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O Projeto Geopolítico para o Império do Brasil: do Atlântico Sul ao Mar da China.


Renato Pereira Brandão *

Referência: Anais do IV Simpósio Internacional de Estudos Sobre América Colonial -


Encontro Caso 2008. CD ROM. Belo Horizonte. 2008. ISBN 978-85-886699-21.

Introdução
Em relação à história de Portugal, com referência à nossa historiografia colonial,
permanece ainda predominante a versão de que a relação econômica de Portugal com a
Inglaterra, quando da transferência da Família Real, era de dependência, ou mesmo de
subordinação. Esta dependência seria conseqüência dos termos do Tratado Methuen, onde
foram garantidos privilégios alfandegários para o vinho português na Inglaterra, em
contrapartida à abertura do mercado português para os tecidos manufaturados ingleses. Esta
relação desigual acabou por gerar um déficit na balança comercial de Portugal, coberto,
principalmente, pelo ouro extraído do Brasil (1). Contudo, Simonsen, ainda nos meados do
século passado, tinha já apresentado dados estatísticos que demonstram a improcedência
desta interpretação, pois se é verdade que esta balança comercial tendia de forma
expressivamente favorável para a Inglaterra nos meados do século XVIII, paradoxalmente,
na medida em que houve o esgotamento da maior parte do ouro de Minas Gerais, Portugal
foi equilibrando sua balança comercial, a ponto de, já no final do século, ser superavitária,
situação em que permaneceu até o momento da transferência da Família Real (2).
Recentemente, Arruda retomou esta perspectiva ao reafirmar a vitalidade da economia
portuguesa no início do século XIX, que, para ele, era devida, primordialmente, a
reexportação de produtos agrícolas brasileiros, por parte da metrópole. Considera ainda que
a dependência frente aos britânicos seja conseqüência da transferência da Corte para o
Brasil, o que veio a favorecer, principalmente, aos interesses mercantis britânicos, devido à
forma perspicaz com que foi estabelecido, a favor dos ingleses, os termos da Convenção
Secreta de Londres (3).
O nosso objetivo é de ampliar esta discussão, procurando demonstrar que os interesses
envolvidos neste episódio extrapolam a relação bilateral Brasil-Portugal, e que a concepção

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Professor Titular da UNESA – RJ
Doutor em História pela UFF
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de Império, justaposta ao Brasil por D. João VI, não tinha como referência única às
dimensões territoriais continentais, mas também a um projeto geopolítico de transferência
do centro administrativo do império ultramarino, visando fortalecer o papel do Atlântico
Sul como eixo integrador na relação com o complexo mercantil Índico-Mar da China.

1- O Tratado de Methuen e a “Dependência” Econômica de Portugal


Nesta perspectiva da não dependência econômica de Portugal em relação à
Inglaterra, inicialmente sobressalta a questão referente à identificação do processo que
permitiu Portugal, em poucas décadas, reverter uma situação de expressivo déficit em
superávit. Ou seja, o ouro que tinha saído do Brasil no meado do século XVIII, passado por
Portugal e chegado na Inglaterra, no início do século XIX fazia o percurso inverso,
voltando para o Brasil (4).
Ao abordar esta questão, devemos, inicialmente, fazer uma ressalva a respeito de
um freqüente equívoco em referência ao Tratado de Methuen. O produto inglês favorecido
com tarifa menor, em contrapartida ao vinho português, foi, exclusivamente, o tecido de lã,
e não os produtos têxteis em geral (5). Esta ressalva é fundamental, pois, como diz Morton,
ao se referir a Revolução Industrial na Inglaterra, “apesar do extraordinário avanço obtido,
não foi na indústria de lã que se verificou o progresso decisivo, mas na do algodão,
indústria mais nova, mais concentrada e, desde o início, mais capitalista” (6).
Novais, reconhecendo o momento favorável da economia portuguesa no final do
século XVIII, considera que esta fase era devida, quase que exclusivamente, à expansão da
agricultura no Brasil (7). Contudo, a reexportação dos produtos agrícolas brasileiros
representava somente cerca da metade do total, onde a outra metade era formada por
manufaturados do Reino e, em menor porção, produtos oriundos de outras colônias (8).
Assim, em paralelo aos investimentos na agricultura no Brasil, a partir do meado do
século XVIII, o Estado português passou também a atuar diretamente na expansão da
manufaturas portuguesas. Sob sua égide foram fundadas diversas fábricas, como a Real
Fábrica das Sedas de Lisboa, a de tecidos de Alcobaça, de louça também em Lisboa, de
chapéu em Pombal, os de lanifícios em Fundão e Portalegre, além de patrocinar a
contratação de mestres estrangeiros, principalmente da França, Inglaterra e Itália (9). Desta
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maneira, o fomento das manufaturas em Portugal concomitante ao da lavoura no Brasil,


