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‘Ao lado de grandes filésofos do séeulo XVIII, como Rousseau e Voltaire, Diderot também fez suas incursdes pelo teatro. Neste seu Discurso sobre a Poesia Dramétle, faz um tratado sobre @ dramacurgia da época, Sob a forma de uma carta 20 leitor, ele combate o teatro clissico francés que, com seus cendrios, figurinos e convengbes, restringe @ Tiberdade do dramaturgo. Defende com isso uma volta pureca estétiea dos espetaculos gregos, onde 0 Uinico recurso dos atores era seu proprio talento: onde poeta dramético” era, antes de tudo, um fil6sofo; ‘onde 0 objetivo final era revelar ao espectador @ natureza humana e, assim, reconclié-lo com sua prépria espécie, DISCURSO SOBRE A DENIS DIDEROT Traduglo, apresentagioe nota: LAF. Franklin de Matos APRESENTACAO, Filosofia e teatro em Diderot A China I Em 1786, Diderot jd tem alguma celebridade em toda @ Europa, ientfcado como da maitlustres figuras do cha ‘mado "partido dos fisofos". Tal identficapdo ndo se deve fanto aos lon que publicoyaiéento (um dos quais he valew ‘Sembastihamento) mas sobretudo@atvidade que hd alguns foo acupaintepratmente: adregao da Enciclopédia. Prec- Jdamente nesta altura, 0 grande projet de rerdenamento do Contecimento humano vive wm dos seus momentos mas del ‘das: D'Alembert, 0 mais prosimo colaborador de Diderot, ‘eaba de deivar 0 empreendimento, Rousseau faré 0 mesmo ‘dentro em pouco eno ano sepuinte, © Consetho do Rei rev (gard 0 priviinio de imprestso da Encilopédia. Ora, apesar ‘dog sucestiv “aborrecimentos”, Diderot enirega ao editor tima pega de teatro, O Pal de Fula, publicada juntamente ‘om tm pequeno tratado tsrico que pode sr considerado “Arte Podica do séeuo XVII frances: Discurso sobre a Poe: {is Dramitic, Aid, essa obras do sequncta a-um projeto ‘que 0 preocupa devde ano anterior, quando apareceram ‘OFikoNatural,“comédia série « Conversagbes Sobre o Fi Iho Natural, didiogo em gue Diderot submete reflex sua ‘experiincia de dramaturgo. Poi bem: por gue, mum instante ‘io decsv,0 lsofo se tora poeta dramético e,além dis, ‘xige que o poeta dramdio “tej flisafo"?” Num século em ‘que oincansével Voltaire, liria filoséfiea de entdo, se notabi- {sara como dramaturgo, 0 controverido Rousseau, antes de {fiat sua imagem publica de lsafo, izeraalgum nome em Poris como homem de teairo, a pergunta seria certamente desproposital. Nao o& entretanto, pare letor modern, gue ‘bem poderiaformular a questo sob a forma de wma inguie- tagbo 2 se fazer dramaturgo eexgir que o dramaturg foie {filoofo, Diderot ndoestarasccrifleando a partialaridade do {teatro ao dominio absirato da flsafia? Se quisermos respon der ais quests, serd preciso que tratemas de eclaecer me thr oponto de vista a pari do qual considera 0 eat 0 di retor da Enciclopidia. Quem fala nos textos de Diderot sobre poesia dramdtiea? I “Enre uma infnidade de homens que escreveram sobre arte pottice, trés #80 partcuarmente edebres: Artétels, Hordetoe Boileau. Aristieles £0 flaafo qua caminka onde Inadamente,estabelece princpios peri, deixando as conse- ‘Gténcia por trar as apliagdes por fazer. Horio 60 ho- mem de genio que parece aftar dsordem e que fala como octa, pars pocts. Boileau £0 mestre que rocura dar 0 pre- ‘ato eo exemple eo disciple." ‘Esta pareagem do Discurso nos permite stuaro pred tento de Diderot com repeto &tradiao da qua, em parte, tle se pretondetibutirio. Embora Aristétele fosse wm dos ‘Que trabalha “ordenadamente". Para provélo, bestria ev ‘ara elogiente metifora da “rameira’s que abre Provocai ‘mente O Sobrinho de Rameau. Aires dela, Diderot se ‘treve a pensar sua divagagdo flosiica como uma aividade “dusoluta”, ade entregarse ar idias como te assedasse mu heres da vide, corendo eirks de uma, detzando esta por ‘aque, eequela em seeuida, por outra. Amante da forma do dogo, sux indole gosta de se deizar levar pela vivacidade da ‘conversa, Improsisando, repetindo, derivando, mudando Brus ‘amente de assunie. Mesmo quando pretende expor suas ‘dfias soba forma mais ecabade do tratado", como no Dis- urs, exeree om forma de carta, imaginando as intervenes ‘do destintsrio, debatendo com ele, respondendo suas per- untae objerdes. ‘Nem por io, entretanto, se deve chamé-lo, como jf se fez, deespiito "borra0" pois Diderot se reserou wma fidl- ‘lade inabaldel a certoscombaes. sim, se pe d prova as “dday, nos entregaa qualquer uma, como se fosse um aen™ tureiro inconsegiente: ao expeimentélas,o que procura 6a >maneira mais efcas de combateros seus adverséros perme: rmntes, Um exemple: Diderot jamais transigu com 0 Peso recepista de um Boileau (e, neste sentido, 0 proprio habito ‘de publiar os tests tebrcos como uma espécte de apandice 45 pepas de teatro parece contr uma liao: Diderot no dita regras edi exemplot:pratica 0 teatro ¢, em seguida, refete Sobre essa experiencia). Por iso, ele jamais iratu 0 gue dis: ‘Sera, em 1738, a Madame Riceoboni'*asubmissdo ds regres & ‘morte do Génio.E asim, dos primeiros texas sobre poesia. ‘dramatica ao Paradoxo sobre o Comediante, embora Diderot txibo duas concepedes radicalmente opostas do Geno, emt ‘ambas ese érefrataro ao dominio das regres, submetenderse ‘pena d leis wnversais da Natureca. "A tentapdo, portant, éidentfear sua fla, sobretudo mo Discurso, d postura atrbulda a Hordcio, 0 poeta que finge esordem ese dirige a uma plata de poetas. De fat, como ‘de castume, Diderot se embrenha nos caminhos laterals, as vez por inicatve propria, as vezes detxando-se levar elas ‘objeedes do dstinatdrio. Alem disso escreve 0 tempo todo ‘procando-se a condigao de pocta dramdtco, autor de O Flho Naturale de O Pai de Familia, dirgindo-s abertamente aos Jeus