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Vassily Kandinsky

Escola Superior João de Deus

Curso de Professores do Ensino Básico 1º Ciclo

1999/2000
§1. Introdução

O objectivo deste trabalho reside na tentativa de surpreender na

pintura de Kadinsky características que, no nosso entendimento, faz aproximar

alguns aspectos da obra do pintor russo dos desenhos das crianças. Não se

pretende por esse facto uma análise de todo o material de Kadinsky. Seria

despropositado e completamente fora do nosso propósito e capacidade. Neste

sentido, o que aqui vamos indicando são apenas aqueles aspectos que poderiam,

eventualmente, ajudar a perceber essa aproximação no sentido de, também,

perceber essa actividade na criança.


§2. Da pintura como necessidade interior

Para Kadinsky, tal como formulou nas suas refexões sobre a arte, a

expressão artística correspondia a uma “determinação interior” ou, como

também afirmava, a uma “necessidade interior”. Ora, não teríamos nós na

actividade da criança, mais do que uma preocupação pela representação da

realidade, a expressão também de uma necessidade interior, a realização de

uma expressividade? Mais do que a representação da realidade, que pela

imprecisão e pelo fraco domínio das técnicas e dos materiais mais levaria a

criança a desistir, a criança representa-se a si mesma, representa o seu modo

de olhar/estar entre as coisas. A satisfação do desenho não resulta da sua

aproximação ao real, mas antes enquanto representa a concretização de um

prazer. Nesse sentido, o desenho da criança surge muitas vezes como um puro

divertimento, porque ele vê aquilo que s outros não vêem: não existe uma

figuração delimitada das coisas, mas sim uma transfiguração da realidade que

condensa a sua própria visão.


§3. O predomínio da cor

No quadro a óleo, Cadeiras da Praia na Holanda (1904), também aí

Kadinsky exprime essa libertação da ditadura da representação fiel dos

elementos pictóricos. As manchas espessas e as cores justapostas prefiguram

a futura linguagem pictórica abstracta. E já nessa altura Kadinsky confessava

que se sentia mais mundo das cores que no mundo do desenho. Como nas

pinturas das crianças, onde a mancha da cor é mais que suficiente para sugerir

a figura, sobrepondo-se ao desenho. É a cor que impressiona, que dá prazer. É a

cor que produz a sensação física do desenho. O prazer do desenho na criança

desloca-se para essa impressão viva e forte que a cor ou o jogo das cores

provoca: só a cor, a combinação das cores faz do desenho uma forma de

prolongar a brincadeira. O desenho é esforço, mas a cor liberta, surge

ilimitada, estende-se ao sabor da vontade, numa espécie de prolongamento do

corpo. Em Cemitério e Presbitério em Kochel (1909) é impossível não sentir aí

essa dimensão lúdica da cor, o jogo dos diversos tons do azul, do amarelo e do

rosa. Dimensão lúdica que se acentua pela aparente rapidez da pincelada, como

se fosse a reprodução de um gozo interior que dominasse o espírito, sem a

preocupação da precisão das formas definidas.


§4. O traço rude

E é também essa predominância lúdica pelo jogo das cores que domina

em Improvisação 6 (Africano) (1909), Montanha (1909) e Igreja em Murnau

(1910). Perante estes óleos temos a nítida impressão que estamos diante de

uma pintura infantil. Os traços são reduzidos à sua forma mais elementar. Mas

nem sequer delimitam um espaço. Aliás, deparamos com uma figuração muito

pobre do espaço. Os traços, não só são muito elementares, como seguem as

cores, a sua dança e, por essa razão, surgem tremidos. A importância da cor, e

das cores demasiado fortes e contrastantes, dominam os objectos. Estão aqui

as cores básicas do equipamento cromático de Kadinsky. Os traços como que

seguram o próprio bailado das cores, mas nunca surgem como elementos

definidores dos objectos: estes são definidos pelo alto contraste das cores

utilizadas. Aliás, no último dos quadros referidos nem sequer existem traços.

Existe uma completa dissolução da estrutura linear, pulverizando-se o espaço.

