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Introducao Entre a Liberdade e a Dependéncia: reflexes sobre o fenémeno social do envelhecimento Maria Cecilia de Souza Minayo & Carlos E. A. Coimbra Jr. Reinamguragio. ‘Nocsaidade — velho on mogo —pouso importa. Inporta é nos rentrmos vivor ¢ alvoropadee mais wna ver, « revestidos de Beleza alexa Belesa que vem dos geitos espontineos e do -profiodo intinto de subsisir enguamto at cotsat ‘am redor te derretem e zomem como manvens Prossegrimos. Reinaugisamos. Abrimos olhos niloros a om sl diferente que no: acorda para ‘0: descobrimentos Butaé amagia do tempo. Butaé acolheita particular que se exprime no tlido abrago « no bevo conaongante, no acreditar na vida e na doagio de vvé-la erpétua procira e perpétia evapo. 2 jd nfo somos apenas finitos 36s Cavlor Drsumond de Anszade Somos sempre o jovem ou 0 velho em relagio a alguim Piene Bourdien Existe uma prace na antropologia segundo a quel opesquisadar deve explicitar asrazdes, as condigbes ¢ 0 processo de suas investigagdes Esse relato das condigies de sew trabalho permite ao leitor rlativizer seus achados ¢ localizar sua perspective — ‘por conseguinte, também se posicioner. Por isso, consideremos de bom fom presenter 0s motives que nos levaram # organizer um livro sobre o ‘envelhecimento’ que cruzasse os olhares de antropologia ¢ das cigncias da smide Peles egras de classificagio dos ciclos da vida que vigoram em nosse socieds- de, oBrasil precocemente enlrounetota do envelhecimento populacionel, Nessa estra- dda que acolhe os caminhantes grisalhos ¢ sulcados pela vide, o trinsito vai aos poucos ficando congestionado, a ponto deja serem mais de 31 mil os brasileirosremancscentes do século XIX. E cada vez maior a populagio que, parafraseando o poeta, vai " ANTROPOLOGIA SAUDEERWELEECDENTO reineugurendo, eno a ano, seu frag projeto de Felicidade epos os 60, “entre o gasto dezembro ¢ ofiordo jancto, ene e desmistificagéoe a expectaiva, tomnando e ecied- tas, @ ser bons meninos e, como bons meninos, reclemando graga dos presentes colasidos” (Andrade, 1966:56) (© Brasil dobrou onivel de esperenga de vide somescer em selativem ente pouces écedas, mume velocidade muito meior que os paises ewopeus, os quaislevarem cerca de 140 anos pare envelhecer Pare sete idéie do queisso sgufice, a esperange de vida aonascer dos brasileicos era de 33,7 anos em 1900; 43, em 1950;65, em 1990; chega quase « 70 anos.ne entrada do novo século, ¢ prevé-se que ultrapesse os 75 anos em 2025. De 1950 « 2025 teré crescido 15 vezes, quando 0 sestente da populegéo tert conseguido um incremento de 5 vezes. Apesar de todo esse increment, emeioria das pessoas nesse faixe etsiaesté entre 0560 ¢ 05 69 anos, consituindo ainda menos de 10% de populegéo total (Veres, 1995), quando ne Ewope, por exemplo, so es fixes cima de 70 anos as que mais crescem. No entanto, um pais jé ¢ considered ‘velho’ quando 7% de sue populegéo séo consituidos por idosos. ‘Apprevisio dos demogrefos é de que no ano 2020 existem cerca de 1,2 billéo de idosos:no mundo, dentre 0s queis 34 milhies de brasileiros acima de 60 anos, que, nnesse caso, corresponderdo & sexta populagéo mais velhe do planeta ficendo atras apenes de alguns paises europeus, do Jepéo e de América do Norte. Por tudo isso, ¢ muito importante ouvir « “logice interna desse grupo socioetésio” e cantar com ele para erealizegio de seus anseios e pare a construgdo de um packéo de vide que lhes feja adequede, (© que nos chamou s atengio, a0 progremermos o trabalho equi epresentado, é que, até omomento, quase sempre outros stores tim falado pelosidosos. Se efocalizé- los existem varios ipos de lentes, as Fotografias das cmexas curioses costumem néoit além de luzes, sombras e cores que as eperéncies revelam. E como os que observem so peste de perspective que edotam, o que fice dasimagens séo a contundéncie dos sins de desgaste dos corpos, os vincos nes faces, e voz mais cedencieda, o ender mais vvagaroso outrépego, queda inex oravel dosmusculose afreglidede dosmovimentos Esse setteto, que ¢ feio em selagéo eos pacibes de beleza que edotam o ove como simbolo, costume eceber um veredicto de quem o produz ¢ de quem o contemple. E 0 vveredkcto que assinale velhice como probleme e como doenga, Nossointeresefoi enter ir além, ezer novasperguntes,clhono allo dos que eto em plena estrada ‘na chuva para se mothar’ e que por issoresstem eo rotulo que a soce- dade quer thes impor Mais que iss, entender também os veus que cobcem a destinagéo setecipads ao luger social estereotipado que o aparente cuidado social hes reservout 0 ‘recollimentointericr’ (eufemismoparac efestamento do treba), «inside (colegio dos eposentados e aposentadas), a ‘prevengéo das possiveis domes’ (medicelizegéo da dade) ou as‘festinhas da texceraidade’(infentlzeséo dessa etapa de vide). Foi dessa voniade de encontrar um espego altzmetivo de seflexio, em que vésias possibilidedes pudessem emergyr—producindo une compreensio meisredl des vivéncias, dos desejos ¢ da aveliagéo de sua situagéo que esse vasta cemada da popul ‘brasileira fer de s propsia— que sugiueideia de crgenizer este liv. Néo optamospela