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PEDRO GUILHERME ACCORSI LUNARDELLI ce Spm ER ISENCOES TRIBUTARIAS ‘Sao Paulo - 1999 73 IV - A Iseng&o Tributaria IV.1 - O Significado da Express&o “Exclusao do Crédito Tributario” Prevista no CTN. A Isencao e a Anistia Inclinamos nossas ateng6es, agora, para 0 propésito de desvendar o significado normativo do art. 175 do Cédigo Tributario Nacional, vazado nos seguintes termos: “Art. 175. Excluem o crédito tributario: I- aisengo; TI - a anistia. Pardgrafo tinico. A exclusdo do crédito tributdrio nao dispensa o cumprimento das obrigagGes acessérias, dependentes da obriga- Ao principal cujo crédito seja exclufdo, ou dela conseqiiente”. Um primeiro ponto deve ser ponderado. Contém este dispositivo fendmenos normativos diametralmente dis- tintos, muito embora estejam contidos em um nico contexto gramatical. Verifique-se que “exclusio do crédito tributario” est4 englobando tanto 0 caso da isengio, quanto o da anistia, cujo pressuposto, segundo o prescrito no art. 180 daquele mesmo Diploma, € 0 cometimento de infra- Ges, ou seja, a realizagao de um ilicito. Tal situagdo poderia causar espécie se j4 de antemfo nao estivésse- mos avisados de que 0 contexto sintdtico-semAntico-normativo nao coinci- de com o gramatical, sendo esse apenas 0 indice tematico para a devida in- quirigao daquele. Dessa feita, cumpre ao hermeneuta, em face da estrutura da norma juridica completa - norma priméria dispositiva + norma primdria sanciona- toria + norma secundaria - ir saturando os respectivos categoremas com as significagdes que extrai dos enunciados normativos postos no sistema juri- dico. Assim, a construgao das normas jurfdicas dependera das proprie- dades retiradas daqueles enunciados e, ainda, do modo como serao organi- zados os conjuntos de elementos relacionados aos aspectos dos respectivos antecedentes e conseqiientes das mencionadas normas juridicas. 74 IsencOes TRIBUTARIAS Examinando-se, entao, o previsto no inciso I, do art. 175 do CTN, somos surpreendidos por concepgées de crédito tributdrio bastante distin- tas daquelas observadas nos t6picos anteriores, atreladas ao direito subjeti- vo de o fisco exigir a prestagdo tributdria. Temos aqui duas concepgées, quais sejam, uma que se vincula & norma tributdria geral e abstrata, e outra que se liga a relacao jurfdica isen- cional, derivada de norma de isengdo geral e abstrata, cuja pertinéncia ao ordenamento jurfdico sustentamos haver. Vejamos a primeira. Se, por exemplo, as propriedades componentes da significagao dos enunciados normativos nao permitirem ao intérprete a construco de conjuntos aptos a preencher todos os categoremas da norma juridica, a concepgao de “exclusao de crédito tribut4rio” estar4 voltada para as modificagées havidas apenas no 4mbito da norma tributdria geral e abs- trata. Com efeito, imaginemos a situagdo prevista no inciso VI, do art. 5°, do Regulamento do IPI, aprovado pelo Decreto Federal 2.637, de 25.06.98, segundo a qual nao se considera industrializac&o a manipulagdo em far- mdcia, para venda direta ao consumidor, de medicamentos oficinais e ma- gistrais, mediante receita médica. Abandonando a escrita do direito positivo, nem sempre apegada aos cuidados que a anilise cientifica exige, terfamos o fenémeno normativo isen- cional avangando sobre o critério material da norma tributdria geral e abs- trata, particularmente sobre o verbo que lhe da sentido, para empregar-lhe nova roupagem, de modo que de tal industrializacgZo nao mais configuraria suporte fatico suficiente para ensejar 0 evento tributdvel que daria ensejo a relagdo do imposto sobre produtos industrializados'. Sustenta a doutrina de Paulo de Barros Carvalho que tal fenémeno normativo produziria efeitos exclusivamente na esfera da norma tributéria, em um ou varios de seus aspectos, sempre modificando parcialmente sua estrutura. No exemplo supra mencionado, haveria alteragdéo do aspecto mate- rial, por forga da modificagao de seus critérios conotativos, pois a operacio de aviar medicamentos para consumidor, mediante receita médica, deixa- ria de figurar no conjunto dos respectivos elementos da norma tributéria. A isengao, portanto, seria norma de estrutura, intrometendo modifi- cago no dmbito da regra-matriz de incidéncia tributdria, esta sim, norma de conduta*. ' Paulo de Barros Carvalho, Curso de Direito Tributdrio, p. 332. ? Paulo de Barros Carvalho, Curso de Direito Tributdrio, p. 329. Peoro GuitHeRMe Accors! LUNARDELLI 75 Particularmente, arriscamos dissentir desta respeitavel opiniao, por entender que a norma de isengao poder4 apresentar-se também como nor- ma de comportamento, atingindo diretamente a conduta do particular. To- das essas questdes, estaremos expondo no tépico seguinte. Por ora, fiquemos com 0 registro de que, segundo essa vertente dou- trindria, o significado de “exclusao do crédito tributdério”, de acordo com o art. 175, inciso I, do CTN, apontaria para aquelas alteragGes ocorridas nos aspectos da regra-matriz tributaria. Vé-se, assim, que a concepgao de crédito tributario no mais diz res- peito ao direito subjetivo de o fisco exigir do contribuinte a prestagao tribu- téria, porquanto, ocorrendo 0 encontro de norma tributéria e de isengao, ain- da no seu estado geral e abstrato, nfo estaremos autorizados a falar em evento € respectiva relagao juridica e, conseqiientemente, nas respectivas relagdes de crédito e débito tributario. Exclusao do crédito tributdrio seria, assim, 0 fendmeno juridico da ndo-incidéncia, ou conforme nossa concepgdo, uma incidéncia fraca, de- corrente da modificagao da norma tributdria geral e abstrata. Vejamos, agora, a concepgdo com que mais nos afeigoamos, segun- do a qual exclusao de crédito tributdrio refere-se a uma relagao juridica en- tre fisco e particular, portanto, atrelada a uma norma de comportamento. Abordaremos aqui apenas um exemplo que constitui a aplicagao dos fun- damentos doutrindrios expostos no tépico subseqiiente. Considerando ent&o que nosso indice tematico do direito positivo permite-nos adequar significagdes aos componentes de uma estrutura juri- dica, advird daf a prefalada regra-matriz isencional, com compostura sintd- tica semelhante & da regra-matriz tributdria, cuja hip6tese descreverd abs- tratamente a concretizacdo de um evento, implicando o conseqiiente que, por sua vez, conter a prescrigao, também abstrata, de um efeito, uma relagao juridica isencional. Como se vé, hé semelhanga formal entre tais regras-matrizes, no correspondida, todavia, quando abordamos 0 respectivo vetor semantico. Uma norma tributdria, cujo antecedente preveja a futura concretiza- ¢40 da conduta “X”, implica o conseqiiente, no qual teremos uma relacdo juridica entre fisco e contribuinte. Em tal relagdo, crédito tributario corresponder4 ao direito subjeti- vo de o fisco exigir a prestagao tributdria (esté permitido exigir), contraposto ao débito tributdrio do contribuinte, que denominamos dever subjetivo de cumprir a prestagio (esta obrigado a prestar). 76 Isenc6es TRiBUTARIAS Suponhamos agora a norma isencional. O antecedente serd a previsdo hipotética da concretizagao da aludi- da conduta “X”, enquanto no conseqiiente haverd a prescrigao de uma rela- go juridica também entre fisco e contribuinte, composta pelo dever subje- tivo de o fisco nao exigir a prestagdo (débito isencional) e o correspectivo direito subjetivo de o contribuinte nao ser exigido (crédito isencional). Assim, a conduta “X” que até o advento da norma de isengao cor- respondia a materializagao da hipotese da regra tributéria, passa agora a ser elemento do conjunto hipotético da norma de iseng&o. Por forga da relagao que hd entre tais conjuntos de antecedentes nor- mativos, o pertencente a regra tributdria passa a conotar apenas os eventos juridicos, cujos critérios nao se identifiquem com os da conduta “X”, pois estes estarao, agora, englobados no conjunto normativo da hipotese da re- gra de isengao. Estamos diante de um cdlculo relacional. No caso, diante de uma relag&o de intersecgao’ entre classes de antecedentes: a do antecedente da norma tributdria relacionando-se com o antecedente da norma isencional. O encontro dessas normas, que implica 0 cdlculo relacional das clas- ses formadas pelos elementos dos respectivos antecedentes, indica a muti- lago parcial a que se refere Paulo de Barros Carvalho‘. Calculo relacional’ haver4 também entre os conseqiientes das refe- ridas normas tributdria e isencional, provocando a alteragao na composigao dos respectivos conjuntos dos sujeitos passivos contidos nesses conseqiien- tes, Por conta da concretizagao daquela mesma conduta “X”, 0 sujeito passivo nao mais estaré compondo a relagao juridica tributaria, na qualida- de de devedor, mas sim, aparecerd na relagao jurfdica isencional, na quali- dade de credor, com o direito subjetivo de estar permitido a nao cumprir a prestaco (esté permitido omitir a conduta). Aplicamos aqui os ensinamentos de Paulo de Barros Carvalho: “Se arelagio jurfdica é um ente da regidio dos objetos ideais, como os ntimeros, 0s conceitos ¢ as figuras geométricas, obviamente que suas transformagdes deveriam estar sujeitas ao cdlculo correspondente. Quem pretender diminuir, acrescentar ou fazer desaparecer um niimero aritmético, terd que entrar nu- 4 Alfred Tarski, Introduccién a la Légica y a la Metodologia de las Ciéncias Deducti- vas, p. 121. ‘Curso de Direito Tributdrio, p. 329. * Alfred Tarski, Introduccién a la Logica y a la Metodologia de Las Ciéncias Deduc- tivas, p. 117. Peoro GuitHerme Accors! LUNARDELLI 77 ma das operagGes que a Artimética indica. Fora desse cAlculo, inexiste pos- sibilidade de alterag&o. Com as férmulas da Légica Proposicional Alética sucede o mesmo. Havemos de mobilizar as regras de transformacao, sem 0 que nao obteremos qualquer mudanga nas express6es simbélicas com que trabalhamos. Ora, claro est que no universo das relagdes, integrante de um capitulo da Légica dos Predicados ou Légica dos Termos, chamado de L6- gica dos Predicados Poliddicos (equivalente nominal de Teoria das Relagdes), como jd tive a oportunidade de salientar, nao poderia ser diferente. Vale re- petir ndo ser admissivel, nesse hemisfério, promover-se qualquer alteracdio fora do jogo operacional do cdlculo das relagdes”®. Diante disso, verificamos que “exclusio do crédito tributario”, a que se refere o aludido art. 175, inciso I, do Diploma Tributdrio, aponta para a relago juridica correspectiva ao conseqiiente da norma de isengio, dentro da qual apareceré 0 direito subjetivo (relagdo de crédito isencional) de o contribuinte nado cumprir a prestacdo (esté permitido omitir a conduta de prestar), vinculado ao dever subjetivo (débito isencional) de o fisco nao exi- gir tal prestagao. Sintaticamente, portanto, ajustam-se as concepgoes de crédito tribu- trio analisadas até este momento. Porém, semanticamente, a distancia é significativa, na medida em que naquelas relagGes (tributérias) aponta-se para 0 direito subjetivo de o fisco exigir a prestagdo e, na prevista no art. 175, I, do CTN, para 0 direito subjetivo de o contribuinte nao ter a conduta de rea- lizar a prestagdo pecunidria’. Vejamos agora as anotagGes que dizem respeito ao inciso II, do art. 175, do CTN, mais especificamente, 4 “exclusao do crédito tributario” por forga da anistia. Qual relac&o é exclufda com a aplicagdo da norma da anis- tia? Antes, porém, de prosseguirmos neste feito, devemos reavivar nos- sa meméria sobre 0 efetivo significado que estamos dando a crédito tribu- tario, conforme regulado no art. 139, do CTN. Crédito tributdrio, enquanto decorrente da obrigagao principal, en- tendemos 0 direito subjetivo de o fisco exigir a prestagdo tributdria, que ® Fundamentos Juridicos da Incidéncia Tributdria, p. 215. 7 A denominacao de contribuinte que adotamos para identificar o sujeito titular do direito subjetivo de nao prestar, na norma isencional, néo tem, obviamente, o mes- mo significado utilizado pela doutrina, que o vincula ao titular do dever de prestar na regra-matriz tributaéria. Mesmo sabendo do risco de adotarmos uma denominagio com tal ambigiiidade, preferimos manté-la a estipular outro nome, pois clara est4 a situagio juridica do contribuinte quando o defrontamos com a regta-matriz da isen- io. 78 ISENGOES TRIBUTARIAS implica o dever subjetivo de o contribuinte executd-la. Ambos, direito e dever, compondo a relacao juridica intranormativa, sin6nimo de obrigagao principal, segundo a terminologia do referido Diploma (art. 113). Quando abordamos o tema da anistia devemos, primeiramente, re- portarmo-nos a estrutura da norma primaria sancionatéria, parte da nor- ma jurfdica completa, que prevé em sua hipétese a concretizagao de um evento ilfcito e, na tese, a relagdo juridica entre fisco e contribuinte, cuja prestacdio que lhe é objeto, denomina-se multa’. Mantida est4 a homogeneidade sintdtica entre tais estruturas norma- tivas. Todavia, novamente, enfrentaremos diversificagéo no campo seman- tico, pois, vimos, o evento juridico, na priméria sancionatéria, pressupe o ilfcito, qual seja, o nao cumprimento do dever subjetivo do contribuinte, contido na relagao juridica tributéria (dever de cumprir a prestago pecunid- ria). No tocante & norma da anistia, sua hipétese descreverd conotativa- mente a relag&o jurfdica decorrente da norma priméria sancionatéria. E a relagao juridica da multa que ser4 o fato descrito na hipétese da norma de anistia. Quando posta em linguagem competente, tal relacdo sancionatéria ser4 fato jurfdico suficiente para desencadear os efeitos (eficdcia juridica) do conseqiiente da norma de anistia. No vonseqiiente teremos a prescrigdo da relago da anistia, cujo re- lacionamento com a de multa (sancionatéria) produzird a extingdo desta. Sintaticamente, teremos aqui os mesmos efeitos da relagao advinda com 0 pagamento da prestagio tributdria. Haverd a extingfo da relagZo sanciona- t6ria, decorrente do cdlculo relacional havido com a relagdo da anistia. O produto deste cdlculo é um conjunto vazio, representativo da inexisténcia, no campo dos fenémenos, de condutas obrigatérias ao cumprimento de uma prestacao a titulo de multa. Juridicamente, portanto, inexistird relag&o sancionatéria que tenha por objeto multa decorrente do descumprimento da relagao juridica tribu- taria. Este € 0 efeito da aplicagdo da norma de anistia. Portanto, quando o inciso II do art. 175 do Cédigo Tributario Nacio- nal alude a “exclusao do crédito tributdrio”, esta referindo-se a extingaio da relagéo de multa, advinda da aplicagao da norma primdria sancionatéria, extingdo que ocorreu por forga de seu relacionamento com a relagdo da anis- tia. Exclusao de crédito tributario, neste contexto, assume o significado de 5 Neste sentido, Sacha Calmon Navarro Coélho, Teoria e Prdatica das Multas Tributa- rias, p. 50; consulte também, Roque Antonio Carrazza, Curso de Direito Constitu- cional Tributdrio, p. 352. Pepro GuitHerme Accors! LUNARDELLI 79 extingdo da relacdo de multa, diferentemente do que verificamos ao exami- nar o fenémeno da exclusdo quando opera-se a norma de isengao. Procede, assim, a adverténcia de Paulo de Barros Carvalho, relativa 4 amplititude seméntica do art. 175, do CTN: “E bom que se diga existir certa desordem de conceitos, no que respeita a anistia, sobretudo porque nosso legislador reuniu o crédito do tributo e o crédito da penalidade fiscal numa s6 expressao: crédito tributdrio”®. Outro ponto importante a ser destacado no exame da anistia € 0 que vincula sua aplicagao apenas e tao-somente a eventos ou fatos juridicos jé ocorridos no mundo fenoménico. Prevé o art. 180 do CTN o seguinte: “Art. 180. A anistia abrange exclusivamente as infragdes come- tidas anteriormente a vigéncia da lei que a concede, nao se apli- cando: I - aos atos qualificados em lei como crimes ou contravengoes e aos que, mesmo sem essa qualificagdo, sejam praticados com dolo, fraude ou simulago pelo sujeito passivo ou por terceiro em beneficio daquele; II- salvo disposigo em contrario, as infragdes resultantes de con- luio entre duas ou mais pessoas naturais ou jurfdicas”. Quando o caput do art. 180 determina que a aplicagao da anistia se- r4 apenas para as infragdes ocorridas anteriormente 4 sua vigéncia, nao faz distingao entre fatos ilfcitos que j4 estejam devidamente suportados em enun- ciado protocolar de norma individual e concreta, e eventos que ainda nao apresentem tal caracterfstica. Isto porque 0 conjunto dos acontecimentos englobados na previsdo esté denominado como infragSes, que poderao ser tanto aqueles descumprimentos amparados em linguagem competente, quan- to os ainda nao manifestados em linguagem. No caso de ilfcitos ainda nao vertidos em linguagem, ser4 a prépria norma de aplicagao da anistia que fara a sua formalizago, transformando- o em fato juridico suficiente apto a dar nascimento 4 relagdo juridica da anistia. Frise-se que a aplicagao da norma de anistia poderé ser feita tanto pelo contribuinte anistiado, quanto pela autoridade administrativa compe- tente, porque ambos poderao vir a ser autorizados pela lei que a instituir, conforme previsto no caput do art. 182 do CTN, verbis: “Art. 182. A anistia, quando nao concedida em carter geral, é efe- tivada, em cada caso, por despacho da autoridade administrati- ° Curso de Direito Tributdrio, p. 341. 