You are on page 1of 11
Revista Brasileira de Educacao Especial O método Reuven Feuerstein: uma abordagem para o atendimento pedagédgico de individuos com dificuldades de aprendizagem, portadores ou nao de necessidades educativas especiais HUGO OTTO BEYER Professor Adjunto do Departamento de Estudos Especializados e do Programa de Pés-Graduacao em Educaciio - Faculdade de Educagao (UFRGS) ‘A Psicopedagogia é, reconhecidamente, a area de atuagio dos educadores que se ocupam com individuos que apresentam dificulda- des acentuadas nos seus processos de aprendizagem, com reflexo ime- diato em sua vida escolar (como, por exemplo, o fracasso escolar, a repeténcia e a evasio escolar, entre outras). A tarefa da Psicopedagogia consiste em refletir sobre a pratica da intervengao cognitiva e afetiva, no sentido de uma proposta de ago que se fundamente em premissas te6ricas correspondentes. ‘A conjugagao do binémio teoria-pratica consiste numa tarefa im- prescindfvel e, ao mesmo tempo, complexa. Procura-se conectar coe- rentemente a pritica psicopedagégica a uma linha tedrica especifica. Bossa (1994) menciona as seguintes teorias como exemplos de enfoques teéricos que embasam o trabalho psicopedagégico: a Psicanilise, a Psi- cologia Social, a Epistemologia e a Psicologia Genética (em um bloco s6) e a Lingiifstica. Seguindo esta abordagem de aproximagio teoria- prética no ambito da Psicopedagogia, menciona-se 0 trabalho do Prof. Reuven Feurstein. No intuito de verificar a eficdcia das premissas te6- Revista Brasileira de Educacao Especial rico-conceituais de Feuerstein, desenvolvemos tanto uma anilise teéri- ca. como uma avaliacao empirica do trabalho de Feuerstein. "Assim, juntamente com nossa equipe de pesquisadoras, come- amos a desenvolver estudos tesricos ea realizar a aplicagfio supervi- Sionada do método no dmbito da pesquisa O método psicopedagdgico de R. Feuerstein: um modelo para o apoio cognitivo de individuos com dificuldades de aprendizagem e com Sindrome de Down. Andlise te6ri- ca e avaliagéo emptrica (DEE-FACED UFRGS; FAPERGS; CNPq- UFRGS). A partir dos resultados que fomos obtendo, tornou-se cada vez mais evidente (somado aos resultados que jé tinhamos reunido em pesquisa de Doutorado) que 0 trabalho do Prof. Feuerstein constitui um exemplo de uma abordagem, no campo da Psicopedagogia da Educagiio Especial, que consegue aproximar, de forma coerente, a ago psicopedagégica a premissas te6rico-conceituais correspondentes. Tendo em vista tornar conhecida um pouco mais a pessoa de Feuerstein, apresenta-se, inicialmente, alguns dados biogréficos do au- tor, Reuven Feuerstein é um psicdlogo israelense conhecido em varios paises do mundo como 0 idealizador de um método especffico de inter- vengiio psicopedagégica. Sua abordagem tedrico-metodolégica tem sido exaustivamente discutida e analisada nestes pafses, tanto no Hemisfé- rio Norte como nos pafses do Sul. Gage et alii (1986) avaliam o traba- Iho de Feuerstein da seguinte forma: Os trabathos do psicélogo israelense Reuven Feuerstein tem apresentado resultados promisso- res, dos quais se pressupoe que eles podem aumen- tar a inteligéncia. (...) O método de Feuerstein, de- senvolvido em Israel e aplicado em diferentes dre- as, também achou entrada em outros paises. Sinais de sua efetividade comecam a ser freqilentes, mes- mo que outras provas rigorosas devam haver, de forma a superar todas diividas." Feuerstein nasceu na Roménia no ano de 1921. Em Bucareste desenvolveu estudos em Psicologia e em Pedagogia. Durante aI Guerra Mundial emigrou para Israel, onde prestou exame para docéncia. Por razées médicas, mudou-se para a