durante o período deficitário, possibilitou, posteriormente, que o algodão brasileiro fosse
exportando para a Inglaterra, sem a contrapartida da importação de diversos manufaturados
britânicos, inclusive têxteis. Entende-se assim a razão da petição, em 1788, dos tecelões de
algodão e fabricantes de cambraia e chita de Manchester, reivindicando um novo tratado
com Portugal, em substituição ao de Methuen, onde as manufaturas têxteis fossem também
favorecidas (10).
Sabendo-se então que a importação de têxteis britânicos não foi a principal
responsável pelo desequilíbrio da balança comercial anglo-portuguesa no meado do século
XVIII, enquanto as reformas econômicas estavam em implantação, nos cabe perguntar
sobre os outros produtos responsáveis por tamanho desequilíbrio, coberto pelo ouro do
Brasil. Serrão nos dá uma importante pista, a partir do quadro de “Principais parceiros
comerciais e composição das trocas na primeira metade do século XVIII” (11). Neste,
vemos que Portugal importou, dentre outros produtos, cobre, ferro, cordame, ferragens e
pólvora da Inglaterra. Artigos náuticos, madeiras e produtos de cobre e ferro da Holanda,
enquanto da Escandinávia importou enxárcia, ferro e tabuado. Vemos assim, claramente,
que parte do déficit se referia aos investimentos necessários para a recuperação da marinha
portuguesa (12), imprescindível para a manutenção e fomento de um, ainda vasto, império
ultramarino (13). Este processo, contudo, não ficou restrito às condições materiais nem à
política pombalina. No reinado de D. Maria I, em 1779, é instituído a Aula de Piloto, curso
para a formação de pilotos náuticos. Pouco depois, em 1781 é criada a Companhia de
Guardas-Marinhas, depois Escola Naval, voltada para a formação de oficiais da marinha.
Deste modo, antes e mesmo depois de Pombal, grandes esforços foram direcionados para a
recuperação da força naval portuguesa, militar e mercantil, praticamente aniquilada ao
longo do período da União Ibérica. Ao longo do século XVIII, na medida em que aumenta
o número de navios construídos e sua frota reconstituída, Portugal vai retomando e
incrementando o comércio com suas possessões asiáticas (14).
Podemos identificar, também, um outro fator responsável pelo expressivo déficit na
balança de pagamento portuguesa no meado do século XVIII. Sabemos que era usual a
prática de contrabando com a América Espanhola, feita principalmente através da Colônia
de Sacramento, na Bacia do Rio da Prata, ligada administrativamente a Capitania do Rio de
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Janeiro. Por esta rota de contrabando, a América Espanhola era abastecida não somente por
produtos brasileiros e portugueses, como de escravos, obtidos como paga do fornecimento
de aguardente e tabaco brasileiros para a África, e também de manufaturados ingleses,
adquiridos com o ouro saído do Brasil. O meio circulante neste circuito mercantil era a
cobiçada pataca espanhola, moeda cunhada com a prata oriunda das minas do Alto Peru
(15).
Deste modo, se no déficit da balança comercial com a Inglaterra está expresso o
custo dos produtos enviados para o comércio feito entre a colônia de Sacramento e Buenos
Aires, por outro lado, por ser negociado na forma de contrabando, este déficit não está
devidamente compensado, como lucro, na balança comercial oficial de Portugal.
Além do evidente lucro na reexportação dos produtos ingleses para a América
Hispânica, a conseqüente conversão do ouro de Minas Gerais em prata era de importância
fundamental para o complexo mercantil asiático do império ultramarino português. Na
Ásia, as moedas cunhadas em prata tinham, em relação ao ouro, um valor
proporcionalmente maior (16).
Portanto, ao levar em consideração que no déficit apresentado no trato mercantil
português do meado do século XVIII estão expressos os recursos investidos na implantação
de complexo manufatureiro, na expansão do comércio asiático e na recuperação da marinha
mercante e de guerra, além de não expressar os lucros obtidos no comércio estabelecido na
América entre os domínios de Espanha e Portugal, podemos observar que neste déficit
estava sendo gestado o futuro superávit.

2- Macau e os Interesses Britânicos na China.


Com o avanço dos ingleses na Índia e com a tomada de Mascate e Ceilão pelos
holandeses, os interesses portugueses na Ásia se voltaram, principalmente, para a China,
onde a Coroa tinha a posse de Macau (17). Este privilégio, único dentre os ocidentais,
assegurava aos portugueses uma vantagem definitiva frente aos outros mercadores
europeus, obrigados a negociar unicamente dentro de limites estabelecidos na cidade de
Cantão (18).
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Da China, Portugal importava, principalmente, seda, porcelana, chá e algumas