80 IsENGOES TRIBUTARIAS va, em requerimento com o qual o intcrcssado faga prova do preenchimento das condigdes e do cumprimento dos requisitos previstos em lei para sua concessio”. Ficard, assim, a critério da legislagao de cada ente tributante estabe- lecer 0 modus de aplicagio"’ da anistia. Quando o Diploma Tributédrio auto- riza a concessao em carter geral, parece-nos conferir a competéncia para sua aplicagdo tanto para os contribuintes, quanto para as autoridades fiscais. Desta feita, excluso do crédito tributario, conforme o enunciado do art. 175, incisos I e II, do CTN, envia o intérprete para as seguintes con- cepgées: (a) no caso da isengao, admitindo-a como norma de comportamen- to, (a.i) pressupGe antecedente ou conseqiiente que se relacionam com os da regra-matriz tributdria; (a.ii) dentro deste conseqiiente, exclusio do crédito indica a relagdo juridica entre contribuinte e fisco, que confere ao primeiro 0 direito subjetivo de nao cumprir a prestag4o (est4 permitido omitir a con- duta ou a prestag4o); para o fisco o dever subjetivo de nao exigir o cumpri- mento da prestacao (estd vedado exigir); (b) no caso da anistia: também uma norma com estrutura hipotético-condicional: (b.i) na sua hipdtese haverd a previsdo de ocorréncia da relago juridica pertinente a norma priméria dis- positiva (relacdo de multa); (b.ii) no conseqiiente, a relagdo juridica da anistia que, relacionando-se com a da multa, produziré um conjunto vazio, repre- sentativo da inexisténcia de condutas obrigatérias a0 cumprimento da pres- tag4o sancionatéria (multa). IV.2 - Isengo como Norma de Comportamento A afirmacio que inicia este t6pico do trabalho nfo coincide com importantes posigdes de renomados juristas'', para quem a isengao ndo se apresentaria como um tipico fenémeno normativo, estruturado em uma pro- posig4o hipotético-condicional. 10 Processo de positivacdo, para nds € 0 processo de aplicagdo das normas juridicas por pessoa competente. Seguimos a linha tracejada por Eurico Marcos Diniz. de Santi, Langamento Tributdrio, p. 69: “Aplicagio, reiteramos, definindo estipulativamente, €0 fato juridico suficiente, realizado por ato juridico de autoridade, para produg’o de normas juridicas. Este fato juridico corresponde A eficdcia legal de norma de es- trutura (norma produtora de outras normas)”. Paulo de Barros Carvalho, Curso de Direito Tributério, p. 69, sustenta que aplicar a lei “é 0 ato mediante o qual alguém interpreta a amplitude do preceito geral, fazendo-o incidir no caso particular ¢ sa- cando, assim, a norma individual”. José Souto Maior Borges, /sengdes Tributdrias, p. 149, admite que 0 processo de aplicagio nfo requer necessariamente pessoa in- vestida da competéncia de inserir norma no ordenamento, podendo ser apenas 0 in- térprete, como 0 faz 0 advogado no exercicio de sua fungio. Paulo de Barros Carvalho, Curso de Direito Tributdrio, p. 328; Roque Antonio Car- tazza, Curso de Direito Constitucional Tributdrio, pp. 325 e segs. Pepro GuiLHeRMe Accorst LUNARDELLI ar Nao obstante, entendemo-la sustentdvel e, para que isso torne-se cla- ro, mister retroagirmos a algumas formulagGes. Quando tratamos da distingao entre normas de conduta e de estru- tura acompanhamos a célebre orientacao de Norberto Bobbio e Paulo de Bar- ros Carvalho, os quais atribuem a primeira a propriedade de dirigir-se ime- diatamente 4 conduta intersubjetiva das pessoas, ao passo que na segunda tal caracteristica seria apenas mediata, afinando-se 4 missio de fazer emer- gir no ordenamento juridico enunciados lingiifstico-normativos, cujas sig- nificages utilizamos para a composi¢ao das referidas normas de conduta”. Ao sustentarmos tal caracterfstica para as isengdes devemos, entao, identificar qual a norma de estrutura que projeta no ordenamento enuncia- dos normativos, a fim de empreendermos aquela tarefa de montagem da sua respectiva norma de comportamento. Isto nos obriga a tocar, ainda que brevemente, o tema das competén- cias, a qual tem sido apregoada pela doutrina como a “aptidao para criar, in abstrato, tributos”"?. “Ao outorgar essa aptidio, o constituinte fé-lo as pessoas politicas, obviamente por serem as tnicas que possuem Poder Legislativo ¢ indicou expressamente os fatos que poderiam ser descritos na norma e conectados a entrega de dinheiro'*. Precisaremos 0 conceito de competéncia, que se mostra ambiguo, pois tanto pode ser utilizado com o significado de uma norma, como quan- to ao exercicio do direito subjetivo respectivo a esta norma. Nas linhas que seguem, acreditamos expor tal ambigiiidade relacionada & competéncia, & medida que evidenciaremos a distingao entre a norma e o exercfcio decor- rente da mesma. Mantendo-nos reto as premissas de nosso trabalho, o sistema juridico apresenta fechamento e homogeneidade sintaticos decorrentes do conjunto de normas constitucionais e da compostura hipotético-condicional pertinente a qualquer norma, na qual vinculam-se, pela imputagao dedntica, predeces- sor € sucessor. 2 E importante notar que nio estamos fechando as fungdes das normas de estrutura como exclusivamente capacitadas a projetar enunciados normativos constituintes de normas de comportamento, Estamos apenas realgando tal fungo por ser ela impres- cindfvel para a presente dissertagio. ') Roque Antonio Carrazza, Curso de Direito Constitucional Tributdrio, p. 218. No mesmo sentido Paulo de Barros Carvalho, Curso de Direito Tributdrio, p. 142. Ci los Santiago Nino, Introduccién al Andlisis del Derecho, p. 222, define competén- cia como “la facultad para regular juridicamente la conducta de los demds”. | Marco Aurélio Greco, Norma Juridica Tributdria, p. 58. 82 IsENCOES TRIBUTARIAS Sendo norma, cabe, primeiramente, a Constituigio, assumindo as vezes de estrutura, juridicizar quais e tais eventos do fendmeno social tor- nar-se-do fatos juridicos capazes de desencadear a dialética normativa. E por isso que se dividem as normas em de estrutura e de conduta, pois, com tal classificag4o, permite-se compreender esse afunilamento do ordenamento numa série de normas cada vez mais especfficas na sua pecu- liar fungdo de motivar a conduta humana intersubjetiva. Considerando o significado de competéncia enquanto norma, te- mos, entdo, uma norma de estrutura localizada no nivel das normas consti- tucionais, cujo antecedente prevé um érgio' legislativo competente e 0 res- pectivo processo de produgao de enunciados normativos e, no conseqiien- te, o resultado desse processo, os enunciados normativos, a partir dos quais, compondo a significagao, formaremos normas de comportamento, no caso, regras-matrizes de incidéncia tributdria ou de isengao. Com efeito, ao analisarmos, por exemplo, o enunciado contido no art. 153, inciso I, da Constituigdo Federal, comegamos a compreender a exten- so do fenémeno normativo relativo a disponibilizagao da renda, para fins tributdrios. Subjacente a tal enunciado apuramos uma norma prevendo 6rgaos qualificados para dar inicio ao processo legislativo complementar para re- gulagao daquela exagio (art. 61 e pardg. 1°, inciso II, letra b), seguido de um qualificado processo de produgdo (maioria absoluta - art. 69) em am- bas as Casas Legislativas (respectivamente 0 érgao Camara dos Deputados € 0 6rgao Senado Federal), exigindo, ainda, a sanco presidencial ou pro- mulgagao (art. 65) e, finalmente, a publicagio feita por érgdo também juri- dicamente competente, qual seja, pelo didrio da imprensa oficial. Ora, dada a existéncia desta norma de competéncia para legislar e o seu respectivo exercicio (exercfcio da competéncia legislativa), obtém-se, ao final, o produto do processo legislativo, qual seja, enunciados normativos identificados em uma especifica lei complementar, portadores de significa- dos jurfdicos. No caso do exemplo adotado, 0 resultado do exercicio da competén- cia legislativa aponta para os enunciados pertinentes ao Cédigo Tributério Nacional (Lei n° 5.172, de 25.10.66), cujos enunciados do art. 43 conotam propriedades do conceito renda, pega fundamental para a organizacdo da hipotese da respectiva regra-matriz do imposto sobre a renda: a conduta 'S Tanto o drgdo quanto o processo de produgdo normativa derivam de feixes de nor- mas que os transformam em juridicos, conforme preleciona Lourival Vilanova, Cau- salidade e Relagao no Direito, pp. 168 ¢ segs. Peoro GUILHERME ACCORS! LUNARDELL! 83 hipotética deverd estar relacionada a aquisig4o de disponibilidade econédmica ou juridica, assim entendido o acréscimo patrimonial decorrente da aplica- ¢4o do capital, da renda ou da combinagao de ambos, ou ainda, quaisquer acréscimos patrimoniais nao vinculados aos mesmos. Vé-se que ainda nao é possivel preenchermos completamente essa regra-matriz, pois, embora j4 tenhamos algumas caracterfsticas da sua hi- potese, nem esta e tampouco o conseqiiente esto exauridos. Isso porque, faz-se necessario localizarmos outros enunciados nor- mativos advindos de outra norma de competéncia constitucional e de novo exercicio de competéncia do 6rgao poder legislativo, que, agora, estard exer- cendo-a para elaborar lei ordindria, cujo quérum nao é qualificado, também relativa 4 norma do imposto de renda'*, Vamos encontrar, entao, o art. 6°, do Decreto-lei n° 1598, de 26.12.77", definindo lucro real como 0 lucro liquido do exerctcio, ajusta- do pelas adi¢ées, exclus6es ou compensagées prescritas ou autorizadas pela legislagdo tributdria. Mas, como se vé, ainda nao esgotamos os aspectos da regra do imposto de renda, obrigando-nos a continuar a consultar os suces- sivos enunciados postos pelo direito positivo. Contactamos, entio, o pard- grafo 1° do aludido art. 6°, que trata do conceito lucro liquido, o qual, por sua vez, reporta-se ao art. 11. Estamos empreendendo assim uma longa experiéncia (juridica) co- lateral, conforme salientado por Paulo de Barros Carvalho", experiéncia essa imprescindivel para formag&o dos objetos juridicos, no caso, da regra-ma- triz do imposto de renda a que nos referimos no momento. Conhecidos tais enunciados, refletimos as significagdes do termo renda e de todas as demais atinentes 4 mencionada regra-matriz - do aspec- to espacial, temporal, pessoal e quantitativo alfquota e base de calculo””. '6 Se atribuirmos a referida norma de estrutura constitucional todos os qualificativos do processo legislativo em exame, chegaremos & conclusao que estamos diante de uma tinica norma de estrutura respons4vel pela produgao dos enunciados; porém, se Ihe atribuirmos os predicados pertinentes a um processo legislativo qualificado, ti- pico de lei complementar, deveremos inferir, entéo, que na Constituigdo hd, pelo menos, duas normas de estrutura responsdveis pela produgao daqueles enunciados: a que projeta os relacionados a lei complementar e os vinculados & lei ordinéria. Seguimos a segunda alternativa, portanto, duas normas de estrutura: a da lei comple- mentar ¢ a da lei ordinaria. 17 Egte decreto-lei foi editado sob a vigéncia da Constituigio Federal de 1967, com a Emenda Constitucional n° 01/69, cujo art. 55, inciso II, dava-lhe question4vel fun- damento de validade. 18 Fundamentos Juridicos da Incidéncia Tributdria, p. 98. 19 Neste sentido, assevera Paulo de Barros Carvalho, Curso de Direito Tributdrio, p. 167: 84 IseNcOes TrIBUTARIAS Formaremos, com base nas propriedades fixadas pela legislag4o (en- tenda-se pelos enunciados legislativos), conjuntos de elementos que irao integrar os aspectos da hipdtese e do conseqiiente da norma desse imposto federal. Vemos com esse exemplo que competéncia pode ser tratada como um tipico fendmeno normativo identificado por norma de estrutura constitucio- nal (norma de competéncia), cujo respectivo exercicio enseja o surgimento de enunciados normativos voltados 4 demarcagio de um certo termo jurfdi- co", No caso do conceito renda, as referidas normas de estrutura permi- tiram a exposigao de suas propriedades (juridicas) no contexto do sistema juridico. Se esse fendmeno indica estarmos diante de normas de estrutura, cu- jo exercicio ensejou enunciados e significagdes que compuseram a regra- matriz do imposto de renda, qual sera, entéo, a norma de competéncia ou de estrutura relacionada a regra-matriz da isengao? Vale dizer, qual a nor- ma de estrutura, cujos enunciados nos autorizam lapidar a norma de com- portamento da isengaio? A resposta a tal indagagdo parece ter sido tangenciada por José Sou- to Maior Borges ao afirmar: “Na outorga constitucional de competéncia tri- butdria esté necessariamente contida a atribuigao da faculdade de isentar. “Ao escolher os fatos jurfdicos que lhe interessam como pretexto para desencadear efeitos juridicos, o legislador expede conceitos que selecionam propriedades do even- to. Lembra aquele ilustre professor que os conceitos, quer normativos, quer empiri- cos-naturais ou empfrico-sociais, sio, invariavelmente, seletores de propriedade. Seria impossivel cogitar de uma descrigGo que pudesse captar o fato na sua infinita rique- za de seus predicados. O fato natural da consangilinidade, pondera K. Engish, nao entra, ele todo, em sua conseqliéncia “parentesco”. E citando 0 exemplo de Pontes de Miranda: “A prépria morte ndo é fato que entra nu, em sua rudeza, em sua de- finitividade no mundo juridico”. 2 Neste sentido também haveremos de compreender 0 art. 6° do Cédigo Tributdrio Nacional, ao dispor que a atribuigdo de competéncia aos entes tributantes abrange a competéncia legislativa plena. A plenitude legislativa refere-se aos enunciados nor- mativos responsdveis pela especificagio das propriedades de um determinado con- ceito jurfdico. Tal competéncia, ndo obstante intitulada plena pelo CTN, sofre limi- tages de indole semfntica, 4 medida que propriedades inseridas pelos referidos enun- ciados nio poderio desviar-se daquelas propriedades minimas jd contidas nos enun- ciados constitucionais. Assim, em relagiio ao termo renda, no poderd caracterizé-lo uma propriedade atribufda ao termo mercadoria: renda como objeto da prestagao acertada em um contrato mercantil. Objeto de tal prestacgdo é a mercadoria. Neste sentido, sobre as limitagdes da legislagio plena, Aliomar Baleciro, Direito Tributd- rio Brasileiro, p. 72. Peoro GuitHerMe Accors! LUNARDELL! 85 Neste sentido, pode-se afirmar que o poder de isentar € corolério do poder de tributar’?!. Tivemos a oportunidade de demonstrar que competéncia tributéria, enquanto norma, refere-se a uma de estrutura que demarca no seu antece- dente 0 drgao e¢ 0 respectivo processo legislativo e, no consegiiente, o resul- tado deste processo, os enunciados normativos contidos em determinado veiculo introdutério, indice temAtico para as significagdes que extrairemos para a elaboragao de normas de conduta. Enquanto direito subjetivo, com- peténcia é 0 exercicio da conduta decorrente da permissdo contida nesta norma. No exemplo da regra do imposto de renda, pudemos verificar que os enunciados postos por leis complementar ou ordinéria trouxeram defini- ¢Ges do termo renda, ou seja, as propriedades desse termo, ou os critérios de uso do mesmo, a partir dos quais demarcamos o objeto” normativo ren- da e sua regra-matriz. Assim, quando Souto Maior Borges diz que a competéncia de isen- tar € conseqiiéncia da de tributar, afigura-nos que o Mestre estd referindo- se a esse mesmo fen6meno normativo, ou melhor, a ou as normas de estru- tura, cujo exercfcio do direito nelas conferido, pelos respectivos 6rgaos le- gislativos, produz enunciados com significagdes suficientes para demarcar os conceitos relacionados aos elementos da regra-matriz de isengdo. Com efeito, a partir do significado de base’ contido na Carta Mag- na, e, via de conseqiiéncia, de propriedades basicas a ele relacionadas, su- cessivos enunciados normativos irao introduzir no termo renda outras tan- tas propriedades, de modo a tornar o conjunto de elementos por ele referi- do cada vez mais especffico. Parece-nos, entdo, que a competéncia para isentar, aludida por Sou- to Maior Borges, € 0 exercicio do direito subjetivo de legislar, regulado pe- las referidas normas constitucionais de estrutura, cujas significagdes dos enunciados inseridos no veiculo introdutor produzido moldam 0 conceito renda. 21 Isengdes Tributdrias, p.32. No mesmo sentido, Seabra Fagundes, Revogabilidade das Isenges Tributdrias, Revista de Direito Administrativo, vol. 58, p. 1; Rubens Gomes de Sousa, Natureza dos dispositivos legais que concedem isengdes tributdrias, Es- tudos de Direito Tributdrio, p. 252. 2 Estas seriam as caracterfsticas definitérias da palavra, segundo Guibourg, Ghigliani Guarinoni, Introduccién al Conocimiento Cientifico, pp. 46 ¢ segs. 23 Luiz Alberto Warat, Introdugdo Geral ao Direito, p. 124. Para este Autor significa- do de base é aquele que “no plano teérico, podemos reconhecer abstraindo a signi cago de uso e considerando um sentido padronizado a partir dos elementos de sig- nificagio comuns nos diferentes usos”. 86 IseNCOES TRIBUTARIAS A moldagem dé-se por forga do relacionamento de conjuntos de ele- mentos formados por tais enunciados. Admitamos que 0 conjunto relacio- nado ao termo renda (0 qual denominaremos “Z”) apresente as proprieda- des “a”, “b” e “c”, Ao mesmo poderao ser agregadas outras mais, “d”, “e” e “f’, perten- centes a um outro conjunto de elementos (“K”), bastando que sejam utili- zados os instrumentos legislativos adequados. O primeiro deles € que, no plano jurfdico-existencial, manifestem-se os referidos enunciados norma- tivos. O segundo é que, no plano légico-juridico, efetue-se o cdlculo relacio- nal entre tais conjuntos. Assim, para criarmos 0 conjunto de elementos “Z.1”, haveremos de contar com 0 relacionamento entre os conjuntos “Z” e “K”. As proprieda- des de “Z” e “K” darao forma ao conjunto “Z.1”, 4 medida que estabelega- mos a adig&o ou uniao de ambos os conjuntos de propriedades”*. ign O relacionamento das propriedades “a”, “b” e “c”, com os elemen- tos “d”, “e” e “f”, tera por produto o conjunto da soma de todas elas. O ter- mo renda serd representado, assim, nao mais por um conjunto com trés, mas um com seis propriedades. Por sua vez, se o propésito for subtrair propriedades do referido con- junto, haveremos de contar novamente com o clculo relacional, no caso, a relag&o de intersecgao entre classes”. Retornando aos referidos conjuntos, teremos 0 conjunto “‘Z” deter- minado pelas propriedades “a” e “b” interseccionando-se com o conjunto “X”, cuja propriedade serd “c”**. Ambos conjuntos nao vazios e mutuamente excludente, ou disjuntos. * Alfred Tarski, Introduccion a la Logica y a la Metodologia de las Ciencias Deducti- vas, p. 105. Segundo este autor, “Dadas dos clases cualesquiera K y L, puede for- marse una nueva clase M que contiene como elementos aquellos, y solamente aque- Ios, objetos que pertenecen al menos a una de las clases K y L; podria decirse que la clase M se obtiene de la clase K agregindole los elementos de la clase L. Esta operacién es llamada adicién de clases, y la clase M recibe el nombre de suma o unién de las clases K y L”. 