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ame yore Faculdade de Dirsito de Lisboa “How far that I Economia Politica Resumos de: ” MicROECONOMIA little candie throws his beams. world". William Shakespeare, “Merchant of Venice N 1 So shines a good deed in @ naughty 1s Eeonoria uma ciéncie social que pratende sstucer ® conduta humane nas suas interacpoes: colectivas. fazendo-o com distanclarnento anaiitico, de um mode sistemaiico & recorrendo @ uma motodologia explicita. OO aivergancias doutrinarias, praticamente todos concordam que 2 problema econérice eramontal 6 0 da escassez © Shy objective essencial d2 Francia economica & 0 O® motviray solugees que permitam sua minimizagéo © j) Corotaries da escasse7 = Ge nfo fosse 4 escassed, A, escolhas de que vata 4 Economia. seria relevantes, visio que uma OPFEC “seeds quanto 2o emprege 6 pens @ TeCUrsoS ‘ieponivais poderia sempre BSE 7 eciada, tangando-se MAO Je ‘aliomativas Timitades: vais Potualmente impossivel alingirmos © aciedade de todas BS necessidedes que expefimentamos (@ esvesacz verifica se globalmente © 3 procure pot“ jal de Se se hue saticfazom necessidades Seay sempre a ofa le potoneial Coe = ue Toumas necossidades DASiCaS > Seripyrevivencia 880 recorrentes. & plona setisfagao mum momento nS? impede, o seu ressuirgiment® PO ciclico).* “ « Aesasces @ gradudvel e relative, ja que a intensidade com Ae ela se verfica depende da propria Infensidade O° que as necessidades 55° sentidas: oepercsendo possivel uma uslizaga> te os mirada e universal GOS IEC 9 facio de sles serem suparabundantss FTE '3 satisiagao de ume necessidade n° significa que o excedente d2e5e% seraoe possa ser reoriented, COT? ‘um minimo d= Sfaancia, para outras neovesidades- _= Mesmo que: em abstracts, digpuséssemos Je todas os meios. adequados & satisfagao lens de todas 28 necessidades, TefAPO continuaria a Ser SSC2SE0. fapodinds = satistagso simulans 3° accor Ge necassidades (@ precise ‘comprar tempo alhsio). fi) 0 objecte da Economia © tema central da Economia ¢ 0 estado das declsées individuals © colectivas tomades em ambiente de escassez, eehende 0 gran de iberdade do ‘agente ea inrerdependéncia que se gers erire eS decisdes. A Economia procra ne errrinat as razhes poles quicie 62 interdapehidancia do gecisbes livres emerge uma order ‘eepontanea que muftas vores dispensa uma Sprevordenasao police, chegando mss SS resistir-the ou a inuitlizar oS designios paterallsias ou tirdnicos. No $20 -sasrapulo reatista, & Economia indaga a5 razbes Palas gueis essa ordem espontsnes, fapecar das esperangas. ae. neta S80 Bepositadas, nao evita alguns resultados patslogices @ sociaimente noclves- Rita Mota # Pedro Galvo ‘ Resumos de Microsconomis A.Economia € uma forma de andlise que procura acrescentar varlas dimensbes & compreenséio da conduta social humana, formecendo uma das mais rigorosas imagens possiveis da natureza humana. Assim, pode colocar énfase inicial na racionalidade abstracta das escolhas ou nos constangimentos contratuais © institucionais que diam os caminhos legitimadores das solugSes que decorrem dessas escolhas (opgao ou organizagao) {l) - a) O institucionaiismo (pp. 26 - 35) iii) A andlise econémica da racionalidade ____ A analise econémica pode assumir uma de duas vias: a de olhar para os objectives © determinar @ racionalidade, a adequapao dos meios (optimizagaio de melas) ou a de olhar para os meios disponiveis e tentar justifica-los, encontrar-Ihes. gbictves para os quais eles se afigurem racionalmente adequados (maximizagao de ins). : A forma como os individuos afectam os recursos escassos obedece a uma Facionalidade que no é diferente daquela que eles empregam para um conjunto de ‘outras decisées que, néio sendo caracteristicamente econémicas, néio so menos importantes do ponto de vista individual e social. A racionalidade de que trata a ciéncia econémica 6 essencialmente procedimental e raramente se aventura pelo, plano dos fins. A racionalidade que pressupde nao é a ponderagdo minuciosa de todos os custos e beneficios associados a totalidade de opges que 0 horizonte cognitivo possa abarcar, mas apenas uma resposta diferenciada e exolicavel a estimulos variéveis. ‘Como estudo centrado na determinagéo e avaliagdo de escolhas racionals, a Economia tem muito a dizer sobre a modelagao juridica, na medida em que esta seja iruto ou objecto de escolhas socials e se trate de prever os efeitos das regras juridicas alternatives aplicadas aquelas decisdes individuais. Hl) — 8) A optimizagao Georoe Stiaier formulou o principio de optimizagéio: escolha de condutas que, de entre todas as possiveis, apresenta a maxima diferenga entre beneficios e custos. Custo de oportunidade: todos os beneficios que deixamos de receber por sacrificarmos as opges que tinham de ser preteridas em favor da conduta que escolhemos. ‘A optimizago nao pode evoluir a partic de uma anélise generalizada e minuciosa de custos e beneficios porque estes nem sempre so explicitaveis e ponderaveis, © também porque mesmo que isso fosse possivel, seria irracional despender o tempo que isso exigiria; dai a vantagem do raciocinio marginal, que so concentra “microscopicamente” nos custos e vantagens de mais uma opgéo, de mais um bem, de mais um factor produtivo. Essa cancentragao no Ambito confinado da préxima deciso dentro de um processo incrementalista de optimizagao € que explice que o comportamento marginalista seja esponidneo e inato nos agenies econdmicos, capazes de resolver racional e eficazmente problemas mais imediatos e urgentes. ‘A moeda é um simples meio de acesso a recursos e nao é, em si mesma, um recurso daqueles cuja escassez obriga a escolhas e a decisbes optimizadoras € maximizadoras da satisfagao das necassidades. ‘A escola neocléssica 6 essencialmente racionalista, pressupondo que as decisdes bésicas do agente econdmico derivam de ponderagées atribuiveis & sua racionalidade, facilitando esta a produgao de resultados maximizadores do bem-estar social. Rita Mota e Pedro Galvso 2 Resumos de Microeconomia fil) - b) Racionatidade limitada Racionalidade limitada (Herbert Simon): conduta que pretende ser racional mas que nio franscende a ponderacdo dos custos implicitos na racionalidade, substituindo © objective da maximizagdo pelo da satisfagao, a exigéncia do dptimo pela do meramente suficiente, daquilo que basta para se poder agit. Esta idela de “racionalidade limitade" assenta na constatagao de que o tempo 6 fimitado, 6 um bem escasso @ custoso na aquisi¢o e analise de informag&o completa no desenvolvimento de um plano de aptimizacéo. ‘Assim, nao $6 escolhemos um nivel de “ignordincia racionat” como também nos agregamos em grupos de divisdo de trabalho e partha de Informagao. A nossa natureza gregaria © a nossa complementaridade poderiam atribuir-se as necessidades criadas pela “racionalidade limitada". ‘© conhecimento, a informac&o de que a racionalidade se alimenta, lida com meios escassos como o tempo e a capacidade de assimilagao e concentragao. Aquele que & chamado a agir ter& de procurar “atalhos heuristicos” para esquematizer © padronizar os dados minimos daquela informag3o © da decisio que se Ihe siga, procurando reduzir os custos de deliberagao @ aumentar os ganhos provaveis daquela *antecipagao aproximativa’. ib) As opgies ditadas pela escassez Uma parte significative da vida comum é dominada pela escassez @ toda a escolha tem um custo, que consiste essencialmente no valor daquilo a que se renuncia para se obter aquilo por que se optou. 1) Effcléncia e prioridades: A escassez & igualmente condicionants de confitos de fundo, como o que se rogista entre a eficléncia (objective quantitative) e a justiga (objective qualitativo). * A prioridade dada a eficiéncia (afectagéio de recursos aos seus empregos com o maximo valor relativo) significa que o emprego de meios é avaliado em termos de maximizagao (capacidade de obter 0 maior rendimento possivel a partir de um determinado conjunto de meios) € essa priotidade implica orientagoes politicas diversas das que seriam ditadas pela primazia da justiga ® Aprioridade dada a justiga confere importancia a forma como o rendimento € repartido, & forma como a iguaidade é verificada nas comparagbes intersubjectivas de resultados distribuidos. independentemente da dimensao total daquele rendimento Cuje maximizagao é o alvo da eficiéncia. A incompatibilidade da prossecugao simulténea destes dois objectivos € um resultado da escassez dos recursos que podem ser afectados a cada um deles. Um uso eficiente de recursos 6 aquele que resulta na producao dos bens e servigos que mais apreciados so pelo maior numero de pessaas, devendo isto significar que o aumento quantitativo dos meios é um passo decisivo em direcgéo & optimizagao das finalidades. Por outro lado, a distribuicao justa de um resultado ineficiente pode ser injusta, por ndo satisfazer ninguém. A eficiéncia & a desejada consumagao de regras de jogo que foram aceltes por todos na integragéo social © cujo desenvolvimento livre 6 também uma forma de Justia (procedimental) capaz de legitimar como justos os resultados que dela dimanam. _Optimizar recurses é procurar fazer com que se possa retirar deles um maximo de satisfacao, ou seja, levar a respectiva explorago ao limite imposto pela escassez. No extremo oposto, @ Economia lembra as decisdes entre objectives que reputamos iqualmente indispénsaveis, forcadas pela escassez. Rita Mota e Pedro Galvao 3 Resumos de Microsconomis ©) As perguntas basicas da decisao economica Toda @ complexidade do processo econémico resulta da combinago e da sequéncia das respostas que so dadas a um conjunto limitado de questbes: 4. 0 que produzir, e quanto ( em que combinagées, e por quem, e onde)? * 0 crescimento da sofisticaedo no consumo leva & constante muliiplicagao de necessidades secundérias ou civlizacionais, que implicam inovagao (vai-se alargando © espaco de opgies © cada vez é mais patente a escassez dos moios face a multiplicagao das suas possibilidades de uso). * O progresso civilizacional faz com que 0 objective econémico minimo deixe de ser © da mera sobrevivéncia fisica para passat a sero de uma determinada qualidade de vida, convertendo em necessidades primérias ou vitals aquelas que comegaram por ser meras necessidades secundarias. «Numa economia de mercado, as respostas a estas perguntas so fomecidas pelo mecanismo dos pregos. Fora da economia de mercado, as respostas tém de ser dadas por um sucedaneo politico-juridico. *O mecanismo dos precos consegue a descoberta de uma relagdo “quantidade- -prego" que corresponda ao valor que os consumidores alribuem ao que buscam no mercado 8 ao custo que os produtores associam 2 disponibilzagso de bene e servgos no mercado. 2. Como produzir (e como optimizar © modo de produzir)? * Como o enriquecimento do produtor depende do incremento da sua eficiéncia, deve explorar meios alternatives para a produgéo dos mesmos bens, procurando entre eles o mais effciente. * As respostas a esias perguntas resultam de uma comparagéo de custos ¢ beneficios, que se dificulta quando as decisdes afectam varios produtores ou quando se reportam ao emprego de meios que possam ferir intsresses publicos. 3. Para quem produzir, e quando? +O mecanismo de pregos determina, numa economia de mercado, quem beneficia dos bens e servigos produzidos: beneficiaré mais aquele que tiver maior pocier de compra maior disposig&o de pagar. * Estas respostas ganham complexidade quando a sociedade se interroga sobre a validade dos critérios de legitimagao da desiquallade e da excluséi, sobre a justica da “preferéncia pelo presente’, do consumismo que levanta 0 problema da Sustentabilidade ambiental dos niveis presenies de produgao e consumo. = Esta questéo deve ter uma resposta condicionada por critérios de justica, seguranga 8 ordem publica. 4, Quem decide, @ por que processo? = Economia de mercado: todo o mundo e ninguém (todos contribuem para a formag&o de uma vontade colectiva mas ninguém tem esse poder individualmente. » Economia mista (concorre um secior privado e um sector pablico): o mecanismo do mercado é contrabalancado pelo poder de deliberagao do Estado, levantando-se ‘uma questao de legitimidade. * Economia dirigista (planificagao central; uma entidade Gnica arroga-se 0 poder exclusivo de fomecer as respostas a todas estas perguntas): & questo de legitimidade juntam-se outras como a da eficiéncia da direcgao © a da liberdade dos dirigidos. 5, Como confiar? + Economia mista ou dirigista: como assegurar que a actuagao do Estado n&o se pauta por interesses que conflituarao com os interesses individuais? Rita Mota e Pedro Galvao 4 Resumos de Microsconomia * Economia _de mercado: como ter a certeza de que os produtores © as organizag5es que alingem maior dimens&o n&o pervertem 0 poder de mercado sm detrimento do equilibrio do macanismo das trocas’? » Como podemos assegurar-nos de que, enquanto nos conoentramos na parte que nos cabe na divis&o de tarefas, aqueles de quem nos tomamos dependentes cumprem 8 parte deles? . = A estas questSes deve responder o Direito, na sua dimensdo de ordem juridica de base estadual e inlemacional ou na de principio de organizacao convencional entre partes contratantes, que auto-regulam a sua interdependéncie em termos de uniformidade, reciprocidade e confianga. Um mercado operando em condigSes de liberdade, com um nivel concorrencial suficiente, pode responder com eficiéncia aos 4 primeiros grupos de questées, visio ue os consumidores fazem reflectir as suas escalas de preferéncias nos pregos que propéem ou acsitam, © que os produtores respondem a essas solicitagies com uma izagdo da relagao quantidade-preco. a) Custo de oportunidade © prego relativo Uma escotha € racional na medida em que se centra numa comparagao subjectiva, mas desapaixonada, de custos © beneficios implicados nas varias alternativas abertas a op¢80 — utilidade ponderada: o resultado dessa ponderagao, Custo. de oportunidade: a mais valiosa das oportunidade que séo preteridas quando se faz uma escolha; abarca aquilo que deixa de ser possivel fazer-se e obter- se para que possa alcangar-se aquilo por que se optou. |, A bscassez e a irreversibiidade do tempo tornam crucial a ponderagao de benéticios e custos de oportunidade, para que qualquer decisao evunimice possa pautar-se por alguma medida de racionalidade. A dintensdo temporal ¢ decisiva para @ maior parte das valoragBes econémicas © 2 maior parie dos custos em que incorremos resulta basicamente da perda de tempo que o alcangar de qualquer resultado implica, ‘© custo de oportunidade 6 espelhado no prego relativo de dois bens, que & formado pelo mecanismo da oferta e da procura: Precod PRB ecoB [210 raciocinio marginalista A anélise da racionalidade econémica centra-se frequentemente, nao naquelas decisSes que transportam instantaneamente a pessoa de um ponto de insatisfago total para @ saciedade, mas naquelas pequenas decisées que provocam pequenos incrementos de salisfac&o dentro de um plano decisério que nao raro as transcende nos seus valores totais. ‘A maioria das decises de que a Economia se ocupa néo sao em rigor as de fazer ou deixar de fazer algo, mas as de fazer mais ou menos de algo, de intensificar ou reduzir 0 nimero de unidades empregues em apoio de uma determinada decisdo ou actividade, __N&o é racional apegarmo-nos ao custo histérico e imecuperavel de um bem ou servigo (sunk cosf) para com ele condicionar a conduta. Custo marginal: valor da mais valiosa alternativa preterida para se conseguir produzir ou obter mais uma unidade de um bem ou servigo. Rita Mota e Pedro Galvao 5 Resumos de Microsconomia Beneficio marginal: valor dessa unidade suplementar do bem ou servico por que se opiou. Raciocinar em termos marginals significa optarmos por: + Produzir ou adquirir mais de um bem ou servigo enquanto 0 beneficio de mais essa unidade exceder 0 correspondente custo de oporiunidade; * Produzir ou adquirir menos quando esse custo exceder 0 beneficio adicionat; * Nao produzir ou adquirir nem mais nem menos quando os dois valores coincidem, 4) 0 impacto dos incentives na conduta J E possivel condicionar a conduta de um agente econdmico sem the retirar 2 sua liberdade de escolher decidir, interferindo somente nos incentivos que so para ele 0 valor absoluto ou relative dos ganhos e perdas esperados ne sua propria deciséo, 08 pontos de referéncia das suas escolhas ¢ a sua motivagao para agir. ‘A quesizio dos incentives, se 6 relativamente simples no efeito que isolademente provoca numa conduta individual, € uma das mais complexas e dificeis facetas da modelagao da politica econémica, néo apenas porque supde que se conhega com um minimo de rigor @ reaceao dos individues @ alteragao dos incentivos, mas também porque um mesmo incentivo pode ter efeitos opostos quando estamos na presenca de destinatarios com diferentes padres de reacca0. A énfase nos incentivos & crucial para se compreender a viabilidade das solugdes econémicas em contextos de liberdade social ¢ politica. Esta énfase tem a sua contrapartide, que é o sacrificio dos valores igualitarios: uma economia que assente na livre,mecnica dos incentivos apela aquilo que diferencia as pessoas. Uma economia que insista numa medida de nivelamento igualitério em nome da justiga social tem de contar com uma perda de incentivos e com as fespectivas consequéncias (queda do nivel de actividade econémica e da capacidade de gerar riqueza). Nenhuma medida econémica de fundo pode alhear-se deste dilema sntre eficiéncia e justica, ou pode furtar-se ao prego imposio por qualquer solugo do dilema. i) © postulado da racionalidade Um dos pontos de partida da andlise econémica é o da presungao de que 2 acgio humana 6 dominada, mesmo se no exclusivamente, por principios de racionalidade, sendo possivel ao agente oscolher livre e conscientemente uma de enire varias altemativas de acgao, optando normalmente pela que: + Apresenta a mator probabilidade de resultados optimos, ao mesmo custo das demais alternativas; * Apresentando uma probabllidade de resultados optimos igual & das demais altemativas, tem um custo inferior ao destas. « Tenta-se racionalmente minimizar os custos ou maximizar os ganhos, ov ‘ambos simultaneamente: tenta-se o maior beneficio liquido, procurendo minimizar desperdicios na obtengo de quaisquer estados de satisfagao. ‘A racionalidade econémica identifica-se com o principio hedonistico, com 2 “lei do menor esforco”: aquele que, com o mesmo esforgo dos demais, tiver alcangado mais elevado nivel de satisfag3o teré maximizado 0 sucesso da sua actividade econémica, minimizando as suas necessidades com os melas momentaneamente disponiveis; aquele que, com menor esforco que os demais, alcangar o mesmo nivel de satisfagao deles, conservou recursos que ficam disponiveis para, de seguida, prolongar o nivel de satisfac&o alcangado. Rita Mota e Pedro Gaivao 6 Resumos de Microeconomia O que é caracteristico do conceito de eficiéncia econémica é a minimizagao de custos na produgso de riqueza, independentemente de quaisquer _outras consideragbes, smbora costume ser relevante a consideragao da_ eficiéncia tecnolégica, 2 que, por definiggo, no se evolui para uma eficiéncia econémica a partir de uma ineficiéncia tecnolégica. ‘© concelto de racionalidade concentra-se mais no plano dos melos do que no da adopgdo dos fins, sendo a apreciagSo que sobre ela incide valorativamente neutra. ‘© postulado da racionalidade & decisivo para que possa acalentar-se esperanga de edificagao de uma verdadeira ciéncia econémica, capaz de formular leis ‘empiricas com algum gray de generalidade © de rigor indutivo: se se admifir ao menos ‘que a racionalidade predomina no plano de resposta do agente econémico aos incentivos, a conduta dests tomar-se-a mais previsivel. Il) As limitagbes temporats e orcamentais A racionalidade do agente econémico manifesta-se e avalia-se dentro de um espago confinado; ai, a estratégia de optimizago da satisfagao de uma necessidade confiitua inevitavelmente com a actuagéo que 6 requerida para se alcangar @ satisfacdo das demais necessidades, pelo que das duas uma: > Ou se estabelece a inequivoca prioridade de uma necessidade ©, temporariamente, ela beneficia do exclusive do emprego de recursos, até que a sua Progressiva satisfagéo the faca perder a prioridade, = Ou, no caso contrério, os recursos disponiveis tém que ser seleccionados e combinados para que se consiga