especiarias, como a canela do Laos, e móveis. Por outro lado, afora as patacas de prata (19),
o mercado chinês pouco se interessava por produtos europeus, sendo o fumo brasileiro um
desses poucos produtos a ter demanda neste mercado.
Em 1709, a Coroa estabeleceu uma carreira de Macau direto ao Brasil, sem passar
por Goa, vendendo aqui uma quantidade considerável de produtos de seda. Em 1727, o rei
de Portugal enviou uma missão ao imperador da China, a fim de estabelecer o trato do
tabaco brasileiro. No ano seguinte, chegou a Lisboa um navio vindo de Macau com 600
mil cruzados em ouro, 200 caixas de sedas chinesas, 140 caixas de porcelanas, quantidades
de obras de marcenaria lacada. Segundo Godinho, o valor médio de cada carga de retorno
da Ásia no início do séc. XIX é de 1 milhão de cruzados sendo os retornos mais ricos de
Bengala e da China, que constituem o grosso da carga. Apesar do aparente déficit, este
mercado tornou-se vantajoso, principalmente, porque “os mercadores portugueses
convencem os Chineses a comprar quantidades crescentes de tabaco, o que reduz a parte
das espécies argênteas” (20).
Assim, dentro do contexto do império português, Macau não estava ligado
unicamente à metrópole, mas também ao complexo mercantil do Atlântico Sul, não só por
ser o Brasil o intermediário na aquisição da prata hispânica, mas também como fornecedor
de tabaco, que tinha na China o principal mercado asiático.
Todavia, a partir da segunda metade do século XVIII, o mercado chinês se tornou
cada vez mais importante também para a Inglaterra, devido ao incremento do consumo do
chá na sociedade inglesa. Para compensar tal despesa, a Companhia das Índias Orientais
Britânica se voltou para o lucrativo mercado do ópio, procurando incrementar a exportação
deste entorpecente, que era produzido na Índia, para a China (21).
Em 1793, ano em que Luís XVI foi guilhotinado, o monarca britânico envia ao
imperador da China Kien-Long uma grande embaixada sob o comando de Lorde
Macartney, com a finalidade de deixar em Pequim um encarregado de negócios e fazer um
tratado de comércio que permitisse aos ingleses negociarem em outras cidades, além de
Cantão. Contudo, o imperador nada concedeu aos ingleses. Em 1802, no desenrolar das
guerras napoleônicas, enquanto Portugal deveria ter na Inglaterra uma fiel aliada, o
governador geral da Índia Lorde Weslleley, irmão mais velho do futuro Duque de
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Wellington, enviou uma expedição militar britânica de Bengala a China, para tomar Macau
de seus “aliados” portugueses. Contudo, as autoridades chinesas de Cantão impediram a
investida britânica (22).
Em 1805, Napoleão encaminha ao Príncipe Regente uma nota diplomática exigindo
declaração de guerra de Portugal à Grã-Bretanha. Ao responder, D. João procura mostrar
do equívoco da política francesa em relação a Portugal, alertando que a declaração de
guerra poderia acabar por atender aos interesses da Inglaterra: “Vossa Magestade sabe que
a monarquia portuguesa se compõe de estados espalhados nas quatro partes do globo, que
ficariam inteiramente expostos, no caso de uma guerra com a Grã-Bretanha”. Pouco
depois, por uma nota da secretaria de estado dos negócios estrangeiros, declara a disposição
de manter Portugal em estrita neutralidade (23).
No ano seguinte, Napoleão decreta o bloqueio continental à Inglaterra. Em 1807, após
assinar o Tratado de Tilsit com a Rússia e Prússia, no qual estes aderem ao bloqueio
continental, Napoleão ordena que Portugal feche seus portos à Inglaterra a partir de 1° de
setembro. O governo inglês, por sua parte, passou a pressionar o Príncipe Regente para que
fugisse para o Brasil, em companhia da Família Real, caso as forças franco-espanholas
invadissem o Reino. Em 22 de outubro, Sousa Coutinho e George Canning, ministros
plenipotenciários de Portugal e Inglaterra, assinam a famosa Convenção Secreta de
Londres, na qual ficou estabelecida a proteção inglesa, para o caso da fuga do Príncipe
Regente e da Família Real para o Brasil.

3- Da Fuga da Família Real a Transferência da Corte: A Convenção e a Ameaça Britânica


ao Império.
Inicialmente, devemos observar que, em nenhum momento, esta Convenção se refere
à transferência da Corte, mas unicamente do Príncipe Regente e da Família Real. Contudo,
o mais importante nela a observar são as condições que a Inglaterra impõe a Portugal que,
se obedecidas, colocaria a Coroa refém da Inglaterra, isolada no Brasil sob a “proteção”
britânica. Esta estratégia está claramente explicita no Art. I, ao determinar que D. João
estaria impedido de enviar algum reforço de tropa para o Brasil e para as Ilhas Madeira.
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Explicitando ainda que esta Convenção tem como um dos principais objetivos o de
impedir que a marinha de Portugal, no todo ou em parte, viesse a cair em mãos francesas, o
Artigo V determina que, no caso do fechamento dos portos portugueses à Inglaterra, o
Príncipe deveria mandar de imediato a metade da sua esquadra para o Brasil que, ao aqui
chegar, deveria ser desarmada. Quanto à outra metade, esta deveria permanecer no porto de
Lisboa, e a primeira indicação de hostilidade por parte dos franceses ou espanhóis, deveria
se reunir à esquadra britânica, sob o comando de um oficial de confiança das autoridades
inglesas (24).
Como ambas alternativas certamente viriam a ocorrer, óbvio ver, inclusive para o
Príncipe Regente, que esta Convenção Secreta foi um instrumento elaborado pelo governo
britânico para isolar, do restante do império, a Coroa de Portugal no Brasil, onde ficaria
desprovida de seu exército e marinha, dependente, portanto, da “proteção” britânica.
Isolando o restante do império, incluindo Macau, este certamente cairia em mãos britânicas.
Por não ter D. João respeitado os termos desta Convenção, e por ter cedido ainda às
ameaças de Napoleão, ao aderir a Bloqueio Continental e expulsar os ingleses de Portugal,
a Inglaterra acabou por decretar o bloqueio ao porto de Lisboa, em 22 de novembro,
posicionando uma esquadra na barra do Tejo, sob o comando do contra-almirante Sydney
Smith.
Deste modo, o desafio que se impões ao Príncipe Regente, na preservação do império
frente às ameaças francesa e britânica, era fazer chegar ao Brasil não só a Família Real, a
bordo da esquadra portuguesa, como também a frota mercante e todo o corpo burocrático
responsável pela administração do Reino e do Ultramar. Acompanhado, ainda, dos acervos
documentais legislativo e administrativo, imprescindíveis para a continuidade do
gerenciamento do Estado e Império.
Sabemos que estes objetivos foram alcançadas, pois, ao se deparar com quase toda a
esquadra portuguesa acompanhada por diversos navios mercantes, todos abarrotados de
cortesãos, incluindo mulheres e crianças, só restou ao contra-almirante Sidney Smith abrir
passagem para este inusitado comboio marítimo, que trazia ainda em seu bojo todo o
conjunto documental administrativo estatal, devidamente organizado e catalogado (25).
Certamente acreditando que a notícia da transferência de toda a Corte, e não somente
da Família Real, demoraria a chegar ao longínquo Macau, ainda neste mesmo ano de 1808,
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quando a Corte ainda aqui se instalava, os britânicos prepararam uma nova frota para tomar
Macau dos portugueses. Em 11 de setembro, o almirante Drury aportou em Macau,
entregando uma intimação de Lorde Minton ao governador Bernardo Aleixo, onde se refere
“aos desastres de Portugal”, exigindo a entrega da cidade aos “protetores britânicos”. O
governador, por sua vez, se negou a acatar tal intimação “em quanto não chegam ordens do
Brazil, ou de Goa” (26). Como tal ordem não chegava, já que nunca foi emitida pelo
Príncipe Regente, o almirante Drury ameaçou tomar Macau à força. Os portugueses,
contudo, resistiram, apesar de “ameaçados, pelo almirante inglez, de serem atacados á
bayoneta” (27). Após três meses na tentativa de tomar Macau por ameaça e persuasão,
Drury desembarcou sua tropa, para tomá-la “pela baioneta”. Porém, se deparou com uma
linha militar chinesa, pronta a enfrentá-lo. Ao ter um dos seus homens atingido pelo fogo
da tropa chinesa, Drury optou por recuar, embarcando novamente a tropa. Por fim, o
almirante britânico partiu com sua frota da China em 22 de dezembro de 1808, de volta
para Bengala (28).