pores, aconselhando-Ihes © melhor maneira de elaborar tum plano ou a forma de aleancardxto na ate do didlogo "6 poetas dramético. apostrofa agul, “sols poeta?”, per~ gunta mais adiante Muitas vers, suas reflexdes se fecham ‘om dita apidares, deforma breve ecortante, & maneira das verso cllebres de Horio. Mas este parentesco,invocado, de resto, pela elgrafe do Discurso, ndo deve ocular o detalke de {que o lugar que Diderot ecolhe para falar nem sempre & um 125: ndo raroy ele estésueito a vaiagdes,establisando-se em ‘udra parte diversficando ts platia. Ete tipo de mudanca {eard mats patente, por ecemplo, no Paradox, onde Dide- ‘ot, falando de inicio, como homens de teatro, sobre 0 come ‘dante « para 0 comediante, alarga em seguida o tema © 0 ‘uti, tratando da arte om goal dirgindove ao pinto, ‘20 poeta 20 sic, a eseulor 0 fidsofo,« até mesmo 20 tribuno ¢ eo estadista. No Discurso 0 fom mais aparente& 0 do poeta dramtco, ow melhor, do dramarurgo que reflete Sobre a propria experiénca de feairo, mas 0 personagem que ‘realmente comenda a fala etd em ouira parte. io transcorer {do tivo, ee raramente desea os Batidores, mas no eaptulo {inl Diderot, fled sua incinagao de dramarurgo the dé um ‘nome eum oii: trata-se de Aristo, oflsofo. Esbogando 0 Derfil deste personagem, seri possveleslarecer de vez 0 pon {odevistsa partir do gual Diderot aborda a quero do teatro “Emprimero lugar. & preciso observar que, muito embora ‘oprocedimento que desce do eral oo particular sea estranho ‘2Arsto, nada mais equvocado do que trbuir a ete fbsfo, ‘como fer'0 Abade de la Pore, aetigueta do ceticiomo.* A recuse das regras e convengdesarbitraramente codiicadas ha pocica eldsicas ndo implica a remincta dos principios {niversas: no seu longo solilaquio, Aristo contesta veemen ‘mene a postura do edicoe se oewpa em buscar, a partir da ‘versa inespotével da Natureza, as iis reguadoras de Verdade, Bondade e Beleza. Mas odecsvo para a compreen- {Mo deste personagem no ¢ 0 tema ~ tap velho como a Pré= pia Filosofia de cumpliidade entre estas instOncias, mas a ‘manera de compreende ase articul-lax, Nas Primeiras Dé {ings do Discurso, Diderot tru ao filésafo uma miso {Ede convocar a8 “homens de genio": poeta, pintores ou mi ‘Hoos, "paramos fazer amaravirtude& odiar 0 vicio™ A afir~ agi sugere que @ eividade do flisnfo deve ser pensoda menos em funezo do procedimento ordenado erigoroso do ‘gue do privlgio concedido 2 Bondade, vale der. a exfera ‘moral, Como distra Voltaire, 0 “amante da sabedoria, quer (ize, da verdade" €aquele que dé aos homens “exemplos de Virtade” e "lgoes de verdades moras." Entretant, 0 aie Dense davreude wm ftsofo do seulo XVIII? Sem entrar em Consideragtes minucloeas sobre a complicada aventura deste umoeito na obra de Diderot, basta refer a breve definicdo ‘provost por ele certa vex" wm secre de si mesmo". A Formula é mats contundente do que a usada por Volare no Diciondro— "beneicencia para com opréximo” —~ mas am bas implicam a concepgao de que "36 €verdadeiramente Bort ‘para nis aquilo que fapa o bem da sociedade"™" A virtude, ‘isin éfundamentalmente soiabilidadee, por iso, no Dis- ‘urs, as figuras mais ameagadoras do veo sao a superstig20, ‘hiner, prininalment, a avareza, por ser “estranka & ‘benefictncie® Alias, a0 efrmar tals prssupostos, Diderot ‘sth apenas fasondo e003 cdlebre formula da Enciclopedia, Sceundo'a qual léofo "um homem que quer apradar ee omar tl” Vio que promovera virtue €inctar a sociabi lidade, ugar de ates do filbsofo se diversifia «ele 8 no define come teblogo, metafiico ou sdbio, mas como “ho- ‘mem de bem®, atuaizado com os avancos da cincia imis- ald na ide police, ineressado por todas as querelas que foncermem d vide socal. E assim que 0 fsofo ganha oss Ties, afl, at slat de espetdculoe, ao fazélo, mostra que ‘conexio entre flosofiaesociedade € to estrelta que & poss ‘lard mesmo ser Floto sem Sabé-lo,” bastando, paraiso, Creveer com probldade uma profissao qualquer. Aqueles Que {te dedicam ao oflelo de pniar fazer versos ou compor mi Sioa este figura exemplar motira que é posse ser fsofo (6 oli, Bsn Pheer Fimo, 94 nn rans norte ee sy Dee Pi motte, Geen, Pb 7%, se ‘manera dels: é necessrio apenas concorrer com as leis para (Oem da sociedade cv. “sso é bastante para explicar por que Diderot, nas pri= meiras piginat do Discurso, exige que 0 poeta dramético la fldsefo" ¢ por que ele proprio, nos anos 0, se tornow ‘poeta dramétio: os tus oles, uma aividade deveriapro- Tongara outa. E dese noer, enrerant, que anecesidade de convocar of "homens de genio supde que estes, por uma ra- ‘lo qualquer, estelam fazendo um uso nadequad de seus fa- Tentos, De ao, as ate ext sobreceregadas por convent des (que entravam a atiidade do Geno. A rasdo para fal no re= ‘mete apenas @histria da arte, mas, para além dela, & stra dds costumes, marcada por um exirevio que & preciso denun= lara ciilizaeto progride ds custas de wma despoetizapto dos ‘astumes, que lena a0 enfraguecimento ¢ amancirameno ge- ‘as. Em termes estos de gosto, esse desio promove um ‘ivécio entre arte ea vide chil dos povos ow, numa chave ‘mais gral, entre a are a natureza:o convencional se sobre ‘Pe ao natural 0 arsta se tora incapas de expressar a nat ‘reza humana e. portonto, de se por a servco da vrtude. E Precio, pos, uma reforma geral do gosto. & preciso restitulr@ ‘Poesia aqule “algo enorme, Brbaro eselvagem” que os an ‘gos comeceram Nesta empresa de reste, 0 teatro ocupa tim lugar especial: para que 0 eepetdculo dele de produsit ‘iment “esas impress pssageras que se dispar majo Tialidade de uma coir” reate core @ grandest do teatro. ‘repo, que procurava ndo apenas divertros edad, “mas foméilor melhores") & precio