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RADIO e IMAGINARIO OQ USO “INTELIGENTE" DO VEICULO FEITO POR VARGAS (BRASIL) E PERON (ARGENTINA) DORIS FAGUNDES HAUSSEN Introdugao O titulo, evidentemente, é provocative. O que se quer dizer dos dois governantes ditatoriais ¢ que souberam - intuitivamente ow nio- carers do yeiculo para seus fins politicos, deixando que o mesmo se dirigisse ao imaginario popular, sem instrumentaliza-lo- totalmente. Tanto Vargas quanto Peron permitiram que o radio operasse comercialmenie, com a sua programagae normal de radio - novelas, programas de humor, de auditérios, musicais, esportivos, informatives, sempre, sob a agao vigilante da censura, mas com as insergdes oficiais apenas em determinados espagos ou através da programagao das emissoras estatais, que eram poucas nos dois paises. No Brasil, a radio Nacional que fora encampada em 1940 funcionava num esquema comercial, Na Argentina, a radio do Estado encabegava a Gnica rede e1 ntemente oficial. Esta andlise da relagao radio gindrio popular apdia-sena concep¢io da intima ligacdo entre cultura e comunicagao, "quenio se esgota na simples andlise ideolégica do discurso, mas que se je como uma abordagem mais ampla, a partir da propria storia da cultura, especialmente aquela relacionada as atividades da vida cotidiana’(FADUL, s/d) Ou seja, tanta Getulio quanto Peon, daha aire Giremane hel aa eae io das emissoras, permitiram que elas continuassem o seu trabalho de “construgac"do imaginario popular. Isto porque, naquele momento da histéria latino-americana, tratava-se de organizar, a partir do Estado, uma consciéneia nacional, E radio, inico veiculo realmente de massa que se estruturava também, desenvolveu importante papel neste sentido, [eran [on Na] [rao 55 [sora] REVETA FAMECOS A radiodifusio nos dois paises No Brasil, os dois periodos de govemo de Vangas (1930-1945 1951-1954) foram diversas em relagao ao radio. No primeira, sob regime ditatorial, o veiculo vivia sob 0 poder do gavernofederal, No segundo, sob a democracia, o ridio gazava de plena liberdade. Na Argentina, durante todo 0 govemo de Perén, embora o mesmo: tivesse sido eleito pelo voto popular, o sistema também foi ditatorial © 0 radio s6 foi ter liberdade apés a deposigsio de Perén em 1955, Ele havia governadoa Argentina de 19461955, tendo sidoreeleito em 1950. Quando Vargas assumiu 0 poder em 1930, a radiodifusio ainda estava em sua fase incipiente de ridio-clubes.e radio-socieda- des. A autorizagao oficial para a veiculagao de publicidade s6 viria em 1932, através do Decreto-Lei 21.111.Também nessa época, o Brasil adotava o modelo norte-americano de radiodifusio e va a distribuir concess6es de canais a particulares, o que auxiliaria a incrementar a exploragao Coats veiculo, O reto 20047, de 1931, que substituiu o primeiro Decreto de 1924 sobre a radiodifusio no pais, havia estabelecido que a tadiodifusio era de interesse nacional com fins educativos, O governo promoveria a unificagaio do servico numa rede nacional e definiria as concessdes de emissoras, renovaveis a cada dez anos. No entanto, "o que desde @ inicio se distanciou do decreto de 1931 foram os fins educativos da radiodifusio pois, baseado em principios de liberdade de expres- $40, 0$ empresarios da inddstria cultural logo procuraram tratar do. hove meio de comunicagao dentro do processo itive (produ- gio, circulagdo, consumo), em busea do lucro. (CAPARELLI, 1985, p. 16). Fendmeno este que seria 0 motivador da profissionalizacao no radio, incipiente naquele momento. Na Atgentina, asituagaoera bastante semelhante, #6 quea fase de ridio-clubes foi superada antes. Isto porque a industria de equipamentos radiofénicos desenvalveu-se mais rapidamente que a brasileira © © contexto s6cio-econdmico e cultural era diverso. Enquanto no Brasil influéncia de Roquette Pinto sobre a programa- a9, que no seu entender deveria ter um cunho educative e cultural, Permaneceu por mais tempo, na Argentina a influéncia da publici- dade iniciou mais cedo. Naquele pals, em 1922 surgia a radio ‘Cultura de Buenos Aires que ja inclufa espagos comerciais na sua programagao, A licenga, conseguida pelo proprietério da emissora, REVISTA FAMECOS SS previa que a publicidade nao poderia exceder a 30% do total da programagac. A partir da introdu¢io da publicidade na fre anedio das emissoras, 0 processa de profissionalizagsio acelerou-se nos dois pases, Os programas de auditério foram incrementados, os progra- mas de masica também foram incentivados. No Brasil, durante a Estado Novo, houve uma forte pressac do governo sobre os compo- sitores para que abandonassem as letras sobre a malandragem e avalorizar otrabalho. Casas ficaram famosos, como oda mdsica"O bonde de Sao Janudrio", de Wilson Batista, precisou alterar a letra. Nesses anos, as contribuigoes de Villa Lobos e Ary Barroso ao nacionalisma,incentivade pelo govemo, foram funda- mentais. Na Argentina, as cangdes de Antonio Tormo, compositor da provincia de Mendoza, invadiram as emissoras de Buenos Aires. Eraa presenga do interiorano nas radios urbanas. Fazia-se, entio, 0 proceso inverso- nao era sé a capital que tomova conta de interior. A partir de 1934, na Argentina, o sisterna radiofonico a organizar-se em redes, com as cabeceiras das mesmas em Buenos Aires. A LR-3 radio Belgrano passou a comandar a "Primeira Cadeia Argentina de Broadcasting", a LR1, Radio El Mundo, em 1935 compunha a Rede Azul e Branca de Emissoras Argentinas e, em 1941, a radio Splendid instituiu a RADES - Rede Argentina de Emissoras Splendid. Mais tarde foi criada a Cadeia Argentina de Radiodifusio, tendo como cabeceira a ridio.do Estado. Este sisterna de redes configuraria o modelo permanente da radiodifusao argentina, sendo conhecide como parte da cabega de- Galias", uma vez que Buenos Aires comandava tudo. Da capital era difundida amaior parte da ramagao, ficando paraasafiliadasdo: interior cerca de 40% da lugao, O sistema, segundo os estudigsos do assuinto, teve muitos aspectos contraditatios, Positives no sentido de que se elevou o nivel antistico das programagdes das emnissorasdo interior, Negativos, na medida em que se transplantou o modelo portenho as provincias. Além da programagio propriamente, as giras das caravanas de artistas da capital reforgavam a divulgagao do modo de vida de Buenos Aires. Alguns historiadores consideram que esta influéncia foi avassaladora, uma espécie de imposigac de um modelo cultural ao interior, Na opinido de RIVERA (1991), "o portenho inteirava-se de coisas que j4 conhecia; 0 interiorano punha-se a par de coisas que REVISTA FAMECOS, Fears 3 hao o interessavam. Por sua vez, o morador da capital nao tinha registro da problematica real das regides, uma recopilagio critica, orgiinica de seu pais. Assim, uns eram alheios aos outros ... otipo do interior derramava lagrimas pelo que dizia uma letra de tango que nada tinha a ver com a sua realidade (...) consumia uma espécie de tolclore homogeneizado com o qual se identificava", No entender de MAZZIOTTI (1991), no entanto, este poder das redes era amenizado pela forte presenga do rarlioteatro, produ- zido nas cidades do interior mais importantes, com seus repertérios elencos préprios, Os artistas locais também tinham seu espago nessas emissoras. E houve ainda o fenémeno inverso: a influencia da forte corrente migratoria interiorana que se transterira para Buenos Aires e que comegou aaparecer na programagao como seu modo de vida. Em determinado