a satisiagao simultanea e proporcionada das varias necessidades concorrentss, sendo irracional que alguma delas seja preterida, mesmo que momentaneamente. Nesta segunda hipgtese,’a gestao de recursos tomaré transparente uma nogdo Ue rendimenios dewescentes ou de custos relatives orescentes, que balizara as decisdes concretas. Num contexto de simultaneidade e de concorréncia entre necessidades, a afectago de recursos ‘ende para uma posicao de equilibrio, que 6 @ posigzo de nivelamento dos custos relatives associados ao emprego desses recursos. Cada agente se defronta com um “canjunto de oportunidades”, um conjunto finito de opgies disponiveis. A dimensao e a composic&o do conjunto de oportunidades depende de limitagées temporais e orgamentais: quanto mais tempo @ recursos se pode reservar & busca € 4 edificag3o de uma solucao, maiores probabilidades havera de que ela seja optimizadora. Séo as manifestagbes mais restrtivas, mais sensiveis no plano individual, da escassez. [g) A vantagem das trocas A relagdo intersubjectiva que se estabelece entre os agentes econdmicos pressupde uma complementaridade de necessidades © uma contraposicso Objectiva de interesses. As nossas trocas no assentam num pressuposto concorrencial ou mutuamente predat6rio, por nfo haver outra forma de alcangar beneficios sendo tirando-os aos nossos parceiros — essa idela remete para a teoria do "jogo de soma zero", em que 0 que o vencedor ganha é precisamente © somatério daquilo que os demais jogadores perdem, situag0 em-que o valor total dos ganhos © valor folal das perdas se anulam reciprocamente. Se esta situaco predominasse na ‘economia, seria racional que cada um se isolasse e fugisse de se deixar explorar. ‘As trocas econémicas, sendo livres, s6 tém lugar se ambes as partes envolvidas puderem aperceber-se racionalmente da existéncia de vantagens reciprocas. Nas trocas econémicas, os interesses que se contrapbem so complementares, t8m valores desiguais para as partes envolvidas. Rita Mota e Pedro GalvBo 7 Resumos de Microsconomia As pessoas sentem-se frequentemente prejudicadas, insatisfeitas nas trocas; isto acontece porque 2 troca ¢ um compromisso e implica que cada parte transija rolativamente sua posigao inicial de ganho maximo: 0 facto de ambas as partes ganharem néo significa que ambas as partes ganhem o mesmo, sendo perfeitamente normal que, no ambito das trocas bilateralmente vantajosas, ocorram variagdes de pregos que ora beneficiam mais uma parte, ora beneficiam mais a outra A situagao de troca comresponde a de um “jogo de soma positiva’, no qual os beneficiados de uma das partes néo implicam necessariamente prejuizos da outra, tudo contribuindo para um resultado crescente, em.que o total das transacgdes vai fazendo aumentar a utilidade total (utilidade combinada de ambas as partes) 2 medida que as trocas se vao multiplicando. Cada familia consumiré tanto mais, quanto mais produzir. Mas produzir mais implica basicamente libertar-se das aciividades em que € menos produtiva pare se concentrar naquelas em que o 6 mais —> especializar-se e intensificar as trocas. 0 isolamento ¢ a autarcia sao atitudes irracionais, porque fazem perder oportunidades de ganhos reciprocos. Sé assim no suceder4, em termos estritamente econémices, numa situagdolimite em que j& nada resiasse para trocar. Esta sera tanto mais possivel quanto menos pessoas estiverem envolvidas nas frocas. ‘Adam Smith: se todos ganham com as trocas, ¢ se as trocas sao veiculo de enriquecimento generalizado, as oportunidades de riqueza serio tanto maiores quanto maior for a dimensao dos mercados, e a subsisiéncia ¢ preservacéo do mercado é a premissa essencial para o enriquecimento generalizado. h) A afectagSo social de recursos através do mecanismo dos pregos A resposta as perguntas basigas dd decisao econémica pode ser confiada ao poder politico (entrega-se a uma racionalidade central o poder de planificar ¢ dirigir a actividade econdmica) ou abandonada as forgas do mercado e ao poder de maximizagdo de ganhos reciprocos através das trocas. Numa economia de mercado, a actividade econémica 6 condicionada essenciaimente pelas forcas que animam as trocas (sendo o mercado, na sua acepeao mais ampla, a ocasiéo dessas trocas), predominando a liberdade de conformagao de direitos © deveres conexos com os interesses em jogo, por recurso &s formas contraiuais comuns. As grandes decisées de que depende a eficiéncia e a justiga do resultado ultimo @ total do funcionamento da economia de mercado nao sao confiadas 3 ninguém, presumindo-se que elas resultarao de uma ordem espontanea, centrada no mecanismo dos pregos, um processo de sinalizagao através do qual as partes comunicam: = Assua disponibilidade para trocar, * Asua adesdo a valores geralmente aceites como base de negociagao; =O respeiio que os compradores 18m pelo custo expresso na avaliagao do vendedor; + Assensibllidade que os vendedores tem &s necessidades expressas ne avaliagao do consumider, » Aconfianga que as partes depositam no meio de pagamento comum. Toda a iniciativa politica que interfira no mecanismo dos pregos pode gerat, quase instantaneamente, um risco de grave instabilidade na actividade econdmica. i) Mercado de produtos e mercado de factores Existem dois tipos distintos de mercado numa “economia de mercado”: Rita Mota e Pedro Galvo 8 Resumos de Microeconomia * Mercado de produtos: bens e servigas (produios finais da actividade econémica organizada); “outputs” directamente empreques na salisfagao de necessidades. — Mercado final + Mercado de factores protiutivs: bens e servigos apreciados @ ‘empregues no ponto inicial de um ciclo de actividade econémica, consistindo especificamente nos “inputs” de terra (factores naturais ¢ matérias-primas), {rabalho e capital que as empresas coordenam e optimizam, recorrendo a um Grau qualquer de solisticagSo tecnolégica, tendo om vista a obtengao dos meios que directamente satisfagam necessidades dos utentes e consumidares —+ Mercado instrumental. Entre os dois fipos de mercados geram-se nexos que podem ser configurados como um fluxo circular de produtos © de factores © um contrafluxo de pagamentos, entre consumidores e produtores: + Mereado dos produtos: os individuos ou as familias so os consumidores (pagam pelo que adquirem) os produtores ou empresas S40 0S fomecedores (recehem os pagamentos monetarios daquito que fornecern). AS famfias concentram aqui as suas despesas © as empresas oblém o seu rendimento. © Mercado de factores produtivos: os individuos ¢ as familias s80 0s formecadores de trabalho, factores naturais € capitais (recebem a remuneragao correspondente aos factores produtivos que colocam no mercado) © as empresas ocupam o lugar de utentes (pagam as remunerages). Aqui, as familias obtém 0 seu rendimento e as empresas conentram as suas despesas. Os fundos aforrados perturbam a simetria do fluxo circular, sendo canalizados para 0 investimento em empresas e regressdndo &s maos de familias sob forma de crédito ao consumo. As familias so fomecedoras de factores de produgio e consumidoras de bens 2 servigos; as empresas so produtoras de bens e servigos e utentes de factores de produgdo. O que umas ganham é o que as outras gastam, pelo que o rendimento total & equivalente & despesa total. [iA intervengao do Estado nos mercados: 0 funcionamento do mercado vem acompanhado de ineficiéncias e injusticas, a detecgao das quais poderd justiicar a intervengac do Estado para emender as falhas de mercado (todo o tipo de pardas de eficiéncia resultantes do funcionamento esponténeo do mercado) Esta actuacdo pode exprimir-se com uma amplitude muito variada, que se prende também com a génese histérica do Estadio modemo. ___A afrmagao do Estado por sobre formas inorgénicas ¢ tradicionais de actividade econémica, mas alicercada nos automatismos e nes virualidades mecanicas do mercado, teve sucessos muito desiguais em diversas épocas, paises, regides e sectores produtives. A intervengao estadual no funcionamento des mereados pode assentar em qualquer de 3 razbes gerais: = A pura e simples ignorancia das lets econémicas, o desconhecimento dos requisitos ¢ implicagdes da atitude intervencionista; * Oimperativo de eficiéncta, * — O imperativo de justica. Rita Mota e Pedro Galvao 9 Resumos de Microeconomia i) A justiga social A principal razéo justificativa de uma intervengao publica nos mercados deriva de consideragdes de justiga social. O rendimento atribuido aos participantes no “jogo da economia® deveria em principio ser proporcional ao esforgo e habilidade por eles ~aplicados na produgao de bens e servicos para as quals existisse procura no mercado. No 6 Obvio que o mercado atenda as circunstincias episédicas que fomam menos gil © pronta a resposta dos produtores e dos trabalhadores as mudangas de solicttagSes do consumo. © Estado nao deve demitir-se de balizar, a0 menos nos seus limites minimos, 0 resultedo da livre manifestagao de incentives @ actividade econémica, evitando que a regra da coexisténcia e de complementaridade em que o mercado se basaia, por sua vez destrua os seus proprios alicerces. Nao existe verdadeira liberdade econdmica sendo dentro de um determinado quadro normativo e organizativo, um quadro que assegure justia e seguranca nas trocas, promovendo ainda, sempre que o mercado falhe, a eficiéneia do circuito econdmico. ii) As fathas de mercado As intervengdes do Estado nos mercados que sejam ditadas por propésitos de eficiéncia costumam ser justiicadas pata alegada existéncia de “falhas de mercado’, a8 quais s30 atribuidas a 2 causas principais: - Externalidades: possibilidade de que uma actuagSo econémica faga projectar irremediavelmente efeitos, benéficos ou maléficos, sobre alguém que ndo 0 proprio agente, interferindo no nivel de bem-estar desse alguém, sem que Ihe seja paga qualquer indemnizago ou sem ter de pagar qualquer compensdgdo. Neste caso, a intervencao do Estado justificar-se-4 para colmatar a brecha criada entre a eficiéncia ‘econémica € 0 bem-estar colectivo (refrear o nivel de actividade; incentivar aquele que no dispbe de meios para reclamar desses tefceiros a contrapartida dos beneficios que Ihes causa). Se nao houvesse extemalidades, a intensidade da procura no mercado denotaria o beneficio social marginal, a intensidade da oferta denotaria o custo social marginal e o ponto de convergéncia de procura e oferta no mercado indicaria c ponto de maximizagao de bem-estar social. A presenga de extemalidades perturba 2 coincidéncia entre effoiéncia de mercado © bem-sstar social. ~ Poder de Mercado: permite a alguém a axploragao do mecanismo dos precos em proveito proprio, para i de um limite que fira um sentido minimo de justiga ou que gere desincentivos a produg&o e as trocas. A actuagéio de Estado justificar-se-4 na estrita medida em que seja alcangével o esvaziamento desse poder, evitando situagbes abusivas, a exploracio de vantagens ou desequilibrios extremos que comprometam a capacidade de o funcionamento normal do mercado assegurar a Justica e 2 eficiéncia da actividade total que nele decorrs. Em ambos 0s casos, o Estado pode: ; * — Produzir directamente bens, servigos ou conteidos informativos que se entenda serem subproduzides pelo mercado, ou adquirir esses bens, servicos ou informago a produtores privades; + Griar incentives e desincentivos a produtores privados; + Impor certos padrBes e condutas ao sector privado. Mecanismos de combate as fathas de mercado: * — Controlo e regulacao directa das quantidades produzidas: + Intervencéio no mercado no sentido de alteragao dos pregos; Rila Mota e Pedro Galvao 10 Resumos de Microeconomia © “Criagdo de mercado’, com definigaio de direlios de apropriagSo, quotas negosiaveis, sistemas de compensagdo de beneficios e sacrificios parliculares; «= Aumento da informagao disponivel. Estes mecanismos traduzem-se em medidas concretas: + Bliminagao de ‘subsidios perversos" que fomentam actividades geradoras de externalidades negativas. + Adopeéio de medidas “internalizadoras” a = Reforgo da regulagao juridica do acesso a recursos comuns e da parlicipagao pliblica na definigso das politicas ambientais. * Ponderagao custo-beneficio de efeitos de longo prazo ; . ‘Substituig0 da regulacao administrativa direcia & discricionéria mais exposta @ distorgdes © captura por parte dos seus destinatarios pelo estabelecimento de incentivos de mercado, mais fixos e automaticos. © Formagio de coligagées intemacionais para coordenagao de esforgos e melhoria do acesso a fontes de financiamento. iii) As falhas de intervengao ‘Qualquer intervenco do Estado na economia tem uma jegitimagao controversa. Motivo basico das “fathas de intervengdo”: nao sendo o Estado administrado por pessoas infalivels e invariavelmente justas ou por pessoas omnipotentes ‘omniscientes, toda a intervengSo é inevitavelmente contaminada por informag&o impertefta, por unilateralidade e confinamento de avaliagdes, por deficiéncias de planeamento ¢ de execugo, por quebras de comunicagao, por ocultagao deliberada Promovida pelos visados, por falta de vigiléncia ou de responsabilizagao dos executantes das medidas aprovadas, pelo jogo da corrupgao, do, compddrio, do nepotismo, do caciquismo. A actividade econémica colectiva é dos fendmenos sociais mais complexes, ¢ legitimamente sempre se colocaré em divida se possivel por-se em pratica uma planificag&o tao sofisticada que abarque e interaja eficientemente com essa complexidade, ou se hd um sucedfneo razoavel para os incentivos que © mercado transmite a todos os participantes. Existem critérios de legalidade, de imparcialidade e ds transparéncie na actuagao dos entes publicos que prejudicam a sua lidade na tomada de decisSes, 6 fornam muito onerosa, em termos de cusios administrativos, a sua aciividade. Além disso, existe um grave problema de incentivos no sector piblico, ja que nele as decisties sto tomadas por funciondrios que n&o so incentivados @ adoptarem a diligéncia que teriam se dela estivessem dependentes os seus interesses pessoais. A relacdo de forcas entre o Estado @ o mercado tende a desfavorecer sistematicamente o primeiro. Nao € muito evidente que a intervengSo colectiva do Estado seja globalmente eficiente, em termos de se poder afirmar que as “falhas de inlervengao” nunca excedem as “falhas de mercado” e que, portanto, na presence de uma “falha", a solugao piiblica é sempre o remédio adequado. Deve-se isto & incapacidade de interagit com o dinamismo do mercado, A falta de pressdo competitiva, & falta de informagao detaihada e a tantas outras complicagées previsiveis ¢ impravisiveis. Uma parte das “falhas de intervengéio” pode ser minimizada através do recurso a instruments muito sofisticados, seja na recolha e processamento de informagSes, seja na sua afericao empirica e reformulacéo permanente, seja na sua sujeigdo explicita 2 procedimentos iterativos de optimizago que se apresentam como alternative ao funcionamento do mercado. Se, apesar disso, o problema das “falhas de intervenga0" subsiste, isso deve-se também’A subsisténcla de formas de “idealismo metodoligico” que tendem a inculcar nos espiritos a nogSo de que ha uma ‘via triunfante” para a optimizago econémica por via politica, em vez de tomarem claro Rita Mota e Pedro Gavia Resumos de Microsconomia que nao € possivel passar-se além de uma escotha de graus de “falha de mercado” de “falha de intervencao”. kj 0 tema da Macrosconomla J A Microeconomia concentra-se no funcionamento do mercado de produtos ¢ no mercado de factores produtives. A Macroeconomia incide na conduta do todo da Economia, ial como esse todo se espelha em valores médios e em valores agregados, @ tal como ele se revela, seja em fenémenos que alegadamente transcendem o horizonte de eficdcia de agentes econdmicos individuais, seja nas correspondentes. Patologias. Concentra-se no estudo de questies que se prendem com as inter- dependéncias de_um valor méaio, o dos pregos, com alguns valores totals, os da produgéo, do rendimento e do emprego. ‘A Microeconomia encara os fenémenos econémicos a partir da base, procedendo analiticamente, enguanto que a Macroeconomia encara os mesmos fendmenosjé na sua manifestagdo combinada © final, eles fornecende @ perspective sintética, ‘A Macroeconomia lida com valores agregados: oferta agregada e procura agregada. © progresso da Macroeconomia foi permitind um crescente sucesso na aplicacao de medidas estabiizadoras, ¢ por isso é possivel sustentar que gracas a ela @ economia se tem aproximado de uma situagao de pleno emprego, na qual se julga ser finalmente viével a verificagao das. condigbes da ‘sintese neociéssica” na Microeconomia, © aumento de rigor analitico que se espelha na confluéncia entre Microeconomia ¢ Macroeconomia confere a ambas maior respeitabilidade cientifica & esta presarva, intocada, a sua muito evidente proeminéncia cacial e politica. 1) A Produtividade Produtividade: quantidade de bens e servicos que cada trabathador € capaz de produzir, em média numa unidade de tempo (0 “output” por hora). Numa comparagao instanténea, sero mais présperos os paises e regides onde é mais elevada a produtividade do trabalho. Numa comparagao digcrénica, os aumentos de prosperidade, para no serem unicamente aparentes ou especulativos, resultarao essencialmente da intensificago da produtividade, alcangad através do progresso tecnolégico. Hoje € crescentemente aceite que a forma ideal de gerar riqueza a nivel nacional, de assegurar o crescimento da prosperidade de modo favordvel na comparayao internacional e de modo sustentavel a nivel interno, deve colocar 6 énfase na garantia de condigées estruturais de produtividade, na afectagao de recursos ao investimenio em capital humano e fisico que assegurem ndo apenas que © crescimento acorreré mas também que se mantém de reserva o potencial de crescimento futuro. A actuagdo estadual, sendo tradicionalmente mullo absorvente de recursos, desvia para ela melos de financiamento que de outro mode estariam disponiveis para © investimento directo em capital humano e fisico. Isto pode determinar quebras de produtividade, e portanto um abrandamento do progresso, ou mesmo um retrocesso, no caminho para a prosperidade. ‘A opga0 pelo investimento em tecnologia, em delrimento de finalidades allernativas, revela 0 quanto o incremento de produtividade reclama um esforgo incessante, mas fragil e de resultados incertos, de lula contra o bem escasso que 6 0 tempo. Rita Mota e Pedro Galvao 12 Resumos de Microaconomia “Path dependence”: feito de irreversibilidade que frequentomenie acompanha as triunfos tecnologicos, que faz com que a tecnologia triunfante tenda a arrebatar a totalidade do mercado, convertendo-se em “standard” e expulsando as tecnologias rivais. © progresso tecnolégico transporta consigo um risco estrutural. i) A fronteira de possibilidades de produgao A escassez dé recursos pode ser associada a imagem de um universo finito, limitado por uma fronieira que agrega as possibllidades extremas das opgdes, uma fronteira de possibilidades de producao. Esta pretende _representar simplificadamente as varias combinagGes de produgo de dois bens ou servicos que sdo aleangéveis pela aplicacao maxima e Optima dos correspondentes factores de produgao. ‘A fronteira de possibilidades de produgao é a sxpresséo do continuo de combinagées de varios bens ou servigos que esto ao alcance do pradutor através de simples reafectagZo de recursos disponiveis. E um limite maximo que pressupde @ afectagao total dos recursos, querendo isso significar que em toda a opgao produtiva por ola representada @ maximizada a eficiéncia produtiva, verificando-se uma situagéio em que nao é possivel produzir mais de um bem sem produzir menos de oulros bens para os quals seja possivel reafectar em altemativa 0s recursos disponiveis. Nessa fronteira de possibiidades de produgSo, a percepgao das vantagens maximas de uma determinada opgo 6 imediatamente acompanhada da medida total dos correspondentes custos de oportunidade, o que faoiita a intuigao de que a gestao de recursos e a busca de solugdes sao ambos dominados por um mecanismo equilibrador. ‘Se na fronteira de possibilidades de produgao se entende ser atingivel a eficiencia, esta consistira essencialmente na insusceptibllidade de aumentar © rendimento total através de simples transferéncias de recursos enire sectores: a eficiéncia tolal estaré maximizada quando todas as transferéncias entre sectores ja se deram e equilibraram, A fronteira de possibilidades de produgao néo é um dado estético nem um limite absoluio; 6 certo que ndo podera ser alterada de modo abrupto ou ilimitado, mas. nao 6 menos certo que ela 6, em larga medida, susceptivel de expansdo e retracgao (capacidades inatas, formagao, incrementos tecnoiégicos, etc.). E possivel um crescimento em termos absolutos, isto é, uma expansdo da fronteira do possibilidades de produgao que permita solugbes eficienies com crescente susceptibilidade de nos aproximarem do limite da abundancia geral. A opeao pela poupanga e pelo investimento revelou-se mais produtiva, no sentido de fer aumentado a capacidads total e absoluta de consumo ¢ de produgao no futuro. — *Faldcia da composigao” (o que & valido para um pode no ser valido para todos): 2 poupanga que é benéfica para um ou para alguns pode tomar-se contraproducente se praticada por todos, ou para ld de certos limites. . Com a prevaléncia da racionalidade, a liberdade de opgéo pela afectagao 6ptima de recursos no limite da eficiéncia, sobre a fronteira de possibilidades de produggo, e a liberdade de apropriagio dos recursos maximizadores © dos Tespectivos frutos 6 um dos principais incentivos da actividade econémica. Estas liberdades e 2 legitimacéo dos modos de apropriacao privada com elas conexas, S80 as razbes do sucesso histérico do sistema econdmico capitalista. T) 0 controle dos meios de pagamento Outro des riscos da intervengao estadual relaciona-se com o fenémeno inflacionista, com a possibilidade de subida provocada do nivel geral de pregos. Rila Mota e Pedro Galvao 13 Resumos de Microeconomie _.