração do trabalho no capitalismo contemporâneo e as políticas


públicas de combate à desigualdade
Rogério Nagamine Costanzi
O mercado de trabalho sofreu profundas transformações desde o começo do capitalismo até o
momento atual, sendo possível compará-lo a uma loteria, na qual os trabalhadores passaram a
competir entre si por ascensão profissional. Os bilhetes dessa loteria são os investimentos em capital
humano. Nela haverá, necessariamente, vencedores e perdedores, com os primeiros apropriando-se
do trabalho dos últimos. Dessa realidade, surge uma nova for ma de explor ação do trabalho, cujo
instrumento de legitimação é o capital humano, que reforça a tendência inerente do capitalismo à
geração de desigualdade e coloca limitações à visão tradicional de combate à desigualdade baseada na
democratização do capital humano. O crescimento também tem limitações na redução da desigual-
dade, tendo em vista que a motivação microeconômica que gera o crescimento macroeconômico é
justamente a busca pela desigualdade.

Las nuevas formas de explotación del trabajo en el capitalismo comtemporáneo y las


políticas públicas de combate a la desigualdad
Rogério Nagamine Costanzi
El mercado de trabajo pasó por profundas transformaciones desde el inicio del capitalismo
hasta el momento actual, convirtiéndose en una lotería, en que los trabajadores pasaron a competir
entre sí por ascenso profesional. Los billetes de esta lotería son las inversiones en capital humano. En
esta lotería, habrá, necesariamente, ganadores y perdedores, con los primeros apropiándose del
trabajo de los últimos. De esta realidad, surge una nueva forma de explotación del trabajo, cuyo
instrumento de legitimación es el capital humano, que refuerza la tendencia inherente del capitalismo
de generación de desigualdad e impone limitaciones a la visión tradicional de combate a la desigualdad
basada en la democratización del capital humano. El crecimiento también tiene limitaciones en el
combate a la desigualdad, puesto que la motivación microeconómica que genera el crecimiento
macroeconómico es justamente la búsqueda por la desigualdad.

New forms of labour exploitation in contemporary captalism and public policies to


combat inequality
Rogério Nagamine Costanzi
The labour market has undergone deep transformations from the start of the capitalism to the
current moment, becoming a lottery, in which workers started to compete among themselves for
professional development. The tickets of this lottery are the investments in human capital. Here,
there exists, necessarily, winners and losers: the firsts appropriates the work of the latters. A new
form of exploration of the work appears, in which the instrument of legitimation is the human
capital. It strengthens the inherent trend of the capitalism towards inequality generation and imposes
limitations to the traditional vision of inequality reduction based on the democratization of the
human capital. Growth has also limitations to combat inequality, considering that the microeconomic
motivation that generates the macroeconomic growth is exactly the search for inequality.

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Rogério Nagamine Costanzi RSP

Rogério Nagamine Costanzi


Mestre em Economia pelo Instituto de Pesquisa Econômica da Universidade de São Paulo (IPE/
USP), Especialista em Políticas Públicas e Gestão Gover namental do Gover no Federal, em exercício
na Diretoria de Estudos Sociais do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (DISOC/IPEA), ex-
chefe de Divisão da Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda (1995), ex-coordenador-
geral de Empreg o do Ministério do Trabalho e Emprego (2000 a 2003).Contato:
rogerio.nagamine@ipea.gov.br

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