25 Alfred Tarski, Introduccidn a la Logica y a la Metodologia de las Ciencias Deducti- vas, p. 102: “Decimos que dos clases K y L se Intersecan si ellas tienem al menos un elemento en comin y, ademés, cada una contiene elementos no contenidos en la otra”. No caso abordado em nosso trabalho, as classes de objetos cogitados tém em comum a propriedade de nao serem classes vazias ou nulas e também de os respec- tivos elementos ndo pertencerem nem a uma, nem a outra. Tais classes sio mutua- mente excludentes. 6 “Qu uma coisa tem propriedades que nenhuma outra tem, e pode-se entio sem mais distingui-la das outras através de uma descrigao, e referi-la; ou entéo hd diversas coisas que t¢m em comum as suas propriedades, e é de todo impossivel mostrar uma Peoro GuiLHerme Accorsi LUNARDELLI 87 Af esta, segundo entendemos, a competéncia para isentar menciona- da por Souto Maior Borges. Os enunciados normativos introduzidos por nor- ma de estrutura refletem significagdes que se aglutinam em conjunto de ele- mentos, cuja relagdo dar nova forma ao conjunto de elementos atrelado ao termo renda. Competéncia para isentar, portanto, deve ser entendida sob estas duas perspectivas juridicas; a existencial vinculada aos enunciados e a ldgica, atrelada ao relacionamento entre conjuntos de elementos que demarcam os conceitos tributdrios e isentos em questao. Justamente neste ponto situa-se nossa divergéncia em relagdo ao pensamento de Paulo de Barros Carvalho. Segundo este Professor a iseng4o impée limites na regra-matriz tri- butdria, por decorréncia do cdlculo relacional havido em um ou alguns de seus aspectos, Assim, nas significagdes advindas dos enunciados normati- vos encontrariamos apenas conjuntos isolados e vocacionados ao exclusi- vo relacionamento com a regra-matriz. Entendemos que o fenémeno em tela nao apresenta unicamente tal dimensdo, porquanto os conjuntos poderao estar formando uma estrutura normativa tipica de comportamento, que também poderd relacionar-se com a regra-matriz tributdria. A possibilidade de composigao dessa estrutura normativa, que deno- minamos regra-matriz isencional, dependera das significagdes extraidas dos enunciados normativos e suas propriedades. Se forem suficientes para saturar os categoremas de uma estrutu- ra normativa hipotético-condicional, haveremos de ter uma regra-matriz de isengdo, com antecedente e conseqiiente prevendo, hipotética e respectiva- mente, o evento isento e a relagio juridica de isengio entre fisco e contri- buinte. Quando acima definimos os conjuntos “K”, “Z”, “Z.1” e “X”, mar- cando suas propriedades, trabalhamos com uma linguagem que reduziu muito seu campo de significagao, permitindo, com isso, melhor compreen- s&io do fendmeno normativo sob nossa anilise. Entretanto, quando voltamos a atengdo para o exame das proprie- dades dos termos juridicos, verificamos que a tarefa mostra-se com grau de delas. Se nada distingue uma coisa ndo posso distingui-la, porque sendo fica distin- ta.” Ludwig Wittgenstein, Tratado Légico-Filosdfico - Investigagdes Filoséficas, p. 33/2.02331. 88 IseNGdes TrIBUTARIAS dificuldade muito maior; vale dizer, a demarcag&o de um conjunto de ele- mentos e€ sua respectiva significagao, tomando-se por base o direito posto, ndo é algo que o intérprete executa automaticamente com o simples conta- to com seu indice tematico que é 0 texto legislado. Isto ocorre porque o direito positivo deita-se sobre linguagem, a qual sempre estard marcada pelas seguintes caracteristicas indicadas por Alf Ross”; “En resumen, los seguintes axiomas se aplican a las palabras en el uso cotidiano: 1) El significado posible de toda palabra es vago; su posible campo de referencia es indefinido.; 2) La mayor par- te de las palabras son ambiguas; 3) El significado de una palabra se determina en forma més precisa cuando ella es considerada como parte integrante de una determinada expresién; 4) El sig- nificado de una expresién - y con ello el significado de las pala- vras contenidas en la misma - se determina en forma més preci- sa cuando la expresién es considerada en la conexién en que es forlulada. Esta conexidn puede ser lingiifstica (el contexto) 0 no lingiifstica (la situacién). A partir de 3) y 4) es posible formular la siguinte generalizacién: el significado de una palavra es una funcién de la conexién - expresi6n, contexto, situacién”. Tais problemas, todavia, ndo devem fazer o intérprete recuar quan- do possuidor dos instrumentos capazes de fazé-lo transpor as barreiras na- turais da linguagem cotidiana, propria do direito positivo. Quer pela compreens&o das relagdes sintagmaticas e associativas, quer pelas conexGes contextuais ou situacionais, o intérprete tera em maos competentes meios de desvendar a ambigiiidade e vaguidade dos enuncia- 27 Sobre el Derecho y La Justicia, p. 112. Este relacionamento das palavras ¢ respecti- vas oragées € definido por Luiz Alberto Warat, O Direito e sua Linguagem, p. 31, como relagées sintagmaticas, de primeiro ¢ de segundo grau, ¢ associativas. As sin- tagmaticas permitem identificar 0 significado das palavras por um processo de con- traste e oposi¢fo com outros termos contidos na prdépria oragdo. Assim, 0 significa- do originado por relagdes de primeiro grau seria derivado do contraste imediato das palavras, com aquelas que a cercam. De segundo grau, por forca do contato mediato com outras palavras que a acompanham na oragio. Por sua vez, relagdes associati- vas, define Warat: “as palavras, segundo Saussure, associam-se na meméria ¢, assim, formam grupo no seio dos quais se exercem relagGes muito diversas. Desta forma, a palavra “mie”, por exemplo, evocard uma série de outras palavras (ternura, prote- ¢ao, seguranga). Tais conecgdes sio completamente diferentes das relacdes sintag- miaticas. O seu suporte nao é a extensao. Elas nao se articulam in presentia das pala- vras no discurso, mas se manifestam de forma interiorizada no sujeito (in absentia). Estamos falando daquilo que Saussure denomina “relagdes associativas”. Pero GuitHerme Accorsi LUNARDELLI 89 dos legislativos, ou seja, de referir-se a um dado objeto, no caso, em tiltima instancia, 4 conduta regulada intersubjetivamente. Esclarecedor o exemplo citado por Luiz Alberto Warat: “... poderfa- mos pensar que as palavras ‘matar’ e ‘alguém’ adquirem uma significacao juridica quando as analisamos como formadoras do sintagma ‘matar al- guém’; no entanto, esse sintagma sé adquire o seu sentido pleno quando do entrelagamento com outros tipos penais ou com o ‘bem jurfdico’ protegido ¢ incluido em cada um dos titulos do Cédigo Penal”**, Diante desse quadro, no qual a significag&o de um certo enunciado normativo torna-se clara a medida que submetida a freqiientes processos de oposigao a outras significagdes advindas do contexto juridico, cabe indagar se tais significagdes poderao ou nao compor a regra-matriz de isengdo que mencionamos. Parece-nos que a resposta é afirmativa. Com efeito, no processo de interpretagdo dos textos normativos o exegeta encontra-se tolhido pelos referenciais sintaticos da norma juridi- ca completa, e semnticos, estes ultimos que serao descobertos com o uso dos instrumentos contextuais-sintagmaticos. Dentro deste campo, caberd a ele, ao intérprete, ir qualificando os aspectos da estrutura normativa, dando fei¢ao a regras-matrizes tributdrias, de iseng4o, normas que impdem deveres instrumentais etc. O limite a esta atividade, portanto, esta na projegdo sem4ntica dos enunciados. Sendo suficientes para exaurir os categoremas da regra-matriz tri- butdria, a implicagio e a aplicagdo deéntica se encarregarao de fazer o res- to. Do mesmo modo acontecerd se tais enunciados permitirem o preenchi- mento dos aspectos da regra-matriz da isengao. Teremos, no caso da mencionada regra-matriz da isengio, na hip6- tese, a previsao da possfvel ocorréncia do evento juridico isento e, no con- seqiiente, da relagdo juridica de isengado. Imaginemos 0 seguinte enunciado”: estdo isentas do imposto de ren- da as pessoas sexagendrias. No exemplo proposto, e seguindo a tese de que a isengio provocaria mutilagdes parciais no 4mbito da regra tributdria, tal enunciado estaria a * O Direito e sua Linguagem, p. 31. 2 Posto por lei complementar ou ordindria. 90. IsencOes TRIBUTARIAS indicar alterac¢des do aspecto pessoal, na parte em que retira do seu conjun- to aquelas pessoas com sessenta anos ou mais. Deformando parcialmente um de seus aspectos, a regra-matriz tribu- taria se projetaria sobre o mundo existencial de acordo com a performance, segundo a qual, o enunciado que diz que os sexagendrios esto isentos do imposto de renda, remete a uma primeira significacdo atrelada ao conjunto de elementos que atendam a seguinte fungdo: 0 conjunto de todas as con- dutas de adquirir renda por pessoa de sessenta anos ou mais. Tal conjunto, por sua vez, assumird a posi¢ao do aspecto material da regra-matriz isen- cional, conclusaéo que chegamos por confronté-la, a significagao, com ou- tras pertencentes ao contexto que estamos analisando. Tal conduta deriva de enunciado manifestado em contexto juridico, 0 que nos obriga a extrair 0 seu qualificativo normativo. Além disso, aponta uma conduta humana, al- go possivel se a linguagem que a expressar utilizar-se de verbo pessoal e in- completo. A propria andlise da significagZo do termo renda, segundo suas ca- racteristicas jurfdicas, nos levaré 4 mesma conclusao de que se vincula a renda adquirida por pessoa, fisica ou juridica. J& as significagdes espago-temporais do evento-conduta decorrem das condigées formais aprioristicas do conhecimento humano, advertidas por Immanuel Kant™. Para conhecer o evento “adquirir renda por pessoa sexa- gendria” é preciso denotd-lo no espago e no tempo a partir das referidas condigées. Para conhecer 0 evento juridico isento sera preciso ainda que tais coordenadas correspondam aquelas intencionalmente dispostas na regra de iseng4o, o que foi conseguido por meio de contrastes realizados com as coordenadas de tempo e espago contidas na hipétese da regra-matriz do im- posto de renda. Tomamos de empréstimos, neste momento, as palavras de Paulo de Barros Carvalho que, embora referindo-se ao critério espacial da regra-ma- triz tributdria, entendemos inteiramente aplicaveis aos critérios temporal e mesmo 0 especial da regra-matriz da isengao: “Hi regras juridicas que tra- zem expressos Os locais em que 0 fato deve ocorrer, a fim de que irradie os efeitos que lhe sao caracteristicos. Outras, porém, nada mencionam, carre- gando implicitos os indicios que nos permitem saber onde nasceu 0 laco obrigacional. E uma op¢ao do legislador. Aquilo que de real encontramos, ® Critica da Razdo Pura, pp. 61 a 87; No mesmo sentido, coletinea Os Pensadores, p. 09. Pepro GuitHerme Accors! LUNARDELLI 91 no plano do direito positivo brasileiro, é uma dose maior ou menor de es- mero na composigao dos critérios espaciais, de tal modo que alguns sao ela- borados com mais cuidado que outros. Todavia, ainda que aparentemente pensemos ter 0 politico se esquecido de mencioné4-lo, haver4 sempre um plexo de indicagées, mesmo tacitas e latentes, para assinalar o lugar preci- so em que aconteceu aquela acfio, tomada como nticleo do suposto norma- tivo"#!, Aplicdvel, também, sua classificagao a respeito do critério espacial: “Acreditamos que os elementos indicadores da condig&o de espago, nos supostos das normas tributdrias, hao de guardar uma dessas trés formas com- positivas, diretriz que nos conduz a classificar o género tributo na confor- midade do grau de elaboragao do critério espacial da respectiva hipdtese tributéria: a) hip6tese cujo critério espacial faz mengao a determinado lo- cal para a ocorréncia do fato tipico; b) hipstese em que o critério espacial alude a dreas especificas, de tal sorte que 0 acontecimento apenas ocorrerd se dentro delas estiver geograficamente contido; c) hipotese de critério espacial bem genérico, onde todo e qual- quer fato, que suceda sob o manto da vigéncia territorial da lei instituidora, estard apto a desencadear seus efeitos peculiares”*. A hipétese da regra de isengao permite visualizar 0 evento jurfdico isento, qual seja, a conduta de adquirir renda por pessoa sexagendria, ao fi- nal de cada perfodo de apuragao* e conforme as possibilidades espaciais acima indicadas. Vejamos, agora, 0 seu conseqiiente. Particularmente 0 seu aspecto pessoal. Considerando que o enunciado prevé a conduta de pessoas com, no minimo, sessenta anos, refere-se a um conjunto que apresenta uma primei- ta caracteristica posta por enunciados do Cédigo Civil, quais sejam, que seus elementos correspondam a sujeitos de direito (art. 2°), aos quais conjugar- se-4o a propriedade originada pelo enunciado isencional, resultando: sujei- tos de direito com no minimo 60 anos. ‘Curso de Direito Tributdrio, p. 170. ® Curso de Direito Tributdrio, p. 172. 33 No tocante ao perfodo de apuragio, igualmente, esta a critério do legislador, poden- do ser anual, mensal, semestral ou até didrio. 92 ISENGOES TRIBUTARIAS Temos assim, 0 critério de identificago desse conjunto, cujos ele- mentos deverio satisfazer 4 seguinte fung4o proposicional: “X” 60 anos - 0 conjunto de todos os sujeitos de direito "X”, tais que “X” sejam pessoas que tenham 60 anos ou mais™. Portanto, no critério material da regra-matriz da isengdo verificamos 0 conjunto dos elementos relacionados a conduta de adquirir renda por pes- soa COM sessenta anos ou mais; enquanto no pessoal, na parte credora des- sa relagdo juridica da isengdo, sujeitos de direito com pelo menos sessenta anos. Seguimos em frente para localizar a contraparte nesta relagao de isen- cao. Mantendo-nos junto ao exemplo do imposto de renda, identificamos que o devedor seré a Unido Federal**. A tal inferéncia chegamos analisando a norma de estrutura que deu origem aos enunciados normativos isencionais. Todo o processo legislativo foi concretizado por 6rgios legislativos perten- centes a Unido Federal, sendo sancionada pelo seu representante maximo, o Presidente da Reptiblica. Salvo a hipdtese de o préprio enunciado habili- tar outra pessoa, publica ou particular, para figurar nesta relago de isencao, a significagéo que extrafmos aponta para a Unido Federal. Por fim, no que diz respeito ao critério quantitativo, a regra de isen- go trard também uma base de célculo, uma perspectiva dimensfivel” da conduta que se quer ver desonerada, e respectiva alfquota que poderd variar de 1% a 100%, dependendo dos fundamentos axiolégicos que nortearao a atividade do legislador ao fixa-la. A base de cdlculo da regra de isengao justifica-se pela proximidade do art. 3°, do Cédigo Tributario Nacional, permitindo enquadré-la na cate- 4 Alfred Tarski, Introduccién a la Logica y a la Metodologia de las Ciencias Deducti- vas, p. 97. Pessoa juridica de direito publico interno - art. 14, inciso I, do Cédigo Civil. Ressal- te-se que desconsideramos a possibilidade de figurar nessa relagdo terceiros distin- tos da Unido Federal. A respeito deste assunto, consultar Paulo de Barros Carvalho, Curso de Direito Tributdrio, p. 202. % Geraldo Ataliba, Hipédtese de Incidéncia Tributdria, p. 101. A titulo esclarecedor, para os critérios conotacionais que estamos sustentando pertencer 4 regra-matriz da isen- gio, enquanto norma geral e abstrata, o Prof. Aires Barreto, (Base de Cdlculo, Ali- quota e principios constitucionais, p. 91), adota a terminologia de base de célculo, reservando ao termo base calculada 0 que entendemos haver quando do surgimento do enunciado protocolar denotativo de situagio objetiva, advindo do ato-norma for- malizador do crédito tributario efetuado pelo contribuinte ou do efetivo langamento tributério feito por agente competente. Et Pero GuitHerme Accors! LUNARDELLI 93 goria das relagées patrimoniais, porquanto a prestagao, enquanto objeto da relago juridica isencional, pode ser dimensionada em termos pecuniarios””. Como dissemos, a alfquota tem sua significagdo condicionada ao modo explicito ou implicito de como os enunciados a ela se referem. Ge- ralmente tais enunciados quedam silenciosos a seu respeito, permitindo in- ferir que, de acordo com fundamentos valorativos subjacentes a tal medida € a patrimonialidade da relagao, toda aquela perspectiva dimensivel esta- 14 isenta. Vale dizer, que a alfquota a ser aplicada é a de 100% (cem por cen- to) sobre a base de cdlculo, qual seja, sobre a perspectiva dimensfvel daquela conduta colhida no aspecto material da hipdtese. Diante do exposto, conclui-se: dependendo das significagdes que venham a ser extrafdas dos enunciados normativos, postos por norma de estrutura, o fendmeno da isengio poderd estar embasado por norma de com- portamento, cujos categoremas devidamente esgotados darao nascimento ao que denominamos regra-matriz de isengao. 