Suiga, onde veio a radicar-se. Foi neste perfodo que desenvolveu estudos em Genebra, vindo a aderir a0 circulo de colaboradores de Piaget. Em 1952, concluiu seus estudos em Psicologia e veio a doutorar-se em 1970 em Psicologia Cognitiva e do Desenvolvimento. E fundador do Hadassah-Wizo-Canada Research Institute e profere palestras e cursos em vérias Universidades do mun- do como Professor convidado. No Ambito das énfases teéricas de Feuerstein, para se compreen- der alguns dos conceitos fundamentais precisa-se retroceder 8 época ‘T GAGE NLL, BERLINER, D.C. Pidogopiche psycooge, Weinheim: Bele, 1986p. 138,139, Do inglés meditedleoring experience. {J FEUERSTEIN, R Insrumentl enrichment: ‘an mervertion program for cognitive mediiabi- ly. Baltimore: University Park Press, 1980, p. 16 Revista Brasileira de Educacao Especial em que ele se ocupou da avaliagao psicolégica dos filhos dos emigran- tes israclenses, que entAo transferiam-se do Norte da Africa para Israel. Conforme constatagio de Feuerstein, as criangas demonstravam, em regra, niveis intelectuais consideravelmente baixos. Inquietado pela situagdo, ele observou que, no ambito sécio-familiar dessas criangas, ‘os vinculos de interago cognitivo-afetiva eram insuficientes para pro- mover um desenvolvimento intelectual e lingiifstico adequado. ‘A énfase nos processos interpsicolégicos como elementos quali- tativamente diferenciais para o desenvolvimento infantil fundamentou a elaboraco teérica do conceito de “aprendizagem mediada”. Assim, para Feuerstein o fator diferencial na qualidade do desenvolvimento cognitivo-intelectual da crianga depende das experiéncias de interago da mesma com o seu meio (aqui fundamentalmente o meio “social”, isto é, 0 circulo de relagées interpessoais). ‘A énfase s6cio-cultural de Feuerstein no que tange aos proces- sos de desenvolvimento ¢ aprendizagem encontra paralelo na aborda- gem tedrica de Vygotsky a respeito das interacdes sécio-culturais da crianga. Feuerstein, assim como Vygotsky, reconhece o desenvolvimento ontogenético das estruturas do conhecimento e da linguagem, Este de- senvolvimento, no entanto, correlaciona-se significativamente com a dindmica interativa da crianga. Assim, 0 nivel qualitativo das interagdes s6cio-culturais influencia diretamente a forma que a construgao psico- l6gica (cognitiva e afetiva) individual teré. Ou seja, parafraseando ‘Vygotsky, o desenvolvimento das “estruturas intrapsfquicas” ocorre em fungio das “relacdes interpsiquicas”. ‘Sobressai-se, assim, o conceito de “mediagao”. Vygotsky enfatiza a importincia dos processos mediadores no grupo sécio-cultural para que a crianga possa desenvolver - através de mecanismos funcionais - as estruturas cognitivas e lingiifsticas. Diferentemente de Piaget, na 6tica de Vygotsky os processos monitoradores do desenvolvimento in- fantil nfo so auto-suficientes, isto é, ndo sto caracterizados por uma autonomia auto-reguladora. Ocorre, a0 contrério, uma equilibragdo pro- gressivamente mediada do desenvolvimento infantil pelo outro social, resultando na internalizaco e construgao gradual da autonomia inte- Jectual, cultural e lingiifstica por parte da crianga. Feuerstein assimila a abordagem vygotskyana de mediagao, pa- rafraseando-a através do seu conceito da “experiéncia de aprendiza- gem mediada” *Conforme Feuerstein, a determinacao diferencial do desenvolvimento infantil dé-se em fungdo das oportunidades da crian- ca em ter sua aprendizagem informal e formal mediada. E isto exata- mente o que ele afirma na citagao seguinte: “A experiéncia de aprendi zagem mediada pode ser considerada como o ingrediente que determi- nao