momento, inclusive, o tango come- gou a dividir o espago com o folclore nas emissoras. Isto ja durante © governa peronista que incentivava © nacionalismo, As radionovelas, por sua vez, marcavam presenga nos lares brasileiros € argentinos. Na Argentina, o género iniciau bem antes, devido a forte iniluéncia do circo ¢ do teatro naquele pais. Ja em 1929 ja. ao ara novela episédica "A caricia do lobo"e em 1931 "A estiincia de Dom Segundo"era irradiada pela ridio Nacional argen- tina. No Brasil, em 1937 a ridio Nacional iniciava o ama "O teatro em casa" e, em 1942 fa ao ar “Em busca da felicidade", a primeira radionovela, do cubano Leandra Blanco. O papel das radionovelas foi relevante. Na Argentina, as ere pegas do género tinham como personagens principais iguras gauchescas - a ambientagao era toda no pampa argentino, Esta tematica vai cedenda espace para ambientagdes urbanas, na medica em que comegam as migragdes do interior para a capital, devido a industlalizeno ea oe de empires, © enredo das radionovelas comeca a tratar das questies dos sulsarbios edo tango, © conflito sentimental, que nas novelas gauchescas aparecia entre @ mocinha seduzida pelo filho do fazendeiro, surge agora nas relagdes entre a mogado subirbioe o rapaz de outraclasse, Comega a construgio do novo imaginario. No Brasil, as novelas, emgeral, tema sua origem nas produgdes cubanas e argentinas, adaptadas ao gosto nacional, E como ja se iniciam na década de 40 , tratam principalmente de problemas urbanes. © fendmeno das migragdes brasileira, em direcio As cidades maiores, também ja comegara, A entrada das grandes REVETATAMICOS 10 agéncias publicitarias norte-americanas, nese perfodo, trouxe igual- mente grande impulso ac ordenamento da producio empresarial da radio- novela. O uso politico do radio As pessoas viviam apaixonadamente o radio nessa época. Os dois ditadores desenvolviam as suas politicas ¢ usavam o velculo, sone era necessario, Os empresarios sabiarn os seus limites. Na rgentina, quando Peron assumiu, a primeira medida fol apropriar- se das emissoras que, posteriormente, foram dewolvidas aos seus donos, 86 que estes ficaram comodiretores ou gerentes - 0 Estado era o dono. A administragao continuou privada, com a venda de espagos publicitarios. Aqueles que nao concordaram, tiveram que abandonar seus negécios. No Brasil, embora nao tenha ocorrido a apropriag¢ao de emissoras, os mecanismos criados pelo gaverno foram tic fortes que também era impossivel transgredir - 0 DIP foi a mais siva dessas ferramentas. radio, a nova tecnologia daquele momento, encontrava condigdes férteis para 0 uso politica, tanto em nagdes mais desen- volyidas ( Estados Unidos, Kila, Alemanha, por exemplo) como em paises em situagdes de menor desenvolvimento € com caracteristi- as peculiares e pré-condicionadas a utilizagGes populistas como nos casos de Brasil e Argentina, O entendimento do tendmeno, no entanto, passa pelo que BARBERO (1985) considera fundamental: a introdugao da histéria para superar a concep¢do puramente manipulatéria da cultura, procurando-se pensar a relagao entre Trashicaeto cultural e a entrada das massas na politica. Rotular-se, assim, esses mavimentos apenas de fascistas ou de revolucionarios seria nao aro todo, a complexidade da situagao, O que confirma, também, a definigao de WEFFORT (1980, p.62): "o populismo foi um modo determinado e concreto de manipulagao das classes lares, mas foi também um modo de expresso de suas insatistagoes". O quese percebe, entio, nesses dois paises, nas décadas de 30 a 50, em relagdo ao radio? Por um lado, situagdes concretas de ‘censura @ auto-censura; proibigdes de determinados programas e misicas; contratagio de alguns artistas em detrimento de outros; favorecimentos