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CURSOS DE ESTETICA Volume I Com 0 Prefacio da 1* edigio de H. G. Hotho G.W.F. Hegel Tradugao Marco Aurélio Werle Revisdo Técnica Marcio Seligmann-Silva Consultoria Victor Knoll Oliver Tolle ‘SBD-FFLCH-USP TO 240 bez ‘Titulo do original: Vorlesungen tiber die Asthetit It edigdo 1999 2 edigio 2001 Dados Intemacionais de Catalogagio na Publicaglo (CIP) (Camara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Hegel, Georg Wilhelm Friedrich, 1770-1831, ‘Cursos de Estética 1/G. W. Hegel ; tradugio de Marco Au. rélio Werle ; revisio t€enica de Marcio Seligmana-Silva ; con- sultoria Victor Knoll ¢ Oliver Tolle ~ 2. ed. rev.~ Sto Paulo : Editora da Universidade de Sio Paulo, 2001. — (Cldssicos ; 14) Titulo ignal: Vorlesungen ber die dsthetik. ISBN: 85-314-0467-3, 1. Bat 99.3721 cpp-701.17 ica. I. Titulo I. Série. fodices para cadlogo sstemitico: 1. Bstética: Arte 70117 Direitos em Lfagua Portuguesa reservados & Eddusp ~ Editora da Universidade de So Paulo Av. Prof. Luciano Gualberto, Travessa J, 374 6° andar ~ Ed, da Antiga Reitoria - Cidade Universitaria (05508900 — Sto Paulo ~ SP — Brasil Fax (Oxx11) 3818-4151 ‘Tel. (Oxx1 1) 3818-008 / 3818-4150 ‘www usp br/edusp — e-mail: edusp@edu.usp br Impressono Brasil 2001 Fo feito o depésito legal DEDALUS - Acervo - FFLCH-FIL HUNAN SUMARIO Wl 17 Nota do tradutor .... pee ee eee ee Prefacio de H. G. Hotho para a 1* edigdio dos Cursos de Estética . INTRODUGAO 1. DELimiracAo DA EstErica & REFUTACAO DE ALGUMAS OBIECOES CONTRA A FILosoria DA ARTE ered Il, Bsrécies De TRATAMENTO CIEMTIFICAS DO BELO EDA ARTE Ill. Concerto po Beto Arristico Concercdes Usuals Da Arte . 1. A Obra de Arte como Produto da Atividade Humana .. , 2. A Obra de Arte como Produgdo Senstvel Dirigida para o a Humano ..... 3. Finalidade da Arte Depug&o Historica Do VERDADEIRO CONCEITO DA ARTE J. A Filosofia Kantiana 74 2. Schiller, Winckelmann, Schelling . 78 3. Alronia .. 81 Divisio .. 86 Parte I. A IDEIA DO BELO ARTISTICO OU O IDEAL Posigdio da Arte em relagdo A Efetividade Finita e & Religido € 4 Filosofia ... 107 (CURSOS DE ESTETICA Primeiro Capitulo: Conceito do Belo em Geral 1 1.AlbeIa ..... 5 121 2. AEXIsTENCIA Da IDEia cee et teeter ee eee ADS 3. A Iéta Do Beto .. . 126 «131 131 131 138 143 Segundo Capitulo: © Belo Natural . A. O Belo Natural enquanto Tal 1.A Idéia como Vida : 2. A Vitalidade Natural enquanto Bela : 3. Modos de Consideragao da Vitalidade Natural. B. A BELEZA EXTERIOR DA FORMA ABSTRATA E DA UNIDADE ABSTRATA DA MATERIA SENSIVEL . L.A beleza da Forma abstrata 47 a. A Regularidade.. ren 147 b. A Conformidade a Leis......... 150 c. A Harmonia ...... 152 2. A Beleza como Unidade Abstrata da Matéria Senstvel . 153 C. Dericiéxcia Do Beto Natura... ASA 1. O Interior no Imediato enquanto apenas Interior 156 146 2. A Dependéncia da Existéncia Singular Imediata . Pris 3. O Aspecto Limitado da Existéncia Singular Imediata 161 Terceiro Capitulo: O Belo Artistico ou 0 Ideal ppnsoonsaeepanenonals) A.O IDEAL ENQUANTOTAL .... 165 1. A Bela Individualidade ..... atc = 165 2. A Relagao do Ideal com a Natureza .. pees ae B. A DeTERMINIDADE Do IDEAL .. .. peeeieart 5) - 18S 185 1. A DeterMinipabe IDEAL ENQUANTO TAL ...... 1. O Divino como Unidade e Universalidade . 2. 0 Divino como Circulo dos Deuses 186 3. O Repouso do Ideal . +186 IL. A Acio . 188 1. 0 Estado Universal do Mindo . = 189 A Epoca dos Heréis ..189 a. A Autonomia Individua b. Os Atuais Estados Prosaicos ... 201 c. A Reconstrucdo da Autonomia Individual ....203 seen 20S 2. A Situagao ... a. A Auséncia de Situagao ....... 8 SUMARIO b. A Situagdo Determinada em sua Inocuidade ..209 ¢. A COliSG0 .....ceeeeeeeeeeeee BAAGO occ cece ee eeeeeee a. As Poténcias Universais do Agir . b. Os Individuos Agentes c. O Cardter se... TIL. A Derersinibabe ExTertor 00 IDEAL 1. A Exterioridade Abstrata enquanto Tal 2. Concondancia do Ideal Concreto com a sua Realidade Exterior ...256 3. A Exterioridade da Obra de Arte Ideal na Relagao com 0 Piiblico . . .266 C.OARTISIA eee cecceeeeee renee 1. Fantasia, Génio e Entusiasmo. a. A Fantasia ‘ b. O Talento ¢ 0 Génio.... c. O Entusiasmo.... 2. A Objetividade da Exposigaéo . 