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PROVA 114/12 Pags. EXAME NACIONAL DO ENSINO SECUNDARIO 12.° Ano de Escolaridade (Decreto-Lei n.° 286/89, de 29 de Agosto) Cursos Gerais — Agrupamentos 3 e 4 Duragio da prova: 120 minutos 2002 PROVA ESCRITA DE FILOSOFIA Leia atentamente as instrugdes: + Esta prova 6 constituida por 2 (dois) grupos de questoes: = GRUPO I ~ 3 (\rés) questées; = GRUPO II ~ 1 (uma) questao. + A indicagao do numero de linhas/palavras tem um caracter meramente orientador do grau de desenvolvimento da resposta, +A inadequagao das suas respostas as questées formuladas implicara uma pontuagdo de 0 (zero) pontos. V.S.EF. want GRUPOL Seleccione apenas um dos textos transcritos e responda as trés questées que Ihe so colocadas acerca desse texto e da obra a que pertence. Na resposta as questées 1 © 2 deverd utilizar, em cada uma, aproximadamente 10 linhas (cerca de 80 palavras) ‘Na resposta a questo 3 deverd utiizar, aproximadamente, 40 linhas (cerca de 220 palavras). — Armera transcrigao de frases do texto implicaré uma pontuagao de 0 (zero) pontos ‘Ando manifestagao do conhecimento da obra implicaré uma pontuago de 0 (zero) pontos. 1414/2 DA NATUREZA, Parménides 2 3. (25) 30) a ©) a TEXTO Tu que vens nos coreéis que te trazem & nossa morada, Salve! Nio foi sorte mesquinka que te impeliu a seguir este caminho ~ bem longe do trilho dos homens, na verdade — mas a Justiga e 0 Direito. Forga é pois que saibas tudo: © Gnimo inabalivel da rotunda Verdade © 2 opinido dos mortais, em que ndo hé confianga verdadeira No entanto, aprenderds isso também, como as aparéncias devem ser julgadas, tudo pasando através de todas as coisas. ‘Vamos! Dir-te-ei ~ ¢ tu conserva as palavras que me ouvires — 0 jinicos caminhos da investigago em que deve pensar-se: uum deles € 0 que é; € 0 que ndo é nio existe — €0 caminho da persuasdo, companheira da Verdade, 0 outro, o que nao é, ¢ como € forgoso que no exista; desse te digo que é trilho que se no pode percorrcr. Pois no poderis conhecer 0 que ndo é ~ no € possivel ~ nem declari-lo, . porque pensar & 0 mesmo que existr. Fig. 1, ww. 26:2, frgs. 2, in Hélade, Colmbra, F.LU.C., 1982, p. 128 QUESTOES 4. Caracterize, com base no texto, o estatuto da «opiniao», 2. Explique, a partir do texto, de que modo & excluida a possibilidade de investigagao pelo ndo-ser 3. Exponha a relevancia do excerto no contexto global da obra. V.S.F.F. 11413 GORGIAS, Platao TEXTO GORGIAS ~ Mais surpreendido ficarias, Sécrates, se soubesses tudo, ou seja, que, por assim dizer, ela [a retérica] reine em si ¢ tem sob a sua jurisdigio todos os poderes. Vou te uma boa prova do que afirmo. Muitas vezes acompanhei o meu immo ¢ outros médicos a casa de doentes que no queriam tomar um remédio ou submet ¢ a0 tratamento do ferro ou do fogo. Ora, quando o médico se mostrava incapaz de persuadir 0 doente, fazia-o eu sem mais recursos do que a ret6rica. Mais, ainda: se um orador ¢ um médico se apresentarem numa cidade qualquer a tua escolha € se discutir na assembleia do povo ou em qualquer reunigo qual dos dois deve ser eleito médico, garanto-te que o médico deixa simplesmente de existit € que aquele que domina a arte da palavra se fard eleger, se quiser. Do mesmo modo, seja qual for 0 profissional com quem entre em competigo, 0 orador conseguiré que o prefiram a qualquer outro, porque nao ha matéria sobre a qual um orador nao fale, diante da multidao, de maneira mais persuasiva do que qualquer profissional. Tal € a qualidade e a forga desta arte que & a retorica. Deve-se, porém, Sécrates, usar a retérica como todas as outras artes de competi¢ao. La porque se aprendeu o pugilato, o pancricio e 0 combate com as armas de modo a poder vencer amigos ¢ inimigos, nfo se vai agora fazer uso disso contra toda a gente, a ponto de ferir, trespassar ou matar os proprios amigos. Note-se ainda, por Zeus, que, se alguém frequenta a palestra, onde adquire robusteze bom treino de pugilismo, e se serve depois dessas vantagens para maltratar © pai, a mae ou qualquer dos parentes € amigos, ndo devemos ver nisso razdo para detestar e exilar das cidades os mestres de gindstica e os mestres de armas. E que estes instruem os seus discipulos para que eles fagam um uso justo da sua arte contra os inimigos ¢ contra os maus, para se defenderem, ndo para atacarem, mas os discipulos desviam-se por vezes da linha tragada ¢ usam mal da sua forga e da sua arte. Claro que nio so os mestres que sfo maus nem a sua arte € culpada ou censuravel; a culpa cabe exclusivamente, creio eu, aqueles que fazem mau uso do que aprenderam. Idéntico raciocinio pode aplicar-se a retérica. O orador é, sem diivida, capaz de falar de tudo ¢ contra todos ¢ poderé, melhor que ninguém, persuadir a multido em qualquer assunto que Ihe interesse, mas isso no é motivo para privar da sua reputacao os médicos ou os outros profissionais, nfo basta estar em condigdes de o fazer. A retdrica, como qualquer arte competitiva, deve ser usada com justig Portanto, entendo que, se um homem adquire uma preparagio retorica e depois se serve deste poder e desta arte para praticar 0 mal, nfo hé o dircito de odiar ¢ desterrar da cidade aquele que 0 ensinou. Este ministrou conhecimentos em ordem a um uso legitimo ¢ 0 outro utiliza-os de um modo inteiramente oposto. A justiga manda, pois, que no seja (© mestre mas este, que abusou da sua arte, a sofrer 0 ddio, 0 exilio ou a morte, 4569-4876, Lisboa, Esigbes 70, 1991, pp. 42-43 QUESTOES 41. A partir do texto, mostre que a retérica & uma técnica de «persuaséo sem ciéncian. 2. Explique, com base no texto, 0 perigo representado pelo poder da retérica, 3. Exponha a relevancia do excerto no contexto global da obra. 114/48 FEDON, Platao TEXTO Socrates] ~ (...) Chamar, portanto, «causas» a coisas destas no faz qualquer sentido. Poderd, claro, alegar alguém que, sem possuir ossos, masculos e assim por diante, nao seria também capaz de por em pritica as minhas decisdes ~ ¢ ndo estaria fora da verdade. Agora asseverar que é gracas a eles que fago aquilo que fago, ¢ que é em fungdo do espirito que assim me comporto, mas nao em fungao de uma escolha que fiz do «melhior», eis o que trai porventura excessiva inconsequéncia de linguagem... Trai, em suma, a incapacidade de distinguir que uma coisa é a causa em si, outra, aquilo em cuja auséncia jamais a causa seria causa, Ora, quanto a mim, é nesta tltima que as pessoas visivelmente falham e, como tenteando na escuridio, the atribuem um nome indevido, confundindo-a com a verdadeira causa, E ai estd, pois, porque alguns, envolvendo a Terra num turbilho, querem que seja 0 céu @ manté-la, enquanto outros, fazendo dela uma espécie de tampo largo e chato, the colocam o ar por baixo como base e suporte. Mas esse poder, gracas a0 qual tais coisas se encontram dispostas da forma mais conveniente, isto é, mantendo a posigo que mantém, desse no cuidam eles ou tdo-pouco Ihe atribuem qualquer forga divina... Julgam, pelo contréio, descobrir ainda um dia um Atlas mais possante do que este, mais imortal ¢ capaz de suportar o peso do mundo, sem pensarem que é 0 Bem o verdadeiro elo de ligagdo que liga entre si todas as coisas ¢ as suporta. E, no entanto, confesso, com que alegria me nao teria feito discipulo fosse de quem fosse, para me instruir sobre semelhante causa e seu modo de actuacao! Mas, uma vez que esta me falhou e nao pude, por minha parte, descobri- -la ou achar quem ma explicasse, tive de tentar uma segunda via para me langar na sua busca... Desejas, pois, Cebes, que te conte a historia dessas tentativas? — Por mim ~ respondeu -, ndo desejo outra coisa! — Ora bem — retomou ele. — Depois disto, uma vez desiludido da observacao dos seres, achei por bem acautelar-me, ndo viesse a acontecer-me a mim o mesmo que aqueles que contemplam ¢ observam o Sol em momentos de eclipse: é sabido que alguns chegam a perder a vista, se nao for através da agua ou de qualquer outro meio que mirem a sua imagem. E, com pensamentos mais ou menos deste teor, receei ficar irremediavelmente cego de espitito, caso persistisse em fixar os olhos nas coisas, em tentar tocar-lhes directamente com os meus cinco sentidos. Pensei entio que o melhor que tinha a fazer era refugiar-me do lado das ideias e, através delas, inquirir da verdade dos seres. Aliés, talvez, num aspecto 0 paralelo nao seja exacto, pois ndo €, quanto a mim, ponto assente que 0 cestudo dos seres, através das suas manifestagdes extemas, se revele, menos do que através das ideias, um estudo & base de imagens... Seja como for, o certo € que me lancei por esta via. E assim, partindo em cada caso do pressuposto que julgo ser mais seguro, tudo 0 que se me afigura em concordancia com ele quer no tocante as causas quer a todos os demais, [seres}, tomo por verdadeiro; e em caso contrério, por falso 990-1008, Coimbra, Edtoral Minerva, 1988, pp. 105-106 QUESTOES 1. Justifique, com base no texto, a opgo de Sécrates por uma «segunda via» de investigagdo. 