sealizagio de ume pesquise original de cunho etnografico, mas sim por reunir em uma 2 smonncho oficine de trabalho um pequeno grupo de pesquisedores estudiosos do essunto. Essa oficine foi realizademo Rio de Janeiro, em agosto de 2000, e contou com a partic: pagio de todos os que integram este coletinee No coloquo, estabelecemos os rumos de presente publiceréo, que, em seu con- junto, amadureceu com base em crticas, comenteriose sugestées Formuledas pelos per ficipentes. A partir dai, muites perguntes puderem ser feitas, mum processo de sprofundemento sucesavo que comegou de formeinttive:seré que estamos erredosna sesisténcia eos rotulos dominantes? Seré que, por influéneia da époce, esteremos senda ‘times da ideologie-mito da etema juventude, esse virus que corr a hum anizegéo do envelhecimento ¢ de morte? Ou ser6, so contrério, que os proprios limites do ciclo e do cwuso de vide estio se desfecendo, por eausa do feném eno irefutevel do eumento da esperange de vida epastir da segunda metade do século XX, aqui em todo o munda? A-medide da cuiosidade deu Iuger 4 idéia de trensformar teis perguntas em questées tecrices sobre as descobertes que o ‘envelhecimento & brasileira’ estéo sus- citendo. Com certeze, as constatagSes poderdo servi de balize para essa grande feixa da populagéo que hoje merchangomuana estrade sem fim e sem sentido, mas pare elerga porteire aberta de uma fezenda de colheites. Nesse espago de movimento e construgéo, continuam # existr nfo apenas os frutos, mas a semente, o plantar, ealegia dos brotos e todos os prazeres, dorese softimentos do ceifer, como em qualquer etapa da vide ‘Mes com enormes diferengas: é smultaneemente otempo do orgasmo de vide ¢ de liberdade ¢ o tempo de medida do possivel ¢ da dependéncia, Tudo concomitente e tudo dferenciado pele tejeteriaindividual.E isso que AnaBesst, Alda Motte ¢ Rita Heck & Esther Jean Langdon mostram em seus reapectivos cepitulos. Também ¢ isso aque j@haviem evidenciado Lins de Berros (2000), Debert 2000), Peixoto 2000) eMotta (2000), dentre outros, em estudos sobre essa questéo social no Brasil Esses autores vém nos ensiner que, como mutes ouas questées ne sociedade ocidental, oassunto da velhice foi ‘estelizado’e ‘medicalizado’, problems politico, ora em ‘probleme de sade’, sea para ser fegulado por normes j8 para ser pensado de forme preventive, seja para ser assunido nos seus aspectos de disfungées e disixbios que, s todos pedecem, so mtito mais acentuados com aidede ‘No que conceme @ saide, em torno da geretie se eatebeleceuum grande mercedo consunidor, rfinendo osinstrumentos ¢ as medidas que rotulem 0 cotideeno da existen- cia dosidosos A seu ledo desenvolveram.se noms preventives fundades no uso nem sempre citico de ‘teoria do risco’,téo problemtica quando tenta, por meio de médias, jjusificerpropostes preventivistas Dessa forme, desconhece-se a complexidade dos sy jjitos, csiendo-se ume estétice da vida referenciada em proibigGes e regras gerais. A pergunte necessécie é @ seguinte: sera que nfo existe possbilidede de sntrockuis, na seceita do que ¢ ssudivel, osngreckente‘prezer de viver' comomote central desse ultima ¢ decisive etapa da existéncie? Dizemosisso porque tlvez seja esta amsior e mais con- tundante descobesta que este hvro poderé trezer como contuibuicéo de entropologia E complexo otema do envelhecimento, pais complexos so todos os processos viteis experimentados desde onascimento, ainfancia ee adalescéncie até avide adulte Recusemo-nos nfo a xeconhecer a complexidade, mas sim colocer como ferinhe do memo seco envelhecim nto, doenga, pivegéo, dependéncia, tistez e frustracka 8 ANTROPOLOGIA SAUDEERWELEECDENTO ‘Aqui se trabalha pera executar um movimento que positive o envelhecimento comoum tempo produtive especifico da vide, emocional, intelectual e social, superan- do assim os estigmas da discriminegio, Pois é essa discriminagéo internalizada que frequentemente leva os idosos a wma stitude de negagio, buscando parecerem mais jovens pare serem actitos e acolhidos, obscwecendo suas caracteristicas, seus atsibu- tos ¢ sua identidade (Lins de Barros, 2000). A positivagio da identidade do idoso significa, por um lado, reconhecer o que hé de importante e especifico nesse etape da vida para desfruté-lo; por outro, compreender, da ponto de vista desse grupo social, os softimentos, as doengas e as limitades com toda a carga pessoal e familiar que teis situagées acerretem, embora unca tratando teis econtecimentos dolorosos ¢ tristes como sinénimos de vethice envelhecimento nfo ¢ um processo homogéneo. Cada pessoa vivencia essa fase da vida de uma forma, considerando sua histéria particular e todos os aspectos estrutursis (classe, género ¢ etnia) a eles relacionados, como satide, educagio e cond- ges econémices. Os cepitulos que integram este livro demonstrerfo que os fatores que contribuem mais e melhor pare diferenciar « vivncia do envelhecimento so as redes de apoio social e comunicagéo, com énfese ne solidariedacle familias. (O que tora a velhice sinénimo de softimento é mais o abandano que a doenga, & solidéo que a dependéncia. Assim, nesta introdugio, quatro aspectos