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PROIN-CAPES 1998
J. Delgado - S. Firmo - P. Nóbrega ii Instituto de Matemática - UFF
Conteúdo
1 Conjuntos 1
2 Os Inteiros 19
3 Os Racionais e os Irracionais 69
0
Capı́tulo 1
Conjuntos
1.1 Introdução
As teorias estudadas em matemática são construı́das sempre partindo de alguns fatos con-
siderados básicos. Tais fatos são chamados axiomas. Os axiomas junto com as definições dos
conceitos que a teoria pretende estudar dão lugar, após raciocı́nios lógicos, a resultados cha-
mados proposições. A seqüência de conclusões lógicas utilizadas para chegar a um resultado
determinado partindo das definições, axiomas e outros resultados, é chamada demonstração.
A palavra teorema é reservada a proposições de caráter relevante na teoria em questão, da
mesma maneira, um lema é uma proposição que será usada como ferramenta fundamental para
provar outras proposições. Os corolários são proposições que se obtêm como conseqüência di-
reta de proposições e teoremas importantes.
Todo lema, proposição, teorema e corolário, tem um enunciado. Todo enunciado se divide
em duas partes, as hipóteses e as teses. A demonstração do resultado (seja um lema, uma
proposição, um teorema ou um corolário) pode ser descrita da seguinte maneira: usar os axio-
mas, definições e resultados prévios da teoria para chegar às teses partindo das hipóteses por
meio de um raciocı́nio lógico. Isto se resume dizendo que a hipótese implica a tese e escreve-se
Hipótese =⇒ Tese
O sı́mbolo =⇒ significa que partindo da parte da esquerda (Hipótese) e usando um ra-
ciocı́nio lógico baseado nos axiomas, definições e resultados anteriores da teoria, se obtém
como conseqüência o lado direito (Tese).
Por exemplo consideremos o seguinte enunciado:
1
Conjuntos 1.2 Conjuntos
1.2 Conjuntos
Neste capı́tulo introduziremos algumas noções básicas da teoria de conjuntos. Não apre-
sentaremos uma exposição axiomática e rigorosa da teoria, mas sim uma exposição intuitiva e
simples, incluindo apenas o material e a terminologia que usaremos mais adiante.
Embora esta “definição” do termo “conjunto” seja intuitivamente clara, ela não é formal-
mente correta, pois a palavra “coleção” é ainda indefinida. Na verdade, a noção de conjunto em
matemática é uma noção indefinida (da mesma maneira que a noção de ponto na Geometria
Euclidiana) e é necessária uma lista de axiomas para trabalhar com conjuntos e suas propri-
edades. Na prática, uma introdução heurı́stica, como a que apresentamos a continuação, é
suficiente.
Os conjuntos serão designados (salvo menção explı́cita) por letras maiúsculas, deixando
as minúsculas para designar objetos dos conjuntos. Se a é um objeto do conjunto A, dizemos
que a pertence a A, ou que a é elemento do conjunto A e escrevemos a ∈ A. Se a é um objeto
B. Por meio de uma propriedade que caracteriza dos elementos do conjunto. Por exemplo
A caracterização (b) é principalmente útil quando o conjunto tem tantos elementos que
seria praticamente impossı́vel colocá-los numa lista. Consideremos por exemplo:
ou pior ainda,
F = {x ; x é o nome de um assinante de algum catálogo telefônico de alguma cidade do mundo}.
Quando todo elemento de um conjunto A é também elemento de um conjunto B, dizemos
que A é um subconjunto de B, ou que A está contido em B e escrevemos A ⊂ B. As vezes di-
zemos também que B contém A e escrevemos B ⊃ A. Se A não está contido em B escrevemos
Demonstração. Procedendo pelo absurdo, vamos supor que A e B sejam conjuntos tais que
∅A 6= ∅B .
Segundo o item iii. acima, ∅A 6= ∅B significa que ∅A 6⊂ ∅B ou que ∅B 6⊂ ∅A .
Caso ∅A 6⊂ ∅B, deverá existir um elemento x ∈ ∅A tal que x ∈
/ ∅B .
Pela definição de ∅A vemos que x será um elemento de A tal que x 6= x, “o qual é absurdo,
pois qualquer objeto é igual a se próprio”.
O quadrado que temos colocado no extremo direito da última linha acima indica que a
demonstração está terminada. Alguns autores escrevem as letras CQD que significam “Como
Queria-se Demonstrar” para indicar o fim de uma demonstração.
Como conseqüência da proposição anterior obtemos o seguinte resultado.
Corolário 1.2.2. Existe um único conjunto ∅, chamado o conjunto vazio, que não contêm
elementos e está contido em qualquer conjunto.
A ∪ B = {x ; x ∈ A ou x ∈ B} e A ∩ B = {x ; x ∈ A e x ∈ B}.
A=A∪∅ ∅ = A ∩ ∅.
Demonstração. Exercı́cio.
As propriedades formais das operações de união (∪) e interseção (∩) são colocadas no
seguinte resultado:
Demonstração. Não é difı́cil provar (1)-(3), exercı́cio. Vamos provar apenas a primeira das
fórmulas de distributividade.
Lembramos que dois conjuntos são iguais se, e somente se, um está contido no outro.
Portanto, provar a fórmula em questão equivale a provar que o conjunto do lado esquerdo está
contido no conjunto do lado direito e que este, por sua vez, está contido no primeiro:
Prova da inclusão A ∩ (B ∪ C) ⊂ (A ∩ B) ∪ (A ∩ C):
x ∈ A ∩ (B ∪ C) =⇒ (x ∈ A) e (x ∈ B ∪ C)
=⇒ (x ∈ A) e [(x ∈ B) ou (x ∈ C)]
=⇒ [(x ∈ A) e (x ∈ B)] ou [(x ∈ A) e (x ∈ C)]
=⇒ [(x ∈ A ∩ B) ou (x ∈ A ∩ C)]
=⇒ x ∈ (A ∩ B) ∪ (A ∩ C).
Observamos que qualquer conjunto não vazio A pode servir como conjunto de ı́ndices de
uma famı́lia de conjuntos. Com efeito, para cada a ∈ A seja Aa = {a} e consideremos a famı́lia
F = {Aa }a∈A . Também todo conjunto F, cujos elementos são conjuntos, pode ser considerado
como uma famı́lia de conjuntos indexada por F (i.e. auto-indexada). De fato, F = {AF }F∈F , onde
AF = F para todo F ∈ F.
Observando com cuidado, podemos ver que a união e a interseção de uma famı́lia inde-
pende da maneira como está indexada. Isto é, se Λ = Γ e F = {Aλ }λ∈Λ é uma famı́lia indexada
por Λ, então
[ [ \ \
Aλ = Aγ e Aλ = Aγ .
λ∈Λ γ∈Γ λ∈Λ γ∈Γ
Pode-se provar com um pouco de esforço, que a união de famı́lias distribui sobre a interseção e
que a interseção de famı́lias distribui sobre a união. Para enunciar este fato usaremos a noção
de produto cartesiano que introduziremos em breve.
Definimos a seguir uma outra operação entre conjuntos
A − B = {x ; x ∈ A e x ∈
/ B}.
A − ∅ = {x ; x ∈ A e x ∈
/ ∅} = {x ; x ∈ A} = A.
B ⊂ C ⇐⇒ (x ∈ B =⇒ x ∈ C) ⇐⇒ (x ∈
/ C =⇒ x ∈
/ B).
Portanto
(x ∈ A − C) =⇒ (x ∈ A e x ∈
/ C) =⇒ (x ∈ A e x ∈
/ B) =⇒ x ∈ (A − B),
(x ∈ A − (A ∩ B)) =⇒ (x ∈ A e x ∈
/ A ∩ B) =⇒ (x ∈ A e (x ∈
/ A ou x ∈
/ B)) =⇒
((x ∈ A e x ∈
/ A) ou (x ∈ A e x ∈
/ B)) =⇒ ((x ∈ A − A) ou (x ∈ A − B)).
A − B = {x ; x ∈ A e x ∈
/ B} = {x ∈ X ; x ∈ A e x ∈
/ B}
= {x ∈ X ; x ∈ A} ∩ {x ∈ X ; x ∈
/ B} = {x ; x ∈ A} ∩ {x ; x ∈ X e x ∈
/ B}
= A ∩ (X − B) = A ∩ {X B. C.Q.D.
Demonstração. Os itens (a)-(d) são simples e os deixaremos como exercı́cio para o leitor.
Provemos a primeira das leis de De Morgan:
x ∈ {X (A ∪ B) ⇐⇒ (x ∈ X e x ∈
/ A ∪ B) ⇐⇒ (x ∈ Xe ((x ∈
/ A) e (x ∈
/ B)))
⇐⇒ (x ∈ X e x ∈
/ A) e (x ∈ X e x ∈
/ B)
⇐⇒ (x ∈ {X A) e (x ∈ {X B) ⇐⇒ x ∈ ({X A) ∩ ({X B).
A segunda das fórmulas de De Morgan pode ser provada de maneira similar, mas também
pode ser obtida da primeira com ajuda do item (b). De fato, como
Vamos introduzir outra operação entre conjuntos, o produto cartesiano. O resultado desta
nova operação será um conjunto de natureza diferente da natureza dos conjuntos envolvidos.
Na definição a seguir, a noção de par ordenado desempenha papel fundamental. Se a e b
são dois objetos quaisquer (não necessariamente pertencentes ao mesmo conjunto), podemos
considerar o objeto (a, b) no qual os elementos a e b serão denominados a primeira coordenada
e a segunda coordenada do par (a, b), respectivamente.
Dizemos que os pares ordenados (a, b) e (c, d) são iguais e escrevemos (a, b) = (c, d) se,
e somente se, a = c e b = d, isto é, dois pares ordenados são iguais se, e somente se, as suas
coordenadas correspondentes são iguais.
Observemos então que, se (a, b) é um par ordenado, então
(a, b) = (b, a) se, e somente se, a = b.
A × B = {(a, b) ; a ∈ A e b ∈ B}.
A × B = {(a, ?), (a, •), (b, ?), (b, •), (c, ?), (c, •)}.
Observe por exemplo, que os pares ordenados (?, a), (a, a), (•, ?) não pertencem a A × B.
De maneira similar podemos definir o produto cartesiano de três ou mais conjuntos. Se A,
B, e C são conjuntos, definimos A × B × C como sendo o conjunto (A × B) × C e similarmente, se
A1 , A2 , . . . , An são conjuntos, definimos A1 × A2 × . . . × An como sendo o conjunto (A1 × A2 ×
. . . × An−1 ) × An . Os elementos de A1 × A2 × . . . × An são as n-úplas ordenadas (a1 , a2 , . . . , an )
onde a1 ∈ A1 , a2 ∈ A2 , . . . , an ∈ An , e duas n-úplas (a1 , a2 , . . . , an ) e (b1 , b2 , . . . , bn ) de A1 ×
A2 × . . . × An são consideradas iguais se, e só se, a1 = b1 , a2 = b2 , . . . , an = bn . Todas as
propriedades que estudaremos sobre o produto cartesiano de dois conjuntos continuam válidas
para o produto cartesiano de mais de 2 conjuntos.
A seguinte proposição descreve duas propriedades básicas do produto cartesiano.
Demonstração.
(a) A propriedade do enunciado (a) equivale1 a
(A × B 6= ∅) ⇐⇒ (A 6= ∅) e (B 6= ∅).
c ∈ C =⇒ (c, d0 ) ∈ C × D ⊂ A × B =⇒ (c, d0 ) ∈ A × B =⇒ c ∈ A,
(a, b) ∈ A × (B ∪ C) ⇐⇒ (a ∈ A) e (b ∈ B ∪ C) ⇐⇒ (a ∈ A) e (b ∈ B ou b ∈ C)
⇐⇒ (a ∈ A e b ∈ B) ou (a ∈ A e b ∈ C)
⇐⇒ (a, b) ∈ A × B ou (a, b) ∈ A × C
⇐⇒ (a, b) ∈ (A × B) ∪ (A × C).
Consideremos, de novo, duas famı́lias de conjuntos F = {Aλ }λ∈Λ e G = {Bγ }γ∈Γ . Pode-se
provar, sem dificuldade, que valem as seguintes propriedades distributivas:
[ [ [ \ \ \
Aλ ∩ Bγ = (Aλ ∩ Bγ ), e Aλ ∪ Bγ = (Aλ ∪ Bγ ),
λ∈Λ γ∈Γ (λ,γ)∈Λ×Γ λ∈Λ γ∈Γ (λ,γ)∈Λ×Γ
Dito em palavras, a interseção (resp. união) de duas uniões (resp. intersecções) de famı́lias é
igual à união (resp. interseção) da famı́lia I = {Aλ ∩ Bγ }(λ,γ)∈Λ×Γ (resp. U = {Aλ ∪ Bγ }(λ,γ)∈Λ×Γ )
indexada pelo conjunto Λ × Γ . Mais ainda, ao invés de considerar duas famı́lias podemos con-
siderar uma famı́lia de famı́lias e provar propriedades similares, mas este ponto é bem mais
delicado e o deixaremos para um curso avançado.
Resumimos alguns fatos básicos sobre o conjunto potência de um conjunto dado na se-
guinte proposição:
C ∈ P(A ∩ B) ⇐⇒ (C ⊂ A ∩ B) ⇐⇒ (C ⊂ A e C ⊂ B)
⇐⇒ (C ∈ P(A) e C ∈ P(B)) ⇐⇒ C ∈ P(A) ∩ P(B).
Para mostrar que a igualdade nem sempre é verdadeira basta dar um exemplo (isto é, um
contra-exemplo para a igualdade da afirmativa):
Consideremos A = {?} e B = {•}, então P(A) = {∅, A}, P(B) = {∅, B}, e portanto, P(A) ∪
P(B) = {∅, A, B}. Por outro lado, A ∪ B = {?, •} e P(A ∪ B) = {∅, A, B, A ∪ B}. Como
A∪B∈
/ P(A) ∪ P(B), os conjuntos P(A ∪ B) e P(A)) ∪ (P(B) são distintos. C.Q.D.
É interessante observar aqui que (e) e (f) podem ser generalizados a famı́lias de conjuntos.
Isto é, se F = {Aλ }λ∈Λ é uma famı́lia de conjuntos, então valem as relações:
! !
\ \ [ [
P(Aλ ) = P Aλ e P(Aλ ) ⊂ P Aλ .
λ∈Λ λ∈Λ λ∈Λ λ∈Λ
Exercı́cios
1. Prove que a relação ⊂ é uma relação transitiva, i.e., se A, B e C são conjuntos tais que A ⊂ B
e B ⊂ C, então A ⊂ C. Prove, dando um contra-exemplo, que a relação ∈ não é transitiva.
2. Sejam A, B e C conjuntos. Prove que
(a) Se B ⊂ A, então B ∪ C ⊂ A ∪ C e B ∩ C ⊂ A ∩ C.
(b) As operações ∩ e ∪ são comutativas e associativas:
A∩B=B∩A e A ∪ B = B ∪ A,
A ∩ (B ∩ C) = (A ∩ B) ∩ C e A ∪ (B ∪ C) = (A ∪ B) ∪ C.
3. Sejam A = {?} e B = {?, •}. Diga se as afirmações abaixo são falsas ou verdadeiras, e
justifique sua resposta:
(a) A ⊂ B (b) A ∈ B (c) ? ∈ A (d) • ⊂ B
4. Sejam A e B subconjuntos de um conjunto X. Prove que:
(a) A ∩ B = ∅ ⇐⇒ A ⊂ {X B ⇐⇒ B ⊂ {X A.
(b) A ∪ B = X ⇐⇒ {X B ⊂ A ⇐⇒ {X A ⊂ B.
(a) (A − C) − (B − C) = (A − B) − C, (b) (A − C) ∪ (B − C) = (A ∪ B) − C,
(c) (A − C) ∩ (B − C) = (A ∩ B) − C, (d) (A − B) − (A − C) = A ∩ (C − B),
(e) (A − B) ∪ (A − C) = A − (B ∩ C), (f) (A − B) ∩ (A − C) = A − (B ∪ C).
8. Sejam A e B conjuntos quaisquer. Prove que existe um único conjunto X que verifica as
igualdades A ∪ X = A ∪ B e A ∩ X = ∅ simultaneamente.
9. Sejam A = {0, 1, 2, {2}, 3} e B = {{1}, 1, 4}.
(a) Determine A ∪ B e A ∩ B.
(b) Diga se as afirmações abaixo são falsas ou verdadeiras, e justifique sua resposta:
•2∈A • {2} ∈ A • {2} ⊂ A
• {2, {2}} 6= {{2}, 2} • {2, {2}} ⊂ A •2⊂A.
10. Dados dois conjuntos A e B sua diferença simétrica é definida como sendo o conjunto
A∆B = (A − B) ∪ (B − A). Prove que A∆B = (A ∪ B) − (A ∩ B). Interprete a diferença simétrica
por meio de um desenho.
11. Sejam A e B conjuntos não vazios. Prove que, se (A×B)∪(B×A) = C×C, então A = B = C.
12. Sejam A, B ⊂ X e C, D ⊂ Y conjuntos. Prove que:
(a) (A × C) ∩ (B × D) = (A ∩ B) × (C ∩ D).
(b) (A × C) ∪ (B × D) ⊂ (A ∪ B) × (C ∪ D).
(d) (A ∪ B) × (C ∪ D) = (A × C) ∪ (B × D) ∪ (A × D) ∪ (B × C).
(e) {X×Y (B × D) = (({X B) × Y) ∪ (X × ({Y D)).
(e) Dê um contra-exemplo para mostrar que a igualdade em (b) nem sempre é verdadeira.
13. Designamos por N o conjunto dos números naturais N = {0, 1, 2, 3, . . .}. Dizemos que um
conjunto A é finito se podemos fazer uma correspondência entre os elementos de A e os ele-
mentos de um subconjunto de N da forma {1, 2, 3, . . . , n} para algum n ∈ N. Convencionamos
que o conjunto vazio é finito. Se A é um conjunto finito que se corresponde com o subconjunto
Os Inteiros
2.1 Notação
Este capı́tulo será dedicado a estudar as propriedades do conjunto Z dos números inteiros:
{Z Z− = Z − Z− = {0, 1, 2, 3, . . .}.
Dizemos que um número inteiro a ∈ Z tem sinal positivo, se a é positivo, isto é, a ∈ Z+ , e
dizemos que tem sinal negativo, se a é negativo, a ∈ Z− .
19
Os Inteiros 2.2 Operações
Dados a, b ∈ Z, dizemos que a e b têm o mesmo sinal quando ambos têm sinal positivo ou
ambos têm sinal negativo, isto é, ambos pertencem a Z+ ou ambos pertencem a Z− . Diremos
que a e b têm sinais contrários quando um deles é positivo e o outro é negativo.
2.2 Operações
No capı́tulo anterior estudamos algumas operações sobre conjuntos. Estas operações nos per-
mitiram construir, a partir de conjuntos dados, um novo conjunto. Nesta seção vamos introduzir
a noção de operação desde um ponto de vista global e depois enfocar a nossa atenção em
operações definidas no conjunto Z dos números inteiros.
Definição. Seja A um conjunto não vazio. Uma operação sobre A é uma lei que a cada par
ordenado de elementos de A faz corresponder um elemento de A. Se ? é uma operação em
A e (a, b) ∈ A × A, escrevemos ?(a, b) ou a ? b para designar o elemento de A determinado
ao aplicar a operação ao par ordenado (a, b). Dizemos que a ? b é o resultado de aplicar a
operação ? ao par ordenado (a, b) ∈ A × A.
Em sı́mbolos escrevemos
? : A × A −→ A
(a, b) 7−→ a ? b .
Por exemplo, consideremos um conjunto A = {α, β} contendo dois elementos. Definimos uma
operação ? : A × A −→ A mediante a seguinte tabela:
Nesta tabela, escrevemos a primeira coordenada dos pares ordenados
? α β
de A × A na coluna embaixo de ?, e a segunda coordenada na fila à
α α β
direita de ?. A primeira fila da tabuada se lee: α ? α = α, α ? β = β, e a
β β α
segunda fila β ? α = β e β ? β = α.
Neste exemplo observamos que, quaisquer que sejam x, y ∈ A tem-se x ? y = y ? x. Uma
operação verificando esta propriedade é chamada comutativa. Também, quaisquer que sejam
x, y, z ∈ A, vale x ? (y ? z) = (x ? y) ? z (verifique este fato!). Uma operação com esta propriedade
é chamada associativa. O elemento α de A tem a propriedade de que α ? x = x ? α = x, isto é,
α é um elemento neutro para a operação ?.
Sobre o conjunto Z dos números inteiros podemos definir muitas operações. As operações
de soma e de multiplicação, com as quais já estamos familiarizados, serão de fundamental
importância no resto deste capı́tulo:
A multiplicação de dois números inteiros a e b será também designada pela justaposição ab,
isto é, colocando um número após o outro. Esta terminologia deverá ser usada com cuidado,
por exemplo: 15 é o inteiro quinze e não 1 · 5. Por outro lado, se a ∈ Z, 2a se entende como 2 · a.
Da noção geral de operação, tem-se a seguinte regra que utilizaremos com freqüência:
• (i) se a = b então a + c = b + c ,
• (ii) se a = b então a · c = b · c .
Mais tarde voltaremos a falar sobre esta regra, ou mais especificamente, sobre a sua recı́proca
(vide as leis de cancelamento para adição e multiplicação).
Na prática fazemos uso das operações de soma e multiplicação, junto com uma série de pro-
priedades ou regras de manipulação, que na maioria dos casos aplicamos de maneira quase
automática sem reparar muito nos detalhes.
Com o objetivo de entender com mais detalhe a natureza destas operações e mesmo para en-
tender o por quê de alguns erros que se cometem com freqüência na prática, vamos apresentar
tais propriedades e fazer uma análise cuidadosa das conseqüências e fatos que delas se obtêm
.
• (1) Comutatividade:
• a + b = b + a para todo a, b ∈ Z,
• a · b = b · a para todo a, b ∈ Z.
• (2) Associatividade:
• (a + b) + c = a + (b + c) para todo a, b, c ∈ Z,
• (a · b) · c = a · (b · c) para todo a, b, c ∈ Z.
• (3) Distributividade:
• a · (b + c) = a · b + a · c para todo a, b, c ∈ Z,
• (a + b) · c = a · c + b · c para todo a, b, c ∈ Z.
