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Coordenagao George Salomio Leite Ingo Wolfgang Sarlet Direitos Fundamentais e Estado Constitucional Estudos em homenagem a J. J. Gomes Canotilho Participam desta edi¢ao ‘Alexandre de Moraes Gilmar Ferreira Mendes Christian Starck Ingo Wolfgang Sarlet Daniel Sarmento José Afonso da Silva Dieter Grimm José Herval Sampaio JGnior Dimitri Dimoulis Lenio Luiz Streck Domingo Garcia Belaunde Leonardo Martins Fabiano André de Souza Mendonca _—_ Nelson Nery Junior Flavia Piovesan Pedro Lenza Frank |. Michelman ‘Walter Claudius Rothenburg George Salomao Leite Co-edigao aavboadass EDITORA Coimbra Editors REVISTA DOS TRIBUNAIS. 16 Protecdo judicial efetiva dos direitos fundamentais Gann Festa Mevoes™ Sumaatoz Consideracdes gerais~ 1, Ambito de protegao do dieito& prote- (io judicial efetiva: 1.1 Duplo grau de jurisdiga0; 1.2 Arbitragem e juizo arbitral; 1.3 Duragio razoavel do processo; 1-4 Publicidade do processo; 1.5 Judicializaglo de questées polticas; 2. Ttularidade do direito& pro- tego judicial efetiva; 3. Conformacao ¢ limitacao do direito & proteso judicial efetiva: 3.1 Proibigio de liminares ¢exigéncia de caucio; 3.2 Ne- cessidade de motivacio das decisSes juicials; 3.3 Formulas de preclusso ‘eoutras exigéncias formais ~ 4. Consideragesfinas. Consideragies gerais, A dogmatica constitucional alema cunhou a expresso “Justizgrundre- chte” para se referir a um elenco de protecoes constantes da Constituicao {que tem por escopo proteger 0 indivi- duo no contexto do processo judicial. Sabe-se que a expressao € imperfeita, uma vez que muitos desses direitos transcendem a esfera propriamente judicial * PresidentedoSTFedoCNJ.Doutorem Dieito pela Universidade de Manster, Republica Federal da Alemanha—RFA Professor de Direito Constitucional nos cursos de graduacdo © pés- graduacio da Faculdade de Direito da UnB. Membro Fundador do IDP. Membro do Conselho Assessor do “Anuario Iberoamericano de Justicia Constitucional” — Centro de Estudios Politicos y Constitucionales ~ Madr, Espanha. A falta de outra denominacao ge- nérica, optamosporadotardesignacao assemelhada ~ direitos fundamentais de cardter judicial e garantias consti- tucionais do processo-,embora cons- cientes de que se cuida de denomina- 20 que também peca por imprecisto terminologica. Assim, 0 direito a0 contraditorio e a ampla defesa, no sistema brasileiro, tem relevo nao apenas no processo ju~ dicial civile penal, mas também no amm- ito dos procedimentos administrati- vvos em geral. E, para no ser omisso, recomhece-se, as vezes, 0 significado desse principio até mesmo nas elac6es brivadas.* 1, CE. RE 201.819, rel. Gilmar Mendes, DJ 21.10.2005; cf, ainda: Gilmar Fer- reita Mendes, Direitos fundamentais: cficdcia das garantias constitucionais nas relagSes privadas: andlise da ju- A Constituicto de 1988 consagra ‘um expressivo elenco de direitos desti- nadosadefesadaposigaojuridicaperan- te a Administracdo ou com relaco aos (rgaos jurisdicionais em geral, como se pode depreender da leitura do disposto no art. 5.°, XXXIV; XXXV; e XXXVII a LXXIV; XVIII, LXXVI e LXXVIIL Ademais, algumas disposicdes constantes de capitulos diversos do ordenamento constitucional concre- tizam, explicitam ou ampliam muitas dessas garantias. Eo que se verifica com o dever de fundamentagao das de- cisoes judiciais, previsto no art. 93, IX, da Constituicio. Também as normas relativas as garantias da magistratura guardam estreita conexao com a idéia de juiz natural (CR art. 95). Essaexpansdonormativadas garan- tias constitucionais processuais, penais e processuais-penais nao € um fenome- no brasileiro. A adocao da Convengio Enropéia de Direitos Humanos por muitos paises fez com que ocorresse ex- pansio singular dos direitos e garantias, nela contemplados no ambito europeu. Mediante uma interpretagao dos di- reitos fundamentais previstos na Consti- ‘uigao em conformidade com as dispo- sigdes da Convengio Europtia, tem-se risprudéncia da corte constitucional alema, Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade: estudos de di- reito consticucional, 3. ed. rev. e amp, ‘Sao Paulo: Saraiva, 483 p.;eA eficacia dos direitos fundamentais nas elacoes privadas: exclusao de sécio da Uniao Brasileira de Compositores, Ajuris,n, 100, dez. 2005. Pronto WGA. vos oasros NOAM | 373 hoje uma efetiva ampliagao do significa- do dos direitos fundamentais previstos nna Constituicioou quaseumaampliagao dos direitos positivadosna Constituigao. Tendo em vista a préxis dominante na Alemanha, observa Werner Beulke que tal orientagdo culmina por conferit su- premacia fatica da Convencao Europeia em face do direito alemao2 Alguns direitos relevantesreconhe- cidos na Convencao Européia de Diret- tos Humanos: proibi¢ao de tortura (art. 3.2); direito a liberdade e a seguranca, especialmente o direito de imediata apresentacao do preso para afericao da Tegitimidade de eventual restricdo a li berdade (art. 5.°, II); direito ao devido processo legal (fair trial), especialmen- te a um processo submetido ao postu- lado da celeridade (art. 6, 1); direito a imediata informacao sobre a forma (tipo penal) e a razao (fato) da acusa- cao (art. 6.°, IIL, a); dieito a assistencia gratuita de tradutor ou intérprete (art 6. IIL, €); direito a assistencia juridica (art. 62, IL, c);diteito de inquirirou de fazer inquiriras testemunhas de acusa- 0 (art. 6., II, d); principio da lega- lidade em sentido estrito em matéria penal no que concerne a tipificagio de condutas e & cominacao legislativa de sangdes penais (nulla poena sine lege) «2. CLWernerBeulke, Strafprozessrecht, 8 d., Heidelberg, 2005, p. 6; ef. ainda, sobre 0 tema, Maria Fernanda Palma, Direito constitucional penal, Coimbra: ‘Almedina, 2006; Jormadas de Direito Processual Penal e Direitos Fundamen- tais, coord. Maria Fernanda Palma, Coimbra: Almedina, 2004, 374 | Gilmar Ferreira Mendes (art. 7.°,D; aboligao da pena de morte (Protocolo 6 e 13)? Registra Beulke que o art. 6.°,1, da Convengao Européia contém sete di- reitos de cardter judicial, o art. 6. I consagraa presungao de nao-culpabili- dadee oart. 62, II, outros vito direitos de carater judicial. O direito ao devido processo legal contemplado no art. 6.°, 1, da Convengio configura direito de carater geral abrangente dos direitos especiais que dele derivam.