2. Explicite, de acordo com 0 texto, 0 método hipotético de investigagao proposto por Sécrates, 3. Exponha a relevancia do excerto no contexto global da obra. V.S.F.F. 11415 CATEGORIAS, Aristételes TEXTO Passemos agora ao que se opde enquanto afirmagio ¢ negacdo. E evidente que a oposigao ndo se efectua segundo nenhum dos modos mencionados, pois agui ocorre, ¢ s6 aqui, que um oposto deve por necessidade ser verdadero, enquanto 0 outro deve ser sempre falso, No caso dos contririos e dos relativos, dos possessivos e privativos, nao € sempre necessirio que um dos opostos seja verdadeiro ¢ 0 outro falso, por exemplo, saiide e doenga so contrérios, mas nem um nem outro € verdadeiro nem falso. Se tomarmos 0s correlativos dobro e metade, opostos enquanto relativos, nem um nem outro € verdadciro ou falso, ¢ a mesma afirmagéo vale para tudo quanto depende da privagdo e da possessio, como a visdo e a cegueira, Em sintese, a menos que as palavras sejam combinadas entre si, os termos verdadeiro € falso nao so aplicaveis, e todos os ‘opostos de que fakimos sao simples palavras sem composigdo (combinago} Pareceria, ndo obstante, que um tal cardcter se encontraria prineipalmente em contrérios expressos sem combinagdo. «Séerates esté bom» é, com efeito, o contririo de «Socrates esté doenten, mas até nestas expressdes ndo é sempre necessario que uma delas seja verdadeira ¢ a outra falsa, Se, sem diivida, Sécrates existe, uma seré verdadeira € outa falsa, mas, se ndo existe, ambas serdo falsas, pois nem a expresso «Séerates esti doente» nem a expresso «Sécrates est bom» so verdadeiras, se Socrates no existt. Quanto A privag2o e a possessio, se 0 sujeito no existe, nem uma nem outra sao verdadeiras; e, se 0 sujeito existe, nem sempre acontece que uma seja verdadeira e a outra falsa, Na verdade, a expressio «Sécrates vén € oposta a «Sécrates & cego», enquanto possessio ¢ privagio; se Séerates existe, nao é necessario que uma destas, expressdes seja verdadeira e a outra falsa, pois, se Sdcrates ainda no for naturalmente ambas as proposigdes so falsas; e, se Séerates no existe, ambas as expressdes so igualmente falsas, isto é a de que vé a de que é cego. Voltando a afirmagao e a negagZo: exista ou ndo exista 0 sujeito, uma delas sera de qualquer modo falsa ¢ outra verdadeira. Por exemplo: Sderates esti doente © Sécrates 4 doente. Se Sécrates existe, € claro que uma destas duas proposigées é verdadeira, © outra falsa; e, se ndio existe, © mesmo acontece, pois, se ndo existe, afirmar que ele esti doente é falso, mas afirmar que ele nao esti doente é verdadeiro. Assim, os ‘opastos, como a afirmagio e a negagao, tém como exclusiva propriedade a de serem, sempre, um verdadeiro € outro falso. 13837-13035, in Organon, Uisbos, Guimaraes Eitores, 1985, 9p. 98-101 (adaptado) QUESTOES 1. Explique, com base no texto, os casos de oposigdo que nao implicam oposig4o do valor de verdade. 2. Identifique no texto uma formulago do principio de n&o-contradigao. 3. Exponha a relevancia do excerto no contexto global da obra. 114/68 © MESTRE, Santo Agostinho TEXTO ADEODATO ~ 0 facto € que agora tomo tudo s6 pelo lado daquilo que é significado. Concordo efectivamente contigo: de nenhum modo se pode conversar se, a0 ouvir as palavras, o espirito ndo & levado para as coisas de que elas so sinais. (..) AGOSTINHO - (..) Vé pois com especial atengdo se a silaba -ho nada mais é do que -ho, ¢ se a silaba -mem nada mais é do que -mem, ADEODATO — Aqui verdadeiramente no vejo mais nada AGOSTINHO - Vé também se da juncdo destas duas silabas se faz um homem. ADEODATO ~ De modo nenhum o concederia, Ficou efectivamente estabelecido, ¢ estabelecido com razao, que dado um sinal se atende ao que ele significa, e pelo exame disso se concede ou nega ‘© que se diz. Ora essas silabas pronunciadas em separado, por ressoarem sem significago alguma, esta concedido serem elas apenas o que ressoam. AGOSTINHO — Fica pois assente ¢ tu mantém-lo firme no espirito, que se niio deve responder as perguntas sendo segundo as coisas mesmas que as palavras significam. ‘ADEODATO — Nao vejo porque nao haja de ficar assente, desde que se trate de palavras AGOSTINHO ~ Queria saber como impugnarias esse individuo, de quem costumamos ouvir dizer, aos gracejadores, que concluiu ter saido um ledo da boca da pessoa com quem estava a disputar. Tendo, com efeito, perguntado se 0 que dizemos procede da nossa boca, ¢ nao o tendo o outro podido negar, fez com que este ao falar nomeasse um leo, 0 que foi ficil de conseguir. Quando tal aconteceu, comecou a injurid-lo jocosamente e a aperté-lo, porque tendo confessado que tudo aquilo que proferimos sai da nossa boca e nio podendo negar que tinha proferido -lefo, sendo ele homem sem maldade, dava mostras de ter langado pela boca um animal tdo feroz. ADEODATO ~ Pois nio seria nada dificil impugnar esse gracejador. Eu no concederia que sai da nossa boca tudo aquilo que dizemos. Com efeito, aquilo que dizemos significamo-lo. Ora da boca de quem fala nio sai a coisa que se significa, mas o sinal com que ela se significa, a nfo ser quando se significam os proprios sinais, Deste caso tratimos pouco antes. AGOSTINHO ~ Estarias de facto bem munido contra tal homem, dessa maneira. Entretanto, que ‘me responders ao perguntar-te se -homem é um nome? ADEODATO — 0 qué, seniio um nome? AGOSTINHO ~ Como assim? Quando te vejo, vejo porventura um nome? ADEODATO ~ AGOSTINHO ~ Queres entdo que te diga 0 que se segue? ADEODATO ~ Nilo, peso-te, pois eu a mim mesmo declaro nfo ser um homem, eu que respondi ser um nome, quando me perguntaste se -homem era um nome. Com efeito, ja tinha ficado por nds assente que, a partir da coisa significada, & que se aprova ou se nega o que se diz. AGOSTINHO - Mas a mim parece-me que nao foi sem motivo que caiste nessa resposta; & que a propria lei da razdo, inscrita nas nossas mentes, sobrepujou a tua atencdo, Se (...) perguntasse simplesmente: 0 que & -homem? silenciando nome ¢ animal, 0 espirito dirigir-se-ia para aquilo que é significado pelas duas silabas, por essa lei da fala por nés aceite, nada mais se responderia sendo animal, ou mesmo pronunciar-se-ia a defini¢do completa, ou seja -animal racional mortal. In Opaseuios Selectos da Filosofia Medieval, Braga, Faculdade de Fiosofia, 1991, pp. 82-95, QUESTOES 1. A partir do texto, explicite a fungao das palavras. 2. Explique a «i la razo», ou «lei da falan, referida no texto. 3. Exponha a relevancia do excerto no contexto global da obra. V.S.F.F. 41417 PROSLOGION, Santo Anselmo TEXTO Capitulo TIT — Nao se pode pensar que Deus nao existe. E de facto, [Deus] existe tio verdadeiramente, que nem se pode pensar que ndo exista. Com eftito, pode-se pensar que existe certa realidade, a qual no se possa pensar que nio existe. Tal realidade é maior do que outra que se pode pensar que no existe, Consequentemente, se se pode pensar que no existe -aquilo, maior do que 0 qual nada se pode pensar-, aquilo mesmo, maior do que 0 qual nada se pode pensa nao € -aquilo, maior do que 0 qual nada se pode pensar. Ora tais afirmagdes sio incompativeis. Por conseguinte -aquilo, maior do que qual nada se pode pensar- existe tdo de verdade, que nem se pode pensar que nio exist. () Capitulo IV — Como o insipiente disse no seu coragao 0 que nao se pode pensar. Como porém disse [0 insipiente] no seu coragdo aquilo que no pode pensar, ou como é que nio péde pensar o que disse no coragiio, jé que pensar e dizer-no-coragio so a mesma coisa? Mas se verdadeiramente, e ainda mais porque verdadeiramente no 86 0 pensou, jé que 0 disse no coragdo, mas também nio 0 disse no coragio, porque néo 0 péde pensar, -ndo & de um sé modo que alguma coisa se diz no coragdo ou se pensa. De um modo diferente se pensa uma realidade, quando se pensa a palavra que a significa, e de outro modo diferente, quando se inteleceiona aquilo mesmo que essa realidade é. E assim, do primeiro modo pode-se pensar que Deus nio existe; do segundo modo é absolutamente impossivel. Na verdade, ninguém que inteleccione aquilo que Deus € pode pensar que Deus nao existe, embora diga estas palavras no coragao, ou sem nenhuma ou com alguma significagao inconexa. Deus, com efeito, & -aquilo, maior do que o qual nada se pode pensar-. Quem intelecciona isto devidamente intelecciona sem diivida que isso mesmo existe de tal mancira, que nem em pensamento pode ndo existir. Quem por conseguinte intelecciona que Deus existe desse modo ndo pode pensar que Ele nao existe. In Optsculos Seloctos da Filosofia Modioval, Braga, Faculdade Ge Filosofia, 1991, pp. 138-140, QUESTOES 1. Explicite, com recurso ao texto, por que razo 6 impossivel pensar que Deus ndo existe. 