desemberscélo dar regrat arbitrrias que aprisionam. Comojse pode ver. 0 ponto de ‘sta "flofco” de Diderot no prtende scrfcar 0 teatro [lsofa, mas restituir ao dramaturgo a Uberdade subtraida ‘plas conventées. Para compreender devez gue esta perspec” tive preserva escrapulasamente a inteprdade do expetéeuo teatral, basta acompanhar mais de pero a queso da reforma ‘doreatroem Diderot. DISCURSO SOBRE A FOESIA DRAMATICA 8 1 “Nada sei sobre as regras (.) € menos ainda sobre as stbiaspalavras nas quis foram concebidas, mas Sei que so" ‘mento verdadeiro agradae toc, Sel ainda que a perfigao de lim espeticulo consist na iitasdo to exata de uma agdo que ‘leipectador, enganado, som gualauer inerrupgdo. se ima fina a assistr a propria aedo. Ora, hé algo semelhante mas ‘ragédias que nos gabais?” (Ofragmentoacima fz parte de uma digessdotsrica do romance kes Bijoux Indscrets, publicado em 1748. E entdo ‘que Diderot formula pela primeira vez um programa gerade ‘forma, ident{fleando oadversrio a ser combatido a cena ‘ontempordnea, tbr do teatro elssce frances — eine ‘cando a norma hstrica que deve presidr a reviravolia os ‘andes epeticuls da Aniguidade. Enquanto ests admins fram wm apareto simples, onde “nada vos tre da ido", ‘aqula padece de uma submissto 0 convencionalismo codif- ‘do nas potas sob a forma arbitra das "regras”. as- ‘im que, na cena moderna, as intigas so sobrecarregadas © ‘os desenlaces nto aparecem como decorréncas necessrias do ‘desenvolvimento: quanto aos didlogos, do enflices, pouco ‘aturase ndo rar usados para transmit os propéslos esp ‘wosos do proprio dramaturgo: enfm, 0 desempenho. dos ‘iors eo epetdculo em perl do "bizarres" e "extravagan {es". O teatro moderna sofre, assim, de um defito perl de ‘erowimilhancae,consequentemente €incapas de epagarse ‘como imitagao ¢infundir uma iusdo duradoura sobre 0 c= ‘pectador." ‘Como se vé. na sua primeira ertice 2 teatro modern, Diderot comeca por invocar®ra mals geral e fundamental da pottca clésica francesa: a verossimilhanga. Aos sexs ‘otha, a verosimilbenga jamais Sera wma regraarbirria, ge eralzardoiegiima de observages emplrcas, mas um prin ipo fundamental daarte dramética e, como fal, nao hi ra ‘io para contesti-la. Como te verd adiante, 0 que importa ‘para Diderot sao as contegiéncas que pode recoler, sobre Fado no plano da tora dos nero, desta mvocaeto da vero: Smilhanga conta 0 teatro clasico francés. Mas @ sua con ‘cppdo do verosimil nao ¢exatamente a mesma que vingow recs precetists frances do séeulo XVIL. Como ésabio, tudo o que se dist sobre o ascnto, desde oséeulo XVI, est fasentado na Potten de Aritteles, que define 0 verossimil ‘como 0." possvel"ow.0 “Impossvel”=que ‘persuade’. Esta passard plas miliplas lures do preceptismo ia. ‘defn iano do séeulo XVT e, nos anos seiscentos, proseegird sua ‘eidentada histria sob ar nia Interpretacbes dos térieas Franceses, Muto embora as vozes dlscordants seiam por ve esutres,tiunfa na Prana aconcepeao que identfca ov ‘ossimil realidad mais comum’’ ou sea, 20 "habital® dequelepiblico que, no seu perfil individual, 0 séeulo XVI ‘Shama de bonnets homme e, dem ponto de visa eoletve, de incouret le vill." Para inporse,entreranto, tal concepedo SESS Semen isan Sate oeein cae ‘Sree Sonics XVI er por wep tence Leng na Domai de Sie ra 1 Eau ie iin ses XV a eee cai le asc st tn pi Casi ms a SAREE Sine cai pi pre i ‘Spent course sien out ry cose ern SEDGE Sars eer deur tee pio ma a acti Scat ne La iV una ‘eines ket acme pu geen wus Samvinbinatten Mtwmsn ne pne oso og maton ISCUREO SORE A RORSIA DRAMATICA s debatewse, por exemplo, com outro tépio da Poética de Ars {teers a exiponcia do "maravhoso",esencial para 0 eflto ‘da tran edefinio como ago que ocorre “contra 0 que se ‘ipera’- De que mancira ser verosimi, vale dizer, ndo fron taro doxa do honndte homme e, ao mesmo tempo, ser mare tilhos, iso & excolher argument capazes de inteessar © Seradar? A alternating tve tanta importincia que, ndo por ‘eaeo, 0 capitulo mats signcativo na histria do conceto de ‘erotinilnanca no século XVII ~a Querela do Cid ~ ops, (dem lado, os terics do “habitual” ede outro, um drama: fuga como Corelle, sempre 2 procira do "argumento Be- rador de maraviha"? "Para faser frente d questo, os preceptstasfranceseslan- carom mio, enreoutras cosas, dat [das de verosimithanga ‘rdiniriaeverassimlhanea exraordndria, Mas no nos inte= ‘esa acompanhar minuclosamenteo problema: basta-nos 0 ‘Quadro sumiro do debate no gual opera a concep¢aodidero- ‘lama do vercsimil. Como jé te pide ver. Diderot pense @ ‘questo, na maior parte do iempo, pelo ves daidiadeiasbs ‘vero nao é 0 préprio verdadeir, mas aquilo que se Darece com ele, provocando em ns wona impressao que € 0 Irande segredo da arte em pera. A eigéncia de lado 00° ‘manda, asim, todos os julos de gosto de Diderot. Trata-se ‘de um romance? Diderot escreve paginas exltadas sobre a Incomparivel uso provocada pelas obras de Richardson ©, ‘em broverpinceladas,trapa a potcologia do modernoteitor de Fomance, que trata ox personagens do autor Ingls como pes {ous de carne oxo, dsputando por elas se deseabelando Delos seus destinas.Trata-se de wm quadro? Eis Diderot dian- ede uma naturess morta de Chardin, entuslasmad pela ‘preado que nos esa desejar meter a faca no pate, descascar sfratas tomar o copo e beber o vino. Tratese de falar da ‘ompasido de uma boa pera ou do desempenho de um bom ‘tor? Diderot sentencia: “Quer compondo, quer represen tando, fae de conta que oespectadorndo existe endo penseis Sites meena rele em menhum ds casos. Imaginai no proscnio uma gran ‘de parede que vos separa da plaiia¢ represent como se & ‘tina nd ertvesn aberta Eutes julzas