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Uma reconstituição histórica

Órgão do Senado do Império Rio de Janeiro, segunda-feira, 14 de maio de 1888

ASSINADA A LEI ÁUREA


O
Brasil está livre escravos. Levantamento poucos parlamentares quan­­do o deputado Joa­ gravemente enfermo em
do trabalho es­ do Império mostra que, no con­t rá­r ios à abolição. quim Na­b u­­co, de uma Milão, na Itá­lia, onde se
cravo. Na tarde ano passado, eram mais Calcula -se que cerca sacada, comu­n icou que submete a tratamento de
de on­tem, a Princesa Isabel de 700 mil. A Lei João de 5 mil pessoas se não havia mais escravos no sáude, ainda não sabe da
sancionou a lei que pôs Alfredo, mais chamada de concentraram diante do Brasil. Em uma das janelas, sanção da lei. Por meio
fim a mais de 300 anos Lei Áu­rea, foi aprovada em Paço da Ci­d ade, para Dona Isabel foi aclamada do telégrafo, a notícia já
de escravidão. Conforme tempo re­corde na Câmara acompanhar a solenidade pe­los manifestantes. chegou à várias províncias
o senador Sousa Dantas, dos Deputados e no Senado, de assinatura. O povo O Imperador Dom Pedro do País e nações americanas
havia no país 600 mil apesar dos protestos dos irrompeu em aplausos 2º, que se encontra e eu­ropéias. Pág. 3

Leis que antecederam a abolição nem


sempre provocaram resultados práticos
Em 1845, surgiu a lei que anos, com a obrigação de
previa sanções contra o tráfico prestar serviços, a título de
de escravos. Em 1871, foi indenização ao se­nhor, por
adotada a Lei do Ventre três anos. Essas medidas,
Livre, que dava liberdade aos porém, não trouxeram os
filhos de escravos nascidos a resultados esperados, pois
partir da sua edição, mas os a contrapartida geralmente
manteve na tutela dos seus exigida inviabilizava seu
senhores até os 21 anos. E em cumprimento ou a lei era
1885, ga­ran­tiu-se liberdade sim­ples­mente desrespeitada.
aos que com­p letassem 60 Pág. 2

Primeiros registros da
resistência negra são de 1575

No Paço da Cidade, senadores e outras autoridades assistem a D. Isabel assinar a Lei Áurea

Câmara dos No Senado, apenas Campanha envolveu


Deputados votou o dois senadores se monarquistas e
republicanos
projeto em dois dias manifestaram contra
O Projeto de Lei nº 1 foi apro­ Ontem, domingo, o Senado do O abolicionista Joaquim Nabuco
va­do em apenas dois dias pela Império aprovou a proposta que relata que o movimento pelo
Câmara dos Deputados. A extinguiu o trabalho escravo fim do trabalho servil no país
decisão em tempo recorde só no Brasil. Dois senadores con­c entrou-se inicialmente
foi possível graças ao esforço se manifestaram contra a em clubes, lojas maçônicas,
da bancada antiescravagista – iniciativa: o Barão de Cotegipe – associações, cafés e jornais, e
liderada pelo pernambucano advertindo que no futuro haverá só aos poucos estendeu-se à
Joaquim Nabuco – e à ajuda do grave perturbação da ordem no po­pulação. Nesse período, que
presidente da Casa, deputado Brasil – e Paulino de Sousa. durou de 1879 a 1884, diz ele,
Barão de Lucena. “Precisamos Defendendo a proposta, Sousa “os abolicionistas combateram
apressar a passagem do projeto, Dantas disse que a abolição sós, entregues aos seus próprios
de modo que a libertação seja constitui o maior acontecimento recursos”. Só mais tarde, dis­
imediata”, defendeu Nabuco da história do Brasil e tornará a cur­sos nas tribunas, artigos e
aos colegas. Pág. 4 Nação mais próspera. Pág. 5 poemas nos jornais ajudaram
a pressionar o Império para
que fosse extinta a escravidão.
Os republicanos, praticamente
todos eles, eram abo­li­cio­nistas,
mas nem todo defensor do fim
do trabalho escravo preferia a A resistência dos negros ao trabalho servil foi um
República. dos fatores que levaram à abolição da escravatura
Escravidão foi abolida no Joaquim Nabuco, Ruy Barbosa e
Castro Alves são grandes nomes Os primeiras relatos de passaram, depois, a ser
Ceará quatro anos atrás do abolicionismo, que contou re­s istência à escravidão chamadas de quilombos;
também com negros ilustres, são de 1575, quando o o mais conhecido deles foi
No Ceará a escravidão acabou há quatro anos. A Império recebeu, da Bahia, o dos Palmares, que pode
ini­ciativa reforçou o sentimento abolicionista em pro­ como André Rebouças, José do
Patrocínio, Luís Gama e Tobias notícias de negros fugitivos. ter abrigado mais de 20
víncias como Amazonas, Pernambuco, Bahia, Goiás, Inicialmente, eles se re­fu­ mil pessoas em 1670. A
Piauí, Rio de Janeiro, São Paulo, Rio Grande do Sul Barreto. Luís Gama chegou a
ser vendido, aos dez anos, como giavam em mocambos, es­ resistência foi um dos fatores
e Paraná. Foi Mossoró, em 1883, a primeira cidade a pécie de acampamento. As que levaram à abolição da
pôr fim ao trabalho servil. Pág. 8 escravo, e se transformou em
símbolo do movimento em São comunidades de fu­g itivos escravatura. Pág. 7
Paulo. Pág. 6

Edição comemorativa dos 120 anos da Lei Áurea – Jornal do Senado – 12 a 18 de maio de 2008 – Ano XIV – Nº 2.801/172
2 Jornal do Senado Uma reconstituição histórica Rio de Janeiro, segunda-feira, 14 de maio de 1888

Uma primeira tentativa de Ordem do dia de

proibir o tráfico de negros hoje, segunda-


feira, 14 de maio
de 1888, às 11h

Com poucos efeitos práticos, a Lei Eusébio de Queiroz, a do erceira dita da proposta
da Câmara dos Deputados
Ventre Livre e a dos Sexagenários antecederam a Lei Áurea n. 42, de 1887, aprovando
a pensão de 1$4000 diá­
rios aos menores irmãos

E
m 7 de novembro de José Bonifácio de Andrada mo em águas territoriais Para burlar a lei, fazen­ do 2º sargento do Corpo
1831, a Câmara dos e Silva chamou de “cancro brasileiras, e julgar seus dei­ros incentivaram o trá­ Militar da Polícia da Corte
Deputados promul­ mortal que ameaçava os co­mandantes. fico interno, tirando es­ Antonio Nery de Oliveira
gou uma lei que proibia fundamentos da nação”. O governo brasileiro não cra­vos de áreas em que a Araújo, para que votou-se
o tráfico de escravos afri­ O ato de 1831 foi um pri­ resistiu à pressão e o mi­ agri­cultura decaía, como dispensa de interstício.
canos. O texto, resultado meiro passo, mas ine­­ficaz. nistro da Jus­tiça de Dom os engenhos de açúcar do
de acordo do Brasil com A tur­bulência política em Pedro 2º, Eusé­bio de Quei­ Nordeste, para as lavouras egunda dita do proje­
a Inglaterra, estabelecia várias províncias im­pediu roz, enviou projeto ao Par­ de café no Centro-Sul. Mas to do Senado letra S de
que to­dos os escravos que que o governo cen­­­­­tral fi­ lamento que determinava foi aprovado, em 1854, a 1887 determinando que
en­trassem no território ou zesse cumprir a lei durante a apreensão de navios que Lei Nabuco de Araújo (mi­ a disposição do parágrafo
portos do Brasil vindos de as duas décadas seguintes. traficassem escravos. A Lei nistro da Justiça), que pre­ 1º do artigo 1º do Decreto
fora ficariam livres. Porém, Só com a pressão política nº 581, de 4/9/1850, co­ via sanções para as autori­ nº 3.300, de 9 de outubro,
o último desembarque de e militar in­glesa o cenário nhecida como Lei Eusébio dades que encobrissem o não é aplicável ao minis­
es­cravos africanos no país se modificou. Em 1845, o de Queiroz, considerava con­­trabando de escravos. tro do Supremo Tribunal
só ocorreria em 1855, no Parlamento em Londres criminosos o dono do navio, Com o fim do tráfico, pro­­ de Justiça que exercesse já
litoral de Pernambuco. apro­vou lei (o Bill Aber­ o ca­pitão e seus subordina­ gressivamente os imigran­ semelhante cargo e tivesse
Os 14 anos entre a in­ deen) que dava à Marinha dos, a­lém do pessoal em tes europeus co­meçaram a mais de 72 anos de idade.
tenção e a realidade fo­ram inglesa o direito de aprisio­ ter­ra que participasse do substituir a mão-de-obra
a sobrevida daquilo que nar navios negreiros, mes­ comércio ilegal. ser­vil.
Expediente
Esta edição especial reproduz os
principais episódios relacionados à
abolição da escravatura no Brasil.
O formato adotado simula o que
poderia ser uma edição do Jornal
do Senado publicada em 14 de
maio de 1888, dia seguinte ao da
assinatura da Lei Áurea. Naquele
período, o Senado não possuía ne­
nhuma publicação jornalística. Os
textos foram elaborados com base
nos Anais do Senado e da Câmara
dos Deputados, jornais e revistas da
época e livros de estudiosos do mo­
vimento abolicionista.