__ Aimaior parte dos fenémenos inflacionistas mais pronunciados © persistentes tém como causa préxima o aumento da quantidade de moeda em circulag&io que Conduz @ desvalorizag&o da moeda, afectando a sue funcao de padréo gerat de vaior dos bens, dos servigos € dos factores produtivos, © perturbando-Ine © papel de intermediario geral nas trocas. Nao h4 aumento de massa moneléria onde 0 Estado ou as autoridades monetarias 2 no provoquem ou consintam e no ocorreré inflagdo nem pressac inflacionista so a massa monetaria no crescer mais rapidamente do que o volume das ‘rocas, disponibilizando mais unidades monetarias por cada transaccao. Pode admitir-se que 2 prioridade de outros fins da actuagao do estado © das autoridades monetérias determine e justifique a intensificago da emissio de moeda em terms inflacionistas. Podera pér-se em dovida que seja necessério que o Estado ou as autoridades monetarias joguem no curto prazo com essa tensa de objectives, dedicando-se 2 poderosos mas delicados exercicios de sintonia entre eles. n) Vinte idelas a reter J 4. Os recursos produtivos so escassos. 2. As decisbes concretas raclamam a ponderagao de custos e beneficios adicionais resultantes de cada uma das alternativas. 3. Ha diversos métodos de afectagao de bens e services. 4. As pessoas respondem de um modo previsivel a incentivos, tanto positivos como negativos, 5. 86 existem trocas voluntarias quando as partes tém esperanga de ganhos. 6. A produgao ¢ o consumo crescem com a especializagao dos agentes econémicos. 7. Ainterangio de compradores e vendedores constitii as mercadas. ‘8. Os precos sinalizam e incentivam os agentes num mercado. 9. A concorréncia entre vendedores baixa custos € pragos € beneficia em Uiltima insténcia os compradores. 10. Os mercados geram um enquadramento institucional que visa apoiar os ‘agentes econémicos na realizagao dos seus fins. 14. A moeda fatilita as trocas, os empréstimcs, a poupanga, 0 investimento, as comparagées de valores. 12. As taxas de juro, ajustades @ inflagdo, variam para adequarem os niveis de poupanga aos niveis de empréstimo, determinando assim a afeciagao de recursos escassos entre os seus usos presente e futuro. 13. O rendimento das pessoas & maioritariamente fixado em funcao do valor dos recursos produtivos que fornecem ao mercado. 14, Os empresarios sao aqueles que, incentivados pela contrapartida do fucro, ‘assumem as incertezas da organizacao produtiva dos recursos. 15. 0 investimento em capital fisico e em “capital-humano” tem a virtualidade de inctementar o nivel de vida futuro. 46. Hé lugar, numa economia de mercado, a intervengao do Estado, desde que ela se justifique em termos de eficiéncia. . 17. A intervengde do Estado pode implicar custos que excedem os beneficios, ‘dados os incentivos nao esiritamente econémicos por que se pauta a accao politica. 48. O nivel nacional de rendimento, emprego e pregos & resultado da interaccao das decisdes de produzir e consumir do conjunto de todos os agentes econémicos nactonais. 19. O desemprego e a inflagao tém efeitos nocivos muito extensos no bem-estar colectivo, ao menos na injustiga da redistribuigZo e na perturbagao das expectativas. 20. O nivel de emprego, de produgao e de pregos podem ser influenciados pelos ‘governos e pelos bancos centrais através de politicas orgamentais e monetarias. Rita Mota e Pedro Galvao 4 Resumos de Microeconomia CAPITULO 2 O modo de:pensar do sconomista Uma das primeiras percepgies que 0 ndo-especialista tem sobre a ciéncia economica respeita a linguagem privativa que esta emprega. O objectivo principal dos tecnicismos 6 o de servirem de abreviaturas para conceifos e cadeias de raciocinios que s&o complexos e que, nao sendo intuitivos, reclamam uma aprendizagem ralativamente extensa ¢ dificil Para nos atermos 6 a0 formalismo, ele é necessariamente mais simplificador, mais empobrecedor na Economia do que em outras ciéncias que a ele recorrem, jé que as abstracgdes podem ser fatais @ adequada compreensao do objecto da Economia. ‘Alé meados do séc. XX, a Economia foi sobretudo uma ciéncia social; sobretudo a partir da década de 40 que @ ciéncia econémica se entrega ao formalismo, se concentra obsessivamente em modelos quantitativos de condutas rigidamente optimizadoras € quantificadoras, postulando um crescente mecanicismo reactivo que paulatinamente foi erigindo um homo oeconomicus que, mais do que ser racional ¢ egoista que se dizia ter sido 0 protétipo da Escola Classica de A. Smith ede David Ricardo, era agora um “cyborg” hiper-racional, capaz de competir, como processador de informagao @ decisorestratégic, com as male sofetisdas esiruturas institucionais. a) A explicagao e a compreenséo no ambito de uma ciéncia social Como eiéncia social, esté confiade & Economia um esforgo adicional, 0 de compatibllizar os intuitos de objectividade com a inevitabilidade do envolvimento do observador, do “sientista, nos mesmos fenémenos socials que se esforca por analisar © descrever, com a inevitabilidade de envolvimento nos fenémenos humanos e sociais pelo prisma da vivéncia directa, com a inevitabilidade da referéncie a esses fenémenos através da linguagem empenhada e intuitiva do testemunho pessoal. A objectividade, o distanciamento, apontam para o paradigma cientifico da explicagao; 0 envolvimento do observador nas ciéncias sociais e humanas privilegia antes 0 paradigma da compreensio. A dialéctica enire teoria e observacao esta no proprio cere da atitude cientifica. E perfeitamente possivel estender-se 0 ambito da ciénoia econémica até & observagd e apreciagao pragmatica de condutas n&o-humanas. Esse estudo que dispensa a racionalidade consciente, a racionalidade da deliberagao intencional, peculiar da nossa espécie, pode ser util na explicagSo de condutas limitadamente. racionais por parte dos agentes humanas, naqueles contextos em que a aquisi¢ao de informagso completa e a adequacao racional a toda a informagao disponivel sao desproporcionadamente custosas face aos beneficios marginalmente atingiveis através delas, justificande racionalmente condutas presidkias pela Ignorancia © peta racionalidade limitada, ou pela itracionalidade. b} Observacao e experimentagao A complexidade, se cria graves dificuldades ao método cientifico, entravando- “the © esforco sintético, 6 em contrapartida 0 propria motor de toda a actividade econémica, que nenhuma sintese cientifica pode ignorar ou desprezar sem perda de contetido. Por isso, frequentemente, a metodologia econémica langaré mao do Sucedaneo estatistico, ou seja, de uma forma de descraver os fenomenos de massa Rita Mota e Pedro Galvéo 15 Resumos de Microeconomia nas suas simples regularidades tenoménicas ou extsmas, prescindindo de atribuigses OU pressuposigGes causais, limitando-se abertamente a evidenciar requiaridades e tendéncias, sem se envoiver nas dificuldades © riscos de explicagies internas de motivagbes e deliberacées conscientes. Isto visa facilitar 0 seu contributo para o raciocinic indutivo, ou seja, para a formacso de principios sintéticos e coesos a partir da pura observagao de fenémenos empiricos. ‘Ao economista & habitualmente vedado a experimentagdo em contextos reais, nBo simulados. Toda a reprodug3o experimental, se é uma experimentacdo convolada, envolve um artificio, ¢ esse ariificio tende a comprometer itremediavelmente a motivagdo dos agentes econémicos, dado que estes possuem 2 capacidade de reagir & alteragao deliberada das condigées iniciais da sua conduta, adulterando a espontansidade, a naturalidade das condutas. Resta ao economista, na maior parte dos casos, remeter-se a simples receptor Passivo de dados, especificamente os dados histéricos (fomecem uma inforrnagao completa acerca de um ciclo integral de acc&o econémica no qual todas as deliberagées terdo chegado aos seus uitimos desfechos, ¢ incidem sobre facios que a disténcia imunizou contra o ascendente das paixées) ¢ os dados estatisticos (reportam-se a dados presentes, insusceptiveis de abordagem desapaixonada, mas em contrapartida dados referides a circunsténcias nas quais é de esperar que @ informagao obtida possa ainda alicercar decisSes relevantes). isto néo significa, todavia, que nao haja algum lugar para a experimentagao. ¢) 0 apoio da Estatistica Estatistica: Meio de apoio & ciéncia, ajudando a recolha de dados, & detecgo de regularidades e afinidades em fenémenos de massa, a manutengao de padres de uniformidade e de rigor na elaboracao dos dados, no estabelecimento de correspondéncias relevantes com a realidade e na extrapolacéo de regularidades para 1a dos dominios do observavel. Na Economia, a dupla circunsifncia de abundarem fenémenos de massa e de muitos desses fenémenos serem facilmente quantificaveis faciita mutto a colaborago entre Economia ¢ Estatistica, ao mesmo tempo que, para alguns, reforga a conviccao de que 2 Economia deve submeter-se ao mesmo tipo de paradigma formal e matematico que domina a metodologia Estetistica. A Estatistica permite a apresentagSo de grandes quantidades de dados sob forma compacta de quadros, mapas e gréficos, que, propiciando uma intuig&o répida de fenomenos de massa, tem uma eficdcia inigualada por qualquer sucedaneo expositivo, mas também aumenta grandemente os risoos de erro na interpretagdo © de manipulago dos resultados. A. Esiatistica ("Aritmética Politica) nasceu para tornecer sinteses panoramicas relativas a grandes quantidades de dados, que pudessem transmitir conhecimentos, a0 menos quantitativos, sobre fenémenos que pela sua natureza & dimensao escapassem 2 possibifidade de experiéncia directa, e menos ainda de intuigdo, aqueles que devessem decidir com base no conhecimento desses fenomenos. © conhecimento fomecido pela Estatistica € aproximativo: refere tendéncias e caracteristicas gerais. a) Causalidade € correiagao A reconstrugéo do mecanismo de causalidade implica que se admita ao menos duas variévels, o que basta para que surjam complicagdes. E por isso que @ cléncia econémica recorre & Estatistica, vocacionada como esta esta para 2 analise © Rila Mota e Pedro Galvao 16 Resumos de Microeconomia descrigao do comporiamenio de fendmenos de massa independentemente de quaisquer atribuigdes causais: + Que duas varidvels fendam a comportar-se de um modo similar, com amplitudes proporcionais, é facto que pods ser estabelecido com um grau_ muito apreciado de seguranga e medido com rigor; as excepges nao perturbam a verificagao de uma tendéncia dominante; + Que essas varidveis sejam causa uma da outra, sejam produtos de uma causa comum, ou se manifestem conjuntamente por mero acaso, ou por efeito de uma causa indetectével ou incompreensivel, tudo isso irrelevante para. possibilidade de ‘estabelecimento de uma corretacdo entre amas. O primeiro passo que os economistas dao na direcodo de uma descoberta te6rica costuma resultar da percapgo de que existe uma qualquer afinidade recorente entre varidvels, 0 que conduz & interrogagae sobre a existéncia de uma razSo subjacente. O estudo de correlagées é a aplicagao de testes eslatisticos aos dados (testes econométricos), multiplicando as observagées por forma a que possa determinar-se se existe um padrao de relacionamento entre variaveis que possa atribuir-se a algo mais do que a um nexo errético ou aleatério. Pode causar estranheza que a ciéncia se demita de prosseguir na senda da descoberta de verdades fundamenteis e de certezas indutivas. Na realidade, esse 6 0 prego 8 pagar pela necessidade de agir com eficiénoia num mundo em que @ omnisciéncia nda 6 gratuita e toda a aquisicSo de informagao tem um custo. H&-3 tipos de certezas que nos s&o acessiveis a baixo custo: certezas analiticas ou dedutivas, certezas intencionais quanto & causalidade das deliberagbes livres © certezas historicas relativas & consumagao de processes causais, derivadas da irreversibiiidade do tempo. ‘No dominio da aquisigao indutiva ou sintética de conhecimentos, tais certezas n&o so passiveis, pois para isso terfamos que aguardar a constimagao dos tempos. & eniretanto ter-nos-lamos privado de agir com base num grau de certeza. Anecessidade prioritaria para os seres vivos 6 agir. A Unica forma de agit é a de procedermos como se dispuséssemos ja da certeza, é a de substituirmos o limite a certeza por um grau aceitavel de probabilidade e de corroboragéo. [e) 0 papel da teoria | Nao hé ligacao da teoria a pratica que nao envolva uma margem de risco ou de oportunidad, uma margem de criagao de teorias e de formulag&e de hipoteses na qual se insinua o talento individual, a formacéo e as convicgdes do proprio clentista- -economista. A rentincia & descoberta de verdades fundamentais é um titulo de gloria a ciéncia, sendo a melhor prova da sua sofisticago filoséfica, da sua emancipagao e da sua inesgotavel energie. Teoria: representaco simpilficada da realidade assente no encadeamenio de pressuposigdes e de corolérios logicos dessas pressuposigées © geralmente formulada como um condicional hipotético (se... ento). A sua aplicagao pela ciéncia justifica-se essencialmente no plano da simplificago das pressuposigdes analiticas. ‘A teoria 6 uma imposieo de sentido, da qual procuramas retirar consequéncias préticas, E ela que confere atractivo e relevancia pralica a esta e a qualquer ciéncia. f) Descriggo @ prescrigao nas proposicbes da Economia Coexistem, no seio da Economia, 2 tipos distintos dé proposigées: * As que descrevem o mundo como ele é ou tentam detectar nele uma ordem latente, podendo ser refutadas por contraprovas factuais + descrig&o; Rita Mota e Pedro Galvao W7 Resumos de Microeconomia * As que visam a transformagao do mundo, a formagSe de uma ordem positiva, podendo apenas ser contraditadas através de uma demonstragao da inadequagao técnica dos meios propostos, ou contestadas por quem adopte um quadro de valores diverso do proposto — prescrigao O economist, na sua veste de "cienlista social’, nao se encontra habilitado a ditar soiugées politicas 4 sociedade, mas 0 poder carismatico da ciéncia econémica confers a0 economista uma voz autorizada na formagaio da representagSo cultural que uma sociedade forma de si mesma. A distancia entre descrigado e prescrig¢do pode ser encurtada pela autoridade que a sociedade reconhega a voz dos economistas. A nossa liberdade postula uma demarcagao entre assergies descritivas © prescritivas: 0 mundo como é nao tolhe, nem deve tolher, o nosso desejo de o rectificarmos, de © melhorarmos de acordo com valores que representamos naquilo que ele néo é mas poderia ser e seria bom que fosse. A objectividade do cientista social no tolne a sua participago no devir histérico, nao © indisponibiliza para @ manifestagao da sua vontade transformadora. E através da Economia que recebemos as mais sombrias € preocupantes informagées acerca da condigao material da humanidade, mas também é na sua aplicagao que se depositam as mais genuinas e vibrantes esperangas de remédio social e de progresso real. [g) Abstraccao e modelacao ] Na medida em que a representagao simplificada da realidade envolve escolhas, pode dizer-se que todo 0 aparato ledrico da andlise econémica assenta numa arte, em regras de selecgdo ¢ edificago de aparatos tedricos que nem sempre esto perieitamente explicitas ou s8o generalizadamente adoptadas, ¢ que Sobretudo nao derivam, por deducdo estrita. de um ndcieo axiométtico de “evidéncias universais”. A.escolha de varidveis, a sua manipulacao, a propria discriminagao entre aquilo que conta como dado e aquilo que se admite como varidvel, constituem facetas da arte de modelacao. Modelo econémico: conjunto de proposigées sobre comportamentos econémicos @ suas relaghes, de acordo com hipéteses causais que podem conferir relevancla genérica a esse conjunto de proposiges como principios explicatives ou predifivos de um universo de situagdes subsumiveis aos tagos bésicas da caracterizagao daqueles comportamentos. Debate-se com 2 interesses conflituantes: 0 do realismo ¢ o da simplificagao. Compreende-se 0 quao subtil e falivet € 2 arte da modelag3o. se considerarmos a verdade da asserpa0 segundo a qual 0 melhor modelo @ aquele que conseguir ser ao mesmo tempo mais realista & ‘mais irrealista, ao mesmo tempo o mais informativo ¢ 0 mais esquemaitico A forma mais rudimentar de modelag&o econémica € aquela que, para efeltos de anélise ¢ de cdlculo de uma variavel, procura isoléta representando o resto da tealidade de referéncia como se ele fosse composto exclusivamente por dados constantes, E de enorme importéncia esse pequeno “deslizamento” ficcional que consiste em imaginar-se que, no complexo mundo da realidade economica, ¢ possivel que um fenémeno produza os seus efeitos isoladamente, mantendo-se constante tudo o resto - “ceteris paribus”. Mais crucial se toma este esforgo de simpitficagao se lembrarmos que a ciéncia econémica @, uma vez por outra, chamada a conceber mercados que serao criados efectivamente. Ideias como as da “ronteira de possibitidades de produgao" e do “fluxo circular” de riqueza, s40 j4 modelos simplificadores, envolvendo opgbes de escala e elementos de arte. ‘S40 essas simplificagdes que converiem estes modelos incipientss em poderosos instrumentos analiticos, de uso recorrente em toda a ciéncia econdmica. Rita Mota e Pedro Galvao 18 Resumos de Microeconamia h} O modelo do mercado concorrencial Num modelo rudimentar que pretenda representar a concorréncia livre no mercado, podemos presumir que as partes contrapostas se movem por principios de racionalidade em direcoSo a finalidades maximizadoras © hedonisticas, @ que o mercado em que interagem dispde de uma tal capacidade de optimizagso do nivel de satisfag&o de necessidades que ele em larga medida dispensa qualquer intervencao rectificadora externa, nomeadamente por parte do Estado. 