obedecem d con ‘epeto de que a ilusdo ¢a “finalidede comum” de todas as lrtes de imtacdo. Mas de que depende ela? perguntowse in: ‘asavelmente Diderot. A perfepdo das obras se mede pelo ‘eu poder de lui, mas como se deve proceder para garantr. ‘tepoder? ‘No Discurso, a rsporta & lepidar: a iusdo depende “das ircunstincias, firma Diderot. "S80 as cirunstancias que @ fomam mats ou menos dill de ser produsida.”” Para bem Compreender eta breve definicao, nada methor do que referit ‘apéndicetérico a conto Os Dols Amigos de Bourbonne,” ‘nde ae acha ideal didertiano de narador moderno. Agi, Diderot ditingue 0 “conto istérico", praicado por Cervan- tes, Scarrone Marmantele “conto maravihaso" 4 mancita ddeHlomero, Vigo e Tasso. Neste, «verdade & “hiportice “firma ele, €@ naturesa "exagerada” Sua regra 60 mari ‘hove, por io, aqui entrando, “clocals os pés uma terra ‘desconecda, onde nedase passa como naguela que habia, ‘mas tudo se faz grande, assim como sto pequenas cs clsas ‘que vor cercam’. Nao se dir, porém, que este engrandeci= mento nor araste para os dominios do quimérco. Conforme Cnsina 0 Discurso, 0 maravilhoso ndo deve ser confundido ‘Som 0 “miraculose"s gue uate sempre deverd rete: mira Culoos ado "os cates naturalmente imposivels", maravithor foe, "a0 aoe raves dos quats 0 poeta ds rezes Se apossa ‘ara imitar a naturesa nos momentos om que esta encadela Pimeidentes extrardindriae”™® Por iso mesmo, mara ‘hosondo & extranko 20 cont hstrico, visto que o poeta te ‘aqui dua fnaidades. De um lado, fomando “por objeto @ ‘erdade", ee pretnde “lun”, o sea, “'guer que acreitem Iele"s De outro, "guer interessar, tocar, Pasar, comover, Dprovocarerepios na pele e lagrimas nas ols, efelto jamais ‘bud em elogiincia e poesia": Eniretanto, uma ves que ‘ests “inspira desconfianca”, poraueexageram, encareem ‘ampliicam as coisa, de que manera o poeta poderd conc ‘lion duas exigenclas aparentomente contradiras? Reto ‘mando impasse nos termos do debate elssico, Diderot dirk: "ite semeard sua narroiva de pequenas cireunstincis 100 ligedas dois, de rage 10 simples, to naturas, «todavia tdo dices deimapiner, que sere forcado a dizer conosco Porminhe sto € verdade: no se inventam esas coisas. E isin que reigataréo exagero daelogudncia eda poesia: que ‘verdade da naturesa cobriri o pretigio da art; e qu ele Saifaré.as duascondigoes que parecem contraditrias, er 00 ‘mesmo tempo hstoriador © poeta, vridico e mentiroso”.® Olque ve dis agul do narrador fico, guardadas ws particule ‘idedes decade género, vale também para o poeta dramitico. Veriico « mentiro, 0 poeta serd verossimil e, a0 meso ‘ge recorer ds "pequenas crcunstin- Jove de compensagtes entre 0 comum e 0 incomum, "a ‘Gade da natureza"eultando do espectador ou do itor Drestigio da arte". A orginalidade desta concepedo do esea™ pou, por exemplo, 3 sagacldade de um ertico como Marmon {212 Sua importincia no pensamento de Diderot pode ser ‘valada pelo ato de que no futuro, ela seréusada para pen- {forndo apenas a poesia, masa arve em gerl. A arte até em ‘lstrarcrcunatancas commun mas cosas mais maravthosas Treveunstancias maravihoras nor esuntar male Comins”, ‘dr ele mum aforiomo escrito jf nos anos 70." Como é Sin, eta concepeso ests afinada com o fend- ‘mene da cotdientagio gral da literatura e da arte no séelo Vit. Mas, em termes exrits de teora do featro em que ius eieunstincastviais editing da "realdade mais ‘comum’'e do “habitual, invocados na concepgdo de veross= tmihana dominante no séeulo XVII? Desde Ariiteles, 0 verossimil depende, em sitima ins- tncia, da opinigo comum. isto &, do public. Quando recor ‘rem dgulloqued habitual, os preceptstasfranceses esto pen Sando, como Se vin, no sistema de expectaivas do hoanete homme do sceulo XVI Ora, xe Diderot imputa um defo de ‘eraasimilhanca ao modern teatro francés, é de 4 spor que, 10 fad, este denunclando um divrcio entre este teatro ‘to seu piblce. De fato, ndo € diel prover que 0 divrcio resulta de uma mudanea n pbc: se esptéculo€ineapas ‘de persuadire lui, & porque o perl do pile j4 ndo 60 ‘mesmo, embora a cena francesa feime em desconheco. AO fazer esta deminca, alts, Diderot est apenas reafirmando flgo que vor correnteno “partido dos faofos. para mas liter bastaria consular @ "Carta XVII" Parte TT, de La INouvele Helis, de Rousseau. Neste texto, Rousseau comea ‘or asinalar o profundo abismo entre o teatro a ida cl ‘francesa. Segundo ele, instrlgdo da tage entre os are= fos, extva asentada numa sida tradiao relipiova ¢ histé- ice “Mas que me digam”. se pergunia em segulda, "que uso ‘em ogui as ragédas de Cormilee que importam, wo Povo de Paris, Pompeu ou Sertirio.” Que veosimilhanca wilidade 4 pode esperar, pois, de um teatro fundado em arpumentos {ao quiméricas? Quanto dcomédla, que "deveria representar ‘2 natural os castumes do pov para o qual ¢ fit, 0 quadro Tlmpouco & dos mais animador” "copiam-se no teatro at ‘conversas de uma centena de casas de Pare Fora disso, mada {apronde sobre os costumes dos fanceses. Ha mesta grande dade qunhent ox slscentas mil almas que jamais st00 fm questin sobre a cena. Moire ousou pintar Burgueses lartesdes tanto quanto margueses: Svat: faia falar cochel ‘os, marcencras,sepaters, pedrciros. Mas 0s autores de Ide queso pestoas de outro tom, se acrediteriam desonre- ‘dose soubestem o ques passa o baledo de um comerciante ‘una oficina de um operario: eles precsam apenas de inter- cures idusre e procuram ma condigdo de seus personagens ‘eleva que no podem tirar de seu genio". ® Para 0 que rns importa, ext texto slebre é bastante claro e ndo precisa ‘de maiores comentirios.Atribuindo a inverossimilhanca € & lnulidade da cena francesa wo seu carter