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A Historia da Alimentacdo: balizas historiogrficas Ulpiano LBezerra de Meneses Departamento de Hisria - FFLCH/USP Henrique Carneiro. Doutor em Historia Socal / USP Introdugao_ Este texto nGo pretende realizar um levantomento panorémico da Hisria do olimenioggo, multe menos fomecer um reperloio biblogidico. A indefinigdo e plasticidade e a ubiqiidade do tema, sua extensao universal, a multipicidade ‘de abordagens, a amplitude [na quantidade © nos graus de qualidade) dos trabalhos publicados tonam inviével uma bibliografia gue so pretenda abrangente, ainda que nao exaustiva. E, mesmo, talvez, de utilidade problematic ‘Assim, © objetivo € antes caracterizar um campo de estudos que, nesta segunda metade do século, vem assumindo certa peisonalidade propria, n&o 86 nos dominios da Histétia [nosso foco principal de interesse|, mas também nas demais ciéncias sociais. Longe de nds pretender, com isso, dar status epislemolégico & Histéria da Alimentagdo, NGo se trata de aumentar o elenco das miltiplas ‘historias’ em que a disciplina se vem fragmentando, perdendo de vista © principio de que, se a Histéria ndo tiver camo objeto essencial de atengao a sociedade como tal — a sociedade como um todo —, forgosamente comprometeré sua capacidade de produzir conhecimento (ao invés de simples informagao} e entendimento dos fendmenos e seus atributos. No entanio, & forgoso reconhecer que a prética da Historia organiza suas necessidades e conveniéncias em torno de certos referenciais, plataformas, problemas, recursos, articulagées com outras disciplinas, hébitos ‘Anais do Museu Paulista. Sao Paulo. NSér v5, p.9-91- jan /dez. 1997 10 —e até modas —, que constituem efetivamente algo préximo da nogéo de ‘campo proposta por Bourdieu, E a formagéo desse campo e sua consolidagdo, assim como tragos hoje predominantes, que se procuraré tragar. Por certo ser conveniente, antes disso, inserir a Histéria propriamente dita num quadro mais amplo e diversificado de disciplinas que se interessaram pelo problema da alimeniagdo. (Ainda mais que, dentre as disciplinas congéneres, a Histéria est longe de se distinguir pela atengéo dada ao temal. £, depois, caracterizar a bibliogratia histérica, salientando, de um lado, alguns marcos ¢, de outro, selecionando o que se acteditoy referéncia exempllicativa de tendéncias, padrées, tipologia de fendmenos @ assim por diante. Em conseqiiéncia, a estrutura que nos pareceu mais eficaz é a seguinte; De inicio, um panorama dos estudos da alimentacao, salientando, além dos principais enfoquas, a contribuicdo especfica das ciéncias sociais. A seguir, vem uma fentativa de acomponhar a formagéo do que hoje se pode chamar propriamente de Histéria da Alimentagao e sua insiitucionalizago. Seguese o quodro de caracterizagéo geral da bibliografia histérica. Algumas questées relovantes mareceram tratamento mais espectico: assim, foramlhes reservades, na seqiiéncia, espaco proprio: a fome, © universo religioso, a mundializagéo da alimentagao € 0 gosto ¢ a gastronomia, Finalmente, tentou-se também delinear um rapido perfil da problemdtica da climentagao na historiografia brasileira Uma glima ressalva introdutéria deve ser apresentada. A bibliografia aqui considerada é essencialmente européia e norle-americana. Sao esporddicas ‘as mengées 4 literatura sukamericana (salvo Brasill, africana e asidtica, E mesmo @ literatura européia se concentra basicamente na Franca, btélic, Inglaterra, Alemanha e algume coisa de seus vizinhos. Tais lacunas se devem, seja 4 origem predominante dos estudos e ao interesse maior que despertou a pesquisa nessas Greas, seja a seu viés eutopocéntrico, seja, enfim, ds grandes dificuldades, com que nos defrontamos, de acesso 4 bibliografia. Estudos da Alimentagéo Desde o Anigtidade pode-se dizer que o climeloeso vem sendo objeto de atencao ¢ conhecimento. Do um lado, a necessidade inescapavel de ingerir alimentos para mantor a vida 2, de outro, a enorme variedade de ‘escolha neste processo, permitiram sem divida perceber um conjunio de fendmenos prenhes de implicagées. Mas convém desde jé inkoduzir uma questéo determinante: ao se falar de alimentagdo, de que se esta falando, qual, precisamente, © objeto desse interesse, desses registros, crénicas & estudos? A julgar pela situagéo hodiema, ha varios focos que se cruzam ou superpdem @, ds vezes, seguem em paralelo. Falarse em alimentagdo & privilegiar © alimento (sua produgao, aquisiao, circulagéo, consumo, caréncia, o mercado, representagées, fungées sociais e culturais e assim por diante)? Ou a nutrigéo? Nao existe, hoje, uma Antropologia nutricional, assim como uma Sociologia do alimento? Ou o objeto seriam a dieta e os modelos © sistemas alimentares? Ou os habitos @ mesa, as praticas alimentares © a culindria {a ‘cozinha'|, 08 espagos € equipamenlos, contexlos e agentes, em portcular os préprios'comedores © beDedores? Eo historia do goslo 6 da gastronomia, seriam subcategorias da alimentacéio? E a educagéo alimentar, seguran¢a alimentar e as politicas alimentares? Hé, podese ver, grande oscilacéo de sentido e de cenlros de gravitagdo. Estas fronteiras estéo longe de poderem ser claramente demarcadas — e ndo é evidente que devam sélo. No entanto, maior esclarecimento pode derivar de um exame dos enfoques predominantes na andlise desses variados abjetos. Sao eles, basicamente, cinco: 0 enfogue biolégico, o econdmico, 0 social , 0 culural ¢ 0 filosdfico. Segundo tais enfoques, muda a propria natureza do objeto de atencdo: 0 alimento pode ser enfocado enquanto plantas econdmicas ov onimais domésticos (ov, hoje, matétiasprimas de diversa proveniéncia ou sintefizadas), como mercadorias ov nutrientes, como vetores de ‘agG0 social ¢ politica, como elementos simbélicos ou ideolagicos e suportes de praticas culturais © enfoque biolégico O enfoque bioldgico de todos é 0 que conseguiu monfar o quadro mais equilibrado de problemas ¢ métodos, assim como um apreciavel acervo de informago e conhecimento, associados basicamente & nutticao. Na Antigiidade, hé uma farta literatura médica, principalmente entre gregos e romanos: Hipécrates, Galeno, Oribase, Antimio, Dioscérides, Apuleio, Celso etc. procuram desvendar os ‘mistérios’ do metabolismo humano e, particularmente, 0 fenémeno da digestéo. Um tratado famoso do século XVIll, 0 Traité des aliments de Louis Léméry (1702), ainda se enquadie neste filo, Toda © Historia da Medicina, aliés, € uma fonte de informagées para a histéria da alimentagGo. As teoriais nutricionais, a idéia da digestéo como cozimento, as prescrigdes dietéticas, so prodigos reveladores dos hdbitos e concepcées de uma sociedade (cf. Mazzini 1996}. Aliés, o Enomedicina, hoje em dia, prolonga tal tradi¢ao, buscando coletar e explicar informagdo [até mesmo. istoricamente) sobre crengas associadas a alimentos ou formas pelas quais os grupos e sociedades os classificam, no tocanle aos aspectos da nuligdo e saide (Wilson 1979}. Além disso, estalisticas, censos ¢ oultos registios oficiais no campo climentar, nos séculos XVill e XIX, na Europa, ficavam normalmente a cargo de médicos. Caso exemplar € o do Reino de Népoles: a pesquisa esatistica ‘ordenada em 1811 tinha, entre suas cinco segées, a Ill, relativa & “sussisienza e conservazione della popolazione”, cujos dados, ‘muito ricos e precisos, foram colelados © processados exclusivamente por médicos [De Benedettis 1995} A Bolénica ¢ a Zoologia trouxeram aporte fundamental pora a constituicGo de um acervo de conhecimentos basicos referentes a alimentos. No Renascimento, os pioneiros estudos gregos e latinos sobre plants, como a Matéria médica de Dioscérides, a Histéria Natural de Plinio, 0 Velho, ov a Histéria dos plantas de Teofrasto, que tratavam da flora de um ponto de vista utilitério, econémico, tecnolégico e medicinal, foram traduzidos e pela primeira vez publicados no Ocidente. Os herboristas’ (que, na otigem, eram médicos}, W 12 fiveram um papel desbravador no fomecimento de dados histéricos das plontos alimenticias. NGo nos esquegamos que muitos hetbatios do século XVI so chamavam justamente ‘Historia das plantas’ (De Historia Stispium, de Leonhard Fuchs, 1542) ou "Historia dos frutos” (Frugum Historia, de Rembert Dodoens, 1552], por exemplo. As ciéncias modernas relacionadas & nutri¢éo desenvolveramse a partir do século XIX, com um carder interdisciplinar, reunindo os avangos obtidos em diferentes ramos das ciéncios natrais juntomente com os da Medicina {Agronomia, tecnologia alimentar, andlise quimica de alimentos, Fisiologia, Bioquimica, Toxicologia, Microbiologia, Patologia, Epidemiologia e Genética, entre outras}. Por volia de 1850 é que comega a desenvolverse tol género de estudos, principalmente na Franga, na Alemanha e na Holanda, acompanhado de sistemas de coleta de dados, em ambito nacional. Os objetivos da pesquisa biolégica, com énfase na nutri¢éo, foram assim definidos por Teuteberg (1992: 2} “Notiitional research is supposed 10 examine the processes of digestion within the human body and to gather data for an optimal diet which can be modified according fe age, gender and the amour of work humans do. OF special imporonce i he search for 0 sound basis fora dietary treainent fr diseases ofthe metabolic, digestive, ‘and excretive roceses, ‘and progess lowards optimal food conditions, determined by clinical research” Compre notar que, por muito tempo, nesta Grea, os pesquisadores raramente se interessaram por questées fora do ambito biolgico, constituindo um dominio de ala competéncia, mas excessivamente circunscrito, como na caracterizacéo de Teuteberg c esta dimensdo bioquimica da climentacao, vista apenas como um proceso orgénico e metabélico. Mas jé no século XIK, estudos de Medicina procuravam determinar implicagdes histéricas. E 0 caso, por exemplo de Watt, Freeman e Bynum (1881) que, ao estudarem a fome crénica dos marinheiros, trataram de estabelecer a influncia da nutricao na histéria maritima e naval, Doutta parte, a necessidade que outras disciplinas sentiram de um apoio biolégico ha algum tempo comecou a estabelocer pontes, ainda que ‘assimétricas. Em 1983, por exemplo, Scrimshaw publicava um artigo destinado @ realgor a importéncia do conhecimenio nuticional para os historiadores. Mais tarde apareceram até mesmo instrumentos de difusdo, como a obra de Harold McGee (1988), que procura transmitir aos ndo especialistas referancias basicas de Botanica, Zecloge, Fisiologia, Bioquimica, apontando as propriedades de matériaspprimas © suas combinacées (late, carnes, ovos, dlcool, grdos, legumes, etc.|, 05 efeitos de métodos e equipamentos de cozinha e assim por diante Desse contacto com as ciéncias sociais crioramse areas de investigago e afuagao interdisciplinar, como, nos Estados Unidos e na Europa, 2 j@ mencionada Anttopologia Nutricional (Freedman 1977, Wilson 1979, Fieldhouse 1986). Fala-se também de uma Psicotisiologia e de uma Biopsiquiatria da alimentagao, assim como de Nulrigéo Sociale, ainda, de Educagéo Nutricional (Cf, Messer 1984] Hoje ndo se contesta que os grandes problemas de base biolégica no podem ser encaminhados apenas no ambito restito da nuttigéo. Basta aponiar ‘alguns temas criticos — fome e patologias alimentares, seguranga alimentar, jejuns edietas, demagrafia, adogéo/rejeigdo de alimentos, gosto — para néo falar de tematicas mais amplas como a evolugdo biolégica ou os processos nutricionais ‘adaptativos: sGo lodos temas imbricados em outras dimensdes. ‘A fome, como se veré mais adiante, assim como a desnutrigao ov a subnutrigGo, nGo podem mais ser entendidas apenas em seu nivel orgdnico, fisiolégico. Uma obra importante como a de Amartya Sen [1988], por exemplo, propés um modelo explicitamente sécio-cultural para definir a fome e nele & que incorpora o biolégico, ‘A compreensao de patologias como a bulimia e a anorexia nervosa exigem que elas sejam tratadas como ‘welfare diseases’, tipicas de uma sociedade de consumo — para o que as condigées favordveis comegaram a se condensar j& no século_passado. As dimensdes ndo biolégicas sGo aqui determinantes. Caplan (1994: 18), por exemplo, preccupada com as relacdes de poder, nao hesita em caraclerizar a anorexia "as an extreme form of self control, but also involves the exercise of control over others’ Problema associado é 0 do jejum, que convém examinar, como tem sido frequente (cf. Bynum 1987}, conjuntamente com a festa. O jejum tanto pode ser um ato de subordinagao, quando de resisténcia: em ambos os casas (e ndo 86 nas greves de fomel, sua matriz é politica, Jé as dietas [restri¢ées alimentares ou, ao contrério, reforco alimentar} tém sempre implicagdes sociais, politicos, culurais. Apenas para ficar num exomplo evidente, lembrese como o ideal corporal feminino depende do processo de socializagéo da mulher (Caplan 1994: 14-5; Orbach 1978, Charles & Ker 1986). Movimentos populares, como os\ inimeros health movements dos americanos e também de europeus, infegram conhecimentos médicobiolagicos, além de premissas filosdficas e, ds vezes, religiosas, modelos culturais, sem contar um semnimero de pressées séciceconémicas (como se patenteia no caso exemplar do vegetarianismo). Nessas circunstancios, uma autonomia da dimenséo biolgica seria em exlemo deformante. Felizmente, a bibliografia de base procurou ullrapassar tais limitagées (cf. Schwartz 1986, Bauer 1989, Spencer 1995). Merece mengdo & parte a obra de Fiddes (1991} sobre a rejeigdo e consumo da carne — trotada como um ‘simbolo natural” Estudos recenies de evolugGo biolégica insisiem diretamente na dimenso social, ao tratarem da alimentagGo, como por exemplo no tocante 4 nutrigdo dos coletorescagadores. Um caso que merece referéncia sdo os esforgos para explicar a parilha da came de animais de grande porle e que tém mobilizado argumentos variados, mas sempre de conotacdo social: selegao pelo parentesco, folerancia ao furto, reciprocidade, redugdo dos riscos da imprevisibilidade dos recursos, etc. Por sua vez, lembrese como, entre nés, um conceito de conteido bioldgico vinculado 6 produgao de alimento — 0 conceito de domesticagao — ndo dispensa a inclusto de seu significado social. Assim é que Pierre Ducos transfere 0 foco de definigéo para o papel dos animais como ‘propriedade viva’ a domesticasdo pressupde uma forma especifica de integragdo dos animois vivos 1 Kent has eco sage that meat shared primal for w- ‘mic ones, and Peterson Tas ange that foragers share for wcll reason ‘There 6 probably not ‘one explanation, ¢..) 1 peopave thar men sbare eat becaue enables them o eed ther ther culdren — those nt oa 10 thet waves — and thie directly ines ses thei repredcare suecces” (Thiol 1994: 13 14 @ organizagéo socioecondmica do grupo, que implica a possibilidade de posse, heranga, toca, comércio, etc, [Ducos apud CluttorBrock 1989; ver também Vialles 1994], Na mesma linha, estudos de domesticagdo de plantas ndo apenas enformam 0 conceilo de ‘sociedade agricola’, como, ainda, e melhor, o de ‘sistemas especilicos de exploragdo agricola’, entendidos como sistemas s6cio técnicos [leaf 1996: 32}. Em nossos dias se trata correntemente a adogéio ou rejeicto de alimentos como tendo mais a ver com sua consideragao social do que com suas propriedades nutritivas. Burguiére (1986: 10} lembra as dificuldades com que cettos alimentos foram introduzidos na Europa, embora posteriormente desempenhassem papel relevante, por seu valor nutritive, principalmente em tempo de fome. Assim, o milho, cuja origem indigena suscitou “une réaction de repugnance”, ou a balata, cujo “anoblissement social” se deveu a acdo promocional de Parmentier. De igual modo, a castanha, alimento de bom feor nufirtivo e muito importante na Europa do sudoeste até 0 séc.XIK, além de pouco custosa na produgdo e na demanda de méodeobra, entra em dectinio pela imagem de pobreza e de atraso com a qual passa a ser associada: De mesmo teor, 0 gosto ndo pode ser tratado como exclusivo problema biolagico — apesar da importdncia fundamental que o poladar exerce, principalmente como sentinela do organismo; 0 sabor amargo, por exemplo, 6 indicio de olcaléides, substancia téxica que cumpre evitar; (6 © sabor doce indica a presenca de glucidios, sinal de alimento bom (Nicolaides 19936: 39, Moskowitz 1971}. Por isso mesmo, os especialistas sentiram necessidade de estabelecer distingdes, como foi o caso de Rozin e Fallon {apud Garine 1994 232), que propdem separar distate |"corresponding to sensory rejection") de disgust [‘comesponding to refusal on cognitive grounds”) Devese ainda mencionar um campo importante, intimamente vinculado a uma base biolégica, mas que fem tido, no tema da alimentagdo, presenga menor do que a desejdvel: tratase da demogratia. Por certo, existem muitas obras relevantes que poderiam ser lembradas, como The rise of modern population, de Thomas McKeown (1976], que relaciona crescimentos populacionais com melhorias nutricionais, ov Popolazione e alimentazione, de MiviBacci {1987}, que percorre a histéria demografica européia; ou entéo, trabalhos que procuram acentuar a imporiéncia da Demografia Historica nos estudos de climentagéo, como Biraben {1976}. Também, como se vera mais adiante, nas décadas de 60 ¢ 70 — momento de institucionalizagao da Histéria da Alimentaéo —, principalmente os historiadores franceses referiramse com freqiiéncia a questées de conleido demografico. Mas ainda ha muito o que fazer, neste dominio. Por fim, para inferir a estreiteza da perspectiva biolégica, se desonvolvida auionomamente, alentese para o {aio de que os enfoques nutricionais ndo sGo suficientes para explicar a alimentagdo na sociedade industrial. Ne verdade, tratase de casos amplissimos de inadaptacéo nutricional, como [6 nolaram os especialistas, pois os padres olimentares contemporaneos 860, antes, os de uma sociedade tipicamente agricola, otientada para intenso atividade corporal, muito diversa da sedentariedade que caracteriza nosso modo. de vida — além de fovorecerem inimeras tendéncias psico-patolégicas (Teuteberg 1992:6, Garine 1994: 238} O enloque econdmico ‘Ao contrétio do enfoque examinado aié agora, é no campo da Histéria que se concentom os estudos de alimentos em que predomina o interesse econdmico. Com efgito, até mais que na Antropologia, foi na Historia [ou com prespectiva histérica} ¢, secundariamente, no afia, que se produziram abundantes trabalhos sobre @ obtengao e utilizagéo de um dado alimento, numa 6poca ov contexto dados, explorandose, ainda, seu processamento, consumo ingesiéo, oramazenamenio, transporte, comercializagéo ¢ distribuigdo. Na verdade, produgdo, preparo e ulilizagdo dos alimentos, como observa Valeri 11977: 347) 6 “il pid antico e fondamentale proceso economico" Nos iltimos vinte, trinta anos, como jé se disse em particular quanto 4 Franca [Barlésius 1992}, foi a descoberta, pelos historiadores, da cultura material que fomentou os esiudos de alimentagao. Claro esta que a nogdo de ‘civilisation matérielle’ utlizada pela historiogratia dos Annales e, a seguir, pela Nouvelle Histoire, ndo coincide com as propostas que hoje caracterizam este campo (comparar, por exemplo, uma viséo tao esteita e tacanha como a de Pesez 1988, com o quadro amplo, embora por vezes incompleto, tragado por Poult 1997]. Assim, cumpre reconhecer 0 débito implicito com a categroia marxista de infaestrutura, o que em grande parte jusiifica a forte marca econémica de uma Hist6ria que vai preocuparse com a produséo, sobretudo a produgéo agricola, a ponto de se ter podido folar de uma ‘Agrohistéria, acoplada a uma historia do abastecimento. Abastecimento, safras, precos, mercados ¢ suas flutuagdes diversas sdo alguns itens que mreceram destaque Em conseqiiéncia, afirmase a necessidade de consultar ofemenios e dodos censitirios © investigar as técnicas de aquisigdo, consumo, circulagéo, tansporte, as carestias e fomes. Contextos, em especial os da urbanizagdo e industiializagdo, também mereceram aten¢éo particular, (Bumett 1989, Cépade & lagelle 1954, Teuteberg & Wiegemann 1972| Por certo que 4 distancia é mais facil identificar as limitagdes dessa abordagem, que eventualmente ocorteram, quando se ignoraram ov minimizaram cautelas hoje consideradas fundamentais: a necessidade de trabalhar com sistemas © complexos ineiros, ou de considerar variéveis