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OS DEUSES E & oo lima no sicologia d ane | amores Mma ul inc dean Shinoda Bolen Colegao AMOR E PSIQUE O feminine. + Aborta- perda ¢ ronovapdo, Eva Patlis + A femniniidade consciente: Entravistas com Marion Woodman, Marion Woodman + A mulher modema em busca da alma: Guia Junguiana da mundo visfvel e do mundo invi- ‘ival, June Singer + A prositula sagrada, N,Q. Corbett + As dewsas 0 a maltiey, J. S. Bolen * A vigor andvide, Marion Woodman * Caminho para a iniciagfo teminina, 8: B. Perera © Dosiine, amor o dxtase, J. A. Santord » Os misidrios da muthor, Esthar Harding ‘© medo do leminino, E, Neumann + Varapdes soba ater muster J. Bonaventure O masculino + Abusca filica, J. Wyly + A radio recreta da jarcinagem, Jackson * Casirapdo e hina masculina, E. Manik * Curando a aima mascutina, G. Jackson * Falo, a sagrada imagem do masculino, € Monik + Hermes a saus files, R. L, Pedraza + Os mistérios da sala de estar, G. Jackson * Sob a sombra dle Satumo, J. Hollis + Os dauses e a hamem: Uma nova psicotogta da vida @ dos amores masculinos, Jean ‘Shinoda Bolen Psicologia e religiso + Agima colebra: Preparapde para e nova rel ldo, Lawrence W. Jatle + A doonga que somos nds, J. P. Dourley » Ajomada da alma, J. A. Santord * Biblia @ Psique, €. F. Eainger * Daus, sonhos @ revolagiio, M, Kelsey + Do iiconsciente a Deus, E. van dor Wirchel + Uma busca interior em Psicologia @ reiigido, 4, Hiller * Rastreando 0s Deuses, J. Hollis, Sonhos + Aprendendo com os sonhos, M.A ‘Galibach + Breve curso sobva os sonhos, A. Bosnak * Qs eonhos 0 eura da alma, JA. Saniord + Sonos de um paciente com AIDS, Ri Bosniak Sanhos @ gravidag, Wt. R. Galibach + Sonhos e nitual de cura, C, A. Maier Envethecimento + Apaszagem do meio, J. Hollis + Asoliddo, A. Storr + Avetha sabia, FL Weaver + Desperande na mela-idade, KA, Brehony + Enveihecer J. A, Pretat + Mela-idads 9 vida, A, Bormann + Menopausa, tempo de renascimenia, A. Mankowilz + O vaiho séblo, P. Middelkoop: Contos de fada @ histérlas mitolégicas + Aindividuagao nos contes dé fada, M.-L. von Franz * Ainterpretapdo dos contos de fada, M-L. von Franz + A sombra @ 0 mial nos contos ds fada, M.-L. von Franz * Galo, M-L, von Franz + O que conta 0 conto?, J, Bonaventure + O significada arquetipico de Gilgamesit, A. 8, Kluger © puer * Olivo do pues, J. Filliman + Puor astomus, MeL. won Franz Relacionamentos + Amar, trai, A. Carotenuto + Eros @ pathos, A. Carctenute + khcosto & amar humana, R, Stein + No sou mais a mulher com quam vood se casou, A. B. Filenz + ho caminha para as rulpelas, L. 8. Leonard + Os parcels inisivels, J.A. Sanford Sombra * Mal, 0 jado sambrio da raalidada, J, A. Santord * Os pantanais da alma, J, Hollis + Peicologit profunda e nova dia, E. Neumann Outros Ansiedade cultural, RL. Pedraza Alimanto a lransformagae, G. Jackson Conhecends a si mesmo, D, Sharp Gonscidincia soln, consciénaia hanay, Ml. Stein Medltapdes sobre os 22 arcanos maioras do tard, andnine No espelho de Psique, E. Newnann ‘O-caminho da transformant, €. Perrot O despartar ds seu fro, C. de Truchis Psicoterapia, M.-L, von Franz Psiquiatia junguiana, H, K, Fieez Alastveands os deuses, J. Hollis A terapia do jogo de arole: imagens que cu- fam a aima.a desenvolver a porsonaiidade, Rulh Ammann * Dioniso no exito: Sabre a repressao da emo- pao a do como, A. L.-Podraza + © projets Eden, James Hollis JEAN SHINODA BOLEN OS DEUSES EO HOMEM Uma nova psicologia da vida e dos amores masculinos PAULUS Dagos intemnacionais G2 Catalogagao na Publicagao (CIF) (Camara Braestelra do Livro, SP, Bras) : Bolen, Jean Shinada 3 deuses @ o homern : uma nova psicolagla da vida e dos amores masculinos {Joan Shinada Bolem ; [tradupiio Maria Silvia Maurie Netto). — Sao Paulo = Paulus, 2002. — (Armor @ Peique) Thule criginal: Gods in everyman = a naw psychology of men's lives & loves. Bibliograta, ISBN 85-343-1903-8 1, Arquitipo (Psicologia) 2, Hamens ~ Psicologia |. Titulo, Ul, Série, 01-8476 cDD-155.832 on 1. Arqudlipos : Psicologia maseulina 185 602 2. Homns : Psicologia 155.632 Colegdo AMOR E PSIQUE ditigida por De. Léon Bonaventure, Pa. {vo Stamioio, Dra, Marla Ele! Spaccaquercha Titulo original Gods io everyman: A new psychology of men’s lives & loves ©1989 by Jean Shinoda Bolen, USA Tradupso Maria Silvia Mouro Neto Capa Marcelo Campanha Revistio Iranildo B. Lopes Evitoragac eletrénica PAULUS, em New Century pts. Papel (Chamais Fine Dunas 7ogimn* Impressio e acabamento PAULUS: @ PAULUS - 2002 Rua Francisco Cruz, 229 ¢ 04117-081 Sao Paula (Brasil) Fax (11) 5879-3827 « Tol. (11) 6084-3066 eww paulus.com.br + editoris!