* Talvez nao haja qualquer exageto nna constatagao de que esses direitos de cardter penal, processual e processual- penal cumpremum papel fundamental na concretizacao do modemo Estado Democratico de Direito, Como observa Martin Kriele, 0 Estado territorial moderno arrosta um dilema quase insoluvel: de um lado, hé de ser mais poderoso que todas as demais forcas sociais do pats — por exemplo, empresas e sindicatos -, por outro, deve outorgar protecao segura ‘a0 mais fraco: a oposicao, aos artistas, aos intelectuais, as minorias étnicas.? © Estado absolutista e 05 modelos construidos segundo esse sistema (di- taduras militares, Estados fascistas, 0s sistemas do chamado “centralismo democratico”) nao se mostram aptosa resolver essa questao. 3. CE, Werner Beulke, Strafprocessrecht cit, p.6. 4. Idem, ibidem. 5. CE. Martin Kriele, Introduccion a la teorta del Estado, rad, Eugenio Buly- gin, Buenos Aires: Depalma, 1980, p. 149-150, A solucéo do dilema ~ diz Krie- le ~ consiste no fato de que o Estado incorpora, em certo sentido, a defesa dos direitos humanos em seu préprio poder, ao se definir 0 poder do Estado como poder defensor dos direitos hu- manos. Todavia, adverte Kriele, “sem divisdo de poderes e em especial sem independéncia judicial isto nao passa- 4 de uma declaracao de intengdes". E que, explicita Kriele, “os direitos hu- manos somente podem ser realizados quando limitam 0 poder do Estado, quando o poder estatal est baseado em uma ordem juridica que inclui a defesa dos direitos humanos”.* Nessallinha ainda expressivaacon- clusdo de Kriele: “Os direitos humanos estabele- cem condicdes ¢ limites aqueles que tem competéncia de criar € modificar © direito € negam o poder de violar 0 direito. Certamente, todos os direitos ndo podem fazer nada contra um po- der fatico, a potestas desnuda, como tampouco nada pode fazer a moral em face do cinismo. Os direitos somente tem efeito diante de outros direitos, 0 direitos humanos somente em face de um poder juridico, isto é, em face de competéncias cuja origem juridica € cujo status jurfdico seja respeitado pelo titular da competencia, # Esta €a razao profunda por que 05 direitos humanos somente podem fun- cionar em um Estado constitucional. Para a eficécia dos direitos humanos ‘a independéncia judicial € mais im- 6, Martin Kriele, Introduecion cit. p. 150. portante do que o catalogo de direitos fundamentais contidos na Constitui- cao”? Tem-se, assim, em répidas linhas, © significado que os direitos funda- mentais e, especialmente os direitos fundamentais de carter processual, assumem para a ordem constitucional como um todo. Nao se pode perder de vista que a bboaaplicacao dessas garantias configu- ra elemento essencial de realizagao do principio da dignidade humana na or- dem juridica. Como amplamente reco- mhecido, o principio da dignidade da pessoa humana impede que o homem seja convertido em objeto dos proces- sos estatais.® TTem-se, nesses casos, flagrante ofensa ao principio da dignidade da pessoa humana. Quando se fazem im- putagbes vagas ou dentincias infunda- das, dando ensejo a persecugao crimi- nal injusta, esté-se a violar, também, 0 principio da dignidade da pessoa hu- ‘mana, que, entrenés, tem base positiva no art. 1°, III, da Constituigio. Na sua acepcao originaria, esse prinefpio profbe a utilizagao ou transformagao do homem em objeto dos processos e acdes estatzis. O Esta- do esta vinculado ao dever de respeito ce protecao do individuo contra exposi- 20 a ofensas ou humilhacées. 7. em, p. 159-160. 8. Cl. Maunz-Dirig, Grundgeset2 Kom- rmentar, Band I, Minchen: Verlag C. H. Beck, 1990, 1118. ron $0 W010. 00s oneos enoauents | 375 ‘A propésito, em comentarios a0 art, 1.° da Constituigao alema, afirma Gunther Darig que asubmissao do ho- ‘memaum proceso judicial indefinido € sta degradacao como objeto do pro- cesso estatal atenta contra o principio da protecdo judicial efetiva (rechtli- ches Gehér) efere o principio da digni- dade humana (“Fine Auslieferung des ‘Menschen an ein staatliches Verfahren und eine Degradierung zum Objekt dieses Verfahrens ware die Verweige- rung des rechtlichen Gehors*].” Assim, tal como a garantia do de- vido processo legal, o principio da dig- nidade da pessoa humana cumpre fun- co subsidiaria em relacao as garantias constitucionais espectficas do proces- so, Em verdade, a aplicacio escorreita ou nio dessas garantias € que permite avaliar a real observancia dos elemen- tos materiais do Estado de Direito e distinguir civilizacao de barbarie A ordem constitucional brasileira assegura, de forma expressa, desde a Constituigdo de 1946 (art. 141,842), quea lei nao excluird da apreciacao do Poder Judiciario leso ou ameaga a di- reito (CF/1988, art. 5.°, XXXV). Tem ‘se aqui, pois, de forma clara e inequi- voca, a consagracao da tutela judicial 9. Maunz-Darig, Grundgesetz Kommen- tarcit, 118, “A lei nfo poderd excluir da aprecia- ‘glo do Poder Judicidrio qualquerlesio de direito individual” (Constituigio de 1946, art. 141, § 4.°). Observe-se {que o texto de 1988 inova ao garantir ‘ acesso a justica também no caso de ameagaa diteito, 10. re 376 | Gitar Ferreira Mendes efetiva, que garante a protecdo judicial contra lesdo ou ameaca a direito, ‘Ao lado dessa expressa garantia geral, 0 texto constitucional consagra as garantias especiais do habeas corpus, do mandado de seguranca, do habeas data e do mandado de injuneao, como {nstrumentos destinados a defesa da li- berdade de ir e vir (habeas corpus), das liberdades publicas em geral em face do Poder Publico (mandado de segu- ranca), dos direitos de carter positivo em face de eventual lesao decorrente de omissao legislativa (mandado de in- jjuncao) e dos direitos de autodetermi- nagio sobre dados (habeas data). ‘Aordem constitucional contempla outras garantias judiciais significativas que podem ter rellexos sobre posicdes subjetivas, como a agdo direta de in- constitucionalidade, a acao declarat6- riadeconstitucionalidade,aacaodireta de inconstitucionalidade por omissao, aargiicdo de descumprimento de pre- ceito fundamental, a a¢ao popular € a acao civil publica, Embora destinados a defesa da or dem constitucional objetiva ou de de- terminados preceitos constitucionais, ‘ou, ainda, da legalidade e da moralida- de, do patrimonio publico, esses ins- trumentos podem levar a decis6es judi- ciais com repercussao sobre situagdes subjetivas. A declaragao de inconstitu- cionalidade em um processo objetivo refletiré, inevitavelmente, sobre a posi- «0 de tantos quantos tenham, na vida real, sido afetados pela norma. Nopresente estudo ficaremos ads- tritos a andlise do direito a protesao judicial efetiva, previsto no art. 5.