Estudos Culturais - para além das fronteiras disciplinares
Os Estudos Culturais em sua fase contemporânea trata-se de saberes não
capturados na ordenação da produção do pensamento humano; como nômades, transferem-se de uma cultura para outra; percorrendo países, grupos e tradições.
Um novo campo de estudos neste final de século; atividade com aspecto
político, atraente e promissor, conectado às concepções e práticas que marcam o contexto desse tempo.
Quanto a origem dos Estudos Culturais, muitos escritos abordam o tema;
tem-se principalmente muitos na língua inglesa e novas tendências surgem nos anos 50. Questiona-se as concepções inspiradas na tradição arnoldiana (debates do teórico Mathew Arnold, do século XIX a o XX).
Os Teóricos e suas concepções relativas aos Estudos Culturais
Mathew Arnold
Em sua análise cultural, tem como ponto mais contestado a noção de
cultura como um coro do conhecimento identificado como “o melhor que se tenha pensado e dito do mundo” e que se opunha ao que era entendido como os “progressos da civilização”. Seu pensamento identifica-se com o de Coleridge (poeta e crítico literário inglês), para quem classe dos clérigos era responsável pela preservação do desenvolvimento da cultura e na conservação da memória coletiva para a difusão do saber na comunidade.
Frank Raymod Leavis
Adotou as políticas culturais de Mathew Arnold. Sua obra percorre um
período de 40 anos; seu pensamento está em que a cultura sempre foi sustentada por uma minoria que manteve vivos os padrões da mais refinada existência. O declínio da autoridade cultural dessa minoria ocorreu no século XX, com os movimentos de democratização, afastamento das pessoas dos cânones literários, transformando o mundo em massa de indivíduos incultos ou semicultos.
A Revolução Industrial dividiu a coluna comum inglesa em cultura das
minorias e a cultura das massas; projetava criar postos avançados de cultura nas universidades e escolas dirigidas por grupos de intelectuais para defesa da tradição literária. Coleridge
A civilização se encontra do lado da exterioridade das coisas e a cultura
como exigência humana de perfeição, tem origem na intimidade da consciência.
Obras pioneiras nos Estados Unidos são originadas de família de classe
operária e possibilitam o processo de democratização no período pós-guerra.
Stuart Hall
Concordando com Richard Hoggart e Raymond William em suas teorias,
expressa as tensões dos estudantes, de origem popular ao debater-se em ambivante identidade cultural formada por dois mundos diferentes.
Colins Sparks
Para ele, Estudos Culturais trata-se de amontoados de idéias e temáticas
das críticas literárias da sociologia, história etc. Não havendo condições de se determinar a esfera de sua atuação, nem uma teoria e metodologia que sejam suas características.
As idéias apresentadas pelos teóricos fazem surgir os Estudos Culturais;
sua institucionalização acontece a princípio no Centro de Estudos Culturais, fundado por Richard Huggart e Raymond Williams em 1964, na Universidade de Birmingham e depois nos cursos e publicações de várias fontes e lugares. Admite-se que o espaço acadêmico não foi ideal para a relação entre a cultura do povo e a academia para abordagens relativas a cultura.
Para Stuar Hall, a institucionalização dos Estudos Culturais trouxe perdas e
ganhos. Após a fundação do Centro, houve grande expansão de diversificação de temáticas e abordagens. A conquista de um lugar na academia talvez tenha sido uma das formas mais visíveis de institucionalização.
Cary Nelson
Levava seu encorajamento aos acadêmicos quanto as instituições em
relação a importância dos Estudo Culturais, mas admite a expansão que este processo poderia acarretar a superficialidade e ausência do senso político em relação a vida social. Ellen Rooney e Elisabeth Long
Defendem a manutenção da ligação dos Estudos Culturais com os
movimentos sociais para preservar seu caráter de crítica política.
Raymond Williams
Define cultura usando três categorias: 1- processo de aperfeiçoamento em
direção a valores universais e absolutos; 2- conjunto de produção do trabalho criativo e intelectual; 3- descrição de um modo de vida.
Williams argumenta contra a posição entre “cultura de massa” e “alta
cultura”; e entre “cultura operária” e “cultura burguesa”. Ele verificava um certo etnocentrismo cultural que descarta todas as expressões e realizações humanas não submetidas à expressão escrita e à tradição letrada.
Heloísa Buarque de Holanda
Faz referências às idéias que se caracterizam por transitar entre diferentes
universos simbólicos ou culturais e aí encontrar novos portos de ancoragem onde se deixam ficar.
Com relação a expansão dos Estudos Culturais pelo mundo vê esses
estudos como “viagens”, que abordam questões de âmbito da cultura global e adquirem os contornos e matizes das configurações locais reinventando-se sempre nos questionamentos e perspectivas de análise. Os exemplos que se tem situam-se nas problematizações sobre o gênero, raça e etnia que tem recomposto todo o panorama das discussões nos países e em outros pelos quais tem circulado. Esta “idéia em movimento” torna-se um território de embates em que diferentes interesses políticos entram em jogo.
A vocação transnacional dos Estudos Culturais possibilita-lhe operar no
âmbito amplo da política cultural, como também esta grande expansão pode promover o risco da banalização oportunista da despolitização.
Hall, quanto a dispersão teórica e metodológica afirma que os Estudos
Culturais têm múltiplos discursos, grande quantidade de diferentes histórias. Tem suas próprias e diversas conjunturas em seu passado e acompanhado de transtorno, discussão e ansiedades. A questão da dispersão que se comenta decorre da forma como os Estudos Culturais são vistos pelos teóricos em diversos aspectos: política, da pesquisa, na aprendizagem, etc. No entendimento de O’Connor, os Estudos Culturais nada mais é do que um comprometimento político, pensamento também de Frow e Morris que os vê sempre marcado por um discurso de envolvimento social,pois são adeptos da insistência da dimensão política do conhecimento, enquanto Nelson, mesmo acreditando na teorização da ação política aliada aos Estudos Culturais, admite que eles não são necessariamente inter-relacionados.
Para alguns teóricos, os Estudos Culturais não se ajustavam ao Marxismo
até porque temas como cultura e linguagem foram silenciados neles.
Verifica-se que os Estudos Culturais têm se caracterizado pelo debate
amplo, pela divergência e pela intervenção, sujeitos à mudanças e à diversidade e ênfases problemáticas em momentos diferentes. Novas e produtivas formas de pesquisa e debate surgiram por conta da sofisticação tecnológica de artefatos. Vê-se pois nos estudos culturais a possibilidade de se sair da passividade para a inclusão na área política cultural e construção social.