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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE CAMPINAS

CENTRO DE LINGUAGEM E COMUNICAÇÃO

Talvez nós sejamos o problema


Numa era em que há informação demais, um eleitorado seletivo simplesmente reforça
ideologias rígidas. Ainda assim, culpamos nossas autoridades eleitas

Meyer, Philip. Disponível em


http://dicasdeumfucador.blogspot.com/2010/03/sera-que-o-
problema-somos-nos.html, acessado em 20/03/10

Um congresso disfuncional? Talvez não


seja esse o problema. Considere a
possibilidade de que o problema seja um
eleitorado disfuncional que evita que
qualquer coisa aconteça em Washington.
À medida que os jornais perdem anúncios
para meios mais novos, todos nos
preocupamos com como pagar pelo
jornalismo que mantém os cidadãos
informados e motivados.
Mas existem outros problemas para que
esse jornalismo seja feito. Precisamos de
um público que preste atenção e esteja disposto a agir sobre a informação que recebe.
Sem ele, o engarrafamento parlamentar que vemos durante o ano inteiro não tem
cura.
O que também importa é saber se a informação nos une ou nos divide. Se um liberal
se encasula nos escritos de Paul Krugman, no sarcasmo de Keith Olbermann e nos
resmungos do Huffington Post, ele ficou mais esclarecido ou simplesmente mais
convicto?
Se um conservador passa uma hora com Sean Hannity, absorve a prosa de Charles
Krauthammer e acampa no The Weekly Standard, ele tem de fato uma compreensão
melhor do plano de saúde proposto por Obama, por exemplo?
Os repórteres de Washington têm parte da culpa. Eles fazem um bom trabalho
cobrindo todos os vãos e desvãos das brigas entre a maioria democrata e a minoria
republicana. Mas não são tão bons em mostrar o contexto maior e motivar-nos a agir.
Paul Lazarsfeld, o grande sociólogo que morreu em 1976, foi co-autor de um artigo
que dava nome a esse problema, há mais de meio século. Informação demais, diz ele,
pode levar à "disfunção narcotizante". Em outras palavras, um público eleitor cercado
por uma plétora de detalhes e pelo jogo de bastidores vai simplesmente se sentir inútil
e apático. Podemos saber muito, e isto nos faz bem, mas deixamos o conhecimento
substituir a ação.
O ambiente de mídia que preocupava Lazarsfeld era muito diferente do de hoje. Menos
de 1% das casas tinham televisão. Ainda assim, somando o rádio e os meios
impressos, havia uma enchente de informação. O cidadão médio, disse Lazarsfeld em
1948, considerava 'suas leituras, audições e pensamentos como a uma performance de
vigário. Ele passa a confundir saber a respeito dos problemas do dia com fazer algo a
respeito.'
'Sua consciência social permanece imaculadamente limpa. Ele se preocupa. Ele está
informado. E ele tem todo tipo de ideia sobre o que devia ser feito.'
Professor mestre Artur Araujo (artur.araujo@puc-campinas.edu.br)
site: http://docentes.puc-campinas.edu.br/clc/arturaraujo/
ftp: ftp://ftp-acd.puc-campinas.edu.br/pub/professores/clc/artur.araujo/
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'Mas... depois de ter ouvido seus programas favoritos no rádio e lido seu segundo
jornal do dia, já passou da hora de ir para a cama.'
Hoje, com muitos outros canais de informação, incluindo TV a cabo, Twitter, Facebook
e uma multidão de blogs, estamos cada vez mais soterrados por informações
potencialmente narcotizantes. Mas nós não estamos mais inteligentes do que antes. O
nível de conhecimento político nos EUA tem se mantido bastante estável ao longo do
tempo.
Entretanto, desde o tempo de Lazarsfeld, e especialmente desde cerca de 1990,
quando Tim Berners-Lee decidiu chamar a coisa que inventou de World Wide Web,
temos consumido um tipo diferente de conteúdo de mídia. Ele é mais especializado.
Presta-se menos atenção a áreas de interesse comum, onde pessoas com diferentes
pontos de vista podem tentar compreender umas às outras. Essa falta de um ponto
comum informativo torna o governo representativo bem mais difícil. Quando não há
interesse em saber e compreender as ideias dos outros, não pode haver deliberação.
Recaímos num método de votação simples, de aprovar ou reprovar. Quando as coisas
saem mal, simplesmente expulsamos os pulhas.
Os Democratas venceram em 2008 porque a economia estava azedando. Os
Republicanos notaram, e então sua mais alta prioridade é que o presidente Obama
falhe para que os Democratas sejam os pulhas de 2012. Eles são bastante abertos a
esse respeito. Onde chegaremos assim?
Caso funcione, o que pode impedir que uma minoria Democrata em 2013 mine o
governo da presidente Sarah Palin com mais engarrafamento? Se levar um governo a
falhar é o caminho da vitória, estamos naquilo que os engenheiros de software
chamam de 'loop': damos voltas e mais voltas e não conseguimos sair disso.
Não culpe o Congresso. Se um eleitorado narcotizado não se envolve, o inimigo somos
nós.

Professor mestre Artur Araujo (artur.araujo@puc-campinas.edu.br)


site: http://docentes.puc-campinas.edu.br/clc/arturaraujo/
ftp: ftp://ftp-acd.puc-campinas.edu.br/pub/professores/clc/artur.araujo/
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