°, XXXV, no contexto de uma teoria ge~ ral, de seu ambito de protecdo e pre- rissas basicas 1. Ambito de protecio do direito Aprotecio judicial efetiva texto constitucional estabelece quealeinao excluira da apreciacao do Poder Judiciério lesdo ou ameaca adi- reito, enfatizando quea protecao judi- cial efetiva abrange nao 56 as ofensas diretas, mas também as ameagas (att. 5°, XXXV). ‘A Constituicao nao exige que essa lesto ou ameaca seja proveniente do Poder Publico, o que permite concluir {que estio abrangidas tanto as decor- rentes de acao ou omissao de organiza- es piblicas como aquelas originadas de conflitos privados. Ressalte-se que nao se afirma a protecao judicial efetiva apenas em face de lesio efetiva, mas também qualquer lesio potencial ou ameaca a direito. Assim, a protecdo judicial efe- tiva abrange também as medidas cau- telares ou antecipatorias destinadas & protecao do direito. 1.1 Duplo grau de jurisdicao E verdade que, em relagdo a esta (jurisdi¢ao), nao se reconhece direito a ama contestagao continuada e perma- nente, sob pena dese colocar em xeque umyvalorda propria ordem constitucio- nal, o da seguranca juridica, que conta com especial protegao (coisa julgada) Assim, o STF temacentuado a ndo- configura¢ao de um direito 0 duplo grau de jurisdigdo, a nao ser naqueles casos em que a Constituigio expressa- mente assegura ou garante esse direi- to, como nas hipéteses em que outonga possibilidade de recurso ordinario ou apelagdo para instancia imediatamente superior arts. 102, Tl; 104, 1; 108, 1) ‘No julgamento do RHC 79.785/RY, STE explicitou essa orientacao em. face de cléusula expressa contida no art. 8°, 2, h, do Pacto de San José da Costa Rica. A ementa da decisio, da relatoria do Min. Sepulveda Pertence, revela-se expressiva: “I, Duplo grau de jurisdicao no Di- reito brasileiro, a luz da Constituicao e da Convencao Americana de Direitos Humanos. 1. Para corresponder a efi- ‘cécia instrumental que lhe costuma ser atribuida, o duplo grau de jurisdicao hha de ser concebido, a moda classica, com seus dois caracteres espectficos: a possibilidade de um reexame integral dasentencade primeiro graue que esse reexame seja confiado a érgio diverso do que a proferiu ede hierarquia supe- rior na ordem judiciaria. 2. Com esse sentido proprio ~ sem concessbes que 0 desnaturem ~ nao é possivel, sob as sucessivas Constituicdes da Repabli- ca, erigir 0 duplo grau em principio garantia constitucional, tantas so a5 previsOes, na propria Let Fundamen- tal, do julgamento de sinica instancia ordindria, jé na érea ctvel, j4, particu- larmente, na area penal. 3. A sitwacao nio se alterou, com a incorporagao ao Direito brasileiro da Convencao Ame- ricana de Direitos Humanos (Pacto de Sao José), na qual, efetivamente, 0 art. 8°,2,h, consagrou, como garantia, 20 ProvcXo nO1OA. Cos DOs eNcAMONTA | 377 menos na esfera processual penal, 0 duplo grau de jurisdigao, em sua acep- 40 mais propria: 0 direito de ‘toda pessoa acusada de delito’, durante 0 processo, ‘de recorrer da sentenca para juiz ow tribunal superior’. 4. Prevalen- cia da Constituicao, no Direito brasi- leiro, sobre quaisquer convences in- ternacionais, incluidas as de protecio 0s direitos humanos, que impede, no caso, a pretendida aplicacao da norma do Pacto de Sao José: motivagao. Il. A Constituicdo do Brasil eas convencoes internacionais de protecao aos direitos Jumanos: prevalencia da Constituicao que afasta a aplicabilidade das clau- sulas convencionais antindmicas. 1 Quando a questao — no estdgio ainda primitivo de centralizacao e efetivida- de da ordem juridica internacional - € de ser resolvida sob a perspectiva do juiz nacional ~ que, érgao do Estado, deriva da Constitui¢ao sua propria au- toridade jurisdicional — nao pode ele buscar, sendo nessa Constituiczo mes- rma, o critério da solucao de eventuais, antinomias entre normas internas © normas internacionais; o que € bastan- te a firmar @ supremacia sobre as ul- timas da Constituicao, ainda quando esta eventualmente atribua aos trata- dos a prevalencia no conflito: mesmo nessa hipotese, a primazia derivara da Constituicéo e nao de uma aprioristica forca intrinseca da convencao interna- cional. 2. Assim como nao o afirma em relacdo as leis, a Constituicao nao pre- cisou dizer-se sobreposta aos tratados: a hierarquia esta insita em preceitos inequivocos seus, como os que sub- metem a aprovacao e a promulgacio — 378 | Gilmar Ferreira Mendes das conveng6es ao processo legislativo ditado pela Constituigao e menos exi- sgente que o das emendas a ela eaquele ‘que, em conseqiéncia, explicitamente admite 0 controle da constitucionali- dade dos tratados (CF. art. 102, 11, b). 3, Alinhar-se ao consenso em torno da estatura infraconstitucional, na ordem positiva brasileira, dostratadosaelain- corporados, nao implica assumir com- promisso de logo com o entendimento = majoritario em recente decisto do STF (ADInMC 1.480) ~ que, mesmo em relagio as convengoes internacio- nais de protecdo de direitos funda- ‘mentais, preserva jurisprudencia que a todos equipara hierarquicamente as leis ordinarias. 4. Em relacao a0 or- denamento patrio, de qualquer sorte, ppara dar aeficacia pretendida a clausu- lado Pacto de Sao José, de garantia do duplo grau de jurisdi¢ao, nao bastaria sequer Ihe concedero poderdeaditara Constituicdo, acrescentando-Ihe limi- taco oponivel a lei como éa tendencia do relator: mais que isso, seria neces- sério emprestar norma convencio- ral forca ab-rogante da Constituigao mesma, quando nao dinamitadora do seu sistema, o que nao é de admitir. II. Competencia originaria dos Tribunais ‘eduplo grau de jurisdigao. 1. Toda vez ‘quea Constituicao prescreveu para de- terminada causa a competéncia origi- nria de um Tribunal, de duas uma: ou também previu recurso ordinario de sua decisio (CF, arts. 102, Il, a; 105, I, aeb; 121,42, IVe V) ou, nao o tendo estabelecido, € que o proibiu 2. Em tais hipoteses, o recurso ordina- rio contra decisoes de Tribunal, que ela mesma nio criou, a Constituigzo nao admite que o institua o direito infra- constitucional, seja lei ordindria seja convencao internacional: € que, afora os casos da Justiga do Trabalho ~ que indo esto em causa ~ e da Justica Mili- tar ~na qual o STM nao se superpoe a outros Tribunais ~, assim como as do Supremo Tribunal, com elacdoa todos os demais Tribunais e Jutzos do Pats, também as competéncias recursais dos ‘outros Tribunais Superiores ~ 0 STJ € 0 TSE ~ estio enumeradas taxativa- mente na Constituigao, € 56 a emenda constitucional poderia ampliar. 3. A falta de orgiosjurisdicionais adqua,no sistema constitucional, indispensaveis a viabilizar a aplicacao do principio do duplo grau de jurisdigao aos processos de competéncia originaria dos Tribu- nais,segue-seaincompatibilidadecom a Constituicao da aplicacao no caso da norma internacional de outorga da ga- rantia invocada”."