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Oar eee ce Bem-vindo reagate Paseadospratiamente vite anos dele seu: lngamento em 1979, lero mit conhecido de slean-Prangis Lyotard smantém stu poder eacarecedo, ate ar de mancra extremamente nda © cinta um. panorana das tamara: (es mais profandar que afetam a cult 1 ocidental neste nowo fin de Eco [Ne verdad, © arco histice dae tranae FormagGeeetraturaie abordaas no lero tstendese entre dt Finis de século. [Neste semdo, o panorama de tendéncine de curt, méi longo prazoe sponta por Lyotard vin sendo prepared, no vel das conde hivcas de prog de conhecimento« tecnologia, doe oF ‘alts cientfcos ccoridon na irda dbo sdcal XIX para 0 XX. A estratura Snterpretativa erabalhada em A iso nse il ao eoencal da clea atria hegeiano-marsst. Ou wi, sina de que mancia uma sucesso de transformsiee quantttives pequense acaba por determinar am ako qualia vo, uma madanga de Gpoc. Do moder 0 péemoderno. ‘A presente edigh raz uma novidde sigificatva,Corrge otto, rertabele: ‘end corvspondénca eta com 0 ‘rsinl. Lyotard ezteve um veo #0- leo cnlise péewmoderna eno sabre 9 *paemodenno". Not anos 80, falar em *pwmodere" come algo pronto te ‘bdo, eru ion de um ipa de sbor dager ech eal “mower qa completamente conta o expr Jo ex de Lyotard © flo irtaysse poe Fandamente com ese tipo de prop so de eu pesament, bastante comm entre inelectuae “pérmedernictae” nvr Feral do a UOTE CATAL 76 en Conneayto ACONDICAO . POS-MODERNA Ome_a3 pe | ™pR0 8 bee | etek dears lacay | omececon sos 5 LX epagag, ee ea JEAN-FRANCOIS LYOTARD A CONDICAO POS-MODERNA a 12" edigio JOSE OLYMPIO EprroRA “Tul do origina francés: TACONDITION POSTMODERNE (© Les Batons de Mimi, 1979 Reservam-se os dios desta eigto8 [EDITORAIOSE OLYMPOLTDA. ‘Rus Argentina, 171 ~3" andar ~ Sto isto 20821-360~ Rio de Janeiro, RJ— Replica Federaiva do Bras “Ts (21) 25952060 Frc 21) 285-2086 sored soto (2) 255 2002 ISBNSTESSA.06585 (Cap: Vier Boros ]UNIVERSIDADE FEDERAL 0» « A2A] BIBLIOTECA CENTRAL Ws sun FRR TEA GERTAL NOTA Eorravo pela primeira vex no Brasil, por festa Casa, em 1986, est loro recebet 0 titulo de © pésmodemo, até sua quarta edlgao, Quase vinte ance depois de escrito = Lyotard 0 pubiicou na Franca, em 1979—, procuramos resgatar set titulo original: A condigto pos-moderna, por representar mais fielmente as tdétas do Bie volume traz um posfcto, assinado ‘pelo crico Slviano Santiago, em que asst- nala a importancia do pensamento de um dos filésofos mais combartvos do nosso séeulo, morto, aos 73 anos, em 22 de abril de 1988. Setembro 1998, woven FD. 00 RA TEA CEMRAL SUMARIO ‘Tasos Pos woDeNos (Wimar do Valle Barbosa) sroDucto. vi A.CONDIGCAO, POS-MODERNA, (© campo: 0 saber nas sociedades informatizadas. © problema: a legitimagl0 mons : ‘© metodo: os jogos de linguagem A natureza do vinculo social: a alternativa moderna ‘A natureza do vinculo social: a perspectiva pés-modema 27 Pragmatica do saber narativo, 35 Pragmdtica do saber clentiico v7 ‘A fungio narrativa e a Jegitimacao do saber... St (Os relatos da legitimag0 do SabeF.nnsnnn 58 @ 7 8 » A deslegitimacio, ‘A pesquisa e sua legitimacao pelo desempenho.. ‘O ensino e sua legtimacio pelo desempenho, A citncia pos modesna como pesquisa de instablidade. ‘A legitimagao pela paralogia a Posrhco: A artosva ExTauOREZAGO DO SABER (Sloano Santiago). a eee id VERSO FERAL D0 PA TEENA, ‘TEMPOS POS-MODERNOS “A verdade € que « citmia favoreceu a forge intelectual rude © francamente insuportivel todas es vethas ropresentagies metafsices © moras da rapa humana.” (Robert Ms © homem sem qualidades, 1) Com o inicio, por volta dos anos 50, da chamada ésindustial”, assstinos a modificacbes substantivas nos estatutos da ciéncia e da universidade. O mats importante esse proceso de madifcagio,euja rigem encontrase na “crise da ciéncia”(e da verdade) ocorride not iltimos de trios do sée. XIX, ndo fol apenas a eventual substeuiio de uma “ma concepcao da ciéncia (a empirista, por exem- lo) por outra qualquer. O. que de fato vem desde entao ocorrendo é uma modificagio na natureza mesma da cifn cia (e da universdade) provocada pelo impacto das trans Jormacées tenoldgicas sobre 0 taber. A conseqténcia mais ‘melita desse novo cenirio foi tornar incfcas 0. quatro teérico proporcionado pelo filésofo (elase:metaisco) moderna que, como saberos, elegen como sua questao @ problenitica do conbecimento, secundartanda ‘as ques {es ontoldgicas ent face a gnoveol6picas. Mas, ao proce der dessa mancira, jez da fosofia um metadiscurso de legitimacio da propria ciénea, A modertade do. quatro tebrico em questao encontrese exatamente no fato de com ter certs recits os quais @ cléncia moderna eve que re correr para legtimarse como saber: alta do esprite, emancipagio do sujeto razodvel on do trabalbadon eres: cimento da rigueza ¢ outros. Desde 0 momento em que Se invalidou 0 enquadramento metaisico da ciéncia mo- dderna, vem ocorrendo nao apenas a crise de conceitos ca 10s ao pensamento moderno, tais como “razio”, "sujeto”, “wotalidade”, “verdade”, “progresso”. Constatamos que «0 lado dessa crise operase sobretudo a busca de novos en (quadramentos teéricos (“aumento da poténcia", “ficicia”, “optimizacio das performances do sistema) legitimadores da produgio ciemificotecnoldgica muma ere que se quer posindustrial. O posmoderno, enguento condicao da cul- ‘ura nesta era, caracteriza-se exatamente pela incredulida- de perante 0 metadiscurso filosificometafisico, com suas pretensoes atemporas e universalzantes. © ceenirio pxrmoderno 6 essencalmente cibernéico- informitico e informational. Nele, expandense cade vez mais os estudos e as pesquisas sobre a linguagem, com 0 objetivo de conbecer « mecinica da sua producto ¢ de textabelecer compatiblidades entre linguagem e miguine in- formitica. Incrementemse também os estudos sobre a “ine teligdncia artificial” € 0 esforca sistemitico no sentido de conbecer a estrutura e 0 funcionamento do cérebro bem como 0 mecanismo da vide, Neste cendrio, predominant or esforcos (cientificas, tecnoldgicos e politicos) no senti- do de inkrmata a ida. Spor am lado, een 2 colidianizaao da tecnologia informitica jé nos im. Doom sérias rellesdes por outro lado, seu impacto sobre 4 ciéncia vem se revelendo considendvl ns le (io 8 formato). queen de riecdade. ie prada) questa fideo FOr ces (nemamtoasonea de dad toborder dat flow) © rola a cemra ea, guess calor (veld midds ela e » pmol Homage de, menuem Wek fin samntide por site) suet policosris Cemocrtzngo Iniormagioredleuo de canara, perndoca soccer) ds" nor Tinea sabre cones tele rege eg, 0A aurea, A ciéncia, para 0 filésofo moderno, berdeiro do Iw sminismo, era vista como algo autorreferente, ou sea, exis. tia e se renovaca incessantemente com base em ki mesma Em ontras palaoras ra vista como atvidade "nobre", "de- Ainteresada”, sem finlidade preesabelecid, sendo que sua funcao primordial era romper com o mundo das “re. was’, mando do senso comum € das erent traconas, contribuindo assim para 0 desenvolvimento moral e esp ritual da nagio. : Nesse contexto, a citncia no era sequer vista como “ualor de uso” eo idealismo alemito pode entdo concebéla ‘como funduda em um metaprincipio filosbfco (a "vida di- vina”, de Fichte, ou a “vida do espirito”, de Hegel) que, or sua vez, permitiu concebéla desvincilada do Estado, a sociedade e do capital, e furdar sua legitimidade em "Nacio" ¢ “ciéncia” caminbarana juntas, por exem- plo, na avaliecio bumboldtiana, de sabor bumsnisticolibe- tly € que esteve na base da criagio da Universidade de Berlin (1807-10), modelo para muites organizagier uni versitirias nos meados do abe. XX. No entanto, 0 cenirio pés-maderno, com sua “voce 20" informitica € informacion, “investe” sobre esta concepsio do saber cientifico. Como