centrais serio enfetizados, pois trachzem a sintese dopensamento dos autores: o envelhecimento como Iibeido bioldgico-social, o envelhecim ento como probleme, o envelhecimento como ques- publica; o velho como ator social O ENVELHECIMENTO COMO HiBRIDO BioLOcIco-sociaL “O que é envelhecimento?”, pergunte Veras(1995:25) em seulkwro Pais Jovem com Cabelas Brances, para em seguide responder: “Velhice ém termoimpreciso. (..) anal flutua mais do que os imites da velhice em termos de complexidade fisiologice, paicol6gice ¢ social”. O mesmo eutor diz, numa tentetiva de concetuegéo, que "do ponto de viste culture, a velhice deve ser pescebide diferentemente em wm pais com ‘uma expectativa de 37 anos de vide, como SerraLeoe, ¢ outro de 78 anos de vada, como €0 c4s0 do Japio” (1995.26) ‘Assim como Veras os estudiosos que tém seustestos aqui publicados apresen- tem, como uma das primeiras questées a serem consideredas, a necessidade de desnaturalizer ofendmeno de velhice e consideré-a como uma cetegoria social ecultu- selmente construida Se, por um ledo,o ciclo bicligico préprio do sex humano assemelhe-se eo dos demais sexes vivos—todosnascem, crescem emorrem -, por ouvo, as vies etapas da vida sio social ¢ cultwelmente construides. Isto 6, as diversas sociedades constroem diferentes praticas e representagdes sobre a velhice, a posigéo social dos velhos na comunidade e nas familias ¢ o ixetamento que thes deve ser dispensedo pelos mais jovens E isso que Parry Scott analise em seu capitulo, mums instigante sbordagem 14 smonncho comparative sobre oprocesso de envelhecimentonoJapio eno Brasil. O autor seafisma a idéia de que, para se entender o lugar social dos idosos, ¢ preciso compreender a Forma como a sociedade organize a estrutura, as fungdes ¢ os papéis de cada grupo etétio especifico. Os estudos antropolégicos demonstram que # inffncia, a adolescéncie, a vide adulta ¢ a velhice nfo constituem propriedades eubstencisis que os individuos adeqi- em com o avango daidade cronologica, Pelo contrério: oprocesso biclogico, que é real pode ser reconhecide por sinais extemnos do corpo, ¢ epropriads e elaborado simbo- licemente por meio desitusis que definem, nas fronteiras etérias, um sentido politico ¢ organizadar do sistema social. Comolembram Axiés(1981) ¢ Elias (1990), essasfrontei- rag e suas apropriagées simbélices néo so iguais em todas as sociedades nem na mesma sociedade, em momentos histéricos diferenciados —nem mim mesmo tempo, para todas as classes, todos os segmentos e géneros Nointesior das diferenciagées, no entanto, os estudos entropologicos revelam aspectos estruturais fundamentais, de tal forma que é possivel transcender particulasismos cultureis ¢ encontrer alguns tragos comuns do fendm eno que poderiam ser considerados wniverssis. entropélogo Leo Simmons (1945), por exemplo, anslisou a situagio dos ve- thos em 71 sociedades indigenas, tomando por bese os seguintes perimetror: formas de subsisténcie, dseitos de propriedade, atividades econémices, vida doméstice, of genizagio politica; conhecimento das tadigées, valores e crengas ¢ integragéo na Familia eno sistema de parentesco, Embora seu estudo possa fazer jus a critices de que seja demasiadamente generelista, ele eponta questées interessantes para o que seriam “os desejos universais dos velhos nessas sociedades”. Considerenda o conyunto dos grupos estudados, segundo Simmons, todos os velhos desejam viver o maximo possi- vel, tesminer a vide de forma digns e sem softimento; encontrar ajuda e protegéo pare a progressive dimimicio des cepacidades, continuar a pasticipar das decisées que en volvem a comunidede, prolonger, a0 méximo, conquistas epresrogetives sociais camo proptiedade, autoridade e respeito, ‘Armanipulagio de categories tities, no entanto, é outro fenémeno comumente observado, geralmente exigindo um investim ento politico de definigio de poderes para cada ciclo da vide, no estabelecimento de direitos, deveres e privilégios (Bourdieu, 1983). Sobre esse tema, Debert diz que “categories e grupos deidade implicam aimpo- sigio de uma visio de mundo sociel que contribu pera manter outransform ar as pos gesde cada um em espacos sociais especificos” (Debert, 2000:53), No mesmo sentido, apeser de os desejos “universais’ dos idosos citados por ‘Simmons (1945) estarem todos voltados para sua incluso afetiva nos contextos socieis, Riffiotis (2000), também estudando o lugar do velho entre diferentes etnies afticenes, assinala que em todas eles existe a idéia de que os jovens querem que os ancifos smrram. Mais que isso, existem situais por meio dos quais e sociedade edulta os separa radicalmente da convivencia nas aldeias, quase sempre abandonando-os em cavernas ou outtos lugares distantes do convivie de seu povo, Essas mesmas sociedades que os segregam, porém, iguelmente colocem prove os javens adultos que os substituiréono governo da comunidede, para que fiquem evidentes as cificuldades que sentiro sem 0 16 ANTROPOLOGIA SAUDEERWELEECDENTO apoio da expesiéncia dos velhos, Os mitos demonstram que, em face dos dilemas de dificil solugéo, os novos dirigentes sucumbirio se néo trouxerem, em seu socorr0, lgum