desenvolvimento cognitivo diferencial”. * ‘A partir deste enfoque te6rico, Feuerstein entende que as dificul- dades do desenvolvimento cognitivo-intelectual devem ser atribuidas Revista Brasileira de Educacao Especial “principalmente” as caréncias na aprendizagem mediada nos primei- ros anos da vida infantil. A intermediagao limitada dos processos de aprendizagem da crianga pode acarretar, desta forma, o desenvolvi- mento de “fung6es cognitivas deficientes”, denominago que Feuerstein dA a sindrome de dificuldades especificas do funcionamento intelec- tual. Quanto menos a crianca vivenciar processos mediadores ou rela- es interativas de natureza cognitiva, lingiifstica e cultural, tanto maio- res sero as probabilidades do surgimento de dificuldades no seu de- senvolvimento cognitivo. Apresenta-se, a seguir, algumas das possf- veis funges cognitivas deficientes que podem se manifestar em crian- gas desprovidas da mediagdo social ou portadoras de algum tipo de deficiéncia. ¥ importante esclarecer que Feuerstein entende que os proces- sos de pensamento ocorrem em trés momentos: a consideragio inicial dos dados apresentados ao individuo, os processos de andilise e a elabo- rago de respostas. Algumas das fungdes cognitivas deficientes sio: - Fase da assimilacio: + Exploraco impulsiva e desordenada de um dado problema; + Pouca necessidade de exatidao na consideragio dos dados do problema; = Dificuldade para a consideragao simultanea de duas ou mais fontes de informagao. - Fase da andllis + Dificuldade para distinguir entre informagées relevantes ¢ irrelevantes; + Compreensdo episédica ou desconexa das dimensdes espaco- temporais; + Precariedade de trabalho légico (conexdes de pensamento numa linha indutiva “se-ento”); + Reflexdo deficitéria dos préprios processos de pensamento (ha- bilidades metacognitivas ténues). - Fase da resposta: + Forma egocéntrica de se comunicar; + Conduta do tipo “ensaio e erro”; + Impulsividade. ‘A preocupagio de Feuerstein, além das questdes de natureza te- 6rica (e de fato ele desenvolve um amplo campo de formulacées e cri- ticas conceituais), concentra-se fundamentalmente no lidar - tanto no plano do diagnéstico como no terapéutico - com a crianga cognitivamente debilitada. O individuo-alvo do trabalho de Feuerstein 6 acrianga, o adolescente ¢ 0 adulto que evidenciam dificuldades con- siderveis no que tange as operacdes cognitivas. Por isso, sua contri- buigdo maior no campo da Educagio Especial reside na construgao de uma gama considerdvel de instrumentos psicopedagégicos, com a fi- Revista Brasileira de Educa¢ao Especial nalidade precipua de diminuir, e, se possfvel, dirimir as fungdes cognitivas deficientes. Para tanto, Feuerstein desenvolveu dois programas de ago psicopedagégica, um avaliativo e outro de apoio cognitivo. O primeiro denomina-se “Abordagem de Avaliag&o do Potencial de Aprendizagem”, tradugio para o portugués da denominagao na lingua inglesa Learning Potential Assessment Device; 0 segundo chama-se “Programa de Enri- quecimento Instrumental (PEI)”, cuja formulagao no inglés é Instru- mental Enrichment Program. Dos dois, iremos nos deter brevemente na apresentagdo do segundo programa. O programa de Enriquecimento Instrumental (0 titulo deste pro- grama pode sugerir uma conotagao behaviorista, 0 que nao se confirma quando se analisa a discussio tedrica de Feuerstein) consiste de 15 jnstrumentos ou “cadernos” com variadas tarefas, sendo que cada um deles contém um ou mais objetivos de agao pedagégica. Comenta-se, brevemente, alguns dos instrumentos integrantes do programa. 