® paulus.com.br ISBN 85-349-1903-8 INTRODUGAO A COLEGAO AMOR E PSIQUE Na busca de sua alma e do sentido de sua vida, o homem descobriu novos caminhos que o levam para a sua interioridade: o seu proprio espaco interior torna-se um lugar novo de experiéncia. Os viajantes destes cami- nhos nos revelam que somente o amor é capaz de gerar a alma, mas também o amor precisa de alma. Assim, em lugar de buscar causas, explicagées psicopatoldgicas as nossas feridas e aos nossos sofrimentos, precisamos, em primeiro lugar, amar a nossa alma, assim como ela é. Deste modo 6 que poderemos reconhecer que estas feri- das e estes sofrimentos nasceram de uma falta de amor. Por outro lado, revelam-nos que a alma se orienta para um centro pessoal e transpessoal, para a nossa unidadee a realizagdo de nossa totalidade. Assim a nossa propria vida carrega em si um sentido, o de restaurar a nossa unidade primeira. Finalmente, néo é 0 espiritual que aparece primei- ro, mas 0 psiquico, e depois o espiritual. E a partir do olhar do imo espiritual interior que a alma toma seu sen- tido, o que significa que a psicologia pode de novo esten- der a mfo para a teologia. Esta perspectiva psicolégica nova é fruto do esforgo para libertar a alma da dominagéo da psicopatologia, do espirito analitico e do psicologismo, para que volte a si 5 mesma, isua propria originalidade. Ela nasceu de refle- xdes durante a pratica psicoterapica, e esta comegando a renovar o modelo ¢ a finalidade da psicoterapia, & uma nova visdio do homem na gua existéncia cotidiana, do seu tempo, e dentro de seu contexto cultural, abrindo dimen- sdes diferentes de nossa existéncia para podermos reen- contrar a nossa alma. Mla poderd alimentar todos aque- les que sao sensiveis 4 necessidade de inserir mais alma em todas as atividades humanas. A finalidade da presente colegio é precisamente res- tituir a alma a si mesma e “ver aparecer uma geragio de sacerdotes capazes de entender novamente a linguagem da alma”, como C. G. Jung 0 desejava. Léon Bonaventure PREFACIO Como autora de As deusas e a mulher, fui muitas vezes interrogada a respeito dos deuses nos homens. Os homens que iam as minhas palestras sobre as deusas per- guntavam-me freqiientemente: “E quanto a nés?” Os deu- ses e o homem é, assim, uma conseqiiéncia natural do meu livro anterior. Mas minha profissao, o tempo histé- rico e (paradoxalmente) o fato de eu ser mulher também me incentivaram a realizar este trabalho sobre os arqué- tipos masculinos. Aoescrever este livro, sou mulher fazendo aquilo que as mulheres fizeram tradicionalmente pelos homens, ou seja, servir de intérpretes da vida intima de seus homens, porque estes, com freqiiéncia, compartilham com elas aquilo que em geral nao dizem uns aos outros. Muitos homens, por exemplo, escolhem mulheres psiquiatras por- que se sentem mais segures e acham mais facil conver- sar com uma mulher, Alguns dizem que querem evitar a sensacio de competitividade e as conseqiiéncias que te- mem surgir em si préprios, ou num terapeuta do sexo masculino. E, as vezes, uma mulher significativa pode desem- penhar papel importante como “portadora do sonho” na yida do homem bem-sucedido, como observou 0 psicdlogo Daniel Levinson em seu The Seasons ofa Man’s Life. Este 7 também é papel no qual uma analista junguinna pode serlancada. Na psicandlise, os homens falam de sua vida intima, e encontram seus pontos fracos e fortes, A medi- da que vaio se enxergando mais, vio me ensinando. Eu vejo quem é 0 homem sob a superficie, e chego a conheeer seus arquétipos e as dificuldades que ele pode ter ao ser quem 6 @ sentir-se auténtico. Levinson eacreven, Amulher especial é como o verdadeiro mentor: ua quali- dade especial reside em sua conexfie com o sonhe de jo vem. Ela ajuda a animar a parte do aer que contém o ao- nho. Ela facilita a entrada do joven ne munde adulto ea sua tentativa de realizar seu sonho. Em parte ela faz isso por meio de seus priprics esforges concretos como mes- tra, guia, anfitria, critica, madrinha. Num nivel psicold- fico mais profundo, ela o habilita a projetar nela sua pré- pria figura feminina intima a “anima”, como deacreveu Jung que gera e sustenta suas lutas herdicas,* Por varias razGes, a maioria dos homens sentem-se em geral mais verdadeiramente compreendidos pelas mulheres de que por outros homens, expondo-se mais para elas do que uns para os outros, Como afirma o AfcGill Report on Male Intimacy: Um homem em dez possul wm amigo com quem troca idéias aobre trabalho, dinheiro e casamento; apenas um em mais de vinte tem uma amizade com outro homem na qual re- yela seus sentimentos sobre si mesmo ou sua sexualida- de... O padrao mais comum da amizade masculina é 0 homem ter muitos “amigos”, cada um dos quaia sabe al- #uma coisa a respeite do ser publica do homem e, por con: seguinte, pouco a respeita de quem ele é, porém nenhum deles conhece mais do que 6 uma pequena parte do todo? McGill descobriu que, se um homem decide se expor, é provivel que seja para uma mulher, 4s vezes a prépria esposa, ou outra, Como muitas mulheres suspeitam, os homens tém muito mais probabilidade de manifestar seus 8 sentimentos, pensamentos c sonhos a elas do que a ou. troz homens. Da mesma forma, como observou Jean Baker Miller, em Toward a New Psychology of Wonven, sempre que exis- te um grupo superior ¢ um inferior (homens, mulheres; brancog, negros; patrées ricos, empregados pobres), o gru- po menos poderoso estuda o outro por uma questao de necessidade ¢ sabe mais a reapeito desse, do que viee- versa. Por causa disso, bem como por terem natureza mais voltada para importar-se com as pessoas, as mulheres foram desde sempre atentas observadoras dos homens,? Assim, Os deuses eo homem é uma psicologia dos ho- mens, vista por uma mulher que faz aquilo que as mulhe- res fazem ha tempos pelos homens com 03 quais se impor- tam: mostram-lhes