37 Estamos, aqui, seguindo a classificagio de Caio Mario da Silva Pereira, Institu do Direito Civil, vol. II, p. 13. Para este autor: “Como j4 acima dissemos, 0 objeto da obrigagdo € uma presta¢ao, e esta sempre constitui um ato humano, uma ativida- de do homem, uma atuagiio do sujeito passivo. As vezes este fato do homem se con- cretiza ou se materializa numa coisa. Mas, ainda assim, nio é de confundir-se 0 ob- jeto da obrigagdo com a coisa sobre que incide. Quando a prestagao é um facere, est nitido o ato de devedor: a ago humana como seu objeto, consistente na realizacao de um trabalho, na confec¢ao de uma coisa, na emissio de uma declaragio de von- tade etc., tudo envolvido na expressdo genérica - prestagdo de um fato - e, como no facere se contém igualmente o non facere, 0 mesmo sentido de atividade humana esta abrangido na omissdo ou na abstengdo, tal qual se apresenta na ago. Quando a obri- gagio é de dar ou de entregar, seu objeto nao é a coisa a ser entregue, porém a ativi- dade que se impés ao sujeito passivo, de efetuar a entrega daquele bem; 0 credor tem © direito a uma prestagio, ¢ esta consiste exatamente na agdo de entregar, correlata a0 direito reconhecido ao sujeito ativo de exigir que Ihe seja efetuada a entrega. O objeto da obrigagaio pode variar de categoria, dizendo-se que é positivo, ¢ a obriga- go se diz também positiva quando se cumpre por um dare ou um facere; ou negati- vo e se fala que hd obrigagdio negativa, quando implica em uma abstengio”. Adotan- do os termos do Caio Mario, a relagio de isengiio enquadra-se dentre as obrigagées negativas de dar. Tal afirmativa, entretanto, requer o seguinte esclarecimento. Se exa- minarmos atentamente a classificagio do Professor Caio M4rio, notaremos que a televancia estd toda na posig&io do devedor em face do credor; assim, a obrigago é de dar ou de fazer, porque 0 devedor deverd ter a agdo de entregar a coisa ou de fa- zer algo. No exemplo trabalhado, entio, seria inaplicdvel esta classificagao, porque na relagdo de isengdo aparece como devedor a Unido Federal. Entretanto, se deslo- carmos 0 mencionado ponto de relevancia para a posi¢ao do credor, ¢ modalizarmos a prestagdio com o negador, teremos mantida a classificagio. Dessa forma, as obri- gagdes de isencdo seriam de non dare, pois o credor esté permitido omitir ou nao prestar. 94 IsENGOES TRIBUTARIAS IV.3 - A Regra-Matriz da Isencao, seu Antecedente e Conseqiiente Aproveitando o exemplo exposto no tépico anterior, temos condigdes de formular a regra-matriz da isengao. Com estrutura idéntica a tributdria, diferengando-se nos seus veto- tes semnticos, a isencional contém uma hipétese conotando as proprieda- des de um certo evento ainda por ocorrer em determinadas coordenadas de tempo e de espago, ¢ uma tese, ou conseqiiente, prescrevendo 0 efeito da possivel concretizagio do evento hipotético, que é a relagao juridica isen- cional entre contribuinte e fisco. A compostura geral e abstrata* deste conjunto hipotético-condicio- nal, denominamos regra-matriz da isengdo. Vejamos, entao, os respectivos aspectos, parafraseando as anotagdes de Paulo de Barros Carvalho” e adap- tando-as as premissas deste trabalho: I- a hipdtese: a) critério material: qualificagéo de uma conduta-tipo, de um evento, feita por um verbo pessoal e respectivo complemento“; b) conotagiio das coordenadas abstratas de tempo e de espago da- quela conduta-tipo; II - 0 conseqiiente 38 Sobre os conceitos de norma juridica geral e abstrata, seguimos Norberto Bobbio, Teoria della Norma Giuridica, p. 231: “Cosi consigliamo di parlare di norme gene- rali quando ci troviamo di fronte a norma che si rivolgono a uma classe de persone; e di norme astratte quando ci troviamo di fronte a norme che regolano un’azione-tipo (0 una classe di azioni)”. Curso de Direito Tributdrio, p. 331; a adaptagiio € necessdria porque 0 mencionado Professor sustenta que a isengdo, sendo norma de estrutura, atingiria a regra-matriz de incidéncia tributéria por oito modos distintos, sempre ligados aos respectivos as- pectos dessa regra de incidéncia tributéria. Para nés, todavia, por admitirmos a re- gra-matriz da isengfio como norma de conduta, sustentamos nao a mutilagdo parcial dos critérios da regra tributdria, mas sim a formagao dos critérios da propria regra da isengio. 4 Cabe o seguinte alerta de Paulo de Barros Carvalho, ibidem, p. 169: “Regressando ao t6pico da transcendente importancia do verbo, para definigéo do antecedente da norma-padrao do tributo, quadra advertir que nao se pode utilizar os da classe dos impessoais (como haver), ou aqueles sem sujeito (como chover), porque comprome- teriam a operatividade dos designios normativos, impossibilitando ou dificultando seu alcance. Isso concerne ao sujeito, que pratica a ago, e bem assim ao complemento do predicado verbal, que, impreterivelmente, hd de existir. Descabe falar-se, portan- to, de verbos de sentido completo, que se expliquem por si mesmos. E forgoso que se trate de verbo pessoal e de predicagéio incompleta, o que importa a obrigatéria presenga de um complemento”. Pepro GuitHerme Accors! LUNARDELLI 95 c) conotago dos sujeitos ativo e passivo da superveniente rela- do juridica isencional; d) conotagao dos elementos quantitativos dessa relagio, vertidos na base de calculo e respectiva aliquota. IV.4 - A Relacao Juridica de Isencdo e o Direito Adquirido Posta & lume a estrutura da norma de isengao, fixemo-nos, agora, no seu conseqiiente, a respeito do qual entendemos caber ainda alguns escla- recimentos atinentes a relac¢do jurfdica isencional entre contribuinte (isen- to) e fisco, Igualmente a relacdo juridica tributéria, na qual examinamos as res- pectivas relagdes de crédito (fisco versus contribuinte) e débito (conversa: contribuinte versus fisco), na regra de isengo hd a de crédito e débito isen- cional, protagonizadas pelo contribuinte isento e 0 fisco. Na primeira, de crédito, encontraremos 0 contribuinte vinculado ao fisco por uma relagdo que lhe confere o direito de abster-se a determinada conduta; esté permitido omitir certa conduta. Na de débito, a relagdo entre fisco e contribuinte, conferindo aquele (ao fisco) o dever de nao exigir a prestagao; esta proibido exigir. Esclaregamos a afirmagao que, em princfpio, poderd causar espécie, pois sujeita 4 seguinte indagagao: Como o contribuinte isento pode figurar numa relagao juridica se nao ocorreu a concretizag4o de evento previsto em norma? Exatamente neste ponto é que se encontra nossa divergéncia em re- lag&o a doutrina que se dedicou ao assunto. A divergéncia esté em que, realmente, sob a 6ptica da regra-matriz de incidéncia tributdria, nao haver4 a concretizag4o de uma conduta-tipo. Sob tal plataforma, frise-se, da regra tributdria, visualizaremos apenas e tao-so- mente dois planos jurfdicos: 0 abstrato, conotando o superveniente evento e relagdo jurfdicos tributdrios; e o concreto: o fato e a relagio devidamente concretizados (também tributdrios)". Entretanto, esta mesma perspectiva nado assegura Aquele que a tem por ponto de observago afirmar a efetiva inexisténcia de previsao de ou- tros eventos juridicos demarcados por normas, cuja concretizagdo dard nas- cimento a relagSes também jurfdicas. ‘! Desconsiderem-se, neste momento, as distingdes que fizemos para as relagées juri- dicas efectual e intranormativa. O que estamos querendo evidenciar € somente 0 que se encontra no ambito de incidéncia da regra tributdria. 96 IsencOEs TRIBUTARIAS Isto porque, considerando o relacionamento, no plano légico, entre as normas tributdria e isencional, as propriedades do evento tributdrio dei- xam de integrar a hip6tese da respectiva regra-matriz, para compor a hipé- tese da norma de isengao. Teremos, agora, nao mais a conotacao do evento tributario, mas sim do evento isento, resultado da incorporagiio de suas pro- priedades no antecedente da mencionada regra-matriz isencional. Portanto, a concretizagéo em enunciado protocolar da respectiva conduta prevista nesta hipstese dard ensejo ao fato isento e nao mais ao fato pertencente a regra-matriz tributéria. Via de conseqiiéncia, pela causalidade juridica, teremos a relagao juridica de isengo. Esclarecedoras, do que ora afirmamos, sao as colocagées de Alfre- do Augusto Becker: “O que diferencia uma regra jurfdica de outra, confe- rindo especificidade a cada regra juridica, € o contetido da hipétese de inci- déncia e da regra; noutras palavras, é a natureza dos fatos que compoem a hipdtese de incidéncia e a natureza das conseqiiéncias (efeitos juridicos; exemplo: contetido da relagao jurfdica) predeterminadas pela regra e con- dicionadas & realizagao integral da hipdtese pelos acontecimentos de todos os fatos previstos como elementos integrantes de sua composigéo”, Como vimos no tépico referente 4 norma de iseng&o enquanto nor- ma de comportamento, a qualificago do evento e da relagdo de isengao dependerao de as significagdes dos enunciados normativos terem condicdes de preencher os categoremas de uma proposigdo normativa, dando vez a regra-matriz de isengo. Se tais significagdes forem suficientes, 14 estar4, no ordenamento, a regra-matriz de isengAo tributdria, regulando, abstratamen- te, condutas e relagées juridicas, todas elas pertencentes ao campo isencio- nal, este, inevitavelmente juridico®. 4 Teoria Geral do Direito Tributdrio, p. 290. Neste mesmo sentido, parece-nos a posi- go de Souto Maior Borges, Isengdes Tributdrias, p. 164: “A norma de isengdo, obs- tando o nascimento da obrigagdo tributdria para seu beneficidrio, produz o que jd se denominou fato gerador isento, essencialmente distinto do fato gerador do tributo”. Retornando a Becker, op. cit., p. 293: “Tudo aquilo que existe é um fato e também fato é 0 nao-existir de qualquer coisa; 0 acontecer € fato e outro fato é 0 nio-aconte- cer (ex.: abstengio, omissio, siléncio). Isto permite classificar os fatos em positivos € negativos. Fato positivo é 0 fato de algo existir ou acontecer; fato negativo € 0 fato de algo no-existir ou de nao ter acontecido. A hipétese de incidéncia pode consistir em fato positivo ou negativo. Este é o motivo porque a expressio ‘fato’, a rigor, abran- &e: 0 ato, 0 fato (senso estrito) e o estado de fato. Entretanto costuma-se, quase sem- pre, reservar 0 vocdbulo ‘fato’ como se fosse classe distinta do ‘fato’. E interessante observar que 0 estado de fato é 0 fato (estrito senso) que aconteceu e permanece e que, por isto, pode ser contemplado: ou no momento em que aconteceu (portanto, como fato estrito senso) ou sob Angulo de sua duragdo continuada (portanto, como estado de fato). A hipétese de incidéncia pode consistir em qualquer fato (sentido lato) Positivo ou negativo, seja de natureza fisica, biolégica, psfquica, econdmica, politi- 4 Peoro GuiLHeRMe Accors! LUNARDELL! 97 Segundo nossa andlise, parece ser este também o entendimento de Anténio Roberto Sampaio Déria: “Daf falar-se, usualmente, em direito pui- blico subjetivo do contribuinte, para designar que seu status se determina de acordo com as leis vigentes no momento da verifica¢ao dos fatos tribu- tdveis ou nao tributaveis (fatos geradores ou hipéteses de exclusao do débi- to fiscal). Se cotejarmos os elementos constitutivos do direito adquirido, aduzidos em o némero 22 do capitulo precedente, com o direito puiblico subjetivo do contribuinte, haveremos de concluir que eles se fundem em harmoniosa identidade. Com efeito, a) existird uma norma geral vigente ao tempo e no lugar da ocorréncia do fato, definindo-o como fato gerador de um tributo; b) haverd a ocorréncia do fato gerador, capaz de produzir uma con- seqiiéncia (obrigagdo tributéria), prevista na norma em favor de um titular (direito subjetivo do Estado a uma prestacao e do contribuinte a satisfazé- la nos termos em que a lei previa); c) incorporagdo da consegiiéncia (direito subjetivo do contribuinte de se liberar da obrigag&o de acordo com a lei) ao patrim6nio do titular, sendo-lhe de utilidade concreta (poupar 0 contribuinte seu patriménio de 6nus mais gravosos que aquéle nascido com a obriga¢ao); d) inexisténcia de condigo preestabelecida, alterdvel a arbitrio de terceiro. Por outro lado, se com relagao ao requisito sob letra a) supra, existir lei de isengdo (excluindo, portanto, o crédito tributdrio) ou inexistir lei de- finindo como tributavel ou gerador determinado fato (imunidade ou nao- incidéncia), segue-se que a verificagao in concreto desse mesmo fato nao se traduz pela criagao de uma obrigag4o tributdria (conseqiiéncia), pelo que assiste ao titular um direito subjetivo, de utilidade concreta e integrado ao seu patriménio, de nao fazer ao Estado, com base na manifestagao de rique- za ocorrida (fato), qualquer prestagdo pecunidria compulséria (tributo). Tra- ca, artistica, religiosa etc ... e inclusive de natureza juridica. Basta que a interpreta go da lei (f6rmula literal legislativa) revele estar um determinado fato inclufdo na composigao da hipétese de incidéncia da regra jurfdica. E, se além daquele fato, ou- tro deveria estar inclufdo (ou exclufdo) com fundamento perfeitamente proceden- te no plano politico ou no moral ou por um princfpio de justiga, ainda assim aquele outro fato ndo realizar a incidéncia da regra juridica e, conseqiientemente, nao re- ceberd a incidéncia da regra jurfdica e a conseqiiente irradiagao dos efeitos juridi- cos. O fato (sentido lato) do mundo pré-juridico, quando realiza hipétese de incidén- cia, recebe, automaticamente, a incidéncia da respectiva regra juridica que, ao inci- dir, juridiciza-o, transfigurando-o em fato juridico (ato juridico, fato juridico senti- do estrito, estado de fato juridico) e, pois, integra o mundo juridico”. Os grifos sio do autor. 98 IsENGOES TRIBUTARIAS tando-se, por conseguinte, de um direito adquirido, nao pode lei posterior & ocorréncia do fato, sob pena de inconstitucionalidade, retroagir para esta- belecer um tributo entao inexistente, para agravar o que era devido de acor- do com a norma vigente ou para, de qualquer modo, obnerar as demais con- digdes do débito fiscal do contribuinte’™, Direito adquirido a isengao, portanto, é a relagdo juridica decorren- te da concretizagao do fato juridico isento, havida entre contribuinte (isen- to) e fisco, que regula sua conduta (a do contribuinte), permitindo-Ihe abs- ter-se (est permitido omitir) do cumprimento da prestagio jurfdica (tribu- taria)*’, A relagao de direito subjetivo isencional implica sua conversa, a re- lagdo de dever subjetivo isencional, formada entre fisco (e contribuinte isen- to), desautorizando-lhe (estd proibido exigir) qualquer medida de exigén- cia da prestaco (tributdria). A modalizacao de ambas as condutas decorre do carater necessaria- mente relacional da regra de isengo, espécie de norma juridica. Explica-nos, neste sentido, Lourival Vilanova: “Em rigor, sistema normativo unitdrio (conjunto de uma sd proposigAo de6ntica) é impossfvel se o modo deéntico for (o da Unica proposigo normativa), por exemplo, 0 do proibido. Retomando argumentos de Bobbio (Teoria dell” Ordinamento Giuridico, pp. 25-30) e desenvolvendo-os: sistema normativo cuja Gnica proposigo tudo exaustivamente proibisse, nao sé impossibilitaria a existén- cia humana, como coexisténcia, que requer um mfnimo de permissibilidade licita, como seria um contra-sentido deéntico: dada a estrutura relacional do functor de6ntico, se numa relagao h4 o vedar ou proibir conduta, na rela- ao conversa, necessariamente, d4-se 0 permitir. Se a algum sujeito se veda conduta C, , a outro, correspectivamente, se confere conduta C,, , de card- ter permissivo. Inversamente, se se permite ago ou omiss4o a alguém, pro- fbe-se outrem de impedir 0 permissivo concedido”**. “ Da Lei Tributdria no Tempo, pp. 119/120. O itdlico é do autor. Confira-se também Souto Maior Borges, Isengdes Tributdrias, p. 167. i¢do de direito subjetivo, importante conferir Pontes de Miranda, Si cia Positiva no Direito, tomo II, p. 301: “O direito subjetivo € “indi dualizagiio” da posigdo juridica, o reconhecimento de que alguém, a quem o direito objetivo concede ou reconhece tal posigio, pode invocd-lo, nao como sujeito ativo (a titularidade também 0 pode, como se reclamo aos guardas do jardim a livre aber- tura dos portdes, ou quanto a automével que embaraga a entrada), e sim como sujei- to ativo em que 0 direito se precisou, fazendo-se ‘linha’, em vez de uma das linhas indefinidas da superficie, ¢ se localizou, tornando-se ‘invocdvel’ e ‘realizdvel’ na espécie individual”. Neste mesmo sentido, Lucia Valle Figueiredo, Estudos de Di- reito Tributdrio, p. 36. ‘© As Estruturas Légicas e o Sistema do Direito Positivo, p. 152. 4 Pero GuiLHERME ACcorS! LUNARDELLI 99 Apresentamos, assim, as razdes de nossa discérdia da tese que sus- tenta a norma de iseng&o como norma de estrutura. Verifica-se que a defesa desta tese leva em consideragio o fendme- no normativo que envolve o relacionamento entre a regra tributaria e a da isengao. Poder-se-fa argiiir que, em termos praticos, ter-se-fam os mesmos efeitos na tese ora sustentada ¢ na que predomina na doutrina, pois ambas desembocam no resultado segundo o qual o fisco estaria impedido de exi- gir a prestagdo tributdria. A isengio, enquanto norma de estrutura, produziria campos de nao juridicizagao no antecedente ou no conseqiiente da regra tributdria. Reves- tida como norma de comportamento impediria a exigéncia da prestagao por forca da relagfo jurfdica isencional. Em oposigiio a esta indagagao, esclaremos que ainda que eventual- mente possam apresentar 0 mesmo efeito prdtico, nao nos autoriza a aban- donar, dentro de uma concepgio cientifico-analitica, a integridade do fend- meno normativo. Além disso, ao nos apartarmos daquela corrente vinculada a isengao como norma de estrutura, no estamos querendo dizer que inexista o fend- meno da nao-incidéncia legalmente qualificada, como sustentado por Sou- to Maior Borges*. Acompanhamos este entendimento. Acrescentamos, porém, a afirmagao de que suas conclusdes restrin- gem-se apenas & andlise das modificagdes havidas na regra-matriz tributé- ria. A nao-incidéncia da regra tributéria seria legalmente qualificada por decorrer da norma de isengdo. Certo. Todavia tais alteragdes sao provoca- das por outra regra-matriz, cujo antecedente juridicizard o evento isento, do qual, concretizado, surgiré a relacdo de isengao tal como prevista no conse- qiiente. Em termos praticos, realmente os efeitos s40 os mesmos, mas nao ha preciso do fendmeno juridico como ocorre nos planos sintdtico-semAntico normativos. 7 Isengées Tributdrias, p. 156. 