daqueles encifos abandonados em cavemnas para morser Assim, 0 saber ances tual dessas sociedades evidencia a importincia da conciliaggo e do reconhecimento intergerecional na obtengio do equilibrio necessério @ organizagio social O ENVELHECIMENTO COMO PROBLEMA Noimaginésio social a velhice sempre foi pensada comouuma carge econémica —seja para a familia, seja para a sociedade —e como uma ameaga as mudangas. Essa nogio tem levado as sociedades a subtrairem dos velhos seu papel de pensar seu proprio destino. No entanto, munca feltaram excegbes a tais prétices, o que pode ser exemplificedo com o reconhecimento pelas sociedadesindigenss da figure do pajé ou xamé ancifo ou, nas sociedades ocidentais, dos poderosos, ricos e femosos quando gozem de satidefisica, mentale econdmica Asexcegdes, porém, nfopodem esconder as grandes dificuldades socioeconémicas que os idosos, particulmmente os pobres, sofiem nos mais diferentes contextos de vida. Por isso mesmo, a velhice é por eles auto-essumida como ‘problema’, na mesmamedica em que sofrem por causa dele e 0 imaginsrio social assim a define. ‘Afarmamais comumn de discriminagio cultural tem sido estigne de ‘descartével’, “passada’ ou ‘peso social’. Comomuito bem aponta Guim ares, “nos dicionérios emo- cionais da populagio, velhice ¢ sinénimo de decadéncia, de decrepitude e de perda de cignidade” Guimeries 1997-7) O trabalho de Uchde ¢ coleboradores que integra este volume evidencia, empisicamente, aforma negative de concepgio do envelhecimento por peste dosmore- dores de ume cidade do interior mineiro, em contraposicdo as vises muito mais gene. rosas que osidosostém de s proprios. Os pesquisadores demonstram e distincia entre a observagio externa eo conceitoformulado por eles, mesmo em stuagdo de enfermide- dee de dependéncie fisica. A visio depreciative dosmsis velhos tem sido, através dos tempos modernos, aimentada profundamente pelaideologie ‘produtivista’ que susten- toua sociedede capitelista industrial, para a qual, se ume pessoa néo é capez de traba- thar e de ter renda propria, de pouco ounade serve para sua comunidade ou seu pais. No Brasil, o fenémeno do envelhecimento até pouco tempo atrés vinhe sendo tratado como questio de vide privada, por representar énuspare afemilia, como assu- tode caridade piblice, no caso dos pobres eindigentes,e, de forme bastante reducionista, como questio médica. E claro que essa visio continus confirmada pelas praticas socisis de cuidado com osidasos. Mas oxépido crescimento desse faixa de populagéo passou a preocupar também muitas outres instituigSes socieis, No caso da familia, por exemplo, nos iltimos cinguenta anos, houve profundas trensformagies no seu desenho demogréfico, nos seus ambientes, na sua composig eno seutamanho, pari passti cam aaceleradawbanizagéo. Na medida em que dimiquem os espacos residenciais e o mimero dos membros que entram no mercado de trabalho, 16 smonncho comparstivamente aumentem os que se etiram. Criam-se noves demendas de cuidados, necessidades de adaptagio da arquitetwa das casas, isolamento dos parentes em asi- Jos, oumaior exigéncia de dedicacio dosmeisnovos para proporcionar methor qualide- de de vide eos que se tornam dependentes. Sem falar no fato de que néo slo pouces as ificuldades de convivéncia entre as véties geragdes que cada vez se distenciem mais culturalmente, nums sociedade em que os padres de comportamento também tém mudado aceleradamente, como mostra o trabalho de Comelia Eckert ‘Tembém para a medicine e pare a saude publics, 0 envelhecimento tem se apresentado como problema. As mudangas ne pirimide populacional, que vai ales- gendo seu épice numamédia de 2,5% de crescimento anual, geram preocupagiespara © sistema de smide, porque mesmo sem ter solucionado os problemas sanitétios telativos a infincia, & adolescéncie e aos trabalhadores, ambos terdo de se equipar para dar respostas eficientes relativas & prevengio de enfermidades e @ stengio aos enfermos idosos, Por isso, em geral, os formuladores de politicas no Brasil referem-se a0 ‘custo social de populagio idosa’, calculado como tyés vezes mais alto que o da populagéo em geral (Veras, 1995). Demonstram também que esse custo mais elevado onera, sobretudo, o sistema de satide, pois o crescimento da esperanga de vida, historice- mente, vem acompenhado, no mundo inteiro, de um aumento das doengas cxénicas no infecciosas, como diabetes melito, distirbios cardiovasculares, aticulares, res. piratérios e de movimento; doenges incapacitentes, como deméncia senil, doenga de Alzheimer, doenga de Parkinson, além do incremento das ocorréncias de depresses e de falhas cognitives, Os capitulos escritos por Célia Caldas ¢ Paulo Céser Alves exemplificam a dt mensio dos saftimentos de grupos especificos de idosos e de seus ‘cuidadores', que- se sempre familiares, que os acompanham até ofinel da vide. Esses softimentos cost. ‘mam ser muito mais deam éticos para « populagio pobre, que acaba lotando os asilos pliblicos e conveniados, quase todos em situagéo de flagrante abandono ou padecen- do, cronicamente, da alta de equipamentos e de pessoal especielizado, No Rio de Janeiro (capital com a