através de verbas publicitérias; apropriagao e fechamento de emissoras; delagio de colegas. Por outro, REVISTA FAMECOS ‘ees W Programagdes bem feitas, radionovelas com altos indices de audién- cia, programas esportivas e de humor, noticiosos bem: ( com divulgacao limitada dos fatas). E, principalmente, deuma forma ou de outra, a presenga do povo no que era difundido: no tango ou no-samba, no folelore ou na noticia policial, nes chistes de humor ou nomelodrama, na narragaade futebol ou do ato politico. Ouseja, DE ce aces eat eS otra eee O cotidiano, enfim. i = ae Nos dois paises, a cooptagaode artistas foi feita, princi ene teatravés da legislagiio que Ec beneiiod, ois tori aaeeragsie mesmosas causas popu mais facil, Era comum grupos de artistas e racialistas apolarem programas oficiais de radio, em campanhas de sadde, educagao ou em situagdes extraordinarias, No Brasil, esta adesao tinha uma certa justificativa: em 1928, ainda quando deputado pelo Rio Grande do Sul, Getulio Vargas fora o autor do Decreto Legislative n. 5492, de 16 de julho, que estabelecia o pagamento de direitos autorais cpa Preeens lidassem com mdsica, A chamada Lei Gettilio Vargas foi, assim, 0 primeira vinculo estabelecido entre o futuro presidente e os artistas da mosica lar, 0 nacionalismo, incentivarlo, ‘ia principalmente nas misicas, bem corre am prowrarnasSolclerieos como os de Almiran- te, no Brasil, € nas musicas do argentino Antonio Tormo. Uma diferenga que se estabelece, no caso brasileiro, é em relagao ao segundo periodo Vargas, em que se acentua a campanha naci lista com "G petrélea & nosso", mas que em nivel dos comunicagado encontra grande resistencia, uma vez queo presidente jf n3o contava com 03s mecanismos do DIP, do primeira periodo. Enquanto isso, na Argentina, a situagio continuava inalterada, vindo a se modificar somente em 1955, quase ao fim do poverno Perdn que, entio, ja nao dominava mais a situagaio. Quanto A ramagio, no case da radionovela, come ja foi citado, havia semelhangas mas também diferengas na questao da tematica, O gauchesco argentino nao teve um equivalente muito forte no Brasil pelas razdes j4 explicitacdas. Quanto ao humor, o seu aparecimento no radio foi praticamente simultineo nos dois paises. programas de mondlogos ede duplas humoristicas fizeram parte da programagao inicial. Maistarde, programasmais bem estruturados foram introduzidos, A grande diferenga que se estabelece esta no fato de, no Brasil, Vargas ter incentivade o humor em relagio } sua REVISTA FAMECOS 42 pessoa (ha, inclusive, relatos que indicam terem sido os censores das emissoras, durante a ditadura, mais rigidos que o préprio presidente em relago 4s satiras irradiadas), enquanto que, na Argentina, Perdn nao permitia brincadeiras i, Os programas espartivos, por outro lado, foram incentivados pelos dois governantes. Perén era adepto das corridas de automé- veis, tendo prestigiado 0 coredor argentino "Fangio" em suas competigdes, O préprio presidente gostava de esporte: esqui € equitagaa, J4 os programas jornalisticos apresentavam maiores problemas, uma vez que de politica s6 era possivel falar sobre o permitido (no Brasil, em relagao ao primeiro periodo Vargas, porque, nosegundo, nachavia ingeréncia maior sobre as emissoras). O fato das emissoras operarem comercialmente dava uma autonomia relativa - as giras das companhias artisticas eram banca- das pelos praprios empresarios que, em relacao aos programas de entretenimento, nao tinham maiores problemas. Nacionalismo/Cidadania/Imaginario Inserido no projeto nacional-populista, o radio contribuiu, de alguma forma, com essa nacionalizagao e, por conseqléncia, com 9 processo de een ee. de cidadania, Isto na medida em que, conforme BARBERO (Op. cit. p. 154), "o radio se constituiu em: chave da gestacao do sentimento nacional, na tradugao da idéia de nage, em sentimento e cotidianeidade", Isto porque houve a pavers das culturas rurais chegarem & cultura urbana, com a onroelicee de uma cultura oral, sem a perda total da identidade rural. Pode-se dizer, entio, que o Estado nacional-populista daque- les anos propiciou transformagées modemizadoras nas duas socie- dades, Por ndo contar com categorias sociais capazes de promover a industrializagao ( principalmente no caso brasileiro) , 0 Estado tomou a si a tarefa: reuniu os capitais necessarios, valendo-se principalmente da poupanga interna; criou empresas estatais basi- Cas que induziram o surgimento de empresas privadas; estabeleceu reservas de mercado. proteger as indistrias nascentes; promo- veu estimulos, subsidios, isenges, incentivando a formagao de um mercado interno. "Nao foi um empreendimento apenas nacional, mas também popular. O Estado criou uma nogao de povo que permitiu associar classes normalmente antagénicas. Isto legitimou REVISTA FAMECOS. 13 uma relacao direta entre lideres carismaticos e massas deserdadas". (FREITAS, 1991, p.4) No populismo, a nogao de povo abrangia a todos, ricos.¢ pobres, empresarios etrabalhadores, grandes e pequenos - anagao. O Estado nacional-populista oportunizau, assim, conquistas impor- tantes, mas come o autoritarismo era inerente, nao permitiu a democracia. Havia, entao, crescimento econémico e justi¢a social sem democracia (no primeiro governo Vargas ¢ no de Perén). No segundo governo Vargas, havia democracia e também atentativa de levar em frente 0 projeto nacionalista - mas o esquema de aliangas @ 0 momento politico eram outros, Nio deu certo, O mesmo aconteceu com Perén, embora continuasse tentando governar no mesmo estilo anterior. Dentro desse esquema, o ridio, embora sofrendo pressdes politicas e econémicas, censura, ameagas oficiais, agdes judiciais e pressdes legais, contribuiu de certa forma para o desenvolvimento social, Tanto que, mesmo com todas essas sancées, chegado o momento de esgotamento do modelo, nao foi empecilho para as transformagoes que viriam a ocorrer. Ouseja, oradiocomoummeio de comunica¢ao, por si sé, nao pode modificar a sociedad (pode, talvez, atrasar um processa), mas a decisdo final cabera sempre a coletividade que necesita de mudangas. (HAUSSEN, 1993) Aradio Nacional, durante o primeiro pericdo de Vargas, por exemplo, desempenhou um papel nacionalista e homogeneizador, come parte de um projeto mais amplo, mas também dentro de suas possibilidades, No segundo goveme, embora fosse a maior ¢ a mais qualificada emissora do pats, prosseguiu com a sua programagao e foi usada, dentro do possivel, para dar sustentagao ao governo - mas nao pode fazer milagre, No casodas ernissoras argentinas, que estavam todas em maos de pessoas ligadas ao govemo e contavam com uma censura ainda Mais férrea apds amorte de Eva Perén, em 1952 (quando situagao politica e econémica do pais jA nao era a anterior), o desfecho fai o mesmo - chegado o momento, nenhum mecanisma do governo foi suficiente para impedir o movimento transtormadar, Até porque as informagées chegavam através das emissoras uruguaias. © papel desempenhado pelo radio sob os dois governos listas, em Gltima andlise, ewe ser visto tanto do Ambito da comunicagao ( dentro da historia) come da cultura. Embora fosse, naquele momento, 0 Gnico veiculo realmente de massa, nao era REVISTA FAMECOS na 14, somente essa a explicagdo para seu sucesso: acima de todas as sangSes vividas, o radio relacionava-se com o imaginario popular. ‘O que era apresentado era 0 vivido, o que dava prazer, o que mexia comas emocius-oespelho, enfim. Um espelho que podia, as