* Ve-se, pois, que o proprio modelo jurisdicional positivado na Constitui- ‘cao afasta a possibilidade de aplicacao geral do principio do duplo grau de Jjurisdigao. ‘Se a Constitnicdo consagra a com- peténcia origindria de determinado or- ‘#80 judicial e mao define 0 cabimento de recurso ordinério, nao se pode co- gitar de um direito ao duplo grau de jurisdicdo, seja porforca delei,sejapor forca do disposto em tratados ¢ con- vvengdes internacionais. 11, RHC79.785/R], rel. Sepulveda Perten- ce, j. 29.03.2000, DJ 22.11.2002. A partir da alteragdo promovida pela EC 45/2004, a redacao conferida pelo § 3.° do art. 5.° passou a indicar ‘uma abertura para a idéia de que trata- dos ou convengées incorporados apés a referida EC, os quais versem sobre direitos humanos, possam inserir no texto constitucional outros mecanis- mos ¢ garantias de efetivacao do duplo ‘grau de jurisdicao. Essa possibilidade, entretanto, deve-se submeter aos mes- mos requisitos formais e objetivos te- queridos para a aprovacao de emendas constitucionais (art. 60 da CF/1988) ‘Aredacao conferida a0 8 3.°do art. 5.9da CEpela EC 45/2004, suscita uma duvida acerca da existencia, ou nao, de abertura para a criagdo de instancias recursais complementares a jurisdicdo nacional. Coloca-se em debate a idéia da legitimidade, ou nao, de que trata- dos ou convencbes que versem sobre direitos humanos possam inserir, no texto constitucional, outros mecanis- ‘mos institucionais de garantias de efe~ tivacao do duplo grau de jurisdicto. Essa hipétese, contudo, ndo se mantém como regra geral, pelo sim- ples fato de que a prestacao jurisdicio- nal corresponde a uma das dimensoes estratégicas do exercicio constitucio- nal da soberania estatal. Em outras pa- lavras, apenas na hipotese excepcional daprevisio dacompetenciasubsidiaria do Tribunal Penal Internacional (art. 52°, 84.9) éque surgeapossibilidade de eventual revisio de decisoes proferidas emuiltima ou tinica instancia constitu- cionalmente disciplinada, tema, entretanto, ainda carece de ‘uma dimensio institucional mais con- PrcreeAO NOKGA. 00s oneos Funan | 379 sistente e de um acervo experimental mais diversificado de matérias a serem eventualmente submetidas ao Tribu- nal Penal Internacional, nos termos do Estatuto de Roma (promulgado, entre és, pelo Dec. 25/2002). De toda sor- te, independentemente da auséncia de quaisquer casos instaurados perante a referida Corte Internacional com rela- ao a jurisdicao brasileira, tem-se, no horizonte de possibilidades constitu- cionais transnacionais, uma pletora de singularidades acerca dos efeitos juri- dico-politicos decorrentes de omissio judicial interna no contexto de siste- ‘mas de protecao internacional de direi- tos humanos. 1.2 Arbitrage e jutzo arbitral A principio, 0 art. 5.°, XXXV, da Constituigao estabelece o monopolio do Poder Judiciario para reparar lesto ou ameaca a direito. Assegura-se o di- reitodeacionarajurisdicaoestatal toda vez que se estiver diante de wma lesdo ‘ou simples ameaca de lesio a direito. ‘Com o advento da Lei de Arbitra- gem (Lei 9.307/1996) abriu-se uma nova via de resolucao alternativa de conflitos, alheia a jurisdicao estatal.* 12, A.utilizacio do juizo arbitral paraaso- Iugao de controvérsias nao € novidade no Diteito brasileiro. Ja a Constitut- ‘clo de 1824 estabelecia que as partes poderiam nomear juzes drbitros para solucionar litigios de natureza civel, cas sentencas seriam executadas sem recurso, por convent das partes (ar 160). Também o Codigo Civilde 1916, cemseusarts, 1.037 81,048, previaaar- —— 0 | Gitmar Feira Mendes ‘A arbitragem consiste em mecanismo extrajudicial de solugao de controvér- sias, segundo o qual as partes litigantes investem, por meio de uma convencao arbitral (clausula compromisséria® € compromisso arbitral"), uma ou mais ppessoas!*de poderesdecisoriosparare- solver seus conflitosrelativosa direitos patrimoniais disponiveis. A determi- nagio decorrente da instancia arbitral possui eficacia de sentenca judicial!® bitcagem como técnica de solugto de contendas civeis, além do Codigo Co- rmercial de 1850 (ars, 245, 24, 348) ¢ do Codigo de Processo Civil de 1939 (rts, 1,03181.046). ALei9.037/1996, porém, trouxe signifcativa inovagio a0 tomar despicienda a homologega0 da sentenca arbital pelo Poder Judici- frio,conferindo-Iheeficaciadesenten- «a jlicial arts. 18 €31) 13, "Art. 42° A cldusula compromissoria ¢ 1 convencio através da qual as partes fem um contrato comprometem-se a submeter& arbtragem os litigios que ‘possam vira surge relativamente tal contrato."(Lei9.307/1996.) 14, "Art. 9° 0 compromisso arbitral € a convengoatravésdaqual aspartessub- ‘meter um ltgio a abitragem de uma ‘oa mais pessoas, podendo ser judicial fou extrajudicial.” (Lei 9307/1996.) 15. "An. 13. Pode ser érbitro qualquer ‘pessoa capaz e que tenha a confianca das partes.” (Lei 9307/1996.) 16. “Art 31. A sentenga arbitral produz, centre as partes e seus sucessores, 0s resmos efeitos da sentenga proferi- da pelos érgios do Poder Judiciatioe, sendo condenatoria, constitu titulo executivo,” (Lei 9.307/1996.) 20"Art. 18. Oarbitro¢juizde fatoe de direit, ea sentenca que proferir nao €, portanto, nao sujeita a posterior ho- mologagao pelo Poder Judiciario.” Assim, tema relevante na perspec- tiva da protecdo judicial efetiva colo- cou-se em torno da constitucionalida- de da Lei de Arbitragem (Lei 9.307, de 23,09,1996) em face do que dispae 0 art. 5.°, XXXV, da Constituigio. No julgamento da Sentenca Es- trangeira 5.206 (agravo regimental), 0 ‘Tribunal discutiu a constitucionatida- de de diversas disposigoes da referida lei, especialmente daquelas concer- nentes ao compromisso de submeter a arbitragem eventual controvérsia na execugio do contrato, A ementa do acérdio, da lavra do Min. Sepiilveda Pertence, explicita a orientacio perfilhada: fica sujeita a recurso ou a homologa- ‘io pelo Poder Judiciétio.” A excecto dda homologacao da sentenca arbitral estrangeira, de competéncia do STF (art. 35 da Lei 9307/1996; arts, 215 a 224 do RISTF), a participacao do Poder Judiciario apenas ocorre quan do haja a necessidade de se utilizar 0 poder de coacao do Estado, nas hipo- teses de descumprimento de cliusula compromisséria, desacordo entre as partes quanto a nomeacao do arbitroe fixaciodeseushonordrios, execuga0e declaracao de nulidade de sentenca ar- bitral, quando no curso da arbitragem surja controvérsia acerca de direitos indisponiveis, condugao de testeru- rnhas, adocdo de medidas coercitivas ou cautelares etc 17. SE-AgRg 5.206, rel. para o acor dio Nelson Jobim, j. 12.12.2001, DJ 30.04.2004, p. 29. “Lei de Arbitragem (Lei 9.307/ 1996): constitucionalidade, em tese, do juizo arbitral; discussao inciden- tal da constitucionalidade de varios dos t6picos da nova lei, especialmente acerca da compatibilidade, ou ndo, en- trea execucao judicial espectfica para a solugao de futuros conflitos da cltusula compromissOria ¢ a garantia constitu- ional da universalidade da jurisdicaio doPoderJudicisrio (CRart.5.