maior proporgio de idosos no pais), Veres (1995) observou que 1796 da sus amostra consideravam sua satide ruim oumuitoruim, ¢ of casos de distixbio mental exam mais frequentes nesse grupo. Embora $2,5% das pessoas entrevistedas se dissessem seudéveis ao responderem a questBes auto-refesi- das, os problemas de saide foram mencionados como prejudicais & qualidade de sua vida cotidians. Cerce de 64,496 delas apresentavam morbidades multiplas. Ora, esses dados podem ser lidos sob duas faces: de um lado, para este grupo etézio, os transtor- nos da velhice nio so considerados ‘doengas’, de outro, servem para cimensionsr 0 temanho dos problemas a serem enfrentedos pelo sistema de satide ne esfera da pre- vengio e do tretemento. estudo de Veras chama a atengio, igualmente, para o peso das condigies socioeconémicas adversas, da pouca instruc ¢ de escassez de atendimento no recru- descimento dos problemasfisicos e mentsisna velhice.O fato de 60% da populagfoidosa hhoje serem compostos por mulheres indica também e necessidade de wm atendimento iferenciado por género No conjumto, Veras(1995) assinslanesse grupo etério do Rio de 7 ANTROPOLOGIA SAUDEERWELEECDENTO Jeneizo elevada preveléncia de dishixbios cerdiovasculares ¢ articulates, deficiéncias visusis e auditivas e dishixbios mentais, como depressio ¢ problemas cognitivos, No caso brasileiro, aidéia de que os velhos consituem um probleme social vera sendo construida sobremodo pelo Estado, Na sociedade ocidental contemporénes, 0 Estado € 0 grande regulador do curso da vide, do nescimento & moste, passando pelas fases de escolerizagio, de atividade no mercado de trebelho e de eposentadoria. Por causa disso, aidade cronologica é um principio cultural de extreme relevincia no mo- demo apareto jusidico-politice, que concentra no individuo a stribuigio de direitos € deveres, ¢ no mercado de trabalho, « bese da economia. Essa forma de organizegio ifere, por exemple, des comuidades indigenss ¢ camponesas fundadas economics. mente ne unidede familias. ‘A idéie do ‘envelhecimento como problema’ se expressa ne constante divulge. 0 dos déficits nos célculos da previdéncia social, uma vez. que 0 dteito & aposentado- ia (am direito dosidosos) se universalizou O discurso sobre o “peso social que hoje os vvelhos constituem’ tem nessa insténcie publica um luger entronizedo. E reforsado pela idéia de que a situagéo do aumento dessa populagio ¢ insustentavel com amanutenséo do dizeito universal da aposentadorie, Portanto, o aparato do Estadio tende a ver de Forma catestrofica as propries inslituigSes politico-socieis que criou pare atender os idosos. Veras (1995:23) aponte assim a dimenséo do problema: Uma ver que mais da metade de popula tdosa do Braal teré entre 60¢ 69 anos, asdecisBesrelativas cidade de aposentadori, eesportlabidade edetto & penso, asam como outras questées relacionadas dforga de trabalho, afetardo ‘Agnyficativamente a econonta brasilera no préumo ciculo, Talver o dlema dosformuladoresde politica seja exetsmenteaimpregnagio, em sewhorizonte mental, daidéia de envelhecimento con probleme, sobretudo no senti- do econdmico de apropriagéo de bens « servigos por wn mimero cada vex maior de petsoasmaisvelhas Ore, ssaideia de flncia de previdéncia sociel, da qual undfrusm 0s idosos, como a grende vl da politica social no pais deve ser rletivizeds, Pelo menos é 0 que mostra estudo recente do Instituto de Pessisn Econdmica Aplicada Ape) sobre auniversslizasi de direitos socisis no Brasil. Ospesspisadores constata fem que mais da metede das eposentadaries« pensbes de Previdencia Social, na zona rural desregides Sul e Nordeste, ¢dtigida « mulheres vaives, solteres ou separades Vivendo sem compenhiros, elas sto responstveis pelo mstento da casa dos depen dentes, contendo apenas, pre a sobrevavencia sua © do grupo, com esse beneficio No Nordeste, 58,69 das muiheres aposentadas e pensinistas so chefes de familia. NoSul, 9,4% delaso so. Embora aquanterecebida doINSS sejamsinimn, pelo fato de esses idoses rari terem acimulado, a0 longo de mies vides ume serie de desvantagens como a duple jomada e o trebatho sem remuneragéo, a extensio da sposentadoria rural a eases mulheres, depois da Consituigéo de 1988, mudou sua teajteria, co reconhecer seudseito de cidedania e sue autonome finenceire O estado do Ipea consi que a aposentadoria rural hoje én fatoressencial de redugéo da pobrezenno campo Isvotenbém mostra o trabalho de RitaHeck, queintegra esta coletinea, no ceso do interior do Rio Grande do Sul. Mes esse autora evidensia 18 smonncho que, além do significado econdmico de subsisténcia, a liberagfo financeira ainda que muito modesta) vem acompanhade de um sentido cultural de independéncia da tutele familie, sobretudo para asmulheres trezendo-thesuma qualidade e uma alegria de vida comosmunce tiveram em outras etapas da existéncie, Os exemplos acimareferem-se, de forma muito particular, ao envelhecimento em situagdes de pobreza e privagdo, mas, ‘mesmo assim, agui se expressa um significado positivo dessa etapa de vide, apontando para uma visio diferenciade em relagio aos esteredtipos socisis. O ENVELHECIMENTO COMO QUESTAO PUBLICA