vezes, distorcer a imagem, mas que ndo a modificava totalmente em sua esséncia. O que remete ao indicado por FADUL (op. cit.) como a necessidade de outros pontos de partida para a discussao cuhural que ultrapassem uma visao ilumninista e difusionista, pensando a cultura a partir dos dominados, "como uma manifestayao de vida e no. como um conjunto de atividades relacionadas aos interesses de determinadas parcelas da Ropalicre O radio, entao, foi usado como instrumento de mediagao por Peron ¢ Vargas com as massas, dentro de determinados projetos politicos. O veiculo, no entanto, era anterior aos dois goverantes, nao fai uma criagio de ambos (como na Italia, le Mussolini ascende ao poder juntarente com 0 inicio do perioda da radiodi- fusdo). As emissoras brasileiras e argentinas, atuando dentro do mercada de empresas privadas, com a competi¢aa, tiveram que ter, de alguma forma, mais liberdade de programagao para gerarolucro, 0 que possibilitou certas brechas ( 05 programas humoristicos, no caso do Brasil, exploravam o que era possivel). Se o ridia fosse totalmente instrumentalizado, come determi- nados jomais partidirios, por exemplo, naoteria o sucesso que teve. Asempre citada radio-alema, durante o periodo de Hitler, uma radio onipresente, instalada através de auto-falantes, nas pare nas ruas, nas fabricas - que nao dava quase nunca nenhuma chance de escape = nao impedia, no entanto, que grande parcela da populagio buscasse outro tipo de informagao, de forma clandestina, em emissoras: ciras. O que demonstra haver sempre uma derman- da da sociedade mais pluralista e que repele o monolitico. Neste sentide, Perén e principalmente Vargas, souberam utilizar melhor o veiculo, mantendo uma programagao mais livre, utilizando-o, quando necessario, O que por um lado, auxiliou seus projetos ¢, por outro, deixou o melo de comunicagao mais solto, relem| BACHELARD (1985, p.177):"o radio é uma fungao de originalidade, Nao pode se repetir, Deve criar a cada dia. Nao é simplesmente uma funcao que transmite verdades, informagées. Deve ter vida autonoma, nessa logosfera, nesse universo da palavra, nessa palavra césmica que é uma nova realidade do homem". Apés a andlige do context dos dois paises e da historia do REVISTA FAMICOS 15 radio nos mesmos, pode-se dizer que o vefculo possui uma histéria propria que vai além das conjunturas - Vargas e Perén passaram, o radio permaneceu ... contando outras histérias, sabre outros contex- tos que, por sua vez, tm a ver com o anterior e ... REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS = BACHELARD, Gaston. O direito de sonhar, Sto Paulo, Difel, 1985. - GARBERO, Jesus Martin, Procesos de camunicacién y matrices de cultura. Itinerario para salir de la razén dualista. México, Felafacs/ GG, sd. ~ CAPARELLI, Sergio."Politicas de Radiodifusia no Brasil", Cadernas: INTERCOM, n.8, Cortez/Intorcom, dez/t9A5. - FABUL, Anamaria. Violéncia, Radio ¢ Imagindrio Popular. S30 Paulo, mimeo, sid. -FREITAS, Décio."O Estado Nacional Populista". Porto Alegre, Zero Hora, Ed, Jomalistica RBS, 1/12/91, p. 4. -HAUSSEN, Doris Fagundes. Radio e Politica: Temposde Vargas e Perén, Sao Paulo, Tese de Doutorado apresentada & ECA/USP, 1993. -WEFFORT, Francisco. © populismo na politica brasileira, Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1980, 2. ed, ENTREVISTAS -MAZZIOTT|, Nora, Professora da UBA, Buonos Aires, 1991, dopoimenta 4 autora. RIVERA, Jorge B. Historiador, Buenos Aires, 1991, depoimento a autora, ‘Texto apresentade na GT “Radio: histéria, géneros e linguagem*, XVI Congresso Brasileiro de Pesquisadorcs da Comunicacio INTERCOM - Universidade Federal do Esplrita Santo Vitéria - 1993 DORIS FAGUNDES HAUSSEN

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