Ao chegarem ao Brasil, os negros ficavam em depósitos à espera dos leilões e onde eram inspecionados por compradores Créditos das fotos:
Pág. 1: Museu Histórico Nacional;
Rugendas/Fund. Joaquim Nabuco
Lei dos Sexagenários foi Pág. 2: Rugendas/Fund. Joaquim
Nabuco

fruto de acordo político Pág. 3: Museu Imperial;


Reprodução/Geraldo Magela

Muita negociação políti­


ca entre liberais e conser­
o escravo, não prevendo
qualquer tipo de indeni­
Dom Pedro 2º defendeu Pág. 4: Cedi/Câmara dos
Deputados
Pág. 5: Flickr; Arquivo Senado
vadores foi necessária para
que a Câmara dos Deputa­
zação aos proprietários, o
projeto foi violentamente
a Lei do Ventre Livre Federal; Reproduções/Arquivo
Fotográfico JS
dos aprovasse outro proje­ torpedeado pelos escravo­ Nasceu da vontade de vam o governo de que­ Pág. 6: Fund. Joaquim Nabuco;
to antiescravagista enviado cratas no Parlamento, a Dom Pedro 2º o projeto rer provocar uma crise ABL; Reproduções/Arquivo
pelo governo imperial à ponto de causar a queda da Lei do Ventre Livre, econômica. Fotográfico JS
As­sembléia Geral. Sancio­ do gabinete e a dissolução elaborado pelo gabinete As controvérsias fo­ Pág. 7: Rugendas/Fund. Joaquim
Nabuco
nada pelo Imperador Dom da Assembléia Geral. conservador do Viscon­ ram desproporcionais
Pág. 8: Rugendas/Fund. Joaquim
Pedro 2º com o nº 3.270, A lei sancionada no ano de do Rio Branco em aos seus efei­tos práticos. Nabuco; Christiano Jr.
em 28 de setembro de seguinte continha diversas 27 de maio de 1871. A lei deu liberdade aos
1885, a Lei dos Sexagená­ normas para regular a ex­ Em sua Fala do Trono, filhos de escravos nas­ Jornal do Senado Federal
rios também ficou conheci­ tinção gradual do elemento dias antes, na abertura cidos a partir daquela Praça dos Três Poderes – Ed.
servil. Eram libertados os do ano legislativo, o Im­ data, mas os manteve Anexo I do Senado Federal, 20º
da como Saraiva-Cotegipe,
andar – 70165-920 Brasília (DF)
em referência aos dois che­ escravos que completassem perador antecipara que sob a tutela dos seus se­
www.senado.gov.br/jornal
fes do gabinete ministerial 60 anos, com a obrigação “considerações da maior nhores até os 21 anos. jornal@senado.gov.br
do Império, o liberal con­ de prestar serviços, a título importância aconselham Segundo essa norma, Tel.: 0800 61-2211
selheiro Saraiva e o conser­ de indenização ao senhor, que a reformada legisla­ os filhos menores fica­ Fax (61) 3311-3137
vador (e mulato) Barão de pelo prazo de três anos. O ção sobre o estado ser­vil riam “em poder e sob a
autoridade dos senhores Diretor do Jornal do Senado:
Cotegipe, que deram apoio maior de 65 anos ficava li­ não continue a ser uma
Davi Emerich
à medida. berado de tais trabalhos. aspiração nacional inde­ de suas mães”, os quais Edição: Eduardo Leão
Na verdade, a iniciativa é A crítica dos abolicionis­ finida e incerta”. deveriam criá-los até Coordenação de texto: José do
do ano anterior, 1844, pro­ tas à lei era aos limitados Por vários meses, de­ os 8 anos. Nessa idade, Carmo Andrade
posta pelo senador Sousa efeitos práticos, pois os putados dos partidos o senhor optava entre Redação: Janaína Araújo, Paula
Dantas, então chefe de ga­ poucos que chegavam a Conservador e Liberal re­ceber do Estado in­ Pimenta, Sylvio Guedes, José do
binete. Muito mais abran­ essa idade já não tinham discutiram a proposta. denização de 600 mil Carmo Andrade
gente, ao fixar os 60 anos condições de garantir seu Quatro meses depois, réis ou de utilizar-se dos Pesquisa histórica: José do
como idade limite para sus­tento. em 28 de setembro, serviços do menor até Carmo Andrade e Eliana Lucena
transformou-se na Lei 21 anos. Diagramação: Bruno Bazílio,
nº 2.040, assinada por – A verdade é que a Henrique Eduardo Lima de
lei, ao libertar os bebês, Araújo, Iracema F. da Silva e
Dona Isabel. Os defen­
Festejos populares sores dessa lei afirma­ estabeleceu ao mes­mo Sérgio Luiz Gomes da Silva
Revisão: Eny Junia Carvalho e
vam que ela, juntamen­ tempo que até os 21 anos
comemorativos da abolição te com a proibição do
tráfico negreiro, assegu­
eles permane­ce­riam em
poder do senhor. Na prá­
Lindolfo do Amaral Almeida
Tratamento de imagem:
Edmilson Figueiredo e Humberto
rava a extinção gra­dual tica, até es­sa data, conti­ Sou­sa Lima
Derby - club da escravidão. Já os do­
nos de escravos acusa­
nuavam escravos – ana­
lisou Joaquim Nabuco.
Arquivo fotográfico: Ana Volpe,
Laiane Borges e Elida Costa
sexta-feira – 18 do corrente
3 Jornal do Senado Uma reconstituição histórica Rio de Janeiro, segunda-feira, 14 de maio de 1888

Princesa Isabel assina a Lei Áurea


Texto possui apenas dois artigos e já está em vigor tanto na Corte como nas províncias