como 0 cotidiano e as fesias, a alimentagdo humana e a animal, a producdo doméstica e suas formas de distibuicSo (via parentela, vizinhanga, etc.). Se as fonles para estes fendmenos “que fogem da contabilidade formal”, como se lem apontado, séo mais escassas para a Historia, no hé como negar o desinteresse das pesquisas sociolégicas, antropolégicas e geogréficas, que dispunham de situacéio mais favoravel, a esse respeilo, Releva nolar que na Antropologia, talvez mais que na Histério, foi possivel concsitvar ‘com bastante rigor oguns fenomenos basicos de’ coréir econémico, inserindoos no context séciocultural adequado. E o caso dos 15 16 sistemas agricolas, em que estudo da terminolagia revelou graves distorsdes principalmente nas taxonomias de base geralmente einocéntrica “while ‘gardening’ and ‘farming’, ‘hontcultwa’ and agriculture’ are appropriate to discussing the development of hese actives in Southwas! Asia ond Europe, even in that “home fertitory’ these terms can imply a greater complexity in food production systems thot may have existed. The agricubinal threshold may lie within the Neolihic rater thon ‘mark its commencement. For ihe rest of the world, we should jusly the applicability of western terms like ‘agricutwe’ and ‘hortculre" before employing them to describe recent o” ethnographic practices, and consider adopting new or neuial terms when discussing origins® {Helen leach 1997: 146}. Um exemplo de inadequagdo ¢ dado pele propria autora quando, citando Hartis ¢ os estudos de Malinowski sobre horticutotes da Oceania, aponta como Enganosa a expresséo produtores’, que deveria ser subsiituida pela de ‘porceitos’, em vitude do lipo de relagde de ‘amitié respectueuse’ mantida entre o homem @ 0 meio ambiente Nesse quadro poderseie supor que « atengéo dada é cultura material teria produzido bons estudos sobre espacos, utensilios ov equipamentos envolvides na alimentacéo. Islo, porém, ndo ocorreu, nem de forma sislematica, nem cbrangente. Ha,” sim, exploragdes tecnolégicas, como as de Braudel (1970), ou inventérids monogidficos, muitos vezes puramente descitivos e clessificatérios, como, por exemplo, os raros estudos sobre talheres (Giblin 1987, Sing 1976] ou sobre equipamentos de aparaio de determinados periode [Rainwaler 1983), elc,. Mas & s6 recentemente que a Anttopologia e o Sociologia, além da Histor’, intioduzicam nos estudos de alimentacao dimensbes do artefato além da econémica. Convém assinalar, todavia, 0 nimero cada vez maior de estudos vinculados as fecnologias de produgdo, dada a imporidincia ossumida entie és pelos alimentos. sintéticos, pela’ bictecnologia, ete {referéncias em Mennell et alii 1992; 71-2), © enfogue social © enfoque social, como se pode ter apreendido acima, é reconhecido hoje como inerente a qualquer estudo de qualquer aspecto’ da alimentacéo. Com efeito, a rede de interrelacdes que o ‘alimento obrigatoriamente evoca transforma-o, na expresso de Johan Pottier (1996: 238}, num ‘most powerful instrument for expressing and shaping interactions... a repository of condensed social meanings" Embora esse entendimento possa ter raizes jd na propra consfitvigéo da Sociologia e do Geogralia Humana, é sem duvida na segunda metade do século que se consolida este enloque, o qual, a partir da década de 70, vai ceder a primazia ao cultural. Duas obras podem ser apontadas para amostrar as grandes linhas. A primeira é 0 estudo classico sobre a batata, de R.Salaman {Ta.ed. 1949}, que representa os trabalhos centtados no alimento/alimentogéo mas. procuram desvendar seus conteiidos sociais. Como vem no titulo, o que o autor pretende é trabalhar "a histéria e a influéncia social da bataio". Seu eixo de alen¢ao, portanto, é um alimento, sua origem, seu transplante para a Europa, as condigdes e dificuldades de sua aceitagGo e difusdo, os aspectos de suprimento e as flutuacdes na resposla a fomes © caréncias, nas quais desempenhou papel fundamental, como no famoso caso da Irlanda no século passado. Uma segunda obra sao os dois trabalhos de Sidney Miniz sobre o acicar (1986, 1996). Na verdade, o que ele esta efelivamente estudando é a sociedade capitalista, num espago de quase dois séculos, utilizando-se da historia do agucar como plataforma de observacdo. O vasto panorama que ele montou se compde das conclusdes a que pode chegar examinando as condigces de produgdo do acicar nas colénias, as repercussées de sua dependéncia do tabalho escravo {um dos ‘pecados da escravidao') € a exploragdo moral decorrente, as fungées nutricionais, medicinais luxurias do a¢icar, seu papel no imaginario ¢ nas classificagdes sociais e na emergenle sociedade de consumo ea consttugao de uma nova subjetividade, a organizagao do mercado, néo s6 como mercadoria, mas também como primeira necessidade exética, produzida em massa, para uma classe operdria. Em suma, como j& se disse, 0 aclcar funcionou como uma metéfora para aricular os diversos agentes sociais dar inteligibilidade 4 interagdo entre eles. Num contaxto séciorpolitico poderiamos incluir os trobalhos relativamente raros que consideram o tema sob © Gngulo do poder, como no estudo que John Super (1988) fez do papel da alimentagée no processo de conquista e colonizagdo da América espanhola, no século XVII, ou, entao, aqueles que giram em toino das paliticas climentares (McMillan, ed. 1991] CO efogue cutural Este enfoque ndo ignora a necessidade Fisica da alimentagdo, mas desloca decisivamenie a atengao dos alimentos para as formas de preparélo e, sobretudo, consumilos como espacos de articulagGo de sentidos, valores, mmondlidedes, ee. {Ct lupton 1984}, So as implicagoes semiologiecs do bsber e do comer que sobressaem, para atender ds decorréncias do ‘arbiirio cultural’ como expresso no dito famoso de Trémoliére: “Homme est consommateur de symboles autant que d’aliments" [apud Garine 1990: 1453}. Ou, na verséo de leslie White (1949: 2d}: "man is the only animal able to distinguish between distilled water and holy water’. Embora ndo se tenha constituido uma verdadeira Semiologia da alimentagdo, houve um avango considerdvel neste rumo, desde pelo menos as tentativas dos antropélogos esiruturalistas ou de semidticos como Barthes (1961), que procurou definir uma 'gramética’ para o sisiema alimentar. Hoje a idéia de cédigo & muito mais flexivel, ¢ € em todos os desvéios de vida social € nas suas miliplas formas que se procuram identificar € explicar as signilicagées associadas & alimentagdo. Sirva de exemplo um trabalho como © de lifschitz 1993} que, a0 estudar & produgéo contemporénea de alimentos, demonstra como a industria e o consumo criaram alimentossigno, cuja ingestio corresponde a introduzitmes em nosso corpo biolégico um fragmento do imaginario social; em decorréncia, ’se 0 alimento consfiui nosso ser biolégico de denito para fora, desde o invisivel do orgGnico ao vistvel da pele, o alimento- signo nos constitui de fora para dentro, do visivel do signo ao invisivel da consciéncia, ou seja, conforma nossa identidade social” [ib.: 147]. 7 18 Para sumarizar, em suas variantes, 0 essencial da 3 pepectva cultural, compensa reproduzir o que propée Stephen Mennel, quando se refere ao que chama de cultura culindria, desenvolvendo pistas abertes por Norbert Elias: “Culinary cultre, by extension, includes everything that we mean by the ‘cuisine’ of sociely ar social group, but a lot more besides. I refers not jus! fo what foods are eaten and how they ore cooked — whether simply 0° by increasingly elaborate methods — fur ao oe aces ta oe rug coeing ond ctr. Tow oxo ili the place of cooking and eating in poople’s patams of sociobilty (eating out, in Conipany, oF in privae); peoples enthusiasm or lack of it towards food; their feelings onverschyof epugnance werd certain foods or rethods of propraton; tho place of food, cooking and eating in a group of saciety’s sense of collective identi, and so on. Becouse culure is learned, shared and transmit’, ia my view we can only understand ‘the cultural conrols of percepsion’ by studying how they develop and are transmited over time. An onthiopology or saciology of food must also be a history of food" (Mennell 1992: 279; wtombbém 1987) O enfogue filosétic. Resta falar de um enfoque de desenvolvimento recente e, ainda, sem muita densidade. Duas linhas podem ser mencionadas A primeira, mais geral, é exemplilicada pelo livro de Elizabeth Telfer (1996} que se inttula, precisamente, Food for thought. Philosophy and food, Tais titulo e subtitulo prometem mais do que oferecem, (No entanto muitas das questdes ‘aqui tratadas também ocorrem em trabalhos dos mais diversos campos). A autora ‘acentua os aspectos de prazer, ndonecesssidade, na alimentagdo, assim como 98 preconceitos contra a dimenséo corporal do homem e, @ partir dai comenta posicdes de filésofos, de Plato e Aristételes a Kant e Stuart Mill. Discorre sobre © valor do prazer de comer, as obrigacées implictas, as virtudes morais da hospitalidade e da temperanca. Colelaneas como a organizada por Curtin € Heldke (1992] também se alocam aqui A outta linha @ repesentada pela coleténea de Ben Mephan (ed., 1996) sobre a ética da alimentagdo, Questées abordadas: a fome enquanto problema ético, a seguranca alimentar, o’respeito d vida animal e as condicdes ambientais, a moralidade das modernas biotecnologias, os aspectos culturais da ética da alimentagao, etc. A Contribuigéo das Ciéncias Sociais Também aqui o que se pretende ndo poderia ser um quadro definido, nem um balango ctiico sistemético, muito menos uma listagem bibliogrdfica substoncial. Pretendese, 10 somente, assinalar tragos que regisiem a contribuigéo que as disciplinas sociais trouxeram para o conhecimento de um tema multifacetado como a alimentaco. Desde ja convém esclarecer que as compattimentagées. entre Anttopologia, Sociologia, Geografia, ele., s80 arlficiais © destinamse apenas a acentuer comodamente algumas caracteristicas espectficas dominantes e néo fecortes epistemolégicos e metodolégicos rigorosos © consistentes. Nessa mesma 6tica, devese salientar a perspectiva historica que caracteriza muito desta literatura —o que faz que 0 esboco a seguir também abranja, implicitamente, a Histbria ‘Convém ainda esclarecer que ndo se abriu espago proprio para a Psicologia, pois muitas de suas contribuigdes fundamentais encontramse aiiculadas a outros temas ov contexlos disciplinares, aqui citados {selecao de alimentos, dietas, patologias, etc.| Anttopclogia ‘A Antropologia, sem divida, pode ser considerada a discilina que mais se preocupou com nosso tema, que recalheu o maior acervo de informagso e que exerceu, sobre as demais disciplinas, inclusive a Histéria, a influncia mais consideravel. Para se fer uma idéia da amplitude, diversidade e consisténcia da producdo antropolégica, basta compulsar, por exemplo, a revisdo bibliogréfica, iG nao tao recente, feita por Ellen Messer {1984} © que se organiza segundo temas to diversificados como os estudos ecolégicos e de abordagem materialista {eneigia, coletorescacadores, problemas bioculturais), principios de selegdo de alimentos, classificagéo e construgdo dietéria (atributos sensiveis do alimento; dimensdes cultuais, simbélicas e cognitivas), estudos semidticos, identidade, etnia, enculturacdo, estrutura dietaria, fatores econédmicos. Ou enldo, para se ter uma ‘visGo de ‘conjunio, segundo outros porémetros, podese exominar uma colelénea, como aquela organizada por Carole Counihen e Penny von Estenk (1997], que reproduz textos ‘classicos’ como os de Margaret Mead, Claude Lévi- Strauss, Roland Barthes, Mary Douglas, jean Soler, Anna Meigs, Anna Freud, Jack Goody, Marshal Sahiins e muitos outros mais. Doutra parte, um livio como 6 de Stephen Mennell, Anne Murcott e Anneke van Otterioa (eds.1992), além de constituir um bom exemplo do transito de dupla mGo de direcdo entre a Antropologia e a Sociologia {sem excluir a Histéria}, cobre uma gama extensa de femas, sobre os quais oferece uma sintese bibliogrdfica de interesse: as conexdes entre alimento, nutrigGo e satde; desordens alimentares; desigualdades de consumo por classe, géneto, idade, nacéo; relagdo do alimento com as esferas publica © privada’ ‘perspectiva aniropolégica e histérica sobre as culturas Culinarias; 0 impacto do colonialismo e das migragdes sobre a alimentacéo; a transformagdo das tecnologias de produsdo ¢ suas conseaiiéncias sociais, etc ‘Os antropdlagos, desde 0 século XIX, se Smpenharam em desenvolver uma einografia sistematica dos habitos alimentares e em buscar interpreté-los culluralmente. A primeita fase da Antopologia caracterizouse por um comparativismo das diferentes tradigdes culturais. A andlise dos tabus, onde se destacam os alimentares, foi desde os primérdios da Antiopologia Cultural um terreno féril para especulagdes sobre o significado simbélico da alimentagéo. No interior da exlensa obra The golden bough, de James Frazer, publicado pela primeira vez em 1890, desenvolveu'se a interpretacao destes temas, particularmente no livro Taboo ond the pens of the soul. © resultado de interesses semelhantes ao de Frazer foi estimulcr © mapeamento dos diversos habitos alimentares, cuja especializagdo, de cardter local, regional e, mesmo, continental, foi devidamente fixada. A alimentagGo serviv, ainda, para proposicao de ‘éreas culurais’: exemplos de qualidade séo comuns na 19 20 ‘Alemanho, como, enlie tantos outros, os levantamentos de Moriz Heyne (1901} ou 05 de Eckstein ef alii (1938) Em tempos mais recentes, os estudos antropolégicos de alimentagéo podem ser considerados segundo matrizes diferentes, ecoando transformagSes globois que ocoreram no seio da disciplina. . Até os anos 60, imperava uma perspectiva funcionalista acentuade. E alias de uma discipula de Malinowski, Audrey Richards (1932), um estudo pioneiro de alimentagdo que toma os Bemba, uma tribo Bantu da Africa Central, como referéncia, A autora n&o apenas retrata a produgéo, preparo e consumo do alimento, mas os insere num contexto sécicpsicolégico, lovando em conta difetenciais como ciclos de vide, grupos e estuluras sociais, modalidades diversas de interagdo, etc. Infelizmente, esse rico modelo nao parece ter tido a difusdo que merecia. Somente nas décadas de 60 e 70, na voga do estruturalismo, € que 0s estudos antopolégicos sobre alimentagao deslancham e se define um padréo de anélise cultural. Claude Fischler (1990: 17} 0 caraceriza com felicidade, em poucas palavias: *While’ the functionalists looked at food, the structurclists examined cuisine’. © alimento passa a ser investigado como sistema cliyral e abordado linguisicomente Algumas obras publicadas por Claude LéviStrauss (le ery ef fe cuit, de 1964; Du miel aux cendres, de 1967, origine des maniéres de table, de 1968 ¢ Le triangle culinaire, também de 1968, comecam a ter considerével repercussdo entre os estudiosos da alimentacao. Elas ndo tratavam apenas do tema, especificamente, mas de estruturas mitologicas. Todavia, reconhecendo que € em torno da alimentacdo que as diferentes culturas estruturam sua vide prética, assim como parte considerdvel de suas representagses, Lévi-Strauss ndo deixou de mobilizar a problematica alimentar. A diferenca ente o ctu e 0 cozido tornase para ele um dos marcos que funcam a propria cultura, Seu tridngulo culinario (cru, cozido, assado} teve ampla divulgacdo e suscitou endosso apoixanado, tanto quanto recusa exacerbada. ‘A-voga, nos anos 80, de estudos de base materialisia, como os de Marvin Harris (1989, ed.cr. 1986) ¢ enfatizando aspectos histéricos. Além disso, vai ser inensa © explicita a discussdo de. problemas tedricos e metodolégicos telativos ao tema. Se quisermos assinalar quais os temas que, nesia tlima década, tm provocado 0 maior investimento da Anttopologia, no campo da alimentagdo, independentemente de orientacées leéricas, salientariamos as préticas culturais, (8 processos de aculturacdo, a identidade cultural, Se as prdticas j@ eram importantes desde os levandamentos dos ‘modos de vida’, agora ganham mais relevo quando o que se procura é pesquisar, nos habitos, nas etiquetas, nas maneiras 4 mesa, problemas como aqueles propostos por Norbert Elias (1990, ed.or. 1939) ao tratar do ‘processo civilizator. Assim, Mennell (1987) procura explorar os usos socials de aspectos conerelos desta’ domesticagdo ‘do natuteza pela’ culura, exominando. 08 mecanismos que ‘civiizam © apelite’. © controle do corpo, © controle das emogées em piblico, a ‘ordem & mesa’, as hieraiquias e os padides de relagéo, © avango do individualismo © 0 espaso prvado, etc., ett., 540 explorados, principalmente entie 0 séc. XVI até a contemporaneidade, como produtos vetores de mecanismos sociais [vRoche 1997: 255-7]. Varios estudos desta natureza tém recortes nacionais, como o de Cooper {1986} sobre as maneiras chinesas, ou de Amaboldi {1986] sobre as francesas ‘As questes de identidade também tem sido foco de pesquisa. Quanto 4 identidade pessoal, ha vinculagées com as diversas verlentes de estudo do corpo e da corporalidade [Fischer 1990; Lupton 1996]. Mais espaco tem merecido a identidade étnica, a caracterizagdo e fungdes da ‘comida étnica’ (principalmente entre migranies e minorias|: foco do imagindio, delimitagéo de fronteiras, base de conflitos, fonte de estereétipos e estigmas {'alemao-batata’, ou ‘chucrute’; ‘siriolibanés-quibe'; ‘nos Estados Unidos, ‘spaghetti’ para os italianos e, na Inglaterra, ‘frogs’ para os franceses, etc.). Entre os intmeros titulos, podem ser citados: Kraut [1979], Jerome (1980), Calvo (1982 ‘A identidade nacional, por sua vez, tem sido vista como de estalulo ambiguo. Mennel (1985) ja reconhecera que o aparecimento das ‘cozinhas nacionais', dos ‘estos nacionais de comer’ — ©, mais que isso, seu reconhecimento piblico, tornado possivel pela difuséio de ‘historias’ e livros de cozinha — coincidem com a formacao, desde o fim do séc. XV, na Europa, dos estadosnagéio, culminada no séeXIX, século privilegiado do gastronomia Entretanto, nem mesmo para o século passado possivel falar de cozinhas essencialmente nacionais, seja pelo substrato comum histérico ou trazido pelos comércio e processos de aculluragdo [é em curso, seja pela regionalizagdo ainda muito marcada dos padrdes (Murcott 1997}. Poucos estudos exislem como os de Catherine Palmer {1998}, que procurou examinar, no cotidiano, o funcionamento dos mecanismos da identidade nacional, incluindo a alimentacao. No préptio espaco das identidades e em relacéo as praticas alimentares se tem associado a problemética da enculturagao (Fischler 1985 e 1988; Widdowson 1981) e, portant, o papel da alimentacdo na reproducao da sociedade e, principalmente, da familia. Sidney Mintz, apés referirse Gos habitos alimentares como veiculos de emogGo profunda, resume seu popel enculturativo: “The learning of personal fasidiousness, manual dexterity, cooperation and sharing, reson ond racfouty ate commonly Inkad fo the consmpton of food by chides Indeed, geting 10 eat with the aduls as an adul, rather than as a child, may be one of the major hurdles of growing yp in some cultures" (Mintz, 196: 70) Para finalizor, cumpre assinalar a criagéo, no interior do campo ontropolégico, de varias instivigdes agrupando os profissionais interessados no estudo da alimentacao, algumas de Gmbito internacional, outras, de vinculagGo nacional mas repercussao muito ampla e responsaveis por pesquisas, publicagdes, encontros de especialistas e outras formas de atuactio académica ¢ politica: US National Academy of Sciences Committee on Food Habits (1945), International Committee for Anthropological Food and Food Habits {1968}, International Commission for the Anthropology of Food and Food Problems/Intemational Union of Anthropological and Ethnological Sciences, Ethnological Food Research Group (1970), Foundation of Chinese Dietary Culture {1991}, Ajinomoto Foundation for Dietary Culture (1989) 21 22 Arqueclogia No Arqueologia, o tema da olimentagéo tem ocupado espaso central ‘Antes de mais nada, pela televéncia do problema diante das perspectivas holisticas da Arqueologia. Em seguida, pela disponibilidade de evidéncias testemunhos frequentes de documentos alimentares entre 08 restos arqueolégicos e da viabilidade de inferéncias. Assim, ndo é de estranhar que a Arqueologia tenha fornecido contribuicéo de monta a estudos de