°,XXXV), Constitucionalidade declarada pelo plendrio, considerando o Tribunal, por maioriade votos, queamanifestacio de vontade da parte na clausula compro ‘misséria, quando da celebra¢ao do con- trato, e a permissio legal dada ao juiz para que substitua a vontade da parte recalcitrante em firmar 0 compromisso no ofendem oart. 5°, XXXV, da CE Vo- tos vencidos, em parte ~ inclufdo o do relator que entendiam inconstitucio- naisa clausula compromissoria-dadaa indeterminagao de seu objeto~e a pos- sibilidade de a outra parte, havendo re- sisténcia quanto a instituicaodaarbitra- ‘gem, recorrer ao Poder Judicidrio para compelir a parte recalcitrante a firmar ‘0 compromisso, e, consequentemente, declaravam a inconstitucionalidade de Aispositivos da Lei 9.307/1996 (arts. 62, pardgrafo tinico; 7° eseus pardgra- fose,noart. 41 dasnovasredacoes atri- butdasaoart. 267, VII, eart. 301, 1X,do CPC; eart. 42), por violacdo da garantia da universalidade da jurisdigao do Po- der Judiciério, Constitucionalidade—at por deciso unanime, dos dispositives da Lei de Arbitragem que prescrevem a irvecorribilidade (art. 18) eosefeitosde Peore;to voc 00s ones runons | 381 decisao judicidria da sentenca arbitral (ant. 31)". Por maioria de votos, o STF afir- mou a compatibilidade da cléusula ‘compromissoria com a Constituicao, reconhecendo-se & parte contratan- te 0 direito de recorrer ao Judicidrio para compelir 0 recalcitrante a firmar ‘0 compromisso, sob pena de se substi- tuira manifestacio de vontade por de- isto judicial (Lei9.307/1996,arts.6.°, pardgrafo tnico, 7.° e seus pardgrafos, art. 41, que conferiu nova redacao aos arts. 267, VII, e 301, IX, do CPC, e art. 42). Reconheceu-se, ainda, desta feita por unanimidade, a constitucionalida- de dos dispositivos que prevéem a irre- corribilidade e estabelecem efeitos de decisao judicidria da sentenca arbitral. Esse precedente, além de ter per- mitido umasolucao alternativade con- flitos por meio da arbitragem, firmou alegitimidade da cléusula compromis- s6ria como instrumento apto para, em casos de lesdo ou ameaca a direitos pa- trimoniais disponiveis por descumpri- ‘mento da convencio arbitral, acionar garantias judiciais do proceso perante 0 Poder Judiciario. 1,3. Duragao razodvel do processo A EC 45/2004 introduzin norma que assegura a razodvel duracao do processo judicial eadministrativo (art, 18, Maunz-Darig, Eine Auslieferung des Menschen ein staatliches Verfahren und eine Degradierung zum Objekt dieses Verlahrens ware die Verweige- ‘rung des rechtlichen Gehors, Grand- _gesetz Kommentar, cit. — 382 | Gilmar Ferreira Mendes 5°, LXXVIID. Positiva-se, assim, no direito constitucional, orientagto ha muito perfilhada nas convengdes in- temacionais sobre direitos humanos que alguns autores ja consideravam implicita na idéia de protecdo judicial fetiva, no principio do Estado de Di- reito € no proprio postulado da digni- dade da pessoa humana. Ecerto, poroutrolado,queapreten- so que resulta da nova prescri¢ao nao parece estar além do ambito da protecao judicial efetiva, sea entendermos como protecdo assegurada em tempo adequa- do. A duracio indefinida ou ilimitada do processo judicial afeta nao apenas e de forma direta a idéia de protecdo judicial efetiva, como compromete de ‘modo decisivo a protecao da dignidade da pessoa humana, na medida em que permitea transformacao doser humano «em objeto dos processos estatais. Dessarte, a Constituicdo conferiu significado especialao principiodadig- nidade humana como postulado es- sencial da ordem constitucional (art. 1.°, III, da CF/1988). Na sua acepcio origindria, esse principio profbea utli- zagdo ou transformacio do homem em objeto dos processos eacoes estatais.O Estado esta vinculado ao dever de res- peito e protecdo do individuo contra exposigao a ofensas ou humilhagoes. ‘A propésito, em comentarios a0 art. 1. da Constituicao alema, afirma Gunther Dirig quea submissio do ho- ‘mem a.um processo judicial indefinido € sta degradacao como objeto do pro- ccesso estatal atenta contra 0 principio da protecdo judicial efetiva (rechtliches Gehor) e fere o principio da dignidade humana. Assim, tendo em vistaa indissocia- bilidade entre protecio judicial efeti- vva e prestacao jurisdicional em prazo razoavel, e a auséncia de autonomia desta tltima pretensao, é que julgamos pertinente tratar da questio relativa & duracdo indefinida ou desmesurada do processo no contexto da protecao judicial efetiva, reconhecimento de um direito subjetivo a um processo célere — ou com duracao razoavel — impde ao Po- der Pablico em geral eao Poder Judici- rio, em particular, a adocao de medi- das destinadas a realizar esse objetivo. Nesse cenario, abre-se um campo ins- titucional destinado ao planejamento, controle e fiscalizagao de politicas pu- Dlicas de prestacdo jurisdicional que dizem respeito a prépria legitimidade de intervengées estatais que impor- tem, a0 menos potencialmente, lesao ‘on ameaga a direitos fundamentais. O assunto envolve temas comple- 0s e pretensdes variadas, como amo- dernizagao e simplificacao do sistema processual, a criacao de orgios judi- ciais em mimero adequado e a propria ‘modernizacao e controle da prestacao Jurisdicional e de questdes relaciona- dasa efetividade do acesso a justica. O direito razoavel duracao de pro- gesso, a despeito de sua complexa im- plementacao, pode ter efeitos imediatos sobre situagdes individuais, impondo 0 relaxamento da prisio cautelar que te- nha ultrapassado determinado prazo, legitimando a adogao de medidas ante- cipatorias, ou até 0 reconhecimento da consolidacéo de uma dadasituagdocom fundamento na seguranga juridica. Nesse sentido, sA0 expressivos 0s precedentes do STF que concedem ha- beas corpus em razao do excesso de pra- zodaprisio cautelar, O Tribunaltemen- tendido que o excesso de prazo, quando no atribuivel a defesa, mesmo tratan- do-se de detito hediondo, afronta prin- cipios constitucionais, especialmente o dadignidadedapessoahumana (art.1.°, IL, da CF/1988); devido proceso legal (art. 5°, LIV, da CF/1988);presuncaode inocéncia (art. 5.°, LVI, da CF/1.988);€ razodvel duracao do processo (art. 5.