1, Comparagoes. Feuerstein atribui a esse instrumento uma fun- do bésica. O objetivo do instrumento consiste em fomentar 0 pensa- mento comparativo na crianga, isto é, a capacidade de constatar seme- Ihangas e diferencas entre dois objetos ou acontecimentos. Com isto, a crianga estar incrementando a capacidade de construir operagdes cognitivas complexas, como, por exemplo, agrupar elementos em tor- no de caracteristicas comuns. 2. Categorizagio. Este instrumento objetiva combater a dificul- dade cognitiva do individuo para categorizar. Com freqiiéncia, 0 estilo cognitivo da crianga com prejuizos cognitivos é descrito como “associativo”, ou seja, ela nao é capaz de trabalhar contetidos comple- xos, que exijam a classificagdo como forma de solugao. O instrumento & baseado em habilidades e procedimentos aprendidos em “Compara- Ses” conduz ao instrumento “Silogismos”. 3. Organizagao de Pontos. O instrumento “Organizagio de Pon- tos” € baseado num trabalho produzido pelo Prof. André Rey de Gene- bra, Suica, o qual foi um colaborador préximo de Jean Piaget. O aspec- to basico da tarefa consiste em identificar e tragar, dentro de uma nuvem amorfa de pontos, uma série de figuras que se entrecruzam parcialmente, tais como quadrados, triangulos, estrelas e outras. Algumas das opera- des cognitivas que o instrumento fomenta sao a: + projegio de relagdes “virtuais entre os pontos; + conservago da constiincia de determinada figura, mesmo quan- do esta sofre determinadas variagdes; +clareza na identificagio das dimensées de tamanho, distancia e paralelismo de linhas; + capacidade de planejar e restrigao a impulsividade (a necessi- dade de planejar antes de tragar as linhas ajuda no combate 3 Revista Brasileira de Educagao Especial impulsividade ou ao estilo “ensaio e erro”, caracterfstico do aluno com limitages cognitivo-intelectuais). ‘Os exercicios exigem a aplicago de diferentes operagdes cognitivas que, se por um lado desafiam o aluno pelo seu grau de difi- culdade, por outro oportunizam, com 0 devido auxilio do professor, 0 seu desenvolvimento cognitivo-intelectual. 4, Relagdes Familiares. O alvo deste instrumento no é 0 de en- sinar relagSes existentes numa familia. O tema sobre a familia foi esco- Ihido porque ele oportuniza que se trabalhe com diferentes categorias de relacionamento. As situagGes de parentesco séo uma oportunidade eficaz para que 0 sujeito compreenda os vinculos categoriais existentes entre duas ou mais existéncias separadas. 5. Relagdes Temporais. “Relacdes Temporais” é um instrumento voltado para reorientar a percepgio deficiente da crianga quanto a di- mensio do tempo ¢ a sua capacidade para registrar, processar e ordenar relagdes temporais. O'fato de que a dimensao temporal niio pode ser percebida exceto através da representagdo mental faz com que a com- preensdo temporal dependa de um grande mimero de fungdes que sio reconhecidamente fracas no individuo com necessidades cognitivas especiais. ‘As paginas do instramento sao divididas em unidades, sendo que cada uma delas apresenta, explora e desenvolve um aspecto diferente da orientagao (representagaio) temporal. 6. Progressées Numéricas. O objetivo maior deste instrumento volta-se & procura da crianga por regras leis, através da dedugio das relagées existentes entre eventos por ela vivenciados. A ordem e o sur- gimento ritmico das relagdes so formulados como regras, coma ajuda das quais a pessoa pode construir ou predizer a seqiiéncia futura dos eventos. Assim, um dos principais propésitos do instrumento 6 o de desenvolver uma orientago para perceber objetos ¢ eventos como conectados por algum tipo de relagiio que pode ser deduzida. 