D
esde a tarde de on­ nefanda mácula da escra­
tem, dia 13, está vidão, como já lhe coube
extinto em todo o a de confirmar o decreto
Brasil o trabalho escravo, que não permitiu nascerem
prática das mais cruéis e mais cativos no Império (a
condenáveis que foi per­ Lei do Ventre Livre)”.
mitida legalmente no país Falando em seguida, sem
por mais de 300 anos. Me­ conter as lágrimas, Dona
nos de três horas depois da Isabel declarou:
aprovação do projeto pelo – Seria o dia de hoje um
Senado do Império, a Prin­ dos mais belos de minha
cesa Regente Dona Isabel, vida se não fosse saber es­
com uma pena de ouro tar meu pai enfermo. Deus
ofertada pelo povo, san­ permitirá que ele nos volte
cionava em solenidade no para tornar-se, como sem­
Paço da Cidade a já cha­ pre, útil à nossa Pátria.
mada Lei Áurea. Participaram da ceri­
É opinião generalizada mônia, na Sala do Trono,
que a Pátria se tornou real­ senadores, deputados, mi­
mente livre com o ato que nistros, magistrados, em­
retirou o Brasil da condi­ baixadores e outras perso­
ção de única nação do Oci­ nalidades, além de gente
dente que ainda explorava Sua Alteza Dona Isabel sancionou em nome de seu augusto pai a lei que acaba com a do povo que, em verdadei­
o elemento servil. Estima- escravidão, prática das mais cruéis que foi permitida no Brasil por mais de 300 anos ro delírio, invadiu o palá­
se que mais de 600 mil cio. Em frente ao edifício,
negros foram beneficiados no Senado se enfrentaram, sob os cuidados de três dos volta das 14 horas, rece­ na Praça Dom Pedro 2º,
pela lei. quer defendendo, quer ata­ melhores médicos euro­ bendo demorados aplausos cerca de 5 mil pessoas se
Poucas vezes nos seus 62 cando o projeto, alguns dos peus. do público. aglomeravam. A multi­
anos de funcionamento a maiores tribunos do país. Confiante em que o Se­ Coube a uma comissão dão irrompeu em ruidosas
Assembléia Geral produziu nado aprovaria a propos­ de senadores, tendo à fren­ aclamações quando o de­
uma lei com extraordinária Sorriso e lágrimas ta nesse domingo, Dona te Sousa Dantas, entregar à putado Joaquim Nabuco,
rapidez como a que acaba A fisionomia da Princesa Isabel, que se encontrava Princesa Regente o autó­ de uma sacada do Paço,
de emancipar os escravos. Regente, sempre expres­ em Petrópolis, dirigiu-se grafo do projeto, cujo tex­ comunicou ao povo que
Foram só seis dias de tra­ sando contentamento pelo de trem de ferro logo após to foi transformado numa não havia mais escravos
mitação da mensagem, ato que acabava de assi­ o meio-dia para o Rio de verdadeira peça de arte no Brasil. Chamada pelos
não obstante a tentativa nar, às vezes dava ares de Janeiro. Acompanhada de pelo conhecido calígrafo cidadãos que se concen­
dos parlamentares antia­ preocupação, em virtude seu esposo, o Conde d’Eu, Leopoldo Heck. Na opor­ travam diante do palácio,
bolicionistas de imporem da gravidade do estado de e dos ministros do Império, tunidade, Dantas felicitou Dona Isabel surgiu numa
obstáculos à adoção de saúde de seu augusto pai, Costa Pereira, e da Agri­ Dona Isabel “por caber-lhe janela, sendo mais uma
ur­gência para a matéria. que está em tratamento na cultura, Rodrigo Silva, Sua a glória de assinar a lei que vez aclamada pelos mani­
Nos debates na Câmara e cidade italiana de Milão, Alteza chegou ao Paço por apaga dos nossos códigos a festantes.

Dom Pedro 2º ainda Bandas animam festejo nas ruas


não foi informado Concebida para abolir de forma fluminenses já estavam libertan­ Abolição repercute
imediata e incondicional o ele­ do seus escravos.
O Imperador Dom Pedro 2º, que se mento servil no País, a mais im­ nas províncias e
encontra em Milão, na Itália, onde se portante e mais humana norma Soar de sinos
submete a tratamento de saúde, ainda legal já adotada pelo Brasil, e que Em razão da grande concentra­ no estrangeiro
não pôde ser informado da lei que baniu recebeu o número 3.353, contém ção de pessoas na praça, só com
de nosso país o regime de escravidão. apenas dois dispositivos: muita dificuldade as carruagens O milagre da ciência e da
Transcrevemos, a respeito, os seguintes “Artigo 1º É declarada extin- que levavam a comissão de sena­ técnica neste final do sé­
telegramas: ta a escravidão no Brasil. dores e o presidente do Ministé­ culo 19, de que é exemplo
Milão, 12 – O estado de S.M. o Impe- “Artigo 2º Revogam-se as rio, senador João Alfredo, conse­ o telégrafo, com a ajuda
rador apresenta uma pequena melhora. disposições em contrário”. guiram chegar às portas do Paço, dos cabos submarinos, fez
Os fenômenos cerebrais cessaram após Assim que a Câmara recebeu o sob aplausos dos manifestantes. com que a notícia da abo­
delírio intenso. Agora está em plena in- texto – na terça-feira dia 8 – das Na ocasião, soaram os sinos das lição chegasse rapidamente
tegridade de suas faculdades mentais. mãos do ministro Rodrigo Silva, o igrejas do Rio, três delas situadas à maioria das províncias
Atribui-se esse resultado à aplicação de deputado Joaquim Nabuco, lan­ perto do palácio: as de São José, brasileiras e à grande par­
gelo na cabeça e às injeções hipodérmi- çando mão de recurso regimental, de Nossa Senhora do Carmo e da te das nações americanas e
cas de cafeína, receitadas pelo Dr. Sem- solicitou ao presidente daquela Capela Imperial. européias.
mola. É esperado o dr. Charcot. Casa, deputado Henrique Pereira Depois de sancionada a lei, in­ Habitantes de São Paulo,
Milão, 13 – O estado de S.M. o Im- de Lucena, a designação imedia­ tensificaram-se os festejos e pas­ Santos, Campinas, Salva­
perador apresenta progressivas melho- ta da comissão especial que daria seatas pelas ruas do Rio de Janei­ dor, Recife, Vitória, Belém,
ras, conforme o boletim dos médicos o parecer transformando a men­ ro, em meio a bandas de música Ouro Preto, Fortaleza e ou­
assistentes. Os Drs. Charcot, Semmola, sagem em projeto. Sob os pro­ e espocar de foguetes. Ao entrar tras cidades saíram às ruas
e Giovani declaram em boletim que a testos do deputado conservador na Rua do Ouvidor, após deixar em procissões cívicas, não
febre tem declinado quase totalmente e Andrade Figueira, o parecer foi o Paço, o veterano abolicionista faltando bandas de música
que o estado nervoso do augusto enfer- acolhido pela Câmara no mesmo Sousa Dantas foi carregado nos e fogos. À noite, edifícios
mo é calmo. dia 8, seguindo-se, nos dias 9 e braços do povo. públicos e particulares da
10, a discussão e aprovação. capital paulista foram ilu­
Da mesma forma agiu o Sena­ Pena será exposta minados.
do, nomeando em 11 de maio a A pena de ouro com que a Prin­ Das capitais das provín­
comissão especial, cujo parecer cesa Regente assinou o decreto cias e do exterior chegam
foi votado no mesmo dia. Ontem, da abolição da escravatura fica­ a toda hora ao Rio telegra­
dia 13, ocorreu a aprovação fi­ rá exposta a partir do dia 21 de mas de congratulações. Em
nal, mediante votação simbólica. maio no salão do jornal O Paiz. Buenos Aires, foi decretado
Pessoas que se encontravam nas A pena, que tem no dorso 43 bri­ feriado a próxima quinta-
galerias jogaram flores no Ple­ lhantes, traz a seguinte inscrição: feira, para grande festejo
nário. Apenas dois senadores se “A D. Isabel, a redentora, o povo cívico em honra do Brasil
manifestaram contrários à maté­ agradecido”, e tem no lado oposto livre. O Senado argentino
ria: o Barão de Cotegipe e Pau­ o número e a data da Lei Áurea. e a corporação acadêmica
lino de Sousa. Quando o Senado A campanha de subscrição po­ telegrafaram a Dona Isa­
concluía a deliberação sobre a pular iniciada por aquele diário bel, felicitando-a.
D. Pedro 2º encontra-se doente em Milão,
proposta, chegava ao Plenário a logo recebeu a adesão da Revista
sob os cuidados de três famosos médicos notícia de que alguns fazendeiros Ilustrada.
4 Jornal do Senado Uma reconstituição histórica Rio de Janeiro, segunda-feira, 14 de maio de 1888