1) A questio do egoismo No modelo do mercado, presume-se que as pessoas interagem © colaboram na estrita medida em que percebem que Ihes fividualmente vantajoso fazé-lo; nao se requer qualquer aliruismo, mas isso nao significa que uma atitude altruista seja nociva para quem a adopta num mercado. Naquilo que se diria ser mais um afloramento da “mao invisivel” smithiana, as expectativas partilhadas acerca do altruismo acabam por redundar em beneficio para todos os envolvides nas trocas, tanto egoistas como altruistas. Hé quem defenda que o altruisme 6 inato na condicéo humana. Além disso, nada demonstra que o aliruismo seja uma estratégia mediata de “egoismo de grupo”. Cabe perguntar se serd concebivel que uma comunidade de absolutos egoistas ultrapasse os desincentives & sua coordenacko para promover colectivamente uma afectagao eficiente de recursos, ou se é antes indispensavel sujeitar uma tal comunidade a constrangimentos éticos e institucionais capazes de ‘quebrar os impasses do egoismo generaiizado. Por outro lado, a motivagao econémica néo é necessariamente nem egoista nem altruista, mas € antes “nao-tuista’, no sentido de afigurar-se manifestarnente irracional apenas a atitude daquele que propositadamente favorega o livre curso do egoismo alheio em detrimento dos seus préprios interesses. A definigao de egoismo 6 frequentemente vaga, de tal maneira que pouco mais designa do que 0 facto de a nossa conduta individual ser teleolégica ©, quando se pretende ser econdmica, visar uma satisfagéo de desejos que séo pessoais, amide exclusivos, intransmissiveis e inefaveis. Nada disto significa que, chegado o momento, nao devamos, por razBes de simplificagao e de sintese, voltar @ linearidade do cdnone do egoismo. ii) © papel dos pregos A concorréncia sera tanto mais eficiente e benigna quanto mais ela se cingir a0 aspecto dos pregos; & medida que cresce 0 numero de vendedores concorrentes num mercado, menos peso especifico podera cada um deles ter na forma dos precos. Ao concorrente € retirado o poder de mercado, ficando ole na posigao do simples receptor passive de um nivel de pregos, na posi¢go que habilualmente & designada como a de “price taker”. © consumidor é 0 principal peneficiado com a “guerra de pregos’ da concorréncia, visto que é para ele que © prego se apresenta como um custo, 6 que minimizar 0 custo 6 0 objective central da sua racionalidade; também ele tende a ser um ‘price taker". A incapacidade de oposicao aos pregos dominantes por parte do consumidor beneficia 0 lado dos vendedores, os quais se véem poupados a uma pressao que seria para eles potencialmente ruinosa, dada a possibilidade de essa presséo agravar Grasticaments os custos de formacéo de equillbric nas trocas. Rita Mota © Pedro Galvao 19 Resumos de Microeconomia . Todos 0s participantes no mercado esto molivados pela presenca de incentivos, os quais, transmitidos pela sinalizagao dos precos, consistem essencialmente na possibilidade de se alcangar vantagens extraordinarias nas trocas realizadas no mercado © na possibiidade de haver apropriagao individual dessas vantagens. A capacidade de acumular ¢ permutar riqueza através da apropriago privada um incentivo adicional eficiéncia. if) Modelo basico, incentivos e “laissez-faire” © modelo concorrencial bésico ilustra o poder de modelagéo na andlise ‘econdmica, concordando com ele todos 0s economistas. Todo o recuo perante essa forma ideal de funcionamento eficiente e livre tende a acompanhar-se de problemas. ‘© quadro legal que rodeia o funcionamento de mercado no é sempre um mero conjunto de proibigdes e limitagdes animadas por uma logica restritiva ou tutelar Gominada por valores de justiga, mas é também um conjunto de garantias de atribuicao e de legitimagao, sem as quais ¢ a propria eficiéncia do mecanismo espontaneo do mercado que é posta em cheque, e a propria concorréncia do mercado nao alcanca os seus efeitos optimizadores. Contudo, ainda 6 2 logica tutelar, paternalista, que costuma presidir a inlerferéncia estadual nos mecanismos de mercado. E dificil conceber-se, mesmo em abstracto, um mecanismo de repartigao mais eficiente e justo que o mecanismo dos pregos. 1) Peculiaridades terminologicas Um dos pontos susceptiveis de fracilizar mais @ ciéncia econémica e de dificukar mais @ sua compreens3o consisie no facto de ela empregar ptedominantemente uma terminologia comum, 20 mesmo tempo que Ihe subverte a seméntica. *Custo" € ‘riqueza’, por exemplo, nao 1m o mesmo significado para os economistas © para o senso comum. A ambiguidade que resulta destes subtis “deslizamentos semanticos” nao &, todavia, de evitar a todo 0 custo. J) As divergéncias doutrinarias entre os economistas Uma das limitagdes mais aparentes @ relevancia pratica da ciéncia econémica reside no facto de nao haver consensos estaveis em muitos pontos de doutrina. Esia limitagao é algo de extremamente positive, pois denota nao apenas a abertura e o inacabamento da ciéncia econdmica, a sua capacidade de Progresso através da descoberta de novos factos do debate entre cientistas, mas 0 proprio envolvimento dos economistas em questées politicas, sociais ¢ morais para as quais seria vo @ perigoso esperar-se um consenso definit Muitas das quest6es doutrinarias debrucam-se sobre a eficacia, a amplitude ou Intensidade e a justica. Estas diltimas, que a maior parte das vezes nao podem ser resolvidas pela prépria ciéncia econémica, séo, na sua relafividade, especialmente dependentes de padrées de aferigao. Se ndo compete a Economia oferocer esses padrOes de afericgo, pela mesma raziio que nao Ihe cabe a definicao dos valores sociais que ela serve, e para a prossecuco dos quais dave limitar-se a prescrever os. meios mais eficientes. Mas a mais lagitima missdo da Economia é concentrar-se na avaliagao dos meios, subordinando-se pacificamente, tanto & livre determinacao politica dos rumos sociais, como a livre determinagao dos rumos privados através da ‘espontanea formagéio de mereados. Rita Mota e Pedro Galvao 20 Resumos de Microeconomia ‘A Economia define-se como um incessante esforgo de progresso; é do inacabamento que a caracteriza, dessa sucessiva abertura tematica, que, como qualquer ciéncia, retira a sua forca cultural e 0 seu Animo progressista. ‘Agrande maioria dos economistas tem uma natural simpatia pelas solugdes do mercado € nao se mulliplica em objeogées 4 superior oficiéncia do Iivre-camibismo. N&o s6 0 unanimismo nao reina na ciéncia econémica como ele nao seria sequer desejével. Poderia pensar-se que @ Economia deveria prestar-se a um esforco de coesdo interna, apresentande-se como um produto acabado de analise quantitativa © de modelacdio matematica, ao servigo da “engenharia social”. Mas mesmo que esse ideal de “engenharia social” fosse aceitavel, nao é essa a principal vooago de uma ciéncia social, que deve colocar como seu objectivo primordial a compreensdo dos fenémenos humanos, das intengoes ¢ das condutas que, entrecruzadas, do origem a fenémenos colectivos. ‘A pluralidade de vozes dentro da ciéncia econémica é um atestado da sue vitalidade e das suas perspectivas de progresso. 1) 0 charlatanismo pseudo-clentifico ‘A Economia € um ramo de saber com grande poder de atracpao sobre pseudo-cientistas e charlatdes, que fazem um habil aproveitamento dos tecnicismos da ciénofa econémica para se escudarem numa aparéncia de sabedoria impenetravel, de conhecimento privilegiado ou iniciatico, e seduzirem com essa aparénoia os mais crédulos, transmitindo-Ihes um de dois tipos de falsa impressdo que costumam acompanhar a percepeao “leiga” da Economia: +” A&conomia é um veiculo de conhecimento do futuro; : . Economia contém uma chave segura para 0 enriquecimento pessoal. Estes pseudo-economisias correspondem a necessidades efectivamente sentidas ©, em especial, aquela ansiosa avidez.de antecipagao que alimenta 2 credulidade. ‘A ciéncia econémica no tern muito a ver com o “cireo mediatico” que a rodeta. Nao obstante a margem de “estridéncia circense”, ela continua a fazer-se sobretudo de trabalho metédico, de permuta de conhecimentos e de verificag3o e refutagao de hipéteses, de evolugao de métodas e de linguagem, de adicao permanente de desafios ¢ de estimulos intelectuais, de abertura @ critica radical de cada um dos seus pressupostos por todos aqueles que dela se aproximam com seriedade e escripulo. 1) Pedagogia e “autismo” Em 2000, o jornal Le Monde publicou um manifesto de estudantes franceses contra a falia de realismo e de pluralismo no ensino da Economia, que apetave ao fim da hegemonia do paradigma neoclassico & seus derivados, fazendo-se a apologia do pluralismo, do pragmetisme, de uma maior concentragSo no universo da referéncia ‘empirica. Apelava: . A necessidade de reconexao entre o ‘mundo imaginario” da modelagao neocldssica ¢ o mundo dos problemas concretos: " A necessidade de critica do “enamoramento com a forma” que, avangando num crescendo de complexidade, dificulta mais do que facilita a compreensao dos, problemas reais. . Anecessidade de reintrodugo de aigum pluralismo a nivel pedagégico. Prof. Fermando Aratio: O excesso de formalismo € uma oportunidade pedagogica desperdicada, mas a convencionalidade da ciénoia econémica deriva em larga medida da especializagao intema. Rita Mota e Pedro Galvao 21 Resumos de Microsconomia * __ Ahelerogensidade tem sempre caracterizado 2 evolupao histérica da ciéncia econdmica € esta constatagao conserva toda a sua Validade mesmo em momentos, come 0 actual, de vincadia predomingncia de um paradigma. + Objectives de progresséo académica e de acesso a fundos de financiamenio de projectos tém levado muitos economistas @ aproximarem-se de uma posicso consensual e mediana, pagando insincera vassalagem ao canene dominante. = Qualquer disciplina cientifica deve adoplar as suas convengies agregar em tomo deias as suas escolhas temiticas e os seus oritérios de relevancia. * A obsesséo das ciéncias sosiais com o rigor féas emularem aquilo que se juigou ser o rigor das ciéncias exactas, superando-as.alé em convencionalismo e em formalizagao. * = 0 protesio contra o convencionalismo é exacerbado palo sentimento de exclus0 causado pelo triunfo claro de um s6 paradigma dentro de uma area disciplinar t40 vasta como 0 @ Economia. A economia deve preocupar-se em conservar o seu realismo, permitindo-the compreender ¢ lidar com os problemas reais, mesmo naquilo que esses problemas tenham de mais “contaminado” par infiuxos e consideragbes que podem parecer n5o ter nada a ver com o tema da Economia, mas que néo s8o menos implicados nos contextos vivenciais em que os problemas surgem e convocam a nossa aieng&o @ a nossa determinagao. Contra 0 “autismo” dos cientistas econémicos, depbe o priprio propésito civilizacional que, em finais do século XVIII, fez nascer a modema ciéncia sconémica: © propésito emancipador do iluminismo, © cbjectivo de colocar a disposi¢ao do homem comum os meios para poder levar ume vida condigna de um ser racional, de auto- delerminagéo, responsabilidade ¢ coeséo social n&o imposta, mas esponténea, esclarecida e fraterna, na caminhada da modernidade. Rita Mola ¢ Pedro Galvéo 2 Resumes de Microeconomia CAPITULO 3 Interdependéncia-e trocas A actividade econémica evidencia um grau de coordenagao e de harmonia que parece postuiar uma inieligéncia central, uma supra-ordenacao, de tal modo & regular a forma como cada um de nés contribu para o funcionamento do todo, cada um desempenha funges especificas, cada um auxilia os demais, mesmo que deles no tenha recebide uma indicagio precisa das necessidades que sentem ou das expectativas que tém quanto a esse contributo. Ninguém nasce absolutamente pré-determinado ao exercicio de uma fungao; aquilo que cada um faz depende em larga medida das suas proprias opgbes livres, daquilo que a pessoa, bem ou mal, decide fazer. | Os resultados nem sempre so 0s mais justos, nem os objectivamente mais eficientes, No entanto, ainda que pontualmente sejam detectaveis falhas na a vantagem absoluta que pode alcangar-se na especializagao que comega por ditar qual a posi¢ao que cada um ocupa nas trocas, e é essa vantagem que determina o que é que cada um vai produzir em excesso relativamente &s suas necessidades, de forma a habilliar-se a obter bens © servigos no produzidos por ele, em troca daquele excedente. ‘A especializagao e a divisdo de trabalho segundo os principios das vantagens absolutas s40 as fontes da maior parte da diversidade social observada na economia, ¢ também das formas mais estaveis e permanentes de consagraco institucional da interdependéncia, nomeadamente o trabalho em grupos e em empresas, a definigdo de “profissdes” 2s quais se dirige 0 esforo de aquisicéo de vantagens absolutas, de escolha e investimento em aptiddes produtivas. Feita essa escolha por uma divisao de trabalho estavel e congruente de acordo com principios de vantagens absolutas, os ganhos das trocas podem arnpliar- se até ao limite consentido pela dimensdo do mercado, mas sempre com as ‘vantagens da descentralizagap e da liberdade induzida pelo simples balizamento dos incentives. ©) A confianga ¢ © equiliprio nas trocas facto de uma pessoa se sentir insatisfeita com uma transaceao nfo significa necessariamente que tenha sido prejudicada por ela, ou mesmo que nao tenha sido por eta beneficiada, A troca @ sempre um compromisso, ¢ implica que cada parte transija relativamenie sua posi¢ao inicial de ganho maximo: o beneficio objective tem de existir para que ocorra troca voluntaria, por mais que esse beneficio objective fique aquém do subjectivamente esperado. Transacg4o: unidade bésica da actividade econémica; contém nela os trés principios basicos de confito, mutualidade e order. ‘A complementaridade ¢ a interdependancia, se s&0 por um lado os alicerces da prosperidade, so por outro lado limites & realizagao irrestrita dos planos individuais de cada um, s40 limites ao arbitrio, o qual s6 em pieno isolamento poderd seguir 0 seu livre curso sem quaisquer constrangimenios. Os economistas, conservando um prudente cepticismo perante as preferéncias declaradas, tendem a fazer recair 0 peso da sua andlise sobre as preferncias reveladas dos agentes econémicos. A insinceridade campeia na abordagem negocial as trocas, dados os beneficios estratégicos que podem fazer-se derivar da reserva de informagaio. Aracionalidade nas trocas reclama que todos os envolvidos beneficiem, mas no que todes beneficiem no mesmo mantante ou na mesma proparGio. Se, num caso, 0 luero foi superior ao excedents do consumidor (diferenca entre o maximo que 0 comprador estaria disposto a pagar e aquilo que efectivamente Pagou), noutro caso verifica-se o contrario, mas em nenhum dos casos a presenga de Rita Mota e Pedro Galvao 24 Resumos de Microeconomia um dos valores implicou o desaparecimento do outro, pois se tal tivesse sucedido, a transacgo ndo teria ocorrido, ou entéo a aparéncia de uma transacpao onerosa teria recoberto aquilo que substanciaimente seria um acto de benemeréncia. Sugerir que uma froca 66 é justa se ela resultar numa equivaléncia de resultados para as partes envolvidas pode, para além de ser falso, suscitar problemas melindrosos, sobretudo aqueles que t&m a ver com a tutela da confianga daqueles que contratuam, @ com a distribuigao de riscos entre ambas as partes. ‘A maior parts das trocas envolve uma margem de risco quanto ao valor daquilo que é transaccionado, Os desejos de conhecimento perfelto ou de certeza absoluta 880 incompativeis para a nossa necessidade de acgao. Eliminar completamente esse risco teria o custo clevadissimo de volatilzar a confianga no cumprimento das transacgbes contratuadas, dada a rejeizo por ambas as partes de qualquer margem de risco. E possivel reduzi-lo, fazendo acompanhar as transacgdes de sinalizagoes e garantlas que incutam a impressiio de seriedade ou que permitam remediar resultados muito insatisfatérios ou desequilibrados. Um quadro juridico protector do direito de propriedade 6 um requistio essencial e minimo da existéncia subsisténcia da especializacao e das trocas no mercado, que serve simultaneamente para erradicar 0s riscos maximos. d) Vantagens comparativas Setia vantajoso, para aquele que dispbe de mais de uma vantagem absoluta, assumir todas as farefas nas quais se registasse esse tipo de vantagem, maximizando em todas elas os ganhos advindos da sua superior produtividade. Todavia, € mesmo assim benéfico para 0 produtor mais eficiente dividir trabalho, porque, libertando-se das tarefas em que seja comparativamente menos ‘apto, poderd concentrar-se naquela ou naquelas em que a sua produtividade & relativamente maior, confiando as demais a parceiros de trocas que perderiam em comparagao com ele, decerto, mas sé na situac&o hipotélica de as trocas comerciais se cingirem a um s6 produto. David Ricardo: como poderia a Gra-Bretanha entrar em relagdes econémicas com Portugal na permuta de vinho e de la, se em ambos os casos era patente 2 vantagem absoluta dos produtores portugueses? Solugdo: cada um se deve especializar na sua vantagem relativa, os produtores britanicos na I e os portugueses no vinho, acabando por resultar dessa diviséo de trabalho uma clare vantagem para ambos os envolvidos. ‘A escassez (20 menos a que resulta da limitagdo absoluta do tempo disponivel) determinara que mesmo aquele que dispie de vantagens absolutas em ambas as actividades acabe por nao poder dedicar a qualquer dessas actividades inais do que tempo parcial, no caso de opar pela auio-suiiénca, ou sea, se Se furar s trocas. A solugao tecnicamente mais eficiente pode estar para lé daquilo que o mercado comporte, € por isso converter-s6 numa solugéo que néo 6 economicamente a mais eficiente, no sentido de nao ser aquela que maximiza a utilidade no mercado. Por essa raz8o, a oléncia econémica advertiu para a crounstancia de a especializacao ser limitada pela dimens&o do mercado, pela procura dos bens e servigos a que possa corresponder essa especializagao de factores produtivos. Na orientagao da op9o racional encontra-se uma ponderagao de custos de oportunidade: 0 tempo gasto na actividade menos produtiva € tempo roubado a actividade meis produtiva, ¢ vice-versa, pelo que, obviamente, a opoéo pela actividade menos produtiva & a que tem mais elevados custos de oportunidade, © a opgao pela actividade mais produtiva é a que tem custos mais baixos. ‘Quando extrapolamos a situacaio de especializacao parcial para um contexto nacional, temos ainda que aditar uma outra justificagao: a especializagao parcial ha- Rita Mota e Pedro Galvao 25 Resumos de Microeconomia -de ser reflexo, da diversidadie de produtores interna, e o grau de especiatizagao. dependera do numero e peso especifico de produtores intemacionalmente competitivos de que cada pals disponha. A constatagéo de vantagens absolutas, ou a mais sublil delecco de vantagens comparativas, acabam sempre por apontar no sentido da especializagao, determinando quem produz o qué, 0 que ¢ que se troca e ate 0 quanto se troca, no sentido de permitir determinar qual o volume de transacgdes que incentiva a0 maximo a especializagao. 