3. Maneira, Estilo e Originalidade ... a. A Maneira Subjetiva . B. © Estilo .2...csreeeeeseseeers ses c. Originalidade GLOSSARIO peer eee eee pees) NOTA DO TRADUTOR A tradugdo que ora apresentamos obedeceu a determinados critérios, os quais passamos a expor. Para a maior parte dos termos alemies que possuem equivalén- cia latina optamos por uma tinica solugio. Assim, Gegenstand e Objekt sempre foram traduzidos por “objeto”; Besondem e Partikultir por “particular”; Stoff Materie por “matéria”; Produktion e Hervorbringung/Herstellung por “produgio”, Existenz e Dasein por “existéncia” etc. Mas quando num determinado perfodo ou contexto temético 0 equivalente alemao surge em contraste com 0 termo latino € julgamos necessério marcar este contraste, acrescentamos os termos do original entre colchetes: [ ]. O mesmo procedimento foi adotado em outros casos de empre- go de um tinico termo em portugués para traduzir termos diferentes da lingua alema e onde se apresentava a necessidade de marcar a distingao no original para uma compreensio adequada do texto. Por exemplo, acrescentamos 0 termo alemio en- tre colchetes no caso de “sentimento” quando traduz Gefith!, para diferencié-lo de Empfindung, que € sempre “sentimento” sem acréscimo do termo alemio. O termo Empfindung as vezes foi traduzido por “sensagio”, sendo neste caso indicado entre colchetes. Seguimos a mesma regra quando da tradugdo de um termo alemio, deci- sivo para a compreensao do pensamento estético de Hegel por diferentes termos do portugués. Os termos da familia do an sich {em sil; fiir sich [para si}; an und fiir sich [em sie para si], quando no original constituem uma sé palavra, por exemplo, Flrsichsein [ser-para-si), a tradugdo ird hifenizd-los. Traduzimos in sich por “em si mesmo” para distingui-lo de an sich fem si apresentam a mesma tradugo: “em si mesmo”. Esta solucdo, porém, nio dé conta |. Neste caso in sich ¢ in sich selbst CURSOS DE ESTETICA do an sich selbst que tivemos de traduzir por “em si mesmo”, acrescentando a expressdo alema entre colchetes. Para distinguir a “idéia”, em sentido hegeliano, do termo corrente “idéia” optamos por marcé-la com maitiscula: “Idéia”. Preferimos traduzir Gestalt por “forma” e nio por “figura”, em razio da conotagio estética que 0 termo “figura” apresenta nas artes visuais. Ressalte-se, porém, que a tradugdo para “figura” ndo é incorreta, tanto que em alguns momentos coptamos por ela, por exemplo no caso de caracteres, personagens de uma tragédia, € quando se tratava de uma figura matemética, por exemplo um tridngulo. Para diferenciar Gestalt de Form optamos por marcar esta com a inicial maitiscula: “For- ma”, Portanto, Gestalt é “forma” (miniscula) enquanto Form € “Forma” (maids- cula). A diferenga basica entre Form e Gestalt reside no fato de que Gestalt & necessariamente uma forma efetiva, determinad:,, ao passo que a Form possui um cunho mais geral, universal e indeterminado. Podemos perceber esta diferenga com- parando as formas (Formen] de arte (simbélica, cldssica e roméntica) com uma forma [Gestalt] individual e artistiea numa pintura particular, Entretanto, toda Gestalt € sempre uma Form, como, por exemplo, podemos observar na filosofia da nature- za da Enciclopédia, na abordagem da Gestalt inorgnica (§ 310) e da Gestalt orgi- nica (§ 353). As formas inorginicas so as configuragdes minerais, os cristais etc. enquanto determinagdes da Form. A forma inorgdnica “ainda no é Gestalt organi- ca, esta que nzio mais se apresenta segundo o entendimento; aquela primeira Form {a forma inorganica] ainda se mostra desse modo porque ainda no é Form subjeti- va” (Ed. Suhrkamp, vol. 9, p. 201). Os termos Inhalt e Gehalt foram ambos traduzidos por “contetido”; mas quan- do “contetido” € a traduco de Gehalt apareceré com a inicial maidiscula: “Conted- do”. A diferenca entre os dois termos nio ¢ ficil de ser estabelecida em Hegel, conforme nota Joachim Ritter: “A diferenciagdo entre Inhalt e Gehalt em Hegel geralmente se encontra limitada a nuangas no processo dialético que, em termos de definigdo, sio dificeis de serem apreendidas (mesmo quando escolas-de-Gehaltintei- ras se reportam a Hegel; note-se que Lukacs acentua a posigao central deste conceito para a estética de Hegel)” (Historisches Worterbuch der Philosophie, vol. 3, p. 142). Em termos gerais, Gehalt designa um conteddo em sentido mais amplo, um contetido impulsionado pelo estado do mundo sobre os individuos ou um contetido que a subjetividade do artista traz mediado consigo. J4 Inhalt € 0 contetido geral- mente tematizado no horizonte da relagdo forma [Form] e contetido [Inhalt] e pode designar qualquer conteiido, no sentido de um contetido individual ¢ particular, conforme explicita Hegel: “Denominamos de contetido [Jinhalf] ¢ significado 0 que € emi mesmo simples, a coisa mesma reduzida a suas determinagées mais simples, mesmo que abrangentes, & diferenga da execugio. O contedido de um livro, por R NOTA DO TRADUTOR exemplo, pode ser indicado em algumas palavras