Câmara discute e vota fim 16:000$000


da escravidão em dois dias LOTERIAS DE S. PAULO
1ª DA 133ª
EXTRACÇÃO

Aprovação do projeto em tempo recorde só foi possível graças ao AMANHÃ AMANHÃ


esforço da bancada antiescravagista, com apoio do presidente da Casa IMPRETERIVELMENTE

A
Princesa Im­ ter em lei a pro­
perial Re­gente posta do go­verno,
Isabel enviara acho que é preciso No século 16 já
à Assembléia Geral, na
terça-feira 8 de maio
colocar acima de
tudo a legalidade
havia escravos
de 1888, a proposta dos atos do Parla­ no Brasil
determinando o fim mento – esbrave­
da escravidão no País. jou o representan­ Há quem diga que os
Dois dias depois, o pro­ te dos fazendeiros primeiros negros foram
jeto já estava aprovado fluminenses, acu­ trazidos ao Brasil en­
em segundo turno, e sando os abolicio­ tre os anos de 1516 e
seguia pa­ra o Senado. nistas de rasgar o 1526, mas somente com
A aprovação se deu Regimento da Câ­ o desenvolvimento do
em tempo recorde, mara. cul­tivo da cana no Nor­
graças ao esforço da O Barão de Lu­ deste cresceu significati­
bancada antiescrava­ cena sub­meteu à vamente a demanda por
gista – lidera­da pelo votação o requeri­ negros escravos. É difícil
pernambucano Jo­a­ mento, apro­vado avaliar com precisão o
quim Nabuco – e com Na Câmara, 83 deputados votaram a favor da abolição; apenas nove, contra pelo Plenário da volume do tráfico exter­
a a­ju­da do presidente Câmara, por am­ no para o Brasil duran­
da Casa, Henrique Perei­ do pelas galerias. Joaquim de uma comissão especial e pla maioria. Dispensados te os três séculos e meio
ra de Lucena, o Barão de Nabuco era um dos mais a dis­pensa de todos os pra­ diversos prazos e exigên­ de duração do trabalho
Lucena (PE). O mi­nistro emocionados. zos e interstícios para que a cias regimentais, menos de escravo. A maioria dos
da Agricultura, de­putado – A escravidão ocupa o lei pudesse ser votada pela três horas após a leitura do estudiosos estima a vin­
Rodrigo Augusto da Silva, nosso território, oprime a Câmara no dia seguinte. projeto a comissão especial da de aproximadamente
que foi o portador da men­ consciência nacional e é An­drade Figueira, depu­ criada para analisar o as­ 3,5 milhões.
sagem, leu o sucinto texto pi­­or do que o estrangeiro tado pelo Rio de Janeiro e sunto já apresentava pare­ Os escravos trazidos
de apenas dois artigos. pisando no território da líder da bancada antiaboli­ cer favorável em Plenário. ao Brasil pertenciam a
Pá­­­tria. Precisamos apres­ ção, protestou, sem suces­ Na quinta-feira, dia 10, dois grupos de língua e
Urgência sar a passagem do projeto, so, contra a tentativa de com 83 votos favoráveis e cultura distintas: o dos
Terminada a leitura, o de modo que a libertação ace­lerar a tramitação. apenas 9 contrários, o pro­ sudane­ses, encontrados
Ple­­nário irrompeu em rui­ seja imediata – propôs Na­ – Qualquer que sejam as jeto recebeu aprovação fi­ nas re­­giões mais ao nor­
do­sas manifestações, segui­ buco, sugerindo a criação impaciências para conver­ nal dos deputados. te do litoral africano, e
os bantos, nas áreas ao
sul do Equador.
Rodrigo Silva: Uma pequena, mas crucial, O Gabinete Dantas,
Figueira acusa que esteve no poder de
toda a sociedade emenda de redação 6 de junho 1884 a 5 de
governo de ceder maio de 1885, e levan­
a “apopléticos” quer a abolição Graças ao zelo legislativo da extinta a escravidão no tamento realizado em
e à experiência de minis­ Brasil”, o deputado acres­ 1887 forneceram dados
O deputado Andrade O portador do projeto de tro do Supremo Tribunal centou “desde a data desta es­tatísticos sobre a po­
Fi­guei­ra, da Província do lei que acabou com a es­ de Justiça (STJ) do de­ lei”. O deputado contestou pulação escrava no Bra­
Rio de Janeiro, apontou cravidão no Brasil, depu­ putado baiano Barão de as acusações de que a alte­ sil nos últimos anos:
a “intervenção dos pode­ tado e ministro da Agricul­ Araújo Góes, o projeto de ração seria “inútil”.
res públicos na solução tura Rodrigo Silva, reagiu lei que acaba com a es­ – É uma necessidade in­ 1873:
de um assunto eminente­ da tribuna às críticas de cravidão pôde entrar em declinável em face da legis­ 1.541.348 escravos
mente social”, ao acusar o An­drade Figueira à deci­ vigor imediatamente após lação, porque a lei não pode 1883:
gover­no im­perial de ceder são do governo imperial ser sancionado pela Prin­ vigorar na Corte senão oito 1.211.946 escravos
às pressões da imprensa e de apresentar a proposta. cesa Isabel. Araújo Góes dias e nas províncias senão
dos “apo­pléticos” da abo­ Segundo o ministro, em to­ conseguiu apoio do Plená­ três meses depois de pu­ 1887:
lição ao enviar o projeto das as democracias o poder rio para inserir pequena e blicada. É necessário que 723.419 escravos
de lei. público tem o dever de in­ crucial emenda de redação o prazo que se exige para
Entre poucos aplausos terferir na solução de pro­ ao Artigo 1º do texto origi­ a Corte seja o mesmo para A classificação, por
e seguidos gritos de “não blemas sociais como o do nal. Onde se lia “é declara­ todo o Império. idade, dos 723.419 es­
apoiado”, Andrade Fi­ elemento servil. cravos matriculados no
gueira reverberou o sen­ – Não havia um só órgão levantamento de 1887 é
timento da bancada de respeitável, desses que for­ a seguinte:
proprietários rurais de seu mam o sentimento de um
estado. po­vo e a opinião de uma Menores de 30 anos:
– Que necessidade tão
ur­gente é esta quando o
nação, que não estivesse
em­penhado nesta cruzada.
Projeto é ameaça à ordem 195.726 escravos
De 30 a 40 anos:
problema tem sua solução Se observamos esta agi­
tação pacifista por toda a
pública, diz Alfredo Chaves 336.174 escravos
natural nas leis de 1871
[Ventre Livre] e 1885 par­te, poderíamos, aceitan­ Um dos nove deputados sequer, de proverem a sua De 40 a 50 anos:
[Sexagenários]? Com a do o poder, cruzar os bra­ que votaram contra a extin­ subsistência – disse o de­ 122.097 escravos
sua intervenção, os pode­ ços e deixar que a revolu­ ção da escravatura, Alfredo putado es­cravagista, em re­
res públicos não fizeram ção decretasse a libertação Chaves dirigiu seus ataques ferência ao número de 600 De 50 a 55 anos:
mais do que comprometer dos escravos? – questionou ao ministro Rodrigo Silva, mil escravos que ainda exis­ 40.600 escravos
a marcha do problema, o deputado. que para ele apresentou o tiam no país.
produzindo uma agitação Rodrigo Silva citou a de­ projeto “sem nenhuma razão Para o deputado, o go­ De 55 a 60 anos:
estéril, promessas engana­ fesa da abolição pela Igre­ de estado”, cedendo a pres­ verno imperial caiu em 28.822 escravos
doras, pe­­­sares dolorosos ja, academias, tribunais e sões e ig­norando os direitos contradição ao apre­sentar
– acusou o deputado, em famílias. Até mesmo, disse, dos pro­prietários rurais. o projeto apenas três anos
referência à expectativa “os próprios interessados – O projeto é uma amea­ depois da Lei do Ventre Li­ bacharel duponchel
de emancipação de escra­ na manutenção da proprie­ ça iminente à or­dem públi­ vre, que fixava critérios de lecciona
vos criada pelas leis an­ dade escrava da­vam dia­ ca, porque não se tomaram reparação aos senhores de todas as
materias do curso
teriores. Para Figueira, a riamente exemplos os mais precauções para garantir a escravos, além de estabe­ preparatorio.
estratégia governamental admiráveis de abnegação, lecer as con­dições em que Cartas no escriptorio desta re
so­cieda­de contra essa classe
dacção
de emancipação gradual libertando os seus escravos de cidadãos novos que a ela o fim completo do regime RESIDENCIA EM NITHEROY
enganou os proprietários. incondicionalmente”. são atirados, sem os meios, servil se daria no país. 93 RUA NOVA 93
5 Jornal do Senado Uma reconstituição histórica Rio de Janeiro, segunda-feira, 14 de maio de 1888