2. Caracterize, com base no texto, a nogo que o «insipiente» tem de Deus. 3. Exponha a relevancia do excerto no contexto global da obra. 11418 O SER E A ESSENCIA, 8. Tomas de Aquino TEXTO ce ) © que nao faz parte do conceito de esséncia, ou quididade, isso vem de fora, faz composigao com a esséncia, pois nenhuma esséncia se pode conceber sem os elementos que sio partes da esséncia, Ora toda a esséncia ou quididade se pode coneeber sem que se conceba nada a respeito da sua existéncia, Posso efectivamente conceber 0 que é 0 homem ou a fénix e, apesar disso, ignorar se tem existéncia na Natureza, Logo, & patente que a existéncia é diversa da esséncia ou quididade, a nao ser no caso de existir alguma realidade, cuja quididade se} sua mesma existéncia, Tal realidade, porém, no pode ser sendo uma sé e a primeira [de todas] Efectivamente, & impossivel que se dé a plurificagao de uma coisa, a no ser, (1.], ou por adiglo de algum discrime, que & 0 modo como a enticidade [esséncia] constitutiva do género se multiplica nas espécies; [2°], ou pelo facto de que a dinase {forma] é recebida em matérias diversas, modo como se multiplica a enticidade [esséncia] da espécie nos diversos individuos; [3.°], ou pelo facto de que uma coisa existe independentemente, ¢ outra é recebida nalgum principio [diferente]; por exemplo, se existisse algum calor independente [de qualquer corpo}, ele seria, pela sua mesma independéncia, diverso de outro calor no independente. Se, porém, se considera [a natureza de] alguma realidade que seja unicamente existéncia, de tal modo que essa mesma existéncia seja subsistente, esta existéncia nao recebera a adigao de qualquer discrime, pois que ja nao seria unicamente existéncia, ‘mas existéneia ¢ além disso certa dinase, Muito menos recebera a adigdo de matéria, pois jd niio seria uma existéncia subsistente, mas material, De onde se conclui que tal realidade, que seja a sua existéncia, no pode ser sendo uma s6. Por conseguinte, exceptuando essa realidade, em qualquer outra a sua existéncia tem de ser uma coisa, © coisa diferente a sua quididade ou esséncia, ou dinase, In Opuscuos Solectos da Filosofia Modioval, Braga, Faculdade de Filosofia, 1991, pp. 225-227 QUESTOES 1. Esolarega, com base no texto, os dois primeiros modos de plurificago da 2, Justifique, recorrendo ao texto, a unicidade da realidade cuja esséncia é existéncia, 3. Exponha a relevancia do excerto no contexto global da obra. fencia. V.S.E.F. 114/9 REDUGAO DAS CIENCIAS A TEOLOGIA, S. Boaventura TEXTO Se considerarmos a produgio, poderemos ver que o efeito mi ‘anico procede do antfice por meio da semethanga existente na sua mente, pela qual o artifice concede a sua obra antes de produzi-la, e em seguida produ-la como a ideou. O artifice executa a obra exterior conforme ao exemplar interior, como melhor pode; e se Ihe fosse possivel produzir um efeito tal que pudesse amar e conhecer © seu autor, certamente 0 faria: €, se esse efeito conhecesse 0 seu autor, isto s6 poderia dar-se por meio daquela semelhanga & imitagdo da qual procedeu do anifice; e se esse ‘mesmo efeito tivesse ofuscado os olhos do conhecimento, de sorte que no pudesse clevar-se sobre si, necessério seria, para vir a ter conhecimento de seu autor, que @ semelhanga, pela qual dito efeito foi produzido, se abaixasse até assumir uma natureza tal que pudesse ser compreendida e conhecida por ele. Do mesmo modo, has-de entender que nenhuma criatura procedeu do supremo Artifice sendo por meio do Verbo etemo «no qual tudo dispés» e pelo qual nao s6 produziu criaturas que tém razio de vestigio, mas ainda razio de imagem, a fim de poderem assemelhar- -se a ele pelo conhecimento e pelo amor. Mas, porque a criatura racional, por causa do pecado, tem obscurecido o olho da contemplagdo, foi muito conveniente que 0 eterno ¢ invisivel se fizesse visivel ¢ tomasse a forma de carne, para nos reconduzir 0 Pai. Isto € 0 que se diz-no capitulo 14 do Evangelho de S. Joao: «Ninguém vem a0 Pai sendo por minx; e no capitulo IT do Evangelho de S. Mateus: «Ninguém conhece 0 Pai sendo Filho ¢ a quem o Filho quiser revelar». E por isto mesmo se diz «o Verbo feito carne». Considerando, pois, a iluminagao da arte mecanica quanto a produgdo da obra, intuiremos ai o Verbo gerado e incarnado, isto & a divindade ¢ a humanidade, ¢ a integridade total da f. Coimbra, Atanca, 1970, pp. 33-35 QUESTOES 1. Explicite, com base no texto, o papel da semelhanga na criagdo. 2. Explique, com base no texto, de que modo é permitido ao homem «ter conhecimento do seu autor». 3. Exponha a relevancia do excerto no contexto global da obra. 114/10 GRUPO IL = Apresente um plano organizador. — A nao identiicagao do tema e da obra implicaré uma pontuagao de 0 (zero) pontos. ‘A opgao por um par obra-tema diferente dos que sao apresentados na prova implicara uma pontuagao de 0 (zero) pontos. — Seleccione apenas uma das obras que Ihe so propostas e desenvolva o tema anexo. Na sua resposta devera utilizar aproximadamente 80 linhas (cerca de 640 palavras). opras TEMAS PRINCIPIOS DA FILOSOFIA, R. Descartes. CARTA SOBRE A TOLERANCIA, J, Locke DISCURSO DE METAFISICA, G. W. Leibniz. FUNDAMENTAQAO DA METAFISICA DOS COSTUMES, |. Kant INTRODUGAG A HISTORIA DA FILOSOFIA, G. W. F. Hegel ‘TENDENCIAS GERAIS DA FILOSOFIA NA SEGUNDA, METADE DO SECULO XIX, Antero de Quental A ORIGEM DA TRAGEDIA, F. Nietzsche. DA CERTEZA, L. Witigenstein ELOGIO DA FILOSOFIA, M. Merleau-Ponty (OS PROBLEMAS DA FILOSOFIA, B, Russell PROBLEMATICA DA SAUDADE & ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DA CONSCIENCIA SAUDOSA Joaquim de Carvalno. SOBRE A ESSENCIA DA VERDADE, M. Heidegger TEORIA DA INTERPRETAGAO, P. Ricoeur FIM Duvida e existéncia de Deus © fundamento moral da tolerancia Tipos de verdade e tipos de conhecimento ‘Significado da subordinagao da vontade a razao Estatuto dos sistemas filosoficos particulares Consciéncia humana e realizagao da liberdade Justificagao estética e justificagao tebrica da existéncia Aprendizagem, crenga e saber A ambiguidade floséfica Experiéncia individual e possibilidade de conhecimento Especificidade da representagéo saudosa Filosofia esséncia (© caracter dialéctico da interpretago V.S.FF. a14itt 1.02, aaii2 coTAgoes GRUPO | (2 x 25 pontos)... (1 x 70 pontos), GRUPO II (1 x 80 pontos). TOTAL 50 pontos 70 pontos 80 pontos 200 pontos PROVA 114/C/15 Pags. EXAME NACIONAL DO ENSINO SECUNDARIO 12.° Ano de Escolaridade (Decreto-Lei n.° 286/89, de 29 de Agosto) Cursos Gerais — Agrupamentos 3 e 4 Duragdo da prova: 120 minutos 20 FASE 2002 PROVA ESCRITA DE FILOSOFIA COTAGOES E CRITERIOS DE CLASSIFICAGAO A INDICAGAO DO NUMERO DE LINHASIPALAVRAS VISA APENAS ORIENTAR O ALUNO RELATIVAMENTE AO GRAU DE DESENVOLVIMENTO DA RESPOSTA, PELO QUE NAO SE PROPOE QUALQUER PENALIZAGAO PARA O NAO CUMPRIMENTO DESSA INDICAGAO. RUPO I Questoes 1. ¢ 2. crITERIOS. PONTUAGAO Rigor da andlise do excerto apresentado v= 10 pontos Cosréncia logica da resposta 7 pontos Utiizagao precisa da terminologia flosdtica 4 pontos Correcgao da expressao escrita 4 pontos TOTAL 25 pontos TOTAL das Questées 1. ¢ 2. (2% 28) = sacra 50 pontos * A inadequagao da resposta & questéo formulada implica uma pontuagao de 0 (zero) pontos. + A mera transcrigao de frases do texto implica uma pontuagao de 0 (zero) pontos. Questio 3 oRITERIOS PONTUAGAO Adequapao dos conhecimentos mobiizados ns... 35 pontos Coeréncia ligica da resposta 45 pontos Uilizagao precisa da terminologia flosofica oe 40 pontes Correcgao da expressio escrita 40 pontos TOTAL da Questao 3 (170) = soon 70 pontos TOTAL DO GRUPO I soos 120 pontos. ‘+ A inadequagao da resposta 4 questo formulada implica uma pontuagao de 0 (zero) pontos. ‘+ Se a resposta nao manifestar conhecimento da obra, a pontuago sera de 0 (zero) pontos. V.S.FF. 114/C/1 Tépicos de contetido: DA NATUREZA, Parménides 1. Correspondéncia da opiniao (crenga) ao conhecimento humano (proprio dos «mortais»). A opiniao do ¢ fidedigna na obtengao da verdade, nao permitindo a aquisigao de conhecimento verdadeiro (este € adquirido «bem longe do triho dos homens»). Conhecimento das aparéncias (adquiridas por meio dos sentidos): 0 modo como a realidade ‘aparece ao homem, em mudanca e em movimento («tudo passando através de todas as coisas»). 