muito bem notou Alfred N. Whitebead, 0 sée. XX vem sendo o paleo de tuma descoberta fundamental. Descobrv-se que @ fonte de todas at fontes chanase informasio ¢ que a ciéncia — assim como qualquer modalidade de conbecimento — na da muis é do que um certo modo de organizar,estocar € distribuir certs informacdes. Lange, portato, de cont tnuar tratando a cigncia como fundada na "vida do esp 10” ou na “vida divina"; 0 cenirio pés-moderno. comeca 4 véla como um conjunto de mensagens postoe! de ser tradusido em “quantidade (its) de informagio. Ora, se ‘as méquinas informiticas justamente operam traduaindo as -mensagens em bits de informagao, x3 era “conbecimento x cientifico” certo tipo de informacio traducivel na lingua ff gu ess gene atic on ene compat om ela. O gue se impoe com 0 tratamento informético da “mensogem” cientfica € na verdade wma concepcio ope nacional da ciéncia, Nesse contexto, a pesquisa centifica passa a ser condicionada pelas possbilidades vécnices da manna informbicny 0 que exapt on frances tt sibilidadestende a ndo ser operaciona,j& que no pode {or tradutido om bi. Asin sndo,« atbdade cena deixa de ser aguela praxis que, segundo a avaligio bu- imanisticoliberal,especulatioa, investia a formasio do “es pirto”, do “sueito razodvel”, da “pessoa bumana’” até ‘mesmo da “bumanidade”. Com ela, 0 que vem se impondo & a concepcio da ciéncia como tecnologia intelectual, om scja, como valor de troca e, por isso mesmo, desvincala- da do produtor (cientista) e do. consumidor. Uma pritica submetida ao copital e ao Estado, atuando como essa par- ticular mercadoria chamada forca de producto. Esse processo, fruto da corrosao dos dispositivos mo- dernos de explicagio da ciénca, & muito epropriademente ‘esignado por Lyotard pela expressio “deslegtimacao”. No mano, le Wo we 0 atts om Tso de crsto do “dispostivo especulativo” (Idedlismo alemGo, Hegel) ow do “dispositive de emancipagio” (Iluminismo, Kant, Marx). Esse corrosio (que Nietzsche entendew ser’ wma das ral es do “Nilismo ewropen”), muito bem captada em nar- rativas como Pais ¢ flhos (Ivan Turguenicv), ©. homem sem qualidades (Robert Musil) ¢ Sonimbulos. (Herman Broch), fez surgir novas linguagens que escapam as deter- minacdes tebrcas dos dispostivos modermos e aclerem sua prépria deslegtimagio. Da segunda lei da termodindmica 4 teoria da catistrofe, de René Thom; do simbolismo qui- ios gas alo dents de tori dor uta 3 Hsica pés-quintice; do uso do paradigma cibernttico-infor miley no estudo do codigo genttco co ressirimento da cosmologia de obseroacio; da crise da Weltanschauung RSA FEAL sRTECACevAL ewtoniane a recuperacio da nogio de “acontecimento”, “acaso™ na fisica, na biologis, na bistbria, o que temos ¢ 2 te de wma noo contr nos disposes de legit asio € no imaginério modernos: a nogio de orden. E com oa asstinas& redscussao da nocio de “desordem? 0 gue por sua vez torna impossivel submeter todos os dit= cursos (ou jogos de linguagens) & autoridade de um mete discurso que se pretende a sintese do significante, do sig nificado ¢ da prépria signficagao, isto &, universal e ‘consstente, Por isso mesmo & que as delimitagbes clissicas dos ‘campos cientifices entram em erie, se desordenam. Desa. arecem disciplinas, outras surgem da fusto de antgas; ax velbaslaculdades dio lugar as institatos de ensino efou ‘pesquisa financiados pela iniiatioa privada, pelo poder pa- ‘04 por ambos. A universidade, por sua vet, enguan 40 produtora de citncia, torna-se uma insttuigdo sempre tals importante no cileulo estratégico politico dos Esta- dos atuais. Se a sevolucio industrial not mostrou que sem riqueca ngo se tem tecnologia ou mesmo ciéncia, a condi- #%o pbsmoderna nos vem mostranda que sem saber cien- fico ¢ téenico ndo se tem rigueza. Mais do que isto: mos- tranos, através da concentragio massva, nos patses ditos pésindustries, de bancos de dados sobre todos os saberes hoje dispontveis, que a competicio econbmico-politica entre as nacses se dard dagui para frente io mais em Junio primordial da tonelegem anual de matéria prima ow de manujaturados que postam eventualmente produzi. Dersed, sim, em funcio da quantidade de injormagio 5 Gt. Communicaons, n° 18, 1972 (ndmero epee sobre reomade dn norto Ge scomacenen pele cite voniemprdnen 1 Stbe a centallgnds dee elincnao natal fred psgla cent fn En Morin La eve fa ae att Lama 1 Ua wie la ie ¢ Le pole peda la ralure humaine, toot ela Eaitons Sul, Pas ‘om 197, (000 197, reapetivsi, técnico-cientifica que suas universidades ecentros de pes- “quisa Forem capazes de produzir, estocar-e-fazer circular conto mercadoria. 0 contexto da deslegitimacio pés-moderna nia_pode, ceidetement, pasar sem 1 dips de legit. domo dr, ers Ly ne om ipl nao&tento toma pote da argumentaao desing Tre ier conenimenin dos destination da mens. toot cin, poe saa nr seine fos oc evo de lingtetem ande’o ue ell om questao no € & vverdade mas odesempenbo, ou seja, @ melbor relagio t/output” (p. 83). Como novo dispositivo de legiti- secPariino do decmpenho impbe 10 spent 0 Thandove do dsearto humantetbont por parte do Es ‘tan de capil on mesma da unorsiae. We meds em ttn bt’ €mentr oe, di roma dues. dover o importante ago ao alan svedade, ima. Tocaear sere no tntido de aumento eh, de mins fa ft inosine fr Spur idler coceeaiete eter loer'¢ aio Fee cide mas sr formar competes esp de Me a nes mes ws Eo amen ob “Apis erst comiderade, pree-nos recoil dar ue oteste de Lyotard contin, peta, ame dicen Ge gut rputanes findement: 0 omcesioprnoder Sends ltnar deen epistemoligcn sipiicat torent or cen eae een SP den or wen or arcanurane, motos, shies dposteos ngdertas te leiimaci, pte fo pres jon kee erdade "pote no poe st epae TECTIA, dos. A idéia baconiana de que 0 conbecimento € 0 poder parece, sem divida, animar a construgio do dispositive pérmoderno de legitimacio. No entanto, & preciso noter ‘que, para Bacon, pensar dessa mancira consitula um mo. do de tenter abolir a oposigio entre “técnica” ¢ “eman. ipacio” sem 0 abandono desta. O fildsofo inglés era do parecer de que a construcio de um “novo mundo” eva obje. tivo fundamental e que s6 pela via de um coubecimento ‘que deixasse de ser concebido como. contemplagio|desig- nacao de uma “ordem eterna”, perfeite, divina trans- Bistdriea, poderlames consiruir'uma comunidade livre de “idolos"" A problemética do "novo mundo", no entanto, parece nto seduair 0 filésofo parmoderno, avesso as file: sofias da subjetividade aos metadiscursos de emancipa- so, Preocupado com 0 presente e com 0 reforgo do cri- trio de desempenbo — crtério teenoldgico — visando com isto 0 reforco da “realidade” e 0 aumento das chan- ces de se ter “razio, ele parece ter abandonado os cami- bos da utopia, esse modo de encantar 0 mundo que ani- ma at lgdes de Bacon e de outros modernos. Estas, por sinal, mostram 0 esforco do filésof0 no sentido de supe- tar 0 divércio entre inteligencia e emogio. Para isso € sem divide necessério que o conbecimento (inclusive a filo- sofia) esteia mais perto do concreto, do presente, coope- rando com as forgas do econtecimento, decodificando e dando cocréncia eos detalbes da cotidianidade. Mas tudo isso com 0 objetivo de resgatar 0 encantamento que as religioes proporcionaram aos nossos ancestrais. Estar, sim, perto do cotidiano, do presente, mas visando a interpene. tragio da emogio e da ciencia, da paixio e da inteligencia, do sono ¢ da pritica, de forma que a poesia posta vir @ ser a flor esponténea do mundo juturo. Rio de Janeiro, outubro de 1985 ‘Winak D0 VALLE Banwosa ai es FARA 00 HLOTECA CENA, INTRODUGAO Este exo tem por cbjto a posico do saber nse tociodades mais desenvalvides, Decide chaméla de “péemoderna". A pala € wsade, 00 continente amet ino, por socidlogor e cticos, Desgna 0 estado di ca ture pcs as