ou perfodos € nele nao deve apa- recer outra coisa a nao ser o geral ja indicado no indice [Jnhalf]” (Ed. Suhrkamp, vol. 13, p. 132). Gehalt é um contetido que possui um determinado “teor”, um contetido mediatizado, tanto que “teor” pode servir como opcio de tradugao para Gehalt. © problema desta traduco, porém, reside no fato de que um dos sentidos de “teor” €: “proporcio, em um todo, de uma substincia determinada” ¢, neste caso, nio é sinénimo de “contetido”. Instala-se, assim, um erro de tradugdo, uma vez que em Hegel, no Ambito da estética principalmente, Gehalt sempre é “contet- do” total e nunca a “proporgao” num todo. O termo Darstellung na maior parte das vezes foi traduzido por “exposigio”; algumas vezes, porém, por “representagdo” (com acréscimo do terme alemio entre colchetes), tendo em vista que 0 termo “exposigo” pode facilmente ser confundido com “mostra”, no sentido de uma “mostra de arte”. Nesta opgao de Darstellung por “representagio”, porém, apresenta-se o perigo do falseamento de uma distingdo importante da filosofia pés-kantiana e idealista, a saber, entre Darstellung © Vorstellung, termo este que mais propriamente corresponde a “representagio” em portugués, A Vorstellung situa-se em Hegel, de modo geral, aquém do préprio con- ceito (cf. §§ 1-2 da Enciclopédia), a0 passo que a Darstellung & a expressio do desenvolvimento pleno do conceito, da aboligdo da separagio entre 0 conceito ¢ a sua realidade. Por isso, “representagio” quando traduz Darstellung deve ser toma- da no sentido de uma “representagiio plena” (onde no hd separagio entre interior € exterior), de uma “apresentagdo” ou “manifestagdo” total do espirito e nfo no sen- tido estrito de “re-presentagio” ou de mera “concepgio”. A tradugio baseou-se na edi¢iio Werke [in 20 Banden, Frankfurt am Main, Suhrkamp, 1986. As Vorlesungen iiber die Asthetik compéem os volumes 13, 14 € 15 e foram reeditadas por Eva Moldenhauer e Karl Markus Michel com base na 2* edigio de 1842 (a 1* edigdo de 1835 também foi consultada), organizadas por Heinrich Gustav Hotho. A edigao de Friedrich Bassenge (Asthetik, Berlin, Aufbau, 1955, 2 vols., “Introdugdo” de Georg Lukécs) seguiu orientagio semelhante, a0 asso que na Jubildumsausgabe de Herrmann Glockner (Scimiliche Werke, 20 vols., Stuttgart, Fromman, 3* ed., 1953; os volumes XII, XIII e XIV sio dedicados a Cursos de Estética) foi privilegiada a 1* edigao de Hotho, embora nao apresente diferengas substanciais em relagdo & edi¢Zio Suhrkamp. Glockner/Bassenge dividi- ram alguns subcapitulos de modo diferente, acrescentando algumas subdivisées. Quanto ao texto propriamente dito, a excegio encontra-se no comego do primeiro capitulo (“O Conceito do Belo em Geral") da 1* parte (vol. 13, Ed. Subrkamp, p. 148), onde a edigdio Suhrkamp seguiu a 2* edigdo de Hotho, optando pela express ””, observando em nota que na 1* edigdo de Hotho lé-se: “ndo B (CURSOS DE ESTETICA podem realizar-se”. Glockner/Bassenge seguiram esta tltima opgiio sem indicar nada em nota. Dentre as tradugées disponiveis, consultamos principalmente a italiana de Nicolao Merkere Nicola Vaccaro (Estetica, Milo, Feltrinelli, 1963, 1 vol.), a espa- nhola de Rail Gabaz (Estética, Barcelona, Peninsula, 1989-1993, 3 vols.) e a fran- cesa de Jean-Pierre Lefebvre e Veronika Schenck (Cours d’esthétique I, Paris, Aubier, 1995), que nos foram bastante dteis. Consultamos também a tradugo inglesa de Bosanquet (Introductory Lectures on Aesthestics, edited with an Introduction and Commentary by Michael Inwood, London, Penguin, 1993. Essa tradugao foi publicada pela primeira vez em 1886 sob o titulo: The Introduction to Hegel's Philosophy of Fine Art). A tradugio inglesa de T. M. Knox (Hegel's Aesthetics Lectures on Fine Art, Oxford University Press, 1991, 2 vols.) ndo foi consultada, ‘Também nao fizemos uso da tradugio francesa de Charles Bénard (Esthétique, Pa- ris, Lib. Germer-Baillére, 1875, 2 vols.), porque constitui uma edigao resumida da obra de Hegel. J4 a tradugiio, também francesa, de S. Jankélévitch (Esthétique, Paris, Aubier, 3 t., 4 vols., 1944) foi dispensada porque apresenta graves erros: omissdes de passagens inteiras do original, acréscimos de novas passagens ao ori- ginal, imprecisdes nas referéncias de dados histéricos, abreviagdes, simplificagdes etc, O mesmo se aplicou & tradugdo portuguesa (Estética, trad. de Orlando Vitorino c Alvaro Ribeiro, Lisboa, Guimaries, 1953-1964, 7 vols.), que constitui uma tradu- do da versio de Jankélévitch € mantém os mesmos erros daquela, além de outros. Por exemplo, um erro grave: confundir “estado” [Zustand] com “Estado” [Staar] no subitem “O estado universal do mundo” da 1* parte. Esta é a mesma traducao que se encontra reproduzida, em parte, no volume Hegel da Col. “Os Pensadores” (Sio Paulo, Abril Cultural) e que recentemente foi reeditada na integra pela Ed. Martins Fontes, So Paulo, 1996-1997, em 2 vols. (vol. 1: O Belo na Arte, 1996 vol. 2: O Sistema das Artes, 1997). Quanto & fluéncia e ao estilo da tradugo, h4 que observar que procuramos manter, dentro do possivel, o cariter oral presente no texto hegeliano dos Cursos de Estética, Entretanto, algumas vezes optamos por desmembrar alguns perfodos lon- 08, para adaptar o texto alemio a estrutura da lingua portuguesa. As notas no decorrer do texto, quando nio aparecem indicadas como sendo do tradutor, so de autoria dos editores da Suhrkamp. Em muitas de nossas notas aproveitamos referencias das notas da tradugdo francesa de Jean-Pierre Lefebvre € Veronika Schenck e da traducio inglesa de Bosanquet (quanto & “Introdugio”), cuja autoria € de Michael Inwood. Para permitir que o leitor possa cotejar a nossa tradugio com o original, inse- rimos entre barras verticais a paginago da edigGo Suhrkamp acima referida. “4 NOTA DO TRADUTOR Por fim, é necessério registrar que parte da presente tradugdo (a “Introdu- 40") j& foi publicada em Cadernos de Traducdo n¢ 1, Departamento de Filosofia’ USP, 1997. Em relagio aquela versio, fizemos alguns poucos reparos no sentido de um aprimoramento, de modo que ela ndo difere muito desta atual versio (no que diz respeito & “Introduga0”). E aqui também aproveitamos para fazer um agradeci- mento ao Prof. Marcio Suzuki (USP) e ao Prof. Marcos Lutz Miller (Unicamp), pelas elucidativas sugestdes & nossa primeira versio da tradugio. De maneira especial importa consignar 0 meu agradecimento a Oliver Tolle, que junto comigo esté traduzindo o segundo volume desta obra, pela paciente € ‘minuciosa revisio das provas, contribuindo de maneira decisiva para a melhor rea- lizagdo desta edigao. Is PREFACIO DE HEINRICH GUSTAV HOTHO PARA A PRIMEIRA EDICAO DOS CURSOS DE ESTETICA* Nesta primeira apresentago ao pablico dos cursos de Hegel sobre a estética, nio tenho como objetivo elogid-las nem o desejo de apontar os eventuais defeitos quanto a div io das partes singulares. O profundo prinet. pio-fundamental de Hegel, que também nesta esfera da filosofia confirmou de modo renovado sua poténcia de verdade, permite que a presente obra abra seu caminho por si mesma ¢ do melhor modo. E somente quando isso acontecer, aqueles que possuem inteligéncia poderdo notar a devida posigzio que possuem os esforgos apa- rentados iniciais de Schelling tendo em vista uma estética especulativa, como tam- bém as tentativas até agora pouco apreciadas de Solger. E isso na medida em que a obra de Hegel ultrapassard todas as tentativas mais ou menos fracassadas proveni- entes de subordinados pontos de vista cientificos mais antigos e contempordneos na medida em que ao mesmo tempo se apresentard como o cume do conhecimento, inabaldvel em sua base, perante o borbulhdo e fervilhamento daquela arrogancia 10 do todo ou 3 exposi + Este texto ndo se encontra na edigdo Suhrkamp, mas est reproduzido no volume XII das obras completas de Hegel organizadus em 20 volumes por Hermann Glockner, Os volumes XI, XIl] ¢ XIV slo dedicados ‘205 Cursos de Estetica; of Sdmtliche Werke; Juiliumsausgabe in 2wanzig Bunden: V. XII, 3¥ed. Stuttgart, Fromman, 1953. pp. I-12, Julgamos necesséria a tradugio deste preficio para que 0 leitor possa perceber ée modo mais claro que o texto dos Cursos de Estetica no foi publicado pelo proprio Hegel sim é uma reconsttuigdo feita por um de seus alunos. Neste preficio podem-se acompanhar algumas dus dificulda- des que nortearam esta reconstituigo bem como o modo de procedimento adotado por Hotho. Maiores detalhes acerca da atual pesquisa em torno da “constituigio” da estética de Hegel podem ser encontrados nosantigos de Annemarie Gehtmann-Siefert nas Hegel-Studien dos limos 20 anos. Annemarie Gehtmann- Siefert é professora na FernUniversitit Hagen, colaboradora do Hegel Archiv de Bochum ¢ responsivel pela edigdo critica dos Cursos de Estética (N. da T). (CURSOS DE ESTETICA juvenil. Esta arrogiincia cré que se elevou acima da seriedade da ciéncia mediante seu pouco talento para a produgio artistica. No entanto, na crenga de precisar nutrir ¢ satisfazer novas necessidades, ela se mantém to mais livre no duplo Ambito da arte e da filosofia da arte, por meio de uma mescla superficial de ambas, quanto ‘menos consegue um auténtico aprofundamento numa ¢ noutra. Mediante esta convicgao, nao