Considerações Finais
Consideramos que, ao D. João fazer com que a esperada fuga da Família Real,
conforme planejada pela diplomacia britânica, se transformasse em uma transferência de
todo um aparato de Estado, teria sido quem, neste episódio, conseguiu verdadeiramente
alcançar sua meta principal, e não Canning, como acredita Arruda. Assim, a combinação
entre a aparente hesitação e a perspicácia portuguesa acabou por superar a combinação
entre a pressão militar e a diligência inglesa.
A contra partida, todavia, não se fez muito esperar. O Tratado de 1810 e a Guerra do
Ópio foi a resposta da Coroa britânica no revés sofrido, ao procurar colocar o Brasil na
condição de sua semi colônia e usurpar Macau do império ultramarino português.
Acreditamos, ainda, que esta contra partida se fará presente no processo de reconhecimento
da independência do Brasil, da qual restou-nos a pompa do nome Império, porém destituído
de seu significado de centralizador e articulador do ainda extenso domínio ultramarino que,
neste momento, não seria mais exclusivamente português, mas sim luso-brasileiro.
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NOTAS

1- JÚNIOR, José Ribeiro. Problemas da acumulação capitalista em Portugal. Lisboa:


Livros Horizontes, 1980, p. 27: “A economia lusa continental assentava (durante o
reinado de D. José I), tradicionalmente, na exportação de produtos, como vinho, azeite,
cortiça, sal, frutas e outros produtos de menor importância. Importava manufacturas e
produtos alimentícios. Sua balança comercial era deficitária, sendo os seus saldos
devedores, principalmente ao tempo de D. João V, coberto com ouro do Brasil. Essa
forma de transferência impediu sempre que o ouro pudesse ser investido em Portugal,
propiciando um desenvolvimento de sua infra-estrutura produtiva. O país mais
beneficiado, durante todo o século XVIII e parte do XIX foi, sem dúvida, a Inglaterra.
Esta era a principal fornecedora de bens de consumo a Portugal, principalmente após
o Tratado de Methuen (1703)”. FRANK, André Gunder. Acumulação mundial 1492-
1789. Rio de Janeiro: Zahar, 1977, p. 151. “(...) regulamentava (o Tratado de Methuen)
a troca de tecidos ingleses por vinho português (...) abrindo mercado certo e firme aos
têxteis ingleses que, em sua maioria, eram pagos em ouro”. MAXWELL, Kenneth.
Marques de Pombal: paradoxo do iluminismo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, p. 46: “(...) o
tratado de 1654 e os subseqüentes proporcionaram um ambiente favorável para a
criação do estado de dependência semicolonial, no qual o Portugal de meados do
século XVIII encontrou-se em relação ao seu aliado do Norte”. Dentre os nossos
historiadores, podemos citar: ALBUQUERQUE, Manuel Maurício de. Pequena história
da formação social brasileira. Rio de Janeiro: Graal, 1981, p. 252, SILVA, Francisco
Carlos Teixeira da. Conquista e Colonização da América Portuguesa, o Brasil Colônia –
1500/1750. In LINHARES, Maria Yedda (org.). História geral do Brasil. Rio de
Janeiro: Campus,1966, 6º ed., p.49.

