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COMUNICAÇÃO COMO PAPEL ESTRATÉGICO EM UM

CENTRO DE DEFESA DE DIREITOS DA CRIANÇA E DO


ADOLESCENTE

Não há dúvidas do importante papel dos meios de comunicação na


garantia dos Direitos Humanos. Esses veículos, também conhecidos
como mídia (que engloba jornais, revistas, cinema, rádio, televisão,
internet, etc.), representam instrumento essencial para a efetivação dos
Direitos Fundamentais. Sem a sua participação ativa, a sociedade não
avança na luta por justiça social e respeito aos direitos humanos.

Por isso, é importante que a imprensa tenha consciência da sua


responsabilidade na produção e disseminação de programas, entrevistas
e matérias, que devem garantir o respeito à dignidade humana, à
cidadania e aos valores éticos.

Os meios de comunicação devem adotar uma postura favorável à não-


violência e ao respeito aos valores humanos. Não cabe apenas
denunciar e relatar o fato, mas também cobrar soluções para a questão,
como a punição dos culpados e a exigência de políticas públicas para o
atendimento às vítimas. Para isso, é papel do jornalista uma cobertura
diversificada, exata e plural, conhecendo sobre as legislações e ouvindo
os diversos segmentos da sociedade.

Entretanto, no histórico da imprensa brasileira, os temas jornalísticos


(especialmente os que faziam referências a crianças e adolescentes)
eram apresentados apenas de forma factual. Não eram trazidos dentro
de um contexto explicativo, avaliativo e, até, propositivo. Em alguns
casos, é notória a abordagem onde são descritos atos violentos contra
crianças e adolescentes, sem tratar os mesmos como sujeitos de
direitos.

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A imprensa utilizava de conceitos e formatos antigos para cobrir a
infância e a adolescência, muitos deles forjados na ditadura e
outros herdados de visões que datavam do início do século XX.
(...) O exemplo mais conhecido (e que ainda perdura até hoje) é o
uso da palavra “menor” envolvendo crianças e adolescentes de
baixa renda no País. (Da Árvore à Floresta, Rede ANDI, pág 19)

Essa situação era ainda mais grave quando se abordava a violência


sexual.

Esse tipo de crime traz uma série de dificuldades, como a falta de


informações sobre a temática, a dificuldade na obtenção de
estatísticas oficiais e o mais grave: o preconceito e o receio no
relato desse tipo de caso. (...) Por isso, muitas vezes a abordagem
desse tipo de crime era feita sem analisá-la como fenômeno social
e psicológico e sem a devida cobrança às autoridades para que as
providências fossem tomadas. (O Grito dos Inocentes - Os Meios
de Comunicação e a Violência Sexual contra Crianças e
Adolescentes, Rede ANDI, 2005, pág 23)

O advento do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) em 1990,


além da criação da Agência de Notícia dos Direitos da Infância (Andi),
em 1993, foram pontos fundamentais para o início da mudança dessa
mentalidade. A Andi contribui para a construção, nos meios de
comunicação, de uma cultura que priorize a promoção e defesa dos
direitos da criança e do adolescente, considerando que a
democratização do acesso aos direitos sociais básicos à infância e à
adolescência é condição fundamental para a eqüidade social e para o
desenvolvimento humano.

Em Pernambuco, entidades como o Auçuba Comunicação e Educação


(integrante da Rede ANDI), aposta em ações prioritariamente para a

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promoção e defesa dos direitos de crianças, adolescentes e jovens,
através do potencial pedagógico e mobilizador da comunicação. Vale
destacar também o empenho de outras entidades da sociedade civil que
buscam a atuação da comunicação de maneira inclusiva e de respeito
aos valores humanos.

Foi a sociedade civil, representada por ONG’s, movimentos, fóruns


e conselhos, a grande responsável pelo aumento da mobilização
em torno do problema do abuso e exploração sexual. (...) Ainda
hoje, mesmo com os avanços no tratamento do assunto pelas
instituições governamentais, as organizações da sociedade se
destacam na discussão e adoção de estratégias de enfrentamento
do problema. A sociedade civil focaliza o atendimento a vítimas e
agressores, uma das maiores lacunas das políticas públicas que
vêm sendo implementadas no País. (O Grito dos Inocentes - Os
Meios de Comunicação e a Violência Sexual contra Crianças e
Adolescentes, Rede ANDI, 2005, pág 35)

Como conseqüência desse engajamento, os veículos de comunicação


estão voltando as suas pautas jornalísticas para a inclusão de temas que
abordem os direitos da criança e do adolescente. Estão aparecendo, com
maior freqüência, pautas sobre os direitos em questão. Além do abuso e
da exploração sexual, outros temas chamam a atenção como a violência
doméstica, o trabalho infantil, o orçamento criança, a ressocialização de
adolescentes em conflito com a lei, o abrigamento de crianças e
adolescentes, entre outros.