aristocritico © 00 ‘desconhecimento do pblico real parao qual deveria ser fia, ‘Rousseau aponte para 0 fenomeno da divesficagdo do pi boo mo séeulo XVII. Conforme a palara de Sartre, “a Bur- ltuesiase pds aler’ O romancista eo poeta dramatic, as- ‘im id no excrevem apenas pare os herdetros do bonnéte homme do efculo amerior. plblco especalizado e formado ‘nas normas do goto, capa: de controlar aiidade do arta, ‘trans de regrasexpictamente formuledas, ¢conhecidas de “ambas ax partes Agora & preciso que também considerem a ‘demand dos resi chegador no cireuito da cultura bomen ‘Bote. Ainda sgunco Sertre, esta "eis" no pablico to Drofunda gue dela resultard uma crite do ideal de gra te. ira no stculo XVIII: @ partir de ent, 0 ecrtor se ver Tangado entre sono tradicional, 0 favor dos grandes, © wma ‘ambido mais pedestre, mas no menas almejada: a de que “fim obscure médco de Bourges” ou “um advogado sem cau sar de Reims devorem quasesecretamente sews livros ‘Poucos, como Diderot, tran vido esta cise com tanta cexemplardad:o flo do eutleiro de Langresndo recusaré econhecimentoe a intimidade de Catarina I, mas, no por ‘caro, Marselhaseréa primeira cidade a acolher uma pee ‘como 0 Pai de Fala. Pis Bom: & sobre este novo contin: iente de pablico que se apdia a tase no prosaic donde re Sula concep diderotiana da verassimihanga. As ercuns ‘incite osauntor trivia de que se trata agora nada tm ‘Grercom o "habitual de wma art resria ao esparo da core ‘Aonomearo novo publice, Diderot serd menos ousado do que ‘republicano Rousseau, mas nem por isso menos claro: Seu ‘spectador srk o homem de leva, 0 fésof, 0 comercante, Chu, 0 udvogade, 0 politico, 0 cidadio, 0 magistrad, 0 fi ‘nancst, 9 grande senhor 0 intendente,o pai de familia, 0 Capos, flo natural Eee pequeno eseleto contingente, que {endo subira ao palcoexigmazado plo rso da comédia, ‘agora reivindioa. pares seus assuntos domestcos, a dint (2) Suc, eel ian, Pt Gir 1789.14 dade ¢ 0 sublime da tragédie. De que maneira Diderot dard ora este deseo, 60 que se verdem seguda. Vv “Mais raros¢ singulares estes casos (os maravlhoso), ‘mais (o poeta) precsaré de are, tempo, espace creunsin= ‘Gia para compentar o maraviloso ejundarailusto." ‘Eniretanto, mais do que are, tempo, espaco e crcuns- ‘ancias 0 pocta precisa, podese acrescentar, de beads. De fato, 1 mobiidade de trnsto entre 0 comum e 0 incor ‘mui, esencal para asus aividade,€ contestada pels regres (que airavancam arte Letra. Os greg ndo Restaram em Tovar d cena “os olhos vacados de Bulpo", os gritos inert ‘ulados" de Flotees ferido ou “as rastos de sangue’” do Darricida, guiando a perseguicto das Fras, Em nome dana fureza, nao vaclaram diante dessesdeafhes,por mats “for~ tes" e “iolontos™ que fossem. Se se atrevesse a tanto, unt Aramarurgo maderno horrorzaria a delicadeza do espectador ‘ afrontaria aregra do decora. Contido por tamanka arbitra ‘iedade, como podera el asprardverossimifhanca? ‘Omaisconstrangedor, porém, a serilidade do teatro a teoria clissioa dos géneros, que estabelece wma rigida distin- ‘io entreotrigico eo cOmice. Sustontando que @tragédia# @ omédiarepresentam os homens “melhores” ¢ piores” do “oninariamente 320 esta teora condena 0 teuro aos iremos e prolbe que 0 dramaturgo tome como objeto as “gs mals comuns” da vida, ou sea, aguelas que mas on ‘czmem 0 espectador. Nas palavras de Rousseau: obrigado a Fiar "eure defetoe o exces" 0 teatro acaba por deixar 4e lado, como alg init, “aqulo que 6°.® Assim, quando ‘onsoce ot dramaturgos, em 1757, as aproximarem “da Deriénta cotidiana, « regra invarivel das verosimihangas 1 lenin Die «Rows: we igus # so 8 dramicas",® Diderot os incitasobrtudo a exercer a like ‘dade de pensar ateoria lssoa dos géneros dramatins Como bem rsa Peter Szondi.® a consegiincia mais im portinte desi chamamenta @ cotidiansapdo seré 0 romp ‘meno coma “eléwsula dos estados", vigente desde a Antigui- dade, e segundo a qual somente herbs, principe eres dover Flam ser protagonistas de uma intrga dramatic séria. Por ‘is, 0 peridista Frévon,adversrio dos filsofs, ao erica 0 ‘nenero em que Diderot eacrevera o Pal de Faria, euida de (roorerdeutoridade desta cliueula, Comesando por supor a ‘mpressdo necessrlamente fraca produsida pelo gener, -Frironse pergunta: ‘De onde provim aforca do inerese que nos despertam os hersis nat tragédias? Da ruperioridade de {nar condigder eda grandesa de seus perigos". responde ele "Tratare da perda da lberdade, da coro, da vida ee (~~) Em era, uma depravacdo singular do coracdo nos toma bem ‘mats sensves oa lamentas de um homem acima de née do fue aos de um igual ow infrir. A mesma pessoa que olhar ‘dos soldados be batendo se lancard entre dots homens deem, ‘afim de separé-los. Deve-se, pot, aribuir & natureza que as ‘enas enternecedoraspercam na comédia alg de seu eft. ‘A esta profsio de fé nas normas da pottiea céssca, Diderot jd rerpondere anos antes, nas Conversagbes sobre 8 Filho Natural. Ao cniririo do que se pensa, dssera eno, 12 forca do interesse que os herbis da tagédia despertam em nbs ndo deriva do briho de suas eondigdes, mas de algo que ‘sti para elim desta mera contingencia.O que nos comove na Cena IV, Ato V, da Miggnia de Racine, quando Cltemnes fale, nao 0 fato de que ela sea rainha de Argos e espse ‘Agamenon, general dos greg, mas “o quadro do amor ma termo em toda sua vrdade” Pola mesma razdo, a camponesa ‘que abraca 0 merido asassinado pelo proprio irmao nao & ‘menos parca quee mulher de wma condigao superior e. por {s, do menos digna de ser objeto de uma comovente cena tetra. A mesmo situago inspirarie @ ambas 0 mesmo ds- ‘Curse cabendo a posta encontrar“ ge todo 0 mundo dria ‘em semethantecaso"™” Como