Notação. Dados a, b ∈ Z, escrevemos a − b para significar a + (−b), isto é, a soma de a com
o simétrico de b. O número a − b se lê a menos b.
Observamos que a propriedade descrita no item (5) diz respeito apenas à operação de
soma. Dado a ∈ Z, o número −a ∈ Z é chamado o simétrico de a.
Como dito anteriormente, podemos definir várias operações sobre Z. Uma delas, com a
qual estamos bastante familiarizados é a operação diferença dada pela notação acima:
− : Z × Z −→ Z
(a, b) 7−→ a − b = a + (−b),
: Z × Z −→ Z
(a, b) 7−→ a b = 2 · a + b.
Muita atenção!!
• Observe que nós sabemos somar apenas dois elementos de cada vez. O que significa
então uma expressão tão conhecida como a + b + c onde a, b, c ∈ Z? Melhor dizendo,
faz sentido a expressão acima? De fato, mantendo a ordem em que a, b, c aparecem na
expressão só podemos operá-los como a + (b + c) ou (a + b) + c o que dá na mesma,
segundo a propriedade de associatividade da soma. É por esta razão que a + b + c faz
sentido. Se quisermos alterar a ordem em que a, b, c aparecem na expressão também
podemos fazê-lo, desta vez, lançando mão da propriedade de comutatividade.
a + b + c + d + e + f + g = (a + (b + (c + (d + (e + f))))) + g
= ((a + b) + (c + d)) + ((e + f) + g) = etc.
a · b · c · d · e · f · g = ((a · b) · (c · (d · (e · f)))) · g
= ((a · b) · (c · (d · (e · f)))) · g = etc.
Conseqüência 1. 0 · a = 0 = a · 0 , ∀a ∈ Z.
Conseqüência 2. (−1) · a = −a , ∀a ∈ Z.
a · (b − c) = a · b − a · c , ∀a, b, c ∈ Z.
De fato,
Conseqüência 4. a − b = 0 ⇐⇒ a = b.
A demonstração deste lema será feita mais tarde quando introduzirmos o conceito de divisi-
bilidade. Vamos agora utilizá-lo para demonstrar a lei do cancelamento para a multiplicação.
Desta definição temos que, se a ∈ Z∗ , então |a| é um inteiro positivo. Além disso,
|a| = 0 ⇐⇒ a = 0.
Exercı́cios
1. Calcule
(a) 2 − 2(3 − (−1)) + (−5 − 3(5 − 2(−1(2 − 4)))).
(b) −3 + (−3 − (4 − 2(1 − 2)2)(2 − 3(−1 + (−3 · 2 + 2))(−2))).
(c) −2 − |2(−2 + (5 − 2(3 − | − 4|)))| − | − |3 − |2| | − 1| |.
4. Determinar três inteiros, sabendo que a soma do primeiro com o segundo é 32, a soma do
segundo com o terceiro é 36 e a soma do primeiro com o terceiro é 34.
Respostas propostas.
(i) Não varia.
(ii) Aumenta de 5.
(iii) Diminui de 8.
(iv) Dobra.
(v) Fica multiplicada por 15.
(vi) Triplica.
(vii) Fica multiplicada por 4.
(viii) Aumenta de 8.
6. Um filho tem 11 anos e sua mãe 35 anos. Daqui a quantos anos a idade da mãe será o triplo
da idade do filho.
7. A idade de duas pessoas somam 120 anos. Subtraindo-se 10 anos da idade da mais velha e
acrescentando-os à da mais moça, as idades tornam-se iguais. Qual a idade de cada uma?
8. Um rádio e uma televisão custam juntos R$ 1.500,00. Comprando apenas o rádio me sobraria
R$ 200,00mas para adquirir a televisão precisava ter mais R$ 300,00 do que possuo. Quanto
custou o rádio, a televisão e quanto possuo?
9. Duas cidades A e B distam 200 km. Às 8 horas, parte de A para B, um trem com velocidade
de 30 km por hora e, duas horas depois, parte de B para A um outro trem com velocidade de 40
km por hora. A que distância de A, dar-se-á o encontro dos trens?
11. Use o Lema 2.2.1 para mostrar que se a, b, c ∈ Z são tais que abc = 0 então ou a = 0 ou
b = 0 ou c = 0.
13. Use a lei de cancelamento da multiplicação para determinar todas as soluções inteiras das
equações:
(i) 2a = 2, (ii) 2a = a, (iii) ab = b.
16. Mostre que o Lema 2.2.1 usado para demonstrar a lei do cancelamento para a multiplicação
é de fato equivalente a tal lei, i.e., mostre que a lei implica o lema e que o lema implica a lei.
Aliás, esta última parte nós já fizemos.
17. Sejam a, b ∈ Z. Mostre que |a| = |b| se, e somente se, a = b ou a = −b.
a = b =⇒ a2 = ab =⇒ a2 − b2 = ab − b2 =⇒ (a − b)(a + b) = (a − b)b.
Definição:
• a0 = 1 para todo a ∈ Z∗
• ak = a . . · a} para todo a ∈ Z e k ∈ N∗ .
| · .{z
k vezes
1. am+n = am · an
2. (a · b)n = an · bn
3. (an )m = an·m
Exercı́cios
(a − 1)(a + 1) = 0 ⇐⇒ a + 1 = 0 ou a − 1 = 0 ⇐⇒ a = −1 ou a = 1. C.Q.D.
6. Use uma das leis de cancelamento para demonstrar que se a2 = 0 com a ∈ Z então a = 0.
(g) a4 − 16 = 0.
(a − b)a = (a − b)(b + c) =⇒ a2 − ab = ab + ac − b2 − bc =⇒ a2 − ab − ac = ab − b2 − bc
=⇒ a(a − b − c) = b(a − b − c).
Muitas vezes temos necessidade de considerar somas com um grande número de parcelas,
ou somas com um número n de termos, onde n é um inteiro positivo qualquer. Por exemplo,
a1 + a2 + a3 + a4 + a5 + a6 + a7 + a8 + a9 + a10 ,
b1 + b2 + . . . + b7 ,
b1 + . . . + b8 + b9 ,
c1 + . . . + cn , onde n ∈ Z+ ,
a0 + a1 + . . . + ak , onde k ∈ N .
X
n
ai (lê-se somatório de ai variando i de 1 até n)
i=1
X
n+1
ai = a0 + a1 + . . . + an+1 , onde n ∈ Z+ ,
i=0
X
k
bj = b2 + . . . + bk , onde k ∈ {2, 3, 4, . . .},
j=2
X
m+2
ck = c−4 + c−3 + . . . + cm + cm+1 + cm+2 , onde m ∈ Z+ ,
k=−4
X
p
a2n = a0 + a2 + a4 + . . . + a2(p−1) + a2p , onde p ∈ Z+ .
n=0
Note que cada uma das quatro últimas somas possui um número mı́nimo de termos e um
número total (não confundir com máximo) de termos: a primeira delas possui no mı́nimo 3
termos e um total de n + 2 termos, a segunda possui um mı́nimo de 1 termo e um total de k − 1
termos, a terceira possui um mı́nimo de 8 termos e um total de ...
Atenção! Ainda com relação às últimas quatro somas, é importante você perceber que, na
primeira delas, o resultado da adição de suas parcelas depende de n mas não de i, na segunda
o resultado depende de k mas não de j, na terceira o resultado depende de m mas não de k, e
na quarta o resultado depende de p e não de n.
X
n−1
an − bn = (a − b) an−1−i · bi .
i=0
X
n−1
an−1−i · bi = an−1 b0 + an−2 b1 + an−3 b2 + . . . + a2 bn−3 + a1 bn−2 + a0 bn−1 .
i=0
X X X
n−1 n−1
! n−1
!
(a − b) an−1−i · bi = a · an−1−i · bi − b · an−1−i · bi
i=0 i=0 i=0
n 0 n−1 1 n−2 2
= (a b + a b +a b + . . . + a3 bn−3 + a2 bn−2 + a1 bn−1 )
−(an−1 b1 + an−2 b2 + an−3 b3 + . . . + a2 bn−2 + a1 bn−1 + a0 bn )
= an b0 − a0 bn = an − bn ,
X
n
n
n
(a + b) = ak bn−k ,
k=0
k
n
onde é o número de combinações de n elementos k à k.
k
Veremos mais tarde uma fórmula para a combinação de n elementos k à k mas, você pode
concluir com facilidade que:
1. combinar n elementos 0 à 0 só podemos faze-lo através da coleção com zero elementos,
isto é, da coleção vazia, e então
n
= 1,
0
Exercı́cios
2. Qual o número mı́nimo de parcelas que poderá ocorrer em cada uma das expressões do
exercı́cio anterior?
X
2n
(b) (−1)i · ai+1 , onde n ∈ N,
i=0
X
n−1
(c) δk+2 , onde n ∈ N.
k=−4
4. Qual o número mı́nimo de parcelas que poderá ocorrer em cada uma das expressões do
exercı́cio anterior?
X
n X
n−1
(d) a i = a0 + ai+1 ,
i=0 i=0
X
n
n
(e) = 2n ,
i=0
i
X
n
n k
(f) (−1) = 0.
k=0
k
6. Mostre que
X
n X
n X
n
(a) (ai + bi ) = ai + bi ,
i=0 i=0 i=0
X
n X
n
(b) (c · ai ) = c ai ,
i=0 i=0
X
n
(c) (ai − ai−1 ) = an − a0 .
i=1
X
100 X
100
2
(a) n = n2 ,
n=0 n=1
X
n X
n
(b) (1 + k) = 1 + k, onde n ∈ Z+ ,
k=0 k=0
X
n X
n−1
(c) (i + 1)4 = i4 , onde n ∈ Z+ ,
i=1 i=0
X
n X
n−s
(d) k2 = (j + s)2 .
k=1 j=1−s
8. Mostre que
Xn−1 X
n−1
n
= (n − k) = n(n − 1) − k,
2 k=1 k=1
Representações gráficas:
reta sem orientação
←−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−reta
−−anterior com orientação oposta
Uma reta sobre a qual fixamos uma orientação (i.e. um sentido de percurso) será dita uma
reta orientada. Assim, uma reta orientada é constituı́da de dois ingredientes: da reta e da
orientação escolhida sobre ela.
Os três pontinhos colocados à direita e à esquerda nas representações gráficas acima ser-
vem apenas para indicar que estamos representando graficamente uma parte da reta ou da reta
orientada. Daqui para frente vamos propositadamente esquecê-los, não esquecendo no entanto
que estamos representando graficamente uma parte da reta ou da reta orientada.
Numa reta orientada podemos falar em pontos à direita (resp. à esquerda) de um ponto
dado, da seguinte maneira.
Seja P um ponto de uma reta orientada. Os pontos à direita de P são aqueles que podem
ser atingidos a partir de P, seguindo o sentido de percurso fixado. Os pontos à esquerda são
aqueles que podem ser atingidos a partir de P, seguindo o sentido de percurso oposto àquele
fixado.
pontos à direita de P
−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−◦−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−→
P reta orientada
pontos à esquerda de P
Pois bem, fixemos em definitivo uma reta orientada r, um ponto arbitrário O sobre ela (cha-
mado de origem) e um segmento de reta u (dito, unidade de comprimento).
−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−→
O u r
(segmento de reta)
| {z }
unidade de comprimento
Agora, vamos inserir os números inteiros na reta orientada, colocando o número 0 (zero) na
origem, os inteiros positivos à direita da origem e os inteiros negativos à esquerda da origem,
como mostrado na figura a seguir.
u u u u u u u u
z }| { z }| {z }| {z }| {z }| {z }| {z }| { z }| {
−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−−·−·−·−−−−−−−−−−−−−−−−→
· · · · · · · · ·
−n −n + 1 −3 −2 −1 0 1 2 3 (n − 1) n r
Isto é feito da seguinte maneira:
1 e −1 são colocados à uma unidade da origem,
2 e −2 são colocados à 2 unidades da origem,
3 e −3 são colocados à 3 unidades da origem,
.. .. ..
. . .
n e −n são colocados à n unidades da origem, para cada n ∈ Z+ .
1. a + b (na reta orientada) foi obtido de a (na reta orientada) pela translação à direita de b
unidades, ou simplesmente, a + b foi obtido transladando a de b,
2. a − b (na reta orientada) foi obtido de a (na reta orientada) pela translação à esquerda de
b unidades, ou simplesmente, a − b foi obtido transladando a de −b.
ii. dado um ponto P da reta orientada, existe n0 ∈ Z− tal que n0 está à esquerda de P.
P
−−−−−−−−−−−◦−−−−−−−−−−−−•−−−−−−−−−−→
n0 ∈ Z−
Exemplos.
a. O conjunto N é limitado inferiormente. Para ver isso, fixe um ponto P da reta, à esquerda
da origem. Neste caso, todo elemento de N está à direita de P, o que mostra que N é
limitado inferiormente.
b. O conjunto Z+ não é limitado superiormente, pois, já vimos que dado um ponto Q das reta
orientada sempre existe um inteiro positivo à sua direita.
d. O conjunto Z não é limitado inferiormente nem superiormente. Isto segue do fato que dado
um ponto P sempre existem inteiros à direita e à esquerda de P.
Exercı́cios
1. Diga se é falso ou verdadeiro e justifique sua resposta.
(a) O conjunto dos inteiros não positivos é limitado inferiormente,
(b) O conjunto dos inteiros não negativos é limitado inferiormente.
(b) Dado um ponto P da reta orientada existe um inteiro n0 ∈ Z+ tal que n0 − 5 está à direita de
P,
(c) Dado um ponto P da reta orientada existe um inteiro n0 ∈ Z+ tal que n0 +100 está à esquerda
de P.
4. Seja P um ponto da reta orientada e M ∈ Z. Mostre que existe n0 ∈ Z+ tal que n0 − M está
à direita de P.
6. Nesta seção, nós definimos o que significa um subconjunto de Z ser limitado superiormente.
Colocamos agora uma nova definição: Dizemos que um subconjunto não vazio A ⊂ Z é limitado
superiormente quando existe um número inteiro N tal que todo elemento de A está à esquerda
de N.
Mostre que a definição antiga e a nova são de fato equivalentes, isto é, mostre que todo sub-
conjunto não vazio de Z que é limitado superiormente em relação a uma das definições também
será limitado superiormente em relação à outra.
Definição. Sejam a, b ∈ Z. Diremos que a é menor que b (notação a < b) quando a está
à esquerda de b na reta orientada. Equivalentemente, diremos que a é maior que b (notação
b > a) quando b está à direita de a.
Neste contexto, os inteiros positivos são aqueles que são maiores do que zero e os inteiros
negativos são aqueles que são menores do que zero.
Esta forma de comparação entre elementos de Z, introduzida pela definição acima, será dita
relação de ordem.
Observe que, definida a relação “ < ”ao definir a relação “ > ”não introduzimos nada de novo,
a não ser uma nova notação. Dizer que b > a é, exatamente, dizer que a < b.
A relação de ordem que acabamos de introduzir tem algumas propriedades fundamentais
que utilizaremos com muita freqüência, sem demonstração.
De posse destas propriedades podemos demonstrar com facilidade os seguintes lemas que
nos são muito familiares.
Demonstração. Suponhamos então que a e b são ambos positivos. Como b é positivo, multipli-
cando ambos os membro da desigualdade a > 0 por b, obtemos
e a demonstração do caso (i) está terminada. A demonstração do caso (ii) é uma repetição da
demonstração do caso (i). C.Q.D.
Lema 2.6.2. Se a, b ∈ Z∗ têm sinais contrários (i.e. se um é positivo e o outro é negativo) então
a · b < 0.
Demonstração. Para demonstrar este lema basta considerar o caso em que a > 0 e b < 0.
Admitamos pois este fato. Como b é positivo, multiplicando ambos os membros da desigualdade
a < 0 por b, obtemos
a < 0 =⇒ a · b < 0 · b =⇒ a · b < 0,
Lema 2.6.3 Sejam a, b ∈ Z tais que a · b > 0. Então, ou ambos são positivos, ou ambos são
negativos.
Lema 2.6.4 Sejam a, b ∈ Z tais que a · b < 0. Então a e b têm sinais contrários.
Vamos agora falar de uma nova e importante propriedade da qual dotamos o conjunto dos
números inteiros ao inserı́-lo na reta orientada, como descrito na seção 2.5. Esta propriedade
diz o seguinte:
Seja A um subconjunto não vazio de Z que é limitado inferiormente. Então, existe um ele-
mento a0 ∈ A com a seguinte propriedade: todo elemento do conjunto A, distinto do elemento
a0 , é maior do que a0 .
O elemento a0 é dito o menor elemento (ou mı́nimo) do conjunto A e é denotado por min(A).
Analogamente,
Seja A um subconjunto não vazio de Z que é limitado superiormente. Então, existe um
elemento b0 ∈ A com a seguinte propriedade: todo elemento do conjunto A, distinto do elemento
b0 , é menor do que b0 .
O elemento b0 é dito o maior elemento (ou máximo) do conjunto A e é denotado por max(A).
Exemplos.
(a) O conjunto Z+ tem como menor elemento o número 1. O conjunto Z+ não tem maior
elemento pois não é limitado superiormente.
(b) O conjunto Z− tem como maior elemento o número −1. O conjunto Z− não tem menor
elemento pois não é limitado inferiormente.
(c) O conjunto Z não tem menor elemento nem maior elemento.
Exemplos.
1. Considere o caso em que A = Z. Assim, dado um ponto P da reta orientada temos
elementos de A à direita e à esquerda de P. Se P é um ponto da reta que não representa um
número inteiro, então P está entre dois inteiros consecutivos n0 e n0 + 1, onde o primeiro é o
inteiro mais próximo de P pela esquerda e o segundo é o inteiro mais próximo de P pela direita.
É importante lembrar que o inteiro n0 depende de P.
2. O que fizemos no exemplo anterior pode ser feito com um subconjunto qualquer A ⊂ Z
que tenha a seguinte propriedade: dado um ponto P da reta existem elementos de A à direita e à
esquerda de P. Neste caso, o conjunto Adir(P) é não vazio e limitado inferiormente, similarmente
Adir(P) é não vazio e limitado superiormente. Conseqüentemente, podemos falar no primeiro
elemento de A à direita de P e no primeiro elemento de A à esquerda de P. Em particular, dado
n ∈ Z podemos falar no primeiro elemento de A à esquerda de n e no primeiro elemento de A
à direita de n.
Antes de seguir adiante você deve tentar resolver alguns exercı́cios desta seção.
Propriedades da relação “ ≤ ”.
• Sejam a, b, c ∈ Z. (1) a ≤ a,
(2) se a ≤ b e b ≤ a então a = b,
(3) se a ≤ b e b ≤ c então a ≤ c (transitividade),
(4) a ≤ b ou b ≤ a (dois elementos quaisquer são comparáveis),
(5) se a ≤ b então a + c ≤ b + c,y
(6) se a ≤ b e c > 0 então ac ≤ bc,
(7) se a ≤ b e c < 0 então ac ≥ bc.
• Além disso, segue das propriedades acima que
(8) 0 < a ≤ b =⇒ 0 < an ≤ bn , quando n ∈ N.
1 = ab = (1 + n)(1 + m) = 1 + m + n + mn > 1,
(−a)(−b) = ab = 1.
Este teorema nos diz que a equação xy = 1 , analisada no universo dos números inteiros,
apresenta apenas duas soluções: a solução x = 1 e y = 1 e a solução x = −1 e y = −1.
Veremos mais tarde que a mesma equação, analisada no universo dos números racionais, terá
uma infinidade de soluções.
Este corolário descreve uma propriedade importante das potências naturais de números
inteiros que não foi citada na secção 2.3.
De pose da relação de ordem podemos reescrever a definição de valor absoluto de um
número inteiro a da seguinte forma:
a, se a ≥ 0
|a| =
−a , se a < 0 .
Exercı́cios
3. Considere os conjuntos:
(a) A = {2n ; n ∈ Z e n ≥ 0}
(b) B = {4n ; n ∈ Z e n ≥ 0}
(c) C = {4n + 3 ; n ∈ Z e n ≥ 0}
(d) D = {3n + 1 ; n ∈ Z e n ≥ 0}
(e) E = {2n (−1)n ; n ∈ Z e n ≥ 0}
Descreva A ∩ B, C ∩ D, A ∩ E, A ∪ E e C ∪ D.
4. Para cada uma das inequações abaixo, determine o subconjunto dos números inteiros que a
satisfaz.
(a) x + 2 < 2x + 1,
(b) x − (2 − x) > 2x + 1,
(c) x − 2(x − 1) > 2 − (1 + x).
9. Use o Teorema 2.6.6 para concluir que se a, b ∈ Z são tais que ab = −1 então a = 1 = −b
ou a = −1 = −b.
18. Sejam a1 , a2 , . . . , an ∈ N tais que a1 ·a2 ·. . .·an = 1. Mostre que ai = 1 para todo i ∈ {1, . . . , n}.
X
n
19. Sejam a1 , a2 , . . . , an ∈ N tais que ai = 0. Mostre que ai = 0 para todo i ∈ {1, . . . , n}.
i=1
20. Mostre que todo subconjunto não vazio de Z+ (resp. de Z− ) possui um menor elemento
(resp. um maior elemento).
Uma idéia muito interessante e sutil que segue das noções que acabamos de introduzir, ou
mais especificamente, da representação dos inteiros na reta orientada, é a seguinte:
Considere a sucessão 1, 2, 3, . . . constituı́da de todos os inteiros positivos, colocados em
ordem crescente, e seja P um ponto da reta orientada. Vimos, como propriedade da nossa
representação, que existe n0 ∈ Z+ tal que n0 está à direita de P. Conseqüentemente, todo
inteiro n > n0 estará à direita de P.
Ou seja, a sucessão 1, 2, 3, . . . tem a seguinte propriedade:
Vamos mostrar que esta sucessão tem uma propriedade semelhante àquela da sucessão
1, 2, 3, . . . , n, . . .:
Antes de mostrar esta propriedade, vamos mostrar que 2n > n para todo n ∈ Z+ .
Utilizando o binômio de Newton, obtemos:
X
n
n X
n
n
n n i n−i
2 = (1 + 1) = 1 ·1 =
i=0
i i
i=0
n n n n
= + + ... + +
0 1 n−1 n
n n
≥ + = 1 + n > n.