aquilo que clas vaéem, e tomam consciéncia da neeessidade que eles sentem de mais sensi- bilidade 4 medida que descrevem os defeitos & os prable- mas masculinos, e conseiéncia da importéincia de valori- zarem suas qualidades positivas. A perspectiva deste livro éa de observadora solidaria, perspectiva que adquiri atra- vés de experiéneias tanto profissionais quanto pessoais. Sou psiquiatra e analista junguiana ¢ professora de psiquiatria cliniea na Universidade da California, em Sao Francisco, Atendo tanto homens como mulheres em mew consultério particular, ¢ sou mulher numa profissiio mas- culina repleta de mentores, amigos e colegas do sexo masculino, Por outre lade, fui mentora e preceptora de homens e mulheres. Além disso, fui “filha orgulho do papai®, a “queridinha do papai”, ¢ meu pai eentia orgulho do que eu fazia. Em razdo disso, achei mais facil que muitas mulheres sentir validade nessa cultura patriarcal, Durante dezenove anos fui também esposa, num relacionamento que tinha tanto raizes tradicionais como igualitdrias, Fiquei separada por trés anos eem seguida me divorcici. Sou mae de um filho 9 e uma filha, ambos nagcidos no comego dos anos 70, a década do movimento feminina, quando a questio dos esterettipos da controvérsia natureza x cultura — era amplamente debatida, UMA VISAO BINOCULAR DA PSICOLOGLA Em Os deuses ¢ o homem oferece-se uma “visdo binocular" da psicologia, uma visdo em profundidade que leva em conta, ao mesmo tempo, os polerosos arquétipos @o8 esteredtipos que requerem conformidade, no esforgo de compreender onde se situam nossos conflitos e como poderiamos melhor aleangar a plenitude, Essa perspectiva se desenvolveu a partir do meu trei- namento profissional e de minhas experiineias pessoais. Com o trabalho do consultério, desenvalyi a conseiénecia do que acontece no coragio ena mente dos homens e das mulheres, conheci a alegria que advém de se ter senga- gio de plenitude e integragio, quando aquilo que faze- mos é consistente com quem somos, Por outro lado, nosso corpa e nesses sonhos ¢ sintomas expressam conflitos @ dor, quando aquilo que é arquetipicamente verdadeiro 6 conscientemente negado e reprimido, O que sao esses arquétipos, ¢ a maneira como se expressam na vida do individuo, torna-se mais claro somente apds anos de tra- balha profundo em psicologia. Da mesma forma, é essencial o entendimento daqui- lo que o movimento das mulheres chamou de a “desper- tar da consciéncia’. Nas trés ditimas décadas, constata- mos como os esteredtipos podem distorcer e limitar o potencial humano, especificamente o das mulheres. Nes- se periodo, muitas mulheres tomaram consciéneia de como sua vida numa cultura patriarcal as toca pessoalmente, Os valores ¢ ag crencas de todaa as pessons sao moldados 10 pela cultura, que se reflete em noseas leis & costumes, atinge a forma eomo o poder é distribuido, ¢ como o valor eostatus sdo determinados, Numa sociedade patriarcal, as mulheres nado se saem bem. Mas os esteredtipos mas- culinos também exereem poder sobre os homens, limi- tando quem eles podem confortavelmente ser, ao recom- pensar algumas qualidades e repudiar outras. DEUSES E DEUSAS EM TODAS AS PESSOAS Quando falo a reapeito de deuges e homens, descu- bro que as mulheres muitas vees acham que existe um deus particular nelas também, da mesma forma coma descobri que, quando falava a respeito de deusas, os ho- mens podiam identificar uma parte de si mesmos com uma deuse especifica, Os deuses e as deusas represen- tam qualidades diferentes na psique humana, 0 pantedio de todas as divindades gregas, tanto as masculinas como as femininas, existe como arquétipo em todos nds, embo- ra os deuses peralmente sejarn os determinantes mais fortes e influentes da personalidade do homem, assim. como as deusas o so para as mulheres. Todo arqueétipo esti associado a certos dons e deter- minades problemas possiveis, “dados por um deus" ou “dados por uma deusa”. Reconhecer esses dinamismos torna menos provavel tanto a presungio como a autocen- sura. H, porque tudo o que fazemos e que emerge das nossas profundesas arquetipicas tem um significado para nég, o homem que sabe que deus ou deuses estado ativos nele, torna-se apte a fazer escolhas, sabendo que opgies ou rumos 6 provavel que Ihe sejam pessoalmente mais salisfatériog, Ler sobre os deuses torna-se fs vezes um meio de “reamembrar" partes amputadas (desmembradas) de nés 11 mesmos. Esse processo também pode ser facilitade pelos sonhos, recordagies e mitos atives cm nosso inconscien- te, Informar-se a respeito dos deuses diferentes nos ho- mens 6 importante também para as mulheres, muitas das quais fazem grande esforgo para procurar entender cos homens (geralmente determinado homem de cada vez), As mulheres psicologicamente despertas is vezes perce- bem que se envolvem, vexes @ veZed sepuidas, com um tipo particular de homem, ¢ percebem que realmente pre- cisam saber “quem” as atrai. Os dewses eo homem pode dizer-lhes que elas foram atraidas por um deus ou arque- tipo particular, numa série de homens, e que esse “deus” niio é compativel com suas expectativas, o que explica por que suas relacdes muitas vezes tém um final infeliz, ‘0 discernimento em relagio aos “deuses" proporcio- na a quem ceria meninos (especialmente miles solteiras) um meio para ver e avaliar “quem” séo seus filhos. O re- sultado logico 6 um pai ou mae sentindo-se mais compe: tente, porque entende o que provavelmente sera aquele filho, como o mundo provavelmente o tratard, quais po- derdo ser euas forgas e fraquezas, ¢ onde ele talvez preci- se de alguma ajuda, Tanto os homens quanto as mulheres precisam tam- hém enxergar seus pais com clareza, muitas vezes a fim de perdoar-lhes, ou ainda compreendé-los, Entender os densea e seus mitos pode fornecer uma imagem objetiva do pai. IE. porque existem também “deuges" nas mulheres, elas podem aperfeigoar seu autoconhecimento a partir do conhecimenta deles. O “Ahal" de momento da revelacdo pode ser de especial valia para a mulher que ji este fami- liarizada com as “deusas" e que, agora, descobre que de- terminade deus explica parte do seu préprio comporta- mento, Ela pode entender a satisfacdio que todos nds sentimos quando uma pega de um quebra-cabegas se en- 12 caixa com perfeico, especialmente quando essa é a pega que faltava, aquela que completa o quadro eda sentido & vida, Existem deuses e deusas em todas as pessoas. Por meio deles, pode-se captar pela introspecefio, aquele mo- mento em que alguma coisa que sabemos intuitivamen- te a nosso respeito se conecta com uma imagem nitida ae com palavras claras, Assim como ao olhar num espelho e ver noseos tracos pela primeira vez, esse lampejo de percepeao pode revelar aquilo a que os outros reagem em nds, expondo-nos de uma forma muito mais clara a nds mesmos. Escrevi este livro para todos os que querem enten- der melhor os meninos e os homens, ou que querem co- nhecer os arquétipos masculinos tanto nos homens como nas mulheres, ou deacobrir algo a reapeito de si mesmos @ suas relagies. Mm particular, eserevi pensando nog ho- mens que querem descobrir o deus interior, aqueles que me perguntaram “¢ quanto aos denses em todos on Ao- mens? E quanto a nds?" AGRADECIMENTOS Cada capitulo deste livro conta com a contribuigio de muitas pessoas que nao sao nominalmente citadas — pacientes, amigos, colegas, parentes, cada homem ou ga- rote importante de minha vida — que sendo quem sfio, exemplificaram certos aspectos do arquétipo de um deus, ou me ajudaram a entender o que é ser menine ou ho- mem nesta cultura patriareal, Ao longo dos anos, as mu+ heres me falaram dos homens de quem cram intimas, dando fis vexes a impressio de conhecé-los até meamo melhor que os préprios — especialmente aquele tipo de homem que ndo reflete sobre si. Significativas contribui- ¢des fizeram por homens que mergulharam fundo comi- fo na andlise junguiana, para descobrir sentimentos, his- Lirias, ¢ partes de si mesmos que eles no inicio ignoravam, que estavam fora de seu aleance, Portanto, a maioria das descrigdes compic-se de mui- tos homens que conheci nas mais variadas circunstincias, especialmente ao longo dos meus 25 anos de consultério psiquidtrico, Meu trabalho se desenrola dentro do terencs (santudrio", em prego) da confianca, da confidencialidade, da seguranga. Nele, o que era inconsciente ou nfo lembrado volta 4 tona com o tempo. Cada um dos homens que me con- fou sua psique ensinou-me mais acerca da psicologia dos ou- tros homens edas mulheres, incluindo eu mesma, Obrigada. 14 Ao longo deste texto usei figuras histdricas, colebri- dades, personagens ficticios, para deserever uma faeeta particular de um deus, Reeorri A imagem publica dessas pessoas e aos comentdrios que fizeram © que cito, mas nfio me vali de conhecimento pessoal ou profissional de- les. As pessoas reais geralmente acabam se mostrando mais e menos do que suas imagens exageradas pela ex- posigio ao publica, ‘Tanto este livra como As deusas e a mulher decorre- ram das descobertas e teorias de C. G, Jung. O trabalho que ele realizou sobre os arquéLipos do inconsciente cale- tive e sobre os tipos psicolégicos assentaram os alicerces do meu trabalho. A descrigao do complexo de Mdipo feita por Freud sugeriu o elo de ligagao entre os mitos gregos ¢ a psique, que, depois dele, o5 autores junguianos inveati- garam muito mais a fundo. A maior parte do que se es- ereveu sobre a psicologia arquetipica desde dung & publicada pela Spring Publications ea maioria dos tra- balhos passou pelas mios do editor James Hillman, A maioria dessas publicagies esta relacionada nas notas aos eapitulos. O trabalho de Murray Stein teve para mim importancia especial. 0 entendimento cada vez maior do que é a cultura patriarcal em que vivemos ¢ de como ela moldou os valo- res, as percepeies ¢, enfim, cada um de nds é um dos gran- dea temas deste livre, e esaa consciéneia cada vex mais apurada vem sendo construida por toda uma geragfio de ativistas, escritores e estudiosos aos quais agradeca, prin- cipalmente 4s mulheres desse contingente. No que diz res- peito 4 minha formagiio pessoal, sou especialmente grata a Gloria Steinem e 4 diretoria e funciondrias da Ms, Four: dation jor Women; a Jean Baker Miller, M.0., ¢ a Alexan- dra Symonds, M.D, assim camo fis mulheres que eompu- nham a forga-tarefa eos comités de mulheres da Aseociagto Americana de Psiquiatria, Anthea Francine, com quem 15 coliderci muites workshops, aprofundou minha pereepeiio dos efeitos que a familia e a