100 Isencoes TrisuTARIAS IV.5 - O Fendmeno da Nao-Incidéncia sob 0 Enfoque da Regra Tributaria e da Regra de Isengaio A definigao da ndo-incidéncia tem sido feita pela doutrina de nosso pais sempre atrelada ao préprio conceito de incidéncia. Souto Maior Borges a define como: “Nao-incidéncia é conceito cor- telacionado com o de incidéncia’*, Por sua vez, Ruy Barbosa Nogueira afirma que nao-incidéncia “é 0 inverso, isto é, 0 fato de a situagao ter fica- do fora dos limites do campo tributério, ou melhor, a ndo-ocorréncia do fa- to gerador, porque a lei no descreve a hipdtese de incidéncia’”. E também, Alfredo Augusto Becker, leciona: “A expressio “caso de nao-incidéncia” significa que o acontecimento déste ou daqueles fatos sao insuficientes, ou excedentes, ou simplesmente estranhos para a realizagio da hipétese de in- cidéncia da regra juridica de tributag0”. Acompanhamos tais posi¢des compreendendo-as, entretanto, pelo prisma l6gico-jurfdico, segundo o qual a incidéncia d4-se por conta‘da re- lago de incluso (subsungo) entre o conceito do evento realizado no mundo existencial e 0 conceito previsto no antecedente da hip6tese normativa. Portanto, é a co-incidéncia entre conceitos que determina a incidén- cia a que se refere a doutrina’!, Desta forma, nao-incidéncia refere-se & im- possibilidade de composi¢ao daqueles conceitos pertinentes 4 norma e ao evento, tendo-se em conta divergéncia entre as propriedades de cada um. Fato ha na conduta manifestada em linguagem, mas nao chega a tor- nar-se fato jurfdico por inocorréncia da subsungao; d4-se a inocorréncia da eficdcia legal sobre 0 fato, segundo classificagao de Pontes de Miranda®. HA, heste caso, suporte factico insuficiente para a composigao de fato juridico suficiente’, Souto Maior Borges™ sustenta que a ndo-incidéncia tributdria po- deria ser dividida entre a denominada pura e simples, na medida em que se refeririam a “fatos inteiramente estranhos A regra juridica de tributag4o, a circunstncias que se colocam fora da competéncia do ente tributante”, e as 48 “9 Isengoes Tributérias, p. 156. Curso de Direito Tributdrio, p. 171. * Teoria Geral de Direito Tributdrio, p. 276. *' Infere-se, portanto, que ndo aceitamos a tese de que a incidéncia indica 0 processo pelo qual a norma desce até os fatos. Sendo categorias distintas, uma légica e outra existencial, respectivamente, norma e dado objetivo no podem unir-se para dar nas- cimento ao fato juridico. Tratado de Direito Privado, tomo I, p. 04. Pontes de Miranda, Tratado de Direito Privado, tomo I, p. 75. Isengdes Tributdrias, p. 130. si Pero GuitHerme Accors! LUNARDELL! 101 qualificadas, estas subdivididas entre as constitucional e legalmente predi- cadas, postas conforme distintos vefculos introdutérios de normas. Aquelas, introduzidas por vefculo constitucional, dando ensejo as imunidades tribu- tarias. Estas, por vefculo infraconstitucional (lei ordindria), originando as isengdes. Verifica-se que a melhor doutrina nacional trata a nao-incidéncia apenas examinando-a sob o enfoque da regra-matriz tributdria. Assim, ocorre andao-incidéncia porque os eventos relacionados ao suporte factico, nao sfio suficientes para compor o fato jurfdico suficiente vinculado 4 hipdtese da regra tributdria. O critério, no entanto, parece-nos ignorar 0 exame deste fendémeno sob as luzes da regra-matriz da isengdo. Com efeito, a classificagao que sustenta ser a norma de isengao uma espécie de ndo-incidéncia legalmente qualificada observa o fendmeno nor- mativo do mirante sobreposto apenas 4 mencionada regra-matriz tributaria. Isto porque, o relacionamento com a regra de isengio impée-lhe campos de nao-incidéncia, reconhecidos por forga da eliminagao de certas proprieda- des da hipétese ou do conseqiiente, prejudicando a juridicizagao do supor- te fatico ou o nascimento da relacao jurfdica tributdria. No entanto, sendo a regra de isengao pertencente ao sistema juridi- co, nao se poderd falar de campo n&o-incidéncia, pois se h4 norma pressu- poe-se a juridicizagao do correspectivo evento isento que, posto em enun- ciado protocolar competente, dard noticia do fato juridico isento. Portanto, incidéncia ha. Em outras palavras, a indicagdo de um campo de nao-incidéncia per- mite apenas inferir que tal campo refere-se a eventos que nao sao juridici- zados pela regra tributéria; nao se tornarao fatos juridicos tributdrios por incorréncia da eficdcia legal da respectiva regra tributdria. Mas isto nao au- toriza o intérprete afirmar que tais eventos jamais poderao ser considerados fatos juridicos, porquanto, juridicizados pela regra de isengao, fatos juridi- cos sero, da espécie dos isentos. Portanto, a classificagao da norma de isengdo como norma de nao- incidéncia (legalmente qualificada) deve referir-se apenas aos resultados vistos no 4mbito de incidéncia da regra tributdria. Outra questao de igual importancia refere-se 4 seguinte indagacAo: Determinado evento do mundo social, cujas propriedades nao correspondam as da regra-matriz tributdria, nem as da isencio, poderia ser qualificado como pertencente a um campo de nao-incidéncia juridica? 102 ISENGOES TRIBUTARIAS , A resposta que se nos apresenta € negativa. O evento circunscrito em tais condigées é evento juridico, ainda que nao relacionado as referidas re- gras-matrizes. Com efeito, costuma-se equacionar este problema com a assertiva de que eventos assim ocorridos nao seriam qualificados pelo ordenamento ju- rfdico, porque ao mesmo nao se atrelaria nenhum fendmeno normativo. Em nossa concepgao isto nao subsiste, A medida que abordamos o ordenamento juridico como um conjunto de normas vélidas, as quais, em- bora fechadas sintaticamente a trés tinicos trés modais de6nticos (obriga- t6rio, permitido e vedado), sao abertas a quaisquer comportamentos do mundo existencial. O ordenamento, apesar de fechado sintaticamente aqueles tipos modais, esta aberto semanticamente a contextura dos acontecimentos existenciais. Estamos, aqui, com Marcelo Neves, para quem: “Os sistemas no- moempiricos sAo constituidos de proposigdes que se referem - genérica ou individualmente, direta ¢ indiretamente - a objetos reais em uma linguagem material aberta ¢ condicionada fundamentalmente a experiéncia. Compdem- se, portanto, de proposiges sintéticas. Daf porque sao sistemas nos quais, além da dimensio sintatica (formal), possuem relevancia as dimensdes se- mantica (material) e pragmitica (teleolégica ou ideoldgica)”®. Dada esta completude do ordenamento juridico, fechada em relagio as formas, aberta em relagdo ao comportamento, nao cabe afirmar condu- tas pertencentes ao campo da nao-incidéncia jurfdica. “Sob o ponto de vis- ta sintatico e semAntico do sistema de proposigdes normativas do Direito, a conduta que no estiver proibida, ou nao for obrigatoria, é permitida. Quarta possibilidade nao se da. Sintaticamente, os modais deOnticos sao irreduti- veis, mas interdefiniveis, modalizando-se o operador de negagdo. Assim, o proibido é equivalente ao obrigatério nao-fazet, ou ao nao-permitido fazer: em simbolos, V(p) = O(nao-p) = nao-P(p). Partindo-se de um modal, ou de V, ou de O, ou de P, obtém-se trés equivaléncias proposicionais mediante 0 functor ndo incidindo noutro functor de6ntico, ou no argumento proposi- cional (encerrado dentro dos parénteses)... Ou, entio, os atos permitidos so © conjunto-complemento, descontados do universo de6ntico 0 conjunto de atos proibidos mais 0 conjunto de atos obrigatérios, ou seja: os x tais que n§o pertencem ao conjunto A, que no pertencem ao conjunto B, mas per- tencem ao conjunto C, dentro do universo (de condutas ) U"5*, & Teoria da Inconstitucionalidade das Leis, p. 06. Lourival Vilanova, As Estruturas Lagicas e o Sistema do Direito Positivo, p. 153. Peoro GuitHerme Accors! LUNARDELLI 103 Assim, conduta nao integrada ao campo relativo a regra tributaria, nem ao campo da regra de isengdo, nao se classifica no das nao-juridicas (campo extra juridico), porque normatizadas sdo e, portanto, relaciona- das com 0 conjunto de normas validas do sistema; serao juridicizadas por norma, cujo modal € 0 permitido. Se a conduta, enquanto fato jurfdico, nao gera relaco tributdria, cujo modal é o obrigatério (prestar o tributo), entao € porque a relago é de permissio, decorrente da incidéncia de outra norma pertencente ao sistema, admitido 0 seu fechamento sintatico, em face de toda e qualquer manifestagdo humana objetiva. Mas qual seria, entdo, a distingao entre esta conduta permitida per- tencente ao sistema normativo, e aquela relativa 4 norma de isen¢ao, tam- bém modalizada com o permitido? A distingao pode ser feita se acolhermos a divisdo do modal permis- sivo em permissdo forte e permissao fraca, preconizada por G. Henrik von Wright, segundo o qual: “De los actos que han sido sometidos a norma, al- gunos son permitidos, otros prohibidos, otros mandados. Aquellos actos que no han sido sometidos a norma son ipso facto no prohibidos. Si un agente hace tal acto, el legislador no puede acusarle de violar la ley. En este senti- do, tal acto puede decirse que esta “permitido”. Si aceptamos esta divisién de los actos en dos grupos principales - relativos a una autoridad de normas dada - y se decidimos llamar a los actos permitidos simplesmente en virtud del hecho de que no estén prohibidos, entonces sera sensato distinguir en- tre dos especies de permiso. A uno los Ilamaré permisos fuertes, a los otros débiles, respectivamente. Un acto se dird que esta permitido en el sentido fuerte, se no esta prohibido, pero ha sido sometido a norma. Los actos que estén permitidos en el sentido fuerte, lo estén también en el sentido débil pero no necesariamente viceversa. Hablando en términos generales, un acto es- 14 permitido en el sentido fuerte si la autoridad ha considerado su estado nor- mativo y decide permitilo. Pero no debe entenderse que significa que la autoridad es necesariamente consciente de haber permitido el acto. El per- miso puede también ser una consecuencia légica de las normas que ha emi- tido. Explicaremos més adelante qué significa esto. Un permiso débil no es un caréter de las normas independiente. Los permisos débiles no son abso- luto prescriciones o normas. Sélo un permiso fuerte es un cardcter de las normas”>7, Esta mesma distingdo fez Lourival Vilanova: “A permissdo positiva, pois, é norma exceptiva de outra norma geral proibitiva. E norma particu- lar ou de contetido especificado: com seu Ambito-de-validade pessoal, ma- terial, temporal e espacial indicado. No caput de um artigo de lei profbe-se 57 Norma y Accién una Investigacién Légica, p. 101. 104 Isencoes TrisuTARIAs uma classe de ages a uma classe de sujeitos; num pardgrafo, excetua-se expressamente a limitadamente uma subclasse de agdes de Ambito da veda- ¢ao genérica. A permissdo negativa nao implica proibigdo expressa. Como nao implica, obtemo-la como complemento da soma das condutas (dire- tamente) proibidas, das obrigatérias e das permitidas positivas. Ou seja, 0 que ndo estiver diretamente, expressamente regulado, estd negativamente ermitido: na formula estrita, permitido fazer tido 0 que nao estiver (dire- tamente proibido)**, , Desta forma, o que distingue o comportamento regulado pela norma de isencao (permissio forte) e o prescrito na norma permissiva fraca, € que © primeiro € objeto de regra estruturada a partir de enunciados expressos contidos em vefculo introdutor de norma. A conduta esta permitida porque objeto de norma de isengao, decorrente da lei ordindria numero tal, publi- cada no 6rgio competente qual. Esta é a determinagio do art. 176 do Cédigo Tributério Nacional ao Prever que a isengdo serd sempre decorrente de lei que especifique as con- digdes e requisitos para sua concessdo. Os enunciados relativos 4 isengao deverao ser expressos. A norma dai construfda, Portanto, modalizard uma conduta com o permissivo forte, posta em relacao juridica perante o ente tributante. A permisso fraca, por sua vez, também relaciona-se a regra juridi- ca pertencente ao sistema, porém nfo decorre de enunciado expresso em vetculo introdutor de norma; tem por objeto uma conduta cuja realizacao é admitida como modalizada em fungao da completude sintatica do ordena- mento, aceita por nds. Decorre justamente de norma fortemente influencia- da pelo vetor axioldgico do sistema normativo, segundo o qual “tudo o que nao estd proibido, esté permitido”. IV.6 - Distingdes entre Isengaio e Imunidade | A doutrina nao tem sido unissona quando o tema envolve a caracte- tizagdo da natureza do fendmeno juridico imunidade, embora substancial Parte afirme ser uma efetiva limitagdo do poder de tributar imposta pela pré- pria Constituigdo Federal’, Vejamos, assim, a posigao de alguns renomados autores, Diz Souto Maior Borges: “Ao proceder & tepartigao do poder impo- 3 As Estruturas Ligicas e 0 Sistema do Direito Positivo, p. 198, Via Constituigio Federal de 1988, as principais estariam previstas no art. 150, inciso |. alineas aa d, dispositivo regulado pelos arts. 9° e 14 do Cédigo Tribuldtio Na. cional. ee pi tte Pepro GuiLHeRME Accors! LUNARDELLI 105 sitivo, pelo mecanismo da competéncia tributéria, a Constituigo Federal coloca fora do campo tributavel reservado a Unido, Estados-membros, Dis- trito Federal e Municfpios certos bens, pessoas e servicos, obstando, assim - com 0 limitar o 4mbito de incidéncia da tributagiio - o exercicio das ativi- dades legislativas do ente tributante. Em iltima andlise, ao estabelecer imu- nidades, a Carta Magna delimita a competéncia tributaria de cada uma das entidades da Federagiio brasileira. E a imunidade uma limitagio constitu- cional ao poder de tributar. Mais precisamente ainda: a eficdcia especffica do preceito imunitério consiste em delimitar a competéncia tributaria aos en- tes ptiblicos. Porquanto consiste numa limitacdo constitucional, a imunida- de é uma vedagio, uma negativa, uma inibigdo para o exercicio da compe- téncia tributdria. A imunidade é um princfpio constitucional de exclusao da competéncia tributéria. A rigor, portanto, a imunidade nao subtrai compe- téncia tributdria, pois essa é apenas a soma das atribuigdes fiscais que a Constitui¢éo Federal outorgou ao poder tributante e 0 campo material cons- titucionalmente imune nunca pertenceu a competéncia deste. A competén- cia tributéria j4 nasce limitada”™, Ruy Barbosa Nogueira, reportando-se & ligio de Amilcar Aratijo Falcao, menciona: “a Constituigao faz, originariamente, a distribuigao da competéncia impositiva ou do poder de tributar; ao fazer a outorga dessa competéncia, condiciona-a, ou melhor, clausula-a, declarando os casos em que ela nao poderd ser exercida. A imunidade é, assim, uma forma de nao- incidéncia pela supressao da competéncia impositiva para tributar certos fatos, situagdes ou pessoas, por disposig4o constitucional”*. Por sua vez, Aliomar Baleeiro afirma: “As limitag6es constitucionais ao poder de tributar funcionam quase sempre por meio das imunidades fis- cais, isto €, disposiges da lei maior que vedam ao legislador ordinario de- cretar impostos sobre certas pessoas, matérias ou fatos, enfim, situagdes que define”, Em obra de f6lego, Misabel Abreu Machado Derzi sintetizou referi- do posicionamento doutrindrio, asseverando: “Do ponto de vista jurfdico, todos se pdem de acordo em que a imunidade: 1. € regra juridica, com sede constitucional; 2. € delimitativa (no sentido negativo) da competéncia dos entes po- liticos da Federagao, ou regra de incompeténcia; © Isengdes Tributdrias, p. 180. ‘! Curso de Direito Tributdrio, p. 171. ® Introdugdo & Ciéncia das Finangas, p. 296. 106 ISENGOES TRIBUTARIAS 3. obsta 0 exercicio da atividade legislativa do ente estatal, pois nega @ compet€ncia para criar imposigdo em relacao a certos fatos especiais ¢ determinados; . 