0 1
Fixemos agora um ponto P na reta orientada, e seja n0 ∈ Z+ à direita de P. Então:
Neste tipo de questão, dado um ponto P qualquer da reta, precisamos achar n0 satisfazendo
a uma determinada condição. Até agora, dado o ponto P, nos parece que determinar o inteiro
n0 é fácil, basta tomá-lo à direita de P, o difı́cil é mostrar que n0 vai servir para o que queremos.
Engano! Regra geral, temos dois problemas não triviais neste tipo de questão: determinar
um inteiro que tenha chances reais de satisfazer a condição, e depois mostrar que de fato, ele
satisfaz a condição. A dificuldade vem do fato que o inteiro n0 depende de P e, evidentemente,
da sucessão que estamos estudando.
Antes de estabelecer a próxima definição, façamos mais um exemplo.
O problema agora é determinar n0 ∈ Z+ tal que 2n0 + c está à direita de P. Uma maneira de
fazer isto é a seguinte: Seja m0 um inteiro à direita de P e consideremos um inteiro positivo n0
tal que n0 > m0 − c (isto é, n0 + c > m0 ). Como n0 ≥ 1 temos:
Este exemplo serve para mostrar que a determinação do inteiro n0 nem sempre é trivial.
Estamos agora em condição de entender a seguinte definição:
Definição. Seja an , com n ∈ Z+ , o termo geral de uma sucessão de números inteiros. Diremos
que o limite de an quando n tende a ∞ e escrevemos lim an = ∞, quando dado um ponto P
n→∞
da reta orientada, existe n0 ∈ Z+ tal que
Definição. Seja an , com n ∈ Z+ , o termo geral de uma sucessão de números inteiros. Dizemos
que lim an = ∞ quando: dado K ∈ Z+ , existe n0 ∈ Z+ tal que n > n0 =⇒ an > K.
n→∞
De fato, estas duas definições são equivalentes. Isto vem do fato que dado um ponto P da
reta orientada, sempre existe um inteiro positivo depois dele.
Daqui para frente estaremos utilizando apenas esta segunda definição
a sucessão de inteiros a1 , a2 , . . . , an . . ..
Similarmente, a sucessão a0 , a1 , . . . , an , . . . se designa por {an }n∈N , ou {an }∞
n=0 , ou ainda
{an }n≥0 .
Exercı́cios
1. Mostre que
(a) lim n! = ∞, onde n! = 1 · 2 · . . . · n para todo n ∈ Z+ (define-se também 0! = 1).
n→∞
(b) lim n3 = ∞.
n→∞
(d) lim nn = ∞.
n→∞
2. Seja {an }n∈Z+ uma sucessão de inteiros que tende a ∞ quando n −→ ∞. Mostre que existe
k0 ∈ Z+ tal que ak ≥ 1 para todo k > k0 .
3. Considere sucessões de números inteiros {an }n≥1 e {nn }n≥1 tais que, an ≤ bn para todo
n ∈ Z+ . Mostre que, se lim an = ∞ então lim bn = ∞. Interprete este fato na reta orientada.
n→∞ n→∞
5. Seja a ∈ Z tal que a > 1. Mostre que lim an = ∞, isto é, dado K ∈ Z+ , existe n0 ∈ Z+ tal
n→∞
que an > K para todo n > n0 . Mostre que a hipótese a > 1 é essencial.
6. Mostre que lim n = ∞. Isto é, mostre que dado K ∈ Z+ existe n0 ∈ Z+ tal que n > K para
n→∞
todo n > n0 .
10. Seja a ∈ Z tal que a ≥ 1. Mostre que lim an = ∞, isto é, dado K ∈ Z+ , existe n0 ∈ Z+ tal
n→∞
que an > K para todo n > n0 .
11. Inspirado nas últimas definições e exercı́cios dê sentido (isto é, faça uma definição ade-
quada) aos itens abaixo:
• lim an = −∞,
n→∞
• lim an = ∞,
n→−∞
• lim an = −∞.
n→−∞
12. Sejam {an }n∈Z e {bn }n∈Z sucessões tais que lim an = ∞ e lim bn = −∞. Mostre que
n→∞ n→∞
lim an bn = −∞.
n→∞
13. Sejam {an }n∈Z e {bn }n∈Z sucessões tais que lim an = ∞ e1 ≤ bn ≤ K para todo n ∈ Z+ ,
n→∞
onde K ∈ Z+ é um inteiro fixo. Mostre que lim an bn = ∞.
n→∞
14. Seja {an }n∈Z+ uma sucessão de inteiros. Mostre que, se lim an = ∞, então:
n→∞
Exercı́cios
1. Mostre que:
(a) 6 + 2(2n − 1) é par, qualquer que seja n ∈ Z.
(b) 2(n + 1) + 3 é ı́mpar para cada n ∈ Z.
(c) a soma de dois números pares é um número par.
(d) a soma de dois números ı́mpares é um número par.
(e) a ∈ Z é par (resp. ı́mpar) se, e somente se, o algarismo das unidades de a é par (resp.
ı́mpar).
6. Quais algarismos da unidade podem ocorrer em potências naturais do número 8? Idem para
o número 3. Idem para o número 21. Idem para o número 1010 + 2.
a
A notação = k significa que b é não nulo, que b divide a e que o inteiro k é o quociente
b
da divisão de a por b.
a
Quando b 6= 0, escrever a = k · b é equivalente a escrever = k.
b
Note-se que, se a, b ∈ Z, dizer que b não divide a (escrevemos b 6 | a, por simplicidade)
significa que, ou bem b = 0 ou bem a 6= k · b qualquer que seja k ∈ Z.
Cuidado! Por enquanto, conhecendo apenas o universo dos números inteiros, não podemos
a a
sair por ai dizendo que sempre faz sentido. A notação só faz sentido quando a é um inteiro
2 2
a
par (i.e. um múltiplo de dois). Da mesma forma só faz sentido quando a é um múltiplo de 3.
3
É exatamente isto o que é dito no parágrafo anterior:
a
quando b 6= 0, faz sentido se, e somente se, a é múltiplo de b.
b
É de fácil verificação que para todo inteiro não nulo b temos que
0 b
= 0 já que 0 = 0 · b e = 1 já que b = 1 · b.
b b
. . . < −4b < −3b < −2b < −b < 0 < b < 2b < 3b < 4b < . . .
Isto é feito multiplicando por b a ordenação que construı́mos ao representar Z na reta orien-
tada:
. . . < −4 < −3 < −2 < −1 < 0 < 1 < 2 < 3 < 4 < . . .
Propriedades da divisão.
• Sejam a, b, c ∈ Z.
−a a
(3) se c divide a então c divide −a e temos =− ,
c c
ab a
(4) se c divide a então c divide ab e temos = ·b,
c c
a b a b
(5) se c divide a e b e se a < b então < quando c > 0, e > quando c < 0.
c c c c
É consequência fácil das propriedades (2) e (3) acima que: (6) se c divide a e b então c
a−b a b
divide a − b e temos = − .
c c c
Com a introdução destes novos conceitos podemos demonstrar o lema abaixo que já foi
anteriormente enunciado.
Demonstração. Suponhamos que a e b são não nulos. Assim, sendo b 6= 0 podemos concluir
que cada membro da equação a · b = 0 é divisı́vel por b. Efetuando esta divisão obtemos:
a·b 0
a= = =0
b b
o que contradiz o fato que a é não nulo. C.Q.D.
Na primeira vez que abordamos este lema (quando da lei de cancelamento para a multiplicação)
ele parecia de difı́cil demonstração. Agora, depois de estabelecido o conceito de divisibili-
dade, a demonstração ficou extremamente simples. Isto dá uma pequena amostra do valor
das definições realmente importantes em matemática: elas guardam em si uma idéia.
Finalizaremos este tópico com os seguintes lema.
Demonstração. Como b ∈ Z+ segue que b ≥ 1. Por outro lado, como b divide a segue que
a = kb onde k ∈ Z+ . Suponhamos, agora, que b > a. Multiplicando ambos os membros por k
obtemos a = kb > ka ≥ a , concluindo daı́ que a > a, o que é um absurdo. Logo, b ≤ a. C.Q.D.
Exercı́cios
1. Diga se as afirmações abaixo são falsas ou verdadeiras e justifique suas respostas.
(a) 10 é múltiplo de -2,
(b) 2 é múltiplo de 10,
(c) todo número inteiro é múltiplo de 1,
(d) todo número inteiro é múltiplo de -1,
(e) todo múltiplo de 5 é ı́mpar,
(f) todo número par é divisı́vel por 2,
(g) se a é múltiplo de 3 então an é múltiplo de 9 para todo n ≥ 2.
2. A diferença de dois números inteiros é 288 e o seu quociente é 5. Quais são os dois números?
3. Mostre que todo inteiro cujo algarismo das unidades (da sua expressão decimal) é 0, é um
número par e divisı́vel por 5.
Exemplos. • 10 = 3 · 3 + 1
isto é, dividindo 10 por 3 obtivemos 3 como quociente e 1 (0 ≤ 1 < 3) como resto,
• 17 = 0 · 20 + 17
isto é, dividindo 17 por 20 obtivemos 0 como quociente e 17 (0 ≤ 17 < 20) como resto,
• 170 = 56 · 3 + 2
isto é, dividindo 170 por 3 obtivemos 56 como quociente e 2 (0 ≤ 2 < 3) como resto.
Multiplicando a igualdade acima por −1 obtemos,
• −170 = (−56) · 3 − 2
isto é, dividindo −170 por 3 obtivemos −56 como quociente e −2 como resto.
Cuidado com esta última frase! Ela não está errada. Você apenas não respeitou a
condição imposta sobre o resto no algoritmo de Euclides. Para fazer a divisão segundo o al-
goritmo, devemos escrever:
Agora, podemos dizer, seguindo o algoritmo de Euclides, que dividindo −170 por 3 obtemos −57
como quociente e 1 como resto.
Exemplos. • 10 = 2 · 3 + 4
isto é, dividindo 10 por 3 obtivemos 2 como quociente e 4 como resto (esta não é a divisão do
Euclides),
• 23 = (−7) · 3 + 44
isto é, dividindo 23 por 3 obtivemos −7 como quociente e 44 como resto (esta não é a divisão do
Euclides).
Atenção! Daqui para frente sempre que falarmos em quociente e resto de divisão de inteiros
estaremos entendendo que se trata daqueles referidos no algoritmo de Euclides. Esta é uma
convenção que estaremos sempre respeitando.
Para terminar este tópico falta ainda colocar uma questão importante. Sabemos que fora
da convenção feita acima, dados dois inteiros existem várias maneiras de se obter quocientes e
restos diferentes:
13 = 7 · 2 − 1 13 = 1 · 2 + 11 13 = 2 · 2 + 9 13 = 6 · 2 + 1
O que nos garante que adotando o algoritmo de Euclides, todos obterão os mesmos quo-
ciente e resto, numa divisão de dois inteiros dados? Essencialmente, estamos questionando a
unicidade do quociente e do resto no algoritmo de Euclides...
Teorema (de unicidade). Nas condições do teorema anterior, o quociente q e o resto r são
únicos.
a = q1 · b + r1 com 0 ≤ r1 < b
a = q2 · b + r2 com 0 ≤ r2 < b
Caso 1: r1 > r2 .
Como 0 ≤ r1 , r2 < b segue que 0 < r1 − r2 < b.
Por outro lado, temos que
Agora podemos concluir que 0 < (q2 − q1 ) · b < b. Dividindo ambos os membros por b
obtemos 0 < q1 − q2 < 1. Isto nos mostra que o inteiro q1 − q2 está entre os inteiros 0 e 1, o
que é absurdo, já que na representação dos inteiros na reta orientada não colocamos nenhum
inteiro entre 0 e 1.
Desta forma concluı́mos que o caso r1 > r2 de fato não ocorre.
Caso 2: r2 > r1 .
Similarmente ao caso anterior prova-se que este caso também não ocorre.
A demonstração está terminada. C.Q.D.
. . . < −3b < −2b < −b < 0 < b < 2b < 3b < . . .
Além disso, já vimos (na seção 2.6) que dado a ∈ Z existe n0 ∈ Z+ tal que n0 b ≤ a < (n0 + 1)b
ou, equivalentemente, 0 ≤ a − n0 b < b. Assim, a = n0 b + (a − n0 b), onde 0 ≤ a − n0 b < b.
Isto é, dados a e b como no inicio, existem n0 , r ∈ Z tais que a = n0 b + r com 0 ≤ r < b, e a
demonstração está terminada. C.Q.D.
Exercı́cios
1. Determine:
(a) o quociente e o resto da divisão de 190 por 7. Idem para −190.
(b) o quociente e o resto da divisão de −205 por 8.
(c) o resto da divisão de 15.7321997 por 4.
(d) o resto da divisão de 1.254380 por 9.
2. Determine:
(a) o menor inteiro positivo que dividido por 6 dá resto 3 e dividido por 8 da resto 7.
(b) o menor inteiro positivo que deve ser somado a 8.746 para obter um múltiplo de 11 aumentado
de quatro unidades.
(c) o maior inteiro positivo pelo qual se deve dividir 1.233 e 511 para se obter os restos 9 e 7,
respectivamente.
(d) o menor inteiro que admite exatamente 15 divisores inteiros positivos.
4. Mostre que um número é ı́mpar se, e somente se, ele não é divisı́vel por 2.
2.11 Fatoração
Fatorar um número inteiro positivo é escrevê-lo como produto de um número finito de inteiros
positivos distintos da unidade.
Podem existir muitas fatorações para um dado inteiro positivo, por exemplo o número 12
pode ser fatorado como 12 = 2 · 6 = 3 · 4 = 4 · 3 = 2 · 2 · 3. No entanto existe uma fatoração com
uma propriedade muito especial e que é a única verificando tal propriedade: a decomposição
em fatores primos.
Para enunciar este teorema de decomposição precisamos da seguinte definição.
Definição. Um inteiro p > 1 é dito um número primo se os únicos inteiros positivos que o
dividem são 1 e p.
Teorema 2.11.1. (de decomposição em fatores primos). Qualquer inteiro a > 1 pode ser
fatorado de modo único como a = pα1 1 pα2 2 . . . pαs s onde p1 < p2 < . . . < ps são números primos e
αi é um inteiro positivo para cada i ∈ {1, . . . , s}.
Aqui estamos diante de mais um teorema de existência e unicidade. O teorema diz, primeiro:
todo inteiro a > 1 se decompõe de uma maneira especial, e segundo: tal decomposição é feita
de “modo único”. Isto quer dizer o seguinte:
Se a > 1 se decompõe como no enunciado do teorema e também como a = qβ1 1 qβ2 2 . . . qβr r ,
onde q1 < q2 < . . . < qr são inteiros primos e βj ∈ Z+ para todo j ∈ {1, 2, . . . , r} então,
s = r, qi = pi , e βi = αi , para todo i ∈ {1, 2, . . . , s}.
Observamos também, que dizer que um inteiro a > 1 não possui divisores primos, é o
mesmo que dizer que ele é primo.
Embora a prova do teorema de decomposição em fatores primos não seja sofisticada, ela
requer de metodologias que vão além do escopo elementar destas notas. O leitor ávido pode
ler a prova no livro de I.N. Herstein “Tópicos de ´Álgebra” (teorema 1.3.1).
Proposição 2.11.2. Um inteiro n > 1 é primo se, e somente se, nenhum primo p tal que p2 ≤ n
é divisor de n.
Demonstração. Se n > 1 é primo então os seus únicos divisores são 1 e o próprio n. Logo,
nenhum primo p tal que p2 ≤ n é divisor de n.
Reciprocamente, suponhamos que nenhum primo p tal que p2 ≤ n é divisor de n.
Suponhamos, pelo absurdo, que n não seja primo.
Pelo teorema anterior, n possui divisores primos. Seja p um deles.
Então:
p2 > n e n = p · k, para algum k ∈ Z+ , k > 1.
O primeiro fato a observar é que p não divide k: Com efeito, se p for divisor de k então,
k = l · p para algum l ∈ Z+ .
Logo n = k · p = (l · p) · p = l · p2 ≥ p2 > n, o qual é absurdo.
Portanto n não pode ter divisores primos, isto é, n é primo. C.Q.D.
Exemplos.
• O inteiro 79 é primo: Com efeito, vemos que 2, 3, 5 e 7 não são divisores de 79 e não precisa-
mos testar mais, pois 112 = 121 > 79.
• O inteiro 347 é primo: Fazendo a divisão do algoritmo de Euclides vemos que:
• isto é, 347 não é divisı́vel pelos primos 2, 3, 5, 7, 11, 13, 17, o seguinte primo é 19, mas
192 = 361 > 347. Logo, pela proposição, 347 é primo.
Exercı́cios
1. Faça a decomposição em fatores primos de
(a) 2k + 2k+1 onde k ∈ N∗ (b) 2k · 3k+1 + 6k onde k ∈ N∗
(c) 4k+1 − (2k )2 onde k ∈ N∗ (d) (125 )k onde k ∈ N∗ .
2. A soma de dois números primos distintos é um número primo? Justifique sua resposta.
6. Seja a > 1 um inteiro cuja decomposição em fatores primos é dada por a = pα1 1 pα2 2 . . . pαs s
onde p1 < p2 < . . . < ps são números primos e cada αi é um inteiro positivo para cada i ∈
{1, . . . , s}. Quantos divisores positivos o número a tem?
9. Dentre os seguintes inteiros, diga quais são primos e ache a decomposição em fatores primos
daqueles que não são primos:
541 , 871 , 89 , 381 , 1.411 3.719 .
A coleção formada pelo inteiro 0 não tem um maior divisor comum pois, todos os inteiros
positivos são divisores de 0. Aliás, esta é a única coleção, não vazia, de inteiros que não possui
um maior divisor comum. Vejamos!
Se a coleção possui um inteiro positivo a então os divisores comuns desta coleção estão
entre 1 e a tendo em vista o Lema 2.8.2. Assim sendo, o conjunto dos divisores da coleção é
limitado superiormente. Conseqüentemente, possui um maior elemento. Tal elemento é aquele
que estamos chamando de mdc da coleção.
E agora, como garantir a existência do maior divisor comum quando a coleção possui apenas
inteiros negativos? Bem, reduzindo o problema ao caso anterior! Para isto basta observar que
b > 0 divide a se, e somente se, b divide −a. Isto garante que os divisores comuns de uma
coleção e da coleção formada pelos simétricos da primeira coincidem. Logo a conclusão decorre
do caso anterior.
Designamos por mdc(a1 , a2 , . . . , ak ) o maior divisor comum de a1 , a2 , . . . , ak ∈ Z. Dizemos
que os inteiros a1 , a2 , . . . , ak são relativamente primos se mdc(a1 , a2 , . . . , ak ) = 1.
Exemplos.
• mdc(a, 1) = 1 para todo a ∈ Z ,
• mdc(a, −1) = 1 para todo a ∈ Z ,
• mdc(a, ka) = a para todo a ∈ Z+ e k ∈ Z ,
• mdc(a, ka) = −a para todo a ∈ Z− e k ∈ Z .
• mdc(p, q) = 1 para quaisquer primos distintos p e q.
Os seguintes dois resultados são caracterizações relevantes do mdc, estes podem ser enun-
ciados para coleções de inteiros não todos nulos, mas por simplicidade tratamos o caso de
apenas dois inteiros uma vez que o caso geral se trata exatamente da mesma maneira.
Proposição 2.12.1. Sejam a, b ∈ Z não ambos nulos. O mdc de a e b é o único inteiro positivo
c tal que
(a) c é divisor comum de a e b,
(b) qualquer divisor comum de a e b é divisor de c.
Demonstração. Temos três coisas a provar aqui, primeiro: se c = mdc(a, b) então, c verifica as
propriedades (a) e (b) do enunciado, segundo: reciprocamente, se c verifica as propriedades do
enunciado então c = mdc(a, b), e terceiro: o número c que verifica as propriedades (a) e (b) do
enunciado é único.
Suponhamos primeiro que c = mdc(a, b). Então c verifica a propriedade (a) do enunciado
sem mais, pois c é divisor comum de a e b. Resta ver que c satisfaz a propriedade (b). Proce-
dendo por absurdo, suponhamos que existe algum divisor comum d de a e b que não divide c.
Isto significa (verifique!) que d possui algum fator primo p que não é fator primo de c.
Agora pc é divisor comum de a e b, pois p e todos os fatores da decomposição de c (os quais
são diferentes de p pela hipótese do argumento) figuram entre os fatores das decomposições
de a e b.
Como p > 1, pc > c. Isto é, pc é um divisor comum de a e b que é maior que c, contradizendo
a definição de c. Portanto c verifica a propriedade (b).
Seja agora c ∈ Z+ verificando as propriedades (a) e (b). Então c = mdc(a, b), pois qualquer
outro divisor comum d de a e b é (pela propriedade (b)) divisor de c e portanto é menor ou igual
a c.
Finalmente, suponhamos que d ∈ Z+ é um número verificando as propriedades (a) e (b)
do enunciado. Vemos então, que c | d e como c também verifica as propriedades temos d | c,
portanto d = c pois ambos os números são positivos (exercı́cio 4, seção 2.9).
A prova está terminada. C.Q.D.
O seguinte resultado nos diz que o mdc de dois inteiros tem uma representação muito es-
pecial que o caracteriza.
Proposição 2.12.2. Sejam a, b ∈ Z não ambos nulos. Existem n0 , m0 ∈ Z não ambos nulos,
tais que mdc(a, b) = n0 a + m0 b.
Uma ferramenta útil na determinação do mdc de uma coleção finita de números inteiros é o
teorema de decomposição em fatores primos.
Com efeito, para determinar o mdc de uma coleção de números, escrevemos cada um deles
segundo o teorema da decomposição em fatores primos, logo escolhemos os fatores primos
comuns a todos os números da coleção, o produto de tais fatores será o mdc da coleção.
Nos exemplos a seguir descreveremos o procedimento que usamos na prática desde nossos
cursos elementares:
Exemplos.
• Calculemos mdc(2.480, 1.320, 1.640). Escrevendo os números segundo o teorema da decomposição
em fatores primos vemos que
2.480 2 1.320 2 1.640 2
1.240 2 660 2 820 2
620 2 330 2 410 2
310 2 165 3 205 5
155 5 55 5 41 41
31 31 11 11 1
1 1
Isto é,
Exercı́cios
1. O mdc de dois inteiros positivos é 45. Sabendo que o maior deles é 540 determine o menor
(ou, os menores).