Na sociedade ocidental, no somente o ciclo da vida ¢ socialmente padronizado como também seu curso passe, cada vez mais, «ser regulado pelo Estado, a despeito das potencialidades e dos problemas de cada um. A inféncia, a adolescéncia e ajuven- tude sio tempo de escolerizagio, a dade aduita é o tempo associado & proctiagio © & participagio no mercado de trabalho, a velhice, o tempo da aposentadorie. Essa institucionslizesio crescente das fases da vida envolve todas as dimensbes do mundo dom éstico, do trabalho e, também, do consumo. Para Wkight Mills (1974), um das meisimportantes problemas pera sociologia € a compreensio do movimento de trensformagéo de um fato particular em questio piiblica No caso do envelhecimento, isso supe enfatizar o sentido das mudanas que fesse grupo social, crescente em mimero, em vigor ¢ em organizacéo, provoce ne reorge- nizaglo do poder, dotrabelho, de economia e da cultura, aribuindo novo significado eo seu espago tradicionalmente percebido como o da decedéncia fisica e da inetividade Como questio piiblice, o fenémeno do envelhecimento deve ser focalizado postive: mente pare o desenvolvimento umeno. Portento, pensar a velhice como questéo pit blica ébem diferente de traté-le como problems social ‘Seguindo opensamento de Mills (1974), éimportante descobris quais seriam os formuladores de um novo sentido do envelhecimento e que interesses tém nessa destinagfo, uma vez que quem o formula publicamente ocupa, geralmente, posi privilegiads pare fezé-lo e para xepresentar os interesses dos outros. Ha que descastar os agentes tradicionsis ou ¢ preciso compreender sua mudanga de enfoque? No caso dosidosos, os porte. vozes maislegitimados tém sido os especialistas da geriatria, seja pele apropriagao do avango da ciéncia, seja pelo préprio reconhecimento social da sua prética médica, Mas também no interior desse grupo, as certezes so pouces, como sesselta Guim erdes(1997-7): {todos sabem que a gerontologia e seus dversos ramos tim sido até entéo wma ciéncia tineda, adolescente; um barco carente de bons imoneirose do sopro dos ‘melhores ventos Ainda assim, o conhecimento cientifico temposs bktado avan- 08 conaiderdvets que tornam factivel xm envelhecimento sandével a ponto de ppodermos antever 0 préximo siculo como o séeulo dos velhos. Nossa responsa- biidade tende a aumentar na mesma proporgio daimporténciaatual efturade nossa atuagi 10 ANTROPOLOGIA SAUDEERWELEECDENTO Ora, se nfo é apenas a geriaria (que tend a focelizer as doengas consideradas propries da idade) « grande lider da transform ago do idoso em ator politico, seupapel niko pode deixer de ser reconhecido, juntemente com a combinagao de vérios outros stores de histéria social no pés-Segunda Guerra Mundial. A expresséo mais cabal desse seu papel na redefinigio de espagos ¢ a idéia contempordnea de terceira idade, ‘uma nove construgéo sociel acrescentada as etapas da vide, refesida entre a vida adulte ¢ avelhice propriamente dita Nomeendo # populagao entre 60 ¢ 75 anos ne Europe, onde @ esperanca de vida vem elcengando 80 ¢ 90 anos, essa ‘invengéo’ se socializou, no mundo. Veio e seboque de grandes avangos cientificos na érea de prevengio € ‘retamento de doengas cxGnices, estabelecendo pardmetros cada vez mais definidos do desenvolvimento humano ¢ conguistendo descobertas que se concretizam em tecnologias de tratemento reconhecidamente eficezes ¢ precisas E interessante notar que e maioria dos medicamentos mais modemos, por meio dos quaisaindistia famecéuticameislucr, es{fovoltedos pareo envelhecimento com qualidade de vide’ ou para manter 0 mito da imortalidade ou da eterne juventude, com base em pesquisas fermacolégices e genéticas de ponte Seria uma simplificagdo e um reducionismo dizer que 0 grande propulsor das ‘rensformagées do pepe! atual do idoso ne sociedade seja o mercado, mas nko convém desconhecer seu luger E preciso lembrar que a ‘terceira idede’ é ume nova categoria, sociel que designe o envelhecimento ativo e independente. Geralmente, essa etapa da vide se compe de uma populacio disposte ~ quando tem condides econdmices sminimas para fezé-lo—&"“ociosidade cristive” (De Masi, 2000) « apretica de multiples stividades fisices e culturais. Assim, torna-se impossivel desconhecer 0 seu papel como ‘consumidore’, pois crescem pari passt @ constategéo desse Fenémeno demogefico, otusismo, moda, a cosmétice, amedicina dereabilitacéo e afisioterapie, a industrie de alimentego especifice, novos packdes de construgéo, ume literature eapecifice,além de todas as préticas, instituigSes e agentes voltedos para esse publico cativo e em expensio. ‘A chamada ‘terceiraidade’ se diferenciesia da quarta, de75 a85, ou da quinte, compreendendo os velhos acima desse patemar (Peixoto, 2000), como os paises euro- ppeus j4 vém classificando — sobretudo porque os sintomas ¢ expresses de dependén- cia fisica e mental vo se acentuando ¢ so muito mais frequentes nes iltimes duas faixes, em que os servigos se concentram no desenvolvimento de medicamentos, res- déncies, equipamentos « pessoal especielizado para etendimento métlico e social Ne verdede, « situagio da ‘terceite idade’ ¢ do acelerado