2. Existéncia de dois caminhos de investigagao que é licito considerar: um, aquele que afirma o ser do que é (e nega 0 ser do que nao é); outro, aquele que afirma o ndo ser do que é (@ 0 ser do que nao 6). Pensabilidade do ser; impensabilidade do ndo-ser. Negagdo da possibilidade de conhecer e dizer © nao-ser. Negagao da possibilidade do caminho do ndo-ser, como via de investigagao do saber Dado que somente o ser é pensavel (cognoscivel, deciardvel), resta 0 caminho do ser como unico caminho de investigagao, 3. Explicitagéo da via da verdade (realidade) como legitimo caminho (método) de investigagao do saber. Identidade de ser e pensar: 0 ser como referente do conhecimento verdadeiro e do juizo verdadeiro; 0 saber como conhecimento e afirmagao do que é. Exclusdo da possibilidade de investigago pelas vias do ndo-ser e da opiniao (da aparéncia, correspondente & confusdo do ser com 0 ndo-ser), Oposigao de saber e opiniéo, verdade e aparéncia. Importancia da compreensdo da ineficacia da via da opinido (aparéncia) na aquisig&o do saber. Desvalorizagao do conhecimento sensivel necessidade de «julgar» as aparéncias. Exigéncia da decisao racional na escolha da via de verdade como método de investigagzio do saber. Possibilidade de recuperago do conhecimento humano pela consideragao exclusiva do ser, Permitindo esta ultima via a correcgao da linguagem e do conhecimento: compreensao do ser como referente da diversidade dos nomes, indevidamente alribuidos pelo homem; plausibilidade da ordem cosmica a luz da via da verdade. GORGIAS, Plato 1. Distingao entre o orador e o especialista, ou seja, entre aquele que n3o tem um saber especifico @ aquele que sabe a sua arte. O orador, no sabendo cada uma das artes dos diversos especialistas, é capaz, «melhor que ninguém», de «persuadir a multidao em qualquer assunto que the interesse». Exemplo do irmao de Gérgias, médico, cujos doentes eram persuadidos ao tratamento «sem mais recursos do que a retérica», e nao pelo seu discurso enquanto especialista 2. A retorica é uma arte competitiva que confere poder e forga (superioridade) a quem a pratica, j& que 0 orador, 20 competir com o especialista perante a multidao, tem sempre a possibilidade de ganhar. Um tal poder torna-se perigoso, pois pode ser injustamente usado, por exemplo, quando «priva da sua reputagao» um especialista, para favorecer aquele que sabe persuadir pela palavra, mas que ignora a arte especifica do profissional, ou quando @ usado para a pratica do mal 3. A rel6rica definida como 0 tipo de «persuasdo que gera a crenga sem o saber sobre 0 justo @ 0 injusto». Este tipo de persuasao confere poder ao orador. Deter o poder constitui, na perspectiva dos sofistas, a grande utiidade da retorica, sendo o poder entendido como «dominio sobre os outros» e «liberdade para si proprio», © orador visa fazer 0 que 114/012 Ihe agrada na cidade, sem ter em vista o ber, ndo tendo qualquer preocupagao moral na sua acgo. Porém, a eficdcia da retérica assenta na ignorancia da multidao e na ignorancia do proprio oradar, 0 ual pode praticar actos injustos (como se diz no excerto). Ora, se quem aprendeu 0 que é a justiga 6 necessariamente justo, como defende Stcrates, entéo 0 orador ndo aprendeu o que é a justica e, ‘como tal, & um ignorante, sendo a retérica por ele praticada initil e até prejudicial na Cidade. Aretérica é indtil, enquanto actividade empirica, simulacro da politica, sendo esta concebida como arte que visa 0 bem comum, fundada racionalmente. O politico conhece o justo e tem na justiga 2 finalidade do seu agit, sendo responsavel pela justiga ou injustica dos cidadaos, tal como o sofista em relagao & pratica da retérica pelos seus discipulos. Pretende-se, assim, criticar a retérica praticada em Atenas e os pressupostos hedonistas e individualistas dos sofistas e oradores. FEDON, Platéo. 4. Rejeig8o das explicagdes que recorrem a causalidade mecanica, construidas a partir das amanifestagdes exterlores», captadas pelos sentidos (observagao dos entes). Estas explicacoes cconfundem a «causa em siv (0 Bem ou, em geral, a forma, verdadeira causa) com aquilo em cuja auséncia a causa ndo seria causa (condigées fisicas). Necessidade de uma «segunda via» de investigacao da verdade dos entes, pela investigagao das ideias, verdadeiras causas, 2. 0 método hipotético, como investigagao da verdade dos entes através das ideias: = assume, relativamente a cada caso (a cada ente), um epressuposto seguron: a hipétese da realidade da forma (ideia); = examina a concordancia de cada hipbtese com as respectivas consequéncias, = toma por verdadeiro 0 que concorda com os pressupostos (relativamente as causas ou a outros aspectos). 3. Integragao do excerto na autobiografia intelectual de Sécrates, a qual tem por objective mostrar a insuficiéncia da investigagao do conhecimento verdadeiro e da constituigao do saber pela via empirica, devendo esta abrir caminho & investigagdo racional da realidade dos entes, do que cada ente & (método hipotético, dialéctica). Importancia da dialéctica no estabelecimento das formas como causas dos entes; finalidade da investigagdo e da vida do filésofo. Possibilidade de relagao com a teoria da reminiscéncia: apesar de descobertas com recurso aos ssentidos, as formas s&o a finalidade do conhecimento e do saber. Relagdo com a teoria da participagao: as formas so investigadas como causas dos entes (por exemplo, 0 Belo como causa das coisas belas), porque estes s80 0 que S40 por participarem daquelas. Importancia do excerto na constituigo da teoria das formas: 0 método hipotético pressupe a aceitagdo da realidade das formas como primeira hipétese, postulando-as como objecto e finalidade de toda a investigagSo. Possibilidade de aplicaggo da teoria da participagao a demonstragao da imortalidade da alma: @ alma participa da forma da Vida, subtraindo-se ao seu contrario, a morte. CATEGORIAS, Aristételes 4. Caso da oposigao sem formulagao de proposigbes predicalivas (sade e doenga, dobro e metade, visdo e cegueira), ja que é na combinagao de palavras (que correspondem aos termos sujeito e redicado da proposicao) que o valor de verdade ocorre. Exceptuando a oposigao por afirmacao e nega¢do, todos os casos em que o valor de verdade da roposigao depende da existéncia da substancia que corre como sujeito de predicagao. V.S.F-F, 114/013 2. Na oposigdio de proposigdes por afirmacao e negacéo, um dos opostos deve, por necessidade, ser verdadeiro e 0 outro, falso. Duas proposigées opostas em que uma & a negagdo da outra ~ «Sécrates esta doente» (afirmacao) e «Sdcrates nao esta doenten (negacdo) ~ possuem sempre valores de verdade distintos, ie., uma é verdadeira e a outta, falsa, 3. O texto relaciona as espécies de oposigao quanto ao valor de verdade das proposigées opostas, istinguindo a oposigao légica da afirmagao e da negagao como a Unica modalidade que implica, necessariamente, a oposigao do valor de verdade. Acentuagao do caracter formal das regras de oposicao légica, designadamente da afirmagao e da negagao, implicando oposigao de valor de verdade, independentemente da existéncia da substancia primeira que é tomada como suieito. Formulagao, ainda que indirecta, do principio légico de nao-contradigao: duas proposigdes contraditérias nao podem exibir 0 mesmo valor de verdade. Reiteragao, explicita ou implicita, de algumas teses fundamentais da obra, nomeadamente: a predicagao como sede da verdade: termos independenies (isoladamente considerados), nao ovorrendo combinados com outros em proposigées, no sao verdadeiros nem falsos: ~ 0 primado da substancia primeira, cuja existéncia determina o valor de verdade das proposi que exprimem os seus predicados; a verdade como adequacao da proposigao a relacdo real entre 0 sujeito e os predicados que dele so afirmados ou negados. O MESTRE, Santo Agostinho 1. A fungao das palavras ¢ significar uma realidade que Ines é exterior. As palavras sao sinais e, enquanto tal, tém uma significagao (referéncia) extralinguistica (2 propria realidade) Contudo, no caso das silabas pronunciadas em separado, a sua funcao é referir 0 proprio nome (que se refere a si proprio enquanto sinal) e nao a realidade exterior ao sinal As palavras tém, assim, a dupla fungSo de se referirem a si préprias, enquanto nomes, ea de referirem realidades exteriores. 