tranformades que afetaam as regras dos fogos da cnca, ca lteratara ¢ das artes a part'do final do século XIX. Aqui, esas transforms serio situadat em relagdo cise dos telaton, Oniginimente, « ciéocla entra em, conflto com os relatos. Bo ponto de vistn de-seis propros crteios m io ae dees hinornovelanee como ful, Ma, ta medida em que noe limite a emsnciar regulardades tis © que bosque 0 verdadero, deve legiinar sue ze gras de jogo. Asim, exerce sobre seu props estatato tum discumo de legiimagio, chamado flosolia, ‘ste metadisurso tecorre explictamente «algun grande felato, como. cislétice do espfrito, « hermentutin, Jo sentido, a emancipagio do sujet rational ou trabalhadar, © desenvolvimento da rigueza, deidese chamat “mo” glen ls ua to a referent asim, por exemplo, que a repra do conenso ene © fe. metente © detintsio de um enunciado com valor. de werdade Serf tida como accitével, se ela se insceve na Petspeccva de tua unanimidade fovsiel de menalidades Ficions: fof este 0 melato dis Luzes, onde 0 her do saber tabalha por tm bom fim éticopoiico, & pur unt versal. Vé-se neste caso que, legitimando 0 saber por um meta ‘que implica uma filesofia da histér cconduvidos a questionar a validade das instituicées. que tegem o vinculo. social: elas tami devem ser lepitima- das. A justica relacionase assim com 0 grande relato, no ‘mesmo gra que a verdade. Simplificando ao extremo, considera-se“ps-maderna”” 1 incrothulidade-em-relacio_aox_metatrelatos. E, sem di vids, um efeito do progresso das cincias; mas este pro- igresso, por sus vez, a supde. Ao desuso do dispositive metanarrative de legitimagdo corresponde sobretudo a crise da filosofia metafisica ea da instituigio universi- tiria que dela dependia. A_funcio-nerrativa_perde-seus vores (funetewrs), 0s grandes hersis,.os grandes perigos, ‘os grandes périplos eo grande objetivo. Ela_se-dispersa fem nuvens de clementos de linguagem narratives, mas também denotatives, prescriives, descrtivos ete. cada um vveiculando. consigo” validades _pragméticas su_genayisr Cada um de nés vive em muitas destas encruzilhadas. No formamos combinagies de linguagem necessariamente es- tiveis, e as propriedades destas por nés formadas no so nccessariamente comunicdveis. ‘Assim, nasce uma sociedade que se baseia menos numa antropologia newtoniana (como o estruturalismo ou 2 teoria dos sistemas) ¢ mais numa pragmatica das part culas de linguagem. Existem muitos jogos de linguagem diferentes; tratase da heterogencidade dos elementos. So- ‘mente dardo origem 2 instituigio através de placas; € 0 determinismo local. ‘Nao obstante, os decisores tentam gerir estas nuvens de socialidades sobre matrizes de input/output, segundo uma Iégica que implica a comensurabilidade dos elemen- tos € a determinabilidede do todo. Para eles, nossa vida fica reduzida ao aumento do poder. Sua legitimagio em iatéria de justiga social e de verdade'cientifia seria a de cotimizar as performances do sistema, sua eficicia. A apli- > eg Fete 00 TEA CENA ‘acto deste ctitério a todos 08 nossos jogos nfo se realiza sem algum terror, forte ou suaver sede operatéios, isto &, comensuriveis, ot. dessparceei. Esta légica do melhor desempenho €, sem divida, inconsistente sob muitos sspectos, sobretudo no que se refere 3 contradigio no campo. socioeconémico: ela quer, simultaneamente, menos trabalho (para baixar os custos dda producio) e mais trabalho (para aliviar a carga social da Populaco inva). Mas a incredldade resultant tl ‘que nio se espera destas contradigdes uma saida. sav dora, como pensava Mare, ‘A condigio pormoderna é, todavia, tio estranha 20 desencanto como & positividade cepa da deslegtimacio. ApGs os metarelatos, onde se poder encontrar @ legit midade? O critério de operatividade € teenolégico; ele no € pertinente para se julaur © verdedeiro e 0 justo. Seria pelo consenso, obtido por discussie, como pensa Habermas? Isto vioientaria a heterogeneidade dos jogos de linguagem. Ea invengio se faz sempre no. disenti mento. O saber pésmoderno niéo € somente 0 instr: mento dos poderes. Ele aguca nossa sensibilidade para as dlifereneas ¢ reforca nossa capacidade de suportar 0 in- comensurivel. Ele mesmo no encontra sua razio de ser na homologia dos experts, mas na patalogia dos inventores. ‘A questio aberta € a seguinte: uma legitimagéo do vinculo social, uma sociedede justa, seri pratcavel.se- undo um parsdoxo andlogo 20 da’atividade cienifca? Em que consistira este paradoxo? O_TEXTO que se segue ¢ um esctito de circunstincia. E uma exposicio sobre o saber nas sociedades mais de- senvolvidas, proposto ao Conselho das Universidades junto so govern de Quebec, a pedido do seu presidente, Este ‘imo autorizou amavelmente sua publicagio na Franca, aqui the agradeco. awit Resta dizer que 0 expositor & um fildsofo, ¢ nfo um expert. Este sabe 0 que stbe e o que nio sabe, aquele nfo. Um conclu, © outro interroga; sio dois jogos de lingua: sgem, Aqui eles se encontram misturados, de modo que rhenhur dos dois prevalece. (0 fildsofo a0 menos pode se consolar dizendo que 4 anilise formal e pragmftica de certos discurses de legi- timacio, filoséfces éticopolitces, que sustenta nossa Exposigi, verd a luz depois desta. Ela a terd introduzido, por um atalho um pouco sociologzante, que, embora a re duzindo, a situa Tal como esté, nds a dedicamos, a0 Instituto Pol- téenico de Filosofia’ da Universidade de Paris VIII (Vin- cennes), neste momento muito pésmodernd, em que esta Universidade corre © rico de despues © © intro soil END Feng 00D TEAC A CONDICAO POS-MODERNA © CAMPO: 0 SABER NAS SOCIEDADES INFORMATIZADAS Nossa hipstese de trabalho € a de que o saber muda de estatuto ao mesmo tempo que as socedades entram a idade dita pésindustrial ae culuras na Made dta ple. moderna Esta passagem comegou desde pelo. mence © final dos anos 50, marcando para a Europe o fim de son reconstrugo, Foi mais ou menos ripida conforme os pa ses c, nos pales, conforme os tetores de atividade: donde tuma ‘discronia_ geal, que’ nio tora ficl © guadro de conjuma® Uma parte das descrigtes nfo pode deixar de ser conjectural. E sabese que é imprudente conceder um crédito excessivo 2 futuroogia? Em lugar de organizar um quadro que nfo poders ser completo, partiremos de uma carscteristea que de- mente neato objeto. O saber centfico € uma espécie de discurs. Ora, pode-se dizer que hi qua- enta anos as cignias e as técncas dits de vanguerda versam sobre a linguagem: a fonologia ¢ es tcories lin. Asticas* os problemes da comunicgio © « cibernétia? 45 mateméticns modernas e a informtca,’ os compotadores € suas linguagens’ 0 problemes de tredagio das lingua gens ¢ a busca de compatibiidades entre. linguagens- as! 0s problemas de memorizagfo e os bancos de dados? a teleméviea e a instalagio de terminals “incl gentes"” a paradovologia:" eis af algumas provas evi enter, © a lista nio € exaustive. 