0 céleulo das vantagens comparativas envolve apenas a ponderagao de Custos de oportunidade e de taxas de substituigo, que s40 valores proporcionsis, susceptiveis de expresso percentual, no estando dependente de qualquer consideracao quanto a dimenséio absoluta do produtor, ao volume dos factores que ‘emprega ou a escala dos seus custos. E 0 facto de cada pessoa se concentrar na produgao de bens e servigos para os quais existem custos de oportunidade mais baixos que explica os beneficios da especializagao das trocas. @) As fontes das vantagens comparativas i) Dotagées naturais ou herdadas Ha pessoas nafuralmente mais e menos dotadas para o desempenho de certas fungoes e essas diferencas podem ser vantajosamente aproveitadas na diviséo Social do trabatho_ Nos néio nascemos iguais, e pese embora o esforgo formativo, seria irracional desperdigarmes a desigualdade inata © ndo eproyeitarmos algum desse esforgo no sentido do aprofundamenio dessa dédiva natural de diversidade. Por outro lado, demasiada énfase nas dotacoes inatas pode nao sé encaminhar-nos para muito perigosas “tentagSes eugénicas", com antecedentes histérices sinistros, como pode refleciir uma atitude conformista e fatalista que sugerinia 2 fuliidade do esforgo de aperfeigoamento individual e colectivo © a ‘irrelevancia das escolhas que presidem a esse esforgo: desconsiderands inteligéncia com que individual e colectivamente nos auto-determinamos, fazendo a nossa hist6ria, Promovemos endogenamente o incremento da nossa prosperidade. Um dos pilares da vida econémica da sociedade mocema ¢ a perspectiva de colocacao das aptidées individuais ao serviga de um esforgo de progresso tecnolégico que, por sua vez, incentiva e apoia o progresso de aptidées individuai: incrementando os meios e as recompensas para o investimento em “capital humano”, premiando o mérito que reside na aquisigao de dotacdes, privilegiando as aptidées mais visiveis e mats padronizades de acordo com critérios de aferigao institucional, sempre de acorde com pressupostos de mobilidade. social que se concentram no dom da perfectibitidade humana. Na actividade econémica, a desiguaidade de dotagdes naturais nao 6 uma maldigao, mas sim uma oportunidade de partilha, de enriquecimento e de transcendéncia. J& sem esta conotagao moral se constata a dosigualdade de dotagées naturais ou herdadas entre as varias nagoes: diferengas de cima, solos, configuragao geogrdfica, acessibilidade, so ou podem ser decisivas pare provocarem profundas diferencas de aptidées produtivas entre regiées ¢ entre Estados, © para determinarem inicialmente as linhas demarcadoras da divisao intemacional de trabalho. il) Dotagdes adquiridas A perfectibilidade é um motor dacisivo da conduta; pode séJo tanto dos individuos como das nagies. Rita Mota e Pedro Galvso 26 Resumos de Micraeconomia ‘A maior parte daquilo que podem considerar-se dotagdes adquiridas reconduz-se ao conceito amplo de ‘capital’, o conjunto de melos de produgao que fiveram por sua vez que ser produzides, 0 ‘stock” de recursos produtivos como méquinas e prédios. ‘A opg8o racional entre consumo e investimento (na Fronteira_de Possibilidades de Produgao) nao ¢ inteiramente indiferente, na medida em que investir & propiciar mais directamente a formagéo de dotagbes adquiridas, embora indirectamente 0 aumento do consumo possa ter precisamente o mesmo efeito. iii) Capital humano e especializagao Aquele que aposta numa formagao muito especializada ou numa educagéo superior, ou 0 pais que acarinha as suas insiituigSes educativas © cientificas, que fomenta a investigagao @ a inovacSo, estéo ambos a investir na melhoria das qualidades humanas que podem resullar em incrementos de produiividade e de riqueza. | Em termos objectives, basta reconhecermos 0 papel da tecnologia no orescimento econémico e constatarmos que a tecnologia @ essencialmente conhecimento para concluirmes que ndo pode deixar de haver uma correlagao posifiva entre educagao ¢ crescimento. Nada disto seria possivel sem a intermediagao de um investimento em “capital de risco” (‘venture capita”), 0 financiamento em inovagao tecnolégica que essencialmente consiste num “salto de fé" em direcg4o aos rumos que, com uma margem de extrema incerteza, podem garantir increments de produtividade até & vanguarda do progresso econémico. ‘A vanguarda econémica no é alcangavel sem a sinergia do capital humano com o “capital social” das instituigdes, em termos que permitem a destringa de varias acepgdes de capital humano que, combinadanienie com o adequado enquadramento juridico-politico, propiciam 0 “salto qualitativo” na produtividade. ‘Aquilo que, desde finais do séc. XX, se tem designado por Nova Economia & precisamente 0 reflexo da eciosdo de novos sectores produtivos dominados por investimentos intensivos em conhecimento e informago, em capital humano, como a informatica ou as telecomunicagbes, e explosives incrementos de produtividade em sectores tradicionais nos quais foi possivel aplicar as inovacies tecnologice confluéncia do “capital humano” com a explosao da “tecnologia de informaca contribuiu decisivamente para a acelerago da produtividade agregada nos paises industrializados. 0 fenémeno tem sido atribuido, nas suas incidéncias reais (nao-especulativas) essencialmente 4 combinagao de aigumas caracteristicas estruturais (intensificagao do ‘emprego de capital por hora de trabalho; aumento de formag3o tecnolégica por \rabalhador, aumento simulténeo, em varios sectores, @ sob a lideranga do sector informético e da “tecnologia da informaco", da “produtividade total dos factores”). Quanto & especializagao, sublinha-se que a divisac do trabalho, que pode resultar de ndo mais do que uma opgo inteiramente arbitraria, tem contudo algumas. virtualidades de auto-reforco (a pratica habitual “aguga o engenho”, e a treino, o labor paciente, a persisténcia 6 que fazem, frequentemente, a exceléncia do especialista). A especializa¢o potencia a manifestacao das capacidades produtivas: "Porque reduz o numero ¢ a diversidade das tarefas, facilita a aprendizagem; * Porque tende a uma estabilizecdo em tarefas repetitivas, permite que a habilidade aumente a custos marginais decrescentes; . Propicia que a atengao se liberte dos aspectos rotineiros para se concentrar nos pontos criticos nos quais é possivel um progresso técnico ou mesmo a descoberta © a invencao, ____ Por maior que seja 2 sua importancia, a especializagao tem limites: 0 da dimensio do mercado © o da desumanizacao (a repeticao pode resultar num Rita Mota e Pedro Galvao 27 Resumes de Microeconomia ambiente produtivo desincentivador, esgotante, no qual as pessoas caem em habitos rotineiros que so os seus horizontes de ambigéo e talento, iméveis @ desatios e avessos a novidade, sem orguiho no produto final, em que nao se revéer). 4) A diviséo internacional de trabalho Conquanto a sua dimensio e a existéncia de uma dinamica propria nos seus mercacios intemos permita aos paises encararem a opgo da autarcia como uma Solugao mais viavel e menos radical do que o é para as pessoas singulares, nenhum pais pode, na actualidade, acalentar sequer a mais remota esperanca de furtar-se a0 comércio intemacional ¢ a0 mesmo tempo conseguir, saja manter 0 seu proprio nivel de prosperidade, seja acompanhar o progresso econémico dos demais paises. As trocas entre Estados podem dizer respelto a: + Transac¢&o de bens e servicas: As importagdes permitem ao consumidor nacional ter acesso a maior numero e diversidade de produtos, as exportagbes a0 produtor nacional ter acesso a mercados mais vastos e diversificados, itando a formagao de excedentes e a remuneracao em moeda estrangeira. * — Deslocagdes de pessoas: As deslocagées respeltam acs movimentos migratérios. Os emigrantes buscam condi¢des de remuneragao que o mercado de factores, espacificamente 0 mercado de trabalho, Ines no propicia internamente; os imigrantes buscam as oportunidades de obterem remuneragdes que ndo S40 aleangaveis nos seus mercados de origem, Muitas das vantagens que podem alcangar-se com o comércio intemacional de bens servigos podem ser obtidas também, e ainda complementadas, pela liberdade de circulagao de trabalhadores. * Movimentos de capitais: Permitem que aja investimentos, poupanga, financiamentos que transcendem as fronteiras nacioneis, que a propria tiularidade de recursos produtivos, ou a assunpao dos riscos inerentes as iniciativas empresariais seja internacionaimente partihada. Muitas das trocas internacionais assumem um caracter mutilateral, © néo simpiesmente uma feicao bilateral. A mulilateralidade, se permite maior fiexibilidade nas trocas e maior agilidade na escolha éptima dos factores de produgo, ¢ se por essa via 6 0 caminho mais curto em direcgao ao crescimento e & redugo da pobreza, agrava drasticamente, por outro lado, a interdependéncia, @ os riscos de reverberaao dos “choques” que se facam sentir em qualquer ponto da cadeia, j que quanto mais profunde € @ dependéncia reciproca, maior € a probabllidade de que se registe um “efeito de doming", envolvendo em cadsia 0 destino econémico de todos os agentes econdmicos abrangides nessa area de multiateralidade. [Os custos da interdependéncia ‘Comércio: Designs, na sua vertente de interdependéncia, de cooperagao e de coordenago, toda a actividade produtiva, aquela mesma que se representa em mini- -modelos de circulagéio econamica. (Os ganhos das trocas implicam agravamentos de interdependéncia "Capital social”: E 0 adquirido civiizacional que corresponde a sedimentagao dos nexos de interdependéncia que varias tazdes colocam nos alicerces da sociedade; visto de um prisma individualista, 6 0 conjunto de vantagens que qualquer pessoa pode retirar da sua pertenca a uma sociedade, ainda que essas vantagens dependam genericamente de uma contrapartida de obrigagbes ¢ limitagoes, ou reciamem niveis minimos de participagao nas actividades colectivas. até como forma de travar ou evitar a degradacao da experiéncia comunitaria ou da formacao € legitimago da vontade politica; hd quam evite completamente esta expresso. Rita Mota e Pedro Galvao 28 Resumos de Microeconomia fh) Livre-cambismo, proteccionismo e Interdependencia Tudo indica que as vantagens @ o potencial de ganhos reciprocos utirapassam em muifo os custos da perda de independancia, As relagbes econémicas internacionais so uma eloquente llustrago do movimento para o aumento da interdependéncia até ao limite da integrago, regide por simples designios econémicos, ou seja, pela mera consciéncia das vantagens que podem advir da divisio intemacional do trabalho e da especializagao das produgbes nacionais. Especializar-se nas actividades com menores custos de oportunidade significa um aumento global de eficiéncia. Quanto mais um pais importa, mais pode importar, se porventura teve a boa fortuna de importar efectivamente apenas aqueles bens em que ndo tinha vantagens comparativas. ‘A interdependéncia nas relagdes econdmicas intemacionais no 6 um assunio to near como aquilo que pudéssemos pensar; mas esse aumento de complexidade no nos deve fazer perder de vista 0 principio basilar: comércio intemacional é um veiculo de beneficios generalizades para todos os paises intervenientes, © de ganhes econémicos especificos para cada uma das partes envolvidas nas trocas intemacionais. ‘A. especializagéo nacional, a diviso inlemacional de trabalho, nao desembocam num “jogo de soma zero” em que um Eslado sé pode enriquecer & custa dos demais, transformando-se as trocas em velculos estralégicos de uma guerra ‘em que ha venedores e vencidos. O comércio permite a0 pais mais pobre ¢ menos poderoso enriquecer por intermédio da especializaggo e da troca de utlidades. Se 2 distancia entre os paises, em valores econémicas absolutes, pade aumentar, devernos ‘em conirapartida considerar a real viabilidade da altemativa proteccionista como via para 0 enriquacimento do pais mais pobre e fraco: sendo verdade que a auséncia de trocas prejudicaré mais aquele pais que mais tinha a ganhar om elas, em termps absuluius, ambém o pais menos favorecide poderia estar mais rico com a liberdade das trocas. - £ rebativel o proprio argumento proteccionista de que a concorréncia 6 uma ameaga aos postos de trabalho ou aos salérios nacionais, Ja que a falta de compeiitividade dos produtores nacionais levard ao encerramento de empresas © 20 desemprego ou & sobrevivencia destas empresas através de um esforgo de emulagao dos préprios alicerces das vantagens competitivas das empresas estrangeiras. E rebativel com 0 contra-argumento de que, com a concorréncia internacional, nao 56 existird a tendéncia para o aumento do emprego, visto que 0 pais que se especializa produz e exporta mais do que 0 faria persistindo numa afectag&o de recursos préprios em produgdes pouco eficientes, como também existira a tendéncia pare o aumento dos salarios, visto que estes naturalmente reflectirao no seu nivel médio 9 aumento da produtividade | que resulta da concentrag&o de produgéo nacional naqueles ponios nos quais existem vantagens comparativas. ‘Mais peso tem o argumento proteccionista de que 0 ineremento das trocas e da especializagdo se ha-de fazer, em muitos casos, com elevados custos sociais ® humanos. Este argumento nao 6, em bom rigor, proteccionista: ele é sobrefudo imobilista, porque procura esquivar-se @ necessaria ponderagao de ganhos ¢ custos que & propria de qualquer deciséo econdmica, apresantando apenas um Prato da nga, o dos custos, ¢ escamoteando tanto quanto possivel a considera dos ganhos potenciais. santo pos Nao haveria progresso econémico se estes argumentos imobilistas prevalecessem @ o pals perde quando aqueles que os usam dispéem de peso politico. Toda a atitude proteccionista que o pais assuma deve ser precedida de uma ponderagao das consequéncias da bilateralidade © da generalizagao dessa atitude Junto dos nossos parceiros comerciais. ___ Interdependéncia significa perda de independéncia e isso implica custos; 0 Pais que se habituou a importar fica refém das suas importagdes, no sentido de que, Rita Mota e Pedro Galvao 29 Resumos de Microeconomia na falta de produg&o propria, nfo poderd sobreviver num contexto de hostitidade internacional em que as trocas sejam dificultadas. O pais exportador é igualmente refém des suas exporiagées, no sentido de que os excedentes que exporta 56 puderam, e poderao, maximizar-se através da especializag&o, ou seja, do abandono de produgées nacionais menos eficientes, mas nao menos vilais para @ subsisténcia da populacao numa situagao de isolamento. A intensificacdo das trocas intemnacionais, mais do que pressupor um estado permanente de paz ou uma arquitectura cosmopoiita, 6 antes e sobretudo o principal incentivo a que essa paz se perpetue e a que uma._ordem juridica intemacional se consolide. Quanto mais os Estados dependem economicamente uns dos outros, menos atraente se toma a opgao belicista ou Isolacionista, porque com esta todos perdem. Essa pacificagao através das relagdes econémicas internacionais aparenta maior sofidez do que outras vias, porventura mais nobres e edificantes, porque qualquer um Teconihecsré 0 poderosissimo ascendente dos interesses econémicos na conduta dos estados @ 0 seu peso na pacificagsio, mesmo quando nao passe de inarme hipocrisia, de simples célculo de oportunidade. Podemos desejar um mundo melhor em que @ paz fosse resultado de uma deliberagao desinteressada, assente numa vontade constante e perpétua; infelizmente, no podemos esperar muito mais do que a paz como o resultado contingente de uma complementaridade de interesses que toma os estados reféns uns dos outros. Todas as variantes da concorréncia imperfeita, ¢ até todas as patologias das “ialhas_de mercado", podem ocorrer nas troces intemacionais com @ mesma probabilidade com que ocorrem no ambito intemo das economias nacionais. Em muitas situagdes 2 predagao comercial é uma estratégia de sucesso, © a defesa contra ela toma-se um argumentoproteccionista perfeitamente razoavel, como estratégia de n&o-cooperago e de reialiacao. A liberalizacéo incompleta e a ambiguidade de propositos fivre-cambistas ngo inteiramente aplicades, ou conjugados ‘com medidas incongruentes, pode contribuir para o agravamento das desigualdades internacionais, para a generalizagSo e perpetuacao de situagées de pobreza e grave caréncia. ‘A interdependéncia, tanto no plano intemo como no plano intemacional, & consequéncia normal da divisdo de trabalho e da especializacdo, 6 expressao da comptementaridade, e nessa medida 6 0 veiculo insubstitufvel para a geraglo combinada de prosperidade partilhada por todos. Sera uma via Imperfeita; mas nfo hé ‘solugo menos imperfeita do que ela. ideias a reter depois do exame final: * _ Hé diversos métodos de afectacao de bens e servicos; = Ainteracgao de compradores e vendedores consfitul os mercados; * Qs mercados geram um enquadramenio institucional que visa apoiar os agentes econémicos na realizag&o dos seus fins; + Os recursos produtivos S80 escassos; a * A produgo e 0 consumo crescem com a especializag3o dos agentes econémicos (individuais ou colectives). Rita Mota Pedro Galvao 30 Resumos de Microeconamia CAPITULO.4 As forgas.de mercado a) Oferta ¢ procura Oferta: conjunto de atitudes tipicas daquele que se dirige a0 mercado para la entregar um bem ou prestar um servigo, que ele avalia essencialmente em funcao do custo (esforgo ou custo de oportunidade que para ele representou}, embora © custo nao seja a Unica base da avaliaco. Procura: conjunto de atiludes tipicas daquele que se dirige ao mercado para salisfazer as suas necessidades, seja através da aquisigao de um bem, seje pele utiizagdo de um servigo, sendo que o valor que atibui a um ou ao outro 6 essencialmente determinado pela utilidade (aptidao de um bem para satisfazer as necessidades) que associa a eles, embora possa haver outras determinantes da avaliagao. Tratam-se de simplificagdes modelares, que impdem unidade onde existe diversidade, que impoem um sentido onde o chaque de motivag5es poderia sugerir um caos de irresolugao. Numa visio mais préxima e detalhada do funcionamento do mercado, assistiriamos a uma virtualmente inesgotavel variedade de relagées contratuais em resultado de um principio de liberdade, ainda que pudéssemos identificar tragos comuns e esirutures recorrentes, dada a tipicidade dos interesses individuais e das atitudes que tais interesses ditam. Cada agente econémico procura antes de mais resolver 0s seus problemas (abarcando os daqueles que com ele vivers em economia comum, 2 sua “familia”). ? bb) A nogao de mercado concorrencial Mercado: intaracgaio do conjunto de vendedores e compradores, actuals ou Potenciais, que se interessam pela transacgéio de determinado produto ou factor de Produgao, Embora na linguagem comum tenda a designar-se por mercado um local fisico no qual ocomem trocas dos mais variados produtos, em bom rigor econémico ha tantos mercados quantos os tipos de bens, de servigos @ de factores que séo oferecidos e procurados. Ha muitas combinagées estaveis de consumos, de produgtes e de factores, mas analisar cada mercado isoladamente pode ter mais vantagens que inconvenientes. Comegar por separar os varios mercados pode ser a via adequada para se alcangar, no final, uma sinfese que seja ao mesmo tempo realista e mais rigorosa. ‘S6 assim ndo suceden’ nos casos em que sé consiga estabelecer que 2 Produtos, ou 2 factores de produc&o, esto necessariamente, causalmente, conexos, seja porque: * A producao de um reclama a presenga do outro — bens de produgaéo conjunta ou complementares na produgao (6x.: gasolina e derivados do petroleo} * A sua utllizagao ou consumo se fazem combinadamenie — bens complementares (ex.: pneus e automéveis) * ,__Concorrem para a satisfacdo da mesma necassidade, em termos de dever a caréncia de um produto ser compensada pelo aumento do consumo do outro + bens sucedaneos (ex.: Coca-Cola e Pepsi) _Nestes casos, a andlise conjunta de 2 mercados apresenta a vantagem de permitir detectar motivages dos agentes que passariam despercebidas numa andlise Separada. Mesmo assim, interessaré uma vez por outra considerat separadamente cada um desses mercados. Rita Mota e Pedro Galvao 31 Resumos ds Microaconomia Um mercado pode formar-se espontaneamente e ser inteiramente efémero, tanto como pode ser muito organizado e regulamentado, tendendo para 2 Permanéncia e para 2 estabilidade institucional. Alguns mercados aproximam-se mais, na sua forma de organizag&o, do modelo que se sugere com as expressdes oferta © procura, no sentido de que neles existem agentes que se agregam em dois lados mais ou menos compactos, e de gue ocasionalmente @ articulagao entre os dois lados é facilitade pela presenca de intermediarios que recebem ordens de ambos os lados, as iransmitem @ procuram. harmonizé-las + mercados centralizados em tomo de um ‘porto focal", de um pregoeiro que garante o funcionamento e o equilibrio das transacgSes porque recalhe todos os sinais iransmitidos pelos agentes e os redistibui ¢ reorienta para os potenciais destinatarios, estes casos, mais nitida se toma a fungao coordenadora do mercado, o modo como este propicia aproximagies sucessivas e transigénoias reciprocas, fazendo, com didlogo e persuasto, convergir as escalas de preferéncias complementares para o ponto de equilibrio possivel e eficiente, em allemnativa & subordinago a normas uniformes ou aos ditames das instituigdes socials. Equitibrio Walrasiano (Léon Walras): equllibrio que seria alcangado num mercado hipotético com um leiloeiro capaz de, sem “custos de busca” de oportunidades e de parceiros de troca, sem extemalidades ou quaisquer imperfelcbes de mercado, ajustar todas as licitagdes a um preco unico, o prego de equilibrio, o preco geral das transacgbes. Muitos mercados s&o inteiramente descentralizadcs e desprovidos de uma estruturacdo esiavel, mas isso ndo significa que eles se desviem do funcionamento basico do mais organizado dos mercados. ~ Um mercado desorganizado pode comportarse como so estivesse orgjanizado, na medida em que seja um mercado concorrencial, na medida em que haja nele um nGmero suficientemente elevado de compradores e de vendedores, que disponham de liberdade de participagdo nas trocas ou de saida delas, e que disponham de um grau razoavel de racionalidade e de informago acerca daquilo que esta a ser transaccionado. i) Desmaterializagao e comércio electronico: A Economia modema tem vuigarizado crescentemente a nogdio de que o mercado pode ser desmaterializado (ex.: Intemet, que veio faciitar e ampliar extraordinariamente as trocas de mercado). Fagilitando as ttocas, a Internet tomou-se também espelho de uma evolugio dos mercados no sentido do aumento da convencionalidade e da imaterializagao, soja em consequéncia da evolucao da sofisticagéo ¢ secundarizacao das necessidades determinada pelo progresso cultural, seja até por pressdo dos servigos, sendo que & muito claro 0 que a Internet passou a representar em termos de possibilidades de prestagdo de alguns servigos a qualquer distancia, aumentando a abertura das economias, reafectando quase instantaneamente os recursos para a afectagao optima em termos giobais, dando origem a muitas sinergias e “efeitos multiplicadores", ainda que alguns entraves sejam obviamente insuportaveis. ‘A disseminac3o do comércio electrénico, @ 0 seu impacto nos “custos de transacpac", pode ter as mals amplas consequéncias na configurago do fenémeno empresarial: tornando cada vez menos oneroso o recurso ao mercado, 0 “outsourcing”, a internet, e o “comércio electrénico B2B" (“business to business"), podem tomar crescentemente desnecesséria a integragdo vertical dos factores produtives em organizagdes empresariais, devolvendo ao mercado toda @ sua proeminéncia, com o declinio da “altemativa empresarial", pulverizando-se essas estruturas institucionais numa miriade de pequenos nexos contratuais de balxo custo. Rita Mota @ Pedro Galvao 32 Resumos de Microeconomia Para alguns, 2 Intemet efigura-se como o paradigm do mercado néio-regulado, ‘eminentemenie descentralizado, porventura até um pouco anarquico. A Iniemet nao garante especialmente a formacao e manutengso de um ambiente competitive; € verdade que nunca foi to facil a entrada e safda do mercado dos produtores concorrentes, como 0 agora na Intemet; todavia, nada disso impede a subsisténcia dos tradicionais fenomenos de “dispersdo de pregos” e de “concentragao de mercado” que impedem o mecanismo optimizador das trocas de alcangar a plenitude dos seus objectives. A Intemet pode até promover o aumento da desigualdade econémica, na medida em que propicie a concentragae dos ganhos das trocas num numero progressivamente mais reduzido de participantes. Um dos arquétipos que tradicionaimente foi usado na andllse das trocas, 0 de rede de partes contratantes que parilham algum conhecimento comum, tinhe virtualidades insuspeltas, que s6 revolugo tecnolégica permitiu discemir. O simples anonimato “atomistico” e amorfo no costuma ser a regra nas trocas, as quails tendem a concentrar-se em pélos ‘moleculares" de comunidades de interesses. de valores, de sinalizag8o @ de reputagdo “tocais", de confianca adquirida em relacionamentos pretéritos. Questiona-se a eficiéncia dessas “redes", tendo especialmente em conta que se pressupde que @ sua formacao também ocorre a margem do mecanismo de mercado. A multipicaggo de conexdes pessoais prévias as trocas permite uma dispers8o do risco por partitha; por outro lado, pode erradicar 2 incerteza nas vendas de modo similar a0 que resulta da fidelizagao dos compradores. ii) A atomicidade. Se o numero de participantes, tanto no lado da oferta como no da procura, for suficientemente elevado, as decisdes de cada um ver-se-do diluidas no todo das interacges que ocorrem num mercado que seja suficientemente vasto, © tornar-se-4 dificil, se n&o impossivel, que alguém consiga impor a um tal mercado as suas preferéncias, ou as suas avaliagbes refativamente ao que Ihe 6 proposto nas trocas — nao existe poder de mercado. Desie modo, todos poderdio dar largas & sua capacidade de escolha racional dos padrées que tenham por maximizadores dos seus projectos individuais de salisfac&o; sera cada vez menos dificil a cada um estabelecer a sua propria ponderagio de vantagens e custos imediatos, visto que poderd tomer o nivel de pregos como um dado, um valor fixo, ao menos dentro daquele prazo relativamente curfo deniro do qual ocorrem as principais decisées marginals de reacco as solicitagdes do mercado. ‘Os agentes da oferta e da procura contribuem colectivamente para a formagao dos precos mas nao dispéem individualmente do poder de allerar os pregos que Se vo formando no mercado, pois de outro modo o automatismo equilibrador ficaria contingentemente dependenie da abstengéo desses agentes com poder de mercado. Essa situago de “auséncia de poder de mercado” 6 caracteristica de contextos de pulverizacao “atomistica” dos centros de decisao no mercado. O produtor sem poder de mercado fem um incentivo adicional para se tornar eficiente: a dnica liberdade de configuraco e ampliag&o dos ganhos fica reservada @ diminuigao dos custos médias, pois nao ha nada a fazer quanto aos pregos. __E possivel aferir 0 grau maior ou menor de atomicidade de um mercado considerando aquilo que sucederd a um vendedor no caso de ele tentar subir o prego dos seus produtos: uma elasticidade infinita revela que é um vendedor atomistico sem poder de mercado; um grau intermédio de elasticidade revela algum poder de mercado; a total inelasticidade da procura revela o maximo de poder de mercado © de ‘alta de atomicidade. E discutivel que a atomicidade seja um requisito necessério para a definig&o de mercado concorrencial; 0 elo entre atomicidade e concorréncia perfeita foi mais ou Rita Mota ¢ Pedro Galvao 3 Resumos de Microsconomie menos imposto nos alvores de marginalismo, de que a escola neociassica é a herdeira directa. Essa via teérica teve consequéncias que so, no minimo, discutiveis, come a de que o participante nas trocas seria invariavelmente uma vitima de uma légica que o transcenderia. iil) A liberdade Um quadro juridico que imponha aos agentes economicos, como condigao de ingresso no mercado, algumas caracteristicas, é quase invariavelmente uma barreira artificial que faz perder a todos a maior parte das vantagens do mercado competitive, desfazendo o equilibrio das trocas a favor daqueles que séo resguardados da competigao. A liberdade & 0 mais marcante dos aspectos distintivos do mercado face a ‘utras instituigSes socials. O participante no mercado tem, em principio, plena liberdade de ingressar, seit, reingressar, as vezes que bem Ihe aprouver. iv) A fividez Fiuidez: conjunto de caracteristicas © de circunsténcias que permitem ao consumidor no se deixar enganar pelos vendedores quanto @ possibilidade de se proceder a uma simples comparago de pregos, que the pemmitem aceder as Vantagens da concorréncia perfeita e da guerra de pregos entre verdedores, adquirindo o mesmo produto 20 prego minimo, cu a maxima quantidade do mesmo produto a um dado prego. Trata-se de assegurar 2 transparéncia das motivagdes dos agentes, de maximizat a eficiéncia do conhecimento disponivel ao agente, equilibrando 0 custo marginal da obtencao de informagao mais perfeita com os ganhos que poderiam advir desse acréscimo de informagao. ‘A exigénoia de que nao existam constrangimentos no desenvolvimento dos planos individuais de realizago econémica dentro do livre jogo do mercado 6 agora ‘completada pela exigéncia de que nao exisiam erros na formagao desses planos de realizagdo ou na avaliagéo dos meios que, para 4 consumagéo daqueles planos, 840 fornecidos pel proprio mercado. Para que um mercado veja funcionar no seu seio, sem entraves, o mecanismo dos pregos, deve pressupor-se que nele existe pelo menos uma predomindncia de informacao e de racionalidade, que permite discemir o que & igual e o que € diverso nos produtos para lé das meras aparéncias, facuttando, aquele que opta, uma base para a adopgao de critérios racionais. E essa combinacao de informagao com racionalidade que genericamente se designa como “fluidez". Vv) 0 nivel concorrencial A existéncia de um maior ou menor grau de atomicidade, de liberdade e de fluidez determinaré, em principio, que um mercado coja mais ou menos competitive. Num extremo, encontramos situagées proximas da concorréncia perfeita, em que ninguém dispde de poder de mercado; nouiro extremo, temas situagdes em que o poder de mercado se manifesta através da formacao dos pregos, ndo pela acco combinada das foras em concorréncia, mas pela vontade de um Gnico agente ou de um grupo restrito de agentes, para os quais os pregos correntes dekxam de constituir um dado para passarem a ser uma variével, que eles conseguem manipular dentro de certos limites (“price makers") Nalguns casos, ha monopétio (apenas um vendedor) ou monopsénio {apenas um comprador); noutros casos, ha oligopélio (numero restrito de vendedores) ou oligopsénio (numero resirilo de compradores). n&o se podendo considerar que exisle atomicidade; noutros casos ainda, a concorréncia do mercado Rita Mota e Pedro Galvio 34 Resumos de Microeconamia procura deliberadamente sacrificar a fluidez, apostando cada vendedor na diferenciagdo dos seus pradutos e na segmentagéio do mercado em pequenos “nicho de exolusividade” —> concorréncia monopolistica (todos vendem produtos similares, procurando conquistar clientela através da diferenciapao ostensiva desses produtos). ‘Quando nos aproximamos do paradigma da concorréncia perfeita, comegamos a constatar que nesse situacao todo © comportamento gravita em torno da relagdo quantidade-progo, que vende quem apresenta a melhor das relagdes possiveis, e que todos os vendedores que ficam aquém dos valores exiremos desse binémio correm o risco de seram exctuidos das livres preferéncias dos consumidores, ¢ portanto das transacgdes, do mercado. O vendedor que vence na competigao nao & aquole que apresenta 6 melhor produto, mas aguele que faz o melhor preco, O paradigma da concorréncie perfeita parece assequrar, com espontaneldade, 2 satisfagao maxima do consumidor. ¢] Factores da oferta num mercado concorrencial O mecanismo da oferta e da procura 6 considerado o instrumento analitico basico da ciéncia econémica, especialmente pelo que ele permite em termos de Previsdo de efeitos nos precos @ nas quantidades transaccionadas de algumas Modificagoes de circunsténcias de mercado. Oferta: posigo dos vendedores no mercado, vendendo produtcs ou disponibilizando os factores produtives no respectivo mercado, sendo a quantidade oferecida fungi do conjunto de produtos de que os vendedores dispéem ¢ sao capazes de vender, dado um nivel de pregos. Nao é s6 do prego que depende a atilude da oferta, existem outras seterminantes: ‘A dimensio do sector; O progresso tecnolégico; O custo dos factores de produgo; O prego de bens relacionados na produg3o com 0 bem ou servigo oferecido; A organizagao do mercado; ‘Os choques exégenos aleatérios; As finalidades do produtor; * __As expectativas dos produtores-vendedores quanto evolucéio do mercado e dos pregos. #) Precas “Lei da Oferta": Quanto mais elevados sao os pregos, maior 6 a oferta; quanto mais baixos, menor a oferta. E uma corelagao directa; consiitul uma tendéncia (ceteris paribus) da oferta para acompanhar, no mesmo sentido, as variagdes dos pragos. Produzir ou obter um bem para o ofrecer nun mercado envolve custos, por ‘sso, quanto mais elevados s80 os pregos, maior é @ possibilidade de esses custos sersm cobertos pelo total da receita obtida com as vendas, ¢ de so obter até um remanescente de rendimento que premeia o esforgo do vendedor ("excedente do Produtor” ou “lucro”), “Mesmo um prego baixo compensador para produtor se a quantidade produzida for es: mas s6 um prego elevado recobriré a elevacdo de custos marginais inerente a uma producdo mais volumosa. © aumento da oferta tende a fazer-se, no curlo prazo, a custos crescentes, com perdas marginals de eficiéncia, A escala da oferta parte de um ‘ponto inicial”, ou seja, do ponto em que, estando 0 prego de mercado abaixo do custo de produgdo da primeira dose de um bem ou serviga, nada se produz. Rita Mota e Pedro Galva 35 Resumos de Microeconomia Em caso algum 6 racional produzir um bem cujo prego seja inferior ac seu custo marginal, pelo que qualquer subida do prego em relacdo a0 nivel do custo marginal incentiva racionalmente a produzir mais; isto, se envolve custos marginais crescontes, $6 se justifica se essa subida de custos for mesmo assim coberta por uma subide proporcional, ou mais que proporcional, dos pregos, A curva da oferta representa 0 conjunio de pontos minimos da disposicgo de vendier (prego minima 3 que alguém julgaré compensador produzir e vender mais uma unidade de um bem ou servigo). li) Custo dos factores Se @ producto 4 0 fnito de uma combinagae de factores, os custes de Produgao héo-de consistit essenciaimente na remuneracao que esses faciores reclamam pela sua participagao no processo produtivo. Se porventura essa remuneragao varia, nalural 6 que isso se repercuta no nivel da_produgao, © portanto da oferia, gerando-se uma correlacéo inverse, que essencialmente consiste no facto de, ceteris paribus, o aumento dos custos tender a reduzir os incentivos @ produgao e a diminuir a oferta, e de a diminuigao des custos tender ac aumento da oferta. i) Rendibilidade de produgées alternativas Alguém que pretenda produzir e oferecer bens no mercado faré uma opcéo pele processo produtivo que seja mais susceptivel de Ihe proporcionar um lucro. Se porventura subsistir durante 0 processo produtivo uma flexibilidade de afectagao de recursos que permita ao empresario deslocar-se agilmente para a produgao que em cada momenio seja a mais rentavel, a oferta de um bem restringir- 86-4 drasticamente se aumentar a rendibilidade, a susceptibllidade de hicro, de autras Produgses @s quais possam ser afectados. sem grande perda de eficiéncia, os factores ja disponiveis; e expandir-se-4 se essas produrGes alternativas conhecerem ‘quebras de rendibilidade, tormando-se menos atraentes. Existem bens sucedéneos na produgao, sendo que o aumento da oferta de um bem impiica a diminuigao da oferta dos seus sucedaneos. Hé bens de produgao conjunta ou complementares na produgao, em que, aumentando a oferta de um bem, porque por exempio aumentou o respectivo prego, se seguiré 0 incremento da oferta do outro. iv) Tecnologia A tecnologia influi no nivel de oferta exclusivamente por via dos custos de produgao, “Lei de Moore”: © prego da “poténcia computacional” tende a reduzir-so a metade em cada 18 meses, cadéncia que aclualmente acelerou para cadéncias de menos de 12 meses. Os “saltos qualitativos" que 2 evolug&o tecnolégica permite véo para Id das simples incidéncias nos custos, e prendem-se também com as possibilidades de geragao de novos mercatios e de novos habitos de consumo. ‘A escata da oferta representa 0 canjunto de respostas dos vendedores a cada um dos possiveis pregos de mercado, simbolizando a disposigSo de vender que ha- -de comegar por estar condicionada pelo custo de produgo dos bens, naquele preciso estadio de evolugo tecnolégica. vendedor atento a totalidade das virtualidades do progresso tecnoiégico n&o deixar de explorar também a capacidade de condicionamento das necessidades dos consumidores, induzindo-os a procurar uma melhoria qualitativa no seu grau de satistagao, que se prende com a multiplicagdo de necessidades secundarias é com 0 Rita Mota € Pedro Galvao 36 Resumos de Microsconomia ‘seu lento transito para o estatuto de necessidades primérias. O progresso econémico permite-nos viver melhor, e no apenas sobreviver, encarando uma ceria qualidade de vida como limiar minimo aceitével de sobrevivéncia dentro de um contexto social € civilizacional determinado. - ‘O progresso tecnolégico pode propiciar tanto a expansio da oferta como a da procura, assegurando ganhos mituos através do incremento das trocas. v) Dimensao do produtor © nivel da oferia dependera em muitas situagdes da dimensao efectiva do produtor e daquela que Ihe & possivel alingir dentro dos limites de um determinado mercado. Ultrapassada uma certa dimensdo minima, o produtor pode comegar 3 ‘experimentar um abaixamento dos custos unitarios dos seus produtos, tomando-se desse modo tanto mais eficiente quanto malor for a escala da sua produgdio: A dimens&o do mercado 6 o nico limite aparente ao crescimento do produtor. Em muitos casos, 0 incremento da dimens&o do produtor nao sé nao 6 possivel, dada a limitagdo absoluta do mercado, como pode inolusivamente redundar em diminuigSes da oferta. vi) Objectives do produtor Uma subida de pregos pode nao induzir imediatamente um aumento da oferta, se o produtor pautar 2 sua conduta por consideragbes estratégicas como: » - ‘Esperar que 08 concorrentes acompanhem a subida da pregos para, resistindo a ela, alargar o seu “nicho" de clientela; +" No aumentar a oferta para no revelar a total amplitude da sua capacidade de resposta, para nao ficar refém dela; . Estando no iimite da escala de eficiéncie, nao amiscar um aumento de produgo que venha a traduzir-se num agravamento progressivo dos custos. vil) Expectativas © nivel actual da oferta pode depender de simples expectativas quanto 4 préxima evolucdo do mercado: Aquele que prevé uma queda de pregos tentara vender imediatamente 0 seu sfock de produtos, muitas vezes desencadeando, com essa atitude, a propria queda de pracos de que aparentemente fugia; aquele que prevé uma subida de pregos procuraré acambarcar os produtos, restringindo a oferta até que os Precos subam efectivamente, alitude especulativa que, pot sua vez, tenderd a provocer por si mesma a subida prevista. Designa-se por “Efeito de Edipo” as capacidades que as previsbes tém por elas proprias de desencadear os efeitos previstos. (@) Factores da procura num mercado concorrencial A quantidade procurada dos bens e servigos hé-de resultar de uma disposigao para suportar os custos da aquisig&o e de uma determinada capacidade econémica ara arcar com essa aquisiggo. A procura é a quantidade de produtos que as familias © as empresas decider comprar, dada a relapao entre as suas limitagSes orgamentais, € o nivel dos pregos daqueles produtos. Além dos pregos, outros factores podem influenciar o nivel da procura, destacando-se entre eles: » —Mudangas no rendimento médio dos consumidores; + Mudangas nas preferéncias ou gostos dos consumidores; " Onivel des pregos de produtos relacionados com os produtos em causa; Rita Mota e Pedro Galvao 37 Resumos de Microeconomia ‘A dimensio da poputagao de consumidores; Condigdes espsciais de exacerbagao de necessidades; Expectativas: Quadro distributivo © redistributive de rendimentos (poder de compra efectivo dos consumidores). i) Os pregos Quanto menor for 0 prego unitario, maior sera o niimero de unidades que se Pode adquitir pelo mesmo vaior total. “Lei da Procura” (ou “iej de procura decrescente"): & uma correlago inversa, ou seja, @ procura tende, ceteris paribus a diminuir quando ocore uma subida de pregos, e tende a aumentar por ocasiao de uma quada dos pregos. Esle principio geral nao é isento de excepgées. A futilidade é um poderoso motor da actividade econémica. “Ter sucesso” significa, para a esmagadora maioria das pessoas, ter meios de suporte de uma ostentagao com sabor a vitoriana comparacaa € na emulagao em que se afere a riqueza pessoal e a posigZo social que ‘essa riqueza confare. A escala da procura representa o panorama das escolhas possiveis para cada nivel de pregos dentro de um periodo de tempo delimitado. © mercado livre demonstra que nao ha uma Gnica quantidade procurada, mas tantas quantos os preces possiveis, pelo que tudo depende do prego que prevaleca, @ da interacgéio que se gere entre esse prego e a reacgao dos potenciais compradores. i) O rendimento disponivel , __ Para que haja efectivamente procura, ¢ necessério que exista a capacidade para supartar o pagamento dos precos. A procura individual dependeré do nivel de Tendimento de que cada um disponha, e poderd oscilar em fungSo das proprias variagdes desse rendimento. © problema primordial de quaiquer consumidor é relative ao destino a dar ao rendimento de que possa dispor na afectaggo entre finalidades alternativas que the Possibilitada pelos meios de que o rendimento se compie. Bens normais (que inclusm os bens normais de luxo ou bens superiores): 0 consumo aumenia com o aumento do rendimento disponivel dos consumidores (correlagéo directa). Bens inferiores: o consumo tende a diminuir quando o rendimento aumenia, @ aumentar quando o rendimento diminui (correlagae inversa). iii) A existéncia de bens sucedaneos e complementares Se a baixa do prego de um bem determina habitualmente a quebra da procura de outros bens, cu se o aumento do prego de um é habituaimente acompanhiado do aumento do volume de venda dos demais, dir-se-d que séo bens sucedaneos. A disputa entre os bens suceddneos assenta na ponderagao relativa dos seus. pregos. Bens complementares: a procura de um bem revela uma correlagao directa com a procura de outros bens; bens que habitualmente so utiizados conjuniamente, dependendo