Tal como nos desenhos das crianças as fronteiras ficam indefinidas. As figuras

sobrepõem-se, movidas pelas suas cores fortes, pelas pinceladas vigorosas,

como se o corpo de quem pinta se apresentasse aí, na sua máxima intensidade.

Existe uma sensação de densidade e de volume, porque as cores se sobrepõem,

dominam, sem respeito pela delimitação dos objectos que aparecem assim como
se uma névoa os indefinisse, os estivesse prestes a revelar. Em Improvisação

19 (1911) os traços revelam-se na sua rudeza mais gritante. Cruzam-se

despreocupadamente e quase parecem toscos. Como se a sua espessura tivesse

sido conquistada à força de tentativas desesperantes para uma afinação nunca

conseguida e aparecessem assim, como o resultado dessa desesperante

tentativa sempre retomada, mas cada vez mais imperfeita. Tal como nos

desenhos das crianças, onde o traço vai engrossando à custa de incessantes

aperfeiçoamentos nunca conseguidos. O que acaba por dominar o quadro são os

diversos tons de azul que deixam essa impressão mais perdurável. O que se

retém é o jogo das cores, o seu deslizar constante, essa aparência de

movimento.
§5. A dança das formas

No período que os estudiosos do pintor russo denominam como fase de

ruptura para a abstracção (1911-1914) encontramos um outro traço de

aproximação com a actividade pictórica das crianças. Trata-se aqui da

sobreposição das formas. Em Pequenas Alegrias (1913) deparamos com um

bailado curioso de todos os elementos, uma espécie de irriquietude quase

infantil. As figuras tocam-se, sem respeitar a individualidade de cada uma. O

elemento figurativo apenas sugere, permite, aqui e ali, realçar esse movimento

quase barroco, das figuras desconexas, que se intersectam, como que numa

erupção interminável. Inegavelmente, o quadro respira movimento, mas trata-

se de um quase tumulto, um movimento aparentemente caótico, apenas

ordenado por linhas que se cruzam, mas não detêm essa desarmonia. Como na

actividade da criança, tudo parece muito confuso, mas, possivelmente, é o

nosso olhar que se tornou demasiado distante dessa aproximação mais imediata

e despreconceituosa à realidade. Nesse sentido, a pintura de Kadinsky não só

revela traços que sugerem a pintura das crianças, como nos permitirá,

porventura, compreender melhor o olhar das crianças diante do mundo.


6. Conclusão

A criança revela-se como um ser puro autêntico, com necessidade e

desejo

de se apropriar do mundo e de todas as coisas que a rodeiam.

A expressão livre é uma necessidade constante, e um acto inerente ao seu

próprio desenvolvimento. Quando a criança se exprime livremente, ninguém

melhor do que ela para responder pelo que faz ,e porque o faz. Deste modo,

desenvolve o sentido de responsabilização, de autoconfiança, vontade própria,

poder de iniciativa e criatividade.

Através do desenho ,poder-se-á descobrir a criança que sempre “habitou”

dentro de Kandinsky e estabelecer uma relação entre este, e as variadas

manifestações artísticas das diversas crianças ,que elaboraram os desenhos ,

complementos deste trabalho.

Deste modo, a escola de hoje deverá procurar estimular o aluno no prazer da

descoberta, no desenvolvimento do seu espírito crítico, da sua criatividade.

Para efectuar este ideal educacional, torna-se necessária uma pedagogia


flexível e aberta, onde o professor não é mais do que orientador das múltiplas

aprendizagens.

A função do professor, é basicamente, trazer o mundo para dentro da sala de

aula.
7. Biografia

Wassily Kandinsky
(1866-1944)

Kandinsky nasceu em Moscovo, no seio de uma família acomodada, e embora

tenha passado mais de metade da sua vida na Alemanha e em França, conservou

um forte vínculo emocional com a sua cidade. Durante os seus primeiros trinta

anos, a pintura foi apenas a inclinação apaixonada de um jovem sonhador e

romântico, mas convencional. Estudou Direito e Economia, e a sua brilhante


carreira académica proporcionou-lhe uma cátedra na Estónia, à qual renunciou

para se mudar em 1896 para Munique a fim de se dedicar à pintura.