cultura exercem sobre a crian- ca, especialmente no caso daquelas cujos arquétipos nao si reepeitados. Os livros de Alice Miller deram-me novo Angulo de visiio sobre o pensamento psicanalitico, que con- firmou o que eu jé sabia sobre criangas eo efeite de serem traumatizadas por pais traumatizados, Este livro teve um trabalho de parto muito facil por- que teve licenga para vir 4 luz em seu proprio ritmo, le- vando em conta as estagées da minha vida, em vez das datas e prazos do contrato original, Agradego a meu edi- tor e gerente editorial na Harper & Row, Clayton Carlson, por seu generoso tempo e demonstragdo de entendimen- to, e por haver designado Tom Grady para trabalhar co- migo. Asensibilidade editorial de Tom foi no ponto certo. John Brockman e Katinka Matson, meus agentes litera- riog, por cuidarem do que ja fazem tio bem, ajudaram- mea ser autora, Meu pai, Joseph Shinoda, deu-me apoio quando se tra- tou de fazer coisas no mundo. Herdei dele a intensidade, o companheirismo, a inclinagao pela literatura e pela histé- ria, ea capacidade de eserever e falar, Ele morreu enquanto en cumpria 6 meu primeiro ano de residéncia em psiquia- tria, e. com isso nunca chegou a conhecer meus filhos nem meus livros, Sinto falta dele, e sei que, embora nosso tempo juntos tenha sido mais curto do que eu queria, tive a felici- dade de ser muite querida por ele. Em parte, a afetuosidade caclareza de entendimento que marcam este livro so fru- todeeu ter tido um pai Zeus bem-sucedido a quem pude me opor e com quem medir forgas, quando o que me importava eo que ele queria de mim diferiam, Mill Valley, Califérnia, novermbro de 1988, 16 PARTE I OS DEUSES E 0 HOMEM I HA DEUSES EM TODOS 08 HOMENS Este livro trata dos deuses que existem em todos os homens, ou seja, os padriies inatos arquétipos que se en- contram no fundo da psique, moldando os homens por dentro, Esses deuses sao predisposigées invisiveis @ po- derosas, que atingem a personalidade, o trabalho e os relacionamentos. Oz deuses tém ligagdo com a intensida- de ou a distancia emocional, com as predilegies por pre- cisio mental, exercicios corporais ou uvaliagdéo estética assim come com experiéncias de fusio extatica, entendi- mento global, nocdo de tempo, e muito mais. Os diferen- tes arquétipos sfio responsdveis pela diversidade entre o6 homens e pela complexidade masculina, ¢ Lém muito a yer com a facilidade ou dificuldade que homens (e meni- nos) experimentam quando ha que se conformar com ex- pectativas, ¢ que custo isso acarreta para sua mais pro- funda autenticidade, Sentir-se auténtico significa ser livre para desenval- ver tragos e potenciais que séio predisposigées inatas. Quan- do somos aceitos ¢ temos licenga para ser genuinos, 6 pos- sivel ter ao mesmo tempo auto-estima e sentir-se autéentico, Esse sentimento a6 se desenvolve se somos encorajados, & nao desestimulados pelas reagdes das pessoas que so importantes para ndés, ao termos condutas espontiiness e confiantes, ou quando nos deixamos absorver por aquilo 19 que nos traz contentamento. Desde a infancia, primeira a familia e depois a cultura sao os espelhos em que nos en- xergamos como pessoas aceitdveis ou no, Quando preci- samos nos conformar para sermos aceitos, terminamos adotando uma falsa mascara ¢ desempenhando papéis vazios, se entre quem somos por dentro e 0 que se espera de nds ha distancia muito grande, 0 CONFORMISMO COMO 0 LEITO DE PROCRUSTO A conformidade exigida dos homens pela cultura patriarcal é como o leito de Procrusto, da mitologia gre- ga. Os viajantes que iam de Mégara a Atenas eram forga- dos ase deitar nessa cama de ferro, Se fossem menores, 0 bandido esticava suas pernas com sistema parecido ao das rodas medievais de tortura; se fossem maiores, eram simplesmente esquartejades para se ajuatar ao tamanho. Ha homens que cabem precisamente na leito de Procrusto, da mesma forma como existem aqueles para quem os esteredtipos (ou as expectativas do mundo ex- terno) e 08 arquétipos (os padrées internos) estéo em har- monia, Para esses o sucesso é facil e prazeroso. Todavia, conformar-se aos esteredtipos é, via de repra, processo torturante para o homem cujo padrfio arquetipico des- via-se “do que devia ser”, Ele pode dar a impressdo de eaber mas, na verdade, manobrou até chegar a ease re- sultado, amputando aspectos significativos de seu ser, ou esticando outras dimensées de sua personalidade para corresponder As expectativas, mas comprometendo assim sua complexidade e profundidade o que, muitas vezes, torna intimamente vazios 03 sucessos no mundo externa. Os viajantes que passaram pela provagéo do leito de Procrusto para chegar a Atenas podem ter-se questiona- 20 do sebre a validade dessa experiéncia como costumam fazer hoje em dia os homens que “chegaram 1a", William Broyles Jr, em artigo para o Bequire, descreve amuarga- mente como o sucesso pode ser vazia: Toda manhé me enfiava num terno, agarrayva a pasta ia para o glamurese trabalho morrer um pouce, Eu era o editor-chefa da Newsweek, cargo que, aos olhos dos ou- tros, ora Ludo; sé. que nao tinha nada a ver comigo. Dava- me pouco prazer dirigir uma grande ingtituigdo, Queria sentir uma realizagae pessoal, nfo ter poder. Para mim, 0 sucesso era mais perigoso do que o