O domingo da vitória no Senado


Proposta foi aprovada ontem, em sessão extraordinária, sem dificuldades

A
s atenções da Cor­ e mais veemente aspiração
te se voltaram, no nacional”.
sábado e no do­
mingo, 13 de maio, para o Aprovação
Senado do Império, onde No sábado dia 12, du­
se processava a discussão rante a segunda discussão,
final do Projeto de Lei nº Cotegipe fez longo pro­
1 da Câmara dos Deputa­ nunciamento contrário à
dos, que baniu de forma proposta, que foi aprovada
imediata e incondicional domingo, dia 13, em sessão
a escravidão no território extraordinária.
brasileiro. A proposta foi Na direção dos traba­
aprovada sem dificuldades lhos da Casa, o senador
pela Casa. Apenas dois se­ Cruz Machado designou
nadores, os conservadores, a comissão que levaria o
João Maurício Wanderley, pro­jeto ao Paço e que foi
o Barão de Cotegipe (BA), composta pelos membros
e Paulino de Sousa (RJ), o da comissão que ofereceu o
Segundo Visconde do Uru­ parecer e ainda por outros
guai (RJ), se posicionaram nove senadores.
contra a iniciativa. O senador e presidente do
Logo após a leitura da Conselho de Ministros João
pro­posta na sessão do últi­ Alfredo (PE) comunicou,
mo dia 11, pelo 1º vice-pre­ Em frente ao Palácio dos Arcos, populares aguardam aprovação do projeto pelos senadores então, ao Plenário da Casa
sidente do Senado, Antônio que Sua Alteza a Prince­
Cândido da Cruz Machado, especial de cinco membros Sou­sa Dantas, Affonso A comissão apresentou sa Regente receberia às 3
que exercia a Presidência destinada a dar o parecer Celso (pai), o Visconde de imediatamente o parecer, horas da tarde, no Paço
da Casa, o líder do libera­ so­bre o projeto. Ouro Preto (MG), Jerô­ des­tacando que a proposta da Cidade, a comissão de
lismo abolicionista, sena­ A solicitação foi acolhida nimo José Teixeira Júnior continha “providência ur­ senadores que levaria o de­
dor Manuel Pinto de Sousa sem debate e Cruz Macha­ (RJ), José Antônio Correia gente, por inspirar-se nos creto da Assembléia Geral
Dantas (BA), solicitou que do nomeou para compor da Câmara (RS) e Alfredo mais justos e imperiosos in­ declarando extinta a escra­
fos­se nomeada a comissão o colegiado os senadores Escragnolle Taunay (SC). tuitos” e satisfazia “a mais vidão no Brasil.

“A lei reconhece como “Medida arriscadíssima Acordo quase unânime


propriedade e matéria para a ordem social e “Não há perigo algum. garante “força moral e
tributável o escravo” econômica da Nação” Esta lei vale por uma prestígio” à decisão
“A verdade é que vai haver uma Repetindo argumentos do Barão
nova Constituição” Em resposta aos argumentos
perturbação enorme no País du­ de Cotegipe e do deputado An­ Contestan­ de que a abolição deverá acarre­
rante muitos anos, o que não verei drade Figueira contra a abolição, to os senado­ tar transtornos, o senador Manuel
talvez, mas aqueles a quem Deus o senador Paulino de Sousa (RJ) res Paulino e Francisco Correia (PR) afirmou
conceder mais vida, ou que fo­ afirmou que a proposta era “in­ Cotegipe, o que “não se extirpa do organismo
rem mais moços, presenciarão.” A constitucional, antieconômica e senador Sou­ social um cancro secular sem que
previsão som­ de­sumana”, porque deixaria “ex­ sa Dantas perturbações se operem”.
bria foi feita postos à miséria e à morte os in­ (BA) afirmou Mas o senador conservador disse
pelo senador válidos, os enfermos, os velhos, os da tribuna acreditar na “cicatriz de uma feri­
Barão de Co­ órfãos e crianças abandonadas da que a aboli­ da” que nunca mais será aberta,
tegipe, ao des­ raça que quer proteger”. ção não mar­ possibilitando então a “prosperi­
ferir críticas Apontando o projeto da abolição Sousa Dantas
cará no Brasil dade da Pátria”.
ao projeto da como algo “arriscadíssimo para a “uma época – É grande fortuna para o Im­
abolição. ordem social e econômica da Na­ de miséria, pério que a lei
Para o sena­ ção”, o senador criticou também o de sofrimentos e de penúria”. possa ser pro­
dor, “ninguém “trân­sito pressuroso” da matéria Dantas manifestou a con­ mulgada, re­
acreditará no na Casa. Na sua avaliação, o ele­ vicção de que “o desapareci­ vestida de for­
Barão de Cotegipe futuro que se mento servil era o “único trabalho mento de 600 mil criaturas ça moral e do
realizasse com organizado em qua­se todo o País, escravas”, em vez de produ­ prestígio que
tanta precipitação e tão poucos que não podia zir “a nossa ruína”, tornará o lhe dá o acor­
escrúpulos a transformação que ser tão rápida Brasil mais próspero, graças do refletido e
vai aparecer”. e subitamente ao trabalho livre. quase unâni­
A principal crítica de Cotegipe se suprimido”. – Não há, portanto, perigo me de ambas
referia ao fato de que a proposta Paulino dis­ algum, e até onde a minha voz, as parcialida­
não previa indenização aos pro­ se que, para a a minha responsabilidade, a Manuel Francisco des políticas –
prietários de escravos. emancipação confiança que eu possa ins­ Correia finalizou.
Afirmando que a propriedade dos escravos pirar aos meus concidadãos,
sobre o escravo era uma criação do das colônias até onde a minha experiência
direito, ele enfatizou que “a Cons­
tituição, a lei civil, as leis eleitorais,
francesas, a
partir de 1848,
dos negócios, o meu estudo de
todos os dias me puderem dar PROGRAMMA
as leis de fazenda, os impostos etc., Sousa Dantas foi observado alguma autoridade, eu direi DAS
tudo reconhece como propriedade um prazo de des­ta cadeira a todo o Brasil
e matéria tributável o escravo, as­ dois meses, contados da promulga­ que nós, hoje, vamos consti­ GRANDES REGATAS
sim como a terra”. ção do ato, e garantido fundo para tuir uma nova Pá­tria, que esta
Com a abolição, segundo Co­ indenização aos proprietários. lei vale por uma nova Consti­ NA
tegipe, estaria se decretando que
no país “não há propriedade, que
– Devo dizer que iludem-se ou
querem iludir-se os que acreditam
tuição – sustentou.
Sousa Dantas declarou
Enseada de
tudo pode ser destruído por meio remover uma grande dificuldade ainda que a votação pro­ Botafogo
de uma lei sem atenção nem a di­ com esta lei da abolição do elemen­ posta repre­sen­tava o maior
reitos adquiridos nem a inconve­ to servil; pelo contrário, é agora acontecimen­to da história do EM HOMENAGEM Á
nientes futuros”. que recressem, com a desorganiza­ País, e, ao concluir, recitou
– Entendo que grandes males vão ção do trabalho e com a entrada de estes três pequenos versos do ABOLIÇÃO
surgir dessa medida, que convém 700 mil indivíduos não preparados século 13:
que sejam, o quanto antes, toma­ pela educação e pelos hábitos da li­ Sabbado 19 de maio de 1888
das providências em benefício não berdade anterior para a vida civil, “O’ libertad!
só da lavoura, como também dos as contingências previstas para a Luz del dia! ÁS 1 1/2 DA TARDE EM PONTO
que vão ser libertados. ordem econômica e social. Tu me guia”.
6 Jornal do Senado Uma reconstituição histórica Rio de Janeiro, segunda-feira, 14 de maio de 1888