O trabalho em rede de diversas instituições de comunicação e em várias


cidades brasileiras trouxe uma maior atenção para a procura da
discussão sobre os temas relacionados aos direitos fundamentais de
criança e adolescente. Cada vez mais se reflete a importância de
políticas públicas destinadas para esse segmento. Além disso, a

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imprensa vem incluindo pautas com boas práticas, que ajudam a
minimizar o sofrimento de crianças e adolescentes e mostram os
caminhos que devem ser percorridos para a resolução dessas questões.

As organizações não-governamentais, incluindo os Centros de Defesa de


Direitos da Criança e do Adolescente, são hoje fontes importantes para
os veículos de comunicação. Daí a estratégia dos centros em incluir
profissionais de comunicação em sua equipe.

O comunicador social em um Centro de Defesa deve guiar o seu


trabalho, antes de tudo, dentro do que estabelece a missão institucional.
Não há como um comunicador trabalhar na assessoria de um Centro de
Defesa se não for um militante na causa dos Direitos Humanos e não
conhecer ou estiver associado ao trabalho institucional.

Além disso, deve ter o dinamismo que a profissão exige. Muitas vezes, o
jornalista de um centro de defesa deve ser repórter para buscar e apurar
as informações entre seus colegas de trabalho e entidades parceiras.
Deve ser editor, quando prepara o informativo da organização. Deve,
até, conhecer sobre diagramação e projeto gráfico. Como assessor de
imprensa, deve ter ótimo relacionamento entre os profissionais de
comunicação.

O comunicador tem que conhecer a atuação de cada membro do


projeto. Deve ter a habilidade para atuar em várias áreas da organização
e acompanhar as decisões estratégicas. Especialmente, quando se está
em jogo a imagem institucional. Por desempenhar uma atividade que
influencia todas as áreas que aborda, deve ter mais do que apenas o
domínio da técnica. Deve compreender a extensão dos efeitos, funções
e motivações da sua prática profissional. Este talvez seja o maior
segredo para o sucesso do seu trabalho.

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Hoje, os Centros de Defesa são muito mais procurados para falar na
imprensa sobre as violações de direitos sofridos por crianças e
adolescentes, especialmente nos enfoques da violência doméstica e
sexual. Nesse ponto, é importante para a instituição ter uma equipe
técnica que esteja preparada e orientada para saber o que falar e como
falar.

Para quem atua em um Centro de Defesa, é desafio trabalhar a


comunicação no sentido do fortalecimento da visibilidade institucional e
das temáticas que atua. Mas também é importante fortalecer o papel
organizacional da comunicação, inserindo o tema dentro do ambiente
institucional e como instrumento de defesa dos direitos humanos.

Em relação à atuação junto aos meios de comunicação, deve-se


trabalhar para manter o relacionamento com a imprensa. No entanto,
isso não deve ser feito apenas dentro da perspectiva de visibilizar a
instituição ou o tema. É ponto importante trabalhar incessantemente
para a qualificação da cobertura jornalística dos direitos de crianças e
adolescentes.

O Centro Dom Helder Camara de Estudos e Ação Social-Cendhec, espaço


onde atuo, é reconhecido como centro de defesa de direitos humanos,
com sede na cidade do Recife, e desde 2005 percebeu a comunicação
como estratégia importante para a publicização de suas ações, bem
como para fortalecer a capacidade de ação e articulação institucional,
visando o enfrentamento da violência contra crianças e adolescentes e o
direito à moradia da população.

O Cendhec está presente na mídia, sempre com posicionamentos em


questões relacionadas à violação de direitos humanos de crianças e
adolescentes. Colabora nas ações de divulgação das campanhas e
mobilizações realizadas no estado de Pernambuco, relacionadas ao

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combate da violência sexual, à prevenção e enfrentamento do trabalho
infantil e a luta contra a proposta de redução da maioridade penal. São
bandeiras defendidas junto aos diversos espaços em que o Cendhec
vem atuando.

Para finalizar, não se deve esquecer o nosso papel, enquanto


comunicador social, na necessidade de estar presente nas discussões
pela luta da democratização dos meios de comunicação e na defesa da
comunicação como um Direito Humano, que promova o respeito aos
valores humanos e à dignidade do cidadão.

Paulo Lago
Jornalista
Assessor de Comunicação do Centro Dom Helder Camara de Estudos e Ação
Social-Cendhec

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
 O Grito dos Inocentes - Os Meios de Comunicação e a
Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes. Série Mídia
e Mobilização Social (Vol. 5). Rede ANDI, 2002.

 Da Árvore à Floresta: A história da Rede ANDI Brasil. ANDI e


Rede ANDI, 2005.

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