evolugdo cultural. Helen leach (1997: 135] chega a afirmar que foi no tocante 4 substituicio de um sistema de caca e coleta pelo da produséo de alimentos que, nos dimos cinglienta anos se travou 0 debate mais importante no dominio arqueolégico. Infelizmente, nao hé ainda nenhum tratamento consistente e abrangente do tema, A bibliografia é esparsa e muito volumosa e de qualidade variavel, sobretudo nas tentativas de sintese [como Perlés 1996), mas j@ se comeca a ter um quadto mais definido de problemas (Amott, ed. 1997; Harris & Ross, eds., 1987, Ellen 1994 ou Garine 1994). Uma coleténea que justifica lembranca, pela diversidade de contexio, € a que englobe os trabalhos monograticos de Sigfried |.De Laet, Jack R.Harlan, Sandor Békény, José Llorenzo, Mario Sanoja Obediente, Luis G lumbreras Salcedo e outros que colaboram com a Parte Il [From the beginnings of food production fo the fist states), incluida no primeiro volume da History of Mankind, da Unesco, dirigida por SJ.De Laet (1994: 366-39), estendendose desde o Neoliico até ca. 5.000 anos atrés, com os inicios do proceso de domesticagao de plantas © animais em varios dominios geogrdficos, como o Velho e o Nove Mundo € o Oriente. Mais que tudo, a perspectiva holistica da Arqueclogia, como se disse ‘acima, e sua vocagao para expbrar todas as possibilidades inerentes 4 cultura material obrigoue a defrontarse permanenlemente com o problema da alimentagéo, da subsisténcia, das tecnologias de obtencéo, processamento, conservagao e distibuicéo dos alimentos, dielas caréncias, etc.elc., a parlir de restos materiais e sua insereéo espacial. Seria ocioso mencionar titulos, pois s60 excepcionais os estudos ndo monogrdficos que excluam a alimentagGo de seu arco de interesse, Disso resultou a necessidade de formular e calibrar métodos e técnicas de identificagdo, recupetagdo e andlise de evidéncias ~ o que ndo se encontra, em nivel comparavel, em nenhuma outta disciplina que se tenho ocupado da climentagdo, salvo, em parte, nas ciéncias de nutri¢do {v.Brothwell & Brothwell 1998}. Bastaria, por exemplo, examinar um manual corrente de introdugdo 4 Aiqueologia, como 0 de Colin Renfrew e Paul Bahn (1991), para se ter uma idéia da pandplic de recursos desenvolvides pela Arqueologic, com auxilio interdisciplinar. (E que a Historia, por exemplo, desconhece, mesmo naquelas circunstéincias em que tais recuros lhe poderiam ser de grande valia.] © capitulo 7, sobre subsisténcia © dieta, desfila as posibilidades crescentes que se tém aberto. Andlises macro e microbotanicas, técnicas de flotagdo para recuperagdo de vestigios, estudos palinolégicos ou de impressées de vegetais permitem recuperar quadios palecbotinicos e definir, ds vezes em niveis impressionantes de pormenores, a interacdo humana. © exame de restos faunisticos e humans, principalmente de material osteolégico, & capaz de produzir dados de vasto clcance. A andlise isotépica de colageno do osso humano, por exemplo, vern sendo uilizada para esclarecer a origem da agricultura no Novo Mundo, pois registra informacéo sobre consumo alimentar em padrées de longa duragéo. O estudo do desgaste dentario, por sua vez, revela néo s6 dados preciosos sobre dietas, patologias e coréncias alimentares, como também sobre técnicas de manducagade. O conteido estomacal, coprdlitos, residuos culinérios, tipos de utensilios @ tragos dos padiées de uso nos artefatos asseguraram © conhecimento individuado de refeigdes, de técnicas de processamento, de variagGes sazonais, de combinagées alimentares com implicagées nutricionais, de constantes na distribuigdo per capita etc... © contetido de concheiras é convertide em indices nutricionais, que podem, por sua vez, fornecer pistas para varidveis demograficas. E assim por diante. Sumarizam os autores: “All the methods described in his chopie are. providing orchacology with new Iools, not to say with ‘food for hough’. The evidence available varies rom botanical and animal remains, both laige and microscopic, 10 tools and vessels, plan! and animal residues, ‘and ait and fexs. We can discover what was eaten, in which seasons, and sometimes how 1} was prepared. We need to access whethor the evidence arrived in the archaeological record naturally or through human agency and whether the: resources store wl or ender human convol Cccostonally wwe encouier fe romans of ndcal meals lof as funerary offerings or asthe contents of somachs or feces. Finally, the human body iself contains 0 record of die in oothweor and in the chemical signatures lot in bones by diffrent foods” Renfrew & Bohn 1994: 270), Sociologia Embora os grandes nomes da Sociologia, de Marx a Spencer, de Durkheim a Weber, de Simmel a Sorokin, tenham incluide em suas obras reflexdes sobre alimentagdo, néo desenvolveram um campo sistematico de problemas. E somente o partir da difusdo da Sociologia da Cultura que véo surgir os trabalhos de maior continuidade e os verdadeiros especialistas do ramo (para uma visto panordmica do campo, ver Mennell ef alii 1992, Murcott, ed. 1983) Como aliés & desejavel, a Sociologia parthou com a Antropologia um campo comum de interesses — de que também parliciparam a Geografia © @ Historia. Nao obstante, ha certas ares de problemas que ela privilegiou. ‘A primeira referese a questées de diferenciagtio social pelo alimento, de status, e, em suma, de poder. Apesar de se tratar de uma perspectiva corriqueira, ndo deixa de apresentar resultados interessantes, ao identificar as especificidades que, no caso, assume o alimento (v. Wiessner & Schiefenhével 1996), Entre as diferenciagdes sociais, as de género sGo as que mais tém ‘ampliado seu campo na pesquisa. © eixo tem sido a divisdo social do trabalho doméstico, com o homem como provedor exierno do alimento ea mulher como processadora e responsavel pela reprodugdo da familia [para exemplificar: Charles & Kerr 1988, Murcott 1983 e 1993, Wall 1991). As questées de género também 18m sido vistas de Gngulos mais reduzidos, como a associagéo da carne & virlidade — 0 que terd implicagdes muito amplas em movimentos como 0 vegelarianismo {Twigg 1983, Caplan 1994: 17) 23 24 Em escola superior, 6 @ associagéo da alimentagéo co campo do poder que tem sido uma constante. Arjun Appadurai {1981} forjou, mesmo, o neologismo ’gastropolitica’ para coracterizar num estudo sobre hindus, o uso do climento como meio de proteger ou contestar posigdes sociais, Ele também abservou © conteido politico dos eventos alimentares festivos: “the marriage feast is a quintessentially gostopolitical arena" (1981: 502}. Young (1971) i coracterizara a festa como oportunidade impor de disputa de poder: “fighting with food". £ Mary Dougias repetidamente assinalou o banquets como recurso para mobilizar forcas {p.ex. 1972). Na ordem internacional, como demonstram Carole Counihan ¢ Penny van Esterik (eds., 1997: 3], a hierarquia de ‘primeiro mundo’ e ‘terceiro mundo’ se assenta no acesso diferencial ao alimento, especialmente a carne. A segunda drea de questées 6 a comensalidade. Comer e beber juntos sempre foi reconhecido como matriz de sociabilidede (Mennell ef ali 1992: 1159, levenstain 1993, Autell et alii 1992, Douglas 1984). Dai o preocupagdo em estudar a alimentagao e as praticas alimentares como rites de passagem € incorporagéo, de solidariedade ¢ hospitalidade ou exclusdo, de identidade e socializagdo, oportunidade de transgressdes, de relorco compromissos de hievarquias, etc. A importdncia visceral da comensabilidade em certas sociedades antigas — basta atentar para o symposion dos gregos — motivou obras de elevado interesse sociolégico [Panel 1992, Lombardo 1989, Nielsen 1998). Doutto éngulo, os estudos de comensalidade se orientaram para a tefeigdo como instituigGo social, sua natureza e funcionamento, seus icones — como a mesa (Douglas 1972, 1974, Wood 1995, Herpin 1988, Visser 1987, lucas 1994 etc.| Neste contexto, os avancos da tecnologia alimentar {com os alimentos industrializados}, a ampliagéio do habito de comer fora, o aparecimenio da fast food vo comprometer a cozinha doméstica © seus significados sociais {Fischler 1979, Mintz 1985, leidner 1993, Carney 1995]. Fischler até cunhou um termo —"‘goshoanomia’— (1980: 28) para expressar a dessocializagdo que a liberdade irrestrita de escolha individual esta provocando, ao criar a ‘oportunidade de ‘comer sem refeicdes’ Problema correlato, o'do ‘jantar fora’ tem sido, por isso mesmo, examinado como performance social (Finkelstein 1989) ou ‘teatro das relacdes sociais’ (Shelton 1990), estendendose tais enfoques ao estudo do resaurante ‘como espaco simbélico e de seus agentes, os cozinhelros, chefs, garcons [ver refers, em Fine 1996, Pillsbury 1990] Dentro dos padrdes de sociabilidade, ndo se pode esquecer a alimentagao institucional: escolas, prisées, hospitais, navios, quariéis etc. (Lambert 1968, Valentine & Longs 1998) ‘ bebida e seus desvios tm recebido espaco da Sociologia (as vezes acoplada & Antropologia © com perspectiva histérica). Mary Douglas se interessou pelo que chama de Constructive drinking (1991) para identificar a embriaguez como expressdo de uma cultura; Véronique Nahoum-Grappe, em la cule de Tivesse (1991), procure, com auxiio da fenomenologie' hisérica, estudar a “conscience collective de ce que peut étre un tel état (I'ivresse)"; Didier Nourrisson, que jd havia produzido uma tese sobre © alcoolismo € 0 onl alcoolismo na Franca sob a ila, Repiblica (1988), toma a figura do ‘buveur', no séc.XIX, como eixo de sua investiga¢Go (1990); Harrison [1971] ocupouse com a bebida entre os vitorianos (e organizou em 1967 uma bibliografia critica sobre bebida e sobriedade na Inglaterra, ente 1815-1872} e Brennan (1991) com a bebide como padiéo péblico de. soclabilidade ¢ com 0 culuta popular do séc.XVIll. lossifiedes & GefouMadianou (eds. 1992} associam 0 alcool a questées de génro. G.E.Vaillant [1983] tragou uma ‘historia natual do alcoolismo’. Um nimero especial da revista Terrains {Boire 1989) apresenta varios estudos sociolégicos sobre bebidas (alcool, café, cha, chocolate], suas insttuigées € contextos sociais, Finalmente, aponiese o grande tema, que esti mobilizando a Sociologia de alimentacao: 0 consume. O papel central da alimentacdo nesta faixa foi salientado por Fine, Heasman e-Wright (eds. 1995). Em articulagdo ao consumo, alguns temas tém sido intreduzidos: a publicidade alimentar, seu caréter alienador e valorizador do que Barry Smart (1994) cunhou de ‘gastrorporn’ {alimentos sedutores, mas impossiveis de obter e artificial e estereotipicamente perleitos); © papel da olimentagéo na consfitvic¢éo da cultura popular ‘contempordnea [Bell & Valentine 1997] e na constituicdo de estilos de vido (Tomlinson 1990}; paralelamente, na contracultura [Belasco 1993}. Finalmente, o consumo permitiu fomecer um contexto de entendimento para alteragdes de monta que a alimentacdo vem sofrendo no tocante ao tempo. © tempo das refeicdes, tempo regrado, dos sitmos regulares do cotidiano que inlegravam o tempo dos consumidores e dos produtores, tempos naturais, vase desintegrando (Aymard ef alii 1993, Palmer 1952). As tecnologias alimentares suprimem © tempo natural, pois mascaram as estagdes, momentos do calend marcos sociais repetitivos {Gofton 1990), Geografio A Geogratia, como ndo poderia deixar de ser, hé muilo tempo vem contribuindo para’ iluminar os componentes espaciais da. problemética da olimeniagdo. Um artigo como o de M. Soro {1952} dé idéia dos principais preocupacdes em meados deste século, em que ainda linham peso espactfico a produgdo, transporte e comercializacdo dos alimentos [v. Também Géographie de lalimeniation 1980}. Para que se perceba a relevancia do espaco neste campo de estudos, basta lembrar que a maioria dos staple foods {que alguns especialistas, como Igor de Garine 1994: 239 preferem chamar de cultural supertoods) das sociedades modernas tém origem em expagos externos dqueles em que vieram a dominar: a cassava © 0 milho, na Attica’ Equatorial (origem americana), a batata, para grupos himalaios, a cassava e as baiaias doces na Indonésia e Melanésia Nova Guing; 0 arroz, cuja dispersio esteve vinculada ao sistema colonial; o trigo, as especiarias, o lomale, a pimenta chilli etc.etc.etc, (Santieri & Zazzu 1992, Foster & Cordell, eds. 1992). Num oulto rumo, oponiese, ainda, a importancia do tema da fome no seu enquadramento espacial (Young 1998}. 25 26 ‘Mais recentemente, a disciplina ampliou a escala de ocorréncia dos fendmenos que investiga: 0 corpo, a casa, a comunidade, a cidade, a tegido, anacdo e, fnalmente, o globo, com suas forcas polares de homogeneizacdo ¢ diferenciacéo [glocalisation), que redundam seja na universalizago de uma rede de lanchonetes como a McDonald's , seja na valorizaéo particularistica do ‘auténtico exdtico’ (Bell & Valentine 1997: 19). Dentro desse quadro, a ‘globalizagao local’ da cultura culinaria € 0 fetichismo da mercadoria obrigam a Considerar os alimentos como materiais e pidlicas ‘deslocadas’, como lazem Cook & Creng {1996]. E assim que 0s autores arrolades por James Watson fed. 1998) procuram, também tomando McDonalds como referéncia, observar 0 papel da fast food diante das cozinhas locais, em Hong Kong, Beijing, Taipei, Téquio € outias mettépoles asiéticas Nesse percurso, @ Geogratia esté cada vez mais procurando aprofundar duas questées, que se associam intimamente: 0 consumo © as identidades regionais e nacionais. Nao & puro jogo de palavras que o livio de David Bell e Gill Valentine {1997} intitulado Consuming geographies, tenha por subtitulo We are where we eat. No entanto, 6 preciso observar que, na-maiorio, os estidos de gedgratos sobre alimentago tm convergido para preocupagées comuns com as dos sacidlagos, antopélogos e, mesmo, hisloriadores. Os proprios Bell e Valentine, jé citados, tamb’m exploram, ao lado do espago, a prablemética de tempo na alimentagdo ou, mais precisamente, o consumo alimentar como forma de organizagéo do tempo, numa directo semelhante 4 que foi acima apontada para a Sociologia: os ritos de passagem no consumo (a primeira gota de alcool, @ primeira vez que se cozinhou um prato etc.), a pontuagao e periodizagdio da vida, a estrutura¢ao do ritmo temporal, a criag¢Go do tempo pelo consumo {a naturalizagéo das sasonalidedes do consumo) e, finalmente, a supressGo do tempo pelas tecnolagias alimentares. A Insituicéo de um Campo Especializado As paginas precedentes (4 permitiram perceber alguns tacos morcantes de Histéria nos estudos sobre os problemas da alimentagdo. Também se percebeu que @ Histéria esta longe de ser a disciplina dominante. Impdese, porém, examinar mais de perio a natureza, formagaio e transformages do que se poderia hoje chamar de Histéria da Alimentagdo. dificll svar 0 processo constiutve © acompanhar o desenvolvimento. de um "campo" de estudo histérico 140 vasto, heterogéneo e difuso. Nosso esforco, por iss, serd o de fornecer apenas uma cetta carlogratia histérica desse territério, apresentando indicagées sobre sua condensagGo e institucionalizagao. 5 pontos de paride Os historidgrafos franceses [p.ex. Burguiére 1986) costumam opontar como marco referencial para um novo rumo, na Histéria da Alimentagéo, a obra do polonés Adam Mautizius. Maurizio, como veio a ser conhecido, era um boténico, professor na Escola Técnica Superior de Lvov. Além do crédito pessoal que Ihe reconhecem alguns historiadores, como Fernand Braudel, tal imagem talvez se deva em grande parte & propria avaliagéoque Maurizio fazia de seu livro, originalmente publicado em 1926 e logo traduzido pora o aleméo e para © francés [1932]. Partindo do pressuposto de que a histéria da civilizagéo e a histéria da utlizagdo do mundo vegetal se confundem, e mesmo conscientemente excluindo a alimentagéo de origem animal, Maurizio empreendeu uma vasta tentative de tragar a histéric dos alimentos vegelais, desde a préhistoria alé seus tempos. Seu objetivo era preencher uma lacuna, pois © preocupava a inexisténcio, até enldo, de ‘qualquer histéria da alimentagdo’, que ele entendia, portonto, equivalente a uma histéria da agriculture “Je veux dire une hisloie des planies importantes au point de we de ogriculure et des instumen's agricoles. Il ne s‘agit point de Fistoire del’ exploitation et de administration ds teres, car rian ne nous manque ce point de we 16. Mais les quelques ouvn Qui Sinton! histoire des aliments et de Tatimentaion (Bourdeau, Licbierfell) valent surtout par Fintention. Bien plus utles sont des ouvrages (souvent ulisés ci] qui tatent des planies alimentaires av poin! de we purement botanique. Lo travail rés details de D. Bois: los plantos alimentaires chez fous les peyples ef & travers les dges, fome I de FE ncyclopécie biologique {c'est en réalié la 4 éctlion de louvrage de A, Pollieux et D. Bois’ fe Polager d'un curievs), n'0 malheureusement pore qu’é une époque ne mayan fas perms do Fotise, mots sevement de fopprcier oxtémement™ (Mowizio 4 Por certo, © rumo de Maurizio, disciplinado e rigoroso, & diverso das historias que onteriormente apontames, de variado teor, desde a Aniigiiidade e 0 Renascimento, ou os regisiros imaginosos como o Catalague des inventeurs des choses qui se mangent et se boivent {1548} de Orlensio Lando, ou mesmo aquele gee considerado um dos pontos de partida para o reconhecimento do papel la alimentacdo nas ‘histérias dos costumes’ e da vide privada — a obra de Jean- Pierre Legrand d’Aussy {1782}, cuja linhagem ser numerosa, como alesla a importéncia das crénicas histéricas dos costumes, incluindo os hdbitos alimentares |ck Briffault 1846]. No entanio, no se pode ignorar 0 acervo de informacéo segura e confidvel disponivel, no tempo de Maurizio, e acumulada desde o século passado, seja nos ‘repertérios de plantas’ comestiveis, seja nos levantamentos einogréticos (alguns de cardter regional e, mesmo, geral} a que |@ nos relerimos, sefa, enfim, nos dados constontes de uma vasta série de monogratias nacionais ov desenvolendose em lorno de cerlos alimentos espectticos. A historia da agricultura é um dos pontos de partida do estudo sistematico das plantas de uso alimenticio e, enlre os autores que escreveram ensaios de sistematizagao histérico sobre as plantas cultivadas, podemos citar Haudricourt & Hédin (7943), Franklin (1948), Anderson {1952} e Chrispeels & Sadava {1977}, A Inglaterra foi constante nesse interesse pelas questées alimentares. 