se pode ver, Diderot ecole ut ‘exemplo que pertence ao proprio repertirio da tragédia. Nao Contests eto desta, apenas o disocia da condieao das per- Sonagens, stribuindowo a uma razko mas perl. Blas mt 1767, tno Ensaio sobre o Genero Dramitico Séri, Beaumarchas re= [Forcriaoargumentoetria mas além, atentando para os pos {iver embaragos do brlho da condigio. Um grande principe, “firma els, no Spice da feiidade, da honra« do tito 38 pro ‘ova em seu povo.osentimentoextrlda admirago; mat se lima desgracaou inelidade ameagam perdélo,oentusasmo ‘do povo despeta, masirandoo quanto’o manarea the € caro. "0 verdadetro interesse do coraedo, sua verdadeira relagio&, pots, de um homem para um homem. ¢ nao de um homent para urn rei Por iso, muito Tonge de aumentar em mim 0 Intresce despetado pelos personagens trigcos, 0 bitho da ‘condi, ao contro, opreudica. Quanto mais préximo do ‘meu foro extado do homem que padece, maior a inftuncia de Jiuadesgraga sobre minha alma. "Nar momentos patétieas, mds nos comovemos como bo- mens endo como sds: mas Cena tata, 0 que nos afta Ino € fala cdo es, mar o gue "todo mundo" dra em certs ‘reunstincas. O que quer dizer que 0 objeto do teatro & a fatureza humana, orgiariamente Bou e que habitaigual> ‘monte tot os homens, independentemente do estado que & istira thes confertu. Assim, o "depravaao singular decor 0", referda por Fron, depende apenas de wma convened Dostio, ou melhor, da “miserdvesconvengbes” que perer- tema naturera humana: no € da ordem da nature, mas da order da hist, "Bn nome da natura, poise conta a hstria,€ preciso (que opocta se lbere das convenes que o impedem dese de- Bruce sobre “as agdes mais comuns da vide. Que tis ages Dostuam dignidade dramticae merecam ser tatadas om ne nero parte, batterie para provéloo exempo do Jus, pes DIScUREO SOBRE A FORSIA DRAMATICA a exbogada nas primeras péginas do Discurso: seu interesse © Jorce dramtca sho incontetéves,emtbora jamais pudesse se ‘romodar ds exigéncias da teoriaclassica dos genes. Mas ‘Ste urgumento empiric, Diderot acrescenta outro de ordem Dropriemente"fiaifca". No tereno da experiénei cot ‘ona, © dramaturgo noose arrita a perder de vista a natu. ‘eza humana, ocala sob oesplondor do“ manto real” ou sob Croupagem dversvicade do ridculo. Aqui, a naturesa hw ‘nana nao calea roo ou cotumno, masse apresenta, nas Pala ‘ras de Diderot, om estado de nuder. oferecendo a0 poeta ‘Cremplos inespotiveis de virtde.E preciso, pls, fundar 0 {Enero sri, pono intermedidrio ma escala do sistema dramé= ico, dvidido vm comédiasériae trapédia doméstica.™ Ex: ‘indo oridialo que fas vir" 0 ‘perigo que faz fremir", Dripris da comédiae da raga clisias, 0 efeito dessewé- Tero sobre espectador serdo enterecimento das lgrimas, & ‘doce emogao provocade pelos exemplos edicantes da virtue. ‘Sentimento este, descarga afetvainconsegiente, dire. Tewfrmando sua crenga tuminita na prepapto no exemplo, Diderot relicark: “a sacrfco de #f mesmo, feito om Ide time disposgan preconcebida poraimolarse na realidade’'* v Seaundo Diderot, 0 efito maior do esptdculo reatral 60 de permit que 0 homem contemple « bondade da naturesa Ihumana e- deste modo, se reconcile com rua expécie. Para 0 ‘Soulo das Luzes, nada mais flséfico do que esta missd0. ‘Maso teatro ndo &o flosofia ese ele quise estar & altura da fare deverd preserve iniransigentomente 0 sua propria ‘dentidade€eita uma das acepgbes maiores da reflexdo de Diderot sobre arte dramitica. “Powcos filsafos que se interexsaram pelo esptdculo tee tral iveram, como Diderot, tanta intimidade com el O Dis- ‘curso é um testemunko do alcance desta intimidade. Nele, © leitor poderd acompanhar o diretor da Enciclopedia, 10 Iabituado a descrever ar téenioas ds ofcoe, montando ¢ dex ‘montando a maguina do teatro, revlando os segredos mais ‘cult do seu prdprioafii Reljocira competent, agi ele ‘nsina a elaborar o plano de wma pesa, al a dominar 0 ddr log, 0 mondiog, a exposico, o ato, «cena e mesmo 0.0 ‘Weaios mas adiante. ele mosra como desenher os earacteres mai adiate ainda ~ amante do paradoxo ~ de que ma’ Inia e por que raxdo se deve exquaceroespectador. Mas Di- ‘dro: nto se sarsfes com a perspeetiva estado dramaturg. ‘Para ele, 0 teatro algo familiar de todoro& pontos de vita hnajuventude, conheceu ores eatries nos bastldore ¢ fora ‘eles, chegou mesmo a considera osonho dese tomar come dante, mas, acima de tudo, foi um freqdentador insacivel ‘des sala de espticule. Acompanhandoromuma de suas evo ‘apdes deste mocldade tumaltusa, podemos distingul-lo me lena plata, surprendendo os demets expectedores, 00 fa ar as ouvides para melhor rr gestos © movimentas dos ato- bres. A vando desta exiavagincia €0 pessuposto de que 0 re ‘Curso priprin do teatro 0 de “colocar em aga sob.os mews ‘thes Aus, fmaldade comm de todas a artes de ita (ho, 16 sordpostvel no teutro ue esta partcularidade, que 0 “praxima da pinta, for respeitada eserapulosamente. Deste ‘modo, 56 quiser que “a sao ndoseia momentanea ¢ aim rest facae passageira", 0 dramaturgo nao poderd apelar para 0 "espirito” do especiador, como alpuerm que mexesie ‘Eom normas morais de erdterabstrato © gral. Imitador de ‘apes que'ocomediante da ver. o dramaturgo precisa secon encerde que sew objetivo édiigirse @sensblidade da pax Uli, que ndo desea ser sobrecerregada com paras, mat Yat ‘0 tetra em busca de “impresses”. E preciso, pois que 0 ‘iperdcul earal assuma sua Incegridade de apartacia. Fa endo uso de sua prtica como critic de pincura, Diderot pro- urou resgatar a importancia propriamente espetacular do teatro. Por isso, no Discurso, demunciou "a pobreza flsi- dade dos cendros” ou "o buxo dos trajes” como siniomas Imaiores do