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CONDICIONAMENTO ALIMENTAR DE PEIXES CARNÍVOROS

Ana Maria B. M. Sampaio de Oliveira, Ph.D.


1. Introdução

A produção mundial de organismos aquáticos pela aqüicultura cresceu de


33.310.349 t em 1.999 para 35.585.111 t em 2.000 e 37.851.356 em 2001 (FAO, 2002). No
Brasil, a produção anual total de pescado cresceu de 655.000 t em 1999 para 766.841 t em
2.000e 770.000 em 2001 (FAO, 2002), sendo que a produção originada da aquicultura
cresceu de 119.750 t em 1999 para 153.558 t em 2.000 e 210.000 em 2001. A projeção da
FAO relativa ao incremento da produção de organismos aquáticos através de técnicas de
aqüicultura para 2010 é de 107 a 144 milhões de toneladas, das quais aproximadamente 30
milhões serão transformadas em farinha de peixe e óleo para uso em produtos não
alimentícios.
Em 1997 a produção mundial de peixes carnívoros estava em 2 mil t/ano e
representava 6% do total de produtos aquícolas produzidos no mundo. Em 1991, a produção
mundial de trutas e salmões era 652.428 t, passando para 943.722 em 1995, 1.395.739 em
1999 e 1.633.824 em 2000 (FAO, 2002). Este ramo da piscicultura exige a adoção de
sistemas de criação manejados em regime intensivo, em que o manejo da nutrição
desempenha papel importante, exigindo sério esforço da pesquisa para a geração de
tecnologia adequada (FAO, 2002).
Há vários exemplos de peixes, originalmente carnívoros, que se adaptaram às
condições de criação intensiva usando rações comerciais, como o “yellowtail” Seriola
quinqueradiata no Japão; o “turbot” Scophthalmus maximus e o “seabass” Dicentrarchus
labrax na Europa; a truta arco-íris Oncorhynchus mykiss, o salmão do Atlântico Salmo salar
e outros salmonídeos criados intensivamente em vários países, e o bagre do canal Ictalurus
punctatus que, produzido com uma dieta composta basicamente por grãos, é hoje a principal
espécie da aquicultura no sudeste dos Estados Unidos. Trabalhos envolvendo o
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condicionamento alimentar de espécies carnívoras, como os surubins (Pseudoplatystoma sp.),


o “black bass” (Micropterus salmoides) e até mesmo os tucunarés (Cichla sp), vêm sendo
realizados com relativo sucesso. Um próximo passo seria a determinação das exigências
nutricionais destas espécies, principalmente os teores de proteína e energia das rações, cujo
conhecimento vai embasar a produção de rações para sua criação comercial.
A criação intensiva de peixes carnívoros era considerada muito difícil, uma vez
que estava sujeita aos entraves comuns à criação destas espécies: uso de estratégias
inadequadas de preparo e monitoramento dos tanques de larvicultura, o acentuado
canibalismo e a inabilidade em aceitar de imediato ração convencional, e a baixa
disponibilidade de rações comerciais de qualidade, nutricionalmente completas e bem
balanceadas, que suprissem as exigências nutricionais das espécies carnívoras. Com o
desenvolvimento e aprimoramento de técnicas de condicionamento alimentar, já existem
produções de juvenis avançados de várias espécies carnívoras, entre elas os surubins, pintado
e cachara, que se destacam entre as espécies nacionais como peixes de mesa, esportivos ou
mesmo ornamentais e o black bass, considerado o carro chefe da indústria da pesca esportiva
nos Estados Unidos, a qual conta com 46 milhões de adeptos que movimentam, em média,
US$ 28 bilhões anualmente, ou cerca de 0,5% do PIB daquele país.