envelhecimento populacionel, no Brasil e no munds, incli-se nos temas a gosto da globalizacio ¢ da culture que ¢ produzida neste novo momento histérico, sobretudo pelas mudanges que provoce e pelas potencilidades que encerre, Comoum fenémeno sobre o qual indalhé pouce reflexéo, necessite, para sua compreenséo, de ume perspective construtivist, em que as teorias e as propostas englobem os proprios atores delas destinatérios. Mes, tomada como questéo public, ela éuma espécie de ‘icone’ dos avangos que a socieda- de alcangou, mesmo tendo em conta todas as diferencas entre paises desenvolvidos ¢ subdesenvolvidos, entre classes, géneros ¢ etnias 20 smonncho No caso nacional, a terceira idade revela os seguintes avangos positivos 0 con- tuole de muitas doengas infecto-contagiosas e potencielmente fateis, a dimimsiglo das texas de fecundidade, a queda da mortalidade infentil, gragas & ampliagéo das redes de abastecimento de agua e esgoto, o aumento da cobertura vacinal ¢ de atengio bésica & snide, a acelerada whsnizagio, a universalizagio da previdéncia social e as profundas ‘rensformagBes nos processos produtivos e de cxgenizagio do trabalho e da vide Todas essas mudangas, na realidede, induzem @ que se coloque em paute uma nova datago ¢ um novo imaginésio sobre as etapas da vide até entio vigentes © utilizadas para mercer osituais de passagem, assim como os dseitos e deveres publi- cos ¢ privados. © envelhecimento como questio publica retire esse tema do dominio individual e privado sem negé-lo, colocendo-omum ambito muito mais abrengente: na esfera da grande politica e das politices sociais. E preciso que, daqui para afrente, no nos esquesamos de que, no Brasil, esse grupo etsrio retine ¢ reunira ume popul maior que qualquer sindicato de categoria e até mesmo que qualquer central sindical. O IDoso como ATOR SoclaL Por mais inctivel que possa parecer, ha dues categories socieis opostas ¢ em. construgéo olhando para o futuro do pais. A primeira é a ‘juventude’, essa etapa entre aadolescéncia e omundo adulto que, exatamente pela forga de expansio da expectativa de vide e das exigincies escolares, cada vez tende a amplier seu tempo e a criar uma identificagio especifica A segunda ¢ a velhice, que nfo pode ser nominada nem tratada como hé $0 anos, quando a expectativa de vida era apenas de 43 anos. Portanto, este ‘iltimo e mais novo ator individual e coletivo esta redefinindo es relagdes familiares, construindo a medida de sua pasticipagio social, influenciando os rumos da politica em consequéncia, criando, a partir de s, uma nova imagem e delineando uma preciosa etapa da vide, portadore de uma étice e de ume estética propries ‘Num estudo recente, SimBes (2000) reconstruiu a histéria da constituigio do movimento dos aposentados bresileiros. Com os texmos ‘lute’, ‘mobilizagio’ ¢ ‘nova, categorie’ estruturendo seu discwsso ordenador desde oinicio dos anos 80 e culminando za segunda metade dos anos 90, osidosos se reuniram e foram pare asruasreivindicar reconhecimento de seus direitos previdencisrios, aumento das aposentadarias e pasti- cipagio na gestéo de seus interesses, com assento nos conselhos nacionsis de Satide ede Seguridade Social, Nalideranga da ‘maior categoria do pes’, encontravam.-se antignslideres sindicais ¢ de movimentos socisis. Nesse embate, os idosos brasleiros, nas duas titimas décadas, inauguraram un espago proprio de ago, de cidadanis e deincluséo, Modificaram 0 censsio dda cxganizagio social e se estabeleceram como um grupo de interlocugéo politica — os velhoselegem, destituem, dialogam, denunciem, recorrem Justia, incomodam e se fazem ouvir Transform arem-se, como obra propria, em etores sociais¢ em atores politicos estudo de Simées (2000) faz uma distingéo interessante, Aomesmotempo que cresce e se estrutura o movimento dos aposentados, também se incrementam ¢ se 24 ANTROPOLOGIA SAUDEERWELEECDENTO ruiiplicam os gupos ¢ or movimentos da chamada ‘tecsiraidade’.Os lideres dos sposentados nto gostam muito dessas oures formas de expresséo. Costunam dizer aque as inicatives da cite ‘tercera dade’ no so dinigidasainteresses da coletividade f stendem apenas a mation indiidusis,oferecendo avidedesculturais como as “uni- veridades abertes’, os grupos de encontro, de lect, de solidaiedade, de aividades fisicas ede exoursées, entre outros Ore olhando « efervescéncia dos dois movimento, constate-se que ni hi con- tradigéo enve eles, mesmo porque os grupos de atividades cutis devem congsegar pessons que patcipam do movimento de aposentados «vice-versa Mas diferenges de énfase- os mowimentos sociocutureis costuman reunir mito meis mulheres que hhomens, ¢ os dos eposentados, mais omens que mulheres Amos, porém, revelam a ‘busca do “protagonismo de ‘umanova cetegoria’~ comorevelem AnaB asst, Rita Heck & Je Langton, Alda Motta e Eizabeth Uchée e colaboradores — que acotovela os jovens adultos exigindo a aberture de eapeco e novos eanjos nes ertruturas de poder E preciso reconhecer que, da ponto de vista econémico, os idosos e, deforma daseceds, ‘aterceiaidede’ se configurem hoje como um mercado crescent «cada vez seis promissor no mundo dos bens de