7 Relagdes Transitivas. Este instrumento lida com as inferéncias de novas relagdes a partir das j4 existentes entre objetos e/ou eventos, que podem ser descritas em termos de “maior do que”, “igual a” e “menor do que”. O aluno é introduzido as regras que governam o pen- samento transitivo e aprende a conectar os dados apresentados sepa- radamente através de um ponto comum de referéncia. Através do ins- trumento, a crianga tem a oportunidade de aprender regras e aplicé-las. 4 No Ambito do nosso trabalho de Doutorado, conduzimos °a apli- cagéio de quatro instrumentos que integram 0 programa em questio, sendo eles: Comparagdes, Categorizacio, Orientagéio Espacial I e Per- cepgio Analitica. Optamos por esses instrumentos, dada sua tradugdo jd existente para a lingua alema. A esfera de aplicabilidade tedrica das conclusées empiricas obtidas ficou, naturalmente, reduzida, dada a no 4 Para um conhecimento mais amplo da teoria ¢ método de Feuerstein, recomendamos a letura do nosso livro"O fazer psicopedagégico: a abordagem dé Reuven Feuerstein a partir de Piaget © ‘Vygosty"publiado no correnteano - 1996 pela Mediagio Editors [5 BEYER, HO. Die methode feversein: ein model ir le kogtiveFiderung lembinderter Jogendicher, Hamburg Universitit Hamburg, 1994, Revista Brasileira de Educa¢ao Especial ampla amostra do método psicopedagégico. No trabalho desenvolvido participaram 6 classes escolares das chamadas escolas de apoio para alunos com dificuldades de aprendizagem na cidade de Hamburgo, ‘Alemanha Federal. As seis classes totalizaram 60 alunos, com idade variando entre 11 ¢ 16 anos. O critério cronol6gico se explica pelo fato de que o programa é elaborado especialmente para adolescentes com atrasos considerdveis no seu desenvolvimento cognitivo. O trabalho psicopedagégico nas classes acima mencionadas realizou-se entre de- zembro de 1990 e junho de 1991. Os professores das classes partici- pantes foram preparados no material e envolvidos na aplicagio do mé- todo. Aos professores foi distribuido o seguinte material: +as folhas coms tarefas dos respectivos instrumentos, folhas de solugo e folhas de presenga; + um manual de instrugo para cada instrumento; +um cademo informativo sobre aspectos tedricos e metodol6gicos do programa cognitivo de R. Feuerstein. As tarefas foram aplicadas em média duas vezes por semana nas classes, com duraco de 50 minutos cada sesso. As classes nao foram retiradas de suas atividades normais na escola. Com isto a atmosfera escolar rotineira da classe nfo foi prejudicada. PEI abrange seis objetivos especificos, os quais podem ser agrupados basicamente em duas 4reas: por um lado, determinados ob- jetivos visam a diminuico das fungées cognitivas defectivas e simul- taneamente o fomento das capacidades intelectuais; por outro lado, pro- cura-se intervir positivamente nas varidveis afetivas ou extra-intelec- tuais correlacionadas positivamente com os processos cognitivos. Por- tanto, pode-se definir as duas dreas como constituidas por processos “cognitivos” e “afetivos” da aprendizagem. Na pesquisa-base da tese de Doutorado, estabelecemos as seguintes hipéteses (concentradas nas reas de verificagiio empfrica acima mencionadas): + Hipotese 1 - O apoio psicopedagégico através de 4 instrumen- tos do PEI de R. Feuerstein a alunos com dificuldades de aprendiza- gem atua positivamente “em seu nivel intelectual”, o que se confirma por meio de uma significante diferenca (entre a pré- e p6s-avaliacio) na medida do rendimento intelectual. + Hipétese 2 - O apoio psicopedagégico através de 4 instrumen- tos do PEI de R. Feuerstein a alunos com dificuldades de aprendiza- gem atua positivamente em determinadas “operagdes