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Cordéis e Outros Poemas – Patativa do Assaré.

O livro contém 15 poemas de cordel e mais dois poemas muito conhecidos de Patativa
do Assaré: Cante Lá, que Eu Canto Cá, poema que serviu de titulo para sua mais
conhecida coletânea e A Terra é natura, poema em que defende a idéia de que a terra
deveria ser repartida para todos, ou seja, a reforma agrária.

A literatura de cordel é assim chamada pela forma como eram vendidos estes poemas
em folhetos, pendurados em cordões nas feiras e praças nas cidades de interior do
nordeste brasileiro. A tradição dessas publicações populares, geralmente em versos,
vem da Europa.

Segundo Luís da Câmara Cascudo, os folhetos foram introduzidos no Brasil pelo


cantador Silviano Pirauá de Lima e depois pela dupla Leonardo Gomes de Barros e
Francisco das Chagas Batistas. No início da publicação da literatura de cordel no país,
muitos autores de folhetos eram também cantadores que improvisavam versos viajando
pelas fazendas, vilarejos e cidades pequenas do sertão. Com a criação de imprensas
particulares em casas e barracas de poetas, mudou o sistema de divulgação.

O poeta de cordel usa sempre estrofes de versos regulares e os esquemas de rimas fios.
É comum que usem a redondilha ou versos decassílabos.

O cordel funcionou por bastante tempo, nas pequenas cidades, como uma espécie de
imprensa popular. Nos folhetos narrativos apareciam sempre historias dos
acontecimentos mais recentes, bem como a historia as historias locais dos
acontecimentos familiares, escândalos, misturados a velhos mitos do sertão e lendas que
se formavam. Muitos personagens históricos marcantes no nordeste transformaram-se
em cordéis clássicos, como Lampião, padre Cícero e Raquel de Queiroz.

Também é pelo cordel que o sertanejo faz o gracejo, brincando com uma historia
popular ou um personagem caricato. Ainda hoje o cordel segue também estes modelos
narrativos, inventando, porém, novas possibilidades.
No poema “A Triste Partida” narra, em quadros de dramático sofrimento, a migração de
uma família sertaneja para São Paulo; a dor de deixar tudo para trás, a esperança de
voltar ao sertão. O comovente quadro lembra imediatamente outros dos romances da
seca dos anos trinta, como a família do Chico Bento, em O Quinze, de Rachel de
Queiroz. O poema contém, ao todo, dezenove estrofes regulares (octetos) em métrica de
redondilha menor, ou seja, cinco sílabas poéticas.

Este cordel, “O Padre Henrique e o Dragão da Maldade”, é um longo poema narrativo.


São sessenta e três estrofes regulares (sextilhas), com rimas alternadas e em métrica de
redondilha maior (sete sílabas).

Observem também à interlocução, quando o poeta escreve – Veja meu caro leitor, a
maldade que é – numa atitude de aproximação do leitor, aproximando-o da postura do
cantador, que sempre “conversa” com a platéia ouvinte, tentando convence-la de uma
idéia.

Neste poema, o cordel toma a função de denuncia e reportagem. Patativa denuncia o


assassinato de um jovem padre, inclusive, citado data completa e representa o governo
militar pelo “dragão da maldade”. Cita ainda ao estudante preso, como tantos naquela
época, e clama por democracia, num poema que podemos classificar como poesia de
protesto.

A exaltação da cidade de Juazeiro no poema, ”Saudações a Juazeiro do norte”,


representa uma homenagem a um centro comercial e religioso importantíssimo do Ceará
e Patativa aponta o mito em que se tornou o Padre Cícero, como responsável pelo
crescimento da cidade, que tem seu comercio alimentado pelos romeiros de todos os
dias. Esse poema, diferente dos narrativos, é mais curto: contém nove estrofes regulares
(décimas), sendo os primeiros versos organizados em rimas alternadas e os últimos em
rimas emparelhadas. Os versos são redondilhas maiores (versos de sete silabas
poéticas).
Este Longo poema, “As Façanhas de João Mole” contém 55 estrofes, alternando em
sextilhas em redondilha maior (estrofes de seis versos com sete silabas métricas cada) e
décimas em redondilhas menor (estrofes de dez versos com cinco silabas métricas
cada). Aqui, o poeta adota o tema anedótico, narrando a historia de um lavrador que
vivia sob o jugo violento de duas mulheres: a esposa e a sogra ambas lhe surravam
cotidianamente para mantê-lo sobe controle. A historia detalha o momento em que o
homem resolve reagir e volta para casas disposto a mudar sua situação;

Voltou à casa dizendo:

de hoje em diante eu não apanho,

fui paciente até hoje,

d´agora em diante em me assanho,

é desgraçado o carneiro

que não governa o rebanho.

(...)

Daí em diante a historia se reverte e João dá uma surra na mulher e depois na sogra com
tal violência, que ambas fogem correndo. Ele, por afirmar ainda mais a autoridade, vai
atrás das e manda que voltem para lhe preparar à refeição, pois estava com fome. Então
João pega gosto pela fama de valente e passa a brigar por esporte em toda oportunidade.

Por fim, entra para o bando de Lampião.

Essa narrativa reafirma a tradição sertaneja de afirmação do homem como “cabra


macho”, ou seja, a necessidade da afirmação pública da valentia e supremacia masculina
para que se obtenha respeito, tanto na família quanto na sociedade sertaneja. É um
código moral ainda vigente nessa realidade. Vejamos mais uma estrofe;

Depois de muitas pisas,

da praia até o sertão

e pregar os sete ventos


a fama de valentão

mudou seu nome e entrou

no grupo de lampião

Nesse poema, “O Meu livro”, o eu-lírico se denomina Chico Braúna, poeta iletrado que
demonstra que sabedoria e conhecimento são diferentes. Ele comenta, ao longo do
poema, que a natureza lhe ensina muitas coisas que o homem, às vezes, envaidecido
pelos conhecimentos que tem ou, distraído pelas distrações da modernidade, não
percebe.

Nesse poema, podemos destacar a expressão da religiosidade sertaneja e a comunhão


com a natureza como forma de reflexão. Sabemos, pelos depoimentos do próprio poeta,
que o trabalho no campo, o lavrar da terra, era também para ele, alem do seu ganha pão,
o momento de reflexão, o plantio das idéias em versos que descrevia à noite. Por isso, a
relação de sua poesia com a terra é tão forte, pode-se dizer que sua poesia é telúrica
porque brota da sua relação com a terra, que por sua vez é sua relação coma a própria
cultura e seu tempo, conforme atesta o pesquisador Gilmar de Carvalho, no texto
Patativa do Assaré: natureza e cultura.

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