2. Determinar todos os pares de inteiros positivos sabendo que cada par tem soma 520 e mdc
40.
a+b
3. Sejam a, b ∈ Z+ . Que relação liga a e b quando = 5?
mdc(a, b)
7. Quais são os inteiros positivos menores que 21 que são primos com 21 ?
Dada uma coleção de números inteiros, diremos que um inteiro é um múltiplo comum da
coleção quando ele é múltiplo de cada inteiro da coleção.
O menor múltiplo comum (escrito mmc) de uma coleção de números inteiros é o menor dos
seus múltiplos comuns não negativos.
É importante observar que uma coleção de inteiros que contém o inteiro 0 tem como único
múltiplo comum o 0. Logo o seu menor múltiplo comum existe e é 0.
Designamos por mmc(a1 , a2 , . . . , ak ) o menor múltiplo comum de a1 , a2 , . . . , ak ∈ Z .
Se uma coleção de inteiros admite um múltiplo comum, então o conjunto dos múltiplos co-
muns não negativos da coleção (que por definição, é subconjunto de N) é não vazio e portanto
possui um menor elemento (veja os lembretes acima). Tal elemento é aquele que estamos
chamando de menor múltiplo comum da coleção
A pergunta importante agora é a seguinte: Sob que condições uma coleção não vazia de
inteiros distintos possui um múltiplo comum? Bem, quando ela é uma coleção finita, certamente.
É claro que o produto dos inteiros da coleção é um múltiplo comum.
E quando a coleção possui uma infinidade de inteiros distintos? Neste caso, já vimos que
se a coleção contem 0, então o problema está resolvido. Resta então para analisar o caso em
que a coleção não é finita e não contem 0. Um exemplo desta situação é: a coleção Z+ .
Desafio! Seja S uma coleção não finita de inteiros distintos não nulos. Mostre que não existe
um múltiplo comum para S.
Temos uma caracterização do mmc similar à dada para o mdc na proposição 2.11.2.
Proposição 2.13.1. Sejam a, b ∈ Z. O mmc de a e b é o único inteiro não nulo d tal que
(a) d é múltiplo comum de a e b,
Demonstração. Exercı́cio.
Como no caso do mdc, uma ferramenta útil na determinação do mmc de uma coleção finita
de números inteiros é o teorema de decomposição em fatores primos.
Exemplos.
• mmc(a, 1) = a quando a ∈ Z+ e mmc(a, 1) = −a quando a ∈ Z− ,
• mmc(an , am ) = amax{m,n} quando a, m, n ∈ Z+ , onde max{m, n} representa o maior dentre m
e n.
• Vamos usar o exercı́cio 8 para determinar o mmc dos números 2.480, 1.320 e 1.640. A fatoração
destes números feita na seção anterior é
2.480 = 24 · 5 · 31 , 1.320 = 23 · 3 · 5 · 11 , 1.640 = 23 · 5 · 41,
Exercı́cios
1. Determinar o menor inteiro positivo que dividido por 5, 7 e 8 dá restos 3, 5 e zero, respectiva-
mente.
2. O menor múltiplo comum de dois inteiros positivos é 72 e um deles é 24. Que valores poderão
ter o outro?
3. O produto de dois inteiros positivos é 4.320 e o mmc é 360. Determinar todas as possibilidades
para tais números.
4. Determinar dois inteiros positivos cujo mmc é 225, sabendo que o quociente das soma desses
números pelo seu mdc é 8.
5. Três automóveis disputam uma corrida em uma pista circular. O primeiro dá cada volta em 4
minutos, o segundo em 5 minutos e o terceiro em 6 minutos. No fim de quanto tempo voltarão
os três automóveis a se encontrar no inı́cio da pista, se eles partiram juntos?
8. Sejam a = pα1 1 pα2 2 . . . pαk k e b = pβ1 1 pβ2 2 . . . pβk k , onde p1 < p2 < . . . < pk são inteiros primos
e αi , βi ∈ N para todo i ∈ {1, 2, . . . , k} (isto é, alguns dos αi ou alguns dos βj podem ser nulos,
esta não é a fatoração do teorema de decomposição). Mostre que
(a) mdc(a, b) = pγ1 1 pγ2 2 . . . pγk k , onde γi = min{αi , βi } para todo i ∈ {1, 2, . . . , k}.
(b) mmc(a, b) = pδ11 pδ22 . . . pδkk , onde δi = max{αi , βi } para todo i ∈ {1, 2, . . . , k}.
Os Racionais e os Irracionais
3.1 Os Racionais
m
No capı́tulo anterior vimos que, se m, n ∈ Z, n 6= 0, a expressão tem sentido em Z apenas
n
quando m é um múltiplo de n. Equivalentemente, a equação n · x = m, com n 6= 0, tem solução
em Z, se, e somente se, m é múltiplo de n. Vamos agora considerar um conjunto de números
onde tal equação sempre tem solução:
m
Um número racional é uma expressão da forma , onde m, n ∈ Z e n 6= 0. Designamos por Q
n
o conjunto dos números racionais. Isto é,
m
Q= ; m, n ∈ Z, n 6= 0 .
n
m
Se r = ∈ Q, o inteiro m é chamado o numerador de r e o inteiro n é dito o denominador de r.
n
m m0 m m0
Definição. Dizemos que, os números racionais e 0 são iguais, e escrevemos = 0,
n n n n
se, e somente se, m · n 0 = m · n 0 .
m m
O número racional com m ∈ Z, será identificado com o inteiro m, isto é, = m. Desta
1 1
maneira podemos pensar em Z como sendo um subconjunto de Q.
0 m 0
Em particular, 0 = , e vemos que ∈ Q é igual a 0 se, e somente se, m = 0. Logo 0 =
1 n n
para todo n ∈ Z∗ .
Designamos por Q∗ o conjunto que consiste dos números racionais diferentes de 0, isto é, Q∗ =
Q − {0}.
69
Os Racionais e os Irracionais 3.2 Operações Sobre Q
−m m m −m
= e = .
n −n n −n
p r p r ps + rq
+ : Q × Q −→ Q , 7−→ + = (soma ou adição)
q s q s qs
p r p r p·r
, 7−→ · =
· : Q × Q −→ Q (multiplicação ou produto)
q s q s q·s
onde p, r ∈ Z e q, s ∈ Z∗ .
Antes de passarmos às propriedades de tais operações faremos algumas observações impor-
tantes:
Observação 1.
• Primeiramente, as operações de adição e multiplicação de números racionais que introduzi-
mos acima estão bem definidas. Esta frase significa que o resultado das operações independe
da fração usada para representar os operandos.
Isto é:
p0 r0 p0 r0 p0 r0
p r p r p r
= 0 e = 0 =⇒ + = 0+ 0 e · = 0· 0 .
q q s s q s q s q s q s
De fato, por hipótese: pq 0 = p 0 q e rs 0 = r 0 s. Da definição da soma, obtemos:
p r ps + rq p0 r0 p 0s 0 + r 0q 0
+ = e + = .
q s qs q0 s0 q 0s 0
como querı́amos.
A verificação para a multiplicação é feita de maneira similar (exercı́cio).
p r pq + rq p+r
• Sejam p, q, r ∈ Z com q 6= 0. Então: + = 2
= .
q q q q
−1 1
• Sejam p, q ∈ Z com q 6= 0. Como −1 = = , temos que
1 −1
p −1 p −p p 1 p p
(−1) · = · = e (−1) · = · = .
q 1 q q q −1 q −q
p p −p p
Escrevemos − para designar o racional (−1) · = = .
q q q −q
• Sejam p, q ∈ Z com q 6= 0. Temos que
p p p −p p + (−p) 0
+ (− ) = + = = = 0.
q q q q q q
p 1
• Se a = com p, q ∈ Z∗ , definimos o inverso de a (designado a−1 ou ) como sendo o racional
q a
q 1 pq pq
. Logo: a · = = = 1.
p a qp qp
Propriedades das operações de soma e multiplicação:
As operações + e · definidas em Q verificam as seguintes propriedades:
(1) Comutatividade:
• a + b = b + a para todo a, b ∈ Q,
• a · b = b · a para todo a, b ∈ Q.
(2) Associatividade:
• (a + b) + c = a + (b + c) para todo a, b, c ∈ Q,
• (a · b) · c = a · (b · c) para todo a, b, c ∈ Q.
(3) Distributividade:
• a · (b + c) = a · b + a · c para todo a, b, c ∈ Q,
Muita atenção!! • Tudo que foi dito no item Muita atenção do Capı́tulo 2 continua válido quando
trocamos Z por Q.
• Neste ponto, o leitor deve revisar as conseqüências listadas após as propriedades das operações
de soma e multiplicação em Z no capı́tulo 2, e verificar que tais propriedades são também ver-
dadeiras para as operações de soma e multiplicação em Q.
• Finalmente, note que, se a, b ∈ Q e b 6= 0, então podemos escrever
1 a 1 a
a · b−1 = a · = · = .
b 1 b b
• As propriedades (1)-(6) listadas acima não são axiomas nem convenções. Elas podem ser
demonstradas a partir das propriedades já conhecidas das operações de soma e multiplicação
em Z junto com os fatos e definições estabelecidas neste capı́tulo.
Por exemplo, vejamos como demonstrar a propriedade de distributividade (3):
m p r
Sejam a = , b = , c = ∈ Q. Temos:
n q s
m p r m ps + qr m(ps + qr) (mp)s + (mq)r
a · (b + c) = · + = · = = ·1
n q s n qs n(qs) (nq)s
(mp)s + (mq)r n (mp)(sn) + (mq)(rn)
= · =
(nq)s n (nq)(sn)
(mp)(sn) + (mr)(nq) mp mr m p m r
= = + = · + ·
(nq)(sn) nq ns n q n s
= a · b + a · c.
As potências naturais de números racionais são introduzidas de maneira similar às potências
naturais de inteiros definidas no capı́tulo 2:
Definição:
• a0 = 1 para todo 0 6= a ∈ Q
• ak = a . . · a} para todo a ∈ Q e k ∈ N∗ .
| · .{z
k vezes
1
• a−k = para todo 0 6= a ∈ Q e k ∈ N.
ak
Com isto, vemos que, as propriedades das potências listadas acima são, na verdade, con-
seqüências diretas das correspondentes propriedades para potências naturais de inteiros lista-
das no capı́tulo 2.
p
• Na definição de potências negativas de números racionais, vemos que, se a = ∈ Q∗ e
q
n ∈ Z+ , então: n n
−n 1 1 1 qn q 1
a = n = n = n = n = = = (a−1 )n .
a p p p p a
q q n
Isto nos permite usar a igualdade a−n = (a−1 )n , e mostra que, na verdade, a introdução das
potências negativas de números racionais é de fato conseqüência da definição de potências
positivas e da definição do recı́proco de um número racional não nulo.
m
Dado ∈ Q, com m, n ∈ Z+ , determinar números inteiros relativamente primos p, q ∈ Z+ ,
n
p m p m
tais que = . Isto é, é a fração irredutı́vel de .
q n q n
A resposta vem do teorema de decomposição em fatores primos. De fato, podemos decom-
por m e n como produto de potências de números primos e cancelar os fatores comuns de m e
n. Isto é, se um primo pi aparece na decomposição de m com expoente αi e na decomposição
de n com expoente βi então:
(a) se αi = βi , cancelamos o fator pαi i de m e n,
(b) se αi < βi , cancelamos o fator pαi i de m e substituı́mos o fator pβi i de n
por pβi i −αi ,
(c) se αi > βi , cancelamos o fator pβi i de n e substituı́mos o fator pαi i de m
por pαi i −βi .
m mdc(m, n) · p p
= = .
n mdc(m, n) · q q
Consideremos a reta orientada da seção 2.4, onde já representamos os números inteiros.
Nesta reta vamos agora representar os números racionais.
Antes de começar observamos que a representação dos inteiros na reta foi feita partindo
de um gerador, isto é, a representação toda consiste em fixar uma origem O e a partir desta
interpretar o significado do inteiro 1, depois (mediante translação da unidade) interpretar 1 + 1,
Fixemos n ∈ Z+ . Tomemos uma semi-reta auxiliar r 0 partindo da origem e não colinear com
a nossa reta orientada como se mostra na Fig. 1. Na semi-reta r 0 colocamos a representação
de Z+ escolhendo uma unidade de escala menor do que da nossa reta orientada. Isto é feito
apenas para facilitar a visualização na representação. Seja A o ponto de r 0 que representa o
inteiro n. Trace um segmento ligando A com o ponto U da reta orientada que representa 1,
obtendo um triângulo de vértices OAU.
0 1 2 n−1 n
, , ,..., , ,
n n n n n
mq
Pela observação do parágrafo anterior, P1 representa também o racional e P2 representa
nq
np
o racional .
nq
Seja então P o ponto na reta orientada obtido intersectando a reta orientada com a paralela
ao segmento que liga nq (na semi-reta r 0 ) com U passando por mq + np. Tal ponto é, por
mq + np m p
definição, o representante do racional , isto é, da soma + .
nq n q
m
Fig.2. Representação dos racionais n
com m ∈ Z− e n ∈ Z+ na reta orientada.
Este procedimento pode-se resumir no seguinte: Uma vez que temos pontos P1 e P2 na reta
m p
orientada representando racionais e , consideramos os segmentos orientados que vão de
n q
−−→ −−→
O a P1 e de O a P2 que designamos por OP1 e OP2 respectivamente. Deslizando o segmento
−−→
OP2 sobre nossa reta orientada r até fazer coincidir O com P1 , vemos que o ponto final do
m p
segmento obtido por esta translação é um novo ponto P que representa o racional + (ver
n q
p
Fig.4). Esta idéia corresponde a obter o ponto P transladando em unidades o ponto P1 .
q
„ «
5 2 11
Fig.4. Outra representação da soma + − = .
2 3 6
O leitor agora não terá dificuldade em achar a representação para o produto de dois números
m p
racionais. Proceda, por exemplo, da seguinte maneira: Considere dois racionais e . Faça
n q
um desenho colocando as retas r e r 0 como acima. Na reta r 0 localize o ponto P ∈ r 0 que
representa o inteiro nq. Se nq > 0, trace um segmento ligando P com o ponto U ∈ r que
representa a unidade 1 (veja as figuras acima). Se R ∈ r 0 é o ponto que representa o inteiro mp,
trace a paralela ao segmento PU passando por R. Tal paralela deve cortar r (justifique!) num
m p
ponto Q. Pelo acima dito, o ponto Q ∈ r é o representante do produto · .
n q
m p m p
Definição. Sejam , ∈ Q, com n, p ∈ Z+ . Dizemos que é menor que e escrevemos
n q n q
m p m
< se, e somente se, o ponto que representa na reta orientada está à esquerda do ponto
n q n
p p m p m m p
que representa . Escrever > (lê-se é maior que ) é o mesmo que escrever < .
q q n q n n q
2 5 11 2 2 2
Por exemplo na Fig.4 da seção anterior, vemos que − < 0, 0 < , > , − < , etc.
3 2 6 3 3 3
Da mesma maneira que no capı́tulo 2, um número racional é chamado positivo se é maior
que 0, negativo se é menor que 0, não negativo se é positivo ou é igual a 0, e não positivo se é
negativo ou é igual a 0.
Designamos por Q+ (respectivamente Q− ) o subconjunto de Q que consiste dos números
racionais positivos (respectivamente negativos). Assim, o conjunto dos racionais não positivos
é Q − Q+ e o conjunto dos racionais não negativos é Q − Q− .
Evidentemente, verificar que um número racional é menor que outro usando apenas a
definição anterior, é um procedimento primitivo, sobretudo tendo já conhecida a relação de or-
dem em Z. A proposição 3.2 abaixo nos diz que a relação de ordem em Z, que já conhecemos,
é suficiente para comparar dois números racionais.
m m0
Lema 3.4.1. Sejam m, m 0 , n ∈ Z com n > 0. Então < (em Q) se, e somente se, m < m 0
n n
(em Z).
Consideremos a representação de Q na reta orientada r como foi feito na seção anterior. De-
m m0
signamos por A, B e C respectivamente, os pontos de r representando os racionais 1, e .
n n
J. Delgado - S. Firmo - P. Nóbrega 78 Instituto de Matemática - UFF
Os Racionais e os Irracionais 3.4 A Relação de Ordem em Q
Observação 3.
m
• Note-se que, se m, n ∈ Z com n 6= 0, então > 0 se, e somente se, os inteiros m e n tem o
n
mesmo sinal.
m 0
De fato, se n > 0, segue da proposição 3.4.2, que > = 0 se, e somente se, m = m · 1 >
n 1
m −m 0
n · 0 = 0. Se n < 0, então = > = 0 se, e somente se, −m = (−m) · 1 > (−n) · 0 = 0.
n −n 1
Isto é, se, e somente se, m < 0.
m p q k
0< < ⇐⇒ 0 < mq < kp ⇐⇒ 0 < < ⇐⇒ 0 < s−1 < r−1 .
k q p m
A propriedade (7) segue desta relação, da propriedade (6) e da observação feita na pag. 67.
• Das propriedades (4), (6) e (7) temos que: Se r ∈ Q e 0 < r < 1, então:
0 < . . . < rn < . . . < r3 < r2 < r < 1 < r−1 < r−2 < r−3 < . . . < r−n < . . .
mp
r·s= > 0 ⇐⇒ mp > 0 ⇐⇒ m e p têm o mesmo sinal
nq
⇐⇒ r e s têm o mesmo sinal.
mp
Finalmente, r · s = = 0 ⇐⇒ mp = 0 ⇐⇒ m = 0 ou p = 0 . Isto termina a prova de
nq
(iii). C.Q.D.
Finalmente, voltamos a considerar a equação xy = 1. Na seção 2.5 vimos que esta equação,
quando considerada em Z, possui apenas duas soluções: x = y = 1 ou x = y = −1. Esta
mesma equação considerada agora em Q possui infinitas soluções!
Com efeito, a igualdade xy = 1 em Q significa que x 6= 0 6= y e que y é o recı́proco de x.
Logo, para resolvê-la basta tomar qualquer x ∈ Q não nulo e fazer y = x−1 . Como a quantidade
de números racionais não é finita, a quantidade de números racionais diferentes de zero também
não é finita.
Um fato curioso e importante de se observar é que, o conjunto Q, possui tantos elementos
quanto o conjunto N dos números naturais, e o mesmo vale para Z. Isto se verifica enumerando
os elementos dos conjuntos Z e Q ao colocá-los numa lista da mesma maneira que N (ou da
mesma maneira que um subconjunto ilimitado de N).
Para colocar os elementos do conjunto Z numa lista podemos proceder da seguinte maneira:
0, −1, 1, −2, 2, −3, 3, −4, 4, −5, 5, . . .
Como colocar os elementos de Q numa lista? Primeiro observamos que basta colocar os
elementos de Q que são não negativos numa lista e depois intercalar os elementos negativos
de Q da mesma forma que na lista acima feita para Z.
m
Na tabela abaixo figuram todas as frações da forma com m, n ∈ N, n 6= 0 e o caminho
n
indicado na poligonal mais clara indica como enumerar estas frações. A enumeração é feita da
seguinte maneira:
0 1 0 0 1 2 3 2 1 0 0 1 2 3 4 5 4 3 2 1 5 6 7 8 9 10
, , , , , , , , , , , , , , , , , , , ,..., , , , , , ,...
1 1 2 3 2 1 1 2 3 4 5 4 3 2 1 1 2 3 4 5 6 5 4 3 2 1
0 1 0 2
Isto é, é o primeiro elemento da lista, é o segundo, é o terceiro,. . . , o décimo terceiro,
1 1 2 3
etc.
O conjunto das frações descritas contem todos os números racionais não negativos (os
quais aparecem na lista com repetições), logo o conjunto dos números racionais não negativos
é um conjunto infinito enumerável.
Pra finalizar esta seção, vamos incluir duas belas passagens do livro Meu Professor de
Matemática e outras histórias de Elon L. Lima (Coleção Fundamentos da Matemática Elementar,
Sociedade Brasileira de Matemática, Rio de Janeiro, 1987). Estas passagens referem-se a
alguns problemas citados no livro O Homem que Calculava de Malba Tahan, que relata as
proezas matemáticas de Beremiz Samir narradas por um fiel amigo e companheiro durante
suas viagens por terras árabes.
A primeira aventura de Beremiz acontece quando ele e seu amigo, viajando sobre o mesmo
camelo, chegam a um oásis, onde encontram-se três irmãos em acirrada discussão por causa
da herança de 35 camelos deixada pelo pai, quem antes de morrer, estipulara que metade da
herança caberia ao filho mais velho, um terço ao do meio e um nono ao mais moço.
Bem, a discussão vinha do fato de que 35 não é divisı́vel por 2, 3 e 9. Portanto, o filho mais
35 34+1 1 35 33+2 2
velho iria receber 2
= 2
= 17 + 2
camelos, o filho do meio 3
= 3
= 11 + 3
camelos, e o
35 27+8 8
mais moço 9
= 9
=3+ 9
camelos !!!
Para espanto e preocupação do amigo, Beremiz entrega o seu camelo aos irmãos a fim
de facilitar a partilha. Deste modo, tendo 36 camelos, o filho mais velho do falecido fica com
36 36 36
2
= 18, camelos, o filho do meio ganha 3
= 12 camelos e o mais moço 9
= 4 camelos !!
Após esta partilha, todos saı́ram ganhando, até Beremiz que ainda ficou com o seu camelo
e mais um para o seu amigo !!
O seguinte problema aparece quando Beremiz e seu amigo, a caminho de Bagdá, socorrem
no deserto um rico cheique, que fora assaltado, e com ele repartem irmãmente sua comida, que
se resumia a 8 pães: 5 de Beremiz e 3 do amigo.
Chegados ao seu destino, o cheique os recompensa com oito moedas de ouro: 5 para
Beremiz e 3 para o amigo.
Todos então ficam surpresos com o suave protesto de Beremiz. Segundo este, a maneira
justa de repartir as 8 moedas seria dar 7 a ele e apenas 1 ao amigo !!
O argumento de Beremiz fora o seguinte: durante a viagem, cada refeição consistia em
dividir um pão em 3 partes iguais e cada um dos viajantes comia uma delas. Foram consumidos
ao todo 8 pães, ou seja 24 terços, cada viajante comendo 8 terços. Destes, 15 terços foram
dados por Beremiz, que comeu 8, logo contribuiu com 7 terços para a alimentação do cheique.