°, LXXVIII, da CF/1988), impondo-se, nesse caso, a0 Poder Judiciatio, o ime- diato relaxamento da prisio cautelar do indiciado ou doréu.” Outra interessante hipotese de aplicagto desse imperativo de cele- ridade da prestacao jurisdicional no contexto do processo penal foi afir- mada pela Segunda Turma do STF no 19. HC 85.237/DE rel. Celso de Mello, DJ 29.04.2005; HC 87.164/R}, rel. Gilmar Mendes, DJ 29.09.2006; HC 84.181/R), rel. Marco Aurélio, DJ 13.08.2004; HC 84.543/RN, rel. Elen Gracie, DJ 01.10.2004, HC84.967/RS, rel, Marco Aurélio, DJ 15.02.2005; HC 84.907/S8 rel. Sepilveda Perten- ce, BJ 18.02.2005; HC 85.039/MS, rel, Marco Aurélio, DJ 18.03.2005; HC 84.921/SR, rel. Eros Grau, Dj 11.03.2005; HC84.675/PE, rel. Carlos Yelloso, DJ 01.07.2005; HC 85.400/ PE, rel, Eros Grau, DJ 11.03.2005, HC 86.233/PA, rel. Sepuilveda Pertence, J14.10,2005; HC90.617, rel. Gilmar Mendes, DJ 07.03.2008, Prorecko Wotan. 008 os reNcawena | 383 julgamento do HC 90.617/PE. Nesse julgado, discutia-sea possibilidade, ow io, de reintegracio de desembarga- dorestadual cautelarmenteafastadode suas fung6es jurisdicionais em razio de decisdo do STJ, que, nos termos do art, 29 da LC 35/1979 (Lei Organica da Magistratura Nacional~Loman), rece- eu dentincia criminal em desfavor do ‘magistrado paciente. No caso conereto, a Segunda Tur- ma reconheceu, por maioria simples de votos (2 x 1), 0 excessivo prazo de afastamento do desembargador, o qual permanecera distanciado de suas ati- vvidades por periodo superior a quatro anos e seis meses, sem que a instrucio da acfo penal instaurada nem sequer finalizasse a fase de instrugio corres- pondente a oitiva de testemunhas da defesa e da acusagao. Alem disso, a referida Torma também firmou, por unanimidade de votos, a legitimidade da impetracio de habeas corpus como garantia fundamental apta a levar a0 conhecimento do Poder Judicirio si- tuagées de constrangimento ilegal ou de abuso de poder que, a depender do caso, podem transcender a esfera da liberdade de locomogao propriamente dita da pessoa do paciente. Essa evolucdo no tratamento ju- risprudencial da duracao razodvel do rocesso configura-se como paso de- cisivo para que a propria regularidade da tramitagao de procedimentos inves- tigatorios e eriminais possa ser vindi- cada como uma garantia fundamental que, nos termos do inc. LXXVIIL, deve 384 | Gilmar Ferra Mendes ser assegurada “a todos, no ambito ju- dicial e administrativo” A propria legislacao infraconstitu- cional jé vem se adaptando & novel exi- _gencia constitucional de duracaorazod- veel do processo, O & 1.° do art. 400 do CPP, com a redagdo que Ihe emprestou a Lei 11.719/2008, preve que “as pro- vas serdo produzidas numa s6 audién- cia, podendo 0 juiz indeferir as consi- deradas irrelevantes, impertinentes ou protelatérias”, o que toma a apreciacao Judicial mais célere, dando efetividade a0 citado preceito constitucional 1.4 Publicidad do processo A publicidade dos tos processuais € corolatio do principio da protecao judicial efetiva. As garantias da ampla defesa, do contraditério, do devido processo legal apenas sio eficazes se © proceso pode desenvolver-se sob 0 controle das partes € da opiniao pabli- cca. Nesse sentido, Ferrajoli afirma tra- tar-se de uma garantia de segundo gran ‘ou garantia de garantias.® Assim, ao lado da motivacao, a pu- Dlicidade ¢ fonte de legitimidade e ga- rantia de controle, pelas partes e pela sociedade, das decisoes judiciais. O texto constitucional consagta a publicidade dos atos processuais, esta- belecendo que a lei s6 podera restrin- gi-la quando a defesa da intimidade ow 0 interesse social o exigirem (art. 5.°, LX). Essa regra encontra correspon- 20. Luigi Ferrajoli, Direto e razao: teoria do garantismo penal, So Paulo: Ed. RT, 2002, p. 492. dencia no art. 93, IX, da CE que consa- ‘graa publicidade dos julgamentos dos orgaos do Poder Judicidrio, podendo a lei, seo interesse publico oexigir, limi- tar a presenga, em determinados atos, as proprias partes e a seus advogados ousomentea estes. Como se vé, estabelece a Constitui- fo tanto a regra da “publicidade plena ou popular” como a tegra da “publici- daderestrita ou especial” Assim, are~ gra da publicidade comportaexcecoes, tendo em vista o interesse publico ou a defesa da intimidade. Por exemplo, 6 texto constitucional expressamente ressalva do postulado da publicidade o julgamento pelo Tribunal do Jur, a0 estabelecer o sigilo das votacdes (art. 5.°, XXVIII, b). A legislacdo tambem assegurava o sigilo dos atos processu- ais nas hip6teses de julgemento dos crimes referidos na antiga Lei de TOxi- cos (Lei 6.368/1976)" e de processos 21. CE. Antonio Scarance Fernandes, Pro- cesso penal constitucional, 4, ed., S80 Paulo: Ed. RT, 2005, p.72. 22, “Art. 26. Os registros, documentos ou pecas de informacao, bem como 0s autos de prisio em flagrante e os de inquerito policial para apuracao dos crimes definidos nesta Lei serao man- tidos sob sigilo,ressalvadas, para ele to exclusivo de atuacio profissional, as prerrogativas do juiz, do Ministerio Pablico, da autoridade policial e do advogado na forma da legislacao es- pecifica. Pardgrafo unico. Instaurada 8 agao penal, ficara a critério do juiz amanutencao do sigilo 2 que se refere este artigo.” (Referida lei fot revogada pela Lei 11.343, de 23.08.2006.) da Justiga Militar (arts. 434 € 496 do CPP Militar) No processo penal, se a publici- dade prevalece no procedimento acu- satorio, na fase inquisitoria, o sigilo dos atos deve ser preservado, em prol da propria eficacia das investigacoes que visam & elucidagao dos fatos que, posteriormente, poderao ser objeto de eventual tipificacao penal. Portanto, cuidado especial ha de ‘merecer a investigacio criminal, tendo em vista o seu caréter inicial ou preli- minar ea possibilidadede que ocorram graves danos ao eventual autor ea viti- ma, em razio da publicidade. Por isso, prescreve 0 Codigo de Processo Penal, em seu att. 20, que a autoridade deve assegurar, no inqué- rito, “o sigilo necessério a elucidacao do fato on exigido pelo interesse da sociedade”, Nesse sentido, a doutrina tem esclarecido que, “sendo o inquéri- to um conjunto de diligencias visando a apurar o fato infringente da norma penal e da respectiva autoria, parece Sbvio deva ser cercado do sigilo neces- sitio, sob pena de se tornar uma bur- Ia, Assim, pode-se afirmar, seguindo tal entendimento, que “naose concebe investigacio sem sigilacao”.”> E preciso esclarecer, por outro lad que o sigilo que reveste a tramitagdo dos inquéritos nao pode ser absoluto, devendo ser estabelecido na medida ne- cessiria, de acordo com as circunstan- cias especificas de cada investigacao, 23, Femandoda Costa Tourinho Filho, Co- digo de Processo Penal comentado, 5, ed., ‘20 Paulo: Saraiva, 1999, vol. 1, p. 64 Prongho Mo. 00s onaos ra | 385 em que os indiciados, 0s fatos apurados eaconjunturasocial stovariantes deter- minantes da sigilacao necesséria." Observe-se, oportunamente, que a Constitui¢ao de 1988 institui uma ordem democratica fundada no valor da publicidade (Offentlichkeit), subs- trato axiolégico de toda a atividade do Poder Publico. No Estado Democriti- co de Direito, a publicidade € a regra; o sigilo, a excecdo, que apenas se faz presente, como impoe a propria Cons- tituigao, quando seja imprescindivel a seguranca da sociedade e do Estado (art. 5.