5 * macionais afeta e aletard a circulagio dos con Parece que a incidéncia destas informagies teenol6- gicas sobre o saber deva ser consderivel. Ele € ou serd Afctado em suas dust principais fungées: a pesquisa e a tansmissio de conhecimentos. Quanto % primeira, um czemplo acs ao lego dado ela gendtin, ave deve Sp Pardons nrg 1 hemi, Hi ue nie le outros exe nto 2 segunda, hoje em dia tabe como, normelizando, miniaturizando e comes zando os. spazelhos, modifcam-e as operagdes de aquis- G80, classificacio, acesso ¢ exploracio dos conhecimentas.” E razofvel pensar que « multiplicagio de méquinas infor- tos, do mesmo modo que o desenvolvimento dos meios de ce cexlagio dos homens (transporte), dos sons ¢, em seguida, das imagens (media)” o fer. ‘Nesta transformasio geral, a natureza do saber no Permanece intacta. Ele no pode se submeter aos novos ‘anais, e torarse operscional, a nio ser que 0 conhe: cimento possa ser triduzido em quantidades de informa- fo." Pode-se entio prever que tudo o que no saber cons- fiuido nio € traduvel serd abandonsdo, ¢ que a oem. tagio das novas pesquists se subordinard a condigio de tradutblidade dos resultados eventuais em linguagem de imdguina. Tanto os “‘produtores” de saber como seus utili adores devem e deverio ter os mein de tad nas Tinguagens 0 que alguns buscam inventar e outros apren- det. As pesquisas versando sobre estas miquinas intéxpre- tes jd extdo adiantades," Com a hegemonia da informética, impSese uma certa légica , por conseguinte, um con junto de preserigdes que versem sobre os enunciados scei- tes came “de ier” ; sore Podese entio esperar uma explosiva exterioricagio dlo saber em reagio ao sujeito que sabe (sachar!), em qualquer ponto que este se encontre no processo de conhe- cimento. O antigo principio segundo 0 qual a aquisgSo do saber € indissoctével da formacio (Bildung) do expt Fito, e mesmo da pessoa, cai ¢ cairf cada vez mais em ‘ desuso, Esta relagio entre fornecedores e usurios do co- thecimento ¢ 0 préprio conhecimento tende e tenders a ‘ssumir a forma que os produtores e os consumidores de ‘mereadorias tém com estas tltimas, ou seja,« forma valor. O saber €e send produzido para’ser vendido, ¢ ele é-¢ send consumido-pars-ser valorizado numa nova_ producto ‘os dois casos, para ser trocado. Ele deiza de ser para si ‘mesmo seu proprio fim; perde o seu “valor de uso" " Sabe-se que o saber tornou-se nos sltimos dectnios a principal forga de producéo,” que ji modificou sense velmente @ composigéo das’ populagbes ativas nos palses mais desenvolvidos™ e constitui 0 principal ponto de et- trangulamento pera os pases em vias de desenvolvimento. Na idade pés.industrial e pés-moderna, a ciéncia conser: vvaré-e sem divide reforgard ainds mais sua importincia na disputa das capacidades produtivas dos Estados-nagées, Esta situagio constitui mesmo uma das razSes que faz pensar que o efastamento em relasio aos paises em vias de desenvolvimento niio cessaré de alargar-se no futuro.” Mas este aspecto no deve fazer esquecer outro gue Ihe € complementar. Sob a forma de mercadoria infor tmacional indispensével a0 poderio prodativo, 0 saber jf oe a ee competigio mundial pelo poder. Do mesmo modo que os Estados-nagSes se bateram para dominar terrtérios, € com isto dominar 0 acesso © a exploragio das m ¢ da miodeobra barat, € concebivel que eles se no futuro para dominar as informagies. Assim encontra-se aberto um novo campo para as estratégias industriis © comerciis e para as estratépias militares © politica” Contudo, a perspectiva assim aberta nio € tio sim- ples como se diz. Pois « mereantilizacio do saber no po- deré deixar inacto 0 privilégio que o& Estados.nagBes mo- demos detinham e detém ainda no que concerne & pro- dugio e a difusio dos conhecimentos. A idéia de que estes dependem do “cérebro” ou do “esptrito” da sociedade que 5 eer a eee ene principio inverso, segundo 0 qual a sociedade no Bee ate cea once oD te idaect ee de deat Se re ee fae ot dade e de “ruido” para uma ideologia da “‘transparéncia’ ‘comunicacional, que se relaciona estritamente com a comer- spe Jee bec gis ee ahs ee cue ston a Lp oe ees fa ial En fee ee ee ee ag te oa eine orien oe ee Cece ok Sere oleae de empresas multinacionais. Estas formas implicam que #8 eae Sere reat’ Gon t eogt ‘informacional e telemét ‘a questo corre o risco de tor- arse ainda mais espinhosa. Admitamos, por exemplo, Se ee ee t , des- se da busca metafisca de uma prova ou de luma autoridade transcendente, reconhecese que as condi Ges do verdadeiro, isto é, a5 regras de jogo da ciéncia, So imenentes a este jogo, que elas no podem ser eta: belecidas de outro modo a no ser no scio de um debate ji ele mesmo cientifico, ¢ que nio existe outra prova de ‘que as regras sejam boss, sendo o faro delas formarem 0 consenso dos experts Esta disposigio geal da. modernidade em defini os elementos de um discurso num discurso sobre estes ele- mentos combinase com 0 reestabelecimento da dignidade das culturas narrativas (populares), jf no humanismo re- nascentsta, € diversamente no iluminismo, no Sturm snd Drang, na filosofia idealista alemi, na escola histérta na Franca, A narrasio deixa de ser um lapso da legtimacé. Este apelo expliito a0 relato na problemética do saber é ‘oncomitante 2 emancipagio dos burgueses em relagéo as sutoridades tradicionais. O saber dos relatos retorna no ‘Ocidente para fornecer uma solucio 8 legitimacio das no- ‘vas autoridades. E natural que, numa problemética nar- sativa, esta questio espere a resposta de um nome de hei quem tem 0 direito de deciie pela socedade? qual * esa Fete 00 TEA ENR € o sujeito cujas prescrigées sio as normes para aqueles ‘que elas obrigam? Este modo de interrogar a legtimidade sociopolitca ‘combina-se com a nova atitude cientifiea: 0 nome do heréi € 0 povo, o sinal da legtimidade seu eonsenso, a dlibe- rigio seu modo de normativacio. Disto results infalivel- mente @ idéia de progress; ela no representa outra coisa senio o movimento pelo qual suptese que o saber se acumula, mas este movimento estendese a0 novo sujeito sociopolitico. O povo esti em debate consigo mesmo #0 bre o que & justo ¢ injusto, da mesma maneira que a comu> nidade dos cientistas sobre © que € verdadeiro ¢ falso; 0 ppovo acumula as leis civis, como os cientistas acumulam as leis cientfficas; 0 povo aperfeigoa as regras do seu con- senso por disposigbes consttucionais, como os cientistas revisam A luz dos seus conhecimentos produzindo noves paradigmas”.* Vésse que este “‘povo” difere completamente daqucle que esti implicado nos saberes narratives tradicionais, os uais, como se disse, nio requerem nenhuma deliberacio instituinee, nenhuma progressio cumulative, nenhuma pre- tensio 4 universalidade: sio eles os operadores do saber cientifico, Nao deve causar espanto que 08 representantes dda_nova Tegitimagio pelo “povo” sejam também os des- truidores ativos dos saberes tradicionals dos povos, per cebidos de agora em diante como minorias ou como sepa Tatiamos potenciais cujo destino no pode set senio obs- curantista Concebese igualmente que a existéncia real deste su- jeito forgosamente abstrato (porque modelado sobre o pa radigms do tinico sujeito conhccedor, isto é, do remetente- destinatério de enunciados denotativos com valor de ver- dade, excluindose os outros jogos de linguagem) seja sus- ppenso as insttuigdes nas quais ele € admitido pera deli- berar e decidir, © que compreende todo ou parte do Es- 3 tado. # assim que a questio do Estado encontrase estre- ‘tamente imbricada com a do saber cientfic. Mas vése também que esta imbriescio no pode ser simples. Pois 0 “povo” que é a naglo ou mesmo a huma niidade nfo se contenta, sobretudo em suas instituigdes politics, em conhecer; ele lepisla, ou seja, formula pres- crigdes que tém valor de normas.