16 em 1856, George Dodd se preccupave com a alimentagao em Londres. Além disso, na propria Franca, no comego do século Marc Bloch (1914). levantara, na Encyclopédie francaise, questées que teriam um peso quase programatico, como 0 das transformagdes dos regimes dieléticos [fatores associados & 27 2 as outst erm Sobre ok melas de ‘earspore elem, 2 evolucio da frit de fklla noe dine cl quenta 200s (ou se desde 1670) a8 cole tas € 06 fogos de 810 Joao e de Quaresma 28 ‘expansdo colonial, efeitos no equilibrio orgénico € psicosocial) a segregagao alimentar ¢ seu cardter principalmente social etc. Na década de 30 jd se ‘anunciovam outras posicées que também viriam a deixar importanie marco metodolégica. Cedo, por exemplo Lucien Febvre se inleressou por diversos aspectos inexplorados da alimentaco, tendo consagrado uma intervengdo no Primeiro Congresso Nacional de Folclore, em 1938, & proposig@o de um mapa para as gorduras de cozinha utilizadas na Franga, tema retomedo no inicio dos anos 60 na revista Annales E.S.C. por J.J. Hémardinguer {1961}. Coma diretor da Encyclopédie francaise, Lucien Febvre fundou uma comisscio de invesligacées colelivas para buscar uma convergéncia enlre o Einografia e a Histor Comisséo em dois anos {1935-1937 empreendeu quatro investigagées, entre as quais uma sobre a alimentagao popular (camponesa) tradicional? O certo & que, em tomo da data da difusdo do livio de Maurizio, suigem indmeras publicagdes, de cardter histérico, ao demonstrat, mais que um ‘encial latenle, interesses e recursos [4 em processo de objetivagdo. Nenhuma delas, digase de passagem, em a prelenséo de panorama global mas, ao contrdrio, domina o recorte‘nacional e, até mesmo, local: Cooper (1929) escreve sobre os habitos alimentares ingleses na histiria e na literatura; Drumond & Wilbraham (1939, 2a.ed.1957] tratam de cinco séculos de dieta ingleso; Cereda (1934), Espinosa (1939), Escudero (1934), Madones & Cox 1942}, Bejarano (1941), Guevara (1946) tomam como objeto a alimentagao, respectivamente, na Espanha, no México, em Buenos Ares, no Chile, na Colombia, na Venezuela, © pao (Ashley 1928) € 0 acticar (Dorveaux 1917] coniam entre os alimentos que atraem atengao, Consolidacdo na Franca: © papel dos Annales E com as propostas da ‘escola dos Annales’ que, na década de 60, gonha fisionomia definitiva e explicitamente programética nosso campo de pesquisa. A primeira vaga de trobalhos esta marcada pelo conceito entéo vigente de vida material (Barlésivs 1992) e privilegiava o nivel do econémico e do infra econémico. O nivel do econémico foi conceituado por Fernand Braudel, o sucessor de Fevbre na direcéo dos Annales, como aquele da troca, do mercado. Aboixo dele estaria um outfo nivel, infieecondmico, que seria 0 da vida material e biolégica. O conceito de cultura material abrangeria os aspectos mais imediatos da sobrevivéncia humana: a comida, a habitagdo, 0 vestuario. A longa duragdo, concebida como a escala na qual se davam os fenémenos superiores ‘G05 eventos © &s Conjunturas, to1novse a dimenséio no interior da qual novos objetos lomatiam consisténcia historiogratica. A vida cotidiana, a cultura material, as mentolidades, 0 corpo, a familia © & morte so alguns dos temas que ‘emergem d tona dos profundezas aparentemente congeladas dos tempos para se revelarem na dialética da sua transformagdo e da sua permanéncia como nogées plasticas, sujeitas a mudangas, mesmo que elas aparecam como imperceptiveis para os préprios protagonistas. Em 1961, 0 revista Annales E.S.C. abriv as paginas da sua edigéo de maiojunho com a proposta, num texto assinado por Femand Braudel, de’ um retour aux enquétes. Embora retomo, ele fazia questéo de declarar que néo se tratava das mesmas investigagdes empiricas que anteriormente haviam sido empreendidas por Mare Bloch @ lucien Febvre, sobre ‘nobrezas’ e ‘técnicas’. A investigagdo entéo em pauia, nos anunciava ele, se debrugaria sobre dois temas: ‘A histéria, ciéncia social atual’, e ‘A historia da vida material e dos comportamentos biolégicos’. Na verdade, é apenas o segundo tema que foi deservolvido naguele nimero @, ao longo 'do ano de 196), nos dois préximos nimeros da revista. Nesta apresentagdo inicial da questéo, apés reafirmar seus esforcos em prol de uma histéria considerada como uma “ciéncia do atual” e, até mesmo, como uma ‘ciéncia das ciéncias do homem’, ele define o que seré um dos centros de preocupacéic da revista € fecundaré muitos estudos vindouros: a histéria da vida material, ‘infra e extraecondmica’. Mais & frente, iniciando o Boletim n.1 de investigacdo sobre ‘vida material ¢ comportamentos biolégicos', € © proprio Braudel quem continuava buscando definir tal dominio, para o qual diversos pontos de vista se oferecem: os da propria Historia, mas também os da Geografia, da Anttopologia, da Sociologia, da Economia, da Demografia, do Folclore, da Préhistoria, da Linguistica, da Medicina, da Estatistica. Diante de tal complexidade ele propde que cada disciplina coloque o problema nos seus préprios termos Ele proprio, no entanto, entende por vide material “cing secteurs assez proches: l'alimentation; le logement et le vétement; les niveaux de vie; les techniques; les données biologiques’. ‘la vie matérielle va ainsi, — escreve ele (Braudel 1961a:547) — des choses au corps". Diferentemente da vida econémica ou social, a vida material se situa num outro patamar, onde quase néo ha cansciéncia da parte dos atores. E como uma ‘infrorhistéria’ portanto, ou uma ‘infcrinfraestrutura’, que se apresentava essa histéria dos ‘alimentos, vestimentas habitacdes'. Enquanto ‘a vida econémica, as instituigdes, a sociedade, as crengas, as idéias, a politica’ relacionam-se ds ‘atengées e vigilancias’, a vida material relacionase aos ‘habitos, herancas escolhas longinquas' © método para o estudo da vida material devia ser ‘regressive Segundo Braudel, era preciso partir do conhecimento preciso das cifras que a documentagdo contemporanea oferecia para se poder medir e comparar. A enquéte prossegue com um artigo de Robert Philippe que circunscreve ainda mais o dominio da vida material que a revista se propde abordar. O artigo intitulase: Commengons par histoire de lalimentation, apreseniada como um vasto dominio com caminhos [4 tragados. Duas adverténcias sao dadas: apoiarse sobre os dados da atualidade © néo incorrer num ‘determinismo alimentar’, de querer explicar a histéria inteira dos homens a partir dos alimentos. Dois regimes so sugeridos como modelos antipodas: os mondtonos € 08 variados. Esta distingdo alimentar é a que separa socialmente as dielas em todas as épocas. O caminho que é proposio, em seguida, é 0 estudo nos regimes alimentares de como se combinam os elementos nuttitivos e se sd0 estabelecidos ou ndo “equilibrios biolégicos’ em cada grupo ou sociedade No nivel da caréncia s4 haveria desequilibrio, ov seja, fome, compreendida como desnutri¢éo, 29 3. Amber 0 hunch mento de ss tas ex panhols entre I52 © 1642; come ds Sula fe seus serves em 1573, ums expedite conjunts pomaguest & cespanhnlt para a Ais. do None em 157% 9 Hospital ds incurives fem Genoese 1608 1609: um familia robe na mesma cidade cme 1614 © 1615, 0 Coltgio Borrome de Pavia, ent 1609 © 61k. ee despensas ivi a Inglaterra em issintas epoca ‘ue devia tinspar 2 mal soldados «6 fasaleos de Nips pa 3 Espa 30 Aplicando a primeira adverténcia, © primeito estudo da enquéte alimentar serd sobre a atvalidade: En France aujourd hui: données quanilatives sur les consommations alimentaires, de J. Fémardinquer. Dos outtos dois artigos — Une opération pilote: I'étude du ravitaillement de Paris au temps de Lavoisier, de Robert Philippe e Régimes alimentaires d/autrefois: proportions et calcule en calories, de Frank Spooner — 0 primeiro trata de um estudo, a partir de um edlculo realizado por Lavoisier sobre o total de viveres consumicos em Paris © os seus precos globais, que conclui por uma deterioragao na alimentagdo parisiense na primeira melade do século XIX. No segundo artigo, expressando um objetivo comum dese primeiro namero da revista dedicado 4 alimentagGo, tratase de se esbogar “une méthode uniforme de colcul qui permette les comparaisons enire régimes alimentaires, dans le temps et dans l'espace” (Spooner 1961: 568}, 0 que serd feilo, no artigo em questdo, através da comparagao de sete diferentes registros de despensa? © nimero seguinte dos Annales E.S.C., cortespondente a julhoagosto de 1961, traz um Boletim n® 2 da ‘Historia da Vide Material’, que inclui um novo artigo teérico de Fernand Braudel: Alimentation et catégories de l'histoire, em que cle discute os eventos e as conjuniuras cuttas e longas na historia da alimentaccio — que “se décompose réguliérement comme une histoire quelconque en tranches chronologiques de plus ov moins grande épaisseur". Compraz-se em apontar “la vraie longue durée’ como a camada mais propicia que “nous libéve presque de Ig pesanteur précise du temps” (Braudel 1961b: 723] ‘A metéfora da pesca, que ele usa para a Histéria, indica onde Braudel vé os grandes peixes. Alravés da ampliagdo dos malhas da rede se poderd aumentar também a dimensdo da pescaria’e se falar, por exemplo, da influ€ncia ainda atval da “revoluco neolitica”. Conseqientemente ele elogia ‘Adam Maurizio e seu livro classico, cuja ligdio permaneceria ‘valida, itl e indispensavel” para os historiadores, completandose 0 estudo das plantas coleladas na PréHistéria com uma investigagdo do uso modemo, nas grandes fomes, dossas mesma plantas, como sobrevivéncias de préticas milenares Publicase também nesse némero a reedicéo de um artigo de lucien Febvre sobre « distribuicdo regional das diferentes gorduras usadas na cozinha na Franca, junto com © comentario e um artigo alvalizando a questéo de J. Hémardinquer; € mais algumas contribuiges sobre a climentagdo de regiées e 6poces bem circunscritas: U‘alimentation d'une ville espagnole au XVle.siécle. Quelques données sur les approvisionnemenis et la consommation de Valladolid, de B. Benassar, e Les consommations des villes frangaises [viandes et boissons) au milieu du XiXe siécle, de Robert Mandrou O terceiro e timo ntimero dos Annales E.S.C. a seguir a investigagdo proposta é © de selembro-outubro de 1961, que raz no Boleim n. 3 da ‘Vida malerial ¢ comportamentos biolagicos’, um artigo de Jacques le Goff propondo Une enquéte sur le sel dans l'histoire, onde destaca as pesquisos realizadas por Michel Mallat, que dirigiu semindrios sobre 0 sal na Sorbonne, coordenou questionérios de pesquisa internacional e, em dezembro de 1961, organizou em Paris um Coldquio Internacional sobre Le sel dans le trafic maritime international du Moyen Age & nos jours. Braudel escreve 0 arligo Achais ef ventes de sel d Venise (1587-1593), sublinhando ter sido © sal “la raison du premier essor” de Veneza. Robert Mandrou discule 0s movimentos de longa duragdo na hisléria da alimentac&o a partir de dois artigos sobre o consumo de carne na Alemanha, desde a Idade Média aié o século XIX, em Théorie ou hypothése de travail? Jean- Paul Aron enfoca a formacio das ‘concepedes sobre a bidlogia alimentar, especialmente a andlise da fisiologia da digesiic, a nogdo de regime e 0 conceito de ragdo alimentar, em Biologie et alimentation au XVille siécle et au début du Xike’ siécle e Roland Barthes em Pour une psychosociologie de Jfalimentation contemporaine, analisa aspectos do significado das diferencas culurais em relocéo & alimentagéo {perquntase, por exemplo por que os americanos consumiam quase duas vezes mais acicar do que os franceses), intoduzindo elementos de uma semiologia da alimentacéo, na qual os alimentos sGo vistos como signos de um sistema de comunicacao. ‘A enquéle termina, meio abruptaments e sem um balango, néo cumprindo as promessas de abrir novos dossiés, como 0 do calé ov o das plantas Vigjantes, 0 miho € a batata, embora a revista continue a publicar artigos esparsos sobre a alimentagdo na historia. Em 1970, serd publicado como um Cahier des Annales o livio organizado por JeanJacques Hémardinquer (1970), Pour une histoire de I'alimentation, que reloma a historia da alimentagcio como um objeto multidisciplinar e presente em praticamente todos os aspects da historia social e econdmica. Mas & somente em 1975, a partir de um debate realizado no Segundo Congreso Nacional dos Historiadores Economistos Franceses, realizado em 1973, que a revista Annales E.5.C. voltaré a dedicar mais da metade de um némero ao tema da alimentagao, desta vez sob a denominagao de "Dossié da Histéria do Consumo", publicando 17 artigos sobre o tema, um dos quais, Pour Vhistoire de alimentation: quelques remarques de méthad=, de Maurice Aymard, coloca criticamente importantes questdes metodoldgicas. Segundo ele, apés 0 apelo langado pelos Annales, em 1961, trés grandes vias se abriram para a historia da alimentagdo: a de uma psicosociologia da alimentagdo, ov seja, “dos valores, regras e simbolos” da olimentado; a macroeconémica, que buscaria enquadrar estatisticamente a alimentacdo, por meio de estudos de consumo, populagéo, precos e comércio exterior; e, finalmente, a do estudo do valor nutrtivo e das caréncias, quantitativas e qualitativas, da alimentagdo dos tempos passados, considerada como a linha de pesquisas “mais evidente, mas Go a mais facil. Estas consideragées de Aymard, que foram retomadas por comentaristas do historiografic francesa [Barlésius, Flandrin & Montanari, Hémardinguer, Revel, Burguiérel, expressam tendencias de ocorréncia mais ampla. Assim, pode-se falar, nesta fase de implaniagdo de um campo novo, de uma ‘nica mactoeconémica, preocupada com quesiées agrarias, com insuficiéncias tecnolégicas, as crises, as fomes, os ingredientes demogréticos climaticos, as curvas de precos e o cométcio internacional. Os alemaes Schmoler © Abel so impotantes referéncias extemas.. A agricultura sobressaia como foco centralizador, mas tomada, muitos vezes, como acesso para horizontes ainda mais, amplos. Nessa diego € que Barlésius (1992:95-6) toma o nascimento do copitalismo como tema da obra de E.le Roy ladurie (1966), nao diretamente vVinculado aos Annales, sobre os camponeses do Languedoc e endossa o parecer de Igger: "Here, pethaps for the first time ai serious attempt has been made to write c history of material culture” {ib.: 95]. Pena que esta visdo da cultura material ienha 31 32 sido 140 intensamente t6pica © conceitualmente limitada {dos 18 boletins, entre 1961 e 1989, 15 foram reservados para a historia dos alimentos). Mesmo com relagdo aos arefatos, as abordagens nos parecem, agora, de uma cerla pobreza, amarrades 4s implicagées imediatas de cardter econémico, Subproduto deste esforco sera o Atlas des cultures vivriéres, de Jacques Bertin, JeanJacques Hémardinquer, Michel Keul e W.G.L. Randles (1971], que, como definiu Pierre Chaunu (1976: 522), ecoando o entusiasmo de Maurizio, abrange “dez mil anos, @ teria inteia’ e as 18 plantas fundamentais que asseguram 90% do alimento vegetal humano”, A seguir, cobrindo 0s anos 60 € 70, explorase 0 consumo, mais que a produgdo, © que traz ao primeiro plano a nutrigGo. A procura e exploragao de dados estatisticos é intensiva € as fonies provirdo da area fiscal, de hospitais e mosteiros, de registros sobre racées de marinheiros, soldados, operirios e prisioneiros. Hoje se cobra com facilidade a utlizagdo critica dos dados, sua inadequagao freqiente, assim como os vieses da documentasdo, que nao foram suficientemente percebidos (p.ex., ndo se comem matérias: primas, mas alimentos preparados| A reacéo a este cientificismo se consubstancia numa terceira perspectiva, a psicosocial, que desloca 0 foco para o comer e aquele que come. Se um historiador, Jean-Paul Aron |e, outro, mais tarde, Jean-Louis Flandrin), sdo referéncias capitais para esta orientagdo, é preciso mencionar a repercussGo do artigo acima mencionado de Barthes {1961}, que coincidia grosso modo com propostas que a Antropologia — e principalmente a Antopologia estruturalista — comecava a veicular nos anos 60 70, mas que deixaram marcas definitivas nos anos 80. Sem divida, sugestes como a dos gustemas ou a elaboragéo de um cédigo olimentar de ‘molde logocénirico néo foram absorvidas, como ja se observou acima, mas a preocupacéo com o sentido vai dar consisténcia aos estudos da sensibilidade alimentar, do gosto, da gastronomia e alinhar os estudos de alimentagao nas cortentes das historias das mentalidades. Ramificagdes. Inadiagao. Instiucionalizacée. A Inglaterra e a Alemanha, também ja se mencionou, de hé muito cullivovam inleresse por assunios associados & alimentagdo, acompanhados de perlo pela Holande e Bégica. Nomes como Wilhelm Abel (1974, 1978], Ginter Wiegelmann {1967}, Gustav Schmoller (1981) ou Christiana Vandenbroeke |1975] nao podem ser esquecides. Ainda que em escala mais atenvade, a lidlia igualmente deve ser incluida neste rol. Nestes paises, com pressées muitas vezes diretas recebidos dos historiadores dos Annales, mas também de forma independente, consolidamse os mesmos padiSes académicos de investigagdo historica do tema.) 4 se pode agora falar no ‘especialista’ Derek J,Oddy e John Burnett [1992], co fazerem um balanco historiogidlico da produgéo inglesa, salientam © papel que a Universidade de Londres, por inlermédio do Historians and Nutritionists Seminar do Queen Elizabeth College (mais tarde do King’s College), desde 1963, exerceu, dentto e fora da Inglotona. Ressoiom, iguemente, ckjuns.focos pvlegiados no. hisioro. de limentacao brilénico: © periodo mais estudado € © que sucede a industializaséo € 0 Gngulo preferencial é a andlise do abastecimento, das commodities, do consumo, do status nuricional, da distribuig¢do, dos orgamenlos e dos gastos climentares ©, num segundo plane, de cozinha, dos protos e dos hordtios de roleigdo. O abastecimento esi sempre associado 4 urbanizagao Outro tema recortente na historiografia inglesa sdo as bebidas, alcodlicas ¢ néo alcodlicas, que envolvem quesiées to diversas, como a difuséo colonial do ché, 0s aspecios sociais do alcoolismo e da temperanga eic.. No limiar da década de 90, no prefiicio da 3? edigéo de uma obra famosa, Plenty and want. A Social History of food in England fom 1815 to the present doys, originalmente publicada ‘em 1966, John Burnett reconhecia que no espaco de vinte anos a Historia da Alimentagdo tornarerse uma dtea de pesquisa academicamente reconhecida e que nenhum estudo sério da mudanga econémica e social dos dltimos dois séculos na Inglaterra: ousaria omitir “reference to the changing ways in which food has been grown, manufactured, distributed, and consumed” [Burnett 1989: Vil}. A difusdo dos estudos de Histéria da Alimentagéo no restante da Europa € nos Eslados Unidos ¢ outras plagas foi em grande parle marcade por ‘este quadro de institucionalizagéo. Um dos indicadores da maturagéo de um dominio especifico de conhecimento cientfico & a presenga de publicagdes especializadas — ndo s6 livros e artigos, mas principalmente periédicos académicos — , a orgonizagéo de entidades ¢ grupos de especialistas, a promogéo de semindrios, coléquios, congresses ¢ a formalizagdo de cursos e plalaformas de ensino. E importante, aqui, dar algumas pistas sobre associagées, encontios e periédicos. Fspaco relevante de atuacco desias instituicées, assim como de universidades e outros organismos de pesquisa, © que festemunham o grav de enraizamento de uma Histéria da Alimentagdo, sao os encontros, de variada natureza (congressos, semindtios, coléquios), e que se tém multiplicado. Para dar uma idéia, sem qualquer pretensdo de listager exaustiva, mencionemse os principais temas, acrescentando que quase todos tiveram suas atas publicados {Indo se incluiram aqui aqueles encontros de cardter geral ou especializadamente biolagico, econémico, sdcio-antropologico, embora neles se enconlre sempre a presenca de questées historicas} le sel dons le hafic maritime international du Moyen Age & nos jours (Paris, 1961) Changing food habits londres, 1964 les probemes de Taimentaion. 936 Congres des Socités Savartes (ous, 1968] Pralques et discours alimentaires & lo Renaissance (Tours, 1979) ‘Manger e bore av Moyen Age (Nice, 1982) Calta storia cll alimeniazione {lmperia, 1°23) Falimentozione nellonichté. Parma, 1985) Homo Edens (Verona, 1987} Histoire ef animal (Toulouse 1987) Cuisines, egies okmentares, espaces régionav [Nancy, 1987) A monger des yeux: lesthéique de fa nouirture (Lausanne, 19871 First Simposium on European Food History Minster, 1989) {a Sociabilitéd table. Commensolié ot convvialié 0 tvers es ages (Roven, 1990) Voeclng en Geneeslunde. Almentaion ot médecine Bruxscs, 1990) ‘A toulla é razero: culuro delfalmentazione nei paesi del Mediienaneo (Trapani, 1990) {animal dans lAniquité romaine |Nontes, 1991] {0 production du vin ef de Ihule en Méchiesranée (Toulon, 1991) 33 34 No hé nenhuma revista especializada, stricto sensu, na Historia do Alimentagéo, como existem para outios dominios {sobretudo a nutri¢éio}. No entanto, a revista Food & Foodways, criada em 1985 e contando entre seus diretores e membros do corpo editorial com muitos historiadores (Steven L.Kaplan, Jeantous Flandrin, Maurice Aymard, Claude Grignon etc.), serve de ponto de convergéncia para os cientistas sociais, principalmente estabelecendo uma proficua colaboragéo de historiadores @ antropdlogos dedicados ao conhecimento da ‘history and culture of human nourishment.’ Em todos os tempos e quadrantes — 0 que tem estendido as investigagées para bem longe do dominio europeu, incluindo o Oriente, a Akica, o mundo érabe, as Américas Caracterizagéo Morfolagica da Bibliografia O caréter caudaloso, heterogéneo e difuso da bibliogratia de Historia da Alimentagéo {6 foi por muitos vezes assinalado, até aqui. Se quisermos de alguma forma caractetizé-la sinteticamente, levando em conta sobretudo a produgdo recente, talvez a solugdo mais prética .seja buscar um critério laxonémico que privilegie os aspectos morfolégicos. De inicio, cumpre salientar que o volume @ diversidade dos publicagdes no molivou, entre os especialistas, tentativas de registrérlas em repertérios bibliogrdficos gerais, monogréficos ou seletivos. Séo, assim, rarissimas as compilagées, como a Biblioteca gastronomica, de André Simon (1953}, ov 0 guia Food and drink in British History, de William Henry Chaloner {1960}, ‘Nenhum bolango exist, que Se possa comparar dos que séo comuns no campo da Antropologia e Sociologia (como Freedman 1981 e 1983, Messer 1984 ov Wilson 1979), embora, com freqiéncia, tais levantamentos também incluam obras especificamente histéricas, como € 0 caso de The sociology of food (Menneli, Murcott & van Ottetloo 1992). Alias, algumas obras de cardter geral ou monogralico contam com bibliografias téo extensos que podem ser utilizados como repertorios genéricos (p.ex. Garine 1990} Nesse quadio, ndo se poderia esperar a existéncia de numerosos trabalhos de cunho historiogréfico. Por isso, mais ainda sobressai a utilidade da coberlura européia assegurada pela coleténea que Hans J.Teuteberg organizou (1992} com material apresentado no simpésio European Food History: a research review, sediado na Universidade de Minster, em 1989. Em 16 capitulos, sGo ctiticamente sumarizadas — pesquisas relativas 4 alimentagao em periodos especificas de 14 paises ou regiées da Europa Inglaterra, Irlanda, Holanda, Bélgica, Franga, Alemanha, antiga Alemanha Oriental, Austria, Suiga, Hungria, Polénia, Russia, Boémia e Suécial ‘A mesma escassez se registra no campo documental. Publicagdes como The History of Food: a preliminary bibliography of printed sources, de David Sutton (1982} ou os Anais do Encontro de PotenzaMatera, de 1988 (Gli archivi per la storia dell'alimentazione, 1995] sGo excecées. Finalmente, € preciso assinalar a peniria de obras sobre questdes fe6ricas e metodolégicas. Apenas se podem apontar alguns insrumentos de trabalho, nem sempre de rigor impecével, como cronologias [Trager 1995} ou diciondrios (Craplet (1979) SGo também pouco numerosas as obras gerais, que pretendem abarcar 0 horizonte da Histéria da Alimentagéo como um todo, mas as publicagées 1émse multiplicado nestes dimes anos. Raros so os’ rabalhos devidos a um nico autor, como os livros de Gottschalk (1948), Reay Tannahill {1973] ou Carson LA Ritchie (1996, ed.or.1981}, todos de grande aceitagao popular, ou o encorpado volume da ‘histéria natural e moral’ da alimentacao, de Maguelionne ToussaintSamat (1987), muito rico de informacées, mas por vezes superficial e, quase sempre, europocénitico. Jé Jearlouis Flandrin & Massimo Montanari (orgs. 1996} preferitam reunit cerca de cinquenta pesquisadores, numa antologia enciclopédica de mais de 900 paginas, a fim de abordar cronologicamente os habitos alimentares da humanidade, desde a Préhistéria ai os tempos correnles, passando pelas grandes civilizagdes do Préximo Oriente, os gregos, romanos, bérbares, a Idade Madia, as culturas hebraica, islimica, grega orlodoxa, a época modema e contemporénec, procurando englobar aspectos ecoémicos, demogréficos simbélicos da produgGo e consumo, as diferencas entre cidade e campo, arte culinaria, gastronomia e dietética, refeigdes @ maneiras & mesa, os regionalismos e sincretismos , a ‘macdonaldizagGo’ dos costumes, etc., etc.. Claro esta algumas desias coniribuigdes oscilam na qualidade, mas o resultado geral é bastante satisfatrio e esta obra pode ser considerada, presentemente, a melhor teferéncia geral para o campo em questo, como um todo. ‘As coleténeas helerogéneos, de que a de Hémardinguer (ed. 1970) foi um caso. precoce, tm tido boa fortuna E preciso igualmente mencionar @ existéncia de verbeles em obras enciclopédicas ov de capitulos em obras gerais, que constituem tentativas de linear o compo. Nerhum deles se pode considera lenamente saifotoro: Renée Valeri (1977], J.FRevel {1978}, Igor de Garine {1990}, André Burguiére (1986, muito citado, mas excessivamente francocéntrico}, Daniel Roche {1997}, etc. © que domina, porém, a bibliografia, séo as obras de cardter regional _e, muito mais ainda, de recorte nacional cu referindose a periodos ov ‘civiizagées’, quase sempre da Europa. ‘Assim, Montanari {1993} procurou balizar, « parlr dos barbaros e dos romanos, a formagao, nos séculos Ve VI AD, de uma ‘linguagem comum’ européia, no dominio da alimentagGo (Ele também cobriv quadros extensivos da Idade Média, em 1979 e 1988}. Fenton & Kisbén (eds. 1986] também elegeram 9s habitos alimentares na Europa, da Idade Média ao presente, assim como Forster & Foster (1975), a dieta européia, As civilizagces da Antigiidade nao deixaram de acumular indmeras historias da alimentacdo. O Egito, por exemplo, ja merecera em 1854 um tralamento especial desse problema, por parte de J.G.Wilkinson, numa obra sobre vida e costumes. Dai em diante, a lista forse ampliando, embora com predominio de titvlos com caréter essencialmente descritivo — de que ndo escapam alé mesmo sinteses recentes, como a de Bresciani (1996). As civilizag&es classicas ndo ficam ats. Nao s6 sao correntes hist6rias gerais (como Andrew Dalby 1996 ou André 1980, Blanc & Nercessian 1992}, como também a historias de climentos de grande significagdo cultural, como os Cereais, o vinho ou 0 azeite (Gasiet & Sigar 1979, Amouretti 1986, Pessanha & Bastion, eds. 35 36 1991, Tchemia 1986}. Além disso, alguns temas tiveram forca cotalisadora: assim, 08 padrées de sociabilidade, como aqueles expressos nos sympasia e nos banguetes civicos (Pauline Schmitt Pantel 1992, Frangois lissatrague 19871, a cozinha profana e a litirgica [Berthiaume 1982), 0 tema literério ones 1993) Mencionenrse, também, obras de conjunio, como Brathwell & Brothwell (1985; inclu’ tratamento metodolégico relative 4 Arqueclogia da alimenlagde € examina, além do mundo meditertanico, Asia, Alrica subsacriana e Américas}; Wilkins, Harvey & Dobson (1996), ciganizado em toro de problemas-chave, como cereais e culivares, carne e peixe, contexio social e religioso, medicina, presenca na literatura: Longo & Scarpi (1989) que, além dos quesiées tradicionais, trata dos filésofos gregos, de linglistica ¢ alimentagéo, mercado, vegetarianismo, patologias nutticionais, agregando cos povos classicos os vedas, persas culluras alricanas, sem muita preocupagao com organicidade Quanto ds cozinhas nacionais e locais {até cidades}, é especialmente prédiga nestes estudos a Inglaterra, onde diversas obras t8m-se interessado pelo fema, denire as quais Dodd 11856) Bear (1899), Cooper {1929 Damord © Wilbraham (1939); Blackmon (1962); Fraser 1981; Barker, Oddy © Yudkin {1966}; Burnett (1966); Pullar (1970); Wilson {1973}; Johnston {1977); Driver (1983}; Stead {1985} © Renfrew (19850 e 1985b). HG até mesmo uma série patrocinada pelo digo de patriménio cultural inglés (English Heritage) ¢ denominada Food and cooking in Britain, com mais de sete volumes publicados, e que se eslende desde o Préhistéria até o século XX, Os Estados Unidos nao ficam muito atiés: Root & De Rachemart (1976), levenstein (1988 e 1995), Grover [1987], Aidells & Kelly [1992], Brans [1993], Coe [1993], Melntosh (1995), etc. Na Franga, encontramos desde Briffault (1846) e Bourdeau {1841} até Dupin (1978) ou itte * 1993). E em diversos aulros paises, especialmente na América Latina, podernos citar ao menos uma obra que, em getal na primeira metade do século XX, procurou estudar a alimentagdo nacional: na Espanha, Cereceda |1934}; no México, Espinosa {1939}; na Colémbia, Bejarano (1941); no Chile, Madones ¢ Cox (1942); ¢ na Venezuela, Guevara (1946), no Peru, Mayolo [19811]. Para complelar o perfil: Stewart, Trustwell & Wahiguist (1988), para a Auskdlia; Chang (1978) ov Anderson 1988) para a China, As vezes os estudos so comparativos, como o de Mennell {1987}, que analisa em paralelo a Franca, a Inglaterra e a Alemanha. A fais obras deveriam ser agregados os livros de receitas, muitas vezes selecionadas e apresentadas com critérios hisiérices rigorosos (p.ex. Dalby & Grainger 1996) Desia vasta bibliogratia nem todos os estudos estéo envolvidos em problemas de mudanca e tranformagéo ou na historicizacéo de suas informacdes; nolase, vez por outta, tendéncia perceptivel de tratamenlo sincrénico € auténomo, Néo obsianie, ocorem obras de amplo especio e grande consisléncia hist6rica, de que boms exemplos sdo 0s dois trabalhos de Harvey levenstein (1988 ¢ 1995), verdadeiro estudo de historia das mentalidades & americana {e mais que isso}, em que 0 autor raga um quadio dentio do qual, a parlirde 1880, forma:se nos Estados Unidos a conviegao da comida apropriada, em detrimento do gosto; mas ndo é somente © plano das representacdes que o autor explora, mas os grupos de interesses comerciais € profissionais, as 36 1991, Tchemia 1986). Além disso, alguns temas tiveram fora catalisadore: assim, os padrdes de sociabilidade, como aqueles expressos nos symposia e nos banqueles civicos [Pauline Schmitt Pante! 1992, Frangois lissorrague 1987), c cozinha profana e a litirgica [Berthiaume 1982), 0 tema literdrio ones 1993) Mencionemse, também, obras de conjunto, como Brothwell & Brothwell (1985; inclu’ tratamento metodolégico relative 4 Arqueologia da alimentagdo e examina’, além do mundo mediterranico, Asia, Africa subsaariana e Américas); Wilkins, Harvey & Dobson [1996], organizado em tomo de problemaschave, como cereais e culivares, carne e peixe, contexto social e religioso, medicina, presenga na literatura}: Longo & Scarpi (1989} que, além das questées Wradicionais, trata dos filésofos gregos, de lingiistica e alimentagéo, mercado, vegetarianismo, patologias nutricioncis, agregando aos povos classics os vedas, persas € culturas africanas, sem muila preccupagde com organicidade. ‘Quanto ds cozinhas nacionais ¢ locais {até cidades), ¢ especialmente prédiga nestes estudos a Inglaterra, onde diversas obras tém-se interessado pelo tema, dentre as quais Dodd (1850), Bear (1899); Cooper {1929}; Drumond & Wilbraham (1939); Blackmon {1962}; Fraser 1981; Barker, Oddy e Yudkin 11966); Burnett (1966); Pullor (1970); Wilson {1973}; Johnston (19771; Driver {1983}; Stead 11985] ¢ Renfrew (1985a e 1985b]. Hé até mesmo uma série potrocinada pelo oigao de patriménio cultural inglés (English Heritage) © denominada Food and cocking in Britain, com mais de sete volumes publicados, € que se estende desde a Préhistorio até 0 século XX, Os Estados Unidos nao ficam muito airds: Root & De Rochemart {1976}, Levensiein (1988 © 1995), Grover (1987], Aidells & Kelly (1992), Brans (1993}, Coe (1993), Melntosh {1995}, elc. Na Franga, encontramos desde Briffauit (1846) e Bourdeau (1841} até Dupin {1978} ou Pitte * 1993). E em diversos outros paises, especialmente na América latina, podemos citar ao menos uma obra que, em gerol na primeira mretade do cecule XX, proce estudar o alimentagao nectonal no Espanho, Cereceda {1934}; no México, Espinosa (1939); na Colombia, Bejarano (1941); no Chile, Madones e Cox |1942); ena Venezuela, Guevara (1946), no Peru, Mayolo (198 1}. Para completar o perfil: Stewart, Trustwell & Wahiqyist (1988), para a Austrilia; Chang {1978) ou Anderson 1988} para a China. As vezes os estudos sG0 comparativos, como o de Mennell {1987}, que analisa em paralelo a Franca, a Inglaterra e 0 Alemanha. ‘A tais obras deveriam ser agregados os livios de receitas, muitas vezes selecionadas e apresentadas com critérios historicos rigorosos (p.ex. Dalby & Grainger 1996) Desta vasta bibliografia nem todos os estudos estéio envolvidos em problemas de mudanga e trankormagae ou na historicizagao de suas informacdes; noase, vez por outra, tendéncia perceplivel de tratamento sincrénico e aulénomo, Nao obstante, ocorrem obras de amplo espectto e grande consisténcia histrica, de que boms exemplos $60 0s dots trebalhos de Harvey levenstein (1988 e 1995), verdadero estudo de histéria das mentalidades 4 americana {e mais que isso], em que 0 autor traga um quadro dentto do qual, a partir de 1880, forra-se nos Estados Unidos a conviccao de comida apropriada, ‘em dettimento do gosto; mas nao é somente o plano das representagdes que 0 autor explora, mas os grupos de interesses comerciais e profissionais, as contingéncias da Grande Depressdo e da Il Guerra Mundial, 0 trabalho feminino, a disputa de prestigio entre os excessos conspicuas e as abstinéncias conspicuas, a difusdo do fast food, os paradoxes da abundancia. Outra vertente ‘que representa parle consideravel da bibliografia histérica sGo as monogratias sobre determinados alimentos. Podemos exempt ficar com as seguintes hisiorias: - do pao (Ashton 1904; Ashley 1928; Jacob 1944; McCance & Widdowson 1956; Shepard & Newton 1957; Basini_1970; Kropoktin 1972; Zilht & Buhrer 1985; Desportes 1987; Macherel & Zeebroek 1994; Kaplan 1996 e 1997); ~ do milho [BirketSmith 1943; Stoianovitch 1951 ¢ 1966; Temple 1963; Warman 1988}; - da batata (Salaman 1949; Morineau 1970); - da soja [Scillenpest 1944; Clergeaud 1964); - do queijo (Cheke 1959; Androuet 1981; Volpato 1983}; a sal {Mollat 1968; Bergier 1984; Hocquet 1985; Denton 1982}; - do agicar (Dorveaux 1917; Lippman 1941-42; Deerr 1949-50; Strong 1954; Ely 1963; Hugill 1978; Pancoast 1980; Mintz 1986 e 1996, Cannabrava 198 1); -do al (Crane 1975/76); - da cerveja (King 1947; Monckton 1966; Houaiss 1986; Aidells & Kelly 1992); ~'do vinho {Dion 1959; Scarpi 1991; McGovern, Fleming & Kalz 1994; Murray & Tecusan 1995; Gartier 1996, Poo 1995, le vin 1997}; - da cachaga [Camara Cascudo 1986, enre tantos outros}; - do cha (Ukers 1935; Waugh 1951; Twining 1956; Forrest 1967; Butel 1989); - do café (Moreira 1873; Jacob 1953; Camargo & Telles Jr. 1953; Magalhées 1980; Mauro 1991; Ball, ed. 1991, Brignoli_ & Samper 1994; Roseberry & Gudmundson & Samper Knutschbach, eds., Williams 1994); - da mandioca (Muchnick & Vinck 1984} - da chicha (Mowat 1989); - do mate (Linhares 1969); - do chocolate (Bourgaux 1935; Hardwich 1992; Coe & Coe 1996, Comporesi 1996} - da Cocacola (Pendergast 1993); - da margarina [Stuyvenberg 1969); - dos biscoitos {Corley 1972; Adams 1974); - do hambirguer [Pel 1974) - dos animais como alimentos (Zeuner 1963; Vialles 1994) Alguns destes estudos sobressaem do padrdo genérico, por seus horizontes amplos. Mintz (1986 e 1996] ou Salaman (1949}, como ja se acentuou anteriormente, uilizam, respectivamente, © agécar e a’ botata, pora vesios panoramas histéricos. Outros estudos tm como fio conduter problemas especificos, como 0 arfoz enquanio veiculo de identidade cultural no Japéo {OhnukiTieney 1993} ou @ importancia do cha na ‘domesticagdo’ do estado turco (Hann 1990}, ou o café como velor de poder e formador de classes na 37 38 América Latina {William Gudmundson & Knutschbach, (eds. 1995), Brignoli & Samper (eds., 1994], Williams {1994}, Finalmente, mencionemos a disperséo de monografias em torno de um semnimero de problemas especiticos — econdmicos, sociais e culturais — que nos dispensamos de exempliicar, pois [6 foram abundantemente teferidos anteriormente, a propésito das quesides de contetdo. Tépicos Fome Um aspecto seminal da histéria da alimentagdo é © da historia da fome, cuja definicdo oscila entre a apresentada por Sara Millman e Robert W. Kates (1990:3}, como sendo uma ‘inadequacy in individual dietary intake relative to the kind and quantity of food required for growth, for activity, and for maintenance of good health” e, no polo oposto, a de Amartya K.Sen (1981], para quem, a ndo ser nas economias exclusivamente de subisisténcia, é a roca que deve servir de referéncia; assim, formulou 0 citétio de ‘failure exchange entiflement'(FEE} para substituir o de ‘food availability decline’ (FAD): fome é, antes de mais nada, marginalizagdo social, falhas nos créditos de ttoca e, portanto, esté no Gmbito das decisdes humanas e ndo dos acidentes climaticos ‘ou sistemas formais. Outras vertentes entendem as causas estuturais da fome na quebra de um sistema alimentar (food system breakdown}, como em Richards (1939); ou a partir de uma teoria de modelizago © da adminishacto do imprevisto (thinking ‘on modeling and managing hazards), como em Kates et alii (1985), mo as teorias sobre a fome rebalemse nas teorias sobre o crescimento populacional e sua relacdo com o crescimento na produgo, trés perspectivas teéricas adicionais costumam ser freqiientemente apontadas. (cf. Newman, ed. 1990): a de Thomas Malthus, a de Karl Marx a de Ester Boserup. ‘A teoria mathusiona, como é sabido, considerava que as populaces cresceriam em progressio geométrica {exponencialmente], enquanlo que os meios de subsisiéncia apenas em progressGo aritmética linearmente). Marx, discordando com veeréncia de Malthus, apresenta uma teoria da populagéo especifica para 0 modo de produce capitalista, onde localizara as raizes da fome e outras formas de miséria humana como deconéncia das relagées de opresso e exploragdo do sislema de produgdo. Ester Boserup [1965], ‘apresentou uma teoria que, ao contrério das previsdes malthusianas, identificou no crescimento populacional um mecanismo provocador de’ inovacées lecnoldgicas e, no longo prazo, de melhorias nas condicSes de vida. A Revolugdo Industrial desmentiv o malthusianismo. Nem as populagdes cresceram geometricamente nem a capacidade produtiva aumentou numa progresséo simplesmente aritmética. A mecanizagtio agiicola e os ‘ranspores modernos produziram um salto nos volumes de producdo no mundo. Seja como for, muito do que temos da Histéria da Alimentagéo poderia ser apresentado como a histéria da uta contra a fome. Mas, como afirmam de novo Sara Millman e Robert Kates (1990: 9], "the history of hunger is interwoven with the history of plenly". E significativa a presenga de titulos importantes que associam os dois exiremos, como Le fame e Fabbondanza. Storia dell'alimentazione {1993}, de Massimo Montanari, ou Plenty and want. A social history of food in England from 181.5 io the present day {1966}, de J. Burnett ‘Com efeito, 0 primeiro excedente 6 sempre alimentar. A economia humana 6, antes de tudo, a dos meios de subsisténcia. A diviséo desigual do produto social é, primariamente, uma divisGo dos niveis de consumo alimentar. Mas n@o sG0 apenas os primados da escassez ou da abundancia, ou das formas de controle e estratificagao do consumo alimentor que determinam os formas da alimentagdo humana. A historia da alimentagdo nao pode, obviamente, reduzirse somente 4 historia da fome ou 4 estatistica estimativa dos niveis de consumo e nulti¢Go de diferentes épocas. Essa caractoristica infrar estrutural da vida das sociedades, seu nivel de consumo de calorias e proteinas @ 05 formas de estratiicagéo social desse consumo, podem ser estudadas economicamente como decorrente do regime de producao e distribuicdo, ou socialmente, como parte das formagées sociais € suas inslituigdes politicas, mas elas se inscrevem na consciéncia das populagées como um fato de dimensées ideologicamente matiplas e complexas, com profundas significagdes simbdlicas, religiosas e profanos. Nas suas indmeras vertentes, 0s estudos sobre a fome tém procurado responder a um conjunto limitado de quesiéeschave. Qual tem sido o desenvolvimento histérico da fome, de alimentacdes carentes ou de consumos solisfoldrios nos diversas épocas e regides da histéria da humanidade @ Pode-se afirmar que, na época contempordnea, a humanidade no seu conjunto alimenta- se mais e melhor do que em épocas possadas? Tal suposta melhoria teria sido linearmente progressiva desde o final 5a epoca medievel até os dies de hojee Se em momentos visiveis, como guerras, pestes, catdsiroles climéticas, etc., verificamse crises alimentares e podemse medi os niveis agudos de escassez, como mensurar na longa duragdo o curso da luta pela alimentagdo, como verificar os indices de consumo alimentar, os periodos ou ciclos de crises, 05 quadros nosolégicos associados a nutricdes deficitarias ¢, enfim, a influéncia mois geral do tipo de alimentagéo na consiivigéo biolégica das distintas populacdes 2 Tis questies s6 podem ser respondidas através do exame comporado dos niveis histéricos de escassez ou abundancia na produgdo agricola e das formas de produgao e distribviggo que conslituem o equilibrio ov o desequilibrio. alimentar numa dada sociedade. Por equilibrio pressupde-se o consumo em niveis satisfatérios, quantitative © qualitativo, ve proteinos, calorias © vitaminas! Tal historia comecou a colher seus dados e a buscar sistematizé-los no século XIK. Um dos primeiros estudos foi, como nos informa Jacques Chonchol (1989: 8], o de Comelius Walford que, em 1878, apresentou 4 Sociedade Estatistica de Londres uma anélise de