4. distingue-se da isengao, que se dé no plano infraconstitucional da lei ordindria ou complementar’™, Rompendo varios conceitos dogmatizados no tempo, insurgiu-se Paulo de Barros Carvalho™ contra tais caracterfsticas atribufdas as imuni- dades. No tocante A tese que sustenta ser este instituto uma limitagao cons- titucional ao poder de tributar, adverte sobre a inexisténcia de sucessao tem- poral entre normas que ora firmam a competéncia do ente tributante, ora a suprime. Marcadas pela sincronia, as normas de competéncia e de incom- peténcia, simultaneamente, lapidariam 0 efetivo campo de imposigao das pessoas juridicas de direito ptblico. Para aqueles que sustentaram a imunidade como exclusdo ou supres- sdo ao poder de tributar, contradiz Barros Carvalho dizendo da impossibi- lidade de se aceitd-la, sob idéntica perspectiva sincrénica das normas que compéem 0 ordenamento juridico, pois nao se cogita de uma prévia com- peténcia impositiva alterada posteriormente por outra norma com fungao supressiva ou de exclusao, Ja para a tese da imunidade segundo uma ndo-incidéncia constitu- cionalmente qualificada levanta-se Barros Carvalho advertindo sobre a im- propriedade de conceituagao nesses termos que dariam margem a interpre- tagdes equivocadas do fenémeno, aproximando-o ao da efetiva percussao da regra tributdria. Salienta que, sendo norma de estrutura, as imunidades contribuiriam para a formagao do campo de atuagiio do ente tributante, al- go logicamente anterior ao processo mesmo de produgio das normas tribu- arias, haja vista estas tltimas estarem condicionadas a tal processo. Acaba, assim, definindo-as: “classe finita e imediatamente deter- mindvel de normas juridicas, contidas no texto da Constituigdo Federal, e que estabelecem, de modo expresso, a incompeténcia das pessoas politicas de direito constitucional interno para expedir regras instituidoras de tribu- tos que alcancem situagGes especificas e suficientemente caracterizadas”®. Amotina-se Misabel Derzi contra a formulagao de Barros Carvalho, para defender as imunidades enquanto regras delimitadoras da competén- cia impositiva dos entes tributantes, de indole excepcional. Vejamos suas ® Limitagdes Constitucionais ao Poder de Tributar, p. 225, Atualizagiio da obra de Alio- mar Baleeiro. * Curso de Direito Tributdrio, p. 108. ® Paulo de Barros Carvalho, Curso de Direito Tributario, p. 118. Peoro GuitHerme Accorsi LUNARDELLI 107 palavras: “Ora, o mencionado art. 151, I, nao regula uma imunidade (ape- sar de Paulo de Barros Carvalho supor o contrario. Cf., op. cit., 113). Ape- nas reafirma o princfpio da uniformidade é unidade econémico-territorial do Estado Federal, que é uma especificagao da igualdade, assim como a uni- dade nacional. Principio nao é uma imunidade, embora imunidades estejam expressamente consagradas, por causa de valores e principios fundamentais. Qual sera, entao, a especificidade conceitual da imunidade? Por que razao, tradicionalmente, legalidade, irretroatividade, anterioridade, capacidade econémica de contribuir, vedagao ao confisco e outros principios nao sio imunidades, embora sejam todos limitagdes constitucionais ao poder de tri- butar? Observe-se que aquilo que se convencionou chamar de imunidade (assim como acontece com a isengao, na plano das leis) é regra parcial, de excegdo. A imunidade e a isengdo jamais s4o totais ou coincidentes (no sen- tido negativo), no primeiro caso, com a norma atributiva de poder tribut4- tio, no segundo, com o 4mbito de incidéncia do tributo. Se o forem, equi- valerao 4 cassagéo da competéncia ou a revogag4o da lei tributante, dai a explic4vel analogia, feita pela doutrina, entre imunidade e isengao, em que pesem as suas diferencas substanciais. A imunidade é regra constitucional expressa (ou implicitamente necessdria) que estabelece a nio-competéncia das pessoas politicas da federagao para tributar certos fatos ¢ situagdes, ¢ forma amplamente determinada, delimitando negativamente, por meio de redugdo parcial, a norma de atribuigdo de poder tributdrio. A imunidade ¢, portanto, regra de excegao e de delimitagao de competéncia, que atua, néo de forma sucessiva no tempo, mas concomitante. A redugao que se opera no Ambito de abrangéncia da norma concessiva de poder tributario e tao sé l6gica, mas nao temporal”, Com a transcrigao desses textos, observamos que o debate esta, pre- cisamente, em se saber se hd ou nao ajuste de normas constitucionais, para a formag&o do campo competencial tributario. Em outras palavras, se a imu- nidade limita ou nao a competéncia impositiva das pessoas politicas. Acreditamos que a avaliagdo claborada pela doutrina pode receber diferentes enfoques, neste ponto suso referido. Num primeiro momento, hé de se aclarar a ambigiiidade contida na expresso “limitag&o de competéncia impositiva”, porque limitagao pode dar-se tanto no campo dos significados relacionados aos enunciados norma- tivos, quanto no campo eminentemente estrutural das normas constitucio- nais. Quer naquele, quer neste, pode-se afirmar que ha limitagio de com- peténcia constitucional. Limitagdes Constitucionais do Poder de Tributar, p. 227, Atualiza¢io da obra de Alio- mar Baleeiro. 108 Isencoes TRIBUTARIAS Vejamos, primeiramente, a limitagdo da competéncia segundo os sig- nificados dos enunciados constitucionais. Enunciados constitucionais nada mais sio do que suportes ffsicos, materiais. Constituem linguagem vernacular, portadora de mensagens con- vencionais”. Portanto, sendo linguagem, projetam significacdes. O problema, entdo, neste primeiro plano de interpretagao, est4 na dificuldade de se determinar tais significagées, a partir das quais veremos surgir 0 campo de competéncia impositiva, assim considerado 0 das signi- ficag6es juridicas que preencherfo os categoremas da norma de imunida- de, espécie de norma constitucional. Tal dificuldade decorre do fato de que tais enunciados s&o marcada- mente afetados pela generalidade de seus termos, sempre vagos e ambigiios, apresentando baixo indice conotativo e, inversamente proporcional, alto grau denotativo™. Quanto menor for o indice de propriedades de um certo con- ceito, maior ser4 sua denotagao, portanto, maior o ntimero de objetos que atendem as suas propriedades. A distingao entre conotagao e denotacao, quando aplicdvel aos con- ceitos normativos, vem explicar uma carateristica que a doutrina® costumei- ramente atribui as imunidades, segundo a qual estas requereriam interpre- ta¢ao ampla, contrariamente as isengGes, que exigiriam interpretacdo res- tritiva, nos termos do art, 111, inciso Il, do Cédigo Tributdrio Nacional. A interpretagiio ampla decorre justamente do menor ntimero de pro- priedades atribufveis aos conceitos constitucionais (menor conotagaio), per- © Irving M. Copi, Introdugdo a Légica, p. 121: “Como nos comunicamos mutuamen- te e compreendemos os termos que empregamos, 0s significados intensivos ou co- notativos desses termos niio so subjetivos nem objetivos, nas acepgdes j4 explica- das. Aqueles que atribuem o mesmo significado a um termo devem usar 0 mesmo critério para decidir, a respeito de qualquer objeto, se este faz parte ou nao da exten- so desse termo. Este acordo estabelece uma convengio e, assim, o significado de um termo recebe o nome de conotagdo convencional ou intengdo. A conotagio con- vencional de um termo é o seu aspecto mais importante para os fins de definigao comunicagao, visto que € ptiblico e, ao mesmo tempo, pode ser conhecido por pes- soas que nao sao oniscientes”. Marcelo Neves, Teoria da Inconstitucionalidade das Leis, p. 137. Ives Gandra da Silva Martins, Caderno de Pesquisas Tributdrias, vol. 16, p. 75. Na jurisprudéncia, entre muitos, encontramos os seguintes julgados: Recurso Extraor- dindrio n° 102.141/RJ - RTJ 116/267 (v. também RTJ 121/756); Agrava de Instru- mento n° 138865-0/SP (DJU, 1, 30.09.91 - STF); Recurso Especial n° 104.614/SP (DIU I, 16.12.96, p. 50789); e Parecer PGFN n° 358/90 (DOU 12.06.90), da Procu- radoria Geral da Fazenda Nacional. Peoro GuiLHERME Accors! LUNARDELL 109 mitindo, assim, que um nimero maior de objetos seja possivelmente enqua- drado no conjunto de objetos relacionados a tais conceitos (maior denota- go). A interpretagao, assim, nao deve ser intitulada ampla nem tampou- co restritiva, quer no plano da imunidade, quer no da isengao, mas sim con- forme as propriedades verificadas a partir dos enunciados normativos. A imunidade, de acordo com os enunciados da Constituigao Federal; as isen- Ges, nos termos dos enunciados infraconstitucionais. Para desvendar as caracteristicas relevantes que demarcam os con- ceitos constitucionais, o intérprete terd de recorrer a continuas incursées a outros enunciados da Magna Carta, como também aqueles contidos na le- gislagao infraconstitucional, obrigando-o a pesquisar aos enunciados do Cédigo Tributério Nacional, de outras leis complementares, ordindrias, regulamentos, etc., até obter o resultado desse processo, 0 produto signifi- cativo dos enunciados juridicos, os quais, receberao, ainda, a influéncia dos principios juridicos”, como portadores de valores reconhecidamente impor- tantes para o ordenamento juridico. Obterd assim, 0 conceito constitucio- nal demarcado e referido a um especifico objeto”. Partindo dos significados de base contidos na Carta de 1988, o in- térprete vai desbravando outros enunciados normativos, sacando os respec- tivos significados, para, ento, junté-los na finalidade ultima de identificar 0 conceito considerado pela norma da imunidade, que a descreveremos mais adiante. Assim, por exemplo, tomando de assalto os enunciados do art. 150, inciso VI, alfnea ‘“‘c” e do art. 153, inciso III”, da Constituigao Federal, o m Paulo de Barros Carvalho, Sobre os Principios Constitucionais Tributdrios, Revista de Direito Tributdrio, vol. 55, p. 143: “Muito bem, toda vez que houver acordo, ou que um ntimero expressivo de pessoas reconhegam que a norma N conduz um vetor axiolégico forte, cumprindo um papel de relevo para a compreensao de segmentos importantes do sistema de proposigées prescritivas, estaremos diante de um ‘princi- pio’. Quer isto significar, por outros torneios, que ‘principio’ é uma regra portadora de ndcleos significativos de grande magnitude, influenciando visivelmente a orien- tagio de cadeias normativas, as quais outorga cardter de unidade relativa, servindo de fator de agregagao de outras regras do sistema positivo”. 1 Lourival Vilanova, Sébre 0 Conceito do Direito, p. 10: “Mas, um sistema de concei- tos cientificos tem necessariamente um fundamento objetivo como base. A base do edificio conceptual cientifico é 0 sector especifico do real ao qual se refere”. 7 A redacio é a seguinte: “Art. 150. Sem prejufzo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado 4 Unio, aos Estados, ao Distrito Federal ¢ aos Municfpios: VI - instituir impostos sobre: c) patriménio, renda ou servi¢os dos partidos politicos, inclusive suas fundagées, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituigdes de educagiio e de assisténcia social, sem fins lucrativos, atendidos aos requisitos da lei;”; “Art. 153. Compete 4 Unido Federal instituir impostos sobre: III - renda ¢ pro- ventos de qualquer natureza”. z 110 IseNCOES TRIBUTARIAS intérprete obtém uma primeira inferéncia sobre a dimensao dos significa- dos relacionados com a competéncia da Unido Federal, para instituir 0 im- posto sobre a renda’’, sabendo que dentro deste conjunto de elementos nao poderao ser enquadradas, como sujeito Passivo, instituigdes de assisténcia social sem fins lucrativos. Mas vé-se que a generalidade desta inferéncia, originada pela vagui- dade e ambigiiidade dos enunciados constitucionais, nao permite ainda de- cifrar, precisamente, o que é renda, imposto, sujeito passivo, instituigao as- sistencial sem fins lucrativos etc. Cumpre ao intérprete percorrer os demais textos legislativos para colher outras propriedades e, assim, definir 0 conceito pertinente a cada ele- mento da norma da imunidade. Somente por meio da pesquisa junto aos enunciados da legislagao infra-constitucional o intérprete tera condigées de saber quais as caracterfsticas que moldam 0 conceito relativo as instituigdes de assisténcia social. Feito isto, saberd que tais instituigdes figurarao na re- lagao juridica de imunidade, prescrita no conseqiiente da norma imunizan- te. Logo, delimitagao da competéncia tributéria pode ser entendida co- mo este processo de pesquisa do contetido dos conceitos constitucionais, re- alizado por pessoa competente. E algo restrito A interpretagao das propric- dades que demarcam tais conceitos. Algo bastante diferente é entendermos a delimitagao da competén- cia tributaria enquanto norma localizada no patamar constitucional, pois isto pressupde admitirmos uma estrutura normativa hipotético-condicional, cujo conseqiiente modalizard a conduta de uma determinada pessoa Juridica de direito publico. Por ser norma jurfdica, nio podemos acolher a definigéo segundo a qual a imunidade seria uma espécie de ndo-incidéncia constitucionalmente qualificada, porque estariamos incorrendo no equivoco de relacionar um conceito a um objeto, mediante a utilizago de uma definigao imprépria. Se entendermos que definir” é expressar as propriedades ou o crité- tio de uso de um determinado conceito e, ainda, admitirmos que a imuni- dade reveste a condigao de norma, haverd incoeréncia em nossa assertiva se avalizarmos a definigao de que a imunidade é uma ndo-incidéncia consti- tucional, porque terfamos de aceitar que esta ndo-incidéncia seria uma caracteristica do conceito relativo a imunidade. ® Roberto Quiroga Mosquera, Renda e Proventos de Qualquer Natureza, Imposto e 0 Conceito Constitucional, p. 48. . ™ Nicola Abbagnano, Diciondrio de Filosofia, p, 220. Peoro GuitHerme Accors! LUNARDELL! Ora, se imunidade é norma, conforme afirmamos, haveré de ocorrer a incidéncia, o que afasta, nesta perspectiva, a adogao daquela definigdo pa- ra o conceito de norma de imunidade. Em nossa concepgao, imunidade estrutura-se normativamente. Pos- sui, portanto, hipdtese e conseqiiente, ambos, respectivamente, suficientes para juridicizar um evento e imputar uma relagdo juridica de possivel ocor- réncia no mundo fenoménico. Sendo norma, pertence ao sistema jurfdico vigente, conforme asse- vera Lourival Vilanova: “Quando Kelsen observa que o sistema juridico tem a particularidade de regular a sua propria criagao, podemos traduzir em ter- mos de sintaxe: 0 sistema de proposigdes normativas contém, como parte integrante de si mesmo, as regras (proposigGes) de formagiio e de transfor- magao de suas proposigdes. As normas que estatuem como criar outras nor- mas nao sao regras sintdticas fora do sistema, esto no interior dele. Nao so meta-sistemdticas. Apesar de constitufrem um nivel de metalinguagem (uma linguagem que diz como fazer para criar novas estruturas de linguagem) inserem-se dentro do sistema. Em rigor, uma norma N & metaproposicao face a norma N, ; esta norma N, , em face daN,, 6, por sua vez, metaproposigao””>, As imunidades, portanto, so normas pertencentes ao sistema juri- dico brasileiro que prescrevem uma vedacao para a Unido Federal, os Esta- dos, o Distrito Federal e os Municfpios exercerem 0 direito subjetivo de le- gislar, Estas pessoas jurfdicas de direito publico esto proibidas de desen- cadear processo legislativo competente, para inserit no sistema enunciado normativos infraconstitucionais a partir dos quais construa-se norma tribu- tria, cujo conseqiiente prescreverd uma obrigagio também tributéria pa- ta pessoa fisica ou juridica. Estado proibidas de obrigar, conforme classificagio proposta por Norberto Bobbio que trata da modalizagao das normas que tém por objeto outras normas: “Se levarmos em considerag’o também as normas para a produgao de outras normas, devemos colocar, ao lado das imperativas, en- tendidas como comandos de fazer ou no fazer, e que poderemos chamar de imperativas de primeira instancia, as imperativas de segunda instancia, entendidas como comandos de comandar etc. Somente a consideragiio do ordenamento no seu conjunto nos permite aceitar a presencga dessas normas de segunda instancia. A classificacdo desse tipo de norma é muito mais complexa que a classificagao das normas de primeira instancia, para as quais haviamos fa- 75 As Estruturas Légicas e o Sistema do Direito Positivo, p. 109. 112 ISENGOES TRIBUTARIAS lado de “tripartig&io” cléssica em normas imperativas, proibitivas e permis- sivas. Podem-se distinguir em nove tipos: 1) Normas que mandam ordenar (por exemplo: art, 34, pardgrafo 2°, em que da Constituigao, onde o constituinte ordena ao legislador ordinario formular leis que tornem obrigatéria a instrugao). 2) Normas que protbem ordenar (art. 27, pardgrafo 4° em que da Constituigao, onde se proibe ao legistador impor a pena de morte), 3) Normas que permitem ordenar (em todos os casos em que o cons- tituinte entende nao dever intervir a ditar normas sobre certas matérias, pode- se dizer que isso permite ao legislador ordenar, Por exemplo, 0 art. 32, pa- rdgrafo 2°, da Constituigao, permite ao legislador ordindrio estabelecer nor- mas relativas ao tratamento sanitdrio). 4) Normas que mandam proibir (art. 18, parégrafo 2°, da Constitui- 40: 0 constituinte impée ao legislador ordinério emanar normas proibiti- vas contra associagées secretas). 5) Normas que protbem proibir (art. 22 da Constituigdo: ninguém pode ser privado por motivos politicos da capacidade juridica, da cidadania, do nome). 6) Normas que permitem proibir (a propésito do art. 40 da Consti- tui¢do, que sanciona a liberdade de greve, pode-se observar que nem nele nem em outro se fala em liberdade de suspensao do trabalho; essa lacu- na poderia ser interpretada como se o constituinte tivesse desejado deixar ao legislador ordindrio a faculdade de proibi-la). 7) Normas que mandam permitir (este caso coincide com o do nt- mero cinco). 8) Normas que protbem permitir (este caso coincide com o do nt- mero quatro), 9) Normas que permitem permitir (como a permissio é a negagfio de uma proibigao, este é 0 caso de uma lei constitucional que negue a proibi- ¢4o de uma lei constitucional anterior)”, De acordo com 0 acima exposto, entendemos que as normas de imunidade classificam-se dentre aquelas enquadradas no t6pico 2 da pro- posta de Bobbio, ou seja, sao normas que profbem ordenar. No caso, as imu- nidades profbem as pessoas juridicas de direito ptiblico, apontadas no ca- % Teoria do Ordenamento Juridico, p. 47. O itélico € do autor. £ ¢ 4 i Peoro GuitHerme Accorsi LUNARDELLI 113 put do art. 150 da Carta de 1988, deflagrar o proceso legislativo que resul- te em enunciados relacionados a regras-matrizes tributdrias, em cujos con- seqitentes figurarao pessoas fisicas ou juridicas submetidas a certa pres- tago fiscal. Fazendo uma releitura de Aliomar Baleeiro, a limitagdo constitucio- nal ao poder de tributar, constitui norma de imunidade que profbe os refe- tidos entes politicos dar andamento aos respectivos processos legislativos para determinar a criagao de normas tipicamente tributarias, A hip6tese e 0 conseqiiente desta norma apresentam-se do seguinte modo: + Hipotese: se ocorrer 0 evento relativo a existéncia juridica da Unido Federal, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municfpios Deve-ser - Conseqiiente: a proibigio dos mesmos para deflagrar 0 processo legislativo, cujos enunciados relacionem-se com a composigio de regra- matriz tributdria de imposto ou de taxa. Esclarecemos que incluimos as taxas por entender que além da ve- dagao relativa aos impostos mencionados no inciso VI do art. 150 da Cons- tituigao Federal, temos de considerar também a proibigdio para instituigdo de taxas, prevista no inciso XXXIV do art. 5° do mesmo Diploma Patrio, 0 que, para nds, constitui-se numa norma de imunidade para as situacées ali previstas. Portanto, sob o enfoque desta segunda perspectiva, o significado de imunidade como limitag4o constitucional de competéncia, é 0 de norma constitucional que veda o direito subjetivo dos referidos entes ptiblicos de legislar sobre matéria tributaria. Desta forma, embora no plano sintatico assemelhe-se 4 regra de isen- ¢40, pois ambas apresentam estrutura hipotético-condicional, a imunidade estd no nivel constitucional, ao passo que aquela no infraconstitucional. No plano semantico, imunidade representa vedagio ao direito sub- jetivo de legislar, enquanto a isengdo significa o préprio exercicio deste di- reito subjetivo de produzir enunciados normativos, por conta dos quais nor- mas sao criadas. No plano pragmatico, ambas as normas juridicizam eventos que, pe- la causalidade juridica, postos em norma individual e concreta, dao nasci- mento, respectivamente, as relagdes de imunidade e de isengiio. 