resta outra alternativa ao organizador sento mencionar brevemente os principios que tanto dificultaram quanto facilitaram 0 trabalho de redaco que the foi confiado. As obrigagdes de uma tal edigao podem ser comparadas com as de um restau rador bem-intencionado junto a pinturas antigas. Por um lado, as obrigagées se referem ao aprofundamento destitufdo de subjetividade na obra transmitida, em seu espirito e modo de expor. Por outro lado, consistem na mais conseqliente modéstia de somente permitir que se complete o que é realmente necessdrio para resguardar 20 méximo o original, seja onde se encontrar, e que se tenha o esforgo de fazer com que 0 acrescentado, se a sorte o permitir, se harmonize com o valor aproximado do que se manteve e do auténtico, de tal forma que o eleve. Entretanto, semelhante trabalho compartilha infelizmente de um destino idéntico ao de seus deveres, mes- mo que tenha sucesso: a recompensa pela falta de recompensa, E isso porque pa- ciéncia, trabalho Arduo, entendimento, sentido e espirito néio s6 permanecem na maior parte das vezes encobertos onde mais estiveram atuantes ¢ desempenharam seu melhor papel, mas no topo de sua completude permanecem totalmente irreco- nheciveis, enquanto que os defeitos ficam por si mesmos expostos a luz do dia, inclusive para o olhar menos experiente, mesmo onde segundo 0 estado da questo nijo foi possfvel desviar deles. Tal sorte é to mais implacdvel com 0 organizador dos presentes cadernos, na medida em que ele préprio, segundo a natureza de seu trabalho, logo se via envol- vido em dificuldades sempre mais significativas, Pois nao se tratava simplesmente de editar com algumas modificagdes de estilo um manuscrito elaborado pelo pré- prio Hegel ou qualquer outro caderno copiado com fidelidade, mas de amalgamar 08 diferentes muitas vezes contradit6rios materiais em um todo; para tanto, era preciso 0 maximo de cuidado e receio quando se propunha algum melhoramento. ‘A matéria mais confidvel foi fornecida pelos préprios papéis de Hegel sempre utilizados em suas prelegdes orais. O caderno mais antigo é da época de Heidelberg edata de 1818. Ele provavelmente serviu para ser ditado oralmente, pois € dividido em pardgrafos curtos e concisos ¢ em observagdes detalhadas & semelhanga da En- ciclopédia e da Filosofia do Direito e, segundo seus tragos essenciais, pode ter sido esbogado para o propésito do ensino filos6fico ginasial em Nuremberg. Entretanto, ao ser chamado para Berlim, Hegel deve té-Io considerado insuficiente para suas 18 PREFACIO DE HEINRICH GUSTAV HOTHO primeiras prelegGes sobre a estética, pois j4 em outubro de 1820 comegou a fazer uma nova modificagao, da qual nasceu o caderno que a partir de entdo se tornou 0 fundamento para todas as ligdes posteriores sobre 0 mesmo objeto. Por isso, as principais modificagdes no semestre de verdo de 1823 ¢ de 1826, bem como no semestre de inverno de 1828/29, foram apenas anotadas em algumas folhas inseridas como suplementos. O estado destes diferentes manuscritos é de natureza variada; as introdugGes se iniciam com uma exposigdo corrente, quase que estilistica, € no trajeto ulterior mostra-se também uma completude semelhante quanto as divi- sdes singulares. A parte restante, em contrapartida, € referida ou em enunciados totalmente curtos ¢ desconectados, ou geralmente em palavras singulares aleat6rias que somente podem ser compreendidas mediante uma comparagiio com os cader- nos cuidadosamente copiados. E dificil compreender como o préprio Hegel na ca- tedra sempre conseguia se orientar no fluxo das preleg&es a partir destes cadernos com seu vocabulario lacénico ¢ notas marginais confusas escritas umas por cima das outras ¢ ampliadas ano apés ano. Pois mesmo o leitor mais experiente nio consegue orientar-se na leitura destes manuscritos valendo-se do reconhecimento dos sinais que apontam para cima e para baixo, para a direita ¢ para a esquerda ¢ a0 disp6-los adequadamente. a dificuldade exterior, porém, é ainda em muito sobrepujada por uma outra interior. Isso porque, a cada nova prelecio, H para penetrar mais profundamente no objeto, para dividi-lo mais fundamentalmente quanto & sua filosofia e para permitir que 0 todo se ampliasse e se definisse mais apropriadamente, ou para trazer a uma luz sempre mais clara os pontos centrais ja estabelecidos antes ¢ os aspectos laterais singulares, mediante novas elucidacées. Este esforgo de Hegel no indica uma insatisfeita vontade de melhorar; pelo contré- rio, nenhuma das outras ligdes di um testemunho to claro do fervor gerado pelo aprofundamento no valor do assunto. Com