Dois acontecimentos determinaram a vocação artística de Kandinsky em 1895:

uma representação de Lohengrin, de Wagne, e o impacto que lhe provocou o

quadro Meda de Feno, de Claude Monet, numa exposição impressionista em

Moscovo. Se o primeiro indica a precoce vincualação da pintura à música, o

segundo prefigura o futuro de uma pintura não figurativa. O que impressionou

Kandinsky foi, precisamente, não poder reconhecer o tema do quadro, a pesar

do o ter cativado.

Quando kandinsky chega a Munique em 1896, este é já um dos núcleos Arte

Nova mais importantes da Europa. Esta influência pode ver-se em algumas

obras de Kandinsky, como o cartaz para as exposições Phanlanx, mas o que mais

o vincula a Munique é a sua vocação pelo idealismo romântico, já manisfestada

na Rússia. O autor assimila o tom melancólico do simbolismo, outra das

correntes imperantes na Secessão, e o seu gosto por bosques e lagos. A

correspondência interna entre a cor e as emoções da alma está implícita nesse

legado romântico, que Kandinsky funde com a influência da cor fauve.


Os anos que vão de 1910 ao início da Primeira Guerra Mundial são definitivos na

conquista por Kandinsky do que já será para sempre o seu território pictórico.

A tendência claramente não figurativa da sua obra determina a ruptura com a

NKVM, que em 1911 recusa expôr Composição V com o argumento de que o seu

formato não cumpria os requisitos regulamentares da associação. Kandinsky

estreita, por causa disso, a sua amizade com Franz Marc e o músico Arnold

Schonberg, duas peças fundamentais na formação de O Cavaleiro Azul. Começa

então a interessar-se pela teosofia, a qual atribui referências espirituais ao

seu trabalho artístico.

A sua reputação estabeleceu-se firmemente nos Estados Unidos da América

através de numerosas exibições, tendo sido o seu trabalho apresentado a

Solomon Guggenheim que se tornou um dos seus maiores entusiastas.

Em 1933 Kandinsky , quando Kandinsky se estabelece em Neuilly perto de Paris,

as suas pinturas tornam-se objecto de controvérsia . No entanto era admirado

por muitos artistas sendo o seu estúdio visitado regularmente por Miró, Arp,

Magnelli e Sophie Tauber


Kandinsky continuou a pintar quase até à sua morte em Junho de 1944.

Os quadros prescindem já da representação; apenas

alguns traços alundem de vez em quando a figuras e objectos, que são uma

referência simbólica ao significado do quadro, mas não ao seu tema. Estas

pequenas âncoras figurativas revelam a consciência de fundação de uma nova

pintura que Kandinsky vive agora: o dilúvio, o apocalipse, o barco que entra num

lago aniciático e desconhecido são imagens de regeneração, mas o tema do

quadro é apenas o conflito de massas vibrantes de cor, e o seu objectivo, fazer

«sentir o espiritual das coisas materiais e abstractas».

.
8. Reflexão final: A Expressão Plástica da Criança:

Poder-se-á iniciar a exposição da expressão plástica da criança,

identificando o seu sentido etimológico. Exprimir-se, é expulsar, exteriorizar

sensações, sentimentos; um conjunto de factos e motivos. É concretizar um

acto, que não é ditado, nem controlado pela razão.

Todas as crianças desenham sem necessidade de serem convidadas a fazê-lo.

O desenho, ao princípio - antes que a escola o converta em obrigação -, é um

acto espontâneo, que ocorre na criança sem influência por parte do adulto. Não

é necessário dizer a uma criança que desenhe, como não é necessário dizer-lhe

que brinque. A criança desenha e brinca de livre vontade, de forma natural.