114 ISENCOES TRIBUTARIAS IV.7 - Distinges entre Isengao, Aliquota Zero e Diferimento Historicamente 0 problema da aliquota zero manifestou-se a partir da Constituigao de 1967, com as alteragdes da Emenda n° 01/1969, confe- tindo ao Poder Executivo da Unifio Federal, mediante a edigdo de decretos e conforme os limites legalmente estabelecidos, alterar as alfquotas e base de calculo do imposto de importagio e do imposto sobre produtos industria- lizados”, : Tais dispositivos constitucionais levaram a doutrina a adotar Posigao praticamente undnime no sentido de que a reducao da aliquota até o percen- tual zero (0%), representava fendmeno normativo bastante semelhante ao da isengdo tributéria, porquanto, em Ultima anilise, 0 crédito tributdrio deixa- nia de ser pago por inexisténcia de expressio economicamente considerdvel. Vejamos algumas dessas importantes posigdes. Américo Masset Lacombe, examinando a Constitui¢ao pretérita, sustentou: “A Constituig&o dé ao Poder Executivo (art. 21, V) o poder de alterar as aliquotas ¢ as bases de clculo do IPI, nao havendo qualquer ou- tro dispositivo que faculte a concesso de isengdes independentemente de lei. Assim sendo, 0 Poder Executivo s6 poderé conceder isengdes do IPI através de normas que neutralizem tais aspectos do mandamento da norma, vale dizer, que reduzam a zero ou aliquota ou a base de célculo, Qualquer isen¢ao concedida pelo Executivo que nao seja desta forma serd inconsti- tucional””*, . Paulo de Barros Carvalho, concebe a aliquota zero como uma muti- lago parcial do aspecto quantitativo do conseqiiente da regra-matriz, tribu- (aria, aproximando este fendmeno, assim, ao da isengio”. Valdir de Oliveira Rocha, por sua vez, ressaltando as varias caracte- risticas desse fendmeno, concebe-o: “Da aliquota zero se pode dizer que: a) nao serve A quantificagdo de montante de tributo; b) nfo é renunciavel; c) tem escopo de viabilizar alteragdes de alfquotas, atendidas as condigées & os limites estabelecidos em lei, pelo Poder Executivo, em relagao a deter- minados impostos (art. 153, parégrafo 1° da Constituigao de 1988), no que se distingue da isengao (em sentido estrito), pois esta decorre da lei, enquan- toa alfquota zero pode decorrer de ato do Poder Executivo ou de lei; d) quan- do decorrente de lei, hé que se entender que o legislador quis aparelhar uma “Art. 21. Compete Unido instituir impostos sobre: I - importago de produtos es- trangeiros, facultado ao Poder Executivo, nas condigdes € nos limites estabelecidos em lei, alterar-Ihe as alfquotas ou as bases de cdlculo; V - produtos industrializados, também observado 0 disposto no final do item I;” , Revista de Direito Tributario, vol. 21/28, Pp. 129; grifos do autor. Curso de Direito Tributdrio, p. 333. Peoro GumHerme Accors! LUNARDELLI 115 situagao de exclusdo do crédito do montante do tributo 4 possibilidade de - dada aliquota positiva pelo Poder Executivo, quando nos limites e condigdes em que possa fazé-lo - vir-se a ter determinag4o do montante do tributo por quantificagdo; e) em relag&o aos impostos (pode-se dizer, também, mais amplamente, em relagao aos tributos) outros que no possibilitem alteragao de alfquota por ato do Poder Executivo, a alfquota zero ha que ser entendi- da como tfpica isengdo (em sentido estrito), até porque o nome que se dé ao instituto nao Ihe confere, por si s6, natureza jurfdica”®, Por fim, da lavra do Geraldo Ataliba e Cléber Giardino, apuramos: “No caso, quando o legislador recorre a tal construgao - consistente em imputar alfquota zero a uma determinada base de calculo - o resultado fi- nal, objetivamente considerado, é a inexisténcia de débito tributdrio e, por- tanto (conseqiiéncia légica e inexordvel), a auséncia de relacao juridica obri- gacional. Em sintese, nessas hipéteses, nao ha tributo a pagar, nao se est4 diante de nenhum comando fixando comportamento tributdrio; nao se tem 81 nenhuma norma obrigando a tanto”. Nio obstante a acentuada tendéncia doutrindria de aproximé-la a isengdo tributdria, o Supremo Tribunal Federal adotou outra concepgao, sustentando inexistir a apontada semelhanga normativa®. Para a Corte Constitucional, o fendmeno da alfquota zero em nada modificaria a estrutura da regra-matriz tributdria, dando inclusive condigdes de nascimento da respectiva obriga¢io tributdria, cujo valor, porém, esta- ria reduzido a zero. Mantendo-se intacto o arcabougo da norma tributédria, no haveria como sustentar sua semelhanga ao fendmeno da isengao. 9 Determinagao do Montante do Tributo, p. 136. 4 ICM ¢ IPI - Direito de Crédito - Produgio de Mercadorias Isentas ou Sujeitas d Ali- quota Zero, Revista de Direito Tributdrio, vol. 46, p. 73. A respeito desse assunto, pode-se consultar também, Walter Barbosa Correa, Incidéncia, Nao-incidéncia e Isen- ¢o, co-edigéo IBDT Resenha Tributdria; e Ives Gandra da Silva Martins, Informa- tivo IOB - Estudos Juridicos, 1985, p. 542. ® No julgamento do Recurso Extraordindrio n° 81074 (DJU 09.04.76 - RTJ 77/285), 0 Plendrio, assim pronunciou-se: “ICM. Nao importando isengao do imposto de im- portagiio a atribuicdo, a determinada mercadoria, na tarifa aduaneira, da alfquota ‘zero’, dela nao resulta isencdo do tributo estadual. Reexame da questo pelo Plend- tio do Supremo Tribunal Federal. Recurso conhecido, mas nio provido”. No julga- mento do Recurso Extraordindrio n° 81171 (DJU 05.09.75), verificamos entendimento mais enfatico: “Imposto sobre Circulagao de Mercadorias. Importagdo. Aliquota Zero. Isengio Inexistente. A tarifa zero ou livre configura uma niio-incidéncia proviséria do tributo. A importagio de mercadorias sob regime de tal alfquota nao implica, por- tanto, em isengio do imposto sobre circulagdo. Precedentes: Rex 76.284 ¢ 81.074. Recurso extraordindrio do Estado conhecido e provido”. Confira-se também RE 76.810 (DJU 26.09.75); RE 79.471 (RTJ 77/285); RE 81.177 (RTJ 78/562), RE 81.172 (DJU 26.09.75); RE 82.568 (DJU 19.09.75) e RE 82.570 (DJU 09.04.76). toe 116 Isencdes TRiBUTARIAS Nao nos parece justificdvel o entendimento da Suprema Corte, 0 qual inclusive, acabou por ser pacificado pelo Enunciado Sumular n° 576, vazado nos seguintes termos: “E licitaa cobranga do ICM sobre produtos importados sob re- gime de alfquota zero” A solidificada posi¢o do Supremo Tribunal Federal nao aceitava, por exemplo, 0 pleito correspectivo a isengao do ICM, prevista no art. 1°, inci- so VI, do Decreto-lei n° 406, de 31.12.68", quando houvesse a previsdo de aliquota zero para o imposto de importagio. Se retomarmos, todavia, o incontorndvel piso temdtico dos enuncia- dos lingiifsticos, no caso, dos enunciados da legislagao infraconstitucional que instituem a aliquota zero, teremos condigées de ver abrir & nossa frente dois caminhos semanticos, a partir dos quais perceberemos as razoes pelas quais nao ha sustentagao para a posigao da Suprema Corte, em nao admitir a equiparagao entre os fendmenos da isencao e alfquota zero. O primeiro caminho nos levard ao encontro, novamente, dos conjuntos de objetos. O segundo, & repercussio existencial desses conjuntos. Fechando a compreensao apenas sobre tais enunciados inferimos que alfquota zero significa uma classe nula de objetos*, ou seja, uma classe cu- ja fungao proposicional nao é atendida por nenhum objeto [Cx (x # x)]. Abrindo-se 0 espectro de nossa andlise verificamos que ao lado des- te conjunto vazio encontram-se outros conjuntos de elementos, todos eles relacionados aos demais aspectos da regra-matriz tributéria. Dizer a respeito da aliquota zero, portanto, carrega consigo o enten- dimento de que determinados eventos juridicizados pela hipétese daquela regra, embora valorados juridicamente pela base de cdlculo, nao apresenta- rao a cota-parte desta valoracao, responsdvel pelo dimensionamento, tam- bém econ6mico-juridico, da relagao tributéria. Diante de um conjunto desprovido de objetos, podemos afirmar que, no plano existencial, nao haverd a juridicizagao do aspecto econdmico da relagio tributéria entre fisco e contribuinte. Nao se instaura a relagao tribu- A sua redagio € a seguinte: “Art. 1° - omissis; Pardgrafo 4° Sao isentas do imposto: VI a entrada de mercadorias cuja importagio estiver isenta do imposto, de compe- téncia da Unido, sobre a importagiio de produtos estrangeiros”. Tal dispositivo, por ter sido editado sob a égide da Carta de 1967, nfo foi recepcionado pela de 1988, por forga do seu art. 151, inciso III. “Alfred Tarski, Invvoduccién a la Légica y ala Metodologia de las Ciéncias Deducti- vas, p. 100. Pepro GuitHerme Accors! LUNARDELLI 117 taria prevista no conseqiiente da regra-matriz, por inexisténcia de perspec- tiva juridico-econédmica da relagao de crédito entre fisco e contribuinte. Ainda que se possa verificar, metodologicamente, a eficdcia legal do evento juridico tributério (a sua juridicizagao), no constatamos 0 respecti- vo efeito, a relagao tributdria. Nao se opera, portanto, a causalidade juridi- ca’, Saliente-se, entretanto, que a inocorréncia do fato-efeito, ou seja, a nao concretizag4o do conseqiiente, nao implica a desconstituigao da regra- matriz, enquanto norma geral ¢ abstrata. Isto sé se daria se a alfquota zero fosse aplicada a todo e qualquer evento conotado na hipétese, 0 que nao consideramos no momento. Assim, dada a limitagao semantica do consegqiiente, estaria quebra- da a regra tributéria por forga da implicagao normativa que liga anteceden- te ao conseqiiente. O primeiro € condigao-suficiente do segundo; este, con- dig&o-necesséria do primeiro®. Assim, se nao se dé o conseqiiente, por que a relagao fica desprovida da imprescindivel avaliag&o econémica do even- to, no se dé o antecedente. B implicagdo Iégica. Mas, retomando o problema, cremos que a posi¢ao da Suprema Cor- te no se sustenta porque restringe sua andlise somente a perspectiva das mu- tages havidas na regra-matriz tributdria. Chega a tal conclusao por trilhar 0 mesmo itinerdrio daqueles que defendem ser do tipo de estrutura a norma de isengio, examinando-a sob 0 exclusivo enfoque da mencionada regra- matriz. Posta a andlise nestes termos verifica-se apenas a classe vazia (da aliquota zero) que se estabelece em parte do conseqiiente da regra tributé- ria. Mas, frise-se, 0 estudo deste fendmeno da-se restritamente, preocu- pando-se com as modificagdes operadas no 4mbito de regra tributdria. Cabe aqui, novamente, a assertiva que fizemos quando do tratamen- to da regra-matriz da norma de isengao, como norma de comportamento. *5 Lourival Vilanova, Causalidade e Relagdo no Direito, p. 40. * Lourival Vilanova, As Estruturas Légicas e o Sistema do Direito Positivo, p. 53: “Em outras palavras, sem a norma vincular as duas proposi¢ées, elas estariam isoladas, ou ligadas por outros vinculos, formalmente necessérios, ou empiricamente dados nos fatos aos quais as proposigées se referem. E a norma mesma, € 0 direito positivo que institui o relacionamento entre descritor (hipstese) e o prescritor (tese). Agora, uma vez posta a relagio, uma vez normativamente constitufda, a relagdo-de-implicagao, como relagao Iégico-formal, obedece as leis Idgicas. Assim, se se da a hipdtese, se- gue-se a conseqiiéncia: se ndo se dé a conseqiléncia, necessariamente nao se dé a hipétese (“se p, entio q”, “se nfo-q, entdo no-p")”. 2 118 IseNG6ES TRIBUTARIAS. Nao nos parece que a eliminagdo da dimensaio econémica da relagao de crédito tributdrio, autorize concluir a inexisténcia de um fend6meno juri- dico correlato ao da regra tributéria, qual seja, oda regra-matriz da alfquo- ta Zero. Igualmente ao que sucede no relacionamento entre as regras-matri- zes tributaria e de isengdo, d4-se no fendmeno da alfquota zero. Temos ple- nas condigdes de depreender significagdes contextuais e situacionais para- lelas as significagdes dos enunciados que a colocam no ordenamento e, a partir daf, saturarmos os categoremas relativos a uma nova regra juridica. O fenémeno, portanto, requer o estudo completo do relacionamento de ambas as regras jurfdicas - a tributéria e a da alfquota zero - e nao somente daquela, como tém sido feito pela doutrina ¢ jurisprudéncia. O aprofundamento desse estudo mostra também que, logicamente, inexiste distingdo entre o fenémeno da regra de isengZo e o da aliquota zero. Isengdo denominamos a regra-matriz de comportamento, cujo anteceden- te juridiciza um evento isento e, no conseqiiente, uma relagio isencional, que confere ao contribuinte (credor nesta relagao).o direito subjetivo de nao cumprir a prestagdo tributdria e, ao fisco (relaco conversa, de débito isen- cional) o dever subjetivo de nao exigir a prestagao. A regra da alfquota zero em nada difere desta estrutura. A distingiio est4 nos enunciados tematicos por conta dos quais 0 intérprete inicia a bus- ca das significagdes juridicas capazes de preencher os seus categoremas (os da regra-matriz). No caso, os enunciados apontam imediatamente para significados (de base) relacionados com o conseqiiente da regra, particularmente aqueles relacionados 4 composi¢ao do aspecto quantitativo. Justapondo-se, todavia, os significados contextuais, teremos a saturacao dos demais categoremas da regra juridica da alfquota zero. Vé-se que, logicamente, o fendmeno é o mesmo ao da regra de isen- gao. Portanto, nao hd apoio para a referida posigdo do Supremo Tribunal Federal. Enunciados normativos que se refiram a figura da isengdo, mas apontem para o dimensionamento zero da perspectiva econdmica de um certo evento, estardo indicando o fendmeno da alfquota zero, embora expres- samente diga respeito a isengdo. Assim, considerado o plano normativo destas duas regras, vemos que poderd haver a identidade de fenédmenos, se acaso um enunciado normativo fizer mengdo a isengao, mas dispuser sobre a aliquota da relagiio juridica, Pepro GuitHerMe Accors! LUNARDELLI 119 razo pela qual, sob este prisma, nao se nos apresenta sustent4vel a referida posigao da Suprema Corte, Distingao que entendemos cabfvel em relagao a tais fendmenos, re- fere-se exclusivamente ao processo de produgao dos enunciados que digam respeito 4 regra de isengdo e os que se refiram a da alfquota zero, porquan- to no caso das isengGes tais enunciados deverdo decorrer, apenas € tao-so- mente, de processo legislativo tipico, originado de drgiios legislativos tais como Congresso Nacional, Assembléias Legislativas ou Camaras Munici- pais. No tocante a alfquota zero, os respectivos enunciados decorrerfo da conjugacao de um anterior processo legislativo tipico que demarque a pos- terior atuagdo do Poder Executivo e, posteriormente, a propria atuagdo des- te poder. Portanto, a diferenca est4 nao necessariamente no fendmeno em si, até porque aludimos que poder4 ocorrer a identidade entre a isen¢do e a alf- quota zero. A disting4o que pregamos situa-se nas normas que deflagram ° processo de produgao dos enunciados atinentes & isengao e & aliquota zero. A hipétese da norma relativa isengao, prevé como suporte factico suficiente aatuacdo de qualquer um daqueles 6rgios legislativos, dependendo da pes- soa juridica de direito piblico em tela. No caso da alfquota zero, a hip6tese da respectiva norma prevé como suporte factico suficiente enunciados derivados de um anterior processo le- gislativo, que demarcarao a atuago posterior do Poder Executivo, para tra- tar da alfquota. Vejamos, agora, a figura do diferimento. A doutrina que se debrugou sobre este tema tem afirmado que o di- ferimento ora assume 0 perfil de isengdo, ora de nao-incidéncia ou mesmo de substituigdo tributéria, Geraldo Ataliba e Cléber Giardino apresentam-no como figura seme- Ihante a da n4o-incidéncia: “Os efeitos do diferimento, so, pois, iguais aos da isengao ou outras formas de nao incidéncia: por virtude de seu mecanis- mo essas operacées - tendo por objeto sucata, leite etc. - nao so tributadas. Logo, a ele (0 diferimento) se deve aplicar o mesmo regime (que reconhe- ce a forca juridica do direito ao crédito, por ser este direito constitucional) dos casos de no incidéncia”*’, 87 ICM - Linhas Mestras Fundamentais - 0 Diferimento, Revista de Direito Tributario, vol. 23/24, p. 133. 