efeito, também nenhuma outra disciplina necessitava tanto de modificagdes como a ciéncia da arte, que era empreendida com ‘um olhar sempre fresco, com a forga da especulacdo reforcada e uma ampla perspec- tiva. Os modos de tratamento diferentes forneciam uma ajuda wtil apenas para ambi- tos particulares e, nesta falta de trabathos anteriores, aquilo que fora pensado em primeiro lugar, mais tarde apenas podia valer como trabalho prévio proprio. Desse modo, mesmo que estes esforgos de mais de dez anos tenham sido coroados de éxito, eu no ousaria afirmar que eles teriam se contentado com aquela consumagao com a qual Hegel foi recompensado junto a sua Logica, Filosofia do Direito ¢ Historia da Filosofia. Embora esteja de acordo com o principio fundamental, também nao gosta- ria de subscrever 0 tipo da divisdo do todo e nem cada opiniio e concepgio singular que, junto & arte, mais facilmente do que em outros ambitos, permitem que se fagam I se esforgava com um vivo interesse 9 CURSOS DE ESTETICA valer impressdes juvenis, preferéncias subjetivas e antipatias etc. Por isso, mais dificil ainda foi conseguir encontrar e estabelecer como valida a auténtica e verdadeira divi- stio em meio as variadas divisoes e suas modificagées sempre renovadas, com as quais 0 proprio espirito de Hegel concordava de modo silencioso. Neste contexto, devo imediatamente me proteger no que diz respeito a uma questo. E que poderia facilmente acontecer que ouvintes de Hegel comparassem as ligdes editadas com seus préprios cademos, deste ou daquele ano, ¢ encontrassem com freqliéncia um curso modificado e uma exposigdo significativamente diferente e, assim, seriam im- pelidos a atribuir essa diferenga ao arbitrio do organizador de querer saber tudo me- thor. Esta falha na concordancia, porém, nasce somente a partir de uma vistio superfi- cial sobre o todo do material, o qual me impds o dever, segundo convicgio interior, de Fesgatar¢ levar aquilo que de melhor se me apresentava a um acordo, onde quer que se encontre, seja numa vers is nova, No conjunto, acredito que 0 espaco de tempo entre 1823-1827 foi de modo geral, em termos de sucesso, 0 mais substancioso para Hegel, no que se refere & progressiva elaboragio de suas prelegées sobre filosofia natural, psicologia, estética, filosofia da religidio ¢ hist6ria mundial. Quanto mais rapidamente estava de acordo com o seu pensamento e menos se debatia com o contetido empirico, nesta época ele sempre mais se tornava senhor soberano no completo dominio e clareza de sua especulagio & medida que mais am- plamente acumulava-se a matéria, no que concemne sobretudo & arte, & religio e & ciéncia orientais. A profundidade transparente do curso do pensamento que se desen- volvia segundo 0 conceito do objeto ainda o interessava tanto quanto a organizagao viva e prenchedora de seus ricos e variados conhecimentos e intuigées. Nos anos posteriores algumas experiéncias amargas parecem té-lo levado a exposig&es sempre mais populares que, embora possam ter atingido sua finalidade auténtica na medida em que muitas vezes desenvolviam os pontos mais dificeis com clareza de mestre, cediam visivelmente quanto ao rigor do método cientifico. ~ Se o espaco permitir, espero poder acrescentar ao segundo volume da estética, que logo ser4 editado, uma caracterizagio e um panorama resumidos sobre os diferentes anos das prelegdes € suas modificagées para efeitos de ensino, para com isso justificar a divisio por mim empreendida, O estado acima apontado dos manuscritos de Hegel fez com que o auxilio de cadernos cuidadosamente copiados se tornasse absolutamente necessdrio. Um e outro se relacionaram enquanto esbogo ¢ execugio. Em vez de me lamentar sobre a falta de material, gostaria também de neste contexto apenas aproveitar a ocasiao para expressar publicamente meus melhores agradecimentos pelo auxilio solicito que encontrei. Nao precisei utilizar as ligdes de Heidelberg do ano de 1818, uma vez que Hegel em seus manuscritos posteriores a elas se refere somente por causa 20 PREFACIO DE HEINRICH GUSTAV HOTHO de um ou dois exemplos mais detalhados. Do mesmo modo, pude dispensar as primeiras prelecdes de Berlim do semestre de inverno de 1820/21. Das ligdes que se seguiram a estas, a saber, as do ano de 1823 ¢ que foram essencialmente modifi cadas, somente um tinico caderno copiado forneceu-me uma informagio confidvel. Outro caderno confidivel encontrei nas ligdes do ano de 1826, mas para que pudesse completé-lo tive de a pitio von Grieshein. Um outro caderno semethante, copiado pelo estagisrio senhor M. Wolf, e um caderno bem sucinto, copiado pelo