2- Cf. SIMONSEN, Roberto C. História econômica do Brasil (1500/1820). São Paulo:


Companhia Editora Nacional, 1957. No “Quadro do comércio de Portugal com as
nações estrangeiras de 1796 a 1819”, por ele apresentado na página 456, podemos
observar que, no período de 1796 a 1809, a balança comercial portuguesa se mostrou
deficitária somente nos anos de 1797 e 1799, sendo de cerca de 40.000 contos de réis o
saldo acumulado neste período. Já o “Quadro geral do valor das mercadorias
estrangeiras importadas e exportadas no reino de Portugal” , na página seguinte, nos
mostra que em 1796 a balança comercial entre Portugal e Inglaterra se mostrava
praticamente equilibrada, enquanto em 1806 era favorável a Portugal em mais de 1 600
contos de réis. Neste mesmo ano, o saldo positivo total para Portugal foi de quase 7 000
contos de réis. Estes quadros estatísticos foram inicialmente publicados em: BALBI,
Adrien. Essai statistique sur lê royaume de Portugal et D´Algarve compare aux autre
etats de L´Europe. Paris: Rey et Gravier, 1822, p. 441, 431. Balbi publicou os valores
em cruzados, que Simonsen converteu a razão de 2,50 cruzados para 1 mil réis. Apesar
de Simonsen ter sido o primeiro a publicar os quadros estatísticos de Balbi, não teve
porém a primazia, entre nós, em apontar a situação superavitária da economia
portuguesa no início do século XIX. Pereira da Silva tinha já, ainda no século XIX, isto
10

demonstrado, informando que no ano de 1806 a balança comercial portuguesa teve o


superávit de 6 841: 583$ 360 reis. Cf. SILVA, J. M. Pereira da. História da fundação do
Império Brazileiro. Rio de Janeiro: Garnier, 1864, p. 79.

3- ARRUDA, José Jobson de Andrade. Uma colônia entre dois impérios: a abertura dos
portos brasileiros 1800-1808. Bauru: Edusc, 2008, pp. 39-40; 68. “A meta principal
fora alcançada, o desejo de Canning consumado. A combinação entre pressão militar e
diligências diplomáticas teve êxito. (...) Arguto diplomata, Stranford buscava
esconjurar os temores de D. João, oferecendo-lhe a perspectiva de um futuro seguro,
cuja a finalidade última era a consecução do projeto que a todos mobilizava no
Foreign Office, a transferência da Corte portuguesa para o Brasil, tanto que, reflete
Stanford, o conhecimento do Soberano português lhe permitia cogitar que, “habituados
às oscilações do espírito do Príncipe e aos seus sentimentos de gratidão e respeito em
relação à Sua Majestade Britânica”, estava seguro de que, ao relembrá-lo, defendia
para a Inglaterra o direito de “estabelecer com o Brasil relações de soberano e
vassalo e exigir obediência a ser paga como o preço da proteção”. A tanto não
chegamos. A Inglaterra não se tornou soberana e o Brasil vassalo, mas pagou um alto
preço pela proteção. (...) Foram exatamente dessas vantagens auferidas (no comércio
com o Brasil) durante séculos pelos portugueses que os ingleses se apropriaram,
invertendo novamente a balança em relação a Portugal, passando a ter saldos
positivos. Os superávits da colônia brasileira desapareceram. Os déficits significativos
e crescentes passaram a definir a balança comercial”.

4- Maxwell, referindo-se a relação mercantil anglo-lusa no final do século XIX, diz: “tão
radicalmente tinham mudado os termos de intercâmbio que não só os mercadores
portugueses metropolitanos eram forçados a mandar moeda para o Brasil como os
ingleses tinham de mandar ouro para Lisboa”. Maxwell reproduz ainda uma
correspondência onde Robert Walpole trata deste assunto com Lorde Grenville, em
outubro de 1791, que, dado a sua importância, aqui também a reproduzimos: “Isto pode
ser considerado como uma espécie de fenômeno, a remessa de ouro da Inglaterra para
Portugal; o último exemplo disto foi uma remessa de cerca de 10 mil libras, mas é
provável que mais seja remetido. E não é fenômeno menor a remessa de dinheiro de
Lisboa para o Brasil. Portugal mandando mais mercadorias à Inglaterra do que recebe
faz com que o saldo deva ser quitado em dinheiro. O Brasil, do mesmo modo,
mandando uma quantidade do que produz maior do que recebida de Portugal faz com
que o saldo, também, seja pago assim... Atualmente a Inglaterra deve muito a
Portugal”. Cf. MAXWELL, Kenneth. A Devassa da devassa: a inconfidência mineira,
Brasil – Portugal, 1750-1808. Rio de Janeiro: Paz e terra, 1977, p. 208.

5- SERRÃO, Joaquim Veríssimo. História de Portugal. Lisboa: Verbo, 1979, p. 229, v. 5.


“(....) daqui em diante no Reyno de Portugal os Panos de lãa, e mais fábricas de
lanificio de Inglaterra, como era costume até o tempo que forão proibidos pelas Leys”.
O bispo brasileiro Azeredo Coutinho a ele se refere correctamente. COUTINHO, J. J.
da Cunha Azeredo. Ensaio econômico sobre o commercio de Portugal e suas colônias
[1816]. In Obras econômicas de J. J. da Cunha Azeredo Coutinho (1794-1804). São
Paulo: Comp. Ed. Nacional, 1966, p. 166: “Tratado de 1703 não é mais do que um
simples Tratado de Comércio, e não é relativo a algum outro de paz. Por este Tratado,
11

Portugal só se obrigou a permitir a entrada dos lanifícios da Inglaterra nos seus


Estados sem pagar mais direitos do que os que pagavam antes da proibição da entrada
dos lanifícios estrangeiros em Portugal”. Quanto ao costumeiro equívoco, interessante
observar este em Lúcio de Azevedo. Ao se referir ao Tratado, inicialmente o faz aos
panos e outras manufaturas de lã. Contudo, logo após, o interpreta como referido aos
tecidos britânicos, em geral. AZEVEDO, J. Lúcio de. Épocas de Portugal Econômico.
Lisboa: Livraria Clássica Ed. 1973, p. 396: “O tratado de Methuen, muito mais falado
que conhecido, consta de três artigos somentes, claros e concisos, e cuja precisão faz
honra ao sendo prático de quem o elaborou. Pelo artigo 1º, Portugal obriga-se para
sempre a admitir os panos e outras manufacturas de lã britânica, cuja importação se
proibia anos antes, qualquer que fosse a procedência (...) A Inglaterra conquista
(devido ao Tratado) outro mercado para os seus tecidos, de cuja indústria zela com
afan as prosperidades”.