™ Exerce assim sua com- peténcia nfo somente em matéria de enunciados denota- tivos dependentes do verdadeiro, como também em ma- tGria de enunciados prescritivos tendo pretensio a justia. E exatamente esta, como se disse, a propriedade do saber narrativo, donde seu conceito é retirado, de encerrar am- bas as competéncias, sem falar do rest. (© modo de legitimagio de que falamos, que reintro- dduz 0 relato como validade do saber, pode assim tomar duas diregdes, conforme represente o sujeito do relato como cognitive ou como pritico: como um heréi do conheci- ‘mento ou como um herdi da liberdede. E, em razio desta alternativa, no somente legitimasio no tem sempre (© mesmo sentido, mas préprio relato aparece jé como insuficiente para dar sobre ela uma versio completa NoTAS 97. Sobye a deol enti. ye Sure 9 obraeptemire 1971) Tne gm uber on oy Sioa Pace ‘anim atv formas Ge mvbormagio da ence 90 salem 98, V. Oaldsehni, Les Dilgue de Plan. PALE. 1947 100. Val, Inraduton do rtode de Léosrd da Vine (590, Galina, 197 (cape ame “Marge” ("Nae ed ‘reson (919, “Llano tle plsopes” (1529 DP. Atbenge, Le prblome de Fre ches Arse, PALF 1962. Daher, Ena! ar noon de sre yi de Plan Gal, Herp 5. Rope, Ec aces 190). Hemann 3865 1s vos IERIE FEDERAL 00 PARK OTA CENEAL WM de Cert, D. Tae J Rech Une pt state rape fut Gallina Set ad ue get «mop wer Galo “De ‘ulsangsgs te etsy prs gee daongus ta Imbpart es pane dss rms cums de tunel 48 Mather. unheie di Dio ie del or ta 7 9 (OS RELATOS DA LEGITIMAGAO DO SABER ExxaMiAREMOS duss grandes verses do relat de legiimegio; uma mais pole, «outa mane Aloetic, am- ten de grande imporstcla na bei moderna, em pat clr na do saber e de sas instiigbes, Uma €/a que tem por sujeito « humanidade como beri da berate, Todos of povostda dito boca $5 see elf lo €or cng € porque fo inpedio niso pelo palees¢ trance. O di felto 1 citnda’ deve ser reonguistado. B comprensivel Ghee fling ke tal pli, on enon Pk “que dis universidaces e excl" A polltea es Colar da IT Repiblin dasa casaments exes presuposto. Quanto ao ensng superior, ete relato parece dever ita ose alence. ssi gc, em geral, Se desrever as dispsigdestomadas a este fespeito por Napolefo, cur lindo de produie au compettocise edinstrativas © pr Fisonais necessran A eaublidade do Estado Asin ignornse que este limo, na perpeciva do relao das Iberdades, no recebe sua legitimidade de si mesmo, © tim do povo. Se as instituigdes de entino superior so onsagratas pela poliicn imperial a serem extfas dos ux dros do Estado, secundarimente, da sociedade civil, € porque através das adminstragdes € das prfisdes em que fe exercerd un aividade, a prdpia nao estd utornada 2 conguistar sta liberdade gras 8 difsio dos novos 4: 38 eR FEDER OE RTE ETAL beres na populagdo. © mesmo raciocinia vale a fortiori para a fundagio das instituigées propriamente clentifias Reencontrese 0 recurso a0 relato das liberdades cada ver que o Estado toma diretamente a si o encargo da formacio do “povo" sob 0 nome de nasio € sua orientagio no ca ho. do. progresso."" Com 0 outro relato de legitimacio, a relagio entre 4 ciéncia, a nagio € o Estado dé lugar a uma elaboracio bastante diferente. Eo que se deu quando da fundagio dda Universidade de Berlim, entre 1807 © 1810.™ Sua in- fluéncia seré considerivel sobre a organizagio dos cursos superiores nos paises jovens nos séculos XIX e XX. Por ocasiao desta criagio, o ministério prussiano foi surpreendido com um projeto de Fichte e consideragées| copostas apresentadas por Schlciermacher. Coube a Wilhelm von Humboldt resolver 0 caso; decidiu a favor da opsio mais “liberal” do segundo, Lendo-se 0 relawrio de Humboldt, pode-se ser ten tado a reduzir toda sua politica sobre a instituigio cient- fica ao célebre principio: “Buscar a ciéncia em si mesma” Isto seria equivosarse sobre a finalidade desta politica, ‘muito préxima daquela que Schleiermacher expis de modo mais completo e em que predomina © principio de legit smagio que nos inceress Humboldt declara, ¢ certo, que a eitncia obedece as suas regras proprias, que a insituigio cientifiea “vive © renovase sem cessar por si mesma, sem nenhum cercea- mento nem finaidade determinada”™. Mas acrescenta que ‘a universidade deve remeter seu material, acigncia, 2 “for rmacio espiritual e moral da nagio”." Como este efeito de Bildung pode resulta de uma pesquisa desinteressada ‘do conhecimento? © Estado, a nagio, a humanidade ine teira nio_sio indiferentes ao saber considerado em si mesmo? Com feito, o que Ihes interessa é como declara Humboldt, nlo o conhecimento, mas 0 cariter © agi Ey © conselhiro do minisro coloca-se sts face a um conflto maior, que lembra-a rapture inrouida pela rt fics kanviana entre conhoser querer, 0 confit ents im jogo de linguagem feito de denotgGes que nfo emanam seniio do critério da verdade, e um jogo de linguagem que orienta a pritca cic, soca, polities, e que comporta necessariamente decisdes € obrigagdes, ou seja enunciados dos quais nao se espera que sejam verdadeiros, mas jus- ton, € qe portnto nfo emanam em cima sndie do Seber cent. ‘A unificgio destes dois conjuntos de discurts é, no cntanto, indispensivel 2 Bidang visade pelo projeto hum. toldriano, que consiste no somente na aulsieto de conheciments pelos individ, mas na formagao de um sujeito plenamente legitimado do saber e da sociedade. Hombolde inves assim tm Fspiito, que Fichte também chumeva de Vide, movido por uta taplice spingio, ou melhor, por uma agpiragdo simultaneamente tiplice e un téria: “a de tudo fazer derivar de um principio original”, 4 qual corespone a atvidade cient, "a de tudo re ferir a um ideal”, que governa a pritica ética e social; “a de reunir ese principio ¢ este ideal em uma Gnica Tdeia”,asseguando que a pesquisa das verdadetes caus 1m ciéncia nfo pode deisar de coinidir com & perseaugo de joatos fins aa vida moral e politen. O sujeito leptin coniituise desta tiki sincese ‘Humboldt acrescenta de passagem que esta triplice aspiragio perience paturalmente” ao “carer itlectal da nacido alema”."” E uma concessio, mas discreta, #0 ou- tro telato, isto &, &idéa de que o'sujeto do saber € 0 povo. Na'verdace, esta idéin ext longe de se conformat fo rato da lepitimasio do saber proposto peo idealismo alemio, Sinal dato €'a sspeita de um Schleiermacher, de tim Hemboldt e mesmo de um Hepel a respeito do Es- tao, Se Schleiermacher teme 0 nacionalisma exit, © protecionismo, © wltarismo, © positivamo que gun ot « Pet sn nea D0 TEA poderes piblicos em matéia de ciéncia, é porque o prin- pio desta nio reside, mesmo indiretamente, naqueles, O sujeito do saber nio é 0 povo, € 0 expiito expeculativo. Ele nfo se encarna, como na Franga de apés a Revolugio, rum Estado, mas num Sistema. © jogo de linguager de legitimacio no € poltico-estatal, mas floséfco, ‘A grande funcéo que as universidades tém a desem- penhar € a de “expor 0 conjunto dos conhecimentos ¢ ‘videnciar 08 principios a0 mesmo tempo que os funda mentos de todo saber”, pois “nfo existe capacidade cien- tifica criadora sem espfrito especulativo"." Aqui, a espe- caulagio € 0 nome que o discurso sobre « legitimagio do dliscurso cientifico recebe. As escolas sio funcionais; a uni- versidade € especulativa, isto, filesfica." Esta filoso ‘eve resttur a unidade dos conhecimentos dispersados em cincias partculaes nos laboratérios © nos cursos préuni- versitrios; ela no pode fazélo senfo num jogo de lin- ‘uagem que une ambos os sspectos como momentos no it do esptrito, porento, numa narracio ou, antes, numa rmetanarragio raconal. A Encilopédia de Hegel (1817-27) Ibusceré satsfazer este projeto de totalizaio, jd presente ‘om Fichte ¢ em Schelling como idéia do Sistema, E af, no dspositvo de desenvolvimento de uma Vida ioe desl uieaie) etapa suaioy ss we oe mee saber narrative. Existe uma “histéria” universal do esp Fito, 0 espltito & “vida”, esta “vida” & apresentagso 4 forinulagio do que ela mesmo é; ela tem como meio ‘9 conhecimento ardenado. de todst as suas formas nat cidncias empfricas. A encilopédia do idealismo alemto é 1 narragio da “histsria” deste sujeto-vide. Mas 0 que ela produz € um metereato, pois o que conta ete. relato no deve ser um povo estrangulado' na positividade pat= ticular de seus saberes tradicionais, ¢ tio pouco 0 com junto dos cientstas que sao limitados pelos profissiona- lismos correspondentes 2s suas especalidades. or Este nfo pode ser seno um metassujcito em vias de formular tanto « legitimidade dos discursos das cién- cias empiricas, como a ds instiuigdes imediatas das cul- turas populares. Este metasujeito, revelando seu funda ‘mento comum, reali seu fim implicito. O lugar em que