Uma luta social, política e econômica


Campanha pelo fim da escravidão no país envolveu monarquistas e republicanos

A
abolição da escravatura ta Joaquim Nabuco, a primeira nhos da mesma causa, entre eles Mas a forte pressão social e mo­
foi um processo secu­lar fase do movimento pelo fim da Ruy Barbosa, José do Patrocínio e ral e a redução do interesse eco­
resultante de mobilizações escravidão, entre 1879 a 1884, Tobias Barreto. Já falecidos, Luís nômico pelo negro, que com o
sociais – inclusive dos próprios quando “os abolicionistas com­ Gama e Castro Alves também tempo passou a apresentar custo
negros –, morais, políticas e eco­ bateram sós, entregues aos seus não podem ser esquecidos nessa maior que a mão-de-obra livre
nômicas. Da assinatura da Lei próprios recursos”. batalha. competitiva, culminaram com a
Eusébio de Queirós, que proibiu Mais tarde, discursos nas tribu­ Mesmo os republicanos tiveram aceitação dos parlamentares pela
o tráfico negreiro, já se passaram nas, artigos e poemas em jornais maneiras diferentes de pensar a abolição total dos ainda escra­
38 anos de intensa campanha bra­sileiros e estrangeiros e a forte abolição. O Congresso exprimiu vos.
abolicionista que se finda agora pressão sobre o Império fizeram por um bom tempo o pensar dos Um pouco antes da proibição
com a Lei Áurea. ru­­ir de vez a escravidão. pau­listas que não adotavam a so­ do tráfico negreiro, o preço do es­
Com exemplos europeus de abo­ No geral, todos os republicanos lução geral e totalmente liberta­ cravo já subia no mercado com a
lição da mão-de-obra escrava, mostravam-se abolicionistas, mas dora. previsão de que não seriam mais
por um bom tempo, o processo nem todos os que lutaram pela li­ A proposta era que o proble­ trazidos negros para o Brasil.
da crítica abolicionista no Brasil bertação dos escravos preferem ma fosse resolvido gradualmente, Essa alta manteve-se até 1880,
concentrou-se em espaços como a República. Monarquistas como conforme o interesse de cada pro­ em especial pela forte demanda
clubes, lojas maçônicas, associa­ André Rebouças e Joaquim Na­ víncia, aceitando o princípio da da lavoura cafeeira. Agora, quan­
ções, cafés e jornais e, aos poucos, buco têm sido incansáveis nessa indenização, reconhecendo o que do se assina a Lei Áurea, boa par­
estendeu-se à população. luta pelo fim da escravidão. Mui­ alguns chamam de “o direito do te da mão-de-obra escrava já foi
Essa foi, segundo o abolicionis­ tos outros são defensores ferre­ homem sobre o homem”. substituída.

Grandes defensores da abolição


Joaquim Nabuco
Abolicionistas negros
D iplomata, historiador, jurista, jorna­
lista e político, Joaquim Na­bu­co foi o
maior porta-voz do abolicionismo parla­ André Rebouças
mentar. Sua campanha an­tiescravocrata
na Câmara dos Depu­tados começou em
1878. Fundou a Sociedade Antiescra­
vidão Brasileira, o que mostra sua lu­
FRebouças
ilho de um advogado mulato autodidata e da filha
de um comerciante, o engenheiro baiano André
engajou-se no movimento abolicionista ao
ta veemente pelo fim do trabalho servil. lado de defensores da causa como Joaquim Nabuco.
Ele apresentou projeto de lei em 1880 Monarquista, muito ligado ao Imperador Dom Pe­
propondo o fim da escravidão a partir dro 2º, a partir de 1872 dedicou-se integralmente à
de 1890, com indenização dos proprie­ abolição da escravatura, ajudando a criar a Socieda­
tários, o que provocou choque com os de Brasileira contra a Escravidão e a Confederação
mais radicais, que sempre exigiam a abolição imediata e sem Abolicionista. Publicou diversos artigos em jornais
que houvesse qualquer paga aos senhores de escravos. Três contra o trabalho servil, propondo sempre a conci­
anos mais tarde, em Londres, o maçom Joaquim Nabuco es­ liação entre as classes.
creveu O Abolicionismo, em que defende a abolição legalista,
imediata e não mais com indenizações.
José do Patrocínio
Ruy Barbosa
Eassinatura
ntre os abolicionistas negros, José do Patrocínio
foi incansável até os segundos que antecederam a

Eriosscolhido para redigir o Projeto Dan­


tas, precursor da Lei dos Sexagená­
em 1885, tornando livre todos os
da Lei Áurea. Para o jornalista, filho de
mãe escrava e de um vigário, “a propriedade escra­
va é um roubo duplo”.
escravos com idade igual ou superior a Natural do Rio de Janeiro, tornou-se muito cedo
65 anos, Ruy Barbosa também destaca- um articulista famoso. Depois de conhecer a Prince­
se entre os defensores do abolicionismo. sa Isabel, fundou o jornal A Gazeta da Tarde e pas­
Seu texto não foi aprovado pela Câ­ sou a ser chamado de O Tigre da Abolição. Ao lado
mara porque propunha a liberdade dos de André Rebouças, criou em 1883 a Confederação
escravos a partir dos 60 anos, sem que Abolicionista.
houvesse indenização aos proprietários,
o que causou grande revolta dos senho­
res. Foi aprovada então a Lei Saraiva- Luís Gama
Cotegipe, muito menos abrangente.
Iniciou sua carreira política como deputado na Bahia em
1878. Desde os tempos de estudante participou ativamente
nas campanhas de combate à escravidão e o faz por meio das
O advogado e jornalista Luís Gonzaga Pinto da Gama
era filho de um fidalgo português e da africana
Luí­sa Maheu, de Nagô, que diversas vezes foi presa
associações abolicionistas, da imprensa e da tribuna. por estar envolvida com insurreições de escravos.
Nascido em 1830, Luís Gama teria sido vendido
como escravo, de forma ilegal, pelo seu pai, aos 10
Castro Alves anos. Foi um símbolo do movimento pela abolição
em São Paulo, tendo sido responsável pela libertação

O “Poeta dos Escravos e da Liberdade”


fez de seus versos palavras fortes na
luta pela abolição da escravatura. Nasci­
de mais de mil escravos cativos. Morreu em 1882,
seis anos antes da assinatura da Lei Áurea.

do em Muritiba (BA), em 1847, Antônio


Frederico de Castro Alves morreu aos 24 Tobias Barreto
anos, muito antes da assinatura da Lei
Áurea.
Em 1868, em um gesto de coragem, fez
a apresentação pública, em uma come­
U m dos principais nomes do condoreirismo, escola
literária da poesia brasileira marcada pela temá­
tica social e defesa de idéias igualitárias, Tobias Bar­
moração cívica onde estavam diversos se­ reto, assim como Castro Alves, fez de alguns de seus
nhores de escravos, do poema Tragédia poemas armas para o combate à escravidão.
no mar, que depois passou a ser chamado Além de poeta, Tobias Barreto é filósofo, crítico e
de O navio negreiro. jurista. Sergipano, ele se declara o “mestiço de Ser­
A obra é uma crítica ferrenha do republicano Castro Alves gipe”. Em 1868, publicou o poema A Escravidão. De
aos maus-tratos a que eram submetidos os negros, desde sua 1871 a 1881, viveu em Escada, em Pernambuco, ci­
captura até a sua utilização desumana nos latifúndios. Um dade que teve de deixar após ter alforriado todos os
clássico, o poema foi escrito quando ele tinha apenas 21 anos. escravos que pertenciam a seu sogro.
7 Jornal do Senado Uma reconstituição histórica Rio de Janeiro, segunda-feira, 14 de maio de 1888