cognitivas”, o que se comprova por meio de uma significante diferenga entre a pré- € pés-avaliaga + Hipotese 3 - O apoio psicopedagégico através de 4 instrumen- tos do PEI de R. Feuerstein a alunos com dificuldades de aprendiza- gem apresenta um efeito positivo nos “componentes afetivos” do seu processo de aprendizagem, o que se evidencia numa expressiva dife- renga (entre a pré- e pés-avaliaco) nas atitudes afetivas. Revista Brasileira de Educacao Especial + Hipotese 4 - O grupo de trabalho psicopedagégico se diferen- cia “significativamente” do grupo de comparacio. + Hipétese nula - A intervengao psicopedagégica com o PEI nao ird favorecer no grupo de trabalho psicopedagégico uma melhora sig- nificativa nas varidveis “inteligéncia, auto-estima/motivagao e opera- gdes cognitivas”. + Hipstese 5 - Os efeitos da intervengdo com o PEI irdo se evi- denciar como estaveis. Além dos instrumentos de avaliagdo utilizados na érea intelectual, cognitiva e da motivagiio/auto-estima (como parametro de verificagio das hip6teses acima apresentadas), foram apresentados dois questioné- ios para professores e alunos, com a finalidade de recolher suas opini- Ses referentes as propriedades do PEI como método de apoio cognitivo- intelectual. Os resultados colhidos, analisados e interpretados indicaram para as seguintes conclusdes: +Houve uma mudanga significativa no nivel de rendimento inte- lectual do grupo de alunos das classes de apoio quando contrastado com o seu rendimento antes do trabalho com o PEI e também em rela- ¢40 ao rendimento do grupo de comparagio; + A maioria dos resultados positivos obtidos no ambito das performances intelectuais na pés-avaliagdo do grupo de trabalho psicopedagégico nao se evidenciaram como permanentes cerca de 6 meses depois; + No sentido das mudangas postuladas por Feuerstein no ambito afetivo dos processos de aprendizagem péde-se verificar resultados parciais; +Dos quatro instrumentos aplicados, especialmente o instrumento “Percepgdo Analitica” apresentou os resultados mais convincentes; + Os alunos com dificuldades de aprendizagem expressaram, na sua maioria, uma apreciagiio positiva do PEI; + Alguns professores evidenciaram para com o PEI uma posigao um pouco cética, o que pode-se melhor compreender devido a natureza um tanto abstrata de algumas das tarefas apresentadas aos alunos. Em relagdo aos resultados positivos verificados no ambito das habilidades cognitivo-intelectuais, pode-se comentar os seguintes as- pectos tedricos. Brown e outros fazem sobressair o papel desempe- nhado pela transferéncia da aprendizagem no que tange 4 melhora da performance intelectual: “A inteligéncia significa a eficiéncia da nova aprendizagem e a extensio da transferéncia”. ’Conforme estes autores, a eficdcia da transferéncia dos princfpios aprendidos a novas tarefas integra a capacidade intelectual do individuo. O conceito de inteligén- cia implica, assim, no desenvolvimento da capacidade de aprendiza- gem, isto é, tem a ver com 0 conceito de “aprender a aprender”: “A inteligéncia (...) envolve o desenvolvimento de habilidades de apren- ‘6 BROWNAL, CAMPIONE, LC. Modifying Ineeligence or modifying cognitive skills: mare than a semantic quibble! Em: [DETTERMAN, DK, STERNBERG,R. (org). How and how much can inteligence be in ‘creased, New Jorsey:ABLEX Publishing Cor- poration, 1982 p.227. iealigence isthe efciency of new learn ing and the breadth of transfer” BBROWN,AL, CAMPIONE,}.C.,op.ct, 27-28. ‘9 FEUERSTEIN, R. opt, p. 15. instrumental Enrichment (.) s moze sin- ply described as a strategy for learning to lea, 1 STERNBERG, RJ Icligence apple: un- derstanding and increasing yourinelecua ei San Diogo: Harcoure Brace Jovanovich, Pub- lshers, 1986;SNOW, RE The traiing of n- ‘llacezal aptitude. Em: DETTERMAN, DK, STERNBERG, Ry. (org). How and how much con inteligence be increased, New Jersey: ‘ABLEX Publishing Corporation, 1982. 