dvério entre oteuro ea verdade, restabelecendo ‘importncia do cendgrfo edo fgurnita: ou ent, atento ‘ns detathes aparentemente mais desimportantes, exit que poeta dramético fosse"isianomista’, isto, que erase seu [personagem e,ato continuo, tmaginase um rasto para el ‘Mais elogiente, porém, fo 0 incansivel combate de Diderot feontra um teairo de grandes poeta, equivocadamente sed ldo por achadas postico etradas delamatdras: contra a ‘redusao do teatro & poesia, Diderot insistu na prosificagao do texto dramico, mas. sobretudo, na meulipicapio das cenas Dantomimicas, na notapao de cada deal das avtudese das ‘expresses, ma incluso, por entre atrama do didlogo, de ver “dadeirasconas mudas ~ quadros ~ onde 0 gesto ¢ mals elo- ‘ene do que a pelavra. Nese exforgo de pensar 0 teato em {oda sua riqueza potncialidad vais, no de se expantar ‘que um dia, ao exerever 0 Paradoxo, Diderot foselevedo omsiderar0expetécul apart do comediante, exallando mo lalento desea apoteose da aparénca. LF. Franklin de Matos Da poesia dramatica Ao Senhor Grimm’ 1. Dos géneros draméticos ‘Se um povo nto conhecesse tendo um gbnero de espeté culo, prazeroso alegre, ¢ se Ihe fosse proposto Um oUt, Stig € comovente, sabes, meu amigo, 0 que pensria cle & Fespello? Muito me engaao ov, apis conceber essa posibil- fade, os homens sensats certamente driam: “Pare que est pinera? Nao bastassom os males reais que a vida nos caus, ‘Goerem ainda nos fazer outros imaginirios? Porque adit & 1 aon ts ts metin ESS ‘ste Se Pare: Dent manip aoa hi, po oaroant Sorcerer aeeteneraet ‘Eisen rt eat Ora ‘Oma So tristeza até em nosios dvertimentos?”. Falariam como pes- Sous strana a0 prazar de se enternecer e derramar It ima.” ‘O habito nos torn catios,Surgiu um homem com uma ‘enteha de génio? Produ alguma obra? A. principio, ele Sorpreendee divide os espiitos; pouco a pouc, os reine; logo {seguido por uma multiddo de imitadores: os modelos se mul tiplicam, es observagies se acumulam, colocam-se egras, a itenassee seus limites sh fxados.Proclama-se que € extra: ‘agante ruim tudo © que alo cabe no esteito recto tr ‘ado. Sto as colunas de Hercules nao se int além, sob pena Seextavie. ‘Mas nada prevalece sobre o verdadeiro. O que & ruim passa, apesar 80 elogio da imbecdade, ¢ © que bom per Imanece,aperar da vaclagdo da ignortncia e do clamor da fnveje 0 denlorivelé que os homens s6 obtim justiga quando jo vivem, Somente depots de serem atormentados em vid, Llgumas flores inodoras sto lancadas sobre suas seplturas ‘Que fazer, pois? Sossegar, ou resignarse «uma le que sub- Seteu outros, melhores do que nés? Deseracado daquele ave eentregar com afinco a uma ocupasto, seo (abalbo no for ‘Tone de sus mais doces momento, eee no for eapaz de Satistazerge com povcossulragcs O mero de bons jules & Timitado, O mev amigo, quando ter pubicado algo — sein 0 fsbogo de um drama, uma iia Masia, um fragmento de ‘moral ou de iterators, pots meu esirito espairece com a va- FHedade —irel ter convosco, Se minha presenga no vos for {importuna, se verdes a0 meu enconto com um ar satis, ‘esperar pacientemente que 0 tempo © a eaidade, sempre {taride peo tempo, venom apreciara minha obra." en iitganime ch arepmte ate Seo ee Seca tne at oan es a Aare Mr Shits mee eect TEieiaSe case DISCURSO SORE A FOKSIA DRAMATICA ” Se existe um género df introduzic um novo. E este introdusida? Outro preconceito: logo se imagina que os dos ‘inerosadotados ste vzinhos ese team. Zeno negava a Tealidade do movimento. Como Gnica resposta, seu adversiro e pés a andar e mesmo que tivesse apenas coreado, ainda asim teria respondido." “Tentel dar, em O Filho Natural, a idéia de um drama situado entre acomédiaea tragédia (0 Pa de Familia, que ento prometi,"e qu foi etardado ‘or continuasdistrages,situare entre 0 nero serio de O Pilko Natural ea comedi. "Ese algum da tive tempo coragem, espero compor um rama que s ache entre opine sérioea rapedia. ‘Quer se reeonhera nestas obras algum mérito, quer alo ‘thes conceds enum, elas sempre demonstrario no ser ‘Guimérico o intervalo que eu perebiaentre os dois géneros ‘rabeleidoe TL Da comédia séxia Fis, pos, o sistema dramatico em toda sus extensdo. A ‘comédia jocosa, que tem por objeto ordieuoe 0 vico, a so ‘média séra, que tem por objeto a virtude eos deveres ho mem. A tragédia que teria por objeto nossas desgrapas domts- tias ea trapéia que tem por objeto as catstofes pablias © 5 desgragas dos grandes. SES Varese ct enn ox sve bt: Se me Mas quem nos pintark com vigor os deveres do homem? ‘Qvais serio ae qualidades do poeta ase propor esse tarela? ‘Que ele a feof, qe enka merguhadoemsi mesmo, sends desse nodo anaturers humana, que se insta profn- Uamente sobre or estades em que se divide a socedade, co ‘thecendo hes ber a fungBese 0 peso 0 inconvenientes © as vantagens. ‘SMa como encerrar nos estitos mites de_um drama tudo o ave pertence& condo de um, homem? Que intigs poder sbranger este objeto? Em tal nero, sero feitas de [oelaspecas que chamamos episica:cenasepshdicas suc ‘erto cones episodicas edescosturadas ou, no méximo, liga- ‘des por uma pequena inrien serpenteando entre elas. Mas ‘Sem unidade, com pouca acto e nenhum interese. Cada cena Feunlel os dois pontortto rcomendados por Horicio,” mas fifo haver conuntae o todo ser desprovido de consisténcia © ners” ‘Se as condies dos homens nos proporcionam pesas ‘come 0: Importunas de Mole, por exemplo, jt € alguma ‘ols: mas crelo que dso se pode trar melhor partido. Nem fodas as obrigagbeseinconvenientes de um extado tm igual Importinea, arecesme que podemos nos aplicar aos prini- Dabs fazer desis a base da obra e debuar 0 resto para os de- Tathes £ que me propas em O Pai de Familia, onde