6 - MORTON, A. L. A história do povo inglês. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, p.


294.

7- NOVAIS, Fernando A. Portugal e Brasil na crise colonial do antigo sistema colonial


(1777-1808). São Paulo: Hucitec, 1979, p. 293-4: “Se considerarmos, agora, que toda
essa recuperação do comércio externo português se fêz com produtos coloniais
brasileiros, o que permitiu entre 1787 e 1796 inverter a tendência tradicional nas
relações mercantis portuguesas com as demais nações, fica indicado que a produção se
dinamizou amplamente na colônia neste período”.

8- SIMONSEN, Opus cit., p. 431: “O comércio luso-brasileiro, de 1796 a 1807,


apresentou, em média, uma exportação do Brasil superior a £ 3.000.000. Em 1801, a
exportação subiu a mais de £ 4.000.000. Salvo raras exceções, o saldo da balança de
comércio foi quase sempre favorável ao Brasil. O comércio de Portugal com as demais
nações européias apresentava, nesse período, um ativo de exportação de $ 6.000.000,
em medial. Nesse total, os produtos brasileiros figuravam com cerca de 50%”.

9- Cf. RIBEIRO JÚNIOR, José. Opus cit., p. 123. BOXER, C. R. O império colonial
português (1415-1825). Lisboa, Edições 70, 1981, p. 183: “Desejoso (Pombal) de
reduzir a importação de produtos manufacturados e de matérias-primas estrangeiras,
especialmente com a queda da produção do ouro brasileiro depois de 1760, criou ou
fez reviver várias indústrias regionais e fundou um certo número de companhias
comerciais que tinham a protecção real”.

10- MAXWELL, Kenneth. A Devassa da devassa: a Inconfidência Mineira, Brasil –


Portugal, 1750-1808. Rio de Janeiro, Paz e terra, 1977, p. 209.: “Os tecelões de
algodão e os fabricantes de cambraia e de chita, de Manchester e cercanias, os
magnatas de Borough e os alcaides de Manchester elaboraram uma petição em 1788
para que “uma associação promotora de vendas de manufaturas inglesas de
algodão” fosse fundada, pretendendo-se particularmente que fosse acertado um novo
tratado com Portugal. O objetivo inglês era óbvio: substituir e ampliar as
estipulações do Tratado de Methuen era uma necessidade, conforme o Conselho
Privado do Comércio observara em 1790, porque “ao lanifícios ... era (em 1703)
12

quase que as únicas manufaturas pelas quais a Grã-Bretanha se distinguia: mas


agora há tantas fábricas neste país, criadas desde então e já muito prósperas, por
isto mesmo merecedoras de atenção e proteção do governo, e não seria correto na
opinião da comissão (do Conselho Privado do Comércio) concluir um novo tratado
de comércio com Portugal sem conseguir justas e razoáveis condições que
favorecessem tais manufaturas.” Pouco depois, em 1790, petição semelhante foi
encaminhada pelo Conselho Privado de Comércio da Grã-Bretanha

11- SERRÃO, José Vicente. O quadro económico: configurações estruturais e tendências


de evolução. In Mattoso, José (direcção). História de Portugal. Lisboa: Editorial
Estampa, 1998, vol. 4, p. 104.

12- Ibidem, p. 107; 110: “Observar que entre os itens importados por Portugal estavam,
além dos tecidos de lã (que variaram de 9 a 23% no período de 1700 a 1770 (citando
Fisher), diversos outros produtos , dentre os quais ferro forjado, ferragens, pólvora,
ferro e cobre, sem dúvidas, em grande parte a ser utilizada na construção e
equipagem dos navios da Carreira da India.(...) Por seu turno, desde 1784 até 1807
estão anualmente envolvidos na carreira da Índia de oito até vinte navios, ao
contrário dos dois ou três que, desde o século XVII, se haviam tornado a norma.”
Azeredo Coutinho considerava que o complexo naval deferia ser considerado, e assim
receber a atenção do Estado, como uma imensa manufatura. COUTINHO, J. J. da
Cunha Azeredo. Opus cit.. p. 81-2: “Aquêles que têm visto construir e equipar navios,
sabem quantos obreiros de diferentes misteres são neles empregados. Carpinteiros,
calafates, mestres de velame, cordoeiros, tecelões, ferreiros, marceneiros, armeiros,
pintores, torneiros, vidraceiros, escultores e uma infinidade de outros muitos artistas
concorrem a pôr um só navio em estado de sair ao mar. Muitas produções de um
país, como o ferros, o linho-cânhamo, e todos os gêneros próprio para cordas e
amarras, a madeira, o alcatrão, o breu, etc (...) entram na fábrica de um navio o que
tudo aumenta o consumo geral de um modo muito vantajoso para o Estado: debaixo
deste ponto de vista, a navegação deve ser olhada como uma imensa manufatura e,
como tal, merece as mesmas atenções que as primeiras manufaturas do Estado”.