Resistência começou no século XVI


Primeiros registros de escravos fugitivos são de 1575, na Bahia

O
s africanos escravi­ tavam com o trabalho dos Nas capitanias do Rio
zados no Brasil não capitães-do-mato. Negro e do Grão-Pará, as
demoraram muito As capitanias de Sergipe comunidades negras tam­
para dar início aos movi­ e da Bahia foram tomadas bém recebiam militares de­
mentos de fuga e formação por mocambos no início do sertores e índios. Há regis­
de acampamentos arma­ século 17. Na Paraíba, em tros de fugitivos em outras
dos que, além de servirem 1691, se formou o Quilom­ regiões da Floresta Ama­
de moradias, eram princi­ bo do Cumbe, combatido zônica, assim como nas ca­
palmente centros de resis­ em 1731. pitanias do Espírito Santo
tência e contribuíram para No Rio de Janeiro, os e de Minas Gerais.
o fim do trabalho escravo primeiros registros são de Na segunda metade do
no país. 1625. No século seguin­ sé­culo 18, as denúncias
Ainda no século 16, por te, os mocambos surgiram contra os quilombos sur­
volta de 1575, o Império já em Cabo Frio, Campos dos gem no Rio Grande do Sul,
recebia notícias da movi­ Goitacazes e Saquarema. em Mato Grosso e Goiás.
mentação de escravos fugi­ O escravo que se insurgisse contra o trabalho servil e a
O século 18 foi de ex­ Muitos desses grupos fo­
tivos na Bahia. repressão era violentamente punido, sem direito a defesa pansão dos grupos negros, ram desenvolvendo ao lon­
Inicialmente eles se reu­ quando a denominação go dos anos relações com
niram no que se chamou mocambo foi substituída as comunidades locais. A
de mocambo, espécie de Em 1588 foi publicado dão no Brasil, houve gran­ por quilombo. No Mara­ própria Princesa Isabel, às
acampamento militar e regimento que estabelecia de enfrentamento de tropas nhão, as tropas atacaram vésperas de assinar a Lei
moradia dos negros de lín­ “punição exemplar” para do governo e perseguições grupos que se reuniam en­ Áurea, já havia acolhido e
gua bantu da África Cen­ os fugitivos. Nos quase determinadas pelos senho­ tre os rios Gurupi e Turiaçu hospedado mais de mil fu­
tral e Centro-Ocidental. quatro séculos de escravi­ res dos escravos, que con­ no início dos anos 1700. gitivos.

População de Palmares pode


ter ultrapassado 20 mil pessoas
As maiores comunidades o governo colonial deram
de fugitivos de toda a Amé­ início a numerosas caçadas Navios negreiros, navios de horrores
rica concentraram-se na e ataques a Palmares para
região açucareira de Per­ recapturar os fugitivos. No poema O navio ne- dências” contra “o trata­ convenientemente conter;
nambuco e de Alagoas. Vá­ Os líderes negros de maior greiro, Castro Alves relata mento duro e inhumano faltando-lhes com alimen­
rios núcleos de povoamento representatividade foram os horrores que sofriam que, no transito dos portos tos necessarios para a sub­
de negros fugitivos forma­ Ganga Zumba e seu sobri­ homens, mulheres e cri­ africanos para os do Bra­ sistencia delles, não só na
ram o Quilombo dos Pal­ nho Zumbi, que acabou as­ anças nos navios que os zil, soffrem os negros, che­ quantidade, mas até na
mares, que pode ter abriga­ sassinado. Foram mais de transportavam da África gando a tal extremo a bar­ qualidade, por lhes forne­
do mais de 20 mil pessoas 18 as expedições realizadas para o Brasil. Arranca­ baridade e sordida avareza cerem generos avariados
por volta de 1670. Os regis­ até que se conseguisse aca­ dos da terra natal, eram de muitos dos mestres das e corruptos, que po­dem
tros indicam sua fundação bar definitivamente com o submetidos a toda sorte embarcações que os con­ haver mais em conta; re­
em 1597. Quilombo de Palmares, por de doenças, maus-tratos, duzem (...)” sultando de hum tão abo­
Localizado na serra da volta de 1710. fome e frio na travessia do Segundo o alvará, esses minavel trafico, que se não
Bar­­­riga, Zona da Mata ala­ Outra forte ação negra Atlântico. mestres, “seduzidos pela pode encarar sem horror e
goana, o quilombo resistiu aconteceu na Revolta dos O quadro é também des­ fatal ambição de adquirir indiganação manifestarem
por mais de um século a Malês, de 25 a 27 de janeiro crito, em 1813, por Dom fretes, e de fazer maiores se enfermidades, que, por
fortes combates de tropas de 1835, quando centenas João VI, que, no alvará de ganhos, sobrecarregão os falta de curativo e conve­
do governo colonial. de escravos africanos adep­ 24 de novembro daquele navios, admitindo nel­ ni­ente tratamento, não
As invasões holandesas no tos do Islã lutaram nas ruas ano, determina a adoção les muito maior numero tar­dão a fazerem-se epide­
Brasil, entre 1624 e 1654, de Salvador contra tropas de “humanitárias provi­ de negros do que podem micas e mortais”.
interferiram na rotina dos de cavalaria e milícias.
engenhos e, com isso, aju­ Os malês queriam o fim
daram a fuga dos negros e do catolicismo, que lhes era
a formação dos núcleos de imposto, assassinar os bran­
povoamento do quilombo, cos e confiscar seus bens e
sendo Macaco, Subupira, o direito de praticar o isla­
Zumbi e Tabocas os prin­ mismo.
cipais. O governo conseguiu im­
Mas a expulsão dos holan­ pedir os ataques aos quar­
deses do Nordeste brasileiro téis de Salvador. Nos con­
fez aumentar a necessida­ frontos ocorridos, morreram
de de mão-de-obra para sete integrantes das tropas
os engenhos e, por isso, os oficiais e 70 negros. Outros
proprietários de terras e 281 foram presos.

29 RUA GONSALVES DIAS


29
CASA DO ALMEIDA
CASA DO ALMEIDA

CASA DO ALMEIDA
FAZENDAS, MODAS E ARMARINHO
Grande sortimento de voile de pura lã, metro 600 réis Nos porões dos navios, os negros eram amontoados, comprimidos uns contra os outros

Alvará determinou “espaço aos cativos para se moverem e respirar”


Para minimizar a situa­ estava a limitação do caravelas que saíam para não poderia passar de 3%, que precisavam oferecer
ção cruel a que eram sub­ número de negros trans­ o Brasil carregavam, em mas o percentual chegava variedade e qualidade.
metidos os negros a bordo portados, “dando-se aos média, de 500 a 700 ne­ a 10%, em média. Os navios, conforme o
dos navios negreiros, al­ cativos espaço para se gros. Além disso, deveria ha­ alvará, teriam de apre­
vará de 24 de novembro moverem e respirar”. Todos os navios negrei­ ver fiscalização sanitária sentar condições de salu­
de 1813, de Dom João VI, Também deveria ter um ros precisavam ter um da tripulação e dos escra­ bridade, asseio e ventila­
determinava uma série de livro de carga para fis­ “cirurgião-perito” e uma vos, para evitar a trans­ ção, o que, pelo número
condutas. calizar a lotação e a pro­ enfermaria aparelhada. A missão de moléstias, as­ excessivo de escravos a
Entre as providências, priedade dos escravos. As mortalidade dos escravos sim como dos alimentos, bordo, não ocorria.
8 Jornal do Senado Uma reconstituição histórica Rio de Janeiro, segunda-feira, 14 de maio de 1888

Ceará acabou com a


escravidão há 4 anos Reparação aos ex-escravos
precisa ser discutida
Medida repercutiu intensamente na Corte e que envolve as conseqüên­
estimulou o abolicionismo em outras províncias cias de um processo que
era inevitável diante de sé­
culos de domínio sobre as