mais de 350 surtos de fome historicamente conhecidos. O tema da fome, das crises de produgdo, as oscilagdes de pregos & solérios, © espaco amplo reservado & correlaco com problemas bioligicos e demogralicos (fertilidade, mortalidade, epidemias, etc.etc.) foi crucial, como se 4, Else una vast bi Dliogratia mica sobre aici hamaa, que etine + quanta de ales, de peoteinas € de vitaminas que cons buen uma rac80 ale enti adequads © ue pode ser facilmente Sbrids em obras de referncia medic gv ‘ssi com et et ios © documentos of ‘das ca FAO e da OMS, 39 lore ntrconae de dhe tas pads preci serrata com cael, 0 wo abusive do clk cus, Bo impettena epoca da pines en- fquce da revista les, (6) etext por ‘utes hisoradores, eo fo relat Teter, igen) “ater the phvsiolgy of non bad be tutional 2ed inthe second hal of the 1th cern, sho lars tied for the fet fume 1 canter the quantities of food com sumed, a6 determined tats nt calories fn the he eesti tans ssions uns Prien, ft and cary Grates. Alhough this smehod ss litle used a0 ft, as become commen sce the mid te ofthe 20 cent Ene Laouse, Robe Pllppe, Fin Spooner, Jolin MeKene, Derk ‘dky, Witheln Abe, Andee Wycansks and, the present autor have done sch netional ahve caleuatons. As va Barbus, a tained rutin plnysiologiy, Ste in this vole, stonshing how naively and unerticaly some Fisorlans hive “used these physilonal ca cltions in 9 hte Viu, na implantagao de uma Histéria da Alimentacdo. Relembrese o que foi dito com relagéo ao grupo dos Annales e a importéncia dada ao abastecimento, pobreza e caréncias, principalmente na Europa, de 1400 a 1800. Paralelamente, na Alemanha, Wilhelm Abel, que teve boa circulacdo na Frango, procurava sumarizar a pobreza e as crises de fome concentrandoas na Europa pié industrial (1974). Na Inglaterra, John Burnet delineava uma histéria social, ap6s 0 influxo da industializagéo (1966) Pat Caplan [1994: 12} observa que € nas grandes disparidades relativas & alimentagéo que melhor se simbolizam as diferengas de classe. Nao 6 de estranhar, porlanto, que o tema das rebelides e desordem social se tenha transformado numa plotaforma estraiégica para entender esirutura © relacdes socials. Varios trabalhos podem servir de exemplo, principalmente na Inglaterra: Food riots in England, 1792-1818, de |.Stevenson (1974); Dearth and the social order in early modem England, de J.Walter e K. Wrightson (1976); Were ‘hunger’ rioters really hungry? Some demographic evidence, de D.E,Wiliams (1976); English hunger and industrial disorders, de WJ.Shelton {1973}. Lowe (1986) analisa as tevoltas, politicas alimentares, regulamentacdo de mercados na Inglaterra, Franca e Alemanha setecentistas Como resultado do interesse continuado dos especialistas, dispdese hoje de um acervo relevante de obras de qualidade, pertinentes ao tema. Citem- se apenas alguns marcos globais ou obras caracteristicas. Robert |. Rotberg e Theodor K. Rabb leds. 1985) sdo responsdveis por uma coleléinea que constitui dos primeiros esforcos de orientar interdisciplinarmente os estudos sobre a fome. Lucile F Newman (ed.ger, 1990) teuniv numa antologia intitvlada Hunger in History. Food shortage, poverty and deprivation, 16 trabalhos apresentados entre 1986/87 na Brown University, no Hunger History Seminar e que analisam 6s problemas do fome desde os inicos da sociedade humana e @ Aniguidade, alé a sociedade contemporanea, preocupados com entendélos para situétos numa via de solugdo. ‘A preocupagéo com a quantificagéo ndo encontra_respaldo, infolizmente, na documentagdo disponivel. A fome, aliés, & um fendmeno que tende a ficar 4 sombra. E conhecida a dificuldade de obter calculos precisos do teor de nuttictio dos diversos segmentos sociais das diferentes sociedades. Para isso, foi indispensdvel um esforco teérico para se poder esbogar a comporacéo de dados de cistintas procedéncios no tempo e no espaco, efetuandose eslimativas de composigao calética na associagées de alimentos diferentes — para o que Frank Spooner [1961] e Maurice Aymard {1975} apresentaram importantes contribuicées? ‘Sémente a partir da época modeina as fontes tomamse estatisticas precisas de produgao, circulagéo e consumo dos alimentos. E sobre a época moderna e contemporénea, portanto, a maior parte dos estudos produzidos sobre a historia da forme. O uso de dados demogréficos se amplifica, pois o crescimento demogréfico é um dos elementos que pode indicar um aumento nos padrdes de consumo alimentar em épocas passadas, |@ que a superacao dos indices de mortalidade pelos de natalidade tenderiam a manifesiar uma melhoria nos condigdes de vide, particularmente da nutricéo, que teriam permitido as populagdes uma melhor resisténcia as doencas ¢ um prolongamento da expeciativa de vida. Outras caracteristicas antropométricas ligadas & nutrigéio, como peso, altura, winerabilidade certas doencas, so também objeto de estudo para a histéria da fome. ‘A ocorréncia de determinadas doencas por caréncias climentares especificas, como 0 escorbulo, © bécio, a anemia ou o béribéri, também pode set um indicativo do tipo de alimentagdo de épocas ou regiées especificas, assim como também podem evidenciar as enfermidades derivadas de superobundéncia, come é 0 caso da obesidade, do colesterol elevado ou da diabetes contemporanea. E um paradoxo contemporéneo que ocorra um crescimento da fome no planeta na époce atval, quando « producéo agricola é a maior de toda a historia da humanidade — atingivse no fim da década de 80 algo perto de dois bilhdes de toneladas de cereais — e, devido a diversos recursos lecnolégicos (fertilizantes, agrotéxicos ¢ engenharia genética) que possibilitaram uma verdadeita tevolugao agricola, tem crescido ao longo do século XX em indices supetiores ao crescimento populacional, refutands na protica as previsdes matthusianas que tanto impacto produziram no século XIX No século XX, acreditouse que se poderia cabar com a fome no mundo com o aperfeicoamento dos recursos tecnolégicos da Revolugdo Industrial, Que vaio desde a invencSo dos vehigeradores u dos fetiizantes quimicos, ha cerca de um século, até 2 atual manipulagdo genética com a conseqiente ctiagéo de novos e mais resistentes espécies vegeltiis e animais. E, de fato, pode- se verificar no século XIX um salto significative na melhoria da nutrigéo média das populagdes de diversos paises, particulormente aqueles que desenvolveram a mecanizagdo da produsdo ¢ distribuigéio agricola Apés as duas guerras mundiais, © problema da ome emergiv, entretanto, como a grande realidade mundial; o némero dos desnutridos vai de 500 milhdes a 1 bibso 2 130 milhdes, dependendo das diferentes estimativas®, No segundo pésguerra conheceuse um boom econémico na Europa, que ‘afastou do velho continente as fomes massivas apds os momentos de fome aguda da Segunda Guerra Mundial. Embora nao se possa dispor de cdlculos segutos para 0 conjunto do planeta, pode-se afitmar que houve na segunda metade do século XX, uma melhora relativa da alimentagao diante da sitvagao anterior da ctise dos anos 30, Tal situagéo sofeu uma piora no final do século XX. Como escreve Jean-Louis Flandrin no balango dos séculos XIK @ XX, “le régime alimentaire ne s‘estil pas amélioré de maniére continue pendant les deux siécles de l"époque contemporaine: en Europe, un mieuxétre n’est incontestable qu’ partir de la seconde moitié du XiXe siécle; et dans les pays pauvres d'Afrique, il a pris fin dans le demier quart du XXe siécle." (Flandrin foebr 721) ‘© agravamento do problema alimentar foi oficial e institucionalmente reconhecido com a criagdo da Organizacdo de Alimentagdo e Agricultura das Nacées Unidas (FAO - Food and Agriculture Organization}, que teve origem numa confeténcia realizada em Hot Springs, Estados Unidos, em 1943. Desde entéo, tal organizagdo dedicouse a realizar investigagdes e levantamentos sobre a situagdo alimentar planetaria. Em 1974, sob 'o impacto de uma, crise na producéo mundial de cereais e dos surtos de fome na Africa, na Asia e na América Latina, realizouse em Roma, sede da FAO, uma Conferéncia Alimentar 6." ners its, et se que - as avai oes vain seguado 3 Fonte = um poueo ms de 400 mies te cerca de ithio: de essa sfrem de des utricdo, de forma Consamte. Pars 4 FAO, Intisaxe de 450 mi Ides de_pesons cm 1974, Pani Interna onal Food Policy Re search Insite CPR, Washington DG), 0 ob, 08, 90 Toes de pesos. Para a UNICEF, em 190, foe nero de 780 rilhies. Epa 0 Banco Mundial, essa opulacao stinge 2 be Iho © 150 snlioes de esnutrias” Jacques {Choco 19899), Al 42 Internacional, com a participagéo de 130 patses. As resolugdes desse encontro, entretanto, se serviram para tornar o tema da fome uma preocupagGo constante da midia mundial e para subsidiar uma série de estudos estatisticos © econométricos, no trouxeram efetivamente nenhuma conseqiéncia pratica, A sitvagdo do fome, denunciada pelo médico © socidlego brasileiro Josué de Castro, que foi o presidente do conselho da FAO entre 1952/56, num famoso livro publicado em 1946, Geografia da Fome, qualificado pelo autor como um “ensaio ecolégico", continua na paula dos grandes problemas contemporéneos. Os nimeros oficiais da FAO, aié 1985, mositavam que houvera uma diminuigéo na proporedo dos fomintos na populagéo mundial, mas. também indicavam que, em nimeros absolutos o nimero de famintos nunca féra tao grande: “Over the last three and ai half decades, the proportion of hungry people in the world had diminished by almost half — from 23 percent to 10 percent using the FAO data set and estimation method. Nonetheless there are probably as many hungry people today in the world as ever before.” {Kaies & Millman 1990: 395} Tal evidéncia é ainda mais gritante diante do célculo da produgdo contemporanea de alimentos, que alcangou uma disponibilidade de alimentos recorde na hist6ria humana, Como constaig ainda Kates e Milman (1990: 396): “Today we can speak of the global food supply and calculate its sufficiency - enough to feed 120 percent of the world’s population on a nearvegelarian diet distributed by need, but only enough to feed Halfof the words people on a developedcountry diet. Neste mesmo mesmo contexio, Millman et alii (1990: 309) definem as conseqiiéncias do que se caracteiza como 'developed-couniry diet’, no crescentemente interdependente “global food system”, ao se refetiram as preocupagées “about the possible global envionmeniol impaci of the destruction of ropleal forest in lain “America io increase pastureland for raising beef for US consumption’. ‘A miséria ea fome, longe de serem invariantes das sociedades humanas, tém uma histéria. A modemidade econémica caracterizouse pela transformagdo do estatuto social da pobreza e da fome, ampliando o niimero dos miserdveis e langandoos para fora de suas origens. A acumulagGo capitalista primitiva baseouse na deslemrtorializacéo de amplas camadas sociais antes vinculadas & agricultura, tansformando‘as em marginais. A respeiio deste proceso de pauperizacéo na Europa na época modema a obra de Bronislou Geremek {1995] 6 uma referéncia obrigatéria, mostrando como a pobreza e a fome desempenharam papéis diferenciados na Idade Média e na época modema. Na sociedade medieval, cumpriam um papel funcional ao servir para jusificor a institvigéo da caridade, valiosa n&o apenas do ponto de vista simbélico, na consttugéo da ideologia cristé, mas também necesséria economicamente como fonte de renda para a Igroja, que, através das esmolas, orrecadava quantias néo despreziveis numa sociedade de limitada circulagao monetaria. Além disso, a fome como jejum era apresentada pelo cristianismo como uma manifestagéo de humildade, como um valor, que levava a que ela fosse buscada por um tipo particulor de faminto voluntério que eam os peregrinos, os monges e os eremitas, além dos dias de jejum previstos no Calendario religioso para todos os figs. A pauperizacdo de estratos cada vez mais vastos na época moderna no 6 compardvel ds sitvagdes de desigualdade social medieval, mais ou menos estéveis, pertubadas apenas por crises pontuals, como a do século XN. © periodo modero foi, portanto, um periodo de estratificagdo social acelerada, com grandes camadas de excluidos reduzidos & desnutri¢Go crénica, ao mesmo Jempo em que os produios do comércio de longo curso ampliavam sua estera de consumo, popularizando génetos como 0 agicar, os especiatias, os bebidas coloniais, olém das novas espécies americanas difundidas pelo mundo. Religico A importancia seminal da alimentagéo, para manutengdo da vida, abre espaco para que ela se imbrique infimamente com o dominio religioso. A propria expressdio do teligioso se faz comumente por intermédio dos fenémenos alimentares, Garine (1994: 266) aponta a importancia, nos Evangelhos, de vocabulario e metaforas origindrios de alimentos e seus contextos: pao, vinho, pesca, colheita, vindima elc. Da mesma forma, © calendario littrgico € que ciganiza © clo diver com suos presides, posivos © negatives, em especial os jejuns. Nem seria 0 caso de levantar na mitologia das diversas culluras, © papel matriz desempenhado pela alimentagéo. A propria condicao humana se expressa, na Biblia, como tendo side motivada por um alo alimentar — a ingestéo indevida do fruto da arvore do bem e do mal (Soler 1975 e 1996). Se quisermos nos ater aos modelos alimeniares atvando no patamar teligioso, vale lembrar exemplo registtado por Montanari (1996: 319), a propésito da conversao dos povos eslavos. A crénica russa da época conta que, em 986, quando o principe de Kiev, Vladimir, decidiv converter seu povo, chamou a palacio representantes das quatro grandes teligides {catolicismo, tisfignismo oriodoxo, judaismno e islamismo}; um dos elementos de sua opgao pela ortodoxia foi alimentar, pois os eslavos néo poderiam aceitar a proibigao do lcool -pelos muculmanos,’ nem a do poico pelos judeus e também’ pelos mugulmanes}, ¢ tampouco podiom aceitar a exigéncia caldlica de sucessivos jejuns. Restou, portanto, o ciistionismo orlodoxo bizontino, bem menos rigido nas exigéncias disciplinares em relagdo & comida Faltam obras gerais sobre o tema. Quase todas partem do recorle de uma sociedade, como The lord's table, de Gillian Feeley Harnik ( 1994), em que a ovlora explora a significagéo do alimento no Judaismo primitive @ no Cristianismo, examinando o imaginéirio os sistemas classificatérios e reealeando ‘a reversdo de simbolos, valores € abjetivos do ritual da Pessach em confronto com a Ulima ceia, a crucifixdo € a ressureicGo de Cristo, Alids, 0 Judaismo, da Antigiidade aos tempos correntes, suscitou inimeras investigagdes: Aviva Paraiso (1988) estudou o comer @ o beber judaicos, salientando suos dimensdes religiosas; Susan Starr Sered_ {1988} procuroy entender © preparo do alimento como um ato sagrado, etc A maioria dos trabalhos sobre conteidos simbélicos no alimento e na alimentagdo terminam pot valorizar a dimensdo religiosa. Sirvam de exemplo o estudo de Loveday e Chiba (1985) sobre os cédigos simbélicos na sociedade japonesa ou do simbolismo do péio no Ocidente crisiéio, por Galavaris (1970). Aiguns estudos se concentraram em alimentos espectficos. Desles, © visto talvez tenho sido 0 mais concorride, em especial por sua capacidade de 43 44 provocar estados de superacdo das condigdes habituais de percepgdo. Para exemplo bom relerirse ao estudo de MuChou Poo {1995}, que toma o vinho as ofertas de vinho como via de acesso & aspecios fundamentais do. religidio egipcia. Associeda ao vinho, 6 uma técnica de processamento que vai servir de eixo ao trabalho de Dominique Fournier e Salvatore d’Onofrio (1991}, que pretendem, sem meias palavras, que a civilizagao comega com © dominio da fetmentacdo: dom divino, em varios mitos de origem em varias culluras de maiz indo-européia, é um vetor direto para o sagrado; dai os efeitos de desestruturaga0 cultural que podem ocorrer nos confontos e substituigées, como quando, no Novo Mundo, as bebidas destiladas européias tomaram o lugar dos. licores fermentados tradicionais. Parte considerdvel da bibliografia temética pode ser agregada em tomo de alguns poucos eixos principais: 0 sacrificio, o taby, 0 jejum, a antropolagia O sacrificio ¢ um tema fundamental, quer no campo religioso, quer no campo alimentar (Grottanelli 1988). Como {oi reiteradamenle analisado pelos especialistas, 0 sacrificio 6 um filual de comunicagéo cuja estrutura basica implica ‘a consagra¢éo |sacer facere) de uma vitima, retirada, porlanto, de seu contexto profano e, por isso mesmo, integrada ao contexto dialeticamente oposto, o do sagrado, e sua posterior ingestéo pelos fitis. E essa mesma estrutura que se encontra presente, por exemplo, no sacramento da Fucaristia, Portanto, € por um fitval de alimentagéo que se abre a via da hranscendéncia As pesquisas, de inspiragGo esluturalista, sobre a ‘cozinha do sactificio' na Grécia antiga, desenvolvidas pelo grupo parisiense de estudo comparativo das religides e sociedades antigas contribuiram decisivamente para Fxar pontos. importantes. desta. problemética e fomentor indmeros desdobramentos. JeanPierre Vernant e Marcel Détienne (1979) sdo mencdo obrigatéric, assim como, para entendimento de significagées religiosos da comensalidade, associadas & polilica, os nomes de Frangois Lissarague Pauline Schmitt Pantel {1988). © tabu alimentar & outro foco de inleresse dos estudiosos que buscaram entender a climentacdio da perspectiva religiosa — embora, é claro, 0 fendmeno tenha varias outras dimensées [cf 0 tabu como forma de dominagao de género em O'laughlin 1974}. O tepertério de estudos de caso é grande, © pouces os estudes gerais, como o de Frank Simoons (1994) que tracou um panorama das evitacdes alimentares, da Pré-historia aos tempos correntes. © que aqui 6 de inletesse mais profundo, porém, so as tentativas de buscar os fundamentos dessas prdticas alimentares negativas. Basicamente, sGo trés as linhas mais consistentes. A primeira é de teor materialisia e funcionalista. Marvin Harris (1978, 1989] leva ao extremo tal abordagem, numa vertente ecolégica biolégica, a ponto de pressupor que uma rigida racionalidade regeria todos os. comportamentos olimentares. Nessa perspectiva, os crilérios de alimento preferencial au interdito (as proibigdes islamica e judaica para o consumo do porco ov i hinduista para 0 da vaca} estariam iniimamente associados @ valores uiriivos € 0s proprios sacrificies humanas dos astecas ndo dispensariam consideragdes sobre caréncias protéicas. Mas, como nota Garine {1994:248), salvo na India, pouces tabus permanentes comporiam consequéncios nutricionais. Uma_segunda altemativa leva em conta problemas cognitives e classificatérios. Duas referéncias devem ser apontadas. Em 1966 Mary Douglas publicou um livio que teve ampla citculagdo © que estidava os conceitos de poluicéo e tabu na tradi¢do biblica,a partir dos conceitos de puraza e perigo. A raiz do perigo, sustenta a auiora, esti nos intersticios das categorias classificatérias: quando os fenémenos e os seres ndo podem ser alocados a classes cognitivas identificaveis sem ambigilidade (ela examina principalmente os animais inierditos), gerc'se uma inseguranca que recomenda a ndotocobilidade — pressuposio da pureza. Mais recentemente, M.Douglas {1996} retomou a quesiéo, reconhecendo algumas complexidades que antes haviam sido marginalizadas e restringindo um alcance universal que pudesse ter sido visto em seu ltabalho anterior). O outro nome ¢ 0 de Marshall Sahlins (1976). Em linha préxima, mas num contexto bem diverso, procura explicar por que muitos sistemas, calimentares incorporam a carne de ces € cavalos como alimenio, ao contrario da rejeigéo radical na sociedade americana, E também no plano cognitive e Clssiicatério que vé ele 0 cleo de distindo: “edibilty 's inversely related to humanity"(p. 175); por isso, quanto mais os sistemas classificatérios reconhecerem a proximideds de um animal com © homem, num nivel estreito de convivéncia e individualizagdo {como € © caso do cdo nos E.U.A.