13- Apesar da luta pelo fim da União Ibérica e Restauração da Coroa de Portugal ter
resultado na perda de parte das conquistas asiáticas, tanto tomadas a manu militaris pela
Holanda, como no caso do Ceilão e Malaca, quer por força de acordo, como no caso de
Bombain, na Índia, entregue à Inglaterra por força do Tratado de Whitehall , a Coroa de
Portugal conseguia ainda manter, no início do século XIX, importantes conquistas.
Dentre as mais importantes temos Moçambique, na costa de Zanzibar, na África
Oriental, cujo comércio estava ligado diretamente a Goa, sede do vice-reinado da Índia,
onde ainda possuía Diu, no reino de Guzerate, Damão, na foz do Golfo de Cambaia, e
Cananor, na costa do Malabar. Na Oceania, apesar da perda das Molucas para os
holandeses, tinha ainda a posse de Timor, e, finalmente, Macau, na China.

14-GODINHO, Vitorino Magalhães. Rota do Cabo. In Serrão, Joel (dir.) Dicionário de


História de Portugal. Porto, Figueirinhas, 1981, vol. 5, p. 389-390,: “Em vez dos dois,
quando muito três navios que anualmente , durante o século XVII e os três primeiros
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quartéis do século XVIII, iam de Lisboa para o Índico e de lá regressavam,


bruscamente são 8 e 10, ou até 20 os que desferram do Tejo e aqui voltam a ancorar”.

15- BARRETO, Antônio E. Muniz. O fluxo de moedas entre o Rio da Prata e Brasil (1800-
1850). Revista de História, São Paulo, vol. 51, p. 207-227,1975, p. 209: “Se Buenos
Aires tornou-se numa segunda opção de saida para a Europa, converteu-se também
num centro de contrabando da prata peruana. E foi como comerciantes e
contrabandistas no Prata que os portugueses conseguiram participar das vantagens
econômicas oferecidas pelos metais preciosos.(...) O Prata entrava nesse comércio
fornecendo produtos fundamentais ligados às suas atividades pecuárias. (...) O Brasil,
por sua vez, fornecia açúcar, erva-mate, farinha de mandioca, amido, café, doces,
aguardentes, fumo, arroz, madeiras, cascarilha, entre outros produtos. Nas teve papel
relevante como fornecedor de produtos industrializados, comprados basicamente na
Inglaterra, funcionando como centro reexportador, o Brasil oferecia grande variedade
de tecidos e artigos de vestuário, tanto de luxo como rústico, além de ferramentas,
máquinas simples e utensílios, remédios e drogas”. SZMRECSÁNYI, Tamás. Retomando
a questão do início da historiografia econômica no Brasil. Nova Economia. Belo
Horizonte v.14, n. 1, p. 11-37, janeiro-abril de 2004, p.28 : “(...) Alice Canabrava
descreve com detalhes as duas rotas comerciais que partiam de Buenos Aires no período
colonial; o caminho do Chile e o caminho do Peru, caminhos cuja bifurcação se dava após os
primeiros 500 quilômetros. Enquanto aquele atingia Santiago a sudoeste, o segundo não se
limitava a ir até Potosi, mas continuava até Lima a noroeste. Ao lado desses dois caminhos
dominados pela Espanha, havia ainda a via terrestre do Guairá, que unia a colônia portuguesa
de São Vicente aos núcleos jesuíticos do Paraguai, e que seria também prolongada até Potosi,
resultando na fundação da atual cidade boliviana de Santa Cruz de la Sierra. A principal
mercadoria que seguia por todos esses caminhos, particularmente pelos dois primeiros, eram
os escravos, cada vez mais de origem africana, importados diretamente ou por intermédio do
Brasil. E, na volta, vinha em troca o metal precioso, cujas moedas tinham ampla circulação
nas cidades de Salvador (na Bahia), Rio de Janeiro e Lisboa”. Assim, se, de um lado, parte
do contrabando era reprimido pelas autoridades coloniais, por representar perdas na
arrecadação alfandegária metropolitana, por outro lado, determinados tipos eram
praticados com a anuência das autoridades, como neste caso, voltado para a obtenção
das patacas espanholas, necessárias para o incremento do comércio asiático.

16- Segundo Godinho, o lucro obtido unicamente sobre a prata, no comércio asiático, era
de 30 a 40%. Cf. Opus cit., p. 387.

17- Macau está situada no sul da China, em uma península na parte meridional da ilha de
Hiasan, no Golfo de Cantão. Este golfo é formado pela foz do rio de mesmo nome, que
nomeia ainda a província e a capital. Esta península está ligada à ilha por uma estreita
faixa de areia, onde em 1537 se levantou um muro, demarcando o limite de Macau. O
acesso se fazia por uma porta abobadada, aberta no centro do muro. Após a concessão
de Macau, os chineses não permitiram que nenhuma outra nação européia se
estabelecesse na China. Durante a União Ibérica, em 1622, os holandeses prepararam
uma grande expedição, formada por 600 europeus e 200 orientais, de diversas
nacionalidades, para tomar Macau. Contudo, os portugueses conseguiram resistir aos
diversos assaltos, derrotando os holandeses. Em 1639 os portugueses são expulsos dos
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portos japoneses, onde negociavam a partir de Macau, representando um duro golpe


para os interesses mercantis no Extremo Oriente. Contudo, a Macau importância
permanece não só devido ao comércio na China mas também por funcionar como base
de apoio da soberania e do comércio português nas ilhas de Solor e Timor, na Oceânia.
Com a Restauração, apesar de fortemente pressionados e ameaçados por Hurtado de
Corcuera, governador das Filipinas, a permanecerem sob a autoridade do monarca
espanhol, os macauenses conseguem se manter unidos ao que resto dos domínios
asiáticos da Coroa de Portugal. Em 1624 os holandeses conseguem se instalar em
Formosa. Contudo, em 1661, o célebre corsário Coxinga expulsa-os definitivamente da
China. Cf. CLEMENTS, Jonathan. O Rei Pirata: Coxinga e a queda da Dinastia Ming.
São Paulo, Madras, 2005.