N
as duas últimas dé­ caram. Um grande desfile barbárie recua e a civiliza­ populações negras, e que
cadas, a idéia de atravessou a cidade antiga, ção avança”. não foram contempladas
libertação dos es­ desde a Rua 1º de Março Embora a luta final te­ com nenhum tipo de com­
cravos foi aos poucos se ir­ até o passeio público. nha se dado na cidade de pensação.
radiando para o interior do Fortaleza, foi no interior Em razão disso, é lícito
Brasil, motivando vários Victor Hugo da província, na pequena prever que a pauta de de­
segmentos da sociedade, Em meio às manifesta­ vila de Aracape, que logo bates do Parlamento, neste
desde simples jangadeiros ções, o presidente da Pro­ depois se chamaria Reden­ final do século 19, deverá
e donos de barcaças no víncia, Sátiro de Oliveira ção, que a Sociedade Cea­ incluir propostas visan­
Nordeste, que se recusa­ Dias, declarou em tom so­ rense Libertadora liderou a do contemplar, de alguma
vam a participar do trans­ lene: “Para a glória imor­ primeira grande campanha forma, os ex-escravos e
porte de cativos, a jorna­ tal do povo cearense e em pela abolição. seus descendentes. É possí­
listas, poetas, escritores e nome e pela vontade desse Os jangadeiros também vel até que essa discussão
políticos que abraçaram mesmo povo, proclamo ao tiveram papel decisivo no não tenha fim na próxima
a causa com entusiasmo. país e ao mundo que a pro­ processo cearense de abo­ década e termine se esten­
A criação de trabalho para os
Na Província cearense, o víncia do Ceará não possui lição da escravatura. Em libertos é uma preocupação dendo pelo século 20, mas
fim da escravidão foi pro­ mais escravos”. 27 de janeiro de 1881, ten­ deve-se ter em vista que a
clamado há quatro anos. O O abolicionista José do do à frente Francisco José reparação que precisa ser
Ceará assumiu, no dia 25 Patrocínio, que se encon­ do Nascimento, conhecido Não faltaram discursos atribuída aos ex-escravos e
de março de 1884, a res­ trava em Paris dias antes do como “Dragão do Mar”, de abolicionistas como Joa­ sua gente não se confunde
ponsabilidade histórica de banimento da escravidão os jangadeiros firmaram quim Nabuco, José do Pa­ com qualquer tipo de dá­
proclamar a extinção do no Ceará, enviou carta ao sua posição: “No porto do trocínio, Luís Gama e Ruy vida, por representar, isto
trabalho escravo em todo escritor Victor Hugo comu­ Ceará não se embarcam Barbosa defendendo a ne­ sim, um legítimo direito.
o seu território. A iniciati­ nicando que uma província mais escravos!”. Com esta cessidade de oferecer opor­ Ao longo da luta pela abo­
va pioneira repercutiu in­ brasileira estava prestes a atitude, eles conseguiram tunidades para integrar os lição foram discutidas pro­
tensamente na Corte e nas ser considerada liberta do de fato abolir o tráfico de ex-escravos à sociedade. A postas nesse sentido, como
províncias, reforçando os cativeiro. Ele pedia ao po­ escravos na província. grande dívida para com os a criação de colônias agrí­
movimentos que já come­ eta uma palavra de anima­ Assim como ocorria no escravos libertos deve ser colas para os libertos, a de­
çavam a tomar corpo em ção, um conselho, que ser­ Ceará, a luta pela abolição saldada, para que se possa sapropriação de terras não
outras partes do país, como visse de encorajamento ao agregou não apenas figuras construir uma sociedade exploradas e o desenvol­
Amazonas, Bahia e Paraí­ Imperador Dom Pedro 2°, de expressão nas provín­ justa e igualitária. vimento da agricultura. É
ba. no sentido de engajar-se na cias e na Corte. Militares Neste momento em que o mister que se estudem ain­
A grande festa da abo­ campanha pela abolição. recusavam-se a perseguir Brasil comemora a assina­ da outras formas de repara­
lição no Ceará reuniu a O grande pensador fran­ escravos fugidos; mascates tura da Lei Áurea, alguns ção, como oportunidade de
população da capital, na cês, na resposta a Patro­ ajudavam na distribuição abolicionistas colocam em emprego na cidade e acesso
Praça Castro Carreira. Ca­ cínio, considerou “grande dos panfletos a favor da foco a preocupação diante à educação, conferindo dig­
nhões da Fortaleza de Nos­ novidade” o gesto dos ce­ abolição; ferroviários es­ do quadro ainda nebuloso nidade ao indivíduo.
sa Senhora de Assunção arenses e reforçou que com condiam negros nos trens
reboaram e os sinos repi­ a iniciativa libertadora “a ajudando-os nas fugas.

Movimento abolicionista se
espalhou pelas províncias
A Sociedade Emancipa­ lar em 1870.
dora Amazonense, funda­ Em Goiás, o movimento
da em 1870, cumpriu pa­ chegou a causar conflitos,
pel decisivo na campanha mas nos meses que antece­
libertadora na Província deram a assinatura da Lei
do Amazonas. A 24 de Áurea a escravidão estava
abril de 1884, a Assem­ quase extinta em toda a
bléia Provincial autorizou província. No Rio de Janei­
o governo a despender 300 ro, houve embates violen­
contos com alforrias. A 24 tos, em especial em áreas
de maio foi reconhecido onde a lavoura cafeeira
oficialmente que Manaus se expandiu. A mobiliza­
não tinha mais escravos. ção cresceu em meados de
Em Pernambuco, a luta 1870. Nesse ano, um grupo
contou com os nomes de de parlamentares lançou
José Mariano, João Ramos, campanha pela abolição
Gomes de Matos e outros da escravatura. No final de
Os negros mantiveram tradições do continente africano, como o jogo da capoeira que criaram o Clube do 1887, já ocorriam alfor­
Cupim. O movimento con­ rias espontâneas em toda a
seguiu minar a força dos província.
escravocratas. As barcaças Em São Paulo, diversas
Mossoró se destaca como cidade pioneira pernambucanas também cidades libertaram seus es­
A força do movimento – Mossoró está livre: início deste ano. apoiaram a fuga de escra­ cravos no ano passado. Em
abolicionista logo atingiu aqui não há mais escra­ No Piauí, em 1870, o vos. São Carlos, o fim do cati­
Mossoró, que abraçou a vos!. jornalista David Moreira Na Província da Bahia, o veiro foi proclamado em
causa com entusiasmo O exemplo dessa cida­ Caldas iniciou ardorosa movimento ganhou a ade­ dezembro. No Rio Grande
– especialmente a Loja de passou a ser seguido campanha abolicionista são da imprensa de Salva­ do Sul, o movimento co­
Maçônica 24 de Junho. por comunidades do in­ pela imprensa, fundando dor, que decidiu não mais memorou a libertação da
A cidade comemorou em terior da Província do Rio o jornal Oitenta e Nove, publicar anúncios de fuga, capital em 1884. Com um
grande evento, no dia 30 Grande do Norte. Açu li­ que em sua primeira edi­ compra e venda de escra­ número menor de escravos,
de setembro de 1883, o bertou seus escravos em ção, de 1º de fevereiro de vos. Pessoas simples, como em relação às demais pro­
fim da escravidão. Naque­ 24 de junho de 1885; de­ 1873, “profetizou” a pro­ Manoel Roque, negro e víncias, o Paraná também
la ocasião, o líder da So­ pois Carnaúba, em 3º de clamação da república operário, e personalidades, se engajou na luta, e antes
ciedade Libertadora Mos­ março de 1887; e, logo a bra­­sileira no centenário como Castro Alves, deram da lei, cidades como Porto
soroense, Joaquim Bezerra seguir, Triunfo, em 25 de da Revolução Francesa, grande força ao movimen­ de Cima já estavam livres
da Costa Mendes, fez uma maio de 1887. Natal não no próximo ano, ou seja, to que começou a se articu­ da escravidão.
declaração histórica. possuía mais escravos no em 1889.

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