}, mais a ingestéo de sua came se assemelharia ao canibalismo. Uma tetceira vertente nos parece que, sem negar a anterior, ampliar Ihe 0 alcance. Tratese da consideragdo do taby como marca de identidade. As interdiges alimeniares, com efeilo. funcionam de forma muito eficaz para distinguir e isolar, 0 que é da natureza dos processos de identidade, entendida como mecanismo antes de exclusdio do outro, que de referéncia a si proprio. Os fitulos de Jean Soler, acima mencionados, vdo nessa ditecdo, co interpretar as regras alimentares hebraicas como um recurso de distingGo e isolamento cultural, destinado a manter o povo judeu separado dos demais pela exigancia de que os nimais a setem comidos fossem apenas aqueles que “respeitassem o lugar que Ihes foi fixado no plano da criagéo” Proximo dos tabus alimentares esté o jejum, cuja dimenséo politica ja foi aqui tessaltada, mas cuja dimensdo religiosa é também fundamental. (Baver 1989}. Um trabalho que pode servir de referencia 6 0 de Veronica Grimm (1995), significativamente infitulado From feasting to fasting: the evolution of a sin, em que a autora discute 0 Cristianismo primitive © 0 Judaismo no mundo grecoromano para estudar alitudes cristas diante da alimentagdo, considerando as significagées da comida, do comer e da abstencGo de comer. Em particular, considera as conolagdes de pecado associadas 4 carne e as mottificagdes que lhe devem ser inlligidas para obler a purificagéo. Aponta para os desdobramentos que esse modo particular de jejum tem ainda hoje no ascelismo alimentar. Alias, a associagao dos healt movements com as crengas e praticas religiosas ndo deixou de ser ttatada. |ill Dubisch (1989) as analisa como uma forma de sistemas religiosos, com seu corpo geral de crengas, sua simbologia propria, prescric¢ées morais, ideais de pureza do corpo, mecanismos de segiegardo, etc A segrega¢ao alimentar, alids, dé pista para Colin Spencer (1995) estudar a festa dos heréticos’, ao tratar do vegetarianism. A dlima grande corrente religiosa ocidental a propugnar pelo vegetarianismo foi uma 2. Asa tape, canbe Ji fs somatic a or by deities, i se mitimsphic ee tension of physical om sumption ‘of shat subunit and tate fa the fuman bexly to exphin or encode ith ‘complex motional Yue other, mone sya 1, fom of emp tion for example. ideas finest a cannibals oF eating Hood “Ce ‘1956 6 heresia, a célara, que a Inquisigéo eliminou apés uma acirrada campanha iniciada no inicio do século Xill (le Roy ladurie 1978). A recusa de toda calimentago carnivora expressa-se filosoficamente na tradigGo indiana, que chega ao Ccidente na doutrina pitagérica, igualando todo consumo de came a um ato canibal e recusando a ingesiéo de cadéveres. Se tal ideologia, vinculada 5 crengas reencamacionistas da mentempsicose oriental nao conseguiu imporse no Ocidente cristo, renascem, entre os anticamivoros cantempordneos, crencas 4s vezes préximas (Fides 1991; Twigg 1983}. ‘A antropofagia é um tema préximo do tabu e como este também tem uma marca religiosa, embora seu alcance seja maior. Mesmo dotado de contetdo candente, ndo atraiu muitos especialistas e a bibliogratia ainda é muito insuficiente: faliam estudos gerais mais amplos e consistentes, embora se tenham bons acervas de dados (como Tuzin & Browns 1983). Nao é tema novo; j& no século V a.C. Herédolo atribuia aos citas tal costume abomindvel. Mas € no séc.XVI que sua significago passa a fer um peso maior. Arens (1979) procurou analisor os relatos feitos pelos europeus, no contacto com os natives do Novo ‘Mundo e colocau em divida seus testemunhos. © livio é panfletario e nem sempre se podem acompanhar suas conclusdes, mas teve o métito de chamar a aten¢o para que represeniou © canibalismo na mentalidade dos conquistadores e para @ legitimacGo de conquisia. Frank Lestringant |1994) e Ronald Raminelli (1997} podem ser citados como autores que se preocuparam com esse filo, procurando entender © imaginério do canibalismo. © canibalismo foi explicado no séc.XIX pelo positivismo neo malthusiano como a conseqiiéncia necessdria do conflito entre uma populacéo ilimitadamente crescente e uma_disponibilidade limitada de recursos. Michael Hamer {1977} e Marvin Harris {1977} sdo verses contempordneas, atualizadas com preocupagies ecolégicas e nutricionais, dessa pastura altamente redutora. Com feito, antes de mais nada é preciso distinguir 0 canibalismo ritual do sactificio sem consumo de vitimas humanas [como enlre os astecas), 0 consumo emergencial de came humana, as praticas médicas {ingestéio de placenta, ov do corpo humano embalsamado e pulverizado), as vendeias etc.etc. [Brady 1996) Doutta parte, o canabalismo € polissémico, desdobrandose em inémeras significagdes religiosas, politica, afetivas, psiquicas, simbdlicas” 5 fatores religiosos, enfim, também foram determinantes na fixagéo de padrées de climentacao que se transformaram em padrées de identidade cultural. Na antigiidade grega e tomana, além do saciificio candnico em que a came, de consumo escasso, era importante, havia um modelo de alimentacao ‘civilizada' assentado na trindade do po, vinho e éleo de oliva. Tiés produtos da indistria humana que se opunham ao modelo barbaro germénico do consumo. de produtos ‘naturais’, especialmente a came € o leite. O Cristianismo iré incorporarr essa tradigdo classica revestindo-a dos atributos de representagdo da pépria divindade ao adotar, na sua liturgia, 0 po como o corpo de Cristo, o vino como 0 seu sangue e 0 leo como a ungdo sagrada. Notese que o Novo Testamento rompe com as restri¢des véterotestamentarias € com 0 particularismo judaico, o que the dev base para universalizarse aceitando todas os formas de alimentagGo [com a excegao da proibicéo do sangue que, vinda do Levitico, petmaneceu nos Atos dos Apéstolos). Mas foram sacralizados alguns alimentos patticulares, como a trindade meditewanica do péo, vinho ¢ dleo. Tal partido 2uropeu nao impediu a autorizacdo pela Igreja, em lugares distantes, como na América, da fobricagéo de héstias de farinha de mandioca e de leo erismatico de cobreiva onde havia auséncia de trigo, uvas @ azeite [FeeieyHornik 1994) Os descobrimentos © a mundializacdo da alimentocdo, A maior revolugéo na alimentagéo humana ocorrey no periodo medemo com a ruplura no isolamento continental, quando o intercambio de produtos de diferentes confinentes, que ocorreu no bojo da expansdo colonial européia, alterou radicalmente a dieta de praticamente todos os povos do mundo. As especiatias asidticas se difundiram para a Europa © chegoram aos outros continentes. As plantas alimenticias das Américas: 0 milho, a batata, o tomate, 0 ‘amendoim, os pimentées, propagaramse pelo planeta. Géneros fropicais como ‘2. cana de'acucar, o ché, 0 café e 0 chocolate, combinaramse para fornecerem um novo padiéc de consumo de calorias ¢ de bebidas excitantes, que, ao lado do tabaco, tomaramse habits interriacionais. Produtos tipicos da Europa mediterranice como 0 trigo e a va acompanharam a colonizagdo de diversos paises e 0 éleool destilado penetrou em todos os continentes Os impacios sobre os padiées alimentares foram sentidos de forma diferenciada mas com uma intensidade andloga na Europa e na Américo. Um lira que se dedica especialmente ao estudo das ‘migiacées'de alimentos técnicas culinarias séo as atas do Congresso de Oxford Food in motion (1983); ver também Sentieri & Zazzu 1992. O tréfico comercial interocesnico que inaugurov 9 periode moderna produziu a acumulacao primitiva do capital, alterando profundamente a vida social em todo o mundo. A cultura arabe jé vinha transmitindo lentamenie, desde Baixa Idade Média, diversos produtos asidticos para a alimentagao européia, desde as especiarias (pimenta, cravo, canela, noz moscada) até 0 arroz e as frutas citricas. Como relata Sidney Mintz |1985: 25), antropélogo especialisia no Caribe, em sua obra sobre a influéncia cultural do agicar, ‘ovo difundidos, acompanhando @ expansdo do Isldo, muitos vegetais importantes, como 0 arroz, © s01go, © trigo, © algodao, a beringela, as frutas citricas, bananas, mangos e a cana-deacicar, mas foi no momento em que essa alimentagdo deixou de ser um luxuoso privilégio e comesou a expandirse para diversas camadas sociais que surgi © primeiro mercado’ mundial O comércio dos novos géneros foi o motor do aparecimento de novas formagées sécioecondmicas, como foi o caso do sistema de plantations na ‘América e, ao mesmo tempo. da expansdo num grau nunca antes conhecido do trdlico de ‘seres humanos. Os capitais criados nesse trdfico triplo — produtos asidticos para a Europa, escravos alricanos para a América, produtos americanos para a Europa e Africa — alavancaram as tronslormagées no sistema de producdo artesanal na Europa, fornecendo a demanda, 0 produto lalgodc} © o copital para o surgimento da indistria téxtil que deflagrou a Revolugdo Industrial [Novais 1979; Mintz 1985). 'A pimenta moveu as naus dos descobridores © © acticar produziu a escravidao atricana, deslocando massas humanas entre continentes. Como 47 48 firma o {6 citade Sidney Mintz (1985; 71}, "sugar — or rather, the great ‘commodity market demanding it — has been one of the massive demographic forces in world history" Diversas monografias especificas de cada um destes alimentos (Salaman 1949 para a batata, BirketSmith 1943 para o milho, etc.) perseguiram 0 percurso da migracéo vegetal provocada pelo descobrimento da América e de suas conseqiéncias na alteragéo da dieta européia. Um autor que, mais recentemente, discule a relagao do milho com a economia capitalisia Arturo Warman {1988}. Outras obras mais gerais estudaram a imporiancia destas plantas no periodo dos descobrimentos portugueses (Ferro 1992}, ov no bojo de andlises mais gerais sobre o Império portugués € sobre a consfituicGo do sistema colonial (Disney 1981). Um produto especifico da cultura colonial que ‘adquiriu grande importancia econémica foram os destilados de dlcool de cana, como o aguardente brasileira © o rum do Caribe, que serviram de moeda de escambo para a compra de escravos na Africa (Camara Cascudo 1986). Mas 0 grande género alimenticio cuja ampliacdo do consumo mais influiu na alteragéo dos habitos alimentares foi o agicar, néo s6 adogando as bebidas colonicis que nunca o haviam sido nos seus paises de origem (os chineses consideravam os europeus barbaros por adagarem 0 chd, e os povos Grabes condimentavam o café com cravos, canela ov cardamomo, mas nunca o adagavam}, como estendendo sua utilizagGo para quase todos os tipos de iimentos, inlusive as cames e outios pratos solgados. Seu coméicio [oi o principal da época colonial: apés 1666 superou todas as oulras importacdes coloniais da Inglaterra, somadas (Mintz 1985: 44), Um exemplo inrigante de uma influéncia decisiva da alimentogdo na historia politica e econdmica é a avidez pelas especiarias, a cuja motivagao foram airibuidas diferentes origens. As especiarias sGo. alimentos/drogas, substancias de consumo gustafivo, mas também medicinal e afrodisiaco. As atribuigées de origens miticas para essas substéncias, que viriam do proprio Jardim’ do Eden, carregadas pelos quatro tios que nele nascem, © que corporificariam as virtudes solares das regides quentes e desconhecidas do Oriente foram analisadas por Jean-Pierre Albert (1990). Podemrse encontrar também em estudo sobre 0 cronista das dragas da india, Garcia da Orta, os herbarios do século XVI, informagdes a respetto dos diferentes valores alribuidos 4s especiarias (Henrique Carneiro 1994) A época moderna deve alguns dos seus elementos fundadores essenciais & énsia pelas especiarias, a qual levou ae ciclo das navegacdes, cos andes descobrimentos, ao sistema mundial, ao comércio transocednico e & formacao dos modernos impérios eutopeus, 0 que fez o historiador A. R. Disney {1981} chamar Portugal de Império da Pimenta Essa busca de especiarias, levando & descoberta da América, provocou indiretamente uma revolugdo nos hébitos alimentores mundiais, colocando em contato espécies que nunca antes tinham sido transplantadas. Algumas das centenas de variedades de botatas que @ cultura Aimard do altipleno boliviano conhece se deixam aclimatar no Velho Mundo para difundir uma porcela desse saber: o tubérculo que Charles |'Ecluse descrevev pela primeira vez e que Parmentier conseguiv popularizar na Europa, Os contalos e os influéncias se fazem em diversos sentidos: a bataia, o milho, © tomate, o amendoim, 0 pimentio, 0 feijéo e 0 cacau das Américas difundem-se pelo mundo, junto como ché da China, 0 café da Etiépia, a canela do Ceiléo, 0 cravo das Molucas, a pimenta do Malabar, e a noz moscada de Banda (Ferro 1992; Ferronha 1992}, enquanto produtos da dieta européia, como o trigo, 0 vinho € © dlcool destilado, também expandemse de sua dea original para uma difusdio mundial. Cada um dos produtos de origem americana teve uma histéria especifica na sua expansdo para fora do continente de origem. Alguns, como os pimeniées, por exemplo, vieram a influenciar culinérias 'Go distantes como a africana, a do sudeste asidtico, e a hingara, onde se tornou 0 condimento mais caracteristico do pais: a paprica do gulash (Flandiin 1996: 559). A balata, o tomate, o milho, 0 feijao e, entre 08 animais, 0 caso singular do peru, foram sendo adotados lentamente, ¢ s6 no século XIK se incorpororam definitivamente & limentagdo européia e de grande parte do mundo. RevolugGo semelhante somente ocorera antes quando, em meados do ano 1000, os arabes comecaram a fazer lenta difusGo de uma série de produtos que a Europa até entéo ndo conhecia, como 0 alcool destilado, © ascar, a laranja, e as proprias especiarias asidticas, aié entdo seu monopélfo comercial Tais produtos de lixo naguela época mantiveramse, eniretanio, restritos & nobreza Ahistéria da alimentacéo moderna é a de uma expansGo no consumo de diversos produtos de luxo, @ pimenta e as especiarias no século XVI, e 0 acicar e as Babidas coloniaie (chocolate, café e chd) a ele associadas, que se fomaram os géneros mais importantes do comércio mundial. Apenas o cha, por ‘exemplo, constitviv 81% do valor dos carregamentos da East India Company, da Inglaterra (Flandrin 1996b: 561). Sidney Mintz (1986: 99} designou estas subsincias ‘alimentos drogas’, como 0 chd, que levaram a Inglaterra ¢ um tal grav de vicie que, para obIélo, transferiram para a China em pagamento a maior parte da prata exiraida das minas da América. Wolfgang Schivelbusch [1991] € outto autor que escreveu uma histéria disso que em aleméo se chama Genussmittel, que pode ser traduzido como “estimulantes", destacando os aspecios morais implicados na adogao do chocolate, considerado como aristocrético e alrodisiaco, e do cha, café e tobaco, reputades como burgueses e sébrios. "Ao mesmo tempo em que se expandia o comércio de longo curso & se iniciave a intodugdo das plantations de agicar nas colénias, para © qual se infensificou em um nivel nunca antes visto 0 trélico de esctavos, numa didspora alficana para o América, a alimentagée camponesa na Europa declinava consideravelmente em qualidade e quantidade Diversos autores (Courie 1964; Neveux 1973; Benassar & Goy 1975; Flandrin 1983} escreveram sobre a alimentagdo européia na época moderna. O periodo maderno foi o momento em que a alimentagao cerealifera se impds & maioria da populagéo européia, limitando a maior diversificagdo exisente no periodo medieval, assim como diminuindo o consumo de carne até a sya desaparigo em amplas camadas sociais [Flandrin 1996: 550}. O cercamento dos campos, a expulsdio dos camponeses da tetra, de cuja 49 A. HE pemcos etd dedicados especies ‘do alent. Ae ats Alo Cotoquio dea Sanne (Stern, 1987), apropeadamente it ido manger des ova, @ a excep, 50 propriedade séo cada vez mais excluidos, a alta generalizada de pregos, entre outro fatores, provocam, enire os séculos XVI e XVI, algumas das maiores crises de abastecimento e as grandes fomes se generalizam. Nestas épocas de grandes fomes do periodo modemno se generalizaram também as dietas dos periodos de crise, baseadas no consumo de Taizes e vegetais improprios para o consumo, como 0 joio e, particularmente, cereais contaminados pelo espordio do centeio. Sua ingestio provocava efeitos de epidemias coletivas, onde se destacavam os sintomas mentais, como & 0 caso das manias convulsivas conhecidas como “danga de Sao Vito”. O italiano Piero Camporesi (1980) escreveu um livio cléssico sobre este assunto, !) pane selvaggio, que trata do “imagindrio da fome da Renascenga ao século XVIII". A historindora conadense Mary Kilbourne Matossian {1989} iambém abordou estes fenémenos de uma alimentagdo deletéria e causadora de distirbios psiquicos coletivos no livio Poisons of the Past: Molds, epidemics and History. No Brasil, Josué de Castro (1987:220-227) listou dezenas de plantas téxicas usadas e dietas de épocas de seca ¢ fome no nordeste, os chamados alimentos “brabos' Se a busca das especiarias impulsionou as grandes descobertas maritimas e a adogao do a¢icar levou 4 escraviddo africana, os desequilibrios provocados pelas crises alimentares do século XVIll deflagraram as revallas que culminaram na Revolugde Francesa em 1789. A alimentacdo ocupa, como um ator invistvel, o cenério dos grandes processos consiitutivos da modemidade, assim como forja, no Gmbito menos visivel dos habitos e costumes, essa revolugdo silenciosa que conslitui o que Norbert Elias (1990) chamou de ‘processo civilizatério’, no qual as maneiras & mesa ocupam 1&0 destacado papel Gosto & gastonomia © interesse histérico pela gastronomia surge desde o inicio da insfitucionalizagéo da Historia da Alimentagdo, na década de 60, mos se desenvolve plenamente duas décadas depois. © ponto de partida 6, de um lado, ‘0 reconhecimento da importancia psico-social dos significados alimentares, como assinalada por Barthes {1961} e acentuada a seguir pela Antropologia, ¢, de ‘outro, a instituigGo do gosto como objeto legitimo de pesquisa histérica. Assim, JFRevel, |.PAvon e JL. Flandrin vao superar o univetso predominanle das necessidades e caréncias nutritivas, das quantificagdes e das matériasprimas alimentares, para ocuparse das escolhas, das qualificagées e dos pratos preparados. Os ités percaberam o papel do gosto e da moda como estratégias, para entender a dindmica social da sociedade moderna, paticulormente (mas Go exclusivamente) no que diz respeito & distingGo social (Gronow 1997). Além disso, tralavarse de hisloricizar 0 universo do corpo e dos sentidos e valorizar os atributos esiéticos do alimento, ressaltando a vista € o paladar, Flandiin desde 1978 coordenava pesquisos para escrever uma historia do gosto. Em 1983, num estudo sobre 0 uso das gorduras nas cozinhas da Europa ocidental, do séc.X!V ao XVII, estabelece esta diferenga basica: “dans le comportement alimentaire des peuples comme celui des individus, il faut distinguer la part du go°t et la part de la nécessité” (1983: 369). No artigo do mesmo ano (1983b), la diversité des godts et des pratiques alimentaires en Europe du XVle. au XVille. siécle, resume suas principais posigdes |v.também 1986). Revel (1979) vai explorar ‘a historia literdria da sensibilidade gastronémica’. Aron, também envolvido com a ‘sensibilidade alimentar’ na Paris do séc.XIX, colaca a Historia da Alimentacdo em sintonia com a Histéria das Mentalidades. Comentando trabalhos como estes, Stephen Mennell (1992: 279), que também poderia incluirse nesta corrente, salienta o deslocamento da tengo para o que ele denomina "the demand side — that is, the study of social influences shaping people's tastes in food”. Outro nome que se distingue ¢ 0 do casal Grignon. Claude Grignon (1981, 1988} vai ester, por via da alimentagdo, a estatificagao social e delinear uma sociolagia do gosto; em componhia de Christione Grignon (1980, 1986], retomard o tema de estratificagéo social e intaduzird 0 do gosto popular Do gosto se pode passar gastronomia propriamente dita. Jean Frangois Revel (1996: 18) vé em meados do século XVII rs marcos de superag¢do da uniformidade na culinaria tradicional, que se perpeluava em toda a Europa: 0a publicagdo, em 1651, do Cuisinier francais, de F.de la Varenne; logo apés, 1656, do Cuisinier, de Pierre de lune; e, em 1662, do Le cuisiner méthodique ou I'école des ragoiits, de autor anénimo. Estas raizes vao desabrochar no século XiX numa alentada bibliogratia, em que cumpre salientar os nomes de Grimod de la Reyniére, que publicou de 1803 a 18120 Almanach des gourmands —e por isso € considerado 0 pai fundador da literatura gastondmica — e o nome mais célebre, o de Jean Anthelme BrllatSavarin, autor da Physiologie du godt, de 1825. Aclimeniacéo, que sempre tivera um espaco parlicular nas utopias desde 2 Idade Média, como as de pais de Cocanha, vai também agora incorporar a gastonomia, como em Cherles Fourier (1972), que previa 0 advento da gastrosofia, quado a questéo culinaria se tornaria, Go. Fedo do sexo, a mais imgorane peocupacto © atividade dos cidaddos.