a uttlizagSo de cada um da disponibilidade dos outros no mercado. iv) Os gostos A motivaggo real e profunda do consumidor escapa @ andlise econdmica. Encontram-se excepodes @ tendéncia da correlagéo inversa, © esses excepgdes podem ser sempre atribuidas a interferéncia dos gostos. Rita Mota e Pedro Galvao 38 Resumos de Microeconomia Ascendente do gosto: factor de subjectividade que € indissoclavel das preferéncias livremente manifestadas. v} O efeito da publicidade Nao se pode afirmar que a esfera de subjectividade do consumidor seja imune a influéncias externas, que néo se deixe sobredeterminar pelo poder de sugestBo associado 4 informagao que acompanha os produtos oferecidos no mercado. = Esse “efeito de dominio” existe e condiciona profundamente as preferéncias dos consumidores, substituindo-se regularmente ao esforgo de informagéo © de discriminagso dos produtos, de exame das altemativas de consumo, de escolha racional em funcdo de uma relagdo “utilidade-custo”, a ponto de os fazer perder de vista 0 cardcter decisivo dos pragos. , E a racionalidade de uma “informagao imperfaita” que em larga medida justifica 0 sucesso da concarréncia monopolistica. vi) As expectativas © nivel da procura dependeré muito frequentemente das expectativas do consumidor quanto & evolicao, seja dos preges, seja do seu proprio rendimento disponivel m A poupanga & a conversao de rendimento presente em consumo ‘futuro, logo, aquele que julga que o seu rendimento decairé no futuro, comega desde ja a restringir © consumo; aquele que se convence da iminéncia de um aumento de rendimento, perder o incentive pare poupar. ‘Aquele que julga que os pregos subirdo, anteciparé 0 consumo, $6 porventura os bens sdo armazenaveis e a subida de’ pregos previsia nao é tao longinqua que acabe por néo interferir nos custos de oportunidade de adianrento do consumo; aquele que julga que os pregos desceréo adiaré o consumo, esperando conseguir futuramente baixar os custos inerentes ao seu nivel de consumo, ¢) Totals de oferta e procura ] Tende a formar-se uma correiagao inversa entre a variagao dos pregos e a variagéo da procura. Essa correlagdo pode ser representada por uma escala da procura (uma tabela que indicasse, para cada um dos possiveis niveis de pregos, © nivel de procura com que os consumidores comesponderiam) ou o seu equivalents grafico, uma curva da procura, que ideaimente ligasse num continuo todos os pares “precos-quantidades procuradas”, demonstrando que, ceferis paribus, as quantidades procuradas serdo tanto maiores quanto menores forem os pregos, e que uma subida dos pregos seré acompanhada de uma retracgo da procura. ‘A procura num mercado ndo costuma restringir-se 20 comportamento de um $6 consumidor, e€ antes € constituida pelo somatério de todas as escalas de proferéncias de todes os consumidores de um determinado bem ou servigo que seja oferecido no mercado. O nivel da procura depende do numero de consumidores, allerando-se a escala da procura, destocando-se a propria curva da procura com a entrada de mais um consumidor no mercado e aumento da quantidade procurada para ‘qualquer nivel de pregos. A nivel de valores de mercado, oU totais, para 2 procura, hé ainda outras causas de variagdo da respactiva escala que devem ser autonomamente considerados, como os efeitos demograficos. possivel conceber-se uma escala da oferta (tabela indicando as relagbes entre pregos © quantidades oferecidas que cobrisse @ amplitude total do especiro da ‘disposigao de vender" de cada produter) ¢ 0 seu equivalente grafico, uma curva da Rita Mota e Pedro Galvio 39 Resumos de Microeconomia oferta qué ligasse num continuo todos esses pares “pregos-quantidades", revelando: de forma sugestiva e sintética 2 corelagao positiva que, do lado da oferia, se regista entre esses dois valores. A quantidade oferecida é fung&o do némero de vendedores que se encontram presentes no mercado. A oferta total é, num dado mercado, o somatorio daquilo que. 8m cada nivel de pregos, ou de intervalo de pregos, os vendedores eslao dispostos a transaccionar e @ produzir ou adquirir para vender no mercado. [9.0 prego ea quantidade de equilibrio © prego representa 2 avaliacdo que ambas as pares nas trocas fazem dos bens ¢ servigos transaccionados, por isso ele espelha a escassez desse objecto das transacgbes. Quando um prego estabiliza, ele transmite as partes a informagao de que aquele é 0 limite maximo do incentivo para produzir e para consumir, e que uma das partes nao consegue prosssguir para la daquele ponto sem detrimento da posicaio da outra. Quanto mais elevado 6 © prego correspondente a esse ponto, mais nitida se torna a percep¢ao da escassez, O grafismo em que se cruzam as curvas ds oferta e da procura é designado or “cruz marshalliana” (Affred Marshall), e 0 ponto de intercepgao € precisamenie esse ponte de equilfbrio, ponto de coincidéncia entre um prego de equilibrio e uma quantidade de equilibrio. 1) Deslocagdes das curvas da oferta e da procura Quando os ‘consumidores esto dispostos a rever toda a sua escala de preferéncias, ou soja, estia dispnsins a alterar a relagéin “quantidade-prago” a qualquer nivel de pragos ¢ de quantidades, dir-se-A que a curva se retraiu ou expandiu como um todo, e que consequentemente toda a curva da procura se deslocou. Nao ha expanséo ou retracgio globais da procura, a curva da procura néo se desloca e apenas se regista um movimento ao longo de curva, se @ Unica coisa que varia nas transacodes € 0 prego, e 0 que se regista € uma reacgao do consumidor dentro dos parémetros daquilo que constituia ja @ sua escala de preferéncias. Quando se tenta condicionar 0 comportamento dos consumidores & possivel a opgdo por qusiquer uma das vias (a da reacgio quantitativa aos pregos ou a da contracgSo ou expanséo da procura como um todo), ou por ambas simuttaneamente. Quanto 4 curva da oferta, também assistimos a movimentos ae fongo da curva se, ceteris paribus, tiver ocorrido uma simples variagao de pregos, caso em que © vendedor, sem altcrar a sua escala de preferéncias, se cinge a transitar de uma determinada relagao “preco-quantidade oferecida” para oura, ambas ja representadas, na mesma escala. DA-se uma deslocago da propria curva, uma expanse ou contracgo da oferta como um todo, se 0 que varia 6 outro factor que néio o prego. Ocorreu uma variacio na procura ou na oferia se tivermos verificado que tiveram lugar deslocagdes globais das curvas respectivas, @ que correu uma mera variagao nas quantidades procuradas ou oferecidas se no constatarmos mais do que mavimentos ao longo daquolas curvas, e no qualquer variacao do perfil destas. ii) A formagao do equilibrio As curvas da oferta e da procura representam 2 tipos simétricos de correlacao com os pregos, e pode dar-se 0 caso de elas se interceptarem, ou seja, de haver uma situagéo em que a um s6 prego corresponde a mesma quantidade oterecida © Rita Mota ¢ Pedro Galvio 40 Resumos de Microeconomia procurada. Nesta situagdo esta formado um binémio “prego de equilibrio-quantidade de equiliorio® querendo isso dizer que: © A.umprego superior, os vendedores esiariam dispostos a transaccionar mais bens & servigos do que aqueles que os compradores estariam dispostos @ adquirir; > Aum progo inferior, a situago inverter-se-ia, manffestando os compradores uma disposiga0 para transaccionar superior aquela que seria manifestada pelos vendedores; = Nao seria possivel transaccionar-se uma quantidade superior, visto que isso Teclamaria simultaneamente uma subida de pregos, para incentivar um aumento de produgo, uma queda de preqos, para incentivar um aumento de consumo: : Nao seria possivel transacconar-se uma quantidade inferior, visto que também isso pressuporia uma simultanea queda de pregos que desincentivaria 3 produpdo, e uma subida de pregos que restringisse 0 consumo. Este equillbrio optimiza a posigso dos intervenientes do mercado; nJo ¢ possivel transaccionar-se mais, o que quer dizer que os compradores adquiriram tudo © que podiam adquirir © que os vendedores maximizaram as vendas aié 60 limite do possivel. ‘© ponto de equilibrio é um ponto de estabilidade porque & 0 dnico em que podemes afirmar que ambas as partes nas trocas estao a fazer precisamente aquilo Que querem; al atinge-se o maximo de satisfag&o combinada dos interesses de vendedores ¢ de compradores que, naquele momento do mercado, era alcancavel ‘© proprio mecanismo dos pregos, com aigum automatismo, faz o mercado chegar, @ regressar, a uma posicao vantajosa para os dois lados envolvidos nas trocas, ‘a uma posicgo em que, dadas aquelas escalas de preferéncias, nada se conseguiria fazer de mais eficiente. ‘Sempre que estamos perante um prego de desequiliirrio, sabemos que existe uma presséo sobre esse prego @m diracgao 20 ponto de equilforio, © Unico que nao esta sujeito a pressoes. Situago de equilibrio: situago em que no existem razBes, ou impulsos, para modificar os resultados das trocas, 0 ‘cruzamento de oferta e procura comporta Uma estabilidade dinémice (uma tendéncia de regresso @ posigao inicial quando © equilibrio é perturbado) que mais ou menos imuniza 0 mercado contra a instabiiidade estrutural. Equilibrio: ponto a que necessariamente se regressa, por ser 0 Unico no qual no se manifestam impulsos noutra direcgao, sendo que em todos os outros pontos esses impulsos centripetos esto presentes. Na auséncia de impulsos exdgenos, © mercado ou esté em equilibrio ou iende para o equilibrio, ou se dasloca como um todo ‘em direcgao a um novo ponto de equilfbrio, sem instabilidade estrutural. Corolério dessa nogao de squilibrio @ a ideia de que tendem a ser temporarios todos os excedentes e caréncias geradas no mercado. A convicgéo de que os mercados séio adequados 4 produgao mecanica desse resultado exprime-se por um principio que aparece habitualmente designado como “Lei da Oferta e da Procura’, a qual sustenta que, no simples pressuposto da liberdade nas trocas, os pregos sfectivamente praticades no mercado tendem a convergir para um prego de ‘equilibrio, seja porque coincidem jé com esse ponto, seja porque 0 desequilibrio os impele pare ele. ili) A deslocagao do ponto de equilibrio © prego de equilibrio passa a estar sujelto a press6es quando a desiocago das préprias curvas da oferta e da procura leva a formagao de novos pontos de equilibrio, para os quais os anteriores pontos de equilibrio s80 “empurrados”. Na hipétese mais complexa de deslocagao simulténea, e em sentidos opostos, das curvas da procura e da oferta em resultado de uma mera expectativa de subida de pregas, a ciéncia econémica muito sintomaticamente desempenha um papel Rita Mota e Pedro Galvao 41 Resumos de Microeconomia duplo e bem contrastante: transmite-nos a certeza de que os pregos subirao sempre: ‘em resultado daqueta expectativa e confronta-nos com a divida do que sucederé com ‘as quantidades transeccionadas, com o volume de negécios. ‘Se ambas as curvas se deslocarem no mesmo sentido, as certezas incidem sobre as quantidades transaccionadas (que aumentam se as curvas da oferta © da procura se deslocarem no sentido da expansdo ¢ diminuer se ambas as curvas se deslocarem no sentido da contracgo), incidindo a indefinigao sobre o nivel de pregos que equilibrard essas transacgées, (@) Aafectagao de recursos através dos precos “Funcionamento do mercado”: forma esponténea de nos comportarmos quando nos é confiada a solugao dos nossos problemas econémicos. Oferta designa o universo de todos aqueles actos singulares com que, recorendo a bens ou aptidées nossos, contribuimos para a satisfagio de necessidades alheies. Procura designa 0 conjunto de contributes para a satisfagao das nossas necessidades que podemos retirar de bens ou aptiddes alheios. Através da oferta, tornamo-nos titeis; através da procura, utilizamos. Oferta e procura designam as relagdes Intersubjectivas por meio das quais os bens © servigos séo encaminhados para quem thes atribui mais utilidade. Esse tneaminhamenta 6 2 forma de idermos, rum ambiente de berdade, com a escassez a ica. 1) © valor de troca Nos alvores da ciéncia econémica, procurou-se afirmar a capacidade de organizagéo espontanea e livre do todo da sociedade em tomo das fungSes econémicas basicas. Nenhuma supra-ordenagao politica tem que determinar o que é que cada um faz, como e quanto & que cada um caniribui, o que ¢ que cada um consome e quando. Basta que cada um confie no mecanismo de pregos, ou, mais particularmente, que confie na existéncia de um padrao geral de valor nas trocas, @ através dele na expressao uniforme e segura das suas proprias avaliagdes subjectivas em cada fransacgao que empreende. ‘Que “descentralizagao" ndo signifique “caos", deve-se & universalidade do mecanisme dos pregos como meio de afectagio de recursos @ de sinalizagBo de incentivos. O mecanismo da oferta e da procura 6 inequivoca na definic¢ao do que € © valor de troca de um bem (resulta da intercepgao das escalas da oferta © da procura), que difere do valor de uso (resulia da sobreposi¢ao de um juizo subjective de mérito, de uma apreciagao relativa a uma possivel caracteristica intrinseca ou invariavel dos bens ou servigos) — paradoxo do valor (Adam Smith} - © valor hé-de ser uma atribuiggo subjectiva de contomos mais ou menos nebulosos ¢ arbitrarios, e o prego, conquanto fenha na raiz um entrechaque de dues avaliagdes distintas complementares, seré o resultado objective, autométtico, de um jogo de forcas no mercado, que pode dizer-se que ao mesmo tempo representa aquelas avaliactes mas nao coincide com nenhuma. ii) Desequilibrio e reequilibrio Um aumento generalizado da oferta de produtos agricolas, nomeadamente ‘om resultado de um bom ano agricola, tem a tendéncia, perante uma procura que sera normaimente ineldstica, a determinar uma quebra acentuada do prego de equilibrio, uma quebra mais’ do que proporcional ao aumento das quantidades Rita Mota e Pedro Galva 42 Resumos de Microeconomia oferecidas e que tem, por isso, @ consequéncia de resultar numa deterioragao da receita dos vendedores dos produtos agricolas. + “Efeito de King”: um bom ano agricola pode significar a ruina dos agricultores, tat como um mau ano agricola pode, pelas mesmas razbes, contribuir para a fortune dos agricultores que conseguirem manter-se no mercado. Isto dave-se fundamentaimente & inetasticidade da procura de cortos produtos agricolas, que faz com que a quebra de vendas soja menor do que © aumento dos precos. © aumento de rendimento médio dos agricuitores resullante de um mau ano agricola esconde uma extensa redistribuigao de rendimento entre os agricultores, em beneficio daqueles que, apesar de tudo, conseguiram manter a sua produgao. TF conjugagao do efalto de queda de pregos em anos abundantes © de redistribuicso aleatéria da riqueza em anos agricolas maus, tomam inteiramente justificado © recurso a medidas de estabilizagao dos pregos e de garantie dos rendimenios agricolas, com maior ou menor intervenoao do Estado, medidas que se divider em constituigéo de reservas ¢ establlizagao directa dos pregos: = Estabelecendo limites & produg4o, quotas de produgao para cada produtor, * __ Estabelecendo pregos minimos acima do prego de equilibrio ¢ comprando os excedentes de producao dai decorrentes; * Promovendo uma politica de constituig’o de reservas “niveladoras’ similares ‘aquelas que podem formar-se espontaneamente num mercado agricola especulativo. Desde Theodore W. Schultz que se tem vindo a abandonar o preconceito tutelar e paierialisia em relagao a actividade agricola, i) Convergéncia e divergéncia A existéncia de um desfasamento temporal inevitavel entre a solicitagao do mercado e @ resposta dos Intervententes pode influenciar o ajustamento da oferta & procura, em termos de induzir uma separacdo permanente entre ambos, ¢ mais ou ‘menos irasoliiveis flutuagdes de pregos. © diagrama da “tela de aranha” pretende ser uma representagdo da evolugo temporal do “estimulo” © “resposta” representados respectivamenie pelos pregos & pelas respostas da oferta, no sentido de uma eventual convergéncia enire quantidades 2 pregos num ponto de equilibrio. Parlindo de uma posigdo de desequilibrio, tenta-se examinar como é que sucessivas transacgbes procurarao colmatar a brecha que, aquele prego desequilibrado, se verifica: . + "“‘Incentivados pelo prego elevado, os produtores aumentarao a oferta; * Dado o desfasamento com a quantidade procurada aquele nivel elevado de precos, esse aumento de produgao nao seta escoado, a menos que os precos descam; . Verificada essa queda de pregos, os produtores restringiréo @ sua produgSo; . Restrigdio essa que se fara sentir no mercado induzindo uma subida de precos; . incentivados pela evolugo do prego, os produtores aumentargo a oferta; € assim sucessivamente. Existem duas possi que aqui ocorre: = Convergéncia: se a oferta revela menor elasticidade-prego que @ procura, cada nove lance provocaré uma maior oscilagao de pregos do que de quantidades oferecidas, facilitand-se assim a determinacao de um volume equilibrado de transacgdes, sendo, em cada lance, menor o desfasamento entre quantidade oferecida quantidade efectivamente procurada; * Divergéneia: se a oferta revelar maior elasticidade-prego que a procura, a oscilago serd maior relativamente &s quantidades transaccionadas do que quanto aos lidades de desfecho na evolugéo da “espiral dinamica” Rita Mota e Pedro Galvao 43 Resumos de Microeconomia Pregos, pelo que, sendo cada vez maior o destasamento entre as quantidades oferecidas 6 as procuradas, as oscilagdes de precos limitar-se-do a espelhar essa brecha e a ampliéa, As hipdteses de “tela de aranha” divergente sé nao serao mais frequentes Porque, significando elas a impossibilidade de equilibrio, e, com ela, a impossibilidade de transaccionar, em geral a oferia procurara evitar esta armadiiha, 0 que podera conseguir guiando-se pelas suas préprias previsdes quanto & evolugao do mercado, libertando-se da posigéo de “receptor passivo" e desatento das solicitagbes do Mercado, ou constituindo reservas, “stocks”, que permitam responder mais rapidamente as variagdes de pregos no mercado. Também aqui 0 progresso tecnolégico tem permitido aos produtores fugirem da “teia divergente”, por exemplo agilizando @ sua produco por forma a trabalhar por encomenda, sem recurso a “stocks” e a custos de transacgao minimos. h) Estabilizacao e destabilizagaio através da especulagaio A especulacao tem dois limites: 0 da concorréncia € 0 limite temporal da oportunidade. © vendedor que prevé uma nova queda reequilibradora dos pregos nao tera muita amplitude nem muito tempo para especular, os consumidores podem retrair a Procura em consequéncia da sua expectativa de uma proxima queda dos pregos, ‘endo irracionat comprarem imediatamente aquilo que, em breve, poderéo a prego inferior. Do lado da procura, 2 especulegao pode ter um efeito estabilizador dos Pregos: a uma subida de progos segue-se uma reacgio dominada pela expectativa de que 08 pregos voltardo a cair, uma reacc&o que imediatamenfe provoca a queda prevista, amortecendo assim os efeitos da pressao no sentido da subida dos pregos. A especulago também pode ter um efeito destabilizador, isto 6, amplificador das oscilagSes de precos no mercado, naqueles casos em que as expectativas so de que 0 prego caird mais posteriormente, caso em que a reacc&o compreensivel seré a de intensificar © consumo antes que os precos voltem a subir, 0 que tende 2 intensificar e a antecipar as subidas de pregos previstas. Esses aumentos Seren ego inl ou edizoe oo Somer ee gue ¢ Sucedaneos Valor da elasticidade cruzada | A diminuicao de prego de um bem leva ao perfeitos =o desaparecimento da procura do outro © conceito de elasticidade cruzada é da maior importancia para 2 definigao daquilo que constitui um mercado, para a demarcago dos seus limites, pols em rigor 's6 existiré um mercado aulénomo para cada produto se pudermos determinar a inexisténcia de elasticidades cruzadas de valor diferente de zero. [IDA clasticidade da oferta Elasticidade-preco da oferta: quociente entre a veriagao percentual das quantidades oferecidas e a variagao percentuat do nivel dos pregos. Existe uma correfagéo directa entre os movimentos dos pregos © os movimentos da oferta, Ha situagdes em que a oferta no pode deixar de ser pouco eldstica, como por exemplo: ~ . Se a raridade do bem é inultrapassavel, ” Se hd recursos fixos ou ndo-renovaveis; Mas em geral a elasticidade da oferta prende-se muito particutarments com © condicionamento temporal, tendendo a aumentar visiveimente com a passagem do tempo. A elasticidade da oferta vai diminuindo & medida que nos aproximamas do da capacidade produtiva de uma empresa, jé que, quantos mais recursos estéio empregados, mais dificil se torna encontrar reservas disponiveis para a resposta s solicitagdes do mercado, e mais custoso se torna desempregar recursos com o nico fito de voltar a empraga-los na produgSo dos bens mais procurados. No € apenas 0 horizonte temporal que faz aumentar a elasticidade da oferta, visto que sla depende também das possibiidades de substituigéo de recursos produtivos: se um bem ou servigo é resultado de um processo produtivo idiossincrditico, Tequerendo meios e aptiides muito especificos ¢ inutiizdveis noutros processos produtives, é natura! que so registe uma forte inelasticidade da oferta, que esta dependente da exclusividade daqueles meios; se um processo produtivo usa recursos universais e fungivei els numa grande diversidade de empregos, € de esperar ume muito maior elasticidade da oferta. O efeito de rendimento faz diminuir a elasticidade-preco da oferta, e pode mesmo conduzit a uma elasticidade negativa, ou seja, a um aumento da oferta quando Rita Mota e Pedro Galvao 48 Resumos de Microeconomia ‘descem os pregos de mercado. © vendedor precisa de obler una determinada receita (oruta) das suas vendas. Se porventura 0 prego por unidade se reduz, pode ser no s6 ‘Que 0 vendedor nao disponha da opcac de restringir 0 seu volume da vendas, como normaimente resultaria da sua elgsticidade, como até que se vela compelido a aumentar o seu volume de vendas, por forma a assegurar, através destas, uma determinada receita-alvo. A dlaslicidade negativa pode nao ser mantfestago Isolada da posigao de umn nico produtor, e pode antes resultar de um fenémeno colective de mercado. 