habita € a universidade especulativa. A eifncia positiva € 0 Povo nio sio outra coisa senio suas formas brutas. ( préprio Estado-nagio nio pode exprimir validamente 0 ‘Povo a nio ser pela mediacio do saber especulaivo. Era necessitio resgatar_ a filosofia que a0 mesmo tempo legitima a fundagio da universidade berlinense © devia ser 0 motor do seu desenvolvimento e do saber con- temporineo. Como jé foi dito, esta organizigio univers tiria serviu de modelo para a constitugio ou a reforms dos cursos superiores nos séeulos XIX ¢ XX em muitos patses, a comesar pelos Estados Unidos.” Mas sobretudo, esta filosofia, que estd longe de ter desaparecido, princi palmente no meio universitéio." propSe uma representa 60 particulsrmente viva de uma solugio dads ao proble- mma da legitimidade do saber. No se justfca a pesquisa e a difusio do conhed ‘mento por um principio em uso. am que @ ciéncia deva servir efov da sede iil, Negligence © principe hung: nista segundo o qual a bumanidade eleva-se em dign € em liberdade por meio do saber. O idealismo alemio recorre a um metaprineipio que simultaneamente funda menta 0 desenvolvimento a0 mesmo tempo do conheci- mento, da sociedede e do Estado na reali ” ‘um Sujeito que Fichte chama is sue” Nese meetin @ pe een le inicio sua legtimidade em si mesmo, ¢ € ele que pode dizer 0 que € 0 Estado e © que é a sociedade.” Mas no desempenhar este papel senéo mudando de patamar, Fo ucim doer debandoest 9 sonkeinne pose do seu referente (a naturea, a sociedade, 0 Estado, et.), e es. ER, 00 FL TEAC € vindo a ser também'o saber desies saberes, isto 6, expe: culativ. Sob o nome de Vida, de Espiit, € 4 si mesmo aque nomela Um resultado aprecifvel do dispostvo especulativo, 0 de que todos os cares de onfcimenes tobe tos fos referents possveis so af considerados no com seu valor de vee medi, ma com oar ge cea mem pelo fato de ecuparem um certo lugar n0 petaurso do Espirito ou da Vida, ou, se se prefer, una certa posigio 1a Encilopédia que descreve o discurso especulativo, Este 5 cita expondo por si mesmo 0 que sabe, isto é expondo- se a si mesmo. Nesta perspectiva, o-verdadeiro saber & sempre um saber indireto, feito de enunciados recabidos, ¢ incorporados ao metarelato de um sujeito que asepute, Ihe a legitimidade. ao Isto vale para todos os discursos, mesmo te eles no forem de coahecimento como, por exemplo, os do dicito ¢ do Estado. O discurso hermentutico contemporinea"™ femerge desta pressuposigio que astegura finalmente, que had sentido a conhecer ¢ que confere assim sua legitimi- dade 2 histéra e, notadamente, 2 do\conhecimento, Os ‘enuncades so tomados como autéaimos deles mesmos.™ colocados num movimento onde se admite que eles se fengendrem uns aos outros: tals fo as regras do ogo de linguagem especulaivo. A_universidade, como seu nome o india, é a sua instituigio exclusiva, Mas, como se disse, o problems da lesitimidade pode resalverse pelo outro. proceso so marcarihe 4 dliferenga: # primcira. versio da Tegitimidade'reencontrou lum novo vigor hoje, enguanto 0 esatuto do saber encon- trase deseqilibrada sua unidade especulativa fagmen- tad. © ‘uber aio encontea af sua validade em si mesmo, tum sujeito que se desenvolve atuslizindo suse posi dades de nto, mas num sujeito pritico que é hhumanidade. O principio do movimento que anima 0 Povo 6 rio € 0 saber em sua sutolegitimacio, mas a liberdade em sua autofundagio ou, se se. prefere, em sua autogestio. ( sujcito é um sujeito conereto ou suposto como tal sus epoptia & a de sua emancipasio em relagio a tudo aquilo que 0 impede de se governar a si mesmo, Supde-se que 8 leis que para si mesmo estabelece sejam justa, no por aque clas estario ajustadas « determinada natureza exterior € sim_pelo fato de que, por consttuigio, os leysladores rio sio outros senio cidadios submetidos as leis © que, em conseqjigncia, a vontade de gue a Tei faca justia, que €'a do cidadio, coincide com a vontade do lepslador, que 4 de que a justca seja Ie. Este modo de legitimagio pela autonomia da vonte: 4" privilegia, como se v@, um jogo de linguagem bem dlverso, 0 que Kant chamava de imperativo € os contem- ineos chamam de prescitivo. O importante nio é, ou Dio € apenas, legitimer of emnciador denotativos, depen dentes do verdadeiro, como: A Terra gira em tomo do sol, mas enunciados prescitvos, dependentes. do justo, ‘como: E preciso destruir Cartago, ox: E preciso fixar 0 selério minimo em x francos. Nesta perspectiva, 0 saber positive nfo tem outro papel sendo o de informar 0 sujeito pritico da realidede na qual ¢ execucio da prescrigfo deve se inscrever. Ele lhe permite circunscrever o executivel, © que se pode fazer. Mas 0 execut6rio, 0 que se deve fazer, no Ihe pertence. Que um empreendimento seja possivel € uma coisas que ele seja justo, outra. O saber fio & mais 0 sueito, ele esté a seu servigo; sua ini leg timidade (mas ela € considerével), € permitir que a m Tidade venha a ser realidade ‘Assim introduz-se uma relagio entre 0 saber © a s0- ciedade e seu Estado, que é, em principio, a relagio entre meio e fim. Os centstas nfo devem se prestar a i802 fio ser que julguem # politica do Estado justa; isto é, 0 conjunto de suas prescrigées. Eles podem recusar as pres- cigdes do Estado em nome da sociedade civil de que si0 64 VR FEDER. FA CENTRAL (os membros, se consderam que esta no ¢ bem represen- tada por aquele. Este tipo de legitimacio the reconhece f autoridade, a titulo de. seres humanos priticos, de recusar em prestar sua colaboragdo de cientstas a um po- dex politico que cles julgam injusto, isto é, nio fundamen- tado sobre a autonomia propriamente dita. Eles podem mesmo até fazer uso de sua ciéncia para mostrar’ como cesta autonomia de fato no é realizada na sociedade € no Estado, Reencontrase assim a funglo extica do. saber. Acontece que este no tem outra legitimidade final sena0 a de servir os fins vigados pelo sujeito prévico que € a coletvidade auténoma.” Esta distribuigio dos pepéis na tarefa de legitimasio interessante, segundo 0 n0ss0 ponto de vista, porque ‘supe, ao contratio da teoria do sistema-sujeito, que 0 calendar tvno pom dot fod Tinguagem mum metadscarso. Aqui, 20 conteitio, 0 priv Iegio concedido aos enunciados prescrtives, que sfo os que 0 sujeito pritico profere, torna-os independentes, em prinepio, dos enunciados de cigncia, que ado tém mais fungi senlo a de informasio para 0 dito sujet. Duat observagbes: 1 — Sera fl mostrar que 0 marxismo osilon entre os dois modelos de legitimacio nerrativa que descrevemos. (© Partido pode tomer 0 lugar da universidade — 0 pro- Tetariado, 0 do povo ou da humanidade, o meteralismo dilético, © do idealiomo especulativo, ete pode dal re Sultar 0 ‘estalinismo e sua relagio espeifea com as cién iat, que Id extfo apenas enquanto citagio do metarelato ‘da marcha para o socalismo como equivalente da vide do tsplito. Mas ele pode, a0 contritio, conforme a segunda Yersio, desenvolverse em saber ertico, postulando que 0 Soxiallsmo ndo € sendo a consituigio do sujeiro aurSnomo 6 que tode a justificagio das citncias € dar a0 sujeito em- pirico (0 proletariado) os meios de sua emancipagio em relagio 2 alienagio e & repressio: sumariamente, foi esta f posigfo da Escola de Frankfurt. 