senhor D. Stieglif, também foram acrescentados, A mesma riqueza obtive das prelegdes de inverno de 1828/29, as quais pude consultar satisfatoriamente 0 caderno completo do meu colega, 0 senhor licenciado Bauer, bem como os cadernos do senhor D. Heimann e do senhor Ludwig Geier e os cadernos mais sucintos dos meus colegas, o senhor professor D. Droisen € 0 senhor licenciado Barke ‘A principal dificuldade residiu entdio em combinar e fundir estes varios mate- riais. Desde a publicagdo das ligdes de Hegel sobre filosofia da religiao e histéria da filosofia, jé foram estabelecidas exigéncias totalmente opostas neste sentido. Por um lado, dizia-se que © mais adequado seria manter a prelego oral efetiva, tanto quanto possivel, e somente livré-la das imregularidades estilisticas mais mani- festas e das constantes repeticdes e outras pequenas falhas. Eu ndo pude seguir este parecer. Quem por mais tempo acompanhou com conhecimento ¢ amor as prele- 6es bem préprias de Hegel, ird reconhecer como mérito delas, afora a poténcia e plenitude dos pensamentos, principalmente 0 calor invisfvel, reluzente pelo todo, assim como a apresentacao imediata (de seus pensamentos). E, assim, geravam-se as distingdes mais agugadas, as mediagdes mais completas, as intuiges mais gran- diosas, as particularidades mais ricas e os panoramas mais amplos como que num mondlogo em voz alta consigo mesmo, em que a verdade do espirito se aprofundava, escentar 0 caderno copiado extensivamente pelo senhor ca- Este mondlogo incorporava as palavras mais enérgicas, mas que em sua simplicida- de eram sempre novas e, apesar das extravagincias, eram sempre venerdveis ¢ ar- caicas, Mais admirdveis, porém, eram aqueles lampejos de génio que faziam tremer ¢ inflamavam, nos quais, geralmente de modo inesperado, se concentrava 0 que era préprio da natureza abrangente de Hegel. Para aqueles que eram capazes de capté- Jocompletamente, cle provocava entdo um efeito indescritivel a0 expressar, de modo tio ricamente intuitivo quanto claro, 0 que tinha de mais profundo e de melhor em sua alma mais intima, O aspecto externo da prelegtio, em contrapartida, s6 nao apresentava incémodos para aqueles que de tanto ouvir ja se acostumaram a ela, de modo que eles somente se sentiriam incomodados por causa da desenvoltura, lisura ¢ elegincia, — Se langarmos um olhar para os cadernos copiados, em certa medida somente se sobressaem estes elementos exteriores embaragosos, sendo que desapa- 2 (CURSOS DE ESTETICA receu deles aquela vida imerior e agradavel. Mesmo com a ajuda da prépria memé- ria mais viva, 0 esforgo baseado neles para restabelecer a prelecdo original sempre poderia ter como resultado algum fracasso, do qual mesmo o artista mais habil nao pode subtrair-se quando os tragos do retrato vivo do morto se produzem a partir da mascara mortuéria, exigindo a tarefa ndo executdvel. Por esta razio, desde o comego me esforcei na elaboragdo para dar As presen- tes prelegdes um cardter ¢ uma estrutura de livro sem destrui descuido préprio da prelegdo oral, para a qual é permitida, ora desviar-: episodicamente e logo retornar, ora se expandir e se dedicar aos exemplos os mais variados. Pois ouvir € ler sio coisas distintas ¢ o proprio Hegel, como se mostra pelos manuscritos, nunca escreveu assim como falava. Por isso, eu no me proibi de fazer a mudanga freqiente na separacio, na ligago e na estrutura interna dos enunciados, expressdes e perfodos presentes nestes cadernos. Em contrapartida, estive empenhado com toda a fidelidade para reproduzir completamente as expres- ses especificas dos pensamentos e das intuigdes de Hegel em sua tonalidade mais prépria e para manter tanto quanto possivel o colorido de sua diego, que se impri- mia vivamente em todos os que mais demoradamente se familiarizavam com seus escritos e suas prelegGes. Meu olhar estava principalmente direcionado para a ques- tao da alma e vitalidade interior que habitava tudo o que Hegel disse e escreveu que eu buscava novamente imprimir, tanto quanto este modo de redigir o exigiae a sorte o permitia, no texto construido com esforgo a partir deste material variado. Por outro lado, vozes dissonantes fizeram valer a exigéncia de que os organizadores das ligSes de Hegel deveriam se colocar a dificil tarefa de nao s6 eliminar as falhas externas, mas também de encontrar safdas para as quebras inter- ‘nas, onde quer que se encontrassem. Assim, seria necessério transformar a divisdo do todo, caso nao houvesse uma justificagdo cientifica, ¢ introduzir passagens dialéticas, caso estivessem faltando. Também seria preciso tomar leve 0 