Por sua vez, o amigo contribuiu com 9 terços, dos quais comeu 8, logo participou apenas com 1
terço para alimentar o cheique. Isto justifica a observação de Beremiz.
No final, porém, o homem que calculava, generosamente, ficou com apenas 4 moedas,
dando as 4 restantes ao amigo.
A convenção usual estabelece que o número n do parágrafo acima é escrito (na base 10)
colocando os seus algarismos um após o outro em justaposição de esquerda a direita na ordem
decrescente das potências de 10.
Exemplos.
• 23 = 20 + 3 = 2 · 101 + 3 · 100 . • 31.245 = 30.000 + 1.000 + 200 + 40 + 5 = 3 · 104 + 1 · 103 + 2 ·
102 + 4 · 101 + 5 · 100 .
A representação acima pode ser feita substituindo a base 10 por qualquer natural não nulo.
A fim de não ocupar mais tempo e espaço nestas notas, dedicaremos às nossas considerações
à base 10.
Nosso primeiro objetivo é dar uma representação dos números racionais baseada em potências
do natural 10.
Ántes da prova deste teorema, vamos introduzir a terminologia usada no cotidiano e que
também usaremos no resto destas notas.
Quando b` = 0 para todo ` > `0 dizemos que r possui expansão decimal finita e escrevemos
r = ak ak−1 . . . a2 a1 a0 , b1 b2 b3 b4 . . . b`0 .
As expansões decimais finitas podem ser pensadas como sendo periódicas de maneira
trivial acrescentando uma terminação de zeros:
0 , b1 b2 . . . bk = 0 , b1 b2 . . . bk 000 . . . 00 . . . = 0 , b1 b2 . . . bk 0 .
m
Proposição 3.5.2. Sejam m, n ∈ Z+ . A expansão decimal do número racional é sempre
n
finita ou periódica, sendo finita se, e somente se, os únicos divisores primos de n são 2 e/ou
5. Reciprocamente, toda expansão decimal finita ou periódica é a expansão decimal de um
número racional.
Caso I. n = 1.
m
Neste caso, = m é um número inteiro e escreve-se na forma ak · 10k + ak−1 · 10k−1 + . . . +
n
a1 · 101 + a0 · 100 , onde bj = 0 para todo j ∈ Z.
Caso II. n 6= 1.
Aqui temos que considerar ainda duas sub-situações:
Neste caso podemos aplicar o algoritmo de Euclides para determinar inteiros q, p ∈ Z+ , com
m p m
0 < p < n tais que m = q · n + p. Logo = q + , sendo q a parte inteira de . Como já
n n n
p
sabemos decompor a parte inteira, basta analisar a parte . Isto é feito na situação II.b. abaixo,
n
assumindo que que a fração é irredutı́vel.
tende a infinito quando j −→ ∞. Portanto, para o nosso n, existe um menor inteiro k1 ∈ Z+ tal
que m · 10k1 ≥ n > m · 10k1 −1 .
Se k1 > 1 fazemos b1 = b2 = . . . = bk1 −1 = 0.
Escrevemos r0 = m.
Segundo o algoritmo de Euclides, podemos encontrar inteiros bk1 ∈ Z+ e r1 ∈ N com 0 ≤
r1 < n tais que
m · 10k1 r0 · 10k1 = n · bk1 + r1 . (∗)
1 m bk r1
Multiplicando a igualdade (*) por k
obtemos = k1 + . Logo
n · 10 1 n 10 1 n · 10k1
m b1 b2 bk r1
= 1 + 2 + . . . + k1 + .
n 10 10 10 1 n · 10k1
Neste ponto é importante observar que bk1 ∈ {1, 2, . . . , 9}. De fato, a relação (*) pode ser
m · 10k1 −1 r1
escrita 10(m·10k1 −1 ) = n·bk1 +r1 . Dividindo esta relação por n obtemos 10 = bk1 + .
n n
J. Delgado - S. Firmo - P. Nóbrega 86 Instituto de Matemática - UFF
Os Racionais e os Irracionais 3.5 Os Racionais e suas Expansões Decimais
Pela maneira como foi feita a escolha do inteiro k1 temos m · 10k1 −1 < n e então, o lado
r1
esquerdo da igualdade é estritamente menor que 10. Como 0 ≤ r1 < n temos ≥ 0 e o lado
n
direito da igualdade é maior ou igual a bk1 .
Portanto, 10 > bk1 e como bk1 ∈ Z+ , obtemos 10 > bk1 > 0 como afirmamos.
Se r2 = 0 então a expansão decimal é finita e termina com o dı́gito bk1 +k2 , neste caso
isto é, n divide r1 · 10k2 , ou seja n divide 10k2 (pois r1 < n). Logo, os únicos divisores primos de
n são 2 e/ou 5.
1
Se r2 6= 0, multiplicamos a igualdade de (**) por para obter
n · 10k1 +k2
r2 bk +k r2
k
= k1 +k2 + .
n · 10 1 10 1 2 n · 10k1 +k2
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Os Racionais e os Irracionais 3.5 Os Racionais e suas Expansões Decimais
Logo
m b1 bk −1 bk bk +1 bk +k −1 bk +k r2
= 1 + . . . + k1 −1 + k1 + k1 +1 + . . . + k1 +k2 −1 + k1 +k2 + ,
n 10 10 1 10 1 10 1 10 1 2 10 1 2 n · 10k1 +k2
e se repete o procedimento com r2 no lugar de m.
Vamos agora completar a prova da proposição 3.5.2. após a seguinte observação funda-
mental.
Observação 4. Multiplicar uma expansão decimal por uma potência de 10 significa transladar a
vı́rgula decimal pra a esquerda se o expoente da potência de 10 é negativo, ou pra a direita se
o expoente é positivo.
De fato, consideremos uma expansão decimal r = ak . . . a1 a0 , b1 b2 . . . b` . . .
Dado n ∈ Z+ temos
10n · r = 10n ·
(ak . . . a1 a0 , b1 b2 . . . b` . . .)
n k 1 b1 0 b`
= 10 · ak · 10 + . . . + a1 · 10 + a0 · 10 + 1 + . . . + ` + . . .
10 10
= ak · 10k+n + ak−1 · 10k−1+n + . . . + a1 · 101+n + a0 · 100+n + b1 · 10n−1
+b2 · 10n−2 + . . . + bn · 10n−n + bn+1 · 10n−(n+1) + bn+2 · 10n−(n+2) + . . .
= ak . . . a1 a0 b1 b2 . . . bn , bn+1 bn+2 . . .
Se n ≤ k :
10−n · r = 10−n · (a
k . . . a1 a0 , b1 b2 . . . b` . . .)
−n k 1 b1 0 b`
= 10 · ak · 10 + . . . + a1 · 10 + a0 · 10 + 1 + . . . + ` + . . .
10 10
Finalmente, se n > k :
10−n · r = 10−n · (a
k . . . a1 a0 , b1 b2 . . . b` . . .)
−n k 1 b1 0 b`
= 10 · ak · 10 + . . . + a1 · 10 + a0 · 10 + 1 + . . . + ` + . . .
10 10
= ak · 10k−n + ak−1 · 10k−1−n + . . . + a0 · 100−n + b1 · 10−n−1 + . . .
= 0 · 10−1 + . . . + 0 · 10k+1−n + ak · 10k−n + ak−1 · 10k−1−n + . . .
+a0 · 100−n + b1 · 10−n−1 + . . . = 0 ,0| 0 0 {z
. . . 0 0}ak . . . a0 b1 b2 . . .
n − (k + 1) zeros
Na prova do teorema 3.5.1 vimos que, a expansão decimal de um número racional é sempre
m
finita ou periódica, e que se a expansão decimal de é finita, então os únicos divisores primos
n
de n são 2 e/ou 5. Vamos provar agora que, se os únicos divisores primos de n são 2 e/ou 5,
m
então a expansão decimal de é finita.
n
Seja n = 2α · 5β , para alguns α, β ∈ N.
Temos duas situações por estudar:
Caso α ≤ β :
m 2β−α
Neste caso, multiplicando por β−α e escrevendo m · 2β−α na forma
n 2
m · 2β−α = b0 · 10k + b1 · 10k−1 + . . . + b2 · 101 + bk · 100 , (1)
obtemos:
m m · 2β−α b0 · 10k + b1 · 10k−1 + . . . + b2 · 10k−1 + bk · 100
= =
n n · 2β−α
k−β k−1−β
2β · 5β1−β
= b0 · 10 + b1 · 10 + . . . + b2 · 10 + bk · 10−β . (2)
Caso α > β :
m 5α−β
Neste caso procedemos como no anterior multiplicando por α−β , e escrevendo m · 5α−β
n 5
como
m · 5α−β = c0 · 10k + c1 · 10k−1 + . . . + c2 · 101 + ck · 100 .
Um cálculo como o feito em (2) termina a demonstração para este caso.
Vamos provar agora que toda expansão decimal finita ou periódica é de fato a expansão
decimal de um número racional.
Como toda expansão decimal finita pode ser considerada como sendo periódica, restringi-
mos a nossa atenção às expansões periódicas. Também podemos supor que a nossa expansão
não tem parte inteira.
Seja r = 0, b1 b2 . . . bk−1 bk . . . bk+p uma expansão decimal periódica, com k, p ∈ Z+ , então
Exemplos.
1 1 1·5 5
A. = 0, 5 . Com efeito, = = = 0, 5 .
2 2 2·5 10
21
B. = 0, 2625 .
80
Com efeito, os únicos divisores primos de 80 são 2 e 5, pois 80 = 24 · 5, logo
(1) Temos 103 · 101 ≥ 330 > 103 · 100 e 103 · 101 = 330 · 3 + 40 com 0 ≤ 40 < 330.
Logo b1 = 3 e r1 = 40.
(2) Temos 40 · 101 ≥ 330 > 40 · 100 e 40 · 101 = 330 · 1 + 70 com 0 ≤ 70 < 330.
Logo b2 = 1 e r2 = 70.
(3) Temos 70 · 101 ≥ 330 > 70 · 100 e 70 · 101 = 330 · 2 + 40 com 0 ≤ 40 < 330.
Logo b3 = 2 e r3 = 40 = r1 .
Portanto b2 = b4 = b6 = . . . e b3 = b5 = b7 = . . ..
103
Isto é, = 0, 3121212 . . . = 0, 312.
330
Compare os passos acima com o esquema abaixo !!!
1 = 1 · 100 = 0, 9 = 0, 9999 . . .
0, 1 = 1 · 10−1 = 0, 09 = 0, 09999 . . .
0, 01 = 1 · 10−2 = 0, 009 = 0, 009999 . . .
0, 001 = 1 · 10−3 = 0, 0009 = 0, 0009999 . . .
etc. . . .
0, |00 .{z
. . 00} 1 = 1 · 10−n = 0, |00 . {z
. . 000} 9 = 0, |00 . {z
. . 000} 9999 . . .
n zeros n + 1 zeros n + 1 zeros
Corolário 3.5.3. A expansão decimal finita de um número racional não nulo pode ser escrita
como uma expansão decimal periódica infinita terminando com 9 de maneira única.
m = (m − 1) + 1 = (m − 1) + 0, 9 = (m − 1), 9
Por exemplo:
• 3 = 2 + 1 = 2+, 9 = 2, 9 .
• 38 = 37 + 1 = 37+, 9 = 37, 9 .
Se s = 0 , b1 b2 . . . bk , então
r = mk mk−1 . . . m1 m0 , a1 a2 a3 . . . e s = n` n`−1 . . . m1 m0 , b1 b2 b3 . . . ,
Adicionando os lados direitos obtemos um inteiro c0 c1 c2 . . . cq , onde c0 é a soma das partes intei-
ras de r e s ou a soma das partes inteiras de r e s acrescentada em uma unidade. Adicionando
os lados esquerdos obtemos 10q (r + s). Logo, a soma das expansões decimais é dada por
r + s = (c0 c1 c2 . . . cq )10−q = c0 , c1 c2 . . . cq .
Por outro lado, multiplicando agora os lados direitos das expressões acima obtemos um
inteiro c0 c1 c2 . . . c2q , para algum c0 ∈ Z, e multiplicando os lados esquerdos obtemos 102q (rs).
Logo, a expansão decimal do produto de r com s é dada por
Exemplo.
Se r = 12, 4591 e s = 2, 7372702 temos: 107 r = 124591000 e 107 s = 27372702 . Logo
107 (r + s) = 151963702 .
Na seção anterior vimos que todo número racional é representado por uma expansão deci-
mal periódica ou finita e reciprocamente, toda expansão decimal periódica ou finita é a expansão
de um número racional. Vimos também (ver Corolário 3.5.3) que toda expansão decimal finita
não nula pode ser escrita de maneira única como uma expansão decimal infinita subtraindo uma
unidade do seu último dı́gito não nulo e acrescentando infinitos algarismos 9 nas casas decimais
seguintes.
Nesta seção apresentaremos os números irracionais e os números reais, o enfoque que ado-
taremos é bastante intuitivo mas sem descuidar os aspectos rigorosos que o texto tenta deixar
na alma do leitor, deixando as construções mais formais para outros cursos mais avançados.
Convenção. No seguinte consideraremos todos os números racionais não nulos como sendo
expansões decimais infinitas periódicas segundo o Corolário 3.5.3.
Consideremos a seguinte expansão decimal
r = 0, 10100100010000100000100 . . . 001 00
| . {z
. . 000} 100
| . .{z
. 0000} 100 . . .
n-zeros (n + 1)-zeros
onde o número de zeros entre dois dı́gitos 1 vai aumentando como se indica. Tal expansão, que
não é periódica nem finita, não representa um número racional!! Isto motiva a seguinte definição
Definição. Um número irracional é uma expansão decimal que não é periódica (vide a
convenção acima).
Designamos por R o conjunto que consiste de todas as expansões decimais, os seus elementos
são chamados números reais.
Observação 1. Segundo os resultados da seção anterior, os números irracionais não tem uma
m
representação na forma com m, n ∈ Z, n 6= 0.
n
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Os Racionais e os Irracionais 3.6 Os Números Irracionais e os Números Reais
Definição. Duas expansões decimais são ditas iguais quando as suas partes inteiras e todos
os dı́gitos das suas partes decimais coincidem.
Exemplos.
(a) Se α = 4, 34909 = 4, 3491 e β = 5, 34909 = 5, 3491, então α < β, porque a parte inteira
de α (que é igual a 4), é menor que a parte inteira de β (que é igual a 5).
(b) Se α = 12, 4958285079 = 12, 495828508 e β = 12, 4958285179 = 12, 495828518, então
α < β, pois a oitava casa decimal de α é 0 e a oitava casa decimal de β é 1.
(c) Se α = 0, 34353249132 e β = 0, 34353534232, então α < β, pois a sexta casa decimal de
α é menor que a sexta casa decimal de β
(d) Os números reais α = 4 e β = 3, 9 são iguais.
Com efeito, segundo a convenção do inicio da seção e a definição acima temos que, a
representação de α como uma expansão infinita é α = 4 = 3 + 1 = 3 + 0, 9 = 3, 9 = β (vide
seção anterior).
(e) Se α = 3 e β = 2, 99998, então β < α.
Com efeito, a expansão infinita de α é α = 3 = 2 + 1 = 2 + 0, 9 = 2, 9 = 2, 9999999. Logo,
105 β = 299998 < 299999, 9 = 300000 = 105 α implica β < α.
No conjunto dos números reais temos definidas duas operações básicas que generalizam
as operações de soma e multiplicação definidas na seção 3.2 sobre Q:
Dizer que estas operações são uma generalização das correspondentes definidas sobre Q
significa que, se α, β ∈ Q ⊂ R, então os números reais α + β e α · β, que na verdade são
racionais, são exatamente aqueles definidos na seção 3.2.
Na prática, nós apenas estamos familiarizados com estas operações em se tratando de ex-
pansões decimais finitas ou, no caso de expansões decimais infinitas não triviais, via expressões
formais.
Por exemplo, o número π é na verdade uma expansão decimal infinita não periódica (abaixo
são mostrados apenas alguns dı́gitos da sua expansão decimal junto com uma representação
π
geométrica). Por outro lado, nós temos uma idéia intuitiva de quantidades como 2π, ,etc.
4
Um computador ou uma maquina de calcular precisaria de uma quantidade infinita de memória
para armazenar uma expansão decimal infinita não trivial, coisa que o nosso mundo fı́sico não
permite.
Evidentemente, ao operar com expansões decimais não triviais, as restrições fı́sicas do
nosso mundo observável induzem erros nos cálculos, mais o efeito nocivo destes erros é mino-
rado com boas aproximações finitas das quantidades envolvidas. Uma vez obtidas tais aproximações
finitas elas podem ser operadas como sendo números racionais.
As operações básicas de soma e multiplicação no conjunto dos números reais verificam
as mesmas propriedades básicas das operações de soma e multiplicação em Q descritas na
seção 3.2. Para manter a completitude do texto reescrevemos a continuação as propriedades
das operações + e · em R:
Propriedades das operações de + e · em R.
Se α, β, γ ∈ R, então:
(1) Comutatividade:
• α + β = β + α,
• α · β = β · α.
(2) Associatividade:
• (α + β) + γ = α + (β + γ),
• (α · β) · γ = α · (β · γ).
(3) Distributividade:
• α · (β + γ) = α · β + α · γ,
(4) Existência de elementos neutros (0 para + e 1 para a ·):
Os números reais 0 e 1 são tais que:
• 0 + α = α = α + 0.
• 1 · α = α = α · 1.
(5) Existência dos simétricos:
Para todo α ∈ R existe um número real, chamado o simétrico de α, e
que designamos por −α tal que
• α + (−α) = 0 = (−α) + α.
(6) Existência dos inversos:
Para todo número real α ∈ R diferente de zero, existe um número
real, chamado o inverso ou recı́proco de α, e que designamos por α−1
1
ou por , tal que
α
1 1
• α · = 1 = · α.
α α
Neste ponto o leitor deverá revisar o item Muita atenção da seção 3.2 e o correspondente
no capı́tulo 2 para as operações em Z que descrevem outras propriedades obtidas a partir das
enumeradas acima.
(1) α ≤ α,
(2) se α ≤ β e β ≤ α então α = β,
(3) se α ≤ β e β ≤ γ então α ≤ γ (transitividade),
(4) se α ≤ β então α + γ ≤ β + γ,
(5) se α ≤ β e γ > 0 então αγ ≤ βγ,
(6) se α ≤ β e γ < 0 então αγ ≥ βγ,
(7) α ≤ β ou β ≤ α (dois elementos quaisquer são comparáveis).
Uma caracterı́stica muito importante do conjunto dos números reais é dada na seguinte
proposição:
α = a0 , a1 a2 . . . ak . . . e β = b0 , b1 b2 . . . bk . . . ,
b0 + 1 = b0 + 0, 9 ≥ b0 , b1 b2 . . . bk . . . = β
e
n ≤ na0 ≤ na0 + n · (0, a1 a2 . . .) = n · (a0 , a1 a2 . . .) = nα ,
obtemos, β ≤ nα.
Finalmente, se a0 = 0 i.e., 0 < α ≤ 1, seja aj o primeiro dos dı́gitos de α que é diferente de
zero (ou seja, a primeira casa decimal não nula de α).
aj
. . 0} aj ≤ α.
Então, 0 < j = 0, |0 .{z
10
jzeros
É importante observar e sempre lembrar que, a propriedade arquimediana vale ainda quando
substituı́mos ≤ por < na desigualdade final, isto é, vale que
Definição.
• Para todo α ∈ R∗ , definimos α0 = 1.
• Para todos α ∈ R e m ∈ Z+ , definimos αn = |α · α {z
· . . . · α}.
n vezes
1
• Para todos α ∈ R∗ e m ∈ Z+ , definimos α−n = .
αn
Temos também as seguintes propriedades básicas das potências inteiras:
√
Definição. Seja α ∈ R, α ≥ 0. Dado n ∈ Z+ , a raiz n-ésima de α, que designamos por n
α
1
ou por α é o número real não negativo cuja n-ésima potência é igual a α. Quando n = 2
n
√ √
escrevemos α no lugar de 2 α.
Se α ∈ R, α < 0 e n ∈ Z+ é ı́mpar, podemos definir a raiz n-ésima de α como sendo o
número real negativo cuja n-ésima potência é igual a α.
√ √
3
Por exemplo, temos 4 = 2, −8 = −2, mas não tem sentido se perguntar sobre o valor de
√
−4, pois a raiz quadrada está definida apenas para números reais não negativos.
√
Também é falso que 4 = −2 pois, por definição, a raiz quadrada é um número real não
negativo.
√
Um acidente freqüente entre os iniciantes é escrever igualdades do tipo 4 = ±2. Uma tal
√
expressão implica o absurdo 2 = 4 = −2.
Até o presente momento, não estamos com ferramenta suficiente para provar que as raı́zes
n-ésimas definidas acima existem. Nós admitiremos este fato sem mais considerações. No
caso das raı́zes quadradas (e em geral das raı́zes n-ésimas, para n potência de 2) existe um
procedimento geométrico simples que permite representar tais quantidades na reta orientada.
O caso das raı́zes quadradas dos inteiros naturais é tratado abaixo, o caso geral na próxima
seção.
√
Definição. Sejam α ∈ R e n ∈ Z tais que a raiz n-ésima n
α está definida. Para m ∈ Z
escrevemos
m
1
m √
n
m
α n = α n = α .
Com esta noção e a definição das operações em Q, podemos verificar sem dificuldade que
as propriedades das potências inteiras de números reais descritas acima, são ainda válidas
quando consideramos potências cujos expoentes são números racionais. Além disso, podemos
verificar que 1 m
m 1
α n = αn = (αm ) n .
Exemplos.
(a) 1r = 1, para todo r ∈ Q.
(b) 0s = 0, para todo s ∈ Q, s > 0.
r mr
(c) mn
= nr , desde que as potências mr e nr estejam bem definidas, aqui r ∈ Q.
2 1
(d) 8 3 = (8 3 )2 = 22 = 4.
4 1 1
(e) 27− 3 = (27 3 )−4 = 3−4 = .
81
54
1 1 1 1 1
(f) = 5 = 1 = 1 =
√ .