2. A lei da razon, ou «lei da fala, referida no texto, consiste no facto de que, ouvidas as palavras, © espirito ¢ levado para aquilo que é por elas significado, ja que considera as palavras como sinais de uma realidade exterior a linguagem 3. O excerto dado insere-se na tematica da fungao das palavras, integrando-se no problema mais geral do ensino por meio da linguagem. Uma vez que falamos para «nos advertirmos a nos réprios, ou para que os outros sejam advertidos ou ensinados por nés», resta saber o que pode ser ensinado por meio de palavras. As palavras so sinais «que se proferem com voz articulada» e todas elas so nomes (na medida fem que as duas nogdes tém a mesma extensdo ou referéncia, embora nao tenham o mesmo sentido), porque todas elas «denominam alguma coisay. O problema esta em saber se podem ensinar alguma coisa sobre aquilo de que sao sinais. ‘Se 0 ensino por meio de palavras nao ¢ ostensivo e pressupée o conhecimento prévio daquilo ue as palavras significam, 0 conhecimento da realidade é de «mais valor» que o das palavras, servindo estas apenas para nos advertirem ou apelarem ao conhecimento que se obtém pelo Mestre Interior. Sendo assim, 0 efeito que as palavras (o discurso) produzem no interlocutor depende do saber prévio deste ¢ nao das palavras consideradas em si mesmas. 114/014 PROSLOGION, Santo Anselmo 1. A inexisténcia de Deus na realidade implica a contradigdo da sua existéncia no intelecto como «aquilo maior do que o qual nada se pode pensar», do seguinte modo: = Deus ¢ aquila maior do que o qual nada se pode pensar: = a existéncia na realidade ¢ maior do que a existéncia no intelecto (pensada} ~ Se Deus existisse apenas no pensamento, poder-se-ia pensar algo maior do que Ele (Deus existindo na realidade); = Deus nao seria, entdo, aquilo maior do que o qual nada se pode pensar, o que seria contraditério com a definicao assumida de Deus; ~ Logo, é impossivel pensar que Deus nao existe na realidade. 2. 0 insipiente (insensato) possui uma nogo incompleta de Deus, como existindo somente no pensamento, ndo como existindo necessariamente na realidade, porque da nogdo que pensa nao extrai a necessaria consequéncia logica (a afirmaco da sua existéncia na realidade). Deste modo. pensa Deus apenas mediante a palavra que significa a sua realidade, mas nao intelecciona 0 que ¢ a sua realidade, uma vez que, se inteleccionasse o que Deus 6 (uma realidade maior do que a qual nada se pode pensar), ndo poderia, sem contradigéio, deixar de inteleccionar que tal realidade nao pode existir apenas no pensamento, tendo também de existir na realidade. 3. Impossibilidade de, aceite a definiggo de Deus (como aquilo maior do que 0 qual nada se pode pensar), pensar que Deus nao existe na realidade, sob pena de contradigao légica. Refutacdo da possibilidade de Deus existir apenas no pensamento (posigao do «insipiente»). Necessidade da existéncia de Deus na realidade: existir na realidade & mais (e melhor) do que nao existir na realidade, ou do que existir somente no pensamento, de tal modo que, nao existindo na realidade, Deus nao seria 0 que a sua definigao afirma ser. Contributo & inteleceao possivel do que Deus é na realidade. A perfeigao de Deus: Deus é tudo ‘© que é melhor ser do que nao ser; a sua existéncia na realidade é maior e melhor do que a sua inexisténcia na realidade e do que a simples existéncia no pensamento. Limitagao da intelecgo humana. Deus @ sempre, em si mesmo (na realidade), mais do que 0 homem consegue inteleccionar. A inteleccao possivel supde sempre, porém, 0 estabelecimento da existéncia de Deus na realidade A intelecgao sustentada pela fé. A contemplagao de Deus na sua perfeicao absoluta nao & possivel ao homem na sua vida temporal. E-lhe, todavia, possivel uma aproximagao progressiva, guiada pela fé. © SER E A ESSENCIA, S. Tomas de Aquino 1. Plurificagao das espécies, relativamente ao género, efectuada pelo discrime (diferenga especifica) Plurficagao dos individuos, relativamente & espécie, efectuada pela materia (materia signata) que recebe a forma (dinase). 2. A esséncia pode ser concebida sem existéncia, de tal modo que a primeira difere da segunda, a do ser que exista uma realidade cuja esséncia seja a sua propria existéncia. Existindo uma realidade cuja esséncia seja existéncia, esta é subsistente, néo admitindo qualquer iscrime (pois deixaria, se tal ocorresse, de ser apenas existéncia, passando a ser existéncia adicionada esséncia), nem matéria (pela qual deixaria de ser existéncia subsistente por si propria). Tal realidade n&o admite quaisquer principios pelos quais a plurificagao pode ocorrer, sendo necessariamente uma realidade Gnica: Deus. V.S.FF. 114/015 3. Importancia da compreensao das diferentes modalidades de relagdo entre a esséncia ea existéncia, necesséria & compreensao de diversas modalidades de existéncia dos entes: entes compostos de matéria e forma e entes sem matéria (almas humanas, anjos, Deus). Dependéncia da existéncia relativamente a sua relagao com a esséncia. Compreensdo hierérquica da existéncia, de um maior para um menor grau de pertei¢ao, segundo 0 modo como a existéncia € subsistente (no caso de Deus, acto puro, sem potencialidade) ou recebida (no caso das criaturas, que admitem a potencialidade inerente a existéncia recebida). A existéncia das criaturas nao se encontra compreendida na sua esséncia, sendo recebida e adicionada, resultando numa «composigao» de esséncia e existéncia. Pluralidade da existéncia adicionada a esséncia. Unicidade da realidade, cuja esséncia existéncia Compreensao da ordem ontolégica da existéncia, segundo principios formais e materiais. Ordenacao légica (e epistemolégica), segundo os conceitos de género, espécle e diferenca especifica REDUGAO DAS CIENCIAS A TEOLOGIA, S. Boaventura 1. A semelhanga é caracteristica das ideias exemplares existentes na mente do artifice, por meio das {uals este concebe a sua obra, produzindo-a como a idealizou. ‘A obra (tanto a do artifice humano como a do Autor supremo) 6 criada como imitagao da ideia ‘exemplar, como seu vestigio e imagem (tese do exemplarismo) 2. Deus criou o homem com a possibilidade de conhecer e amar o seu Autor. Esta possibilidade de contemplago foi, porém, obnubilada pelo pecado, nao podendo o homem elevar-se acima de si Deus coloca-se, entéo, a0 nivel de uma natureza que pode ser compreendida e conhecida pelo homem, incamando em Cristo, mediador da recondugao do homem ao seu criador 3. 0 texto expde 0 modo como a luz da arte mecénica (luz exterior) toma possivel a reconducao & luz da Sagrada Escritura (luz superior), nomeadamente no que diz respeito @ consideragao do produto daquela arte, o qual permite a intuigao do Verbo gerado @ incamado. (0 exemplarismo na compreensdo da criagdo como emanagao divina. Todo o conhecimento dos entes ctiados deve visar 0 ctiador (causa exemplar), pelo que todo o saber, onde se inclui o da arte mecénica, deve ser reconduzido teologia. A razdo deve ser reconduzida a contemplacdo da causa exemplar das coisas conhecidas e do intelecto que as conhece, & contemplago do que as coisas so no seu principio: ideias em Deus, exemplares originals e Unicos das coisas conhecidas pelo homem. Deus como principio e fim da criagao. ‘A mediagao de Cristo na recondugao do homem ao seu criador, permitindo a recuperacao da possibilidade de contemplagao de Deus (possibilidade humana, actualmente obnubitada pelo Pecado). Cristo como semelhanga do Pai, do pensamento de Deus consigo proprio. A anagogia ‘como orientagao da mente humana para a forma mais elevada, de onde parte e a qual deve retomar. 