O desenho é para a criança, em primeiro lugar, um jogo e diverte-se com ele

como quando brinca com as suas bonecas ou automóveis.Com estes objectos e

personagens vive aventuras, sentimentos e desejos. Inventa histórias com eles

em que pode estar presente, tanto na sua realidade, como nos seus argumentos

irreais, fantásticos e até impossíveis. A criança precisa do jogo para crescer e


desenvolver-se e este é um factor importante para o seu desenvolvimento e

equilíbrio emocional. Algo semelhante se passa com o desenho, que participa no

crescimento destes valores.

Por meio do desenho, a criança joga, mas joga partindo do zero, criando ela

própria as personagens e o ambiente. Não precisa transformar nada, busca no

seu íntimo e traça-o no papel: o bebé e a mãe que o embala nos braços, a casa

e as personagens que compõem a família que nesse momento gostaria de ter…

É Arno Stern que identifica esta “viagem pelo imaginário” com a sua “anti-

situação”. Este defende que a criança cria “um cenário, um ambiente fictício,

para aí viver a sua anti-situação”. A criança cria no seu imaginário, sítios e

personagens, que alimentam a sua fantasia, alegria e magia de viver. É aqui que

a mesma se preenche como um pequeno ser em desenvolvimento , como uma

singela borboleta desprendendo as amarras do seu casulo, para partir para uma

longa viagem: a do seu auto-conhecimento.

Durante todo o processo, quer dizer, desde que cria o primeiro traço, a

criança pôs em jogo os seus sentimentos, os seus desejos, as suas emoções


positivas e negativas e deu-lhes saída elaborando-as. Aliviou-se de tensões,

descarregando a sua agressividade, o seu amor e o seu ódio de uma forma

especialmente útil e saudável: sem causar dano a ninguém , de maneira que o

resultado não é a frustração ou o sentimento de culpa . “As manifestações

visíveis desta fuga são os sonhos, os contos, os jogos e os desenhos”(Cobo, El

arte infantil em “Tribuna Médica”,nº813,pág.25).Por meio do desenho pode

“fugir” às suas tristezas e problemas e, o que é mais importante, ao elaborá-

los, procurar soluções.

A criança evolui e adquire um maior controle dos movimentos: os gestos

ficam mais lentos e dominados ,contrastando com o traço ofensivo e com o

emaranhado de linhas curvas, características da fase anterior. O maior

controle da mão vai permitir , mais tarde, a representação da figura humana(5

anos), que vai ficando mais pormenorizada(7/8 anos).O ideografismo é outra

das características do desenho infantil, que consiste na representação do que

a criança sabe ou a ideia que vai formulando das coisas, não reproduzindo

fielmente os objectos que a rodeiam. Daqui derivam outras características


como a transparência e os rebatimentos.

A criança desenha sempre para alguém, ainda que esse alguém possa ser ela

mesma ou uma pessoa que não esteja presente(perspectiva afectiva).

Muitas vezes as crianças oferecem os desenhos aos pais e estes nem sabem

apreciá-los, não descobrem a mensagem que encerram. Para ajudar a decifrá-la

, ninguém melhor que a própria criança.

A comunicação tem sempre de encontrar interlocutor, porque senão

converte-se em monólogo ,e comunicar , é compreender e responder ao que a

criança comunica com os seus desenhos. Deste modo, o educador “é

testemunha da elaboração do quadro”. Pessoa sensível, como um artista, não se

deve assumir como tal. Factor importante, não é o “saber” do educador, mas a

sua “atitude”; o facto de descer a escadaria até ao mundo da criança, em todas

as circunstâncias. Transmite uma imagem inspiradora de confiança, que

permite à criança tomar consciência de si própria.

Em suma, o desenho permite conhecer a criança.


ÍNDICE

1.Introdução pág. 1

2.Da pintura como necessidade interior pág. 2

3. O predomínio da cor pág. 3

4. O traço rude pág. 4

5. A dança das formas pág. 6

6 Conclusão pág. 7

7. Biografia pág. 8

8. A Expressão plástica da criança pág. 10

9. Anexos pág. 9

10. Bibliografia pág.

11. Índice pág.


ANEXOS

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