que era demasiadamente pesado; amarrar com solidez filos6fica o que estivesse solto; mul- tiplicar os exemplos apresentados de obras de arte e principalmente apresentar em geral, tanto no particular quanto no universal, o que eles mesmos seriam capazes de realizar em campo idéntico. Este parecer eu pude ainda menos seguir, Pois 0 pibli- co tem o direito incontestavel de também nas prelegdes péstumas ter & sua frente niio este ou aquele aluno e colaboradores correligiondrios de Hegel, mas ele mesmo totalmente 0 vivo e com os pensamentos ¢ os desenvolvimentos que s6 vieram dele. Neste sentido, a corregio seria propriamente uma falsificagdo e atentado contra a fidelidade e ver- dade de documentos histéricos. Mas mesmo estando convencido quanto ao iltimo ponto, preciso confessar que em certa medida, quanto ao particular, fui infiel a Hegel. Na medida em que era 2 PREFACIO DE HEINRICH GUSTAV HOTHO necessério retirar periodos isolados e apresentagdes, ora deste ano ora daquele ano, das diferentes prelegées, para que se pudesse explorar completamente 0 material disponivel, nio foi possfvel, nas idas e vindas das transagdes linglifsticas, evitar de encontrar e introduzir pequenos elos que fizessem as devidas pontes. Esta arbitrarie- dade eu também nao me teria permitido se o proprio Hegel ndo tivesse tido a prefe- réncia de sempre alternadamente manusear com amor e minicia outros capitulos nas diferentes elaboragdes. Para que estes capitulos pudessem ser unidos em um e mesmo todo, tais palavras ¢ enunciados nao podiam ser dispensados e, assim, a vantagem da completude pareccu prevalecer amplamente sobre aquele mal de uma redagiio que se misturava com independéncia em questdes laterais. Afora os acréscimos mencionados, eu igualmente me permiti procurar uma ordenagio mais clara e nitida em passagens em que uma certa confusio na ordena- G0 externa do material e sua conseqiiéneia eram um peso para o desenvolvimento casual da prelectio oral, Para quem também aqui quiser enxergar uma injustiga, no posso oferecer outra garantia a ndo ser contrapondo uma familiaridade de weze anos com a filosofia hegeliana, um convivio duradouro ¢ amigével com 0 autor ¢ uma lembranca ainda em nada enfraquecida de todas as nuangas de sua prelecdo. De resto, 0 que pode ter sido bem ou malsucedido na presente redago, devo deixar que o julguem aqueles que pelo favor de transtornos semelhantes foram convocados a ser os jufzes competentes para tanto. ‘Ao grande piblico, porém, entrego esta obra desejando um olhar livre de preconceitos ¢ aquele zelo de quem se inicia metodicamente, zelo que por si s6 permite louvar e gozar o que é raro e grandioso, seja em que forma possa aparecer. Berlim, 26 de junho de 1835. Hewricst Gustav Horo CURSOS DE ESTETICA INTRODUCGAO |13] Estas ligdes stio dedicadas & estética, cujo objeto € 0 amplo reino do belo: de modo mais preciso, seu ambito é a arte, na verdade, a bela arte. O nome estética decerto nfo € propriamente de todo adequado para este obje- to, pois “estética” designa mais precisamente a cigneia do sentido, da sensagao [Empfinden]. Com este significado, enquanto uma nova ciéncia ou, ainda, enquan- to algo que deveria ser uma nova disciplina filoséfica, teve seu nascimento na esco- Ia de Wolff", na época em que na Alemanha as obras de arte eram consideradas em vista das sensagdes que deveriam provocar, como, por exemplo as sensagdes de agrado, de admiragio, de temor, de compaixio e assim por diante. Em virtude da inadequaco ou, mais precisamente, por causa da superficialidade deste nome, pro- curaram-se também formar outras denominagées, como o nome kalistica?. Mas tam- bém este se mostrou insatisfat6rio, pois a ciéncia A qual se refere nio trata do belo em geral, mas to-somente do belo da arte. Por isso, deixaremos o termo estética assim como est. Pois, enquanto mero vocabulo, ele é para nés indiferente e uma vez que jé penetrou na linguagem comum pode ser mantido como um nome. A auténtica expressdo para nossa cigneia é, porém, “filosofia da arte” e, mais preciss mente, “filosofia da bela arte”. 1. Christian Wolff (1679-1754), maternico e filésofo racionalista que dominava a filosofia alema antes do kantismo. O termo latino aesthetica foi pela primeira vez aplicado a esta nova ciéneia por Alexander Baumgarten (1714-1762) em sua Methaphysica (1739) ¢ Aesthetica (1750-1758). O terme deriva do grego aisthanesthai: “percebet’s aisthesis: “peroepeio";cistheikos: “o que € capuz de percepgi0" (N. da T.) 2. Proviivel alusto ao livro de Gottlieb Ph, Che. Kaiser, fleen

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