fracasso; este ter-me- ia forgade a decidir o que queria realmente, Adinica saida estava em me demitir, mas nunea mais abandonara coisa alguma desde o dia em que larguei a equipe de corrida, no colegial. No Vietna, também fora fuzileiro, ¢ 03 fusileiros sic treinados a sustentar wm ata- que torre acimna, seja a que custo for. Mas ja tinha con- quistado o topo da colina e estava detestando ficar li em cima, Subira o morro errade ¢ a tinica coisa que restava era descer e subir outro, Nite foi ficil: minhas pegas de redagao custavam mais a sair e men casamente foi por Agua abaixe, Eu precisava de alguma coiga ¢ no sabia ao certo o qué, Sabla que queria ser lestade, mental e fisicamente. (ueria ter sucesso, mas de acordo com pardmetros que nao me cram claros nem concretos, e que nem dependiam da opiniao dos outros, Queria a intensidade ¢ a camara: dagem de empreendimente arriscado, Se fosse em outra 6poca, teria ido para o meio-oeste, on para o mar, mas jA tinha dois filhos ¢ toda uma teia de responsabilidades. Esse homem de poder e prestigio, com metas que ocupam os melhores anos da vida de um homem para serem atingidas « que, na verdade, poucos conseguem aleangar sofria do pior distirbio que vi homens de meia- idade padecer; depressio amena, mas insidiosa. Quando 4 pessoa néo tem mais contato com suas fontes interiores de vitalidade e alegria, a vida fica vazia e sem sentida, Nesta cultura, 05 homens mandam e parecem ocupar os 21 melhores papéis. E certo que seupam oa de mais poder e mais bem remunerados, Apesar disao, muitos deles so- fremn de depressao que o dleool tenta mascarar, ou que excesgo de trabalho ou horas e horas diante da televisio tentam entorpecer. Ha muitos mais ainda, ressentidos e gangados, com hostilidade e ira prontas a explodir ao menor estimulo, desde 9 modo como algum motorista se eomporta no transite até o comportamento irritante de uma crianca. Também sofrem de curta expectativa de vida, O movimento feminista expressou de modo muito eloqiiente os problemas que as mulheres vivem em meio ao patriarcado; mas, a julgar por quantos homens infeli- zea que existem, viver no mundo patriarcal parece que também faz mal para eles, O MUNDO INTERNO DOS ARQUETIPOS Quando a vida da a sensagdo de nao ter sentido, ou quando alguma coisa parece profundamente errada no modo como yore vive e no que fax, vocd pode ajudar to- mando consciéneia das discrepfincias entre 03 arquéti- pos, em seu interior, e o8 papdia visiveis que desempe- nham. Muitas vezes os homens ficam presos entre o mundo interno dos arquétipos e o mundo externo dos es- teredtipos, Oa arquétipos so prediaposigies poderosas; representados pelas imagens ¢ pela mitologia dos deuses gregos, nas minhas descrigées ao longo deste livre, cada um deles tem impulsos, emocéea e necessidades caracte- risticas, que moldam a personalidade, Quando se desem- penha um papel relacionado a um arquétipo ativade em nosso intimo, a profundidade e a significagao dease papel em nossa vida geram energia. Se, por exemplo, se é como Hefesto, o artifice e in- yentor, deus da forja, que confeecionou bela armadura e 22 belas jdias, entdo se pode passar horas e horas soxinho na oficina, no estidio ou laboratério, intensamente ab- sorto no que faz, com muito capricho, para atingir os mais altos padries, Mas se, no intimo, se é como Hermes, 0 deus mensageiro, entio se é, naturalmente, “algaém que esta sempre em movimento", Seja como representante de vendas itinerante, ou negociador internacional, ama-se 0 que se faz e para isso é preciso agilidade mental, especi- almente se se perceber, como ¢ comum que acontega, que navegamos por aguas cticamente turvas, Se se 6 como um desses deuses e tens de fazer o trabalho do outro, este nfo geria mais uma fonte de prazer e envolvimento, pois o trabalho sé é capaz de trazer satisfagdo quando coincide oom nosaa natureza arquetipica e com nossos talentos naturais, As diferengas na vida pessoal também sio moldadas pelos arquétipos. O homem que lembra Dioniso, o deus do éxtase, pode estar totalmente absorvido pela sensua- lidade do momento, quando nada é mais importante do que ser o amante espontineo. Ele eontrasta com o ho- mem que, como Apolo, deus do sal, trabalha para aperfei- goar suas habilidades e se tornar especialista numa de- terminada técnica, que pode incluir a de fazer amor. Assim como 08 arquétipos, os “deuses” existem como padroca que ditam as emogées e os comportamentos; fo forgas poderosas que exigem o que lhes é devido, quer iseo seja reconhecido, quer nfo. Reafirmados consciente- mente fembora nao necessariamente denominados) e res- peitados pelo homem (e pela mulher) em quem existem, cases deugea ajudam o homem a ser quem realmente é e motivam-ne a levyar uma vida que lhe dé a sensagao de ter sentido, pois o que ele faz entao esta ligado 4 dimen- so arquetipica de sua psique. Mesmo quando desrespei- tados e renegados, os deuses também exercem sua in- fluéneia que costuma ser altamente perturbadora, e suas 23 exigéncias inconscientes ao serem feitas ao homem c tumam interromper-lhe as atividades, Uma iden cao distorcida também é prejudicial. As vezes, por exem- plo, o homem pode se identificar tanta com certo deus que acaba perdendo sua individualidade; torna-se “pos- suido", “O8- 0 QUE BO ARQUETIPO C. G, dung introduziu o conceite de arquétipo na psicologia, Trata-se de padries preexistentes, latentes e internamente determinadas, de ser ese comportar, de per- eeber ¢ reagir, Esses padrées estaa contidos no incons- ciente coletive, aquela parte do inconsciente que nao é individual e sim universal, compartilhada, Eases padroes podem ser descritos de maneira personalizada, como deu- ses 6 deusas; seus mitos sfo histérias arquetipicas. Hs- ses dinamismos despertam sentimentos o imagens, e tra- tam de temas universais que fazem parte de nosso legado humane comum. Soam verdadeiros, do ponto de vista de nossas experiéncias humanas partilhadas e, por isso, daa asensacio de ser vagamente conhecidos, mesmo quando og ouvimos pela primeira vez, E quando interpretamos o mito sobre um deus, quando captamos intelectualmente seu sentido ou intuitivamente assimilamos sua conexao com nossa vida, o impacto pode ser o mesmo daquele de sonho pessoal que lan¢a lug sobre determinado lado de seu carter, on do carater de uma pessoa que conhecemos. Na qualidade de figuras arquetipicas, os deuses so como qualquer outra coisa genérica: deserevem a estru- tura hésiea dessa parte do homem (ou da mulher, pois arquétipos de deuses também costumam ser ativados na psique feminina}. Essa estrutura basica 6 “vestida” ou *corporificada” ou “detalhada” pelo individuo do sexo 24 muasculino, cuja singularidade é moldada por sua fami- lia, clasze social, nacionalidade, religiao, pelas experién- cias de vida e pela época em que vive, assim como por sua aparéneia fisica e inteligincia. Mesmo assim, é possivel reconhecer que ele segue certo padréo arquetipico, que faz lembrar determinado deus. Uma vex que as imagens arquetipicas fazem parte de nosso legado humano coletiva, clas sfio “familiares”. Os mitos da Grécia, com mais de 3.000 anos de historia, continuam vivos, 6 so contados e recontados, porque os deuses eas deusas nos dizem as verdades sobre a natu- reza humana, Aprender quem sfio esses deuses gregos pode ajudar os homens a entender melhor quem ou o que atua no funde do seu paiquiamo, E as mulheres poder aprender como entender melhor os homens, sabendo quais deuses estio ativades nos que lhes sfio significativos em suas vidas, além de descobrirem que um ou outro “deus” em particular pode ser parte de sua prdpria psique. Os mitos oferecam a possibilidade de um “Ab! repentino de entendimento, a percepeéo sibita de alguma coisa que pareee certa e, intuitivamente, apreendemos a natureza de uma situacio humana com mais profundidade. Asemelhanca com Zeus, por exemplo, pode ser dras- ticamente ébvia nos homens capazes de ser cruéis, que correm riscos para acumular poder e bens, ¢ que querem garantir alta visibilidade assim que alcangam status de destaque. As historias sobre Zeus geralmente cabem tam- bém na vida dos homens que ee identificam eom ele. Por exemplo, sua vida conjugal e sexual pode lembrar os ro- mances de Zeus, A dguia, associada com 4eus, eimboliza algumas caracteristicas dease arquétipa: de sua posigao aoalto pode enxergar as coisas por um prisma abrangente, tem a percepcgao agugada dos detalhes ¢ a habilidade para atacar rapidamente quando quer apoderar-se de alguma coisa com suas garras, 25 Hermes, 0 deus mensageiro, era o comunicador, tra- quinas, guia de almas até o mundo inferior ¢ o deus das pstradas e das fronteiras. O homem que encarna esse arquétipo tera dificuldade em seu instalar num canto 26, pois 6 sensivel 4 seducfio das estradas abertas 4 sua fren- te eda préxima oportunidade. Tal como 6 mereurio (para os romanos ele se chama Merciirio}, esse homem escapa pelo vio dos dedos das pessoas que querem agarré-lo ou segurda-lo com as méos. Zeus e Hermes sfio doia padrées muito diferentes & os homens que lembram um e outro sdo muito diversas entra si. Mas, como potencialmente todos os arquétipos estado presentes no homem, esses dois podem estar ativados num mesmo homem, Se esses dinamismos esti- yerem em equilibrio em seu interior, o homem pode eon- seguir estabelecer-se que 6 uma prioridade de Zeus com a ajuda das habilidades de comunicagao ¢ das idéias ino- vadoras que sdo tipicas de Hermes. Ou ele se percebera atolado num conflito psiquice, na gangorra entre o seu Zeus que quer poder, o que exige tempo e compromisso, & o Hermes que necessita de liberdade. Esses sfio 26 dois dos arquétipos de deuses com valor positive numa cultu- ra patriareal. Os deuses denegridos ou rejeitados, aqueles cujos atributes nfo eram prezados naqueles tempos nem ago- ra, também estado atives na psique masculina, da mesma forma que na mitologia grega, Havia preconceito contra eles enquanto deuses; a cultura ocidental tem um viés negative parecido contra eles enquanto arquétipos da psique humana; a sensualidade ea paixfo de Dioniso, 0 frenesi de Ares nos campos de batalha que, em outro con- texto, poderia com a mesma facilidade transformar-se em danga, a emotividade de Poséidon, a intensa criatividade subterrinea de Hefesto, a introspeegda de Hades. Esse vies ainda em vigor atinge a psicologia dos homens que 26 devem, cada um a seu modo, reprimir esses aspectos em si mesmos no eaforgo de se conformar aos valores cultu- rais que recompensam a distancia