o eta- ‘elecimento do flo e da fha é 0 meu grande exo. A for toma, omascimento, aeducaplo, os deveres dos pas para com tos ilos e dor fils para com os pais, 0 matrimdnlo, 0 cel ‘ato, tudo que se elere A condigio de um pat de familia & transmitigo pelo dlilogo, Se um outro entrar na liga, tendo ‘talento que me falta, vereso que ers sew dram. DISCURSO SORRE A OESTA DRAMATICA » ‘As objees contra este género s6provam uma coisa: que lento & de ic manejenem pode ser obra de uma eviana; fupde mais ate, conhesimentos, gravidade eforea de expat, lige psi coments agus gue Se consgram 30 4 bom julgar uma producto, nto € preciso refer a ‘uma outta prodagto. Fol asim que seenganou um de nosis Drimeiros erticos. Diss ele: "Os antigos no tiveram Opera; Dortanto, a épera é um mau género”. Mais eireunspecto ou ‘als nsraido, talvez dasese! "Os antgoe posuiam apenas ‘oma pers: portant, nossa tagédia nto é bos" Fosse oi ‘melhor, ao favia nem um, nem outo raciini. Pouco im ‘existam poetas. Caso contro, como se teria julgado 0 p meio rma Era bom poraeapade? grado, pore ‘Paro poeta dramitico, os deveres dos homens cons vem wen fio to ric quanta seus close rdieulos. AS pecas honestase srlas sempre aleangado fxito, mas certameate sinda mals entre pov corrompides do que em outra parte. Tndo a0 teatro eles se esquivardo da companhia dos perersos que os cercam: € ld que encontrario aquees com quem go {iviam de vive; € 1 que yerdo aespéce humana tal qual é, econciiando-se com ela. As pessoas de bem so raras, mas Pertpeatrion ire Batemans See: i a i a ie eat ‘eat ‘Semmes mn ari dvi A. Ga Resco ‘Siltaldoata steeped ae, imc on eof Sve gt ‘Rarictev oem ce oe arr reno [Entiat conga Mgt mtinan ies rem asa, ie Rite Ste eee pa er aes {Eo seneacomeme epomet“€ pies gens ae or ‘i Gpeete Seles sop prt Ceadae a todosee ‘beers mr aps ta L a €or bom Pa existem, Aquele que assim nto pensa acus-se a si prio, ‘mostrando como ¢infeliz junto da mulher ds pals, dos ami foe, dor coneeldos que tem. Alguém me diza um dia, apis {Stare de uma obra honesta que deliciosamente 0 absorera: "parece qvefiguel x8", A obra merecao logo, mas os ami+ soso merecam astia "ho escrover,dev-se sempre fer em vista a vrtude © as pessoas vrtaoeas, Quando tomo da pena, sols vs, meu ami fo, du evoco e, quando a, sols ves que tenho dante dos thor «Sofa que pretendoagradar. Se me sorties, ela ‘detrama uma ligrima, se ambos me ttm mals afeigho, snto- ‘merecompensedo. Seman ie mats mee Sg res re ‘Saeed te aceon Some ae tad ow ce ses nnn Arn mer saat actions saat eta ata Sane pce peg St creame map bee Taina DISCURSO SOBRE A POBSIA DRAMATICA “ ‘Ao assstirascenas do camponés em 0 Falso Generos, sfirmel: Bis © que agradaré a todo mundo, em todos os tem- os, arrancanda pranto. O efeito confirmou meu juizo. Este ‘osha pertence ineirmente ao nero honestoe sro ‘0 exemplo de um episédio feliz nto prova nada, dir se, Se nto interromperdes 0 discurso mon6tono da virtude ‘om a algazarra de alguns caracteresrdiculos © mesio um ‘pouceforeadoe, como todos fazem, o que quer que afirmels to género honest e sro, continveeireceando que dele rei fess somente cenasfrias¢incolores, uma moral aborrecida © {rstee alg como sermiesdatogados."” Percorramoe a pares de um drama e vejamos. Devese {lato pelo enredo? No gnero honesto eso, oenredo nio ‘menos importante do que na coméalajocsa, sende tatado ‘dea maneire mais verdadeira. Polos caracteres? Em tal ‘lnero, eres podem ter tao dverose to originals, o posta endo obrigndo # desenhiclos com mais firmera ainda, Pelas Dairbes? No gene sri, mats enérgicas estas se revelarem, flor sero interesee, Polo exo? Ese serh mais vigroso, mais grave, mas elevado, mais vlento, mas ssceptvel do {que chamamoe sentiment, qualidade sem a qual estilo algam {tle ao coragto. Pea asencla do raiclo? Como so desatino dda ages e dos scursos, quando sugeridos por um ineresse ‘mal compreendido ou peo arebatamento da paixto, no fos ‘eo verdadeir rifeulo dos hamens eda vid, co apeo aos belo trchs de Terncloe pergunto em ‘que gener foram exeritas suas cons de pase amantss, (52 Pen niece, ol pai po ae pasetges mares ran oa ete nmr Be a, + Crs nb, ae Se em 0 Pai de Familia nto estive & altura da importin ‘ia do mou arguments se seu andament € fri, as paixdes Toquazese moralistas: se fata vigor comico a0 earacteres do Pat, do Filho, de Soin, do Comendador, de Germeuil « de Cech, devese culparoginero ou aim? Que algvém se proponha a encenar a condigto do juz aque tegaoenredo de uma formato interesante quanto com porta e quanto oconcebo; que, pels Fungbes de seu estado, 0 FRomem sea obrigado a fata dignidade ea santidade de seu Iminstrio— desonrando-s aos seus lose aos dos outros — (ue serfcar suas paises, gostos, fortuna, naseimento, ma- Ther efios proclamese cm seguida, se assim se quise, que fo drama honesto sério € desprovido de ealor, colorido © forva ‘Sempre ave o bite ou a novidadetornam incerto mew julgamento — pos um e outro produzem tal elito — recorro ‘tums forma de decio que muitas vezes me proporcionot ‘bone resltades:&'8 de captar os objetos pelo pensamento, transportiloe da naturers para tla eexaminglos a esa flistdnea, onde nBo estio demasiado longe ou demasiado pert demi.” “Apliguetios aqui este critro. Tomemos duas comédias, ‘uma no gine sri, outra no einer jocoso; montemos, com ‘ada cena, dias galeias de quadros¢ velamos qual pecor- ferlamos por mas tempo ecom mais prazer,em qual expe: ‘imentariamos sensagbes mas fortes e agradivels equal delas feriamo lerados a revista Insist, pois: © honesto, 9 honesto. Ele nos comore de forma mait intima e dace do que aquilo que provoce nosso

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