2 — Pode-se ler 0 Discurso que Heidegger proferiu no dia 27 de maio de 1933, quando de sua ascensio 20 reitorado da Universidade de Friburgo,” como um episé- dio infeliz da legitimasdo, A ciéncia especulativa tomnou-se ‘© questionamento do ser. Este € 0 “destino” do. povo slemao, chamado “povo histéricospiritual”. B a este su jelto que se devem os trés servigos: do trabalho, da defe- sae do saber. A universidade assegura o metassaber de seus tr8s servis, isto é, a cidncia. A legitimacio se faz entio como no idealismo por meio de um metadiscurso chamado-ciéncia, tendo pretensio ontoldgics. Mas ele é ‘questionante, e niio totalizante. E, por outro lado, @ uni- versidade, que € 0 lugar onde ele existe, deve esta cigncia ‘2 um povo cuja “missio histérica” € a de cumpri-la traba- Thando, combatendo e conhecendo. Este povorsujeito no ‘tem vocagfo para a emancipacio da humanidade, mas para a realizagio de seu verdadeiro mundo do espirito”, que & “o poder de conservagio mais profundo de suas forgas de terra e de sangue”. Esta insercio do relato da raga'e do trabalho no relato do espirto & duplamente infeliz: teori- ‘camente inconsistente, bastaria, contudo, para encontrar 1o contexto politico uim eco desastros. NoTAS WS. ere um venti dpc oii dea case x : 6 10. mn. 1 us 6. ww, 1. ven ENERO ARE ‘OTE wen eae a mt hte mat neta gaara se Ciena atmo ee ete etn oy kn FT ee mein ale ene sie aratacke & se am dnd sie ‘sfa'aue we fol avenenc cmercado ating aes ‘e Carve, Un ‘iar are. Sto Paulos e's race arc Miguel Cotes de shlotophie’ Phicoophie ae TUniversie "ll uso de Foner enon de Set- lng Ph Schcemeche. Hamble Hep Peyt 15, “Sup Fortin interne ot exarne des Eaiementssleatgues ‘pvt h Ben” (ie) In Poop de Fontana oe Se a. anses de chconatance srl wives de con. ‘Soton leans” 180), Vids 2ST 70 entino ssc seconheide de ata. eat como o fund mete Ge traded savers” Wide 2 [A Tearing analsn as conta. eta tenplanagto em Univer side Sed nu FireOne Sea, 192, Sa Senel if ns coches do uo) R. Niet, The Depradtion of ‘Acotntc Dope” the Univer tn Amer, 18451970, Lense, Heine, 171. © aor €srlesr na Univerdade de Cavern er. W. Hes. Bhicsople des Recis (121), Kaun Princes 1 hip dra Calioar. a - Ver P, Recut, Le confit des ineroration, Bsa, Sherménc et lees: MAS SP ES Vee masa Slam doe enaniaor (1) La lage ext fete, 2) O enc /La Tia ety" wm ema doing Disa ee th 9 apna /Le lene et level €g atone). Ver. Rey eben 1metongar. Le Wb. 1978 pre 1 © pri. m ota de den tances Sedo's Creda nope Ea ple menos ¢ tan ie pelica ee o ie spi it peso i ol ten Sng Saree a ames ‘ele Lumires™ im Kant. Le Philosophie de Phastabe, ABbir. Ver I, Kent, atts I Habermas, Sraturwandel der Onell Mei tits" Stents Tear de Lamy, Comme pu ‘Sad botacsie Payor 1978 Os rman le ‘im “torr pub ume conesndci privea debe pbles” ‘SE Ea principe de efieickic pion ais de muir ce ado en 18, ano vines ‘ation "(USA)'e © grupo “Brish Sock for Soci Responabiy Seen a 4 Grane! war pare o fants om Pi Se Rantala Tosowete Mies Tasos es Fae. 0 ALOTEACNTL 10 A DESLEGITIMAGAO Na soctEDADE e na cultura contemporines,socieds- de plein, extore pétmoderna" « questo da Ie Siinasao do sabes colcese em cuttos tomnoe, © ganic Feito perdea sua credlidade, see qual for 0 modo de Tifa que Ie € confer’ rete esperutaiv rans enn Polese ver neste delinio dos rats um efeto do dkseavalviento dar teneas © de tecnologia v partir dx Scyunda Guerra Mundial, que deslocor a Enlace sobre os incon da ago de prefernca bénfae sbre os se fins tn enio © redesdobramento do cpitalismo Uber evan Gado ape se ree, sab #protesto do eyesansmo do Fante os anos 1930-1960, enovapdo gue eliminos alter: tative comunista e que valorizoa a faugio individual dos Bens e do srigs. Suse do eausalidade como esta sio sempre dcep- cionantes. Sopondoe que se ait tim on ota desis Fiptees, teen explica « correlao das tendencies rete fies com o deli do poder uifcadore legtimador dos frander relator da especiagzo e da emancipsto, 1 impacto que, por tm lado, teorada © 4 pros peridede capitalists por out lado, 0 avengo deseo: Ccrante dat tenis oder ter sobre 0 estatto do saber Ceramente compronavel, Mas € gio printinumenis feipaar os gemes de “deegtimagio™ e de nilimo que am ineremtes ave grandes elton do séclo XIX para ® ‘compreender como a ciéncia contemporinea podia ser sen- Sivel ates impactor bem antes que cles‘acontecesem dispostivo especulativo encerra iniielmente uma ‘espécie de equivoco em relagio ao saber. Ele mostra que ‘este nfo merece seu nome a nio ser que se reponha (se reldve, bebt sich euf) na citacio que ele fez dos seus proprios enunciados no seio de um discurso de segundo nivel (autonimia) que os lepitima. Isto significa que, em sua imediaticidade, 0 discurso denotativo que versa sobre ‘um referente (um orgenismo vivo, uma propriedade qut rica, um fendmeno fisico, etc.) nfo sabe na verdade 0 que cle acredca saber. A ciéncia postiva no € um stber. E a especulacio nutrese da sua supressio. Deste modo, 0. relato especulativo hegeliano contém nele mesmo, ¢ como ‘onfessa © préprio Hegel, um eeticismo em relagio 90 conhecimento postivo. ‘Uma ciéncia que no encontrou. sua legtimidade no € uma cigncia verdadeira; ela cai no nivel © mais baixo, 0 de ideologia ou de instrumento de poder, se 0 discurso aque deveria legitiméla aparece ele mesmo como depen- dente de um saber précientifico, da mesma categoria que lum relato “vulgar”. O que nio'deixa de acontecer 5 se volta contra ele as regras do jogo da ciéncia que ele de- runeia como emplrica. Considere-e 0 enunciado especulativo: um enun do cientifico € um saber somente sf ‘num processo universal de engendramento. A ques surge a seu respeto € a seguinte: sera este enunciado um saber no sentido que ele determina? Ele nio o seré, a no ser que possa situarse num processo universal de engen ddramento. Ora, ele 0 pode. Bastalhe pressupor que este pprocesso existe (a Vida do expirito) ¢ que ele mesmo é lima de suas expresses. Esta pressuposisio € mesmo dispensével 20 jogo de linguagem especulativo. Se ela nfo @ feia, # propria linguagem da legitimagio no seria legl- 70 ———$————————— es FEDERAL DO AL ECAC tima, e estaia, com a ciéncia,imersa no nom sense, rmenes de acordo com 0 idealismo. me ‘Mas pode-se compreender esta pressuposicio. num sentido totalmente diferente, que nos aproxima da cultura ésmodere: ela define, ditse-d na perpectiva que ado {amos anterirmente, 0 grupo de regras que € preciso ad- titi para jogar o jogo especalativo:* Tal spreciaglo supe io geral da. lingua sgem de saber o das cigncias ‘positivas”. Em segundo lugar, ue se considere que esta linguagem ‘implica pressuposi- ‘es (formais e axiométicas) que ela deve sempre explici- tar. Com outeas palavres, Nietzsche firma isto quando 30 europeu” resulta da auto-aplicagio dda exigéncia cientfica de verdade a esta prOpria ext séncia : Sarge assim a idéia de ferspectiv® que no € distan- te, pelo menos neste ponto, da dos jogos de linguagem. ‘Temse af um processo de deslegtimacio eujo motor € a exigéncia de legitimacio. A “erise” do saber cientifico, jos sinais se multiplicam desde 0 fim do séeulo XIX, provém de uma proliferagio fortuita das eigncias, que seria cla mesma o efeito. do progresso das técnices © da ‘expansio do capitalism. Ela procede da erosio interna do principio de legitimagio do saber. Esta erosio opera no jogo especulativo, e € ela que, ao afrouxar a trama enc clopédica na qual eada cigncia devia encontrar seu lugar, deixaas se emanciparem, ‘As delimitagdes clissicas dos diversos campos cient- passam 20 mesmo tempo por um requestionamento: ilinas deseparecem, invasbes se produzem nas. fron- teiras das iéncias, de onde nascem novos campos. A hie- rarquia especolativa dos conhecimentos di lugar a uma rede imanente ¢, por assim dizer, “rasa”, de investigagdes ‘eajasrespectivas fronteiras no cessam de se deslocer. As antigas “faculdades” desmembram-se em institutes e fan- dagdes de todo tipo, as universidades perdem soa funcio n cde legitimacio especulativa, Privadas da responsibilidade dda pesquisa que 0 relato expeculativo abafa, elas se limic ee eee ele guram, pela didética, mais @ reprodugio ‘que a dos cientistas. E neste estado que Nictache as en- ‘contra e as condena Quanto ao outro procedimento de legtimasio, 0 que results na AufHldrung, 0 dispositivo da emancipacéo, seu pode intrinseco de erosio nfo € menor do que aquele que opera no discurso especulativo. Mas cle se refere & lum outro aspecto, Sua caracterfstca € a de fundamentar & legitimidade da cigncia, a verdade, sobre a antonomia dos ‘um problema: entre um enunciaco denotativo de valor cog: nitivo e um enunciado prescitivo de valor pritico, a dife- renga € de pertinéncia, portanto de competéncia. Nada prova que, se um enunciado que descreve uma realidade € verdadeito, o enunciado prescritivo, que teré necessa- rlamente por efeito modifica, seja justo. ‘Considere-se uma porta fechada, Entre A porta estd Jecbada € Abra a porta ndo existe conseaiéncia no sentido {da Iigica proposicional. Os dois enunciados referem-se a d wos de regis autnomes que determinam Fe ntes €, por conseguinte, competéncias ‘Aqui, 0 resultado desta divisio da razio em cog. nitiva ou teorética, de um lado, e pritca, do outro, tem por elcito atacar@ legitimidade do discurso de ciénca, no iretamente, mas indiretamente, revelando que ele € um jogo de linguagem dotado de suas regras préprias (cujes condigSes a priori do conbecimento so em Kant um pri- meiro esbogo), porém sem nenhuma vocssio para regu- Iamentar 0 jogo pritico (nem estético, aids). Ele € assim posto em paridade com os outros. Esta “deslegitimagéo”, por pouco que a scompanhe- mos, ¢ se ampliarmos 0 seu alcance, o que Wittgenstein n ILO ria, ae aTE faz A sua mancira, ¢ © que fazer, eada um « seu modo, pensadores como Martin Buber © Emmanuel Levinas,” abre caminho a uma corrente importante da pésmoderni- de: ci jog osx proprio jogo el nfo pode lea timar os outros jogos de linguagem. Por exemplo: escapi the o da prescrigio. Mas antes de tudo ela nio pode mais se legitimar a si mesma como o supunhe especulagio Nesta disseminacéo dos jogos de linguagem, é 0 pri prio sujeito social que parece dssolverse. O vinculo social € de linguagem (langagier), mas ele no € constituido de uma Gnica fibre. E ume tecitura onde se eruzam pelo me: nos dois tipos, na realidade um nimero indeterminado, de fee Henge ose beds sy deren ittgenstein esereve: "Nossa ling Ser or omo wa vl cidade: wma rede Ge rocks © pra 28, de casas novas e velhas, € de casas dimensionadas as novas épocss; ¢ sto tudo eeteado por uma quantidade de novos subirbios com ruas retas e regulares e com casas taniformes."* E, para mostrar que retlmente 0. principio de unitotaidade, ow da s{ntese sob a autoridade de um metadiscurso de saber, éinaplicével, cle faz a “cidade” da linguagem passar pelo velho paradoxo do sorta, pergun- tando: “A partir de quantas casas ou ruas uma cidade co- mega a ser uma cidade?” Novas linguagens vém acrescentarse as antigas, for- ‘mando os subtrbios da velha cidade, “o simbolismo qué ‘ico, a notagio infinitesimal” Trinta e cinco anos apés, pode'se acrescentar a isto os linguagens-méquinas, as ma. trizes de teoria dos jogos, as novas notagdes musicas, as notagdes, das ldgicas’nio'denotativas_(I6gicas do tempo, lgicas detnticas, Iigices modksis), linguagem do cédigo ‘genético, os grificos de estruturas fonolégicss, tc. retirar desta explosio uma impressio pest- iis: ning fla todas ess lings eas nfo possum uuma metalingua-universal, © projeto do sistemaatjeito € tum fracasso, o da emancipasio nada tem a ver com a cién- % ea, estse mergulhado no positivismo de tal ou qual co- Stsdanoe pate, whine eamanrat deans so | reduaidas tarefas de pesquisa tornaram-se tarefes fragmen- Z tiias que ninguém domina;® e, do seu lado, a Filosofia 4 especulativa ou humanista nada’ mais tem a fazer senio \ romper com suas fungies de legitimacéo," © que explica ‘crise que ela sofre onde ainda pretende assumiles, ou | sou redupto ao catudo das legis ou das hisras das {idéies, quando cgnformando-se com a realidad, renunciou Aguelas fungies.” ~~ Este pessimism € o que alimentou a geracdo do int cio do século em Viena: os artistas, Musil, Kraus, Hof- smannsthal, Loos, Schinberg, Bloch, mas também os fl6- sofos Mach e Wittgenstein.™ Sem’ divida eles desenvol veram 0 mais possivel a conscigncia e a responsebilidade teGrica e artistca da deslegitimagio. Pode-se dizer hoje que este trabalho de luto foi consumado. Nao se deve re- comesélo, A forga de Wistgenstein consist em nio colo- «arse 20 lado do positivismo que 0 Circulo de Viena de- senvolvia™ e de tragar em sua investgasio dos jogos de linguagem a perspectiva de um outro tipo de legitimagio que nao fosse o desempenho. E com ela que o mundo pés- rmodemno mantém relagio. A prépria nostalgia do relato perdido desupareceu para a maioria das pessoas. De forma alguma segue'se a isto que elas estejam destinadas & bar- bitie. O que as impede disso € que elas sabem que & lexi- timegao nao pode vir de outro lugar senao de sua pritica de linguagem ¢ de sua interagéo comunicacional. Face a qualquer outta crenga, a ciéncia que ironiza (sourit dans sa barbe) ensinowlhes @ dura sobriedade do realismo.™ 1" 1. 1, or bs ‘UNIVERSIOADE FEDERAL NECA CENTRAL SL Mates enpea « ereate “spon of dine” en Fhe Pots of Conmaniosion oe oh ie “Cena de ve (gum do ders.) ee csi Hany ric ont eG tae Stover oe de polo opted tbo bene ae om ra de sbrcrene a expos dnanon pct un etd Sistas exeme done sono ae regs Nasache, er europe No” VI 3) “Ber Ne tron ot gore Zana tm Wit Seek Sly Ria eye ar eh meee tee, Bs ah eno gi Mee Unite de Fate Vit ince, : ‘ser Tet de eaknements Gero” (AD, ak tn. Nate, Ee puharr 16188 Car Buber, Jet Ta, Aube, oi Didegchen ete, 7c Moe T. Ein fab oe ac Seek ies Bibuy ine heer (S30 Bt ‘sari Sober Inthe de a conneteance™ Nome probes hon paar cae ie eatin pha, tcc. AC. de Yon Ca uno Gr Puedes bil Cua, 18 fi a, ‘er por exemple “La traaton de a sce” i, Auer Ne Br acca Stan tte Be, Se Pee (tite Sei cee, NY. Clan UP 19) aos he tht cog ene a ue sco de pata bee {uo sles alan em nono pies) ume fe ‘nie pred Ge et adn © romero lates ‘Sion ctee'p dobro do numer pete, enor ee 0 sone trier ete Ve tea opening Poe Src gue cba coast ene sel undo ‘Sui eco tenon eae secon data i apn Ste mina ve 30. (evo ral) Nei. Go pr dnd ny isp’ Phlpte ene oe citu splonpe Bie, Sea os ie 4 rete Moteur no conju dey tc Saimee OS oe ph Sata tat ee a fee's lr pA a coe fl ‘nas gs cme Ey neon dei, te ‘evende Soe fotibe Sats asides atveantie pens erg edi no Pre dni pint ie apie Damen de phish: Une de Pav fVincone, 1 6 % Yer A lnk & St Toumio, Witapmens Viewa, NY. Simon & Hat NO 5 Beh ict in dn se Shige Si" Gotapiendee 187. ‘er js Hatemay, “Dorman, akon econ: thai et pre ‘ey nae cites sl Gi) Poe rule latin, daa baie & 0 tial deo capil ‘Pore seg gute Mat ced comet por Baa sr" prema ue eo gag FRAO ECAC, un A PESQUISA E SUA LEGITIMAGAO ‘PELO DESEMPENHO Vor.tem0s a citncia © examinemos de ino a pragmd- tica da pesquise. Ela é hoje afetada em suas regulages Sahin A pate othe sho too anle emo fo por estes métodos. Ela pode user © usa linguagens, como se disse, cujas propriedades demonstrativas parecem desafis a rezio dos clésscos, Bachelard feeshe um balan- 0; ee feof ultapesad. : ‘uso dests linguagens, contudo, nfo é qualquer um. Ele extésubmetido « uma condigfo que se pode dizer prag- mética, a de formular suas préprias regras ¢ de perguntat ‘0 destinatirio se cle as accita. Satistazendo esta condi- so, define-se uma axiomética, a qual compreende a defi- tigho dos simbolos que serio empregados na linguagem pproposta, a forma que deverio respeitar as expresses lesa linguagem para poderem ser aceitas (expresses bem ormadas),¢ as operagdes que serio permitidas sobre estas ‘expresbes, e que definem os axiomas propriamente dios.” ‘Mas como se sabe o que deve conter ou 0 que com ‘tém uma sxiomética? As condigGes que foram enumeradas so formais. Deve exist uma metalingua determinante se ”

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