° Este material, mais 0 que se telere a disputas gostonomicofilossficas a partir do século XVII ("science et philosophie s'emparent alors de la marmite”, observa o Barao Grimm, apud Roche 1997: 266), além de cademos de receitas ou testemunhos sobre sua fransmissGo oral, livas de viagem etc. vdo permitir que se desenvolva uma bibliografic histérica, em geral de cardter nacionalmente particularizado: J.R Pitte (1993} faz a historia © a geografia da gastronomia francesa; Piero Camporesi (1996) trata da arte de viver na época das Luzes, com espaco privilegiado para nosso tema; Emilio Faccioli (1992) raga um panorama da gastronomia italiana; lucie Bolens (1990) estuda a cozinha andalusa dos séculos XI a Xill etc.ete Alguns poucos textos tém cardter mais genérico, como o Homo culinarius de PFalk [1991], que se orienta por uma antropologia histérica do gosto, ou, ainda que calcados no caso francés, Flandrin {1992], ou entéo Rowley [1994]. Alguns trabalhos se centraram em aspectos documentais, como La cuisiniére bourgeoise de A.Girard {1977}, que explora os livros culinarios dos séculos XVII e XVill; V. Maclean (198 1} lista o mesmo material para a Inglaterra, entre 1701 e 1800. De um caréter um pouco particular 6 a obra de Jack Goody (1982), Cooking, cuisine and closs, onde 0 auior distinguea haute cuisine da cozinha camponesa e se pergunia por que algumas sociedades, como as afticanas, néo dispdem da primeira categoria. A resposta, associada & organizacéo hierérquica dessas sociedades © & presenca de uma tradigdo literéria na produgsio de 9. cf, Bdmund Leach 964 58) que explora que cle cham de oo ve ‘ween ting ane! veal 51 52 tepertérios, € mais ou menos Sbvia. Stephen Mennell parte de Goody para, em ‘Almannors of food (1985), supero‘o € desenvolve um estudo comparative entre @ Franga e a Inglaterra: “to explain why complex differentiated societies produce complex differentiated cuisines is a less difficult task than to explain why complex differentiated societies hove produced culinary cultures with perceptible different culinary cultures" (1992: 280). Para tanto, estudou as diferencas no processo de urbanizagdo; o abastecimenio diferencial a dependéncia, ov néo, do campo; ‘as caracterislicas da nobreza em cada pais (especialmente 0 cardter marcante do ‘country gentry’ inglesal, etc ‘G estudo da gastronomia, por sua vez, intoduziu figuras e espacos novos, em nosso cendrio: © gourmet, o gluléo, © cozinheiro, 0 ‘bebedor’, 0 restaurante, Um dos marcos 6 a obra de |. PAron, le mangeur au XIXé.siécle 11973; ver também 1974}, em que ele leva em conta a emergéncia da burguesia ea disponibilidade, depois da Revolucdo Francesa, dos ‘officiers de bouche’ nies vinculados és famtlias nobres — 0 que também vai ensajar a abertura de restaurantes. B, Watson {1962} ja se havia intetessado pelos cozinheiros, glulées € gourmets. Quanto 4s representacées do ébrio, é o tema da obra de Didier Nourrisson (1990}, le buveur du XIXé.siécle, anteriormente citada. Historiogrofic Brasileira: Recortes A historiografia brasileira da alimentagdo € muito pobre. E um tema que, eletivamente, ainda néo foi descoberto pelos historiadores, embora sua presenca possa ser deteclada, sempre como apéndice, em varias circunstancias. Como se verd adiante, apenas no seio da Histéria econémica e em files abertos pela Antropologia e pela Historia do cotidiano ou da vida privada é que comesa 4g surgir uma produgdo mais continuada e sistemdtica. Ha alguns quadros gerais descrtivos, que mais funcionam como crénicas ov ensaios, a desenvolver sem base empirica mais sélida problemas de escala muilo vasta {p.ex., Brandao 1948, Costa 1942). Apenas uma obra de sintese, representando uma experiéncia’ acumulada ao longo de cnos de squisas, esta disponivel: A Histéria da alimentacéo no Brasil, do anttopdlogo € folclorista Luis da Camara Cascudo (1983, 1a.ed. 1967-8]. Como ele relata no prefacio, era seu projelo escrever uma obra em colaboraggo com um geAgrafo fambém envolvido com o tema, Josué de Castro: a empreitada comum, segundo ele, frustrouse talvez porque o grande cientisia social pemambucano tratasse da fore © seu quase porceito potiguar estivesse mais interessado_em comida Os dois volumes da Histéria de Camara Cascudo abrangem vastissimo panorama. O primeito cuida do cardapio indigena, da diela africana © portuguesa, da alimentacdo dos viojantes e escravos.. Utilizando fontes histéricas © elnogrdficas, esboca uma tentativa sociolégica de caracterizar a alimentacao do Brasil colonial (que hoje nos parece um pouco superficial, mas cujo valor ndo pode de maneira alguma ser reduzido}. Se descaria os alimentos aculturados {orroz, cona-de-agicar, café}, insiste nos natives. © segundo volume trata da cozinha brasileira, de sua ‘fundagdo’ {insistindo no séc.XVIl}, na proviso € consumo dos alimentos, nos rituais da refei¢do, na alimentagdo viatica [farnel de trabalho, farnel de viagem|, nas supersiigSes © no folelore de alimeniagao, nos itos @ realidades da cozinha africana, Interessase pelas bebidas, sal, agucar, pimenta, feij0, farinha, horialicas, verduras. Nao excli problemas de interdependéncias ¢ assimilagdes — em suma, transformagdes — ao considerar a fisionomia alimentar de grupos étnicos. E também gragas a Cascudo {1977} que devemos uma cémoda compilacéio de textos, de toda ordem e teor, referentes & alimentagéio no Brasil trechos de cronistas € viajantes [luccock, Koster, SaintHilaire, Maregrave, von Marius, lvo d'Evreux, etc.], excertos literdrios (Coelho Neto, Vinicius de Morais, Santa Rita Durao}, ‘além de pequenos estudos de gedgrafos, sociélogos, historiadores contemporéneos. Cascudo publicov ainda monografias sobre a cozinha afticana no Brasil (1964), a aguardente (1968) e o acicar (1971) Doutra parte, é preciso apontar as dificuldades de ordem documental Alé mesmo para estudes de fome em nosso século contamse com enoimes dificuldades de regisitos. Se tem sido freqiente a exploragéo dos textos dos vigjanies € naturalistas, pouco uso se fez da literatura em geral e absolutomente nada com registtos visucis. Urensilios e equipamentos, livios de receita e etiqueta ainda néo mereceram tratamento sistemalico, embora excegdes recentes apontem que este desconhecimento pode ser superado (lima 1996). Da mesma forma, pouces tém sido os estudos dos espacos associados 4 preparacdo e consumo dos climentos, embora se possam mencionar obras sobre a arquitetura © as fungdes da cozinha [lemos 1976). J& os engenhos de agiicar mereceram mais atengdo, ainda que 0 interesse seja, sobretudo, a tecnologia (Gama, 1983: Azevedo 1990). A preocupasao historiogrdfica também fem sido rala e uma tentativa como a de Saldanha (1971) de tagar a evolugao, desde a época colonial, dos estudos sobre o agécar é muito suméria. Ultima observagéo geral: se tem sido pobre o interesse de historiadores estrangeiros sobre a problemética da alimentagdo no Brasil [salvo, em parle, com telacéo ao calé e a0 acicar}, é praticamente nula a produgdo brasileira pertinente a quesides externas a nossa sociedade Conviria agora, agui também, anes de definir os tragos mais especificos dos estudos ‘histéricos, esbocor um panorama dos estudos antropolégicosociolégicos, que estdo, muitas vezes, proximos daqueles — e nos quois a presenca da alimentagéo sempre foi mais sensivel. Estudos antiopoligico sociolégicos Deixamos de lado, aqui, a bibliogratia arqueolégica, néo s6 porque se refere a um foco de aten¢éo diverso da sociedade brasileira, como também porque ela 6 extremamente dispersa e parcelar. Islo nao é negar seu valor, sobretudo na contribuigéo para o conhecimento de alguns cultivates {em particular @ mandioca e © milho}, ov em praticas como « caga e a pesca, ou, ainda, em Jécnicas que se fransmitiro aos indigenas historicamente conhecidos — mos para fundamentar um tratamento de sintese historiogrdlica é insatisfatério. Felizmente, ‘com a atengao dada nestes Ultimos anos a questées como o surgimento e difuso da agriculture, verse acumulando material para outros patamares de interesse, 53 54 como, por exemplo, a correlagao com formas materiais e sociais de organizagao do territério e dos assentamentos. Quanto 6 bibliografia enagrafica © einchistérica, € muito ompla e ja ‘presenta certa continuidade. Ainda faltam, é carlo, estudos gerais: um pequeno texto de Eduardo Galvao (1979, la.ed. 1962} ainda hoje muito citado, ou entGo a tentativa mais antiga de Herbert Baldus {1950} sGo ocorréncias ‘excepcionais. Mesmo uma antologia publicada no vol. |, Etnobiologia, da Suma einobigica brasileira orgonizada por Berta Ribetto (1986), obra ulifssime, revela um campo ainde pouco amadurecido. A antologia inclii quase tudo de importancia e de caréter ou interesse geral que se publicou, cobrindo vasto espectro de quesides einoboténicas e etnozoolégicas {uso e classificagdo de antas, animais e solos, estimulanies e venenos, agricultura, caga, pesca, FineSes rtvais e medicinais dos climentos, ete) F significative 0 peso de alguns grandes ‘classicos’, como Saver, léviStrauss, Cameiro, Métraux, ao lado de felativamente pouces estudos mais recentes. Entre estes vale lembrar o de José Proenza Brochado |1977] sobre a Floresta Tropical. volume de vina vasa producéo de teor folelérico pode ser avaltado na bibliografia de uma obra sobre alimentacdo e folclore publicada por Souto Maior {1988}, obra em que se reuniy um nimero considerdvel de provérbios, ditos, crencas e referencias populares. Completando suas sinalacdes, pode-se confitmar que, entre estudos de base antropolégica e simples regisiros pitorescos, clinhamse poucos trabalhos gerais ou que abordem temas técnicos: 0 alimentagao sertaneja (Sampaiol944}, a conservacéo de alimentos {Faria 1965}, olimentagdo e linguajar popular (Moura 1969], A maioria gira em torno de alimentos especificos: acéicar (Salles 1967, Souto Maicr 1977], Souto Maior 1977, Ribeiro 1977], cachaga {Cascudo 1968, Juliéo 1921, Souto Maior 1970 ¢ 1973, Barbalho 1974), café |Magalhaes 1980, la. ed. 1936, Marconi 1976}, pao (Souto Maior 1971}, caju (Souto Maior 1981) e assim por diame, Apesor da vitalidade do temo, que estes tebolhos representam, deve se reconhecer que, salvo poucas exceces, sua contribuicéo 4 Hisléria se reduz ao fornecimento de informacdo empirica. Pelo contrario, a insisténcia recorrente em caracterizar 0 ‘fipica’ congela os processos © exclui a possibilidade ce transformagéo histérica. Além disso, centrados em seus préprios interesses, tais estudos perdem de vista 0 contexto mais amplo da sociedade. Enire a Einogralia 0 Folclore, um tema tem despertado muita aiengdo, nestes tltimos tempos. E a cazinha associada aos ritvais afro-brasileiros, O trabalho mais completo e de rigor académico é 0 de GiobellineDumana {1988}, que procura examinar a ‘cozinha de santo’ como alimentagGo aliernativa, enfocando questées como identidade, classificagées, papéis terapéuticos, relagdes com o sobrenatural. Da mesma forma, Raul Lody {1998} investe no cardter de celebragdo e nos padrées morais {cf. relacao adequada entre a comida, o fiel ¢ o temperamento do santo, as inierdi¢des, etc.). Outros trabalhos, como Farell {1997} ¢ Varela {1990}, este dime incluindo a umbanda, 1m menos forca interpretativa, E preciso mencionar o desenvolvimento de monogratias académicas, sobre temas variados, de orientagdo antropolégica mas, sobretudo, sociolégica {as vezes, até mesmo, psicolégical, e que, tomando como referencia & climeniagdo, buscam estudar quesiées de género (Woorlman 1996), habitos e ideologias em camadas de ‘Toro, tender Woorlman 1978, Velho 1977), mudanca cultural (Bonin & Rolim 1991); tepresentacées alimentares, incluindo lobus {Maués & Maués 1978, Garcia 1995}. Quesiées como a adequagdo, ou ndo, de nossos habitos alimentares [nutricGo, subnutigdo, satide, fome}, também receberam por vezes um tratamento que as fora Uteis para a Histéria — apesar de muitas vezes como fontes de informagdo, mais do que como andlises propriamente ditas. Citem-se os Problemas ‘da alimentacéo no Brasil, de Agostinho Monteiro (1944), ou Populacdo, alimentagdo, saide e seguranca nacional, de Jorge Saldanha Bandeira de Melo (1966) e, sobretudo, a obra do médico Antonio da Silva Mello (1943, 1946), que teve ampla divulgacéo, principalmente por causa de sua critica ‘& industrializagao excessive dos alimentos e & perspectiva vitalisia da Giéncia médica, com conselhos de bom senso para a alimentagdo das criancas, internatos, hospitais etc., visando 4 ‘felicidade natural’, Silva Mello constitui excelente fonte — juntamente com varios outros médicos de sua geraga0 — para conhecimento de preconceitos e crengas (cientificas ou populares} vigentes & sua @poca, assim como das condigdes de emergéncia da industria alimentar no Brasil e da difusdo de novos produles (soja, leite em pd desnalado etc. | JG de outta natureza é a produgo de Josué de Casito, calada, com rigor, na perspectiva geogrdtica e sécioeconémica. A Geogratia da fome (1946) 2 Geopolitica da fome {1951), junlamente com culras obxas sobre o tema (1933, 1935, 1937, 1938, 1949, 1966, 1984), alcancaram metecida repercussdo intemacional. Mais limitada € sua tentativa, com Fisiologia dos tabus: com um apéndice coniendo varios tabus alimentares brasileiros {1938}, de desenvolver uma inlerpretacéo de tipo reflexeologista-pavloviana, muito questiondvel Finalmente, cumpre tratar da contribvigGo. valiosa, ao mesmo tempo de cardter antropoldgico, ‘socioldgico e histérico, representada por Gilberto Freyre. Quando publicou Acicar, em 1939 (1997, 3a.ed.] — incluindo receitas de bolo e doce lalgumas coletadas em Goal,’ registo de formas e papel recortado para forrar prateleiras, assim como testemunhos de estrangeiros sobre nossos doces e assim por diante — Gilberto Freyre temia ser julgado frivolo. Seu temor era infundado, apesar do cardter evocative e impressionistico de seu texto. Mas nao se pode dizer que seu pioneirismo tenha gerado vasia descendéncia Ele proprio (4 abordara o tema, com um tom mais contido em Nordeste (1937), cujo sobtiulo & Aspectos da influéncia da cana sobre a vida e a paisagem do Nordeste do Brasif Para o autor sem o aclear nao se compreenderia ae do Nordeste. Ao descrever a ‘sacarocracia’ brasileita, que produziv uma alimentagSo eduleorada, em variada gama de doces feice da fuste do a¢sear com as mais diversas frutas, G.Freyre buscou entender dimensoes da identidade ‘nacional’, assim como mecanismos de miscigenacéo dos paladares portugues, hispanico, drabe, judaico, indigena e alricano. Estudos histéricos ase disse, acima, que a historiogetia sobre 0 Brasil no deixou de levar fem conta o alimentagéo, mas quase sempre como opéndice: Sérgio Buargue de 55 56 Holanda, em Caminhos e fronteiras {1994}, acrescentou um capitulo sobre ‘a civilizagao do milho'; Evaldo Cabral de Mello, em Olinda restaurada — que, aliés, tem como subtitulo Guerra e agiicar — (1975) ndo deixou de lado a ‘municéo de boca’; em Tempo de flamengos, José Gonsalves de Mello (1987} discorre sobre a conttibvigdo holandesa 4 alimentagso em Pernambuco. E assim por diante. ‘Os apéndices témse multiplicado e alargade quando esta em causa a histéria do cotidiano ou da vida privada. £ 0 que ocorte com os capitulos ‘Habitos limentares’ e ‘Tradi¢des alimentares e culindrias' de Maria Beatriz Nizza da Silva, respectivamente em Cultura e sociedade no Rio de Janeiro, 1808-1821 (1978 } Vida privada e quotidiano no Rio de Janeiro na época de D.Maria e D Jodo VI{1993), ou em trés capitulos de Cotidiano e solidariedade. Vida diério da gente de cor nas Minas Gerais, séc.XVill, de Julita Scarano (1994; ver também, seu artigo sobre 0 mesmo assunto, em outta época, 1990-1} E de estranhar que a importante série Hisiéria do vida privada no Brasil, em quatro volumes {organizagdo geral de Femando Novais), néo tenha considerado a problemdtica da alimentacéo digna de um tralamento especifico No entanto, leila Mezan Algranti {1997}, ao elaborar seu capitulo sobre familias e vida doméstica no Bros colénia, no lo.volume, ndo deixou de reservar algumas paginas ao tema, tocando em questées como dieta e abastecimento, utensilios, postures corporais, padrées de sociabilidade e intimidade, remédios, mezinhos e alimentacdo de doentes, etc, Muitos estudos tomam a alimentagao como pana de fundo para outros problemas, como questées de género (Figueiredo & Magaldi 1985), 0 cotidiano operario {Bertucci 1995), padrées ¢ espagos de sociabilidade (Chaloub 1986}, Ha também um certo némero de historias da alimentacdo, de cardter regional, numa linha iniciada nos anos SO por Donald Pierson (repr. 1994], mais tarde seguido por Lisanti Filho {1962}, ambos tratando de Sao Paulo @ por Eduardo Frieiro [1966] com seu ensaio sobre a comida do mineiro. Ainda sobre Minas, Ménica Abdala (1997), mais que retomar os quadros evolutives que estavam disponiveis, preccupouse com a questéio da identidade, a partir das peculidaridades histéricas da formacdo da capitania (que nasceu urbana e so mais tarde se ruralizou; que dependeu de alternativas no abastecimento e do espitito de sociabilidade e hospitalidade, para fazer face ao isolamento geogréfico; que foi objeto, por variadas razdes, do cultivo de um mito, o da ‘mineiridade’}. Maria Stella libanio Christo, uma das menioras do projelo de valorizagé0 da. cozinha mineira, recolhey' © comentou receitas que cobrem trezentos anos de informagéo culindria (1986). Ortencio Barini {1981}, além de receitas, fornece dados histéricos sobre @ cozinha goiana. Outtas muitas obras semelhantes disponiveis ndo se enquadram no perfil deste mapeomento. A inica Grea em que os problemas da alimentagéo ganharam um status consolidado e mais definido € no interior da Histéria Econdmica. Assim, sGo ja de tradicdo antiga os estudos de abostecimento, como aquele pioneiro de Mafalda Zemella (1951), sobre a capitania das Minas Gerais no séc. XVIll, ou 1s historias da agriculture, como a de Luis Amaral (1940), que, nas suas préprias palavras, procurava combinar aspectos politicos, sociais e econdmicos. Mais fecentemente, estes estudes ganharam alento e renovagdo com o grupo de Histéria da Agricultura, nucleado por Maria Yeda Linhares, centrado no estudo da sociedade rural e estuturas agrérias no Brasil. Mencionem-se 0s seguintes tiulos: Historia do abastecimento, uma problemdtica em questéo, 1530-1917 \linhares, 1979}, Histéria da agricultura brasileira: combates e controvérsias (Linhares & Silva 1981}, Pecudria, alimentos e sistemas agrarios no Brasil, séculos XVII e XVII Linhares 1996}, etc. Outros muitos trabalhos séo prdximos desta linha, como o de Carlos Roberto Antunes dos Santos {1995} sobre o abastecimento no Parana, ou, mais & parle, sobre a economia do agécar, explorando os imbricagdes de terra, trabalho e poder, o de Vera Ferlini (1988). Mencionemse, por fim, 0s numerosos estudos de alimentos especificos, principalmente 0 agticar e 0 café [cujas referéncias constam em vatios momentos deste texto). Talvez valesse a pena assinalar especificamente as publicagdes produzides pelo Museu do Acicar do Recife, criado em 1960 € posteriotmente integrado & Fundacdo Joaquim Nabuco de Pesquisas Sociois: a Revista do Acicar @ vérias monogrofics ou coleténeas, reunindo material dispor, quer de altissimo interesse, goer de cunho puramente circunstancial Fica evidente, deste apanhado sumdrio, que a Histéria da Alimentagdo ainda 6, entre nds, um teritério a descobrir — principalmente na sua dimensdo cultural. Nao se trata de propor mais uma 'Nova Historia’, mas apenas de néo ignorar uma problematica ubiqua e de sume relevancia BIBLIOGRAFIA ABDALA, MOnica Chaves, Reccita de mineiridacle. A cozinha € a construcio da imagem do ‘mineiro. Uberlandia, Universidade Federal de Uberlandia, 1997. ABEL, Wilhelm, Massenarmut und Hungerkrisen im vorindustriellen Europa. Versuch einer Synopsis. Gottingen, 1974, 2.Aufl ABEL, Wilhelm, Agrarkrisen und Agrarkonjunktur Hamburg, Paul Parey, 1978, 3.Aufl ADAMS, C.J. 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