114/016 GRUPO CRITERIOS PONTUAGAO Plano prévio ~ estrutura e adequagao 8 pontos Selecgao correcta dos conhecimentos para desenvolver 6 tema escolhido «20 pontos Apropriagdo pessoal dos conhecimentos e apreciagéo do modo como 0 tema foi tratado pelo autor, na obra 10 pontos Coeréncia ldgica da resposta 20 pontos Uiilzagao precisa da terminologia filoséfica 10 pontos Correcgao da expressao escrita 12 pontos TOTAL (1 20) 80 ponies TOTAL DO GRUPO 11 80 pontos ‘+ Se 0 aluno nao identificar a obra e nao resultar ébvio do seu texto a que obra se esta a referir, ou se escolher um par obra-tema diferente dos indicados, a pontuagao sera de 0 (zero) pontos. * A Inadequagao da resposta a questo implica uma pontuagao de 0 (zero) pontos. Dado 0 objectivo deste grupo sero de aceitar respostas diversificadas, desde que se reportem a um dos pares obra-tema indicados na prova e revelem uma selecgao adequada dos conhecimentos da obra e um posicionamento critico. V.S.FF. 414/017 ‘Tépicos de conteddo: PRINCIPIOS DA FILOSOFIA, R. Descartes TEMA: Divida e existéncia de Deus A dévida como método necessério procura da verdade, o qual, no entanto, nao se aplica & acgao moral, dominio da verosimithanga. Razoes para duvidar (os sentidos induzem em erro; a dificuldade em distinguir entre sono e vigilia @ possibilidade de errar nos raciocinios, mesmo nas demonstragdes mateméticas; @ hipdtese de um deus enganador). caracter voluntario da divida: podemos sempre recusar 2 crenga naquilo que no se nos apresenta clara e distintamente. O pensamento como primeira certeza indubitavel. A indubitabilidade como clareza e distingao; a clareza e distinggo como evidéncia; a evidéncia como critério de verdade. Andlise das ideias claras e distintas e fundamentagao da sua veracidade: Deus como garante de verdade. Provas da existéncia de Deus: 1a) pelo conceito que Dele temos, dado que na nogSo de Deus como ser perfeito esta contida da existéncia necesséria; b) por ser a cause da ideia de perfei¢ao em nés; ) pela contingéncia do nosso espirito cuja existéncia carece de um criador. Distingéio entre 0 conhecimento dos atributos de Deus e a compreensdo da sua natureza, a qual ultrapassa a nossa capacidade finita. Reconhecimento da fé para ter como indubitavel aquilo que ultrapassa 0 entendimento finito e é revelado por Deus. Conciliagdo entre a crenga na existéncia de Deus e 0 exercicio auténomo da razdo: apesar da certeza infalivel proporcionada pela luz da {8, a sabedoria (ou soberano bem) consiste no conhecimento das primeiras causas ou principios, que apenas a razao natural, quando bem conduzida, pode alcangar. O facto de ser excluida de Deus qualquer responsabilidade pelo erro humano, quer no julzo quer na acgo, mostra a autonomia da razao humana, a qual s6 deve dar assentimento aquilo que percebe clara e distintamente CARTA SOBRE A TOLERANCIA, J, Locke TEMA: O fundamento moral da tolerancia A defesa da tolerancia baseada na liberdade da consciéncia individual, enquanto consciéncia moral, A liberdade como fundamento da sociedade civil e como direito inaliendvel garantido pelas leis, do Estado («uma sociedade livre de homens constituida unicamente com o fim de conservar € promover os seus bens civis»), cujo poder ndo se estende vida espiritual ‘0 fundamento moral da sociedade: a recliddo dos costumes» como parte integrante da vida civil (estando em conformidade com a razao humana) e como limite do poder do magistrado. ‘A diversidade de culto fundada na liberdade da consciéncia individual: nenhuma religiao pode ser imposta ao individuo, que escolhe o culto que mais se coaduna com a sua consciéncia (0 fundamento moral da Igreja («Sociedade livre de homens voluntariamente reunidos para adorar publicamente a Deus...»), sociedade cujo poder é limitado, nao s6 pelo direito civil, mas também pelos ‘bons costumes». ‘A no separagao entre Estado @ Igreja como causa (e consequéncia) de imoralidade, pois as guerras de religiao so motivadas mais pela ambicao de poder do que pela {8 A necessidade da lei da tolerancia religiosa como meio de garantir a ordem civil e a moralidade do Estado. O ateismo (identificado com a auséncia de valores morais) e todas as religides cujas praticas atentam contra os bens civis e a moralidade constituem algumas das excepgdes @ lei da tolerancia 114/018 DISCURSO DE METAFISICA, G. W. Leibniz TEMA: Tipos de verdade e tipos de conhecimento Distingdo entre «verdades necessérias» ¢ «verdades contingentes». Distingao entre conhecimento distinto (a prior) e conhecimento confuso (2 posteriori. As verdades necessarias, ou verdades de razdo, so absolutamente necessarias, obedecendo a0 principio de nao-contradigao. Sao independentes da vontade livre de Deus e das criaturas, mas dependem do entendimento de Deus e 80 acessiveis ao entendimento humano, que as pode conhecer a prior. Sao verdades eternas, como as da geomettia: todas as propriedades, por exemplo, do circulo, esto contidas na sua nogao. ‘As verdades contingentes, ou verdades de facto, s8o necessérias hipoteticamente (ex hypothes!) € © seu conirério nao implica contradigaio. Sao as verdades dos decretos livres de Deus, segundo os quais se encontram predeterminados 0s predicados os acontecimentos de cada substancia individual (a nogao de cada substéncia individual encerra virualmente todos os seus predicados & acontecimentos). E por necessidade hipotética que os futuros contingentes se encontram detetminado’. Dependendo da vontade livre de Deus, ndo s80 necessariamente acessiveis a0 entendimento humano, o qual teria, para tanto, de ser capaz de considerar a totalidade das substancias. Sao conhecidas a posteriori pelo hormem, As verdades fundadas nos decretos lives de Deus (relativamente aos acontecimentos das substancias individuals) sao certas, mas contingentes. Deus escolhe sempre o melhor @ 0 mais perfeito, ou seja, a maior perfeigdo de uma sequéncia (série) de acontecimentos, ainda que alguns desies Uitimos sejam menos perfeitos ou tal parecam ao homem. Contudo, outras ordens de ~acontecimentos continuam a ser possivels (nao sendo escolhidos devido a sua imperfeigo, ou menor grau de perfeigdo, © nao devido 4 sua impossibilidade logica). O seu pré-conhecimento (pre: determinacao) por parte de Deus nao implica a sua determinagdo como absolutamente necesséria Deus conhece a prior todas as verdades, na medida em que conhece a novo completa de cada substancia individual (a0 determinar a sua razao suficiente). Um conhecimento distinto de uma substéncia permitiria conhecer todos os seus acontecimentos futuros, mas tal conhecimento encontra- -se reservado a Deus. O homem possui conhecimento confuso das verdades contingentes, ainda que possua algum conhecimento distinto de verdades necessarias (por exemplo, pelo conhecimento distinio de todos os elementos contidos numa nogao geométrica) FUNDAMENTAGAO DA METAFISICA DOS COSTUMES, |. Kant TEMA: Significado da subordinagdo da vontade a razao ‘A vontade como a faculdade de se determinar a si mesmo a agir em conformidade com certas leis. Num ser dotado de razao, esta tem como verdadeiro destino produzir uma vontade boa em si mesma (valor absoluto). Uma vontade é boa pelo principio que determina o seu querer ~ influenciado somente pela razdo ~ e ndo por aquilo que promove ou realiza, o que a faria depender das inclinages sensiveis. Ora 0 ser humano é simultaneamente um ser racional e um ser sensivel (pertence a0 mundo inteligivel e a0 mundo sensivel); por isso, @ vontade estA sujelta, no seu querer, as influéncias do mundo fenoménico. Se o homem fosse apenas racional, a vontade (racional) determinar-se-ia sempre de acordo com leis universais da raz8o, ou leis morais, e, nela, 0 seu querer identificar-se-ia sempre ‘com o dever ou com a lei moral. No entanto, sendo o homem também um ser fenoménico, a razao tem nele a tarefa de fazer com que a vontade se subordine a lei moral (que ela reconhece racionalmente). O dever é, assim, a necessidade de uma acco por respeito a lei, enquanto principio objectivo representado por um mandamento da razo e cuja formula é o imperativo categérico, Esta subordinagao da vontade a principios racionais ndo significa subordinaco a leis exteriores (ainda que divinas), mas a leis de que a propria vontade é autora, enquanto legisladora num Reino dos Fins, pelo que 2 autonomia da vontade ¢ o principio supremo da moralidade. V.S.FF. 114/019 INTRODUGAO A HISTORIA DA FILOSOFIA, G. W. F. Hegel TEMA; Estatuto dos sistemas flosoficos particulares Relagao entre os sistemas filoséficos particulares e o espirito (a Ideia, 0 verdadelro) que se pensa ra historia da filosofia: cada sistema filoséfico (particular) é um momento histdrico da autoconsciéncia do espirito A filosofia como realizagao do espirito que se desenvolve e pensa, na procura da sua autoconsciéncia. Os sistemas filoséficos como momentos do desenvolvimento ou actualizagao do espirito, como estadios determinados de autoconsciéncia. Estes sistemas 40 incompletos face 20 todo: satisfazem interesses particulares, assegurando concomitantemente o desenvolvimento do espirito. A historicidade da filosofia como necessaria ao desenvolvimento do espirito, realizado na e pela diversidade dos sistemas filoséficos particulares, que historicamente se sucedem, Limitagao historica dos sistemas filoséficos particulares. Cada filosofia pertence a um povo e a um ‘tempo determinados, Nao