emocional e a frieza, junto com a conquista do poder, Quer esteja trabalhanda, quer guerreando ou fazen- do amor, quando vocé s4 se conforma com o que 6 espera- do a eu respeito, e nAéo conta com nenhuma energia ar- quetipica para inspird-lo, gastaré enorme quantidade de energia e de esforco. Tanto empenho podera trazer suas recormpensag, mas nao proporcionard a sensagio da sa- tisfagiio profunda, Por outro lado, quando faz o que ama, vocé ge valida intimamente e sente prazer; o que faz é consistente com a sua natureza, Vor é de fato pessoa feliz se o que faz também 4 gratificado e valorizado no mundo externo, ATIVANDO OS DEUSES Todos os deuses sio padrées potenciais na psique de todos os homens mas, em cada um deles individualmen- te, alguns desses padres sao ativados (energizados ow desenvolvidos) enquanto outros néo, Jung usava a ana- logia da formacdo dos cristais para ajudar a explicar a diferenga entre padres arguet{picos (que sio universais) e arguétipos ativados (fancionando dentro de nés), O ar- quétipo é como o padrao invisivel que determina a forma ea estrutura que um cristal assumira quando chegar a ter forma. Assim que isso realmente acontece, o padriio, agora identificdvel, 6 andlogo a arquétipo ativado. Os arquétipos também podem ser comparados aos “gabaritos” eontidos nas sementes. O crescimento que se processa a partir delas depende do solo e das condigées climiticas, da auséneia ou presenca de certos nutrientes, de um eultive amoroso ou de descasa por parte do jardi- at neiro, do tamanho e da profundidade do recipiente, do yico da propria espécie, Pode ser que a semente nem bro- te, ou que nao sobreviva depois de ter soltado seus pri- meiros raminhos. Se cresee, pode virar um espécime mag- nifica, ou ter o desenvolvimento comprometido, talvez agora devido a condicées muito distantes do ideal. As cir- cunstancias afetarao a aparéncia especifica do que cres- cea partir da semente, mas a forma ou a identidade basica da planta como o arquétipo ainda continuard reconhecivel. Arquétipos sfio padrées humanos hasieos, alguns dos quais inatamente mais fortes em algumas pessoas que em outras, da mesma maneira como tragos humanos tais como aptidéo musical, a nogio interna de tempo, habili- dades paranormais, coordenagdo fisica, inteligéncia. Nés, humanos, temos todos certo potencial musical, por exem- plo, mas alguns individuos (como Mozart) sfio criancgas prodigio ¢ outros (como eu) tém dificuldade em repetir um som, Acontece o mesmo com os padrées arquetipicas. Alguns homens parecem ser a encarnacdo de um arqué- tipo em particular desde o dia em que nasceram e se mantém basicamente do mesmo jeito a vida inteira; ou, no caso de outros, determinado arquétipo pode irromper na metade da vida, por exemplo, se ele subitamente se apaixonar ¢ travar eontato direto com Dioniso. Predisposicio interna e expectativas familiares Os bebés nascem com tracos de pereonalidade: siio vigorasos, voluntariosos, placidos, curiosos, capazes de ficar sozinhos durante algum tempo, ou pedem a compa- nhia de outras pessoas. O nivel de atividade fisica, de energia eo tipo de atitude é diferente para cada menino, O recém-nasecido cujo chore forte tem o inequivoco poder de exigir o que quer neste preciso momento e que, aos dois anos, se arremessa fisicamente em todas as ativida- 28 des, écrianga muito diferente daquele menininho radiante eafetive que parece ser a prépria alma da razoubilidade, mesmo téo pequenino. Sfio tio diferentes quanto o Ares intensa e instintivamente fisico, e 0 amistoso e bem- humorado Hermes, No bebé, no menino e finalmente no homem, as acées e atitudes que comecaram como predisposicées inerentes ou como padrées arquetipicos efo julgados pelos outros ¢ despertam nesses reacces de aprovacio, desaprovacao, ansiedade, orgulho e vergonha. As expectativas de uma familia valorizam estes arquétipos e repudiam aqueles; a mesma atitude mantem-se quanto a casas qualidades em seu filho, ou quanto a propria natureza da criancga, 0 ambicioso casal de jovens profissionais de carreira, em franea ascenséo sociocconémica, que ficou sabenda pela amniocentese que “é um menino", pode pazsar a esperar pelo nascimento do filho que j4 antecipam como caloura de uma universidade consapgrada, Esperam que nasga um filho de boa presenca, capaz de concentrar seus esforcos intelectuais na consecucio de um alvo de longo prazo, Um menino que, arquetipicamente, seja como Apolo ou Zeus poderd corresponder A encomenda com preciso, agradando os pais ¢ se saindo bem no mundo. Mas se esse menino for arquetipicamente de outro tipo, 6 prova- vel que desperte raiva e decepcdo por sua incapacidade de satisfazer As expectativas, Um emotive Poséidon, on um Dic e sua visio do momento presente, teriio difi- euldades em se conformar com o programa que seus pais montaram para sua vida. Esse desencontro provavelmen- te atingira de maneira adversa sua auto-estima. 4! comum que uma crianga de uma familia nao “com- bine" com as suposicées ou com o estilo de convivia fami- liar, A erianga que aprecia a solidio, como Hades, ou a distincia emocional, como Apolo, nao 86 sofre invasoes de privacidade constantes, como também pode ser consi- 29

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