18- O porto de Cantão foi aberto aos estrangeiros, inicialmente, em 1578, sendo, porém,
fechado em 1631, assim permanecendo até o fim da dinastia Ming. Em 1684 é reaberto,
juntamente com os portos de Fuchien e Chekian, para o comércio com holandeses e
ingleses. Posteriormente, o imperador fechou os dois outros portos, mantendo somente
o de Cantão. Os negócios só podiam ser feitos através de uma câmara de comércio,
denominada Co-Hong. Deste modo, os estrangeiros só poderiam se dirigir aos agentes
do Co-Hong, sendo também proibido o empréstimo de capital estrangeiro e admissão de
chineses como funcionários a serviço de estrangeiros. Somente navios mercantes, sem
transportar soldados, poderiam aportar em Cantão. Cf. YANG, Alexander Chung Yuan.
O comércio de Cantão (1720-1796). Revista de História. São Paulo, vol. 54, p. 31-44,
1976.

19- O governo chinês cunhava um único tipo de moeda, de pouco valor, feita de uma liga
de cobre e com um orifício quadrado no centro, denominada tsin pelos chineses e
sapeca pelos portugueses. Já as patacas de prata que entravam no mercado chinês eram
quebradas, passando a ter um valor proporcional ao peso fracionado.

20- GODINHO, Vitorino Magalhães. Opus cit., p. 389-390.

21- Foram os portugueses que iniciaram o tráfico de ópio (anfião) da Índia para China,
onde era inicialmente usado como medicamento. Cf. ANDRADE, José Ignácio de.
Cartas escriptas da Índia e da China nos annos de 1815 a 1835. Lisboa: Imprensa
Nacional, t. 1, 1847, p. 182: “Anfião compõe-se de folhas de papoulas fermentadas;
narcotico funesto a quem o toma: motiva embriaguez tão deliciosa, dizem, que alguns
em o saboreando, jamais pode abster-se do seu uso. É consumido na China, e em toda
a costa malaia. Sahe das províncias de Patene, de Berar, e de Malwa: os habitantes
d´estes logares só usam d´elles, mascando-o. Na Turquia também cultivam a mesma
droga, mas só os chinezes, e os malaios a fumam”.

22- Cf. DAVIS, John Francis. The chinese: a general description of China e its inhabitants.
London, Charles Knight & Co., 1840, p. 33: “It was in that year (1802) that lord
Wellesley, Governor-general of Índia, being apprehensive that French republic had
some designs against the Portugueses establishments in the East, considered it
necessary to garrison the principal settlement of our “ancient ally” with British troops;
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and accordingly an expedition was sent from Bengal to take Macao under our
protection”. John F. Davis foi, posteriormente, governador de Hong Kong.

23- PERES, Damião Peres. In Peres, Damião (dir.) História de Portugal. Quarta época
(1640-1815). História Política. Barcelos, Portucalense Ed., 1934, vol. 6, p. 309.

24- Cf. Convenção Secreta Entre o Príncipe Dom João e Jorge III Rei da Grã-Bretanha.
In: MENDONÇA, Marcos Carneiros de. D. João VI e o Império do Brasil: a
Independência e a missão Rio Maior. Rio de Janeiro: Xérox do Brasil, 1984, p. 19-23.

25- Sydney Smith identificou oito naus de linha, quatro fragatas, dois brigues e uma escuna
“com huma multidão de grandes Navios mercantes armados”. Dos quatros navios da
armada que ficaram em Lisboa, os portugueses só lamentaram a perda de um deles, o
Vasco da Gama, que se achava concertando. Os outros eram meramente cascos velhos.
Cf. Carta do Contra-Almirante Sydney Smith a Guilherme Wellesley Poule, escrita a
bordo do navio S. M. Hibernia, a 1° de dezembro de 1807. In Correio Braziliense:
Armazém Literário. Londres: W. Lewis, junho, 1808, p. 23-26. A documentação
pertencente ao Ministério do Reino, já devidamente inventariada, foi acondicionada em
37 caixões e embarcada no navio Medusa, onde também embarcou Antonio de Araújo
Azevedo. Cf. MANCHESTER, Alan K. A Transferência da Corte Portuguesa Para o
Rio de Janeiro. In KEITH, Henry H. e EDWARDS, S. F. (orgs.) Conflito e
continuidade na sociedade brasileira. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1970, p.
177-217.

26- ANDRADE, José Ignácio. Memórias dos feitos macaenses contra os piratas da China: e
da entrada violenta dos inglezes na cidade de Macáo. Lisboa, Typografia Lisbonense,
1835, p. 95-7.

27- Ibidem, p. 104.

28- Cf. DAVIS, John C. Opus cit., p. 37. Davis criticou duramente o almirante Drury por
não ter enfrentado as tropas chinesas e tomado Macau a força, antevendo, assim, o que
viria posteriormente ocorrer na Guerra do Ópio, marco inicial da usurpação do império
celeste por tropas de nações imperialistas ocidentais. “The Admiral then declared his
intention not to force the Chinese line, and returned with the boats to the fleet. Though
a man of undisputed courage, (as observed in the evidence before the Commons in
1830,) Admiral Drury seems not to have possessed that cool and deliberate judgment
which was essential to success of the business he had been engaged in.”

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