dependendo das restantes realizagdes do pensamento (histéria politica, Constituigdes de Estado, arte, religiao, ciéncia), possui todavia a mesma raiz: 0 espirito (espirito do Povo, espirito do tempo). Como expresséo real do universal, o particular adquire significagao na sua relago necesséria com © todo. O espirito universal atinge a sua actual realizago na sintese dos seus anteriores estadios de desenvolvimento. A eventual recuperacao de um estadio anterior significaria a recondugao regressiva do espirito desenvolvido (para si) a um estadio de pensamento abstracto (em si) € necessariamente Inferior. Oposigao entre @ diversidade dos sistemas filoséficos e a unicidade da verdade, de acordo com a qual apenas uma filosofia pode ser verdadeira. A filosofia verdadeira & assegurada pelas diferentes filosofias que a antecedem. A histéria da filosofia permite compreender os diversos sistemas filos6ficos a luz do todo (espirto, Ideia). © espirito compreende-se a si préprio na e pela compreensdo do seu desenvolvimento, 0 que implica a compreensao dos sistemas filos6ficos do passado. Como a filosofia 6 conhecimento da Ideia em actualizagao, 2 historia da filosofia é conhecimento da Ideia actualizada, da sua autoconsciéncia como Idpia historicamente realizada, TENDENCIAS GERAIS DA FILOSOFIA NA SEGUNDA METADE DO SECULO XIX, Antero de Quental TEMA: Consciéncia humana e realizagao da liberdade \Valorizagéo do papel da consciéncia na prossecugao da liberdade como fim supremo da evolugao do real Redugao da concepgdo estritamente cientifica da evolugSo do real a leis de necessidade e de causalidade mecanica. A concepgao cientifica do universo é limitada @ esfera inferior do ser, carecendo de iluminagao por parte das ideias, da consciéncia, do espirito. O espiritualismo @ a ideia de liberdade como complemento do mecanismo e do determinismo da ciéncia e da filosofia cientifica da natureza. A sintese do pensamento moderne como necessaria a conciliagao das tendéncias cientificas com as tendéncias metafisicas. Importancia do espiritualismo na recuperagao da consciéncia (do espirito, da razdo) como forga ‘auténoma e espontanea, a qual permite a compreensao das causas verdadeiras da evolugao do real, ignoradas pelas perspectivas mecanica e determinista A liberdade como finalidade da existéncia e plenitude do ser na sua espontaneidade. Posigao do ideal de liberdade pela consciéncia que interpreta 0 mundo, Comensurabilidade entre a espontaneidade da matéria, exteriormente condicionada, e a liberdade do homem, que determina 0 mundo no plano do conhecimento e se autodetermina racionalmente no plano da moralidade: 0 ser 114/0/10 nao se limita 4 espontaneidade exteriormente condicionada, mas @, no plano da consciéncia, determinado em fungao de fins racionais; a razdo interpreta a necessidade como lei e a lei como expressao da espontaneidade. O homem como unico ente que, pela razo, realiza o ideal de liberdade da existéncia. ‘A sociedade humana como instrumento da raztio na promocao da evolugao da cadeia da existéncia e do progresso da humanidade. Dependéncia do progresso na prossecugdo da liberdade relalivamente a ordem moral. Importancia da ordem social (criada pelo Direito) na implementagao da ordem moral Resolugao das leis naturais e das leis sociais na lei moral, autonomamente determinada pela razdo. lei moral como solugao da antitese determinismo-liberdade. A lei moral como lei da liberdade, pela autonomia da vontade e pela renincia ao egoismo. A ORIGEM DA TRAGEDIA, F. Nietzsche TEMA: Justificagao estetica e justiicagao tedrica da existéncia A arte e a ciéncia consideradas sob a éptica da vida: a primeira como legitimagao da existéncia ‘enquanto fenémeno estético; a segunda como legitimacao da existéncia, na medida em que a conhece e corrige. A tragédia como conciliagao de dois impulsos e de duas formas de arte opostas: apolinea e dionisiaca. A indissociabilidade entre misica e mito tragico, «expressbes da capacidade dionisiaca de um povo», ou seja, de uma «sabedoria» que aceita a vida tal como ela 6. Na tragédia, a «bela aparéncia» das formas apolineas (representagées) 6 requerida pelo elemento dionisiaco (Uno primordial), enquanto entidade sofredora e contraditéria, que procura a redencao pela aparéncia Neste sentido, a tragédia proporciona uma «consolacao metafisican, j& que transforma uma «ideia de repugnancia sobre os aspectos horriveis ou absurdos da existéncia em representagdes, com as quais se torna possivel viver» Raz6es e consequéncias da «morte da tragédia»: 0 racionalismo do homem tedrico e a recusa dos aspectos irracionais do mito tragico. A iluséo de que o pensamento, por meio do principio de causalidade, pode compreender 0 ser e mesmo corrigi-o. A substituigao da «consolagao metafisica» da tragédia (que no tem uma dimensao moral) pela ideia de rectificagdio do mundo através da ciéncia: a vida toma-se, nesta perspectiva, digna de ser conhecida e é avaliada sob um ponto de vista moral A necessidade do ressurgimento da tragédia face a insuficiéncia do «optimismo teérico». DA CERTEZA, L. Wittgenstein TEMA: Aprendizagem, crenga e saber Vinculagao da aprendizagem ao Ambito da aquisigao e formagao de crengas, de ordem subjectiva, e do saber ao ambito da verdade, de ordem objectiva, em que deve ser possivel aduzir provas do que se sabe. A verdade do que objectivamente se sabe fundamenta-se, porém, na certeza do que subjectivamente se cré e nao é fundamentado nem, necessariamente, explicito, O saber, tal como a duvida, depende do sistema de crengas que constitui a nossa imagem do mundo e cuja formagao Ihe 6 anterior. Aprender significa adquirir crengas que permitem 0 uso de jogos de linguagem. Um jogo de linguagem & adquirido na prética do seu uso, mas este pressupée ja um fundamento de crencas socialmente geradas desde a infancia, No se aprendem explicitamente as regras de um jogo de linguagem, cuja descrigao & do dominio da logica ‘Aprender baseia-se em crer (em factos geograficos, quimicos, historicas, etc.). A crianga aprende V.S.FF. 14/0/11 confiando, acreditando nos adultos e nos livros que estes escrevem, observando e formando um sistema de crengas (convicgdes) interdependentes, que fundamentam todos os usos da linguagem (aprende a compreender € @ usar uma palavra de um determinado modo, acreditando, por exemplo, que uma palavra significa certa realidade, em certo jogo de linguagem). Nao aprende que determinadas Proposigdes constituem saber fundamentado, tal como no aprende a duvidar dos fundamentos. © saber € a duvida surgem posteriormente, a partir do processo de uso da linguagem, como variantes da norma inicialmente aprendida, sem no entanto abalarem a certeza subjectiva de determinadas crengas, Muitas destas certezas nunca vém a ser pensadas em termos de constituigao de algum saber. No entanto, sabe-se que muitos factos aprendidos na Infancia s&o verdadeiros constituem saber, nao porque tenham sido verificados, mas porque se mantém a imagem do mundo entao formada, a qual, antes de ser verdadeira ou falsa, é acreditada e corroborada como fundamento do que se sabe. A divida ao nivel do sistema de crengas (que constitui a imagem do mundo) abala a certeza e toma impossiveis determinados usos da linguagem, ELOGIO DA FILOSOFIA, M. Merleau-Ponty TEMA: A ambiguidade filoséfica Distingao entre «boa ambiguidade» ¢ «ma ambiguidader. Esta ultima é apenas suportada pelos fildsofos e, neste caso, chama-se «equivoco», ja que se limita a por as certezas em causa, a0 contrario da «boa ambiguidaden, ou dialéctica, que contribui para fundar certezas. Aplicagao da «boa ambiguidaden a historia da filosofia: reconhecimento, nos diversos autores, da tradigao de uma ambiguidade como um método que se caracteriza, n8o por definicoes e teorias acabadas, mas por um movimento que «leva incessantemente do saber a ignorncia, da ignorancia a0 saber...» Este método corresponde & prépria relagao entre 0 flésofo @ o mundo, a qual, como se diz a Propésito de Bergson, «ndo & uma relagdo frontal do espectador e do espectaculo, mas como que uma cumplicidade obliqua e clandestina», fundada na percepcao («o saber absolute do filésofon) ‘A ambiguidade nao é, porém, s um método, mas essencialmente uma caracteristica da propria filosofia, que «nunca esta inteiramente no mundo, e, no entanto, nunca esta fora dele» A ambiguidade ¢ ainda ironia (exemplo da ironia de Sécrates, como aquela que «usa de um sentido duplo que se funda nas coisas»), isto é, recusa de «dizer sim a uma unica coisa», para dizer a verdade «integral» (tarefa do filésofo) em cada acontecimento e o seu caracter paradoxal. OS PROBLEMAS DA FILOSOFIA, 8. Russell TEMA: Experiéncia individual e possibilidade de conhecimento Necessidade de partir das nossas experiéncias presentes na busca do conhecimento certo, Da andlise dessa experiencia resulta a distingao entre aparéncia e realidade, j4 que do objecto real (tal como ele é) néio temos experiéncia imediata, e a sua existéncia é inferida daquilo que conhecemos imediatamente Distingao entre «dados-dos-sentidos» ~ 0 que € imediatamente conhecido pela sensagéo - & objecto fisico, ou objecto real. Indubitabilidade da nossa propria experiéncia (pensamentos & sentimentos particulares) e procura de um fundamento para a cerleza que temos relativamente ao conhecimento daquilo que ultrapassa os dados dos sentidos, pois «é licito e razoavel admitir a crenga de que os dados dos sentidos sao sinais de coisas exteriores a nds» Distingao entre conhecimento de verdades, o qual diz respeito as nossas crengas e convicsées, & conhecimento de intimidade ou conhecimento de trato, que se aplica a relagéio com as coisas. Distingéo entre conhecimento de trato e conhecimento por descrig&0, o qual implica sempre um. conhecimento de verdades. Em tltima analise, todo o conhecimento se funda no conhecimento de trato, que, no entanto, nao se limita aos dados dos sentidos. salon © conhecimento de alguns universais como exemplo de um conhecimento de trato, condigao de possibilidade do conhecimento por descrigo. Mediante este titimo, torna-se possivel ullrapassar os limites da nossa experiéncia individual, ja que, por exemplo, os juizos que emitimos sao quase sempre sobre proposigdes (e nao sobre as proprias coisas), das quais no temos conhecimento de intimidade. Neste sentido, pressupGem um distanciamento em relagao as coisas, de que 0 conhecimento por indugo e 0 conhecimento a priori s80 exemplos. pois baselam-se em principios gerals. A estes principios devemos atribuir o mesmo grau de certeza que a inluigdo das coisas sensiveis. Na experiéncia individual nao se coloca 0 problema do erro, que surge apenas quando se trata do conhecimento de verdades (no dominio das nossas crengas). PROBLEMATICA DA SAUDADE & ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DA CONSCIENCIA SAUDOSA, Joaquim de Carvaiho TEMA: Especificidade da representagao saudosa Distingdo entre representagdo e presentacao. A presentagao como vivencia actual ou percepgao (captagao sensivel) de uma realidade extramental, fisicamente manifestada. A representagéo como evocacao retrospectiva de algo ausente no tempo ou no espago. A saudade como vivéncia da consciéncia, cujo correlato intencional nao se encontra presente num tempo actual, a ndo ser como representacao. A representagao saudosa como presenga espiritual de um correlato intencional actualmente ausente (transacto ou espacialmente distante) ¢ desejado, Distingdo entre a presencialidade espiritual, caracteristica da representagdo saudosa, e a presen- cialidade actual da percepgao sensivel (presentacao de um objecto a consciéncia). A presencialidade espiritual da saudade como representagao de seres ausentes ou de estados transactos que se desejam presenciais. A vivencia saudosa como representagao do passado, em conexao contrastante com a presentagao de um objecto actual, o qual suscita saudade. Geragéo da saudade a partir do contraste estabelecido pela consciéncia entre a realidade dada na percepgao actual e a dada na evocagao retrospectiva Projeccao da realidade ausente e desejada sobre a realidade presente. \Variagao da vivencia saudosa em fungo da oposi¢ao entre as qualidades e propriedades afectivas da representagao (valorizadas) e as propriedades afectivas da presentagao (desvalorizadas). E a caréncia de determinadas qualidades, no correlato da percepeo actual, que suscita a representagao de coisas ou situagdes ausentes, cuja actualidade se deseja. A representagao saudosa como especificamente humana. Deus nao possui representagao do que & ausente, pois acto puro (perfeito, sem qualquer caréncia). O animal nao possui representago saudosa, pois 0 seu psiquismo encontra-se confinado ao sensivel e singularmente presente, SOBRE A ESSENCIA DA VERDADE, M, Heidegger TEMA: Filosofia e esséncia Perguntar pela esséncia da verdade é perguntar por aquilo que caracteriza, em geral, uma verdade como tal ‘Oposigao aparente entre a pergunta filoséfica pela esséncia da verdade, enquanto pergunta geral e abstracta, e a pergunta do senso comum pela verdade «efectiva». No entanto, 0 proprio senso comum, ‘quando pretende a verdade «efectiva», pressupde respondida a questéo acerca do que é a verdade (embora seja «surdo» para a linguagem e «cego» para 0 olhar essencial), ‘A pergunta pela esséncia implica uma analise daquilo que habitualmente se entende por verdade. Através da constalagdo de que 0 conceito vulgar de verdade se encontra ligado ao de adequagao e de correccao, procura-se 0 fundamento dessa mesma correog4o, 0 qual aparece como uma relagao de «abertura ao enter. Se a abertura ao ente se funda na liberdade, a liberdade é ela propria a V.S.FF. 14/0/13, esséncia da verdade, como um adeixar-ser» dos entes, ou deixar o ente ser o que € (expo: desvelamento do ente). Através do conceito de esséncia, a filosofia pensa o ser, pois perguntar filosoficamente pela esséncia da verdade (e descobrir o «entrelagamento desta com a verdade da esséncia) significa pensar uma Unica questo: 0 que é o ente enquanto tal e no seu todo, ou, por outras palavras, pensar acerca da questo do «ser do enten, © pensar do ser é a propria filosofia (metafisica) e nele «vem a palavra a libertagéo do homem para 4 ek-sisténcian e a possibilidade de «histéria» (entendida como pergunta pelo ente e como liberdade, isto é, abertura ao ente no seu todo e enquanto tal). jo a0 TEORIA DA INTERPRETACAO, P. Ricoeur TEMA: O caracter dialéctico da interpretagtio Necessidade de uma abordagem dialéctica do discurso que ultrapasse as perspectivas unilaterais, (e, por isso, insuficientes), como 0 caso, por um lado, da hermenéutica romantica, historicista - que privilegia 0 plo «subjectivo» do discurso, isto 6, a intengo do autor e a situacSo historica dos leitores originais ~ e, por outro, do estruturalismo — que, ao privlegiar o sistema, faz desaparacer 0 evento da linguagem (a linguagem como discurso). Conceber o discurso dialecticamente é mostrar as polaridades que Ihe so inerentes, por exemplo, a dialéctica de evento e de significago, segundo a qual se todo o discurso se actualiza como evento, todo 0 discurso se compreende como significagao. A dimensao da significago, enquanto dialéctica de sentido e de referéncia, permite mostrar que todo o discurso, sendo de alguém para alguém, é sempre sobre alguma coisa (0 mundo). Porém, o problema da interpretago surge com o texto escrito, sendo a escrita concebida como a destinagao do discurso. Perde-se 0 evento da linguagem falada e o texto ganha «autonomia semantica». O locutor da lugar ao autor e 0 ouvinte ao leitor. O auditério universaliza-se e 0 texto é objecto de miltiplas leituras. A interpretagao s6 & possivel como dialéctica de compreensao e de explicago, sendo o movimento de leitura um movimento da compreensao para a explicagao e desta para a compreensao. No primeiro ‘momento, pela «conjectura», surge uma hipétese interpretativa possiblitada pela captagao ingénua do sentido do texto, enquanto todo, a qual sera «validada», num segundo momento, pela explicacao, pela 3e do contetido objectivo do texto. Este segundo momento da origem a um «modo sofisticado» de compreensdo, que se baseia em procedimentos explicativos. Procura-se, ndo a situacao original do autor ou dos leitores, mas 0 «mundo» (conjunto de referéncias nao ostensivas, descritivas e nao descritivas) aberto pelo texto, mediante 2 «apropriacdo» (que resulta da dialéctica de distanciamento e de apropriagao) e que, a0 mesmo tempo, possibilita uma autocompreensao do Si mesmo. 114/cn14 “opeaYISseID 40859}01d © 77 ea 2 sane ed opstea oj Bue 9 ooo opous -soperyaou sowuzoqioo sop opbendopy "9 2yosoy Bouin ep esneud ogbeziin aL f. sonoupoutuca sop eoss0d opSeudoudy "ay Powauioayuco sop ei00 ogo — 9's ‘sno op e6 woaa09 3 ‘oad oveid ese ogssanare ep oFt2e00)- 339 Segue 9p 08a i ppp — r | = = L { _ - a 1 — i I — t - - : | - — I I [ — 4 — T my, wy. oy wr 339 | 330 (se) | s39 Wognus - Tosnss ) vIdOSO71d - OVSVOIsISSVT9 3d VHTIUD o8e4 «2 ‘2002 — ouepunsas ou/sug op s!euojseN sowexg

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