1) Forma de calculo E possivel distinguir varias hipétesos quanto a olasticidade da oferta: + Aoferta é eléstica quando ela responde mais do que proporcionalmente as variagdes de pregos; * A oferta 6 ineldstica quando ela responde, em termos de quantidades oferecidas, menos do que proporcionalmente as variagbes de pregos: + Acjerta tem uma elasticidade unitaria se todos os aumentos ou diminuigses de pregos 880 acompanhados de aumentos ou diminuigzes proporcionais da oferta, A oferta & totalmente inelastica quando ela nao responde com qualquer alterago de quantidades oferecidas as subidas ou descidas de pregos: + Acferta 6 perfeitamente elastica ou infinitamente elastica quando existe um prego de equilibrio entre ela e a procura acima do qual a oferia ¢ virtualmente infinita, @ abaixo do qual toda a oferta desaparece, passando a ser de zero a quantidade oferecida. ‘A aproximagao da capacidade produtiva plena diminuira a elasticidade da oferta. Essa clasticidade poderé sempre ser recobrada pela dilatagdo do prazo considerado, na medida em que esse alongamento de horizontes temporais aumentara a capacidade de resposta adaptativa. No cruzamento das escalas da oferta e da procura detectam-se algumas tendéncias gerais: = Na presenca de uma oferta relativamente elistica, as oscilagSes da procure tenderdo a influenciar mais as quantidades transaccionadas do que os pregos: .* Se a oferta for relativamente inelastica, as variagdes da procura terao mais impacto nos pregos do que nas quantidades transaccionadas, + Sea procura for muito eldstica, as oscllagies da oferta reflectir-se-20 mais nas quantidades transaccionadas do que no nivel dos pregos; +” Se @ procura for muito ineldstica, os movimentos da oferta repercutit-se-80 mais nos pregos do que nas quantidades transaccionadas. ‘Se @ passagem do tempo tende a aumentar a clasticidade, tanto da oferta como da procura, dir-se-4 que 2s deslocagdes das curvas da oferta e da procura lenderdo a fer, no curto prazo, um impacto maior nos pregos do que nas quantidades transaccionadas, que se convertera, no longo prazo, num impacto maior sobre as quantidades transaccionadas do que sobre os pregos. Tnelasteidade ; Pasticiéade | Valor = 0 | A quanta oferockia no varia com os pregos. ici Valor= | © aumento de prego Teva @ uri aumento menos que Inelasticidade | ootre 0.6 1_| proporcional das quantidades oferocidas, e vice-versa. Hlasisdade | aj, , )© aumenio do prego feva a um aumento proporcional das unitaria quantidades olerecidas, e vice-versa. i Valor= [0 aumento do prego leva a um aumento mals que Elasticidade | ontre 1 @ = | propercional das quaniidades oferecidas. e vice-versa. Elesticidade A diminuigso do prego teva eo desaparecimento da oferta, 0 cidade | Yalor= © | aumonto do proco lova ao surgimento ou expansio infin da Pet oferta. Rita Mota e Pedro Galvao 49 Resumos de Microsconomia i) Blasticidade e poder de mercado A intensidade com que qualquer dos lados, oferta ou procura, reage as varlages de pregos determina por sua vez 0 peso que cada uma tem na conformagao, eM seu proprio beneficio, da deslocaggo do prego de equitibrio. (ver exempics do livro, pp. 342-345) 1) inelasticidade 6 dependéncia Comparagao econémica das politicas proibicionisias ou repressivas face as Politicas educativas e formativas: As politicas repressivas, se levam & restrigSo directa da oferta de bens e servigos para os quais a procura ¢ inelastica, significam que uma pequena quebra de quantidade implica subidas mais do que proporcionais do prega de equilibrio, © que beneficiard os vendedores, para os quais a quebra de vendas é mais do que compensade pela subida dos pregos. Subsistindo @ inelasticidade, a represso constitui a favor da oferta um incentivo econémico 4 subsisténcia da actividade proibida ou reprimida. As politicas educativas ou formativas procuram aumentar a elasticidade da procura, seja aumentando 0 grau de informacao quanto aos riscos do excesso de consumo ou de praticas viciantes, seja fornecendo as vias sucedaneas que desperiem © efeito de substituicao no consumo. Se a elasticidade da procura aumentar, gera-se a possibilidade de uma contraceo da escala da procura delerminar um novo equilibrio que reflicta uma Tedugo simultanea de quantidades e de pregos, ou que a0 menos se dirja para a finha divisoria pare {4 da qual as resiricbes da oferta deixam de significar aumentos mais do que proporclonals dos pregos. . Rita Mota ¢ Pedro Galvao 50 Resumos de Microsconomia ITULO'S A intervengao do Estado no mercado © imputso Interventor do Estado no funcionamento do mercado deve comegar por se dafrontar com 0 mecanismo da oferta e da procura. O proposito interventor 6, muitas vezes, o da rectificagao dos resultados desse mecanismo, quando eles sejam tidos por injustos ou ineficientes. Essa rectificagso @ os meios ‘que conduzam 2 ela so frequentemente iniquos e ineficientes. Uma das conviegdes mais arreigadas dos economistas é a de que 0 facto de © mecanismo dos pregos ser por excel@ncia o proceso coordenador das decisbes econémices nfo se dove a0 acaco; antes resulta do facio de um tal mecanismo ser ele proprio no mais do que uma designagéo abreviada do somatério daquelas decisées. a) Interferéncias na lei da oferta e da procura ‘A geragao esponiinea de um equilibrio no mercado, com efeitos maximizadores e optimizadores, é aquilo que Adam Smith meiaforicamente designou como 0 resutado da acco de uma "mao invisivel”. A sua mensagem val contra todas as tentalivas de inierferéncia paternalista, cujas consequéncias negativas na eficiéncia, na justica © no bemvestar tém sido evidenciades pela historia das interveng6es politicas no mercado. ‘A regulacao de pregos tem levado & ocorréncia de algum, ou alguns, dos seguintes fendmenos: Caréncia dos bens cujos pregos sejam tabelados abaixo do prego de equilibrio, = Surgimento de um “mercado negro” no qual se forma um prego de equilibtio mais elevado do que aquele que se fotmaria sem o tabslamento dos pregos: + Formagao de um “intervalo especulativo” de disparidade entre o prego de equilibrio sem regulacao e o prego de equilibrio com regulacdo; « Existéncia da dispandade entre prego de equilibrio no mercado negro & remuneragao de quem efectivamente produz o bem ou servigo, © que pode afectar permanentemente os niveis de produgéo; = Florescimento, no mercado negro, da economia do crime, numa simbiose com a economia da regulaggo, de que aquela relia a estabilizagao das suas expectativas de ganhos e perdas, a susceptibiidade de exploragao das disfungdes induzidas no livre funcionamento do mercado e das préprias “falhas de intervengac", quando elas geram dreas de corrupodo e de impunidade; = Percepco, pelos compradores, da destocagdo ireversivel de toda a escala da oferta, ou da degradagao qualitativa dos produtos oferecidos, 0 que por sua vex pode conduzir a um abandono macigo do mercado; = Tendéncia para a expansdio auto-susteniada da burocracia supervisora da reguiago dos pregos, ampliada mais ainda na medida da verificacao da propria ineficigncia da superviséo, gerando-se ‘penumbras hierérquicas" nas quais se instala a corrupgao; = Aumento dos custos para os priprios agentes tutelados, seja os custos de acatamento (compliance costs), seja os de evasio aos regulamentos; * Redugo do nivel concorrencial através da imposigao de uma disciplina uniforme ou de uma segmentagao de mercado que protege os concorrentes uns dos ‘outros, em detrimento da pessibilidade de abaixamento do prego de equilibrio através da “guerra dos pregos”: * No caso de estabelecimento de precos minimos, 0 duplo efeito da degeneragaa em formas concorrenciais que nao incidem em pregos © que par isso podem sobrecarregar 0 consumidor com vantagens indesejadas por ele, ¢ da Rita Mota e Pedro Galviio 51 Resumos de Microeconomia Sobrevivencia de produtores ineficientes, que S60 poupados, com o prego minimo, de uma derrota na "guerra dos pregos". Multas vezes, a adverténcia desapaixonada dos economistas quanto a iminéncia de efeitos perversos em consequéncia da interferéncia estadual soara como afitude fria e cruel para aqueles que se considerem desfavorecidos pelo jogo livre do mercado. Contudo esta adverténcia no chega a ser um julzo de valor, limitando-se @ ser uma constatag3o de facto: sendo inevitaveis caréncias ou desperdicios por efsito da “imobilizago" dos pregos, aqueles que tentem promover esta violagao da din&mica gravitacional @ reequilpfadora do mercado deverdio ter Presente o prego a pagar pelas respectivas consequéncias, de forma a adoptarem, ao menos, soluydes minimizadoras das patologias que inevitavelmente ocorrerao. b) 0 controle dos pregos J Cedendo aos consumidores, 0 Estado pode estabelecer pragos méximos, ‘mais especificamente pregos maximos inferiores ao prego de equilibrio. Se ceader 0s Produtores, optaré por estabelecer pregos minimos, ou mais especficamente pregos minimos superiores ac prego de equilforio. }) Avia dos pregos méximos A via dos pregos maximos & a que se afigura como mais tentadora, visto que transporta a aparéncia de que, uma vez estabelecida, aumentarao as possibilidades do todos acederem a um deierminado produto. © prego maximo eficaz é uma barreira a que 0 prego suba até 2o equilfbrio ajustador da oferta 6 da procura. Dado o desequilibrio e a pressao para a subida, 0 mercado esbarraré com esse limite € 0 prego de mercado sera inevitavelmente esse Prego maximo (perpetuando-se o desequilibrio). Dado 0 excesso de procura relativamente & oferta, seré necessario proceder a um raclonamento, a que serao aplicados critérios varios. Um dos oritérios pode ser 0 de 0s vendedores atenderem sequencialmente os pedidos, 0 que levara a formagao de filas de espera © ao rateio entre os consumidores em fungao do custo de Oportunidade associado ao tempo de espera. ~ Nada, em principio, impedira os vendedores de estabelecerem outros critétios de racionamento, justos ou injustos. Uma via possivel é a da atribuiggo a alquém de critérios distributivos inapetaveis, ou seja, a aceltagao prévia do acatamento definitivo de qualquer decisio que seja tomada por um ditador, 0 que permite “custos de transacgao” aceitéveis e Imuniza a distribuiggio contra a estratégia de dissimulagaio de preferéncias, mas, para la de sacrificar @ liberdade das trocas, néo assegura 2 justiga nem a eficiéncia. ‘Aqueles que sao exciuidos do consumo através das formas de racionamento Por outros meios que no os pregos ficam nao numa situacdo de escassez, mas numa situagao de caréncta absoluta. ‘A solugéio de racionamento poderd ter sido nalguns casos injusta e noutros casos Justa, mais ou menos a0 acaso, mas foi sempre ineficiente. A solucao deste problema é simples: basta desintervir, desregular ¢ especificamente deixar de fixar il) A via dos pregos minimos No caso de o prego minimo ser eficiente, as forcas da oferta e da procura ficam impedidas de “empurrar” 0 prego para baixo, alé ao nivel do equilibrio, querendo isso significar que, neste caso, ao prego que prevalece se verificaré um excedente, um excesso de oferta em relacao 4 procura. Os vendedores sentirao dificuldade em Rita Mota e Pedro Galvio 52 Resumos de Microeconomia escoar todo 0 produto que aqusle nivel de pregos incentiva a vender, @ os incentivou a produzir. Acaba por haver vendedores que, ndo podenda vender nada, se vém excluidos do mercado. ; ‘A fixagao de pregos minimos prejudica todos os consumidores, privando-os do ganho adicional que obieriam com a descida do prego até ao nivel do equilibrio, © prejudica alguns produtores em beneficio de outros. _ Os pregos 86 reequllibram através de uma descida, & qual a maioria dos vendedores acabard por nao se opor, seja porque tém em média uma disposigao de vender que se manifesta ja a um nivel inferior 20 do prego fixado, seja porque, também em média, no conseguem escoar a sua produgso a esse prego, ficando defrontados com um problema de excedentes indesojados. Multas das Intervencées juridicas ¢ politices no mercado referam-se a quesides de eficiéncia e de justica; simplesmente, quando se tenta interferir na justiga comutativa de trocas voluntarias entre pessoas livres 6 muito frequents que so desencadeiem efeitos reequlibradores que anulam o objective distributive, que, por forga da eficiéncia prevalecente dos mecanismos de mercado, suscitam reacsies ‘espontaneas com as quais a justiga é sacrificada. Varias vezes ocorre uma lensdo entre os valores da justiga e da eficiancia, fensdo essa que anima muitos dos dilemas praticos com que a Economia se confronta, condicionando-Ihe as préprias solug6es tedricas. €) Areacgio do mercado negro Se um produtor decidir voluntariamente vender abaixo do prego de equilibrio (15€ em vez de 206), esta a prescindir de uma parte do seu lucro a favor de quem? ‘Suponhamos a existéncia de 2 classes de consumidores: a classe A esté disposta a Pagar 20€ e a classe B 15€. A procura expandiu-se, abarcando as duas classes. Passa a haver uma caréncia do produto, que se resoiverd através da recompra, pela classe A, do que B comprou. Assim, existe uma ‘transferéncia de bem-estar” da parte do’ produtor em favor da classe B, que passa a beneficiar de ganhos de intermediago, No uma situago injusta porque foi um acto voluntario do produtor. Suponha-se que ¢ o Estado a Impor, contra a vontade do produtor, o abaixamento do preco de 20€ para 15€. O produtor 6 desincentivado de produzir, determinando uma situagao de caréncia ainda mais aguda: hé menos produto, mais consumidores (A @ B) e surge em cena uma terceira classe, C, de especuladores que estéo dispostos @ assumir o risco de promover o reequilibrio do mercado através do mecanismo dos pregos, contra a proibigdo legal do recurso a tal mecanismo. C disputa © produto escasso a A e B, independentemente da sua propria disposigao de pager, jogando nos ganhos especulativos da compra ao prego oficial e na revenda a um prego clandestino. O risco da clandestinidade ter por efeito, no minimo, uma nova Tetracgo da oferta, fazendo 0 prego subir em proporgao Aquela retrac¢ao. No final: . Ou © Estado promove uma expansdo da oferta que, ao preco de 15€, consiga satisfazer @ procura, evilando 0 surgimento de © (+ tem de subsidiar o produtor com uma quantia superior ao lucro que ele perdeu, subsidio que sera encontrado em receitas pablicas como impostos, gerando com eles efeitos de “perda absoluta de bem-estar’, “deadweight loss"); * Ou se forma um “mercado negro”, no qual os pregos s&o superiores ao nivel de equillbtio, dada a repercusséo do prémio de risco dos vendedores-especuladores, ©, por isso, a classe A consome menos do que aconteceria aquele nivel, a classe B N&O consome, @ 0 excedente do produtor perde-se numa involuntérie transferéncia de bem-estar em beneficio de uma classe parasitaria, com a agravante de o desvio para a clandestinidade sonegar receitas fiscais ao Estado. ‘Os “mercades paralelos” so uma aberracao, um peso morto na Economia, ¢ se alguma utlidade tem 6 a de evidenciar os custos € a futllidade implicados na maior Rita Mota e Pedro Galvao 53. Resumos de Microeconomia Feta cemeganclas reguladoras do Estado, Sto sinfoma, e nao a causa, da [d)0 caso de congelamento das rendas exemplo mais nitido de fixapao de pregos maximos é o do estabelecimento de limites as rendas no arrendamento para habitago. No curto prazo, tanto a oferta come a procura de arrendamento 50 mut rigidas. A existéncia de Inelasticidade de. ambos os lados determinaré que as oscilagbes de pregos determinem variagdes mais ‘ou menos do que proporcionais de quantidades. A “iravagem’ do preco abaixo do seu nivel de equilfbrio no provocaré uma disparidade muito pronunciada entre procura oferta, no provocaré um grande aumento de procura efectiva, nem ditaré uma retracgéo muito acentuada da oferta. A elasticidade tende a aumentar com a passagem do tempo, levando a um progressive desfasamento entre oferta @ procura aquele nivel de pregos ‘administrativamente fixados. No longo prazo, os senhorios tém tempo para reagir a um prego que os desincentiva de atender a todas as solicitagses da procura. Ao mesmo tempo, entrarée no mercado cada vez mais pessoas atraidas pelo nivel baixo das ‘rendas limitadas. Passa-se de um desfasamento © de uma caréncia relativamente limitados no curto prazo para uma caréncia muito pronunciada no longo prazo. Nenhuma regulamentagao, por mais minuciosa e repressiva que ssja, conseguiré por cobro aos abusos dos senhorios to eficientemente como o faz 0 evantamento dos limites &s rendas, o regresso ao prego de equilibrio e o fermo das caréncias extremas no mercado habitacional, 2) 0 caso des salarios minimos: J Um exemplo de controlo de pregos pela via dos pregos minimes 6 0 do estabelecimento de salarios minimos, O salario é um prego no mercado dos factores, 8 © salério minimo ¢ 0 fimite de que se entende por ficito pagar em contrapartida pelo trabalho. O estabelecimento desse prego minimo, se ocorrer @ um nivel que ultrapassa © de equillbrio, hé-de ter as consequéncias que ja se identificaram: um excesso de oferta sobre a procura (leva ao desemprego). A determinago do nivel a que se deve estabelacer o salério minimo é do maior meiindre, jé que se pretende evitar a ocorréncia ou agravamento de desemprego involuntario, razBo que desaconselha a generalizacso dessa pratica de fixagao de minimos, visto que o custo social de desemprego é menor do que a subsisténcia de seciores com salrios de equilibrio muito baixos. recurso ao salario minimo ha-de situar-se num ponto intermédio, evitando extremos de desemprego e de pobreza associada ao desamprego, e extremos de degradagao das condigSes econémicas da remuneracdo dos jé empregadios. Os dados empiricos demonstram que a presenga de salérios minimos tende a reduzir, para as familias, a probabilidade de cair na pobreza, e aumentando a probabilidade de sairem da pobreza. Certo 6 que a existéncia de salérios minimos Provoca desfasamentos quantitatives no trabalho: = ___ Sela, por exemplo, no mercado de operasios no qualificados, no qual, ou Ocorre desemprego, ou surgem problemas de mercado negro, especificamente de trabalho clandestino no qual as remuneragSes se reaproximam do nivel de equilfbrio, podendo estabilizar abaixo dele; - *__ Seja nas situagdes de busca de primeiro emprego, em que a impreparagso @ @ n&o-integragae_no mercado, a insusceptibilidade de comportamento coligado da oferta no mercado de faclores, mais genericamente a falta de “capital humano” ou de Rita Mota e Pedro Galvaio 54

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