12 KLAUER, K,. Intelligenztraining im kindesaer:ergebrite,theorien und methoden dor forschung Weinheim: Bele, 1975. 1B In constructing FE ("Feuerstain Instr ‘mental Errichment),our major goal has been ‘0 develop a meant for producing earning schemata in children, wile simultaneously ‘constanly enlarging these schemata by in ‘roducing novel skuations into them. This double process of accommodation and 2s- slmlaton described by Paget asthe dynamic Principle ofthe development ofinealigence, Is used by us forthe specie purpose of ers" ‘allzing the prerequisites of leaning while rendering them flexible enough to enable generalization and constant adaptation of ‘heir application in new and varied stations FEUERSTEIN,R,op.c, p34. [4 BROWNAL, CAMPIONE,|..0p.ct, p 8. Revista Brasileira de Educacao Especial der a aprender”. * Costuma-se diferenciar entre uma transferéncia es- treita, circunscrita a tarefas especfficas, mas de efeito mais permanen- te, e uma transferéncia ampla, constituida por estratégias metacognitivas, cujo efeito de transferéncia € presumivelmente mais brando. Estas consideracées dizem respeito exatamente ao conceito que caracteriza 0 PEI de Feuerstein, conforme o seguinte comentario de Begab: °“Enriquecimento Instrumental (...) é mais simplesmente des- crito como uma estratégia para aprender a aprender”. "° O préprio Feuerstein (1980) vincula a problematica do baixo rendimento intelec- tual do individuo a seus processos de aprendizagem; cle traca, assim, um paralelo entre a aprendizagem e a inteligéncia. A correlaco entre a inteliggncia e a aprendizagem (escolar) € avaliada de forma diferenciada. Enquanto alguns autores véem uma correlagao positiva entre ambas, " outros autores apontam para uma correlago insignificante entre as mesmas. "2 Coerente com sua abordagem tedrica, Feuerstein compre- ende que o PEI busca ativar os processos de aprendizagem, isto é, 0 crescimento da capacidade de generalizagao e de transferéncia. Feuerstein compreende que o aumento da capacidade de generalizagio do aluno explica-se pelo desenvolvimento e cristalizago de esquemas cognitivos, conforme explicados pela teoria piagetiana: Ao construir FIE, nosso maior objetivo foi desen- volver uma forma de produzir esquemas de apren- dizagem nas criangas, enquanto simultaneamente (e constantemente) as criancas alargam tais esque- mas pela introdugdo de novas situagdes. Este du- plo processo de acomodagéo e assimilagao, des- crito por Piaget como o principio dindmico do de- senvolvimento da inteligéncia, é usado por nés com 0 propésito espectfico de cristalizar os pré-requisi- tos da aprendizagem, enquanto estes se tornam fle- xtveis o suficiente para possibilitar a generaliza- G0 e a constante adaptagdo de sua aplicagao a novas e variadas situagoes. Este alvo de intervengdo psicopedagégica obtém ainda maior importiincia devido ao fato de que os individuos com dificuldades acen- tuadas nos seus processos de aprendizagem e no seu desenvolvimento cognitivo se caracterizam por terem dificuldades significativas para a transferéncia dos contetidos, operacées e estratégias aprendidas (apre- sentam, predominantemente, uma aprendizagem transdutiva, pontual € concreta). Para Brown e outros, “em concordancia com Feuerstein, © PEI concentra-se fundamentalmente no desenvolvimento da capacida- de de aprendizagem, com conseqiiéncia direta para o