consumo, da culture, do leer, da etic, dos servigos de prevensio, stengio exebilitegdo de satide Do ponto de vise sociclogico, constituem un emergente stor socal, com poder de inthis nos seus destinos, pela sun significincia mumérice ¢ qualitative, por meio da construgéo de leis de protegéo, de conquista de beneficios¢ pela presenja no cenéio politica, no qual velem seu voto © son tepresentapio Comouun nove consrtor de cultre, o:doso em papel insubsttvel porque, adicelizando as novas stuagbes, nada poderé ser como antes, sob pena de sun exchusio moral e social do projeto pera o futuro do pais, Os chamedos tempos por-modemos’trowceram a pautaalgumas questées cul- tuis que favorecem um novo pensmnento sobre aterceze, quate ou quit dade’. A primeira ¢arelaivizayio da centraidade da categoria trabalho’ tl como foi pensada no smundo ocidentl ena sociedade industriel —em que, como assinala Weber (1985), foi considered “vocagio' e, como lembre Mant (1978), acabou sendo umn fator de aliens- gto e despersonslizagéo. Hoje « sociedade esta mais aberte pera outras formas de Zdentificagio e madue para a ctice do “homem wnidimensional’ que fez do trabalho para sobreviver seu ico objetivo possivel de vide Cada vez meis se adnitem outres formas de pertencimento sociale tempo pare o dcio critiva, posibilidade que vem junto com « perspective de dimimnisio dejcontda de tebalho, como previu Merx (1984) tm A Ideologia Alema. A noyio de ‘consumicdr cidadio’ e a expansio das redes de comunicagio, leer ¢ cultura extéo conibuindo para dar forga a produgéo ao reco- nhecimento de outras possbilidades de identficagéo. Em segundo luge, « em consequéncia de uma abertura propiciads, sobretudo, poles tecnologies de comunicagéo ¢informacionss, vem se ampltendo o respeito e0 phurelismo de comportamentos ¢ de atividedes, 0 que, em consequéncie, acebe por Tomperesterecipos ideclogicose camportementeis Por fim, doponto de vist cultra, bserva-se uma valorizegfo da subjetividade em todos os niveis do mundo da vida, da ciéneia e de politica 22 smonncho ‘Ac questionar aidéia do trebstho remuneraclo como ainice forma de realizegio social ¢ 20 colocer em foro outrasformas de estar no mundo ena sociedade, os tempos atuais pesmitem aos idosos, como mca antes, construirem sua nove identidade sob uma dtica de trabalho niio obrigatério, mas de utilidade © de sentido. Isso propicie outros espacos de expresso « serem inventados e desfrutados, contrapondo-se & pecha de ‘descertaveis’ ou & propria referéncie a si mesmos como ‘imiteis’ ‘Armaior aberture para opluraismo de idéies, comportamentos ¢ atitudes confi- gua, para esses homens ¢ essas mulheres, o espago menos preconceituoso para seus desejos e possibilidades de sealizagdes, xetirando de suas testes a texja repressora, na qual este escrito que ser velho € colocer o pijama de avé ouo chinelinho de avé, conter histories do passado, parar de ousar e prepares-se para a morte Na verdade, nio sem dor e conflitos, os paptis sociais esto mudando ¢ podem muda mais, amedida que osidosos se coloquem como atores das trensformagées com que sonham. Quase tudo esta por fazer. As vivincias, em maior profundidade, da pré- pria subjetividede permitiséo aos velhos afrontarem es represses provocadas tanto pelas propries necessidades do trabalho quanto pelos constrangimentos familiares, sendomais auténticos e mais felizes. Por fim, as novas possitilidades de comunicacio, de viagens, de patticipe grupd, de ampliagéo da cultura, do cultivo de diferentes formas de lezer permite também ume existéncia mais ssudével. Mesmo nos baisros e nas condigées em que vvivem os mais pobres, é possivel der um novo sentido e articular atividades de encon- ‘ro, comunicagto e afeto. Para tudo isso, ¢ importante mudar a idéia de que velhice & doenga, substituindo-a por ume nova visio de um tempo no qual se pode opter com menos constrangimentos pelo rumo que se quer dar a este iltime etape da vida, produ. zindo dela ume sintese criadora Essa autoria, pare a qual nio estio definidos os cami- thos a priori, eabe ser inventada, tal qual tem sido feito pelos movimentos citados aqui. Dessa forma, a contribuicéo especifica dosidosos sera um bem para a sociedade ¢ estabelecerd of contornos de seus préprios interesses, num mundo cheio de outros poderosos interesses, REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS ANDRADE, C.D. Poestas Completes. Rio de Janevo: Aguilar, 1965, ARIES, P. Histéra Soctal da Chiangae da Fania. Rio de Janevo: Guanabara, 1981, BOURDIBU, P. Questées de Sociologia Sto Paulo: Marco Zero, 1983. DEBERT, G.G A antropologia ¢ os estudos dos grupos e das categories de idede. In: LINS DE BARROS, MM (Oxg) Hillce on Tereatra Idade? Estudos antropolégicos sobre ident- ede, meméniae politea.2ed, Rio de Jeneivo: FGV, 2000, DEMASI, D. 0 Geto Citativo. Rio de Janeixo: Sextante, 2000, ELIAS, N. OProcesso Cultador: uma hsténa dos costunes. Rio de Janeito: Jorge Zabar, 1990, 2a ANTROPOLOGIA SAUDEERWELEECDENTO GUIMARAES, RM Ciéncia, tengo e vide Arquivos de Gera e Gerontologa, 1 (179, 1997 INSTITUTO DE PESQUISA ECONOMICA APLICADA—IPEA. 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