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verve

Tenho observado com frequncia a pouca ateno que as pessoas do s palavras. Explicome. Um homem simples (com simples no quero
dizer parvo, e sim no-eminente) tem uma opinio, critica uma instituio ou crena geral; sabendo que a maioria das pessoas no
pensa assim, cala-se, na suposio de que no
vale a pena falar, pois o que pudesse dizer
no mudaria coisa alguma. Trata-se de um erro
grave. Eu ajo de outro modo. Por exemplo, sou
contra a pena de morte. Sempre que me aparece uma oportunidade, manifesto-me a respeito,
no porque ache que, com isso, o Estado a v
abolir, mas porque estou convencido de que
contribuo para o triunfo das minhas ideias.
Pouco me importa que ningum concorde comigo.
O que eu disse no foi em pura perda. Talvez
algum repita minhas palavras e elas cheguem a
ouvidos que as ouam e as perfilhem. Quem sabe
se futuramente algum daqueles que ora discordam de mim no se vai lembrar, numa ocasio
propcia, daquilo que eu disse e convencer-se
ou pelo menos sentir abalada sua opinio em
contrrio o mesmo vale para diversas outras
questes sociais, das que exigem ao. Reconheo que sou tmido e no sei agir. Por isso
limito-me a falar. No acho, porm, que minhas
palavras sejam em vo. Outro agir, mas essas
palavras de mim, o tmido tero facilitado
a ao e limpado o terreno.
9/11/1902
Konstantinos Kavfis
[Reflexes sobre Poesia e tica. Traduo de Jos
Paulo Paes. So Paulo, tica, 1998, pp. 29-30.]

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