rendimento inte- Revista Brasileira de Educacao Especial Jectual do individuo (j4 que a capacidade de transferéncia - ao menos conforme os postulados tedricos - é aumentada): O que o programa Feuerstein reivindica ensinar? Principalmente aprender a aprender. Se isto é, de {fato, assim, ent&o um instrumento de avaliagao con- ‘sistente seria seguramente algum tipo de index da habilidade methorada no aprender a aprender. O ponto deste exemplo é enfatizar que a escolha de uma ‘tarefa de transferéncia’ ou ‘medida do resul- tado’ néo é trivial; representa a teoria de alguém do que estd sendo modificado, de quanto alguém pode esperar que o fomento pedagégigo consiga (a extensdo e 0 dominio da transferéncia), e, de ‘fato, representa a teoria de alguém sobre a inteli- géncia. " Enfim, 0s resultados positivos obtidos no rendimento intelectual melhorado apés a aplicago do PEI confirmam a hipétese de que este programa pode se constituir em um suporte psicopedagégico impor- tante para alunos com dificuldades de aprendizagem. Os desdobramen- tos te6ricos ou as implicagdes decorrentes da aceitagao do método de Feuerstein como um recurso pedagégico para tais alunos apontam para um campo amplo de aplicagiio. Pode-se, igualmente, questionar os v- ios conceitos de inteligéncia veiculados, bem como qual o espaco que estes podem ou devem ocupar no amplo espectro de conceitos e das consideragées tedricas que acompanham a problematica dos assim cha- mados problemas de aprendizagem (ou, talvez, mais corretamente, fra~ cassos escolares). Sem dtivida, tal problematica no se reduz apenas & tentativa de se melhorar o desempenho intelectual do aluno, j4 que tal postura pode traduzir um reducionismo te6rico ingénuo. REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS BEYER, H.O. Die methode feuerstein: ein model fiir die kognitive ‘forderung lernbehinderter jugendlicher. Hamburg: Universitit Hamburg, 1994. BEYER, H.O. O fazer psicopedagégico: a abordagem de Reuven Feuerstein a partir de Piaget e Vygotsky. Porto Alegre: Mediacio, 1996. BOSSA, N.A. A psicopedagogia no Brasil: contribuigoes a partir da pratica. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994. BROWN, AL., CAMPIONE, J.C. Modifying intelligence or modifying cognitive skills: more than a semantic quibble? Em: DETTERMAN, D.K., STERNBERG, R.J. (org.). How and how 15 What does the Feuerstein program claim ‘to teach? Mainly learning to learn this is so.thens tutable outcome tese would surely bbe some index ofnerested learing-to-learn ability The point of this example is to Aamphasize that the choice of a ‘transfer taskor ‘outcome measure'is not trivial represents one’s theory of what is being modifed.of how much one can expect rain- ingto accomplish (che extent and domain of ‘ansfer), and, indeed, i represents ones theory of ineligence, Revista Brasileira de Educacao Especial much can intelligence be increased. New Jersey: ABLEX Publishing Corporation, 1982. FEUERSTEIN, R. Instrumental enrichment: an intervention program ‘for cognitive modifiability. Baltimore: University Park Press, 1980. GAGE, N.L., BERLINER, D.C. Péidagogische psychologie. Weinheim: Beltz, 1986. KLAUER, K.J. Intelligenztraining im kindesalter: ergebnisse, theorien und methoden der forschung. Weinheim: Beltz, 1975. SNOW, R.E. The training of intellectual aptitude. Em: DETTERMAN, D.K., STERNBERG, R.J. (org.). How and how much can intelligence be increased. New Jersey: ABLEX Publishing Corporation, 1982. STERNBERG, R.J. Intelligence applied: understanding and increasing your intellectual skills. San Diego: Harcourt Brace Jovanovich, Publishers, 1986.

You might also like