120 Isengdes TrisuTARIAS Sacha Calmon Navarro Coélho molda-o como espécie de substitui- ¢4o tributaria, ao dizer que “‘o diferimento nao constitui instituto auténomo. Caracteriza, quase sempre, a chamada “substituico tributaria”, na termino- logia de Rubens Gomes de Souza, mas com o temperamento de que dita substitui¢ao é “meramente econdmica”, porque o substituto tributdrio, em termos juridicos, nao substitui ninguém. £ sujeito passivo direto de fato gerador alheio (a divida, note-se, 6 sua, e nao alheia). Esta distingao é fun- damental, pena de nao se entender o diferimento. Operamos uma alteragao no entendimento da “sujeigdo passiva indireta”, tributdria, vincando a idéia de que a substituigao tributéria nao implica em momento algum substitui- ¢4o de sujeitos passivos, categoria estritamente juridica”™. Margal Justen Filho, entretanto, nao aceita a assemelhagio feita por Sacha Calmon, pois sustenta que 0 que ocorre no diferimento € o fendmeno da ndo-incidéncia. Ouga-mo-lo: “E isso porque o diferimento importa sub- sungdo do pagamento da prestacao a ocorréncia de um fato futuro e incer- to: nova operacao relativa A circulagdo da mesma mercadoria. A substitui- ¢4o envolve, exclusivamente, a alteragdo do sujeito passivo. Andlise das cir- cunstncias juridicas demonstra que, antes de verificada nova operacao relativa a circulago da mesma mercadoria, inexiste débito ou relagao tri- butéria. Isso comprova que o diferimento se insere dentro da categoria da ndo-incidéncia. Somente haverd fato imponivel se e quando ocorrer uma operacao relativa a circulagio da mercadoria, subseqiientemente aquela sujeitada ao regime do diferimento”®, Ja Clélio Chiesa™ entende o diferimento como norma de isengdo, na concep¢ao doutrindria segundo a qual seria uma norma de estrutura parcial- mente deformadora da regra-matriz tributdria. O Supremo Tribunal Federal adota a posi¢ao de que o diferimento assumiria feigao de substituicao tributéria, liberando da respectiva obriga- ¢ao 0 contribuinte origindrio, para exigi-la do substituto”. * ICM Competéncia Exonerativa, p. 106. © Sujei¢do Passiva Tributdria, p. 355. % Sistema Constitucional Tributdrio - ICMS, Pp. 177; dissertagao de Mestrado apresen- tada em 1995. No julgamento do Recurso Extraordindrio n° 11 1.427-4/SP, Relator Min, Oscar Cor- réa, publicada no DJU I, de 22.09.89, p. 14.833, a Segunda Turma assim decidiu: “ICM. Diferimento. A imunidade ou a isengo de que goza a circulagao posterior nio se comunica a anterior, que nao era objeto de um ou de outra. O diferimento nada mais € do que 0 adiamento da cobranga do imposto ja devido. Essa cobranga, ao in- vés de ser exigida do contribuinte de direito (fornecedor da matéria-prima), 0 € do contribuinte de fato (0 industrial a quem a matéria-prima é vendida), que se torna responsdvel pela obrigagio tributéria. Por isso, quando hd imunidade ou isengio quanto a imposto relativo 4 operagio de que o industrial é 0 contribuinte de direito, 9 Pepro GuiLHeRMe Accors! LUNARDELLI 127 Em nossa opiniao, nao obstante a figura tenha recebido tratamentos diversos tanto na doutrina, quanto no direito posto, o diferimento devera ser concebido como postergagAo da relacao juridica tributdria e, via de con- seqiiéncia, do exercicio do dever subjetivo de prestar a ela vinculado. Haveria, assim, a incidéncia da hip6tese legal sobre o suporte facti- co suficiente, dando ensejo ao fato juridico. Porém a relacao juridica impu- tada ao fato, ¢ seus respectivos efeitos, ficariam postergados para momento posterior. Considerando que, gramaticalmente, diferimento significa um subs- tantivo derivado”, oriundo do verbo diferir, cujo sentido € o de adiar, pro- crastinar, retardar’, deverd, entao, indicar a classe de objetos cuja fungao seja a de postergar algo. Transposta esta definigdo para o campo jurfdico, diferimento conota a classe de normas que atendem 4 fungiio de postergacao da relagao juridica e respectivos efeitos. Nao podemos admitir, nesta classe, a tese da procrastinag&o do fato pela eventual nao ocorréncia de alguns de seus elementos, no caso o elemen- to temporal, porque af o proprio fato no se constituiria. Nao se trataria da postergagao, mas de inocorréncia do fato, ou melhor, de apenas um suporte factico insuficiente para receber o tratamento legal da hipdtese normativa. Nao se teria, portanto, classe de objetos normativos. Quando sustentamos que o diferimento implica postergagdo do mo- mento em que passam a ser gerados os efeitos da relago juridica, assim o fazemos com apoio em doutrina que trabalha 0 tempo como fendmeno ju- ridico, nao exclusivamente atrelado 4 composigao do suporte factico do fato juridico. Pontes de Miranda, tratando sobre a topologia dos fatos, assevera: “Os fatos (atos, acontecimentos, estados) so no tempo e no espago. Tém data e tém lugar Ha “momentos” e “tratos de tempo” que sao assaz rele- vantes para 0 direito: a) 0 tempo em que ocorre cada um dos fatos em que consiste 0 suporte factico; b) o tempo em que se compée o suporte facti- co; c) o tempo em que a regra juridica é edictada e, pois, s6 outra regra ju- ridica a derrogaria, ou ab-rogaria; d) o tempo em que se dé a incidéncia da regra juridica sébre o suporte factico, que é o tempo em que o fato, ou fa- tos, que 0 compéem, se tornam fatos juridicos; e) o tempo, ou tempos, em tal imunidade ou isen¢do se adstringem a essa operagdo, nao se comunicando a an- terior, que ndo era objeto da imunidade ou de isengdo, e que, se nao houvesse o di- ferimento, obrigaria 0 fornecedor da matéria-prima a recolher 0 imposto devido. Recurso extraordinério nfo conhecido”. ° Gramdtica Metédica da Lingua Portuguesa, p. 86. ° Diciondrio Etimolégico Nova Fronteira da Lingua Portuguesa, p. 264. 122 ISENGOES TRIBUTARIAS que se opera (desde e até quando) a eficdcia do fato juridico; f) 0 tempo em que se extinguem os efeitos do fato juridico; g) o tempo em que o fato juridico deixa de ser jurfdico, inclusive o suporte factico ou por ter deixado de ser suficiente, ou por ter deixado de ser, ou por j4 ter deixado de ser a regra juridica que o fazia jurfdico”™. Encontramos também a posi¢éio de Oswaldo Aranha Bandeira de Mello, trabalhando o tempo enquanto cldusula termo integrante do ato-fato jurfdico: “O termo inicial suspende o exercicio, mas nao a aquisigao do di- reito. Por conseguinte, praticado 0 ato juridico, 0 direito que dele adveio se integra no patrimOnio da pessoa interessada, isto é, se estabelece, a seu fa- vor, a aquisi¢ao do direito. O seu exercfcio, porém, pelo respectivo titular, 86 poderd ocorrer com a efetivagao do evento futuro e certo, a que se subor- dinou. Portanto, 0 termo inicial, ou suspensivo, nao impede o nascimento de direito, mas retarda o seu exercfcio“, Na mesma linha, constatamos Lourival Vilanova: “Muitas vezes, a eficdcia no se da desde logo, nao é eficdcia imediata. Fica protraida pa- ra mais adiante, para um futuro certo e determinado. Ou, entio, a eficdcia € imediata, mas cessard em futuro certo e determinado. A cléusula que su- bordina, nos dois casos, a eficdcia dos fatos jurfdicos anteriores a uma de- terminagdo temporal é a cldusula-termo. A cldusula, como clusula, est4 no plano conceptual normativo. O tempo-fato, que a verifica, est4 no plano da realidade. O fato-tempo, se estd qualificado pela hipétese factica, e produz efeitos, é ento, um fato jurfdico (em sentido estrito, como fato natural). O efeito do fato juridico temporal, é determinar a eficdcia do ato juridico, fa- zendo-a comegar, ou fazendo-a cessar, se j4 comegara antes. Em outras pa- lavras, o efeito do tempo, no termo, é provocar o efeito do ato juridico, ou fazé-lo deter-se”™, Transpostos estes fundamentos para a perspectiva da norma juridi- ca, vé-se que 0 tempo, enquanto fenémeno juridico, poderd, dentre outros modos, intervir diretamente na constituigio do suporte factico do fato juri- dico, ou mesmo no momento a partir do qual dar-se-do os efeitos de tais fatos juridicos, as relagGes juridicas. Para nés, o diferimento enquadra-se justamente nesta segunda pos- sibilidade. O tempo, juridico, subordina os efeitos da relagdo jurfdica para momento superveniente. Este tempo, tratado na hipdtese normativa, nao se tefere ao tempo no fato, mas ao tempo da relacio juridica. ** Tratado de Direito Privado, tomo I, p. 29. O itdlico € nosso. °S Principios Gerais do Direito Administrativo, vol. I, p. 518. % Causalidade e Relagao no Direito, p. 36. O itdlico € nosso. Pepro GuiLHerme Accorst LUNARDELLI 123 Estamos cientes, todavia, que nao é desta forma que muitos disposi- tivos da legislag&o tributéria referem-se ao diferimento. Tratam-no, na maio- ria das vezes, como t{pico fendmeno de nao-incidéncia, ou incidéncia com permissivo fraco, segundo concepgao que defendemos no presente trabalho. Mas sendo assim, nao serd 0 caso de nominar o respectivo fendmeno como diferimento. Vejamos alguns exemplos. E 0 caso previsto no art. 399 do Decreto n° 31.118/91, que regula- menta o ICMS no Estado de Sao Paulo, segundo o qual o “langamento do imposto incidente nas sucessivas operagGes internas com energia elétrica, desde a importagao ou produgio, fica diferido para o momento em que ocor- rer sua entrega para o consumidor neste Estado”. Nio se trata neste dispositivo do aspecto temporal da hipétese de incidéncia da norma do ICMS, relativa as operagGes com energia elétrica. Por se referir a langamento do imposto, entendemos que € a relagao juridica que fica postergada para momento ulterior; nao se trata do tempo no fato, mas do tempo de produgio de efeitos da relagao juridica. Em nossa concepgiio, portanto, diferimento deve indicar apenas a figura da cléusula temporal que subordina os efcitos da relacao Juridica para momento posterior, porquanto nos demais casos em que o tempo € compo- nente do suporte factico, temos fato ¢ relacdo jurfdica operando os respec- tivos efeitos. A exclusao do tempo, neste tiltimo caso, indica ser o fendme- no da isengdo, por conta da fixagdo do aspecto temporal da hipétese nor- mativa. IV8 - Distingdes entre Isengao e Remissao O Cédigo Tributério Nacional nao traz capitulo especifico sobre a remissdo, havendo somente a previso no seu art. 156, inciso IV que, por ela, implementa-se um dos meios de extingao do crédito tributdrio. Ocexame, entretanto, da normatividade subjacente ao texto do Diplo- ma Tributério leva o intérprete a localizar 0 efetivo fenémeno normativo da remissio e distingui-lo do da isengao. Este fendmeno, tanto quanto os demais j4 submetidos a este traba- Tho, inaugura-se pela Legalidade, de acordo com o previsto no art. 146, in- ciso III, alfnea c da Carta de 1988. Sao os enunciados normativos devida- mente inseridos no sistema do direito positivo que dao margem para a con- figurago da norma de remissao. Souto Maior Borges a define como: “A remissao de débitos benefi- cia pessoas para as quais jd existe a obrigagiio. Nao se deve, pois confundir 124 Isengoes TriBuTARIAS remissao ¢ isengao de tributo porque nesta inexiste obrigacio a ser extinta, diversamente daquela, que alcanca, como um posterius, débito j constitufdo €, portanto, exigivel’”. Precisemos a ligdo do mencionado mestre. Enquanto a hipdtese da norma de iseng4o aponta para a ocorréncia de um evento futuro, cujas pro- priedades estavam conotadas na hipétese da regra tributdria, até que se deu sua inser¢ao no ordenamento, a hipétese da regra de remissao descreve como suporte factico ou um evento passado ainda nao constitufdo em fato jurfdi- co, ou este prdprio fato juridico quando ja constituido que, no caso, serd a relago jurfdica tributaria, cuja prestagdo inadimplida sera remitida. Quan- do a hipdtese descrever aquele evento, sua constituigdo em fato jurfdico dar- se-4 no enunciado protocolar da norma de remissio individual e concreta. O conseqiiente da regra de remissao, por seu turno, prescreverd a extingao da relagao tributdria. Assim, vigente a remissdo, sua aplicagdo provocard a emissao de enunciado referente a norma individual e concreta, cujo antecedente acusa- rA 0 fato juridico relagao tributaria e 0 conseqiiente a relagio de remissio0 que, no célculo das relagdes, anulard a mencionada relagdo tributaria. Pro- duz-se no plano normativo, com este mecanismo, um conjunto vazio de ele- mentos, que se refere a inexisténcia de relagGes tributarias no plano dos fa- tos juridicos. Segundo tal perspectiva normativa, assim ocorre a extingo do crédito tributario de que trata o mencionado art. 156, inciso IV do Diploma Tributdrio. °” Isenges Tributdrias, p. 174. 136 ISENCOES TRIBUTARIAS E importante notar que a supresso da vigéncia nao implica retira- da da regra de isencdo do ordenamento, pois ainda estaré habilitada para ju- ridicizar eventos j4 ocorridos™, mas ainda nao constitufdos em linguagem competente. Desta feita, embora impossibilitada de produzir efeitos sobre even- tos futuros, a retirada de vigéncia de uma determinada regra-matriz nao Ihe impede de, por processo competente, ser aplicada no sentido de constituir em fato juridico isento presente, eventos passados, A doutrina costuma denominar tal caracterfstica como uma ultrati- vidade da norma juridica, mas, na realidade, isto decorre mesmo da sua vi- géncia e do modo com que o ordenamento trabalha o seu vetor temporal. Disto decorre outro equfvoco pregado pela doutrina, qual seja, de que as regras de iseng6es a prazo certo gerariam direito adquirido para os con- tribuintes isentos. Ora, a regra de isengo, enquanto geral e abstrata, nao reflete nenhum direito adquirido ao particular. Nao podemos olvidar que a regra de isengao, em tal performance, apenas conota as qualidades do evento isento e da re- lagdo juridica de isengao. E preciso, entdo, que se enuncie o fato em Jingua- gem competente para que advenha o efeito, a norma individual e concreta, na qual apuraremos 0 fato jurfdico isento e a respectiva relago juridica de isengdo, esta sim configuradora do direito adquirido pelo contribuinte isen- to, pois estando em relagao com 0 fisco, lhe é atribufdo, especificamente, o direito de abster-se da prestagao tributdria e o dever do fisco de nao impe- dir tal conduta omissiva. Portanto, nao é a regra-matriz de isengdo que outorga o direito ad- quirido ao particular, mas a norma individual e concreta que precisa o fato isento e a respectiva relagdo de crédito ¢ débito isentos. E tal relagdo s6 se d4 com a constituigao do fato jurfdico isento, tema que serd visto adiante. V.5 - A Constituigéo do Fato Juridico Isento e da Relagao Juridica de Isengao A leitura muito préxima do texto do art. 179 nao permite verificar os fendmenos normativos de constituigdo do fato e da relagdo de isengao, podendo levar & confusdo de que o ordenamento prevé apenas aqueles (fa- tos e relagdo) postos por ato-fato e ato-norma de agente da administragdo tributéria. Vejamos sua redacgio: * Paulo de Barros Carvalho, Fundamentos Juridicos da Incidéncia, p. 66. Peoro GuitnerMe Accors) LUNARDELLI 137 “Art. 179. A isengio, quando nao concedida em cardter geral, é efetivada, em cada caso, por despacho da autoridade administra- tiva, em requerimento com o qual o interessado faga prova do preenchimento das condigdes ¢ do cumprimento dos requisitos previstos em lei ou contrato para sua concessao. § 1° Tratando-se de tributo langado por perfodo certo de tempo, o despacho referido neste artigo ser4 renovado antes da expira- ¢ao de cada perfodo, cessando automaticamente os seus efeitos a partir do primeiro dia do perfodo para o qual o interessado dei- xar de promover a continuidade do reconhecimento da isengao. § 2° O despacho referido neste artigo nao gera direito adquirido, aplicando-se, quando cabfvel, o disposto no art. 155”. A sua reescritura normativa, entretanto, apresenta norma semelhan- te & do art. 142 do Diploma Tributério, “norma de estrutura que informa o modo de producao do ato-norma administrativo” que langa no ordenamento norma individual e concreta, na qual encontramos a relag&o jurfdica da isen- Ao entre fisco e contribuinte (isento). Com efeito, dada a regra de isencao, geral e abstrata, caberd a referida autoridade administrativa aplic4-la** ao caso concreto que se d4 com 0 pro- cedimento* de compor o fato juridico administrativo suficiente”’ (do qual faz parte 0 evento isento a ser constitufdo em fato) do ato-norma adminis- trativo*, responsdvel pela colocag&o daquela norma individual (a da isen- ¢4o) no sistema. Diante do parégrafo 1° do mencionado art. 179, encontramos a coor- denada temporal da hipétese da regra de isengdio que se assemelha a da re- gra tributéria. Tal coordenada juridiciza o tempo integrante do evento juridico isen- to, que se faz presente nas provas trazidas pelo contribuinte. Com essas pro- vas (fato produzido em linguagem competente) a autoridade administrativa 4 Burico Marcos Diniz de Santi, Langamento Tributdrio, p. 130. 35 Alberto Xavier, Conceito e Natureza do Langamento Tributdrio, p. 71; Souto Maior Borges, Isengées Tributdrias, p. 149. 36 Burico Marcos Diniz de Santi, op. cit., p. 92 e 138. . 2 bidem, p. 138: Sio pressupostos de constituigio deste fato juridico administrativo suficiente: (i) competéncia do agente, (ii) procedimento, (iii) motivo do ato e (iv) pu- blicidade. 38 Ibidem, 104: “Ato-norma administrativo € uma norma individual e concreta que, em seu prescritor, estabelece uma relagao jurfdica entre a Administragao € 0 Particular, condicionada pela ocorréncia de uma hipétese factica concreta (motivo do ato), di- rigida a realizagdio das normas gerais e abstratas, posta pelo Estado ou quem lhe faga as vezes, no exercicio da fungao administrativa”. “LL T'97 OP “86S'T ol! 191-0101 OP of, “Ue OU CIHaUTEpUNy WA} OANISOdsIP 25H z “08°80°81 OP ‘8 ot AIO OLoIIeOq OT O W9quI} seyNsUOD Oyfadsau aISO B ‘SE) -uast svorpjinf stossad sv ered ojapour orou opexyy 9 08/1 B PPEBOAS 105 ‘86"E'SO OP “gz ,U AUS PANCULION OpSnsu] ep OBSIps woo ‘ouSuast op ogSesE[9p ep onsodoid V “ALES “Me 9/9 B79 “Me) OBduast op opSearpoap requasoade 2 (777 “13e) [ed ION] ap oanensuowop reredoid ‘(97z “We) sesooURUIJ sagSensuOWap FesOgeIa “(£61 “ur) Stvosty 9 STeIJOWOD S19] Sep LIOUYAJASGO WO OYSeINILIOSO JOyUVU WASP “p6"10°TT OP ‘1H0'T oU O1a190q Ojed Opeaoide ‘pE/ATY [eNIe OP SouLsa) sou “opoul assop ‘yer -98 wo seorpyinf seossad sev wired g/yly Ou sepeyndiysa sagseBrigo sTeUap Se souofns optse vpuas ap oysoduy op jeiozed no [e101 oYSuas! ap wez03 onb sajuInqiNUC SO “Ly SOULI} SajUINaS SOU OPLZLA *[8/T] gt OANBULION Jod0Ie4 OP *L WIE OU “OS/ATA Op vioUgSIA B Gos EpulL LpEsaytuCUL ‘[eI9pa,] VIIEOIY LP ovdisod v sejou oyuessozayuy “PO LT'O€ 9P '905"b U 1971 UP Cx “UE Op au10D9p OanIsodsip [RL “ossou 9 anbeIsap Oy o1taya oatjoadsau 0 oJUaUTeUApIO OU Ja9SeU OpUdZey ‘O]UAS! aJUaTOYNs Ootpsnf yey o anbreurap sejnonsed o anb ered Woes SazaAap $9}S9 SOPO} “21Q “(epeo -yyjduits) epuai ap oysodur op ogSexejoap 9 sesiaoueuly sagsensuowiep 481 -uasaide ap Jenap 0 wadajeqeise anb ‘ZZz & QZT “S}e SoU “wy 40d ‘9 SOIAT] saqsop ojuaurryouaesd ap oporgut o aaqos eedsip anb ‘p17 “We ou ‘ayuINqLn -tio9 ojad sopnueur 9 soprysusaid utosas ¥ steosty SOsAt] SO UNE[NBax anb ‘QT Z B POT ‘SUB SOU {]eoSl] 9 [eIOISUIOD ByLIOSa Bp OBSUS]NULU Op JoAEP OP BIT) anb ‘4/61 ‘We ou so}iosaid as-wie.nUODUO SoreAop ste] sJUSWTENTY saquajod ~Wod WesenZur] We oes! 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