°, XXXII} € quando nao preju- dique o interesse publico a informa- ao (art. 93, 1X), ‘Assim, por meio de cléusula nor- ‘mativa aberta e conceito juridico inde- terminado, o Cédigo de Processo Penal atribui a autoridade judictria poderes discriciondrios para definir, em cada caso, quala medida do sigilonecessério a elucidacao dos fatos ou exigido pelo interesse da sociedade (art. 20). Deve a autoridade fazer 0 sopeso das razdes tem prol do segredo das investigacoes, por um lado, e da sua publicidade, por outro, Trata-se, enfim, de um exerci- cio de ponderacao condicionado pela conformacao dos fatos determinantes do caso concreto. A cada caso sera apli- cada uma medida diferenciada do que seja o sigilo necessério a eficiencia das investigacoes. E, nesse sentido, a mu- tagdo das circunstancias faticas pode- 1 justificar tanto a ampliacéo como a restrigao, total ou parcial, do sigilo ini- 24, HC 90.232, rel. Sepulveda Pertence, Dy 02.03.2007. 36 | Gilmar Pereira Mendes cialmente decretado, sempre tendo em vistaaefetividade dasinvestigagées.cri- rminais, assim como o interesse social. Para além do contexto investiga- torio ou penal, no julgamento do MS 26.900/DE, 0 Plenatio do STF depa- rou-se com a possibilidade, ou nao, de aplicagéo da garantia constitucional da publicidade a procedimento de natu- reza politica que, a rigor, ndo possuiria pertinéncia com instincia processual penal propriamente dita Nesse precedente, discutia-se, sin- gularmente,aexisténcia de direito iqui- doe certo de 13 deputados federais para terem livre acesso a0 Plendrio doSenado Federal para acompanharem a tramita- to da sesso de deliberacio acerca da cassacdo de mandato de senador da Re- piblicaque,aomomentodaimpetracao, cocupavaa funcao de presidente do Sena- do. Por maioria (6 x 4), 0 STF decidiu que os deputados impetrantes deveriam ter assegurado o direito de acompanhar ateferida sessdo parlamentat. Nessa assentada, a tese condutora doacérdao pautou-se pela observancia do principio constitucional da publi- cidade. Em radicalizacao desse posi- cionamento, os votos dos Ministros Marco Aurélio € Carlos Britto, além de deferirem a seguranca nos termos supramencionados, estenderam a pro- tecio judicial do direito liquido e certo invocado para resguardar ainda aaber- tura do sigilo das votacoes. Atese vencida, porseu turno, inter- pretoua questio da restrigio do acesso dos impetrantes ao Plendrio do Senado como um conflito que nao envolveria necessariamente discussao sobre vio- lacao de direito Ifquido ¢ certo, mas tdo-somente disposicao de carater in- terno (interna corporis). Ou seja, para a vertente jurisprudencial vencida, 0 tema daabertura, ou nao, das delibera- Goes parlamentares ao publico corres- ponderia a matéria que deve ser regida pela disciplina regimental da respecti- va Casa Legislativa Em sintese, para além das nuancas que essa hipétese pode indicar no que dizrespeitoaspossibilidadesdecontro- Je judicial de questoes eminentemente politicas (v, infra, item sobre questoes politicas), a questo da tutela da ga- rantia constitucional da publicidade consiste em mecanismo que somente pode ser aferido a partir dos espectfi- cos balizamentos que 0 caso concreto revele. E dizer, o respeito ao imperati- vo de publicidade dos procedimentos administrativos e judiciais nao pode fazer tabula rasa da possibilidade sem- pre presente de que as condicionantes materiais da espécie demandem uma protecao mais efetiva com relagdo a qual 0 Estado nao pode imputar im- acto desproporcional de direitos fun- damentais individuais, cuja violagaose torne irreversivel. 1.5 Judicializacao de questoes polticas ., Nao se reconhece indenidade aos dios ou decisées politicas se elas afetam ow ameacam direitos individuais, Essaé orientagao pactfica do Supremo Tribu- nal desde os primérdios da Republica. A doutrina das questoes politicas chegouaoSTF como famosoepolémico Julgamento do HC 300, impetrado por Rui Barbosa em 18.04.1892. Em sua ppeticdo inicial, Rui Barbosa defendeu, amparado na doutrina norte-americana dapolitical questions, criada por influen- cia da decisio do Justice Marshall no célebre caso Marbury vs. Madison, que “os casos, que, se por um lado tocam a interesses politicos, por outro envol- vem direitos individuais, nao podem ser defesos a intervencio dos tribunais, amparo da liberdade pessoal contra as invasbes do executivo”. Assim, “onde quer que haja um direito individual violado, ha de haver um recurso judicial para a debelagio da injustica’.* Apesar da elogiiente defesa reali- zada por Rui Barbosa, 0 STF indeferiu o habeas corpus, por entender que ndo caberia a0 Tribunal envolverse em questoes politicas do Poder Executivo 25, Apesar da eloqiente defesa realizada por Rui Barbosa, o STF indeferiu 0 habeas corpus, por entender que nao caberia ao Tribunal envolver-se em questdes politicas do Poder Executive ou Legislativo. Cf: Leda Boechat Ro- drigues, Historia do Supremo Tribunal Federal, t, /1891-1898: defesa das li- berdades civis 2. ed., Rio de Janeiro: Civilizagao Brasileira, 1991, p. 22. Assim, tl orientagao apenas foi fixada ‘nos posteriores julgamentos dos Habe- 1s Corpus 1.063 « 1.073, de 1898, nos quaiso Tribunal deixou assentado que a doutrina das questoes politicas nao poderia deixar ao desamparo as liber dades individuais. C£.Léda Boechat Rodrigues, Historiado ‘Supremo Tribunal Federal cit. p. 20. Prone von. bos ontros nanan | 387 ‘ou Legislativo.”” Suas licdes apenas fo- ram devidamente apreciadas pelo Tri- ‘bunal nos posteriores julgamentos dos Habeas Corpus 1.063 e 1.073, ambos de 1898, nos quais 0 Tribunal deixou assentado que a doutrina das questoes politicas nao poderia deixar ao desam- paro as liberdades individuais Os célebres ensinamentos de Rui Barbosa influenciaram decisivamen- te a formulacao do art. 141, 8 4°, da CF/1946, precedente remoto do atual art. 5.°, XXV, da CF/1988.* A intencao do constituinte era romper com a or- dem constitucional conformada pela Constituigao polaca (de 1937), que prescrevia em seu art, 94 ser “vedado a0 Poder Judiciario conhecer de ques- 140 exclusivamente politica”.”® Em comentarios ao referido artigo, ‘Aratijo Castro assim afirmou:”* 27. 