2 24 (25 ) 4 21+ 4 2· 42
(g) (Importante) Sejam α ∈ R+ e r ∈ Q tais que ar = 1, então α = 1 ou r = 0.
Com efeito, se r = 0 então, por definição αr = α0 = 1.
Suponhamos então, que r 6= 0 e provemos que α = 1.
p
Se escrevemos r = , com p, q ∈ Z∗ e q > 0, então:
q
p 1
1
q
αr = 1 ⇐⇒ α q = 1 ⇐⇒ (αp ) q = 1 ⇐⇒ (αp ) q = 1q = 1
1 1
⇐⇒ (αp ) = 1 ⇐⇒ (αp ) p = 1 p ⇐⇒ α = 1 .
Voltamos ao nosso estudo sobre as expansões decimais que definem números irracionais.
Construir exemplos de expansões decimais de números irracionais é relativamente simples.
Segue diretamente da definição que, os números a, b, c ∈ R abaixo são irracionais:
c = 0, 0123456789101112131415161718192021 . . . 578579580581 . . .
Mas por outro lado, existem exemplos menos evidentes de números irracionais nos quais a lei
de formação que os define não é tão evidente como nos exemplos acima.
Os números reais
π = 3, 141592653589793238462643383279502884197169399375105820974944 . . .
d = 1, 4142135623730950488016887242096980785696718753769480731766797 . . .
são irracionais, mas isto não é claro a partir das poucas casas decimais que escrevemos acima,
de fato, nada garante que estas expansões terminem na milionésima casa decimal...
O número d é o comprimento da diagonal de um quadrado de lado 1 e o número π é o
comprimento de um semicı́rculo de raio 1 (ver figuras abaixo). Nestas notas não vamos provar
que π é irracional, tal prova requere ferramentas que não serão desenvolvidas aqui.
Por outro lado, a prova de que o número d é irracional, utiliza apenas a teoria básica de
divisibilidade estudada no capı́tulo 2. Tal prova será feita mais tarde, ainda nesta seção, e
outras similares envolvendo a mesma técnica serão colocadas como exercı́cio para o leitor.
representa o número π.
Fig. 7. As hipotenusas dos triângulos representam
igual a 1, isto é, das raı́zes quadradas dos números naturais não nulos. Devemos prestar bem
atenção, pois muitas destas quantidades já são conhecidas, por exemplo, 2 tem por quadrado
o 4, 3 tem por quadrado 9, 4 tem por quadrado 16, etc., ou seja que, as raı́zes quadradas de 4,
9, 16, etc., são respectivamente 2, 3, 4, etc. Mais adiante veremos que a raiz quadrada de um
número natural tem duas possibilidades: ou é um número natural ou é um número irracional.
Na figura acima à direita estamos desentortando um semi-cı́rculo de raio 1 sobre a reta ori-
entada, dando lugar a um segmento cuja magnitude (ou tamanho) é exatamente o comprimento
do semi-cı́rculo, tal comprimento é designado pela letra grega π (chamada pi).
Uma outra maneira de abordar os números irracionais pode ser feita trabalhando a antiga
noção grega de comensurabilidade. Os antigos gregos associavam quantidades abstratas (ou
magnitudes) ao tamanho de segmentos de reta para medir comprimentos. Uma vez feito isto,
duas magnitudes α e β podiam ser somadas colocando na mesma reta uma após a outra como
na figura abaixo.
Duas magnitudes α e β são ditas comensuráveis, quando existir uma terceira magnitude
γ contida um número natural exato de vezes em α e um número exato de vezes em β. Caso
contrário as magnitudes são chamadas incomensuráveis.
Uma magnitude α é dita simplesmente comensurável, quando é comensurável com a mag-
nitude unidade. Caso contrario, a magnitude é denominada incomensurável.
Mais exatamente, duas magnitudes α e β são denominadas comensuráveis, se existem uma
magnitude γ e naturais n, m ∈ N tais que
α=m·γ e β = n · γ,
α β
isto é γ = = , ou seja que
m n
α m
= ∈ Q,
β n
por isto, magnitudes comensuráveis são também denominadas racionalmente dependentes ou
racionalmente proporcionais.
α
Temos que prestar atenção no lado esquerdo da expressão acima: O que significa ? Bom
β
na verdade esta linha deve-ser lida como segue:
Proposição 3.6.1. Uma magnitude α é comensurável se, e somente se, é um número racional.
A proposição acima nos diz também que uma quantidade é incomensurável se, e somente
se, é um número irracional.
Uma das primeiras descobertas importantes dos gregos foi que, num quadrado, o compri-
mento da diagonal e o comprimento do lado são magnitudes incomensuráveis.
Aproveitamos também para relembrar o Teorema de Pitágoras e uma de suas tantas e belas
provas.
a2 + b2 = c2 .
A altura CH divide o triângulo ABC em dois sub-triângulos ACH e CBH sendo os três seme-
m a n b
lhantes. Destas semelhanças obtemos = e =
a c b c
J. Delgado - S. Firmo - P. Nóbrega 105 Instituto de Matemática - UFF
Os Racionais e os Irracionais 3.6 Os Números Irracionais e os Números Reais
a2 b2
Logo m = e n= .
c c
Como também c = m + n obtemos,
2 2
a2 b2 a2
2 2 2 2
c = (m + n) = m + 2mn + n = +2
c c c
a4 a2 b2 b4 1 1 2
+ 2 = 2 a4 + 2a2 b2 + b4 = 2 a2 + b2 ,
= 2 +2
c c c c c c
donde, c4 = (a2 + b2 )2 e, conseqüentemente, c2 = a2 + b2 , provando o teorema. C.Q.D.
Teorema 3.6.3. Num quadrado qualquer, a diagonal e o lado são magnitudes incomensuráveis.
√
O argumento que usaremos a continuação para provar a irracionalidade de 2 pode ser rea-
√
proveitado para provar que, se p é um inteiro primo, então p é um número irracional. Também,
como veremos a continuação, existem muitos outros naturais que, embora não sejam primos,
tem suas raı́zes quadradas irracionais.
√
Proposição 3.6.4. O número 2 é irracional.
√
Demonstração. Procedendo pelo absurdo, suponhamos que 2 é um número racional. Pode-
√ m
mos expressar 2 como uma fração irredutı́vel ∈ Q, isto é, os inteiros m, n ∈ Z+ são primos
n
entre si.
Então,
√ m √ 2 m 2 p2
2= =⇒ 2 = =⇒ 2 = 2 =⇒ p2 = 2 q2 ,
n n q
isto é, p2 é um inteiro par.
Segundo o capı́tulo 2, se p2 é par então p é par. Logo existe um inteiro k ∈ Z+ tal que
p = 2 k e portanto
2 q2 = p2 = (2 k)2 = 4 k2 =⇒ q2 = 2 k2 ,
isto é, q2 é também um inteiro par, e portanto q é também par, o qual é uma contradição, pois
sendo p e q ambos pares, terão 2 como fator comum e portanto não podem ser primos entre
si. C.Q.D.
Exemplos.
√
(A) O número real 6 é irracional.
Prova. Seguindo o método usado na prova da proposição acima, vamos supor pelo absurdo,
√ m
que 6 = é racional, onde m, n ∈ Z+ são inteiros primos entre si.
n
Então
√ m m 2 m2
6= =⇒ 6 = = 2 =⇒ m2 = 6 n2 = 2(3 n2 ),
n n n
2
isto é, m é par e portanto m é par.
Escrevendo m = 2 k temos
donde 3 n2 é par. Isto significa que 2 aparece na decomposição em fatores primos do inteiro
3 n2 . Logo n2 é par e conseqüentemente, n é par.
Sendo então m e n ambos pares contrariamos a hipótese de que m e n são primos entre
si, provando assim o resultado. C.Q.D.
√ √
(B) O número real 2+ 3 é irracional.
√ √
Prova. Procedendo de novo pelo absurdo, suponhamos que α = 2 + 3 ∈ Q. Temos
√ √ 2 √ √ √ √ √ √
α2 = 2 + 3 = ( 2)2 + 2 2 3 + ( 3)2 = 2 + 2 6 + 3 = 5 + 2 6 .
Portanto
α2 − 5 √
. 6=
2
α2 − 5 √
Ao supor α ∈ Q, obtemos ∈ Q, isto é, 6 ∈ Q, contradizendo o resultado do exemplo
√ √ 2
anterior. Portanto 2 + 3 é irracional. C.Q.D.
A reta orientada representando o conjunto R dos números reais é chamada reta real.
Sabemos que todo número real pode (por definição) ser representado por uma expansão
decimal infinita (periódica apenas quando o número é racional), dada uma expansão decimal
α = k, b1 b2 b3 . . ., onde k ∈ N e bi ∈ {0, 1, 2, . . . 9}, vemos que:
No segmento da reta orientada limitado pelos inteiros k e k + 1, as quantidades racionais da
n
forma k + , com n ∈ N e 0 ≤ n ≤ 10 representam todos os pontos do segmento que o dividem
10
exatamente em 10 partes iguais.
Como 0 ≤ b1 ≤ 9, uma das 10 partes iguais é o segmento compreendido entre os pontos
b1 b1 + 1
que representam os racionais k + = k, b1 e k + = k, (b1 + 1). Aqui entendemos sem
10 10
maior explicação que, se b1 = 9 então, a expressão k, (b1 + 1) na verdade significa k + 1, pois
9 1 10
k, (b1 + 1) = k, b1 + 0, 1 = k, 9 + 0, 1 = k + + =k+ = k + 1.
10 10 10
Sendo que
b1 b1 + 1
k+ ≤α<k+ ,
10 10
vemos que α é um ponto do segmento limitado pelos pontos que representam os racionais
b1 b1 + 1
k+ = k, b1 e k + = k, (b1 + 1).
10 10
b1 b1 + 1
racionais k + e k+ em 10 partes iguais mediante os pontos que representam os
10 10
b1 n
racionais k + + 2 , onde n ∈ {0, 1, 2, . . . , 9}. Como o feito acima, a desigualdade
10 10
b1 b2 b1 b2 + 1
k+ + 2 ≤α<k+ + ,
10 10 10 102
diz que α está no sub-sub-segmento limitado pelos pontos que representam os racionais
b1 b2 b1 b2 + 1
k+ + 2 e k+ + .
10 10 10 102
Com este procedimento podemos representar na reta real qualquer expansão decimal com
tantas casas decimais exatas como a nossa visão permitir.
[α, β] = {x ∈ R ; α ≤ x ≤ β} .
Note que todo intervalo (dos tipos acima descritos) pode se obter a partir de intervalos da
forma (α, +∞) e (−∞, α) fazendo operações de conjuntos.
Com efeito, se α, β ∈ R e α ≤ β, então
Logo
(α, β) = (α, +∞) ∩ (−∞, β) , [α, β] = (−∞, β] ∩ [α, +∞) ,
Observamos também que, (−∞, α] ∩ [α, +∞) = {α} e que (−∞, α) ∩ (α, +∞) = ∅. As vezes é
importante levar em conta que o conjunto R dos números reais é de fato um intervalo infinito:
R = (−∞, +∞).
Na reta real podemos representar os intervalos especificando os extremos e a parte da reta
determinada entre eles.
Fig. 15. Intervalos aberto (α, β), fechado [α, β] e semi-aberto [α, β) .
Fig. 16. Intervalos semi-aberto (α, β], infinito (α, +∞) e infinito (−∞, β) .
Com as propriedades básicas das operações, da relação de ordem, das potências e a termi-
nologia estabelecida acima, podemos abordar vários problemas ditos lineares, e que envolvem
a determinação de variáveis, como os que apresentamos a continuação.
Exemplos
(A) Determinar o conjunto dos números reais x tais que 4 − x < 4 − 2x.
portanto
{x ∈ R ; 4 − x < 4 − 2x} = (−∞, 0) .
2x − 1
(B) Determinar o conjunto dos números reais x tais que < 5.
3
Solução. Temos que
2x − 1
< 5 ⇐⇒ 2x − 1 < 15 ⇐⇒ 2x < 16 ⇐⇒ x < 8 ⇐⇒ x ∈ (−∞, 8) ,
3
portanto
2x − 1
x ∈ R; < 5 = (−∞, 8) .
3
x+1 x−3
(C) Determinar o conjunto dos números x ∈ R que verificam − ≥ 0.
2 5
Solução. Temos que
x+1 x−3 x+1 x−3
− ≥ 0 ⇐⇒ ≥ ⇐⇒ 5(x + 1) ≥ 2(x − 3) ⇐⇒ 5x + 5 ≥ 2x − 6
2 5 2 5
11 11
⇐⇒ 3x ≥ −11 ⇐⇒ x ≥ − ⇐⇒ x ∈ − , +∞ ,
3 3
portanto
x+1 x−3 11
x ∈ R; − ≥ 0 = − , +∞ .
2 5 3
e, portanto,
7 10
{x ∈ R ; −7 + x < 3 − 2x ≤ 10} = − , .
2 3
x−1 x−3
(E) Resolver para x ∈ R a inequação > .
x−2 x−4
Solução. Observamos que a inequação tem sentido desde que os denominadores que nela
aparecem, sejam não nulos. Isto é, x − 2 6= 0 e x − 4 6= 0, ou seja x 6= 2 e x 6= 4. Portanto, se
a inequação tem soluções, estas terão que pertencer ao conjunto R − {2, 4} = (−∞, 2) ∪ (2, 4) ∪
(4, +∞). Temos portanto 3 casos por estudar:
Caso I. x ∈ (−∞, 2) .
isto é, o conjunto dos números x ∈ (−∞, 2) que verificam a inequação, é igual ao conjunto dos
números x ∈ (−∞, 2) que verificam a inequação 4 > 6. Portanto
x−1 x−3
x ∈ (−∞, 2) ; > = ∅.
x−2 x−4
isto é, o conjunto dos números x ∈ (2, 4) que verificam a inequação, é igual ao conjunto dos
números x ∈ (2, 4) que verificam a inequação 4 < 6. Portanto
x−1 x−3
x ∈ (2, 4) ; > = (2, 4) .
x−2 x−4
Demonstração. O item (a) segue diretamente da definição. Para provar o item (b) tem que ser
considerados vários casos segundo sejam os sinais de α e β, ficando como exercı́cio.
Para provar a desigualdade triangular temos que saber duas coisas:
(i) Para todo α ∈ R vale |α|2 = α2 = |α2 |.
(ii) Para todo α ∈ R vale α ≤ |α.
O item (i) resulta do fato de que o quadrado de qualquer número real é sempre não negativo.
O item (ii) resulta da definição do módulo (escreva os detalhes como exercı́cio!).
Lembramos também que, a desigualdade 0 ≤ x ≤ y é equivalente a 0 ≤ x2 ≤ y2 . Portanto
basta provar a desigualdade triangular nos quadrados. Isto é, provar a desigualdade triangular
equivale a provar a desigualdade
Observação.
(a) O significado da desigualdade |α| ≤ β (respectivamente |α| < β).
Note que α ≤ |α|, portanto α ≤ β. Também −α ≤ |α| e portanto −α ≤ β, isto é, α ≥ −β.
Resumindo,
|α| ≤ β ⇐⇒ −β ≤ α ≤ β.
e similarmente
|α| < β ⇐⇒ α ∈ (−β, β).
|α| ≥ β ⇐⇒ ( α ≥ β ou α ≤ β ).
similarmente
|α| > β ⇐⇒ α ∈ (−∞, −β) ∪ (β, +∞).
e similarmente
A noção intuitiva de que a segmentos de reta são associados números reais não negativos
para a medição dos seus comprimentos, é formalizada na seguinte definição:
Observação.
(a) As propriedades básicas do módulo em R implicam que a distância introduzida na
definição acima verifica:
(i) |α − β| ≥ 0 e ainda |α − β| = 0 ⇐⇒ α = β.
Isto é, a distância entre dois números reais α e β é sempre um número real não negativo,
sendo nulo apenas no caso em que os números α e β coincidem.
(ii) |α − β| = |β − α|.
Isto é, a distância possui uma qualidade de simetria, ou seja que é indiferente determinar a
distância de α a β ou a distância de β a α que o resultado será o mesmo.
(iii) |α − γ| ≤ |α − β| + |β − γ|.
Esta qualidade é uma tradução da desigualdade triangular, que diz que a distância medida
de α a γ nunca é maior do que a soma da distâncias medidas de α até outro número β e deste
último até γ.
Mais ainda, a igualdade em (iii) se verifica se, e somente se, β está no intervalo de extremi-
dades α e β (prove isto como exercı́cio!), isto é
|α − γ| = |α − β| + |β − γ| ⇐⇒ ( α ≤ β ≤ γ ou γ ≤ β ≤ α ) .
(c) Uma expressão da forma |α−β| ≤ γ significa que os números α e β estão a uma distância
de no máximo γ. Esta interpretação permite expressar de maneira exata o que significa que um
número racional seja uma aproximação de um número real:
Exemplos.
(A) Dado um número real ε > 0 e um número real qualquer α, existem números β ∈ Q e
γ ∈ R − Q distintos de α e ε-próximos de α.
Isto é:
Todo número real pode ser ε-aproximado por racionais e irracionais qualquer que seja ε > 0
Prova. Dado o número real ε > 0 existe, pela propriedade arquimediana, um número natural
n ∈ N tal que n · ε > 1. Seja m ∈ N tal que 10m > n (o número m existe porque sabemos que
10k tende a +∞ quando k tende a +∞). Então, 10m · ε > 1, ou equivalentemente
1
ε> .
10m
Portanto, dado α ∈ R, basta achar um racional β ∈ Q e um irracional γ ∈ R − Q, que estejam
1
-próximos de α.
10m
Suponhamos que a expansão decimal de α é α = a0 , a1 a2 a3 . . . ap . . . , onde a0 ∈ N é a
parte inteira de α e a1 , a2 , . . . , ap , . . . ∈ {0, 1, 2, . . . , 9} são os dı́gitos da parte decimal de α.
Então, o número racional β = a0 , a1 a2 a3 . . . am aproxima α com erro menor que ε, pois
|α − β| = |a0 , a1 a2 a3 . . . am am+1 . . . − a0 , a1 a2 a3 . . . am |
= |0, |0 0 .{z
. . 0 0} am+1 am+2 . . . | ≤ |0,0| 0 .{z
. . 0 0}1|
m-zeros (m − 1)-zeros
1
= 0,0| 0 .{z
. . 0 0}1 = m < ε .
10
(m − 1)-zeros
(ou seja que, se p = m+1, então am+1 é o seguinte dı́gito não nulo após o dı́gito am na expansão
de α.)
Afirmamos que, o número irracional
obtido a partir de α trocando o dı́gito ap por 0, aproxima α com erro menor que ε.
De fato,
. . 0 0} 10| 0 .{z
α = 0, 1010010001000010 . . . 1 0| 0 .{z . . 0 0}100 . . .
k-zeros (k + 1)-zeros
Solução: Temos que ε > 10−7 . Segundo o exemplo acima, uma, podemos definir os número
procurados β e γ como:
β = 0, 1010010 = 0, 101001
e
γ = 0, 1010010000000010 . . . 1 0| 0 .{z
. . 0 0} 1 |0 0 .{z
. . 0 0} 100 . . .
k-zeros (k + 1)-zeros
Isto é, β é obtido truncando a expansão decimal de α na sexta casa decimal, e γ é obtido
trocando o 1 da décima casa decimal de α (primeira não nula após a sétima) por 0. C.Q.D.
Existem infinidade de maneiras de responder a questão anterior, a solução que apresenta-
mos aqui é uma interpretação do exemplo (A) acima.
O nosso procedimento nos leva claramente a obter os números β e γ menores que α, mas
também podemos ε-aproximar α por números racionais e irracionais maiores que α. Faça isto
como exercı́cio.
Solução: A desigualdade se traduz dizendo que desejamos encontrar os números x cuja distância
a −4 é menor que 2. Na reta orientada o problema está resolvido! como podemos ver na figura
abaixo.
Portanto o conjunto dos números reais que verifica a desigualdade em questão é o intervalo
(−6, −2). C.Q.D.
|x − 1| + |x + 1| < 4.
Solução: Trata-se dos números x ∈ R tais que a soma das suas distâncias a −1 e a 1 é menor
que 4.
A desigualdade equivale a |x − 1| < 4 − |x + 1|, que por sua vez equivale a
isto é
|x + 1| < x + 3 e |x + 1| < 5 − x,
ou seja,
−x − 3 < x + 1 < x + 3 e − 5 + x < x + 1 < 5 − x,
isto é, a
−4 < 2x e 1<3 e −6<0 e 2x < 4,
A primeira desigualdade equivale a dizer que x ∈ (−2, +∞) e a segunda equivale a dizer que
x ∈ (−∞, 2). Logo o par equivale a dizer que x ∈ (−2, +∞) ∩ (−∞, 2), isto é x ∈ (−2, 2)
Portanto, podemos escrever
{x ∈ R ; |x − 1| + |x + 1| < 4} = (−2, 2)
|x − 1| · |x + 2| = 0 .
Solução: Sendo que o produto de dois números reais é igual a zero apenas quando um dos
fatores é zero, temos
|x − 1| · |x + 2| = 0 ⇐⇒ ( |x − 1| = 0 ou |x + 2| = 0 )
⇐⇒ ( x − 1 = 0 ou x + 2 = 0 )
⇐⇒ ( x = 1 ou x = −2 )
⇐⇒ x ∈ { 1, −2 .}
|x − 1| > 0 .
Solução: Exemplos deste tipo de desigualdades são fonte importante de erros entre os inician-
tes. Tais erros vem de implicações incorretas da forma
3.9 Limites e a PG
Nesta seção vamos concluir as nossas primeiras noções sobre limites de sucessões iniciado
no capı́tulo 2. O material apresentado aqui é de natureza meramente introdutória (mas nem por
isso menos formal) procurando ser o mais breve possı́vel para não prolongar demais estas
notas. Deixamos de lado outros aspectos relevantes sobre o assunto para serem explicados
num bom curso sobre análise real. Se o leitor tiver muita pressa em aprofundar no assunto,
ou o bom curso sobre análise não chegar, pode ir consultando por exemplo o livro de E. Lima:
Curso de Análise (Vol. I), Projeto Euclides, IMPA, ou o livro de M. Spivak: Calculus, Vol. II. Ed.
Reverté.
No capı́tulo 2 foram consideradas sucessões como por exemplo {2n }n e {5n}n , que tendem
para infinito quando n tende a infinito. Trabalhando com números reais, podemos falar de ex-
pressões que tendem, por exemplo, para zero quando n tende a infinito. Ao representar o
1
conjunto dos números racionais na reta orientada vimos que os números racionais da forma ,
n
n ∈ Z∗ são tais que
−1 < − 12 < − 31 < . . . < − n1 < − n+1
1
< ... < 0 < ... < 1
n+1
< 1
n
< ... < 1
3
< 1
2
< 1,
1 1
dando a idéia intuitiva de que, para aproximar (respectivamente − ) de zero, basta fazer n
n n
grande. Com estas idéias como motivação, colocamos a seguinte definição preliminar:
Vale a pena observar que, se sabemos a priori que αn ≥ 0 para todo n ∈ N, então
1
lim αn = 0 ⇐⇒ dado k ∈ N∗ existe n0 ∈ N∗ tal que, se n ≥ n0 , então 0 ≤ αn ≤ .
n→∞ n
e similarmente, se sabemos a priori que αn ≤ 0 para todo n ∈ N, então
1
lim αn = 0 ⇐⇒ dado k ∈ N∗ existe n0 ∈ N∗ tal que, se n ≥ n0 , então −
≤ αn ≤ 0 .
n→∞ n
Partindo da nossa definição preliminar e segundo a nossa intuição, podemos acreditar pia-
mente no seguinte resultado:
Proposição 3.9.1. Seja αn ∈ R uma expressão que depende de n ∈ N. Se αn > 0 para todo
n ∈ N, então vale que
1
lim αn = +∞ ⇐⇒ lim = 0,
n→∞ n→∞ αn
Demonstração.
(=⇒) Suponhamos que lim αn = +∞. Dado k ∈ N∗ , devemos provar que existe n0 ∈ N∗ tal
n→∞
1 1
que, se n ≥ n0 , então 0 < ≤ .
αn k
A hipótese implica que, para o inteiro k ∈ N∗ dado, existe n0 ∈ N∗ tal que, se n ≥ n0 , então
αn ≥ k.
1 1 1 1
Mas αn ≥ k equivale a ≤ . Pelo anterior temos que, 0 < ≤ , para todo n ≥ n0 .
αn k αn k
1
Isto prova que lim = 0.
n→∞ αn
1
(⇐=) Suponhamos agora que lim = 0.
n→∞ αn
Da nossa definição preliminar acima podemos intuir também, que a noção de limite deve in-
teragir fortemente com a noção de aproximação. Isto é confirmado na nossa definição definitiva:
1 1
Demonstração. Começamos por observar que, a desigualdade − ≤ αn ≤ na condição (i),
k k
1
equivale à desigualdade |αn | ≤ . Portanto, para provar que (ii)=⇒(i), dado k ∈ N∗ , basta aplicar
k
1
(ii) (que vale por hipótese) com ε = .
k
1
Para provar que (i)=⇒(ii), basta provar que, dado ε ∈ R, ε > 0, existe k ∈ N∗ tal que ≤ ε.
k
Uma vez feito isto, tomamos o mesmo n0 obtido em (i) para o k obtido. Tal n0 serve para
confirmar (ii) (verifique isto!).
Dado ε > 0, pela propriedade arquimediana de R (aplicada a ε e 1), existe k ∈ N∗ tal que
1
k · ε ≥ 1. Ou seja ≤ ε, como querı́amos. C.Q.D.
k
Um outro fato importante que devemos observar, e que segue diretamente das definições
acima, é que a noção da convergência de uma sucessão {αn } à L, pode ser traduzida na noção
da convergência da sucessão βn = αn − L a zero. Isto é,
lim αn = L ⇐⇒ lim ( αn − L ) = 0
n→∞ n→∞
Intuitivamente: Dizer que lim αn = L, significa que, para qualquer ε > 0, podemos achar
n→∞
n0 ∈ N (que depende de ε e da sucessão) tal que, se jogarmos fora os primeiros n0 termos
da sucessão α0 , α1 , α2 , . . . , αn0 −1 , todos os restantes αn0 , αn0 +1 , αn0 +2 , . . . estarão contidos no
intervalo [L − ε, L + ε] de centro L e raio ε. Neste sentido entendemos que, dado ε > 0, todos,
salvo um número finito (n0 que depende de ε e de (αn )n ), os termos αn estão ε -próximos de L.
Similarmente, dizer que lim αn 6= L, significa que, para algum ε > 0, uma infinidade dos
n→∞
termos αn estão fora do intervalo [L − ε, L + ε].
Observamos que, assim como existem sucessões que convergem a um limite, existem
também sucessões que não convergem. A sucessão cujos termos são os números n1 , n ∈ N∗ ,
é o exemplo fundamental de uma sucessão que converge a 0 e a sucessão (−1)n , n ∈ N∗ é o
exemplo fundamental de uma sucessão que não converge, pois infinitos de seus termos tomam
o valor 1 (quando n é par) e infinitos tomam o valor −1 (quando n é ı́mpar), portanto não pode
acontecer que todos salvo um número finito dos termos fiquem perto de um número só.
Por outro lado, dada uma sucessão (αn )n , é intuitivamente claro que não é possı́vel que
todos, salvo um número finito, os termos αn , fiquem próximos de dois números distintos, isto é:
Proposição 3.9.3. (Unicidade dos Limites) Seja (αn )n uma sucessão de números reais. Se
L, M ∈ R são tais que
lim αn = L e lim αn = M,
n→∞ n→∞
então L = M.
Demonstração. Suponhamos que L 6= M. Seja ε ∈ R tal que 0 < ε < 12 |L − M|, temos que:
(i) existe n1 ∈ N tal que, n ≥ n1 =⇒ |αn − L| ≤ ε
2
ε ε
|L − M| = |L − αn + αn − M| = |(L − αn ) + (αn − M)| ≤ |L − αn | + |αn − M| ≤ + = ε,
2 2
isto é
1
0 ≤ |L − M| ≤ ε < |L − M|,
2
o qual é absurdo (nenhum número não negativo é estritamente menor do que sua metade).
Portanto, necessariamente L = M. C.Q.D.
Outro fato relevante sobre as sucessões que tem limite é que, todos os seus termos podem
ser encaixados dentro de um intervalo suficientemente grande, isto é
Proposição 3.9.4. Seja (αn )n uma sucessão de números reais que converge a um número real
L quando n tende a ∞. Então, existem a, b ∈ R, a < b, tais que αn ∈ [a, b] para todo n ∈ N.
Fig. 23. Toda sucessão que tem limite está contida num intervalo.
ou equivalentemente
Fig. 24. Toda sucessão que tem limite é limitada em módulo por uma constante.
Nas figuras acima, os termos da sucessão são representados por pontos na reta real.
Prova.
(A) Seja ε > 0 dado. Temos que (aplicando a definição de limite com ε/2)
ε
lim αn = L =⇒ ∃ n0 ∈ N, tal que n ≥ n0 =⇒ |αn − L| ≤ ,
n→∞ 2
e similarmente
ε
lim βn = M =⇒ ∃ m0 ∈ N, tal que n ≥ m0 =⇒ |βn − M| ≤ .
n→∞ 2
n ≥ k0 =⇒ |(αn + βn ) − (L + M)| ≤ ε,
(B) Seja ε > 0. Temos que provar que, existe n0 ∈ N tal que,
n ≥ n0 =⇒ |αn βn − LM| ≤ ε.
Para provar esta propriedade usaremos uma das formas equivalentes da proposição ante-
rior:
lim αn = L =⇒ ∃ R > 0 tal que |αn | ≤ R.
n→∞
Portanto, basta fazer cada uma das parcelas do último lado direito da desigualdade acima menor
ε
ou igual do que .
2
Como lim αn = L temos que:
n→∞
ε ε
Dado , existe n1 ∈ N tal que, n ≥ n1 =⇒ |αn − L| ≤ ,
2|M| 2|M|
e como lim βn = M :
n→∞
ε ε
Dado , existe n2 ∈ N tal que, n ≥ n2 =⇒ |βn − M| ≤ .
2R 2R
Seja ε > 0 dado. O problema de provar (*) consiste em determinar que tão grande deve ser
n ∈ N para que o número
M − βn |M − βn |
1 1
βn − M = βn M = |M| · |βn | (∗∗)
|M| − |βn | ≤ |M − βn | ,
e portanto
|M| |M| 1 2
n ≥ n1 =⇒ |M| − |βn | ≤ =⇒ ≤ |βn | =⇒ ≤ .
2 2 |M| · |βn | |M|2
αn ≤ γn ≤ βn ∀ n ∈ N =⇒ L ≤ lim γn ≤ L.
n→∞
Observação.
(a) Um ponto importante a ser observado é o seguinte: A definição de lim αn = L equivale
n→∞
à seguinte:
∀ ε > 0 , ∃ n0 ∈ N tal que, n ≥ n0 =⇒ |αn − L| < ε. (∗)
A diferença entre esta e a definição anterior está na desigualdade < colocada ao invés da
original ≤.
Note-se que a condição (∗) claramente implica a condição inicial (lembre que a < b =⇒
a ≤ b). Por outro lado, dada a condição da definição original, e dado ε > 0 arbitrário temos,
ε
aplicando a definição original com ao invés de ε:
2
ε
∃ n0 ∈ N tal que n ≥ n0 =⇒ |αn − L| ≤ < ε,
2
implicando (∗). Com isto provamos a equivalência.
(b) Segundo o item acima, podemos complementar alguns aspectos básicos da seguinte
maneira (a comprovação destes fatos é deixada como exercı́cio para o leitor):
Sejam (αn )n e (βn )n são sucessões de números reais tais que
lim αn = L , lim βn = M .
n→∞ n→∞
• Se αn < βn para todo n ∈ N , então L ≤ M (note-se que a conclusão não é L ≤ M, pode dar
um exemplo?).
• Se L > 0, então existe n0 ∈ N, tal que n ≥ n0 =⇒ αn > 0 .
• Se L < M, então existe n0 ∈ N, tal que n ≥ n0 =⇒ αn < βn .
(c) Nos itens (C), (E), (F), (G) da lista de propriedades básicas, a sentença “para todo n ∈ N”
pode ser substituı́da por “para todo n ∈ N salvo para um número finito” ou por “para todo n ∈ N
maior ou igual que algum n0 ∈ N. O leitor é convidado a re-enunciar tais propriedades e refletir
sobre o seu significado.
Esta observação pode-se traduzir dizendo que, para efeito do análise do limite de uma su-
cessão (αn )n , basta prestar atenção no comportamento de αn com n ∈ N “suficientemente
grande”. Ou que, o comportamento de um número finito dos termos da sucessão não interfere
na análise ou determinação do limite. Por tal motivo é indiferente começar uma sucessão com
o termo α0 ou α1 .
Exemplos.
(1) Todo número real é o limite de uma sucessão de números racionais distintos.
Seja α ∈ R um número real.
Se α = 0 consideramos por exemplo a sucessão (αn )n onde αn = 10−n para todo n ∈ N.
Observamos que os termos da sucessão são todos distintos.
1
Sabemos já que 10n −→ +∞ quando n −→ ∞. Logo n = 10−n −→ 0 quando n −→ ∞.
10
Se α ∈ R − {0}, escrevemos a sua representação como expansão decimal infinita α =
N, a1 a2 a3 . . . ak . . ., onde N ∈ Z é a parte inteira e aj ∈ {0, 1, 2, . . . , 9} são os dı́gitos da expansão
decimal. Neste caso, consideramos a sucessão (αn )n , onde α0 = N e αn = N, a1 a2 . . . an , para
todo n ∈ N∗ . Isto é, αn é o truncamento da expansão decimal que define α até a n - ésima
casa decimal. Sendo que a expansão decimal de α é infinita, todos os termos αn da sucessão
considerada são todos distintos.
Afirmamos que lim αn = α.
n→∞
Com efeito, seja ε > 0 dado. Temos que achar n0 ∈ N tal que |α − αn | < ε para todo n ≥ n0 .
Começamos por observar que
|α − αn | = |N, a1 a2 a3 . . . an an+1 . . . − N, a1 a2 a3 . . . an |
= 0, |0 0 {z . . . 0}1 = 10−n .
. . . 0} an+1 an+2 . . . < 0,0| 0 {z
n - zeros (n − 1) - zeros
Como lim 10−n = 0, dado ε > 0, existe n0 ∈ N tal que n ≥ n0 =⇒ 10−n = |10−n | < ε.
n→∞
Portanto, se n ≥ n0 , temos
|α − αn | < 10−n < ε ,
• Todo intervalo aberto não vazio da reta real contem infinitos números racionais (escreva os
detalhes como exercı́cio).
• Todo número irracional pode ser aproximado com graus arbitrários de precisão por números
racionais. Na verdade isto é o que é feito nos computadores e maquinas de calcular como foi
explicado no inı́cio do capı́tulo.
(2) A partir das propriedades básicas dadas acima, podemos calcular o valor numérico do
limite de muitas sucessões simples:
1
(a) Se k ∈ Z+ é um inteiro dado, então lim = 0.
n→∞ nk
n+1
(b) lim = 1.
n→∞ n
n+1
n+1 1 + n1
n 1
Com efeito, temos que = n = 1 + . Logo
=
n 1n
n
n+1 1 1
lim = lim 1 + = lim 1 + lim = 1 + 0 = 1.
n→∞ n n→∞ n n→∞ n→∞ n
(c) O exemplo (b) acima pode ser considerado dentro de um contexto mais geral: Um po-
linômio ( com coeficientes reais) na variável x é uma expressão da forma
p(n)
= ak + soma de termos que tende a 0 quando n → ∞,
nk
e ao dividir o denominador por nk obtemos (verifique!):
q(n)
= soma de termos que tende a 0 quando n → ∞.
nk
p(n)
Portanto, (justifique) lim αn = lim pode ser +∞ ou −∞ dependendo do sinal de ak e de
n→∞ n→∞ q(n)
q(n)
para n grande.
nk
(ii) r = k = m. Neste caso, dividindo o numerador e o denominador por nk = nm obtemos:
p(n)
= ak + soma de termos que tende a 0 quando n → ∞,
nk
q(n)
= bk + soma de termos que tende a 0 quando n → ∞.
nk
p(n) ak
Portanto (verifique!): lim αn = lim = .
n→∞ n→∞ q(n) bk
(iii) r = m. Dividindo o numerador e o denominador por nm temos:
p(n)
= soma de termos que tende a 0 quando n → ∞,
nm
q(n)
= bk + soma de termos que tende a 0 quando n → ∞,
nm
p(n)
e portanto lim αn = lim = 0.
n→∞ n→∞ q(n)
6n2 + 2n − 5 3 4n 9n3 − 8n
lim 2
= , lim 2
= 0, lim = +∞,
n→∞ 8n − 7n + 99 4 n→∞ n + 1 n→∞ 1 + n − n2
Com efeito
6n2 +2n−5 2 5
6n2 + 2n − 5 n2
6+ n
− n2
• lim = lim 2 = lim 7 99
n→∞ 8n2 − 7n + 99 n→∞ 8n −7n+99 n→∞ 8 − +
n2 n n2
2 5
lim (6 + n
− n2
) 6 3
n→∞
= 7 99
= = .
lim (8 − n
+ n2
) 8 4
n→∞
4n 4n 4 lim 4 0
n2 n n→∞ n
• lim 2 = lim n2 +1
= lim 1
= 1
= = 0.
n→∞ n + 1 n→∞ n→∞ 1+ lim (1 + ) 1
n2 n2 n→∞ n2
9n3 −8n
9n3 − 8n n3
9− 8
n2
• lim = limn→∞ 1+n−n2
= limn→∞ 1
+ 12 − n
1
n→∞ 1 + n − n2 n3
n3 n
lim (9− n82 )
n→∞
= = −∞ .
lim ( 13 + n12 − n1 )
n→∞ n
Por quê a última sucessão tende a −∞ e não a +∞? Bom, o numerador na última passagem
tende a 9 e o sinal do denominador (que tende a 0 quando n → ∞) é exatamente o sinal de
1 + n − n2 para n ∈ N grande. Como 1 + n < n2 para n ∈ N grande, o sinal do denominador é
negativo. Isto é, o denominador à direita na última expressão, tende a 0 com valores menores
que 0.
Seja (rn )n uma sucessão de números racionais tal que lim rn = α . Então:
n→∞
„ «
lim rn
βα = β n→∞ = lim βrn .
n→∞
As potências de expoente real possuem propriedades similares às das potências de expo-
ente racional, propriedades que sintetizamos na lista a seguir:
Propriedades das potências de expoente real.
(a) x0 = 1, para todo x ∈ R∗ .
(b) 0α = 0, para todo α ∈ R+ .
(c) 1α = 1, para todo α ∈ R.
(d) Sejam x ∈ R+ e α ∈ R. Se xα = 1, então x = 1 ou α = 0.
(e) xα > 0, para todos x ∈ R+ e α ∈ R.
(f) Para todos x, y ∈ R+ e α, β ∈ R valem
Temos que
2−(x−1) > 1−(x−1) = 1 =⇒ 2−(x−1) · 2x−1 > 1 · 2x−1 (pois 2 > 0 =⇒ 2x−1 > 0)
=⇒ 1 > 2x−1 =⇒ 0 > 2x−1 − 1 .
Prova. A desigualdade 1 < αβ segue diretamente do item (c). Para provar a outra desigual-
1 1
dade, observamos que 0 < β < 1 ⇐⇒ 1 < . Pelo item (d) temos: α = (αβ ) β > αβ , como
β
querı́amos. C.Q.D.
(I) Caso r > 1: Neste caso, temos que mostrar que, dado R ∈ R+ , existe n0 ∈ N∗ tal que
n ≥ n0 =⇒ rn > R.
Começamos por observar que, como r > 1, se m > k então rm > rk . De fato multiplicando
a desigualdade r > 1 sucessivamente por r obtemos a cadeia:
Concluı́mos então, que é suficiente determinar n0 ∈ N∗ tal que, rn0 > R. Pois n ≥ n0 =⇒
rn ≥ rn0 .
Segundo a propriedade arquimediana, para R > 0 e h > 0 dados, existe n0 ∈ N∗ tal que
n0 h ≥ R. Para tal n0 temos rn0 ≥ 1 + n0 h > n0 h ≥ R, como querı́amos.
1
(II) Caso 0 < r < 1: Temos 0 < r < 1 ⇐⇒ 1 < . O caso (I) acima e a proposição 3.9.1
r
implicam: n
1 1
lim = lim = +∞ ⇐⇒ lim rn = 0,
n→∞ rn n→∞ r n→∞
como querı́amos.
e que o limite da sucessão rn não existe quando r ≤ −1. O leitor é convidado a refletir sobre os
casos quando r < 0.
Poderı́amos ocupar muito mais espaço nestas notas com muitos mais exemplos e considerações
sobre o assunto, mas não é o nosso objetivo invadir a abrangência de outros cursos (Cálculo
ou Análise), onde este tópico deve ser cuidadosamente estudado. Esperamos que o material
apresentado aqui sirva apenas como uma introdução à teoria dos limites, e que o leitor se sinta
motivado no seu aprofundamento.
A importância do último exemplo vem à tona quando calculamos a soma dos termos de uma
progressão geométrica:
1 + r + r2 + . . . + rn + . . . . (4)
S n = 1 + r + r2 + . . . + rn , n ∈ N,
r Sn = r(1 + r + r2 + . . . + rn−1 + rn )
= r + r2 + r3 + . . . + rn + rn+1
= (1 + r + r2 + r3 + . . . + rn ) − 1 + rn+1
= Sn − 1 + rn+1 .
1 − rn+1
Sn = .
1−r
Portanto:
1 − rn+1 1 − lim rn+1
2 n n→∞
1 + r + r + . . . + r + . . . = lim = .
n→∞ 1 − r 1−r
Finalmente
X
∞ 1 − lim rn+1
k 2 n n→∞
ar = a + ar + ar + . . . + ar + . . . = a , para r 6= 1.
k=0
1−r
Com isto, o cálculo da soma dos termos da PG (?) se reduz ao cálculo de lim rn+1 = lim rn ,
n→∞ n→∞
que já sabemos fazer segundo o último exemplo acima.
Resumindo:
a
se |r| < 1 e a ∈ R
1 − lim r n+1
1 − r
n→∞
=a = +∞
se r > 1 e a > 0
1−r
−∞
se r > 1 e a < 0
X∞
ark = +∞ se r = 1 e a > 0
k=0
= −∞ se r = 1 e a < 0
=0 se a = 0
6∃ se r ≤ −1 e a ∈ R∗ .
Portanto, o caso particular interessante ocorre quando a razão r da PG tem módulo menor que
1, pois nos outros casos a soma é +∞, ou −∞ ou simplesmente não existe.
Com uma série de exemplos a seguir, vamos ilustrar a importância do cálculo da soma dos
termos de uma progressão geométrica. Como o leitor perceberá, as situações onde o cálculo
da soma dos termos de uma PG é fundamental tem diversas origens.
Exemplos.
(A) Determinação de somas infinitas:
1 1 1 1
(a) Qual é o valor de S = 1 + + + + . . . + n + . . . ?
2 4 8 2
1 1 1
Trata-se de uma PG de razão e primeiro termo 1. Como 0 ≤ = < 1, temos:
2 2 2
1 1 1 1 1
S=1+ + + + ... + n + ... = = 2.
2 4 8 2 1
1−
2
1 1 1 (−1)n
(b) Qual é o valor de S = 1 − + − + ... + + ... ?
2 4 8 2n
1 1 1
Trata-se de uma PG de razão − e primeiro termo 1. Como 0 ≤ − = < 1, temos:
2 2 2
1 1 1 (−1)n 1 1 2
S=1− + − + ... + + ... = = = .
2 4 8 2n 1 1 3
1− − 1+
2 2
(c) Em geral: Quais são os números racionais que são a soma de uma PG infinita de primeiro
termo 1 ?
p p
Seja ∈ Q, onde p ∈ Z e q ∈ Z+ . Suponhamos que seja a soma dos termos de uma PG
q q
1 p
de primeiro termo 1. Se r ∈ R, a razão de uma tal PG, devemos ter |r| < 1 e = , para
1−r q
p
que a convergência da soma dos termos da PG seja ao racional .
q
q p−q p − q
< 1. A segunda condição equivale a |p − q| < |p| .
Isto é, r = 1 − = e
p p p
Resolvendo a desigualdade |p − q| < |p| em Z para as variáveis p, q ∈ Z, com a condição
q > 0, obtemos que, o conjunto dos números
racionais que são a soma dos termos de uma PG
1
cujo primeiro termo é 1 é Q ∩ , +∞ .
2
p−q
Neste caso, a razão da PG é r = .
p
p 2
Por exemplo, = 2 = é a soma dos termos de uma PG com primeiro termo 1 e razão
q 1
2−1 1
r= = (ver exemplo (a) acima).
2 2
O leitor é convidado a estudar o que acontece se retirarmos a condição q ∈ Z+ acima. Isto
é, exigir apenas q ∈ Z∗ . Uma vez feito isto, descubra, dentre os números racionais abaixo,
aqueles que são a soma dos termos de uma PG infinita de primeiro termo 1:
3 9 −15 −1
, , , 0, 4, .
4 6 11 2
(B) Sabemos que todo número racional pode ser representado por uma expansão decimal
periódica infinita. Afirmamos que, todo número racional α ∈ Q, pode ser representado mediante
1
uma PG de razão n , onde n é o perı́odo da expansão decimal de α.
10
Seja α ∈ Q, suponhamos que a expansão decimal de α é:
onde a0 ∈ Z é a parte inteira de r e ai ∈ {0, 1, 2, . . . , 9}, assumimos que não todos os números
ap+1 , . . . , ap+n (que formam a parte periódica da expansão de r) são simultaneamente iguais a
zero.
A expansão decimal de r se escreve mediante uma PG como segue:
a1 . . . ap ap+1 . . . ap+n 1 1 1
= a0 + + 1 + n + 2n + . . . + (k−1)n + . . .
10p 10p+n 10 10 10 !
2 (k−1)
a1 . . . ap ap+1 . . . ap+n 1 1 1
= a0 + + 1+ n + + ... + + ...
10p 10p+n 10 10n 10n
a1 . . . ap ap+1 . . . ap+n 1
= a0 + +
10p 10p+n 1
1− n
10
a1 . . . ap ap+1 . . . ap+n 10n
= a0 + +
10p 10p+n 10n − 1
a1 . . . ap ap+1 . . . ap+n 1
= a0 + + .
10p 10p n
10 − 1
3 3 3 3
(a) 0, 3 = + 2 + . . . + n + n+1 + . . .
10 10 10 10
3 1 1 1
= 1+ + . . . + n−1 + n + . . .
10 10 10 10
3 1 3 10 3 1
= = = = .
10 1 10 9 9 3
1−
10
(a) O lado de um triângulo equilátero T1 mede 3 unidades. Ao unir os pontos médios de seus la-
dos obtemos um novo triângulo equilátero T2 . Repetindo o processo com o segundo triângulo su-
cessivamente, obtemos uma figura composta por triângulos encaixados T1 , T2 , . . . , Tn , . . . como
se mostra abaixo.
Fig. 25.
3
Observamos que o perı́metro do triângulo T1 é 3 × 3, do triângulo T2 é 3 × , do triângulo T3 é
2
3 3
3 × 2 ,. . ., do triângulo Tn+1 é 3 × n , etc.
2 2
A soma dos perı́metros dos triângulos é
3 3 3 9 9 9
S=3×3+3× + 3 × 2 + ... + 3 × n + ... = 9 + + 2 + ... + n + ...
2 2 2 2 2 2
1
isto é, S é a soma dos termos de uma PG de razão (que tem módulo < 1) e primeiro termo 9.
2
1
Logo S = 9 = 9 × 2 = 18.
1
1−
2
(b) Um mosaico infinito é construı́do por estágios sucessivos da seguinte maneira:
1o Estágio: Se começa com um quadrado de lado unitário.
2o Estágio: Em cada um dos 4 vértices do quadrado acima são acrescentados
1
quadrados de lado .
2
o
3 Estágio: Em cada vértice que não é vértice de dois quadrados, é acrescentado
1
um quadrado de lado , . . . etc . . .
4
o
n Estágio: Em cada vértice que ficou livre no estágio (n − 1), é acrescentado
1
um quadrado de lado n−1 , . . . etc . . .
2
J. Delgado - S. Firmo - P. Nóbrega 140 Instituto de Matemática - UFF
Os Racionais e os Irracionais 3.9 Limites e a PG
Fig. 26.
1o estágio : 1
2
o 1
2 estágio : 4×
2
2
1
3o estágio : 4×3×
22
2
1
4o estágio : 4×3×3×
23
2
1
5o estágio : 4×3×3×3× . . . etc . . .
24
2
n−2 1
no estágio : 4×3 × . . . etc . . .
2n−1
3
Logo, a soma das áreas é calculada, mediante uma PG de razão e primeiro termo 1, da
4
seguinte maneira:
2 2 2 2
1 1 2 1 n−2 1
S = 1+4 +4·3 +4·3 + ... + 4 · 3 + ...
2 22 23 2n−1
2 2 2
4 1 4 2 1 4 3 1
= 1+1+ 2 ·3 + 2 ·3 2
+ 2 ·3 + ...
2 2 2 2 2 23
2
4 n−2 1
... + 2 · 3 + ...
2 2n−2
2 2 2 2
1 2 1 3 1 n−2 1
= 1+1+3 +3 +3 + ... + 3 + ...
2 22 23 2n−2
"
2 3 n−2 #
3 3 3 3
= 1+ 1+ + + + ... + + ...
22 22 22 22
" 2 3 n−2 #
3 3 3 3
= 1+ 1+ + + + ... + + ...
4 4 4 4
1
= 1+ = 5.
3
1−
4
Nos exercı́cios a seguir, o leitor terá oportunidade de calcular áreas e comprimentos interes-
santes como a soma de uma PG.
Exercı́cios
2n + 1
2. Seja n um inteiro positivo. Mostre que é uma fração irredutı́vel.
3n + 1
Sugestão. Use a igualdade 3n + 1 = (2n + 1) + n.
m
3. Seja ∈ Q+ . Mostre que, se m1 , m2 , . . . , mk , n1 , n2 , . . . , nk ∈ Z+ são tais que
n
m m1 m2 m3 mk
= = = = ... = ,
n n1 n2 n3 nk
então
m m1 + m2 + . . . + mk
= .
n n1 + n2 + . . . + nk
Vale o resultado se suprimir a hipótese m1 , m2 , . . . , mk , n1 , n2 , . . . , nk ∈ Z+ ? Justifique com
cuidado.
−20 = −20 ⇐⇒ 16 − 36 = 25 − 45
⇐⇒ 42 − 9 × 4 = 52 − 9 × 5
⇐⇒ 42 − 9 × 4 + 81/4 = 52 − 9 × 5 + 81/4
⇐⇒ (4 − 9/2)2 = (5 − 9/2)2
⇐⇒ 4 − 9/2 = 5 − 9/2
⇐⇒ 4 = 5 . C.Q.D.
p
7. Mostre que todo número racional pode ser colocado na forma N + q
onde N ∈ Z e p, q são
inteiros com 0 ≤ p < q. Interprete geometricamente este fato.
Sugestão. Use o algoritmo de Euclides.
9. Diga se as afirmações abaixo são verdadeiras ou falsas. Justifique com cuidado suas respos-
tas.
3 3 7 9 135
(a) < , (b) − 1 > 0, (c) − < 0.
8 9 4 5 75
10. Determine os números inteiros n, para os quais se verifica a desigualdade indicada em cada
um dos casos abaixo:
n 3 2n − 1 2 2n 3n
(a) < , (b) < , (c) − + 1 > 0.
4 5 2n + 1 3 3 2
12. Quais dos números racionais abaixo, possuem expansão decimal finita? Justifique cuidado-
samente sem determinar as expansões.
3 7 6 9 1 6 2
(a) , (b) , (c) , (d) , (e) 1 + − , (f) .
5 35 40 12 10 9 9
105
13. Determine o menor inteiro n > 10 de modo que tenha expansão decimal finita.
3n
14. Ache as expansões decimais periódicas infinitas dos números do exercı́cio 11.
a1 . . . as , b1 . . . br
{z . . . 1} 34 |11 .{z
α = 2, 34134113411134 |111 . . . 13411 . . 11} 34111 . . . ,
n n+1
β = 2, 34134113411 ,
γ = 341339 .
5 2 3
a= , b= , c=− , d = a + c.
7 9 5
21. Diga se as afirmações abaixo são falsas ou verdadeiras e justifique sua resposta.
2 2
(a) 0, 5999 . . . < √2 < 2
(b) √ < 0, 5999 . . . <
5+1 3
5+1 3
2 2 2
(c) < √2 < 0, 5999 . . . (d) √ < < 0, 5999 . . .
3 5+1
5+1 3
23.
√ √
(a) Determine r, s ∈ Q que aproximam 2 com erro < 10− 5 e tais que 2 ∈ (r, s).
√
(b) Idem para 3.
(c) Idem para α = 0, 7297299729997 . . . 971 |99 {z
. . . 9} 71 |99 .{z
. . 99} 719 . . . .
n n+1
p
24. Determine p, q ∈ N∗ sabendo que é a fração irredutı́vel da dı́zima 2, 0303 . . .
q
√
25. Mostre que se p é primo então p é irracional.
√
Sugestão. Imite a demonstração que 2 é irracional.
√
26. Mostre que, se p e q são primos distintos, então pq é irracional.
√ √
27. Use o exercı́cio anterior para mostrar que, se p e q são primos distintos, então p+ q é
irracional.
31. Determine valores para a, b ∈ R de modo que as igualdades indicadas abaixo sejam verda-
deiras.
a b a2 + b2
(a) + = 2
a+b a−b a − b2
1 1 1 a2 − 2a + 2
(b) − + =
a a − 1 (a − 1)2 a(a − 1)
b 1 a+b b(1 − ab) − a(a2 − 1)
(c) − 2− =
a a a−b a2 (a − b)
36. Resolva as inequações e descreva o conjunto solução como uma união de intervalos, dois
à dois disjuntos.
(a) |x| ≤ 2 (b) |x| ≤ a, onde a ≥ 0 (c) |x| ≥ 2 (d) |x| ≥ b, onde b ≥ 0
x
O que podemos dizer da expressão quando x = 0 ?
|x|
39. Sejam a, b, c ∈ R∗ . Diga se as afirmações abaixo são falsas ou verdadeiras e justifique sua
resposta.
(a) a > b =⇒ a2 > b2 (b) a > b =⇒ ac > bc
√
(c) a2 = b2 =⇒ a = b (d) a2 + b2 ≥ a
52.
(a) Densidade dos racionais na reta orientada.
Mostre que dados um irracional a entre 0 e 1, e um inteiro n ≥ 1, existe um inteiro qn tal que
0 ≤ qn < n e
qn 1
0≤a− < .
n n
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Os Racionais e os Irracionais 3.9 Limites e a PG
Observe que as definições que acabamos de apresentar não contemplam o conjunto vazio . . .
e seria natural que ele admitisse cota superior, cota inferior, e que fosse limitado. Afinal ele é
subconjunto de conjuntos com essas propriedades (vide exercı́cios abaixo).
Pois bem, nós então definimos: todo número real é cota superior do conjunto vazio, todo número
real é cota inferior do conjunto vazio, o conjunto vazio é limitado.
(a) Sejam ∅ =
6 A ⊂ B ⊂ R. Mostre que toda cota inferior de A é uma cota inferior de B. Enuncie
e demonstre algo parecido para cotas superiores.
Mostre também que, se B é limitado então A é limitado.
(b) Mostre que se M é cota superior de A então todos os pontos do intervalo [M, ∞) também o
são. Faça um enunciado similar para cotas inferiores.
(d) Dê exemplos de conjuntos que admitem cota superior mas não admitem cota inferior
(e) Dê uma cota superior e uma inferior, caso existam, para os seguintes conjuntos:
1 1
(i) ; n∈N ∗
(ii) {2 + 1 ; n ∈ Z}
n
(iii) ; n∈N
n 2n+1
1
(iv) {x ∈ R ; x2 + 1 > 0} (v) { 2 ; n ∈ Z} (vi) {x ∈ R ; x2 − 1 < 0}
n +1
(f) Dê exemplos de conjuntos que possuem cotas superiores mas tais cotas não pertencem ao
conjunto. Idem para cotas inferiores.
(g) Uma cota superior do conjunto A que pertence ao conjunto A é dita o maior elemento (ou,
elemento maximal) de A.
(h) Uma cota inferior do conjunto A que pertence ao conjunto A é dita o menor elemento
(elemento mı́nimo) de A.
(i) Dê exemplos de conjuntos (não vazios) que possuem cotas superiores mas não possuem o
maior elemento.
(j) Dê exemplos de conjuntos (não vazios) que possuem elemento maximal mas não possuem
elemento mı́nimo.
(k) Já vimos que se A 6= ∅ tem cota superior (resp. inferior) então A tem uma infinidade de cotas
superiores (resp. inferiores). Mostre que todo subconjunto ∅ 6= A ⊂ R não pode ter mais que
um maior elemento (i.e. o elemento maximal é único). Idem para menor elemento.
(l) Para cada um dos conjuntos descritos abaixo dê seu elemento maximal, seu elemento
mı́nimo, a maior de suas cotas inferiores e a menor de suas cotas superiores.
√
(i) [−2, 3) , (ii) (∞, 0) , (iii) (1, π] , (iv) ( 3, ∞) , (v) [1, 2]
1 1 1
(vi) ; n ∈ Z ∪ {0} , (vii)
∗ ∗
; n ∈ Z , (viii) ; n∈Z ∗
n n n2
(m) Seja A ⊂ R um conjunto não vazio e limitado superiormente, isto é, possuindo cota superior.
Nós já observamos que (item (b)) não existe a maior cota superior de A.
Todo conjunto A ⊂ R não vazio e limitado superiormente tem sua menor cota superior.
Isto é, tem uma cota superior que é menor ou igual a todas as cotas superiores de A. Esta cota
superior especial se designa por sup(A) e se chama o supremo de A, .
Similarmente, todo conjunto A ⊂ R não vazio e limitado inferiormente tem sua maior cota infe-
rior. Isto é, tem uma cota inferior que é maior ou igual a todas as cotas inferiores de A. Esta
cota inferior especial se designa por inf(A) e se chama o ı́nfimo de A.
Desafio! Um conjunto A ⊂ R é chamado denso (em R), quando tem a seguinte propriedade:
1 + 2 + 3 + ... + n
(g) lim . Resp. 21 .
n→∞ n2
12 + 22 + 32 + . . . + n2
(h) lim . Resp. 31 .
n→∞ n3
n
2
(i) lim 1 + . Resp. 1.
n→∞ 3
4 n 2
n
n − 3n + 23
5
(j) lim n . Resp. 0.
n→∞ n2 − 3n + 21
56. Determine (com ajuda de alguma máquina de calcular se achar necessário) os primeiros 10
termos das sucessões abaixo, e demonstre que elas convergem aos limites indicados:
n
(a) lim = 1.
n→∞ n + 1
n+3
(b) lim 3 = 0.
n→∞ n + 4
n!
(c) lim n = 0
n→∞ n
Indicação: Tome valores especı́ficos para a e b apenas para ter uma idéia do valor do limite.
α(n)
(e) (Desafio!) Se α(n) é o número de divisores primos de n, então lim =0
n→∞ n
Indicação: Observe que todo número primo é ≥ 2. Use seus conhecimentos sobre logaritmos e o teorema de decomposição em fatores primos
log2 n α(n) log2 (n)
do capı́tulo 2 para verificar que, ≥ ≥ 0. Finalmente, use o fato (não precisa prová-lo) de que lim = 0.
n n n→∞ n
converge e determine o limite (para ter uma idéia do limite, ache com ajuda da máquina de
calcular, os primeiros 10 termos da sucessão).
√
Indicação: Verifique primeiro que, se 0 < a < 2, então a < 2a < 2. Depois use seguinte fato (não precisa prová-lo): se lim an = `, então
n→∞
p √
lim 2 an = 2 `.
n→∞
58. (Exercı́cio auxiliar) Use a fórmula do binômio de Newton para calcular (1 + h)n , depois
verifique que:
(a) Se h > 0 e n ∈ N, então (1 + h)n ≥ 1 + n h,
n(n−1) n(n−1)
(b) Se h > 0 e n ∈ N∗ , então (1 + h)n ≥ 1 + n h + 2
h2 ≥ 2
h2 .
+ n q aq n
(a) Seja q ∈ Z . Prove que, (1 + a) > q , para todo n > 2q.
2 q!
n q aq
Indicação: (1 + a)n > (q + 1)-termo do desenvolvimento de Newton de (1 + a)n > 2q q!
.
nr 2q q! r−q
(b) Obtenha do item acima que, se q > r: 0 < < n , para todo n > 2q.
(1 + a)n aq
nr
(c) Use o item (a) do exercı́cio anterior para concluir que lim = 0.
n→∞ (1 + a)n
(n2 + n) 2n
(b) lim 2 n .
n→∞ n (2 + 1)
n3 + 2n2 3n
(c) lim .
n→∞ n3 3n
62. (Desafio!)
(a) Demonstre que, se {an }n é uma sucessão tal que lim an = `, então
n→∞
a1 + a2 + . . . + an
lim = `.
n→∞ n
an+1 √
(b) Suponha que an > 0 para todo n ∈ N, e que lim = `. Demonstre que lim n an = `
n→∞ an n→∞
√
(use o fato de que lim n a = 1 para a > 0).
n→∞
63. Para cada um dos números racionais r dados abaixo, determine sucessões de números
racionais distintos (αn )n e (βn )n tais que
e lim αn = r = lim βn .
n→∞ n→∞
(a) r = 0, 231.
7
(b) r = .
8
(c) r = 4, 456.
64. Repita o exercı́cio acima com sucessões de números irracionais (αn ) e (βn )n .
65. Seja r ∈ R e sejam (αn )n e (βn )n sucessões de números reais distintos tais que
e lim αn = r = lim βn .
n→∞ n→∞
Prove que:
(a) O erro ao aproximar r por αn (respectivamente, por βn ) tende a zero quando n → ∞.
(b) A distância de αn a βn tende a 0 quando n → ∞.
68. Prove que, numa PG, todo termo, a partir do segundo, é a média geométrica entre o anterior
e o posterior. Isto é, se α, β, γ são termos consecutivos de uma PG, então β2 = α · γ.
71. Numa PG de termos positivos, qualquer termo é igual à soma dos dois posteriores. Qual a
razão dessa PG?
√
72. Determine o valor de a ∈ R de modo que, 7 − a, 23 − a e 2 + a, sejam os três primeiros de
uma PG. Acha também o valor da razão da PG.
73. Dez números formam uma PG finita de modo que, a soma dos termos de ordem par é 4 e a
soma dos termos de ordem ı́mpar é 20. Determine a razão dessa PG.
obtemos
√ 1 √ 1
(a) 3
x (b) (c) x (d) (e) 1
45 2
75. O limite da soma dos termos de uma PG é igual a 1. Determine o quarto termo desta PG
2
sabendo que o primeiro termo é .
3
76. Uma bolinha é solta de uma altura h sobre o solo. Cada vez que ela bate no solo, sobe, atin-
gindo uma altura 20% menor que a altura anterior. Determine, em termos de h, o comprimento
total percorrido pela bolinha em sua trajetória, até atingir o repouso.
Fig. 27.
rq
√ p√ √ p√
qp
78. Ao simplificar o produto infinito α = 2 · 2· 2· 2 · . . . obtemos:
√ n
(a) 1 , (b) 12 , (c) 2 , (d) 2 2 , (e) 2 .
! 15
1 1 15 1 15
5 5 5
79. Simplificando o produto infinito β = 16 · 16 · 16 · . . . obtemos:
1
√
5
1
(a) 25
, (b) 2 , (c) 2, (d) 4 5 , (e) 1 .
Estágio 2: C2 é a união dos intervalos obtidos ao retirar os terços centrais abertos das partes
de C1 . Isto é
1 2 7 8 1 2 1 2 7 8
C2 = C1 − , − , = 0, ∪ , ∪ , ∪ ,1 .
9 9 9 9 9 9 3 3 9 9
etc. . .
Estágio n: Cn é a união dos intervalos obtidos ao retirar os terços centrais abertos das partes
de Cn−1 .
etc. . .
Por definição, o conjunto de Cantor é o conjunto
C = C0 ∩ C1 ∩ C2 ∩ . . . ∩ Cn ∩ . . . .
1
Observação: O conjunto de Cantor é não vazio (de fato, dentre seus infinitos elementos temos 0, 1, todos os números da forma 3n
, etc).
Calcule a soma dos comprimentos dos intervalos abertos retirados para construir o conjunto de
Cantor.
Fig. 27.
Georg Cantor (1845-1918) matemático alemão, criou a Aritmética Cardinal (aritmética dos infinitos), formalizou a Teoria de Conjuntos, e intro-
81. (Desafio!) Refaça a construção do conjunto de Cantor acima retirando intervalos centrais
abertos de comprimento α vezes o comprimento do intervalo do qual se faz a retirada, onde
1 1
(a) 0 < α < (b) 1 > α >
3 3
J. Delgado - S. Firmo - P. Nóbrega 156 Instituto de Matemática - UFF
Os Racionais e os Irracionais 3.9 Limites e a PG
82. Um número natural é chamado perfeito quando é igual à metade da soma dos seus divisores
naturais.
1
Por exemplo : 6 é um natural perfeito, pois 1, 2, 3 e 6 são os seus divisores positivos e 6 = 2
(1 + 2 + 3 + 6).
Sabendo que o natural 213 − 1 é primo, mostre que 212 · (213 − 1) é um natural perfeito.
83. Uma progressão aritmética (PA) é uma sucessão onde cada termo, a partir do segundo, é
obtido do anterior por adição de uma constante chamada a razão da PA.
Assim, se a, r ∈ R, a PA infinita de primeiro termo a e razão r é a sucessão
a , a + r , a + 2r , a + 3r , . . . , a + (n − 1)r , . . . (∗)
Fig. 28.
(II) Uma sucessão é dita uma progressão harmônica quando os recı́procos dos seus termos
formam uma PA.
Determine a soma dos quatro primeiros termos de uma progressão harmônica, onde 3,4 e 6,
nessa ordem, são os três primeiros termos da progressão.
determinar a soma dos dez primeiros termos da PG e a soma dos cinco primeiros termos da
PA.