2. Larvicultura

O sucesso da larvicultura, fase que apresenta duração de 20 a 30 dias, irá


depender de fatores como, tipo, quantidade e manutenção do zooplâncton disponível nos
viveiros, da densidade de larvas estocadas e de parâmetros da qualidade da água, como pH,
amônia, alcalinidade e dureza total e oxigênio dissolvido. A eliminação de insetos (ninfas de
odonata, remadores e baratas d’água) e peixes indesejáveis (permanecem nos viveiros após a
despesca) é de fundamental importância para a sobrevivência das pós-larvas. Para tanto, faz-
se necessário à utilização de cal sobre toda a superfície das poças no fundo dos viveiros, na
concentração de 200 g de cal/m2. Anônimo (1998), destaca a importância da calagem para
elevar a alcalinidade e dureza total da água. Águas que apresentam valores superiores a 30
mg de CaCO3/L dispensam a aplicação de calcário, o que resulta em economia de tempo de
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dinheiro para o produtor de alevinos. A calagem melhora a disponibilidade de nutrientes para


o fitoplâncton, ajuda a manter o pH da água mais estável e fornece cálcio para o
desenvolvimento normal do zooplâncton. A aplicação do calcário deve ser feita no fundo e
nas laterais do tanque quando este está seco ou pode ser aplicado com o viveiro já sendo
cheio. O mais recomendado é a utilização do calcário dolomítico (contém cálcio e magnésio),
com granulometria fina (PRNT acima de 90% conforme indicado na embalagem). A
aplicação de cal hidratada e cal virgem faz o pH da água subir rapidamente para níveis letais
para as pós-larvas e alevinos. Pós larvas são extremamente sensíveis a pH acima de 9 nos
primeiros dias de vida.
Em relação ao black bass e tucunaré, o tempo aproximado da eclosão dos ovos
até as larvas iniciarem a natação, são de 3 dias. Os reprodutores, por sua vez cuidam dos ovos
e das larvas até estas alcançarem 2 cm. É nesta fase que as larvas são capturadas e
transferidas para um viveiro previamente adubado, onde se alimentam basicamente de
zooplâncton. Elas podem permanecer neste viveiro até atingirem aproximadamente 3,5 cm,
tamanho em que os peixes iniciam a procura por presas maiores, período ideal para iniciar o
condicionamento alimentar.
Segundo Ceccarelli e Senhorini (1996), as larvas de matrinxã e piracanjuba tem
demonstrado preferência alimentar por crustáceos zooplanctônicos, principalmente os
cladóceros, além de larvas de insetos aquáticos. Após 7 a 10 dias do abastecimento dos
viveiros e estes terem sido adubados, ocorre pico de alimentos adequados, ou seja, os
cladóceros, este momento é o ideal para a estocagem das larvas. Em seguida, é muito
importante manter um programa de fertilização orgânica e inorgânica, com intervalos de no
máximo uma semana, objetivando a manutenção de pico de zooplâncton. Porém, recomenda-
se iniciar o enchimento dos viveiros até no máximo 2 a 3 dias antes da estocagem das pós-
larvas. Desta forma a estocagem inicial de larvas está em torno de 100 larvas/m2, mas este
número pode variar de acordo com a produtividade dos viveiros e o tipo de adubo, inóculo de
zooplâncton e alimentação artificial utilizados.
Durante a larvicultura o plâncton é de fundamental importância, pois produz oxigênio e
remove a amônia da água, favorecendo um rápido crescimento dos peixes. Além disso, o
plâncton sombreia o fundo dos viveiros, impedindo a entrada de luz e o desenvolvimento de
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algas filamentosas e plantas submersas. O excesso de troca de água nesta fase prejudica o
desenvolvimento do plâncton, facilitando desenvolvimento de algas filamentosas e plantas
aquáticas no fundo dos viveiros, devido à alta transparência da água, além de dificultar as
operações de despesca. Segundo Kubtiza (1999), uma outra sugestão que favorece o
desenvolvimento do plâncton é a utilização de 2 a 3 kg de uréia/1.000 m2/semana e 4 a 6 kg
de farelos vegetais/1.000 m2/dia. Farelos de arroz, trigo ou algodão, por exemplo, podem ser
usados e também servirão de alimento para os peixes estocados. Um parâmetro que pode ser
utilizado para se medir a necessidade de adubação é o disco de Secchi (ideal é manter a
transparência em 50 cm). Atingida está transparência, pode-se interromper o uso de uréias e
farelos. Da mesma forma, caso a transparência da água for se aproximando de 30 cm, deve-se
aumentar a renovação de água de forma a manter a transparência em 50 cm.
Como as pós-larvas apresentam rápido crescimento, são muito exigentes em
nutrientes. Além disso, as reservas corporais em nutrientes são poucas e deste modo,
qualquer deficiência na nutrição das mesmas, pode trazer sérios problemas para o
crescimento. O zooplâncton é o primeiro alimento externo para as pós-larvas da maioria dos
peixes. Enzimas digestivas presentes neste organismo são liberadas pela ação física das pós-
larvas durante a captura e ingestão do zooplâncton. Estas enzimas exógenas desencadeiam a
hidrólise das proteínas do próprio zooplâncton ingerido e estimulam a secreção de enzimas
pelo trato digestivo das pós-larvas (enzimas endógenas), facilitando o processo de digestão e
absorção dos nutrientes. Após alguns dias com alimentação às custas de organismos
planctônicos, as pós-larvas começam a aceitar e utilizar melhor as rações preparadas.

3. Estratégias no condicionamento alimentar de peixes carnívoros

Devido ao hábito natural destas espécies, carnívoros por excelência, é necessário


um período de treino alimentar realizado no período de alevinagem para aceitarem ração
comercial. Existem várias estratégias de treino alimentar: transição súbita das rações,
transição gradual das rações e transição gradual dos ingredientes nas rações (Kubitza, 1995a,
b). A transição súbita consiste na substituição direta do alimento natural ou ração inicial pela
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ração final, ou seja, não considera as diferenças de sabor e textura da dieta durante a transição
alimentar.
A transição gradual das rações consiste na substituição progressiva de uma certa
ração inicial ou alimento natural pela ração final seca, até o ponto onde apenas a ração final é
oferecida. Esta técnica pode favorecer a seletividade alimentar e acentuar o canibalismo em
função das diferenças de tamanho dos peixes dentro do mesmo lote, uma vez que os peixes
maiores se alimentariam primeiro, desenvolvendo-se mais rapidamente e ficando aptos a
praticar o canibalismo (Kubitza, 1995a, b; Ono, 1996; Kubitza & Lovshin, 1997; Moura,
1998).
Porém a estratégia mais eficiente é a substituição gradual dos ingredientes nas
rações, onde o alimento inicial é substituído por uma seqüência de rações formuladas de
forma a conter níveis decrescentes do alimento inicial em sua composição. Neste caso, a
textura e o sabor das rações são alterados progressivamente e os ingredientes misturados
impedem a seletividade.

4. Alimentos artificiais utilizados e fatores que afetam o condicionamento alimentar

A produção de peixes forrageiros para a produção intensiva de peixes carnívoros


implica em aumento dos custos de produção pela maior necessidade de mão de obra e área de
viveiros. Além da menor produtividade obtida com alimentos naturais, existe uma
dependência da sazonalidade de produção do alimento natural, da sua disponibilidade a baixo
preço, da obtenção em quantidade e qualidade adequadas àquela fase do animal e da
disponibilidade de um espaço maior para a criação da espécie forrageira a ser fornecida aos
peixes sob criação. A utilização de zooplâncton e náuplios de Artemia, por exemplo, é restrita
às fases de larvicultura, sendo inadequada na alevinagem devido ao reduzido tamanho de
partículas/presas e alto custo de produção. Normalmente, a depleção de alimento natural
coincide com o tempo em que os alevinos alcançam 4 a 6 cm de tamanho. Nesta fase, há a
necessidade de reduzir a densidade de estocagem nos tanques de produção, para evitar o
canibalismo. Acredita-se que seja necessária a produção de dois quilogramas e meio de peixe
forrageiro para se produzir 500 g de uma determinada espécie de peixe carnívoro (Anderson,
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1974; Kubitza, 1995a, b; Nelson et al., 1974; Sloane & Lovshin, 1995; Willis & Flickinger,
1981).
Estes alevinos podem ser facilmente treinados com peixes moídos ou dietas úmidas
(Lovshin & Rushing, 1989). Porém, o alto custo dos alimentos úmidos e a necessidade de
refrigeração limitam o uso a um pequeno período de condicionamento alimentar ou a uma
pequena escala de produção. Porque são mais baratas e fáceis de armazenar, dietas secas são
mais recomendadas para operações de grande escala. A identificação de rações iniciais e o
desenvolvimento de estratégias efetivas de produção que levem estes peixes das rações
iniciais até as rações comerciais são o grande entrave (Kubitza, 1995a, b).
Filé de peixe moído, ovos de carpa comum e krill seco congelado são alguns dos
alimentos iniciais utilizados para o treino alimentar. Segundo Kubitza (1995a), o melhor
alimento inicial para o condicionamento alimentar do largemouth bass é o krill seco
congelado, seguido de uma transição gradual dos ingredientes das rações contendo farinha de
krill. No entanto, o filé de peixe moído pode ser considerado um potente substituto, uma vez
que peixes treinados com filé de peixe crescem mais rápido e aceitam melhor a ração
comercial extrusada que os peixes treinados com krill seco congelado. (Sloane & Lovshin,
1995; Kubitza & Lovshin, 1997). O aumento da palatabilidade, textura e flutuabilidade do
krill parecem satisfazer as preferências alimentares do largemouth bass.
Willianson & Carmichael (1990), testaram o sucesso de treino de duas variedades
de largemouth bass (Northen e Flórida) e seus híbridos. Os resultados indicaram que os
alevinos da variedade Northen obtiveram maior sucesso no treino. Trabalhando com duas
gerações de largemouth bass (filhos de pais treinados na ração – meridian select e filhos de
pais alimentados com peixes forrageiros - meridian), Ono (1996) testou quatro dietas iniciais:
krill seco congelado (KSC), filé de peixe moído (FPM), 80% de filé de peixe mais 20% de
ração de truta moída (FP-80) e ração de truta moída (RT) e obteve os seguintes resultados:
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Tabela 1. Porcentagem de peixes condicionados e não condicionados a aceitar krill seco


congelado (KSC), filé de peixe moído (FPM), uma dieta semi-úmida feita com
80% de filé de peixe mais 20% de ração de truta moída (FP-80) e ração comercial
de truta (RT).

Espécie KSC FP FP-80 RT

Meridian select Peso inicial, g 0,91 0,93 0,93 0,92


Condicionados, % 92,7a 83,2b 17,0c 2,2d
Meridian Peso inicial, g 0,90 0,88 0,89 0,88
Condicionados, % 58,3a 59,2a 7,3b 1,5c
Ono (1996)

Ono (1996) sugere ainda que para o condicionamento alimentar do black bass, com
peso inicial de 1 g, a melhor estratégia foi usar o KSC durante 4 dias, em seguida uma
transição gradual dos ingredientes das rações durante 9 dias, com rações contendo 75, 50 e
25% de farinha de krill misturada com ração de truta moída, fornecida 4 vezes ao dia durante
2 dias cada ração. Moura (1998), trabalhando com o tucunaré Cichla sp, sugere que a melhor
dieta inicial é aquela contendo 100% de filé de peixe moído, seguida de uma transição
gradual dos ingredientes das rações, contendo 80, 60, 45, 30, 10 e 0 % de filé de peixe,
obtendo-se 37% de peixes aceitando uma ração seca comercial. Apesar de utilizarem a
mesma dieta inicial – filé de peixe moído, Kubitza & Cyrino (1997) obtiveram 76% dos
peixes se alimentando do alimento inicial, mas não obtiveram sucesso em relação ao restante
das rações de transição, pois nenhum peixe aceitou uma ração final seca. Snow (1968),
sugere que alevinos de black bass devem estar com aproximadamente 0,9 g, ou 38 a 51 mm
para começar o período de condicionamento alimentar, pois nesta fase os peixes têm reserva
de energia suficiente para sobreviverem até serem treinados, bem como tamanho uniforme
para reduzir canibalismo.
Brandt et al. (1987), trabalhando também com o largemouth bass, testou o sucesso
do treinamento de 32 dietas iniciais. O sucesso do treino para a maioria das dietas ficou
abaixo de 3,2%, exceto para as rações granuladas contendo 45% de proteína e duas dietas
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contendo pelo menos 97,8% de ovos de carpa comum. As rações granuladas possibilitaram
um sucesso de treino de 18%. As dietas contendo 97,8 e 100% de ovos de carpa comum
possibilitaram um sucesso de condicionamento alimentar de 59 e 57,5%, respectivamente.
Resultados de investigações sobre o uso de substâncias que estimulam o consumo
de alimento pelos peixes sugerem que embora o sabor de um alimento seja quimicamente
mediado por substâncias inerentes ao alimento, depende ainda da quimiossensitividade da
espécie (Adams et al., 1988); misturas são mais eficazes para estimular a resposta alimentar
dos peixes que componentes individuais (Kubitza, 1995b); L-aminoácidos são substâncias
mediadoras da resposta alimentar dos peixes, particularmente os aminoácidos neutros
(Hughes, 1991); e bases nitrogenadas orgânicas e nucleotídeos estão envolvidos com a
resposta alimentar dos peixes (Kubitza, 1995b).
Em estudos com o black bass, Kubitza (1995b) testou o efeito da substituição da
farinha de peixe pelo farelo de soja (60 %) para identificar a palatabilidade das dietas
experimentais. Em seguida, adicionou às rações uma mistura de aminoácidos (alanina
2.000mg/kg, glicina 3.836 mg/kg, prolina 305 mg/kg, serina 1.205 mg/kg, leucina 614
mg/kg, valina 800 mg/kg, histidina 273 mg/kg e triptofano 318 mg/kg), nucleotídeos (inosina
2.800 mg/kg e inosina-5-monofosfato 2.800 mg/kg) e betaina (6.100 mg/kg). Foram testadas
7 rações experimentais: apenas com aminoácidos; apenas com a betaína; apenas com os
nucleotídeos; com aminoácidos mais betaína; com aminoácidos mais nucleotídeos; com
betaína mais nucleotídeos; e com os aminoácidos mais betaína mais nucleotídeos; e uma
ração controle contendo 60% de farelo de soja. Baseando-se no consumo diário de ração, os
melhores resultados foram àqueles relativos às rações contendo somente nucleotídeos ou com
as outras possíveis combinações, como pode ser observado na Tabela 2.
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Tabela 2. Consumo diário de ração (CDR) em g/100 g de peso vivo do largemouth bass
alimentado com uma dieta controle e com dietas contendo aminoácidos (AA),
nucleotídeos (NUC), e betaína (Bet) isolados e com todas as possíveis
combinações.

Rações experimentais CDR (g/100g)


NUC 3,60 a
NUC + AA + Bet 3,45 a
NUC + Bet 3,42 a
NUC + AA 3,34 a
AA + Bet 2,74 b
AA 2,69 b
Controle 2,47 b
Betaína (Bet) 2,40 b
CV (%) 12,40
Kubitza (1995b)

Kubitza (1995b) realizou ainda outro experimento com a mesma espécie, testando
somente os nucleotídeos, inosina e inosina monofosfato, juntos ou isoladamente, em
diferentes níveis e observou os seguintes resultados (Tabela 3):
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Tabela 3. Consumo diário de ração (CDR) em g/100 g de peso vivo do largemouth bass
alimentado com uma dieta controle e com dietas contendo 10% de farinha de
peixe (FP-10), ou contendo somente inosina (Ino) ou somente inosina –5’-
monofosfato (IMP-5’) e Ino mais IMP-5’.

Rações experimentais (mg/kg) CDR (g/100g)

FM-10 1,90 a
Ino+IMP (2.800 cada) 1,63 b
IMP-5’ (5.600) 1,50 b
IMP-5’ (2.800) 1,48 b
IMP-5’ (1.400) 1,27 c
Ino (5.600) 1,29 c
Ino (2.800) 1,29 c
Ino (1.400) 1,22 c
Controle 1,20 c
CV(%) 14,80
Kubitza (1995b)

Apesar de estarem associados a um aumento na resposta alimentar dos peixes, os


aminoácidos neutros não estimularam o consumo de alimento. A betaína, composto orgânico
encontrado em grandes concentrações em extratos de crustáceos e considerado um bom
estimulante do consumo de alimento para peixes, também não foi efetivo neste estudo. O
IMP-5’, encontrado em abundância em músculos de peixes e, consequentemente na farinha
de peixe, foi o nutriente que apresentou melhor efeito estimulatório no consumo de alimento.
Os peixes carnívoros normalmente iniciam sua fase piscívora ainda como alevinos,
à medida que as fontes de alimento natural diminuem ou passam a ser inadequadas em
tamanho. Santos et al. (1993), relata que larvas de dourado Salminus maxilosus, começam a
realizar canibalismo poucas horas após a eclosão, quando ainda possuem saco vitelínico.
Mesmo na presença de peixes forrageiros, este comportamento continua levando a um
pequeno sucesso na criação desta espécie.
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Além do alimento inicial, outros fatores que afetam o condicionamento alimentar


são: a condição de saúde do peixe, linhagem genética, qualidade e temperatura da água,
tamanho e palatabilidade do alimento, estratégia e manejo alimentar, densidade de estocagem
e doenças (Kubitza & Lovshin, 1997). Sloane & Lovshin (1995) sugerem que peixes
carnívoros que estão passando pelo condicionamento alimentar devem ser expostos ao
alimento até serem completamente treinados. Os autores sugerem ainda que quanto mais
oportunidades os peixes tiverem de consumir o alimento, mais rapidamente serão
condicionados a consumir uma dieta comercial seca. Os peixes devem ser alimentados 4 a 5
vezes ao dia, mesmo em excesso, pois a exposição freqüente às partículas de alimento
aumenta a chance dos peixes aprenderem a aceitar a ração final. É sempre muito importante
manter peixes de mesmo tamanho dentro das unidades de produção para evitar canibalismo.
Em geral, 60 a 80% dos peixes que iniciam o treino alimentar aceitam rações comerciais
secas. O condicionamento alimentar é iniciado com peixes de 3 a 5 cm e se estende por 20 a
30 dias, quando os peixes atingem 5g, aproximadamente, e já devem estar aptos a aceitar
ração comercial para peixes carnívoros (42% de proteína bruta) com grânulos flutuantes de 2
mm (Moura, 1998).
A temperatura da água deve permanecer na faixa ótima de conforto para a espécie
em treinamento (normalmente 25 a 30oC) e os níveis de oxigênio dissolvido devem estar
acima de 5 mg/L, o que se consegue, usualmente, com um troca de água freqüente. Quando a
temperatura da água ultrapassa os 30oC e os peixes são excessivamente manejados, é comum
o aparecimento de uma bacteriose causada por Flexibacter columnaris no estoque. Neste
caso, um tratamento tópico com permanganato de potássio na concentração de 2 mg/L por 2
h controla a propagação da doença e reduz a mortalidade. Outra doença comum neste período
é o íctio ou doença dos pontos brancos, causada pelo protozoário Ichthyophthirius multifilis.
Esta parasitose pode ser controlada com banhos indefinidos de formaldeído 37% (formalina)
na concentração de 25 ml/m3. Deficiência de vitamina B1 também foi observada em
experimentos com filé de peixe moído, provavelmente devido a presença da enzima
tiaminase na carne crua de peixes (Snow, 1968).
A produção de juvenis avançados (peixes com aproximadamente 100g) é de grande
interesse porque assegura melhor sobrevivência em programas de repovoamento de
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reservatórios com populações de peixes já estabelecidas. Esta prática já vem sendo feito em
larga escala com o black bass, em reservatórios públicos e particulares para pesca esportiva.
O alto custo inicial dos peixes, cerca de R$ 4,00/unidade é compensado pelo menor número
de peixes necessários, em função da ausência de canibalismo e consequentemente maior taxa
de sobrevivência.
A produção intensiva de juvenis avançados de black bass alimentados com ração
comercial seca em viveiros sem renovação de água e com aeração de emergência alcança até
7.200 kg/ha em 117 a 153 dias de cultivo, com conversão alimentar de 0,97 a 1,14 (Kubitza,
1995b). Surubins com peso inicial de 50g alcançam peso médio de 600g em 90 a 100 dias
após a estocagem, atingindo biomassa final de 5.000 kg/ha, obtendo-se conversão alimentar
entre 1,4 e 1,7. A terminação dos surubins (600g a 3kg) ocorre em 330 a 390 dias, atingindo
uma biomassa total de 4.700 kg/ha e conversão alimentar de 1,9 a 2,0 (Kubitza et al., 1998).
Pesquisas com o carnívoro tucunaré realizado pela ESALQ/USP, demostraram que peixes
com peso inicial de 10g, apresentaram um ganho de peso de 20g em 60 dias com índices de
conversão alimentar de 1,2 e que é possível reduzir o nível de proteína bruta (PB) nas rações
de peixes carnívoros de 40% para 36 a 37% de PB sem redução no ganho de peso e qualidade
da carne do produto final, o que resulta em grande redução no preço das rações (Sampaio,
1999).
Hoje, os preços de venda de peixes carnívoros variam de R$ 10,00 a R$ 15,00/kg
de peso vivo. Os preços praticados em peixarias da região sudeste variam de R$ 7,00 a
R$20,00 dependendo da apresentação do produto. Estes valores mostram que apesar do alto
custo inicial dos alevinos, a criação de espécies carnívoras é hoje uma boa opção para
produtores e donos de pesque – pagues aumentarem as margens de lucro da atividade.
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5. Curiosidades

Segundo Larsen (1993), alguns estudos mostraram que tucunarés adultos se


alimentam exclusivamente de pequenos peixes, especialmente “threadfin shad, mosquito fish,
tilápia e o bluegill em águas americanas. No lago Guri, Venezuela, por exemplo, foram
encontrados tucunarés adultos apresentando grande canibalismo sobre tucunarés menores.
Estudos no Havaí mostraram que a ausência de black bass no estômago de 591 tucunarés,
sugerem que estes não predam significativamente o black bass. Nos canais no sul da Flórida,
foram encontrados tucunarés se alimentando mais de tilápia e outras espécies exóticas, do
que as abundantes espécies forrageiras nativas. O que faz o tucunaré ser uma boa espécie
para este habitat é a habilidade de se alimentar da super abundante tilápia. O tucunaré é um
peixe oportunista que se alimentará do que estiver disponível. Um tucunaré de
aproximadamente 1,84 kg representa 16 kg de peixes forrageiros que foram consumidos.
Comparativamente ao black bass o tucunaré apresenta-se mais ágil, se alimentam
durante o dia, com picos de alimentação pela manhã. O tucunaré é muito sensível a baixas
temperaturas, apresentando altas mortalidades com águas abaixo de 20 a 22oC.
Shafland (1995) mostraram que desde bem alimentados, o tucunaré pode crescer
250-300 mm e atingir a maturidade sexual em 12 meses. Os machos são maiores do que as
fêmeas. Esta espécie, normalmente atinge entre 500 a 600 mm (Axelrod et al., 1971; Zaret &
Paine, 1973). Existem relatos em relação ao Cichla ocellaris, de exemplares de até 74 cm e
6,8 kg e 12, 5 kg para o tucunaré açu, Cichla temensis.
Os melhores lugares para a pesca do tucunaré no sudeste do Brasil são: Itumbiara,
São Simão, Emborcação, Água Vermelha, Ilha Solteira, Jupiá, Pereira Barreto, Nova
Avanhandava, Três Marias, Furnas,Volta Grande etc. Na Amazônia, os rios Uatumã e o
Negro são os mais visitados. No Brasil, o tucunaré também pode ser encontrado no Araguaia.
Em relação aos parâmetros de qualidade da água, as exigências são semelhantes
às outras espécies: alcalinidade e dureza total acima de 30 mg de CaCO3/L, pH entre 6,0 e 9,0
e oxigênio dissolvido acima de 3,0 mg/L.
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6. Conclusão

Com base no exposto podemos concluir que:


• a estratégia de condicionamento alimentar mais eficiente é a substituição gradual dos
ingredientes nas rações;
•o sucesso do condicionamento alimentar é passado de geração para geração;
•krill seco congelado tem sido bastante utilizado no treino alimentar de espécies carnívoras.
No entanto, devido à baixa disponibilidade, tem se utilizado o filé de peixe moído com
relativo sucesso;
•as espécies carnívoras parecem responder positivamente ao uso de atrativos às rações,
aumentando o consumo de alimento. Porém existe uma grande variação na resposta, em
relação ao tipo de atrativo entre as espécies de peixes.

7. Referências Bibliográficas

ADAMS, M. A.; JOHNSEN, P.B.; ZHOU, H-qi. Chemical enhancement of feeding for the
herbivorous fish Tilapia zillii. Aquaculture, v.72, p. 95-107, 1988.
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