28, Cf. Idem, ibidem. CE. José Flaeres Marques Teixeira, A doutrina das questoes politicas no Su- remo Tribunal Federal, Porto Alegre: Fabris, 2005, p. 93. “Aleindo poderaexcluirdaapreciagao do Poder Judiciario qualquer lesto de direito individual” (CF/1946,art.141, 8 4.°) Observe-se que o texto de 1988, nova ao garantir 0 acesso a justica também no caso de ameaca a direito. (O art. 94 da Constituigdo de 1937 re- petiao teor doart. 68 da Constituicao de 1934: “E vedado ao Poder Judi 4rio conhecer de questbes exclusiva ‘mente politicas”. ‘Arailjo Castro, A Constituigao de 1937, edigao fac-similar, Brasflia: Senado Fe- eral, 2003, p. 205-206. 29. 30. 31 38 | Ciar Ferrite Mendes “E doutrina corrente que as ques- tes de natureza politica escapam & Jurisdicao do Poder Judiciario; mas, para que tal aconteca, torna-se mister que tais questées sejam exclusiva- mente politicas, ‘Uma questio, observa Ruy Barbo- sa, pode ser distintamente politica, al- tamente politica, segundo alguns, até puramente politica, fora dos limites da Justica, e, contudo, em revestindo a for- ma de um pleito, estar na competencia dos tribunais, desde que o ato, execu- tivo ou legislativo, contra o qual se de- mande, fira a Constituigio, lesando ou negando um direito nela consagrado, Como questdes exchusivamente politicas devem entender-se somente aquelas que se referem ao exercicio dos poderes que a Constitui¢ao confia a in- teira discrigao do Legislativo e do Exe- cutivo. Assim, tratando-se de decreta- 0 de intervencao nos Estados ou de celebragao de tratados internacionais, oJudictério ndo pode entrarnaaprecia- io de motivos que determinam 0 ato legislativo ou executivo. Mas, se, em virtudedesseato, for violadoumdireito privado, assegurado pela Constituicao, entio, para a protecio de tal direito, sera legitima a agao do Judiciario. A jurisprudéncia do STF tem reco- mhecido sempre a incompeténcia do Judiciario para conhecer de assuntos politicos, desde que em causa nao es- teja um direito privado que constitua o objeto principal da demanda” Assim, alternando momentos de maior emenorativismo judicial," 0ST, a0 longo de sua histéria, tem entendido que a discricionariedade das medidas politicas nao impede o seu controle ju- icial, desde que haja violagio a direitos assegurados pela Constituicao. Apesar de que, muitas vezes, € ta- refa demasiado complicada precisar os limites que separam uma questo po- litica de outra de natureza juridica ou nao politica,” tal fato nao deve servir 32, A Primeira Republica foi mareada pela atuagao acanhada do Tribunal no to- ante ao enfrentamento de questoes politicas, que muitas vezes serviram de subterfigio para que no howvesse Julgamento, transferindo a responsa- bilidade das solucdes para os Poderes Legislativo e Executive, Nesse perio- do, entre 1910 e 1930, a doutrina das quest6es politicas foi aplicada pelo ‘Tribunal em casos de decretacao de estado de sitio, intervencao federal, verificagao de poderes, duplicata de ‘governos estaduais e assembleias le- gislativas,cassagio de mandato parla- mentar e impeachment de governantes estaduais. Passado esse primeiro peri odo, 0 STF se deparou com casos de rejeigao de veto a projeto de lei, con- ‘vocagao extraordindria do Congresso Nacional © deliberagées da Camara dos Deputados, nos quais passou a ter uma postura mais ativa, aceitando x assindicabilidade judicial de questoes politcas nas quais era possivel obser- vara violacao a direitos individuais. 33, Nesse sentido, Pontes de Miranda, fem comentarios a Constituigio de 1937, afirmava: *O problema técnico de aviventar os marcos entre o domi nio judicisrio e 0s dos outros Poderes, de subterfigio para que o Poder Judi- Cidrio se abstenha do cumprimento de sseu dever constitucional na defesa dos direitos fundamentais Mantendo essa postura, o STE na ‘ultima década, tem atuado ativamen- te no tocante ao controle judicial das ‘questdes politicas nas quais observa violacio & Constitui¢ao, Os diversos ‘casos levados recentemente ao Tribu- nal envolvendo atos das Comissoes Parlamentares de Inquérito corrobo- ram essa afirmacao. No julgamento do MS23.452/R], rel. Min, Celso de Mello, deixouoSTFassentadooentendimento segundo o qual “os atos das Comissbes Parlamentares de Inquérito sio passt- veis de controle jurisdicional, sempre executivo e legislative, ¢ érduo, Tanto mais arduo quanto se sabe que € preci- so pé-loem termas decisivos enitidas: exercer o Poder Judiciario toda a sua competéncia - quer dizer: nao deixar, por timide2, por escripulo, por temor a opiniao publica do momento, ou da tendéncia maior da imprensa, de apreciar e julgar onde os principios da estrutura americano-brasileira The permitem que aprecie e julgue; e nao exercer a funcio de julgar onde nao esta a linha da sua competéncia. Nao ir além, porém nao se abster de ir até onde pode, pois, deve. A mesma cir- ccunspec¢ao que Ihe aconselha parar onde se usurparia 4 funcao de outro Poder, use criticariao quesé deoutro Poder depende, torna-se mal quando ‘induz & abstinencia, a remtincia, a cO- moda inércia ea pusilanimidade, que ‘so crimes” (Comentarios a Constitui- ‘G40 Federal de 10 de novembro de 1937, Rio de Janeiro: Irmaos Pongett, 1938, © 3,p.31-32). Proecko OKA. oo ones mounts | 389 que, de seu eventual exercicio abusivo, derivarem injustas lesdes ao regime das liberdades publicas ea integridade dos direitos e garantias individuais’.* Nesse sentido, em seu voto, o Min. Celso de Mello deixou enfatizado que, “com a finalidade de impedir que 0 exercicio abusivo das prerrogativas es- tatais pudesse conduzir a praticas que transgredissem o regime de liberdades publicas e que sufocassem, pela opres- so do poder, os direitos e garantias individuais, atribuiu-se ao Poder Judi- cidrio a funcio eminente de controlar os excessos cometidos por qualquer das esferas governamentais”. Tal entendimento também tem possibilitado ao Tribunal a admissao da sindicabilidade judicial dos atos da ‘Comissdo de Etica e Decoro Parlamen- tarda Camara dos Deputados, quando, em processo disciplinar € de cassacao de parlamentar, nao observa as garan- tias da ampla defesa, do contraditorioe do devido processo legal” Quanto ao tema das medidas pro- visorias, por outro lado, o Tribunal tem admitido o controle judicial dos pressupostos de relevancia e urgencia —exigidos pelo art. 62 da Constituigao, ppara sua edi¢ao ~ apenas nos casos em. que esteja objetivamente evidenciado Batente excesso de poder por parte do Poder Executivo. 34, MS 23.452/R], rel. Celso de Mello, Dy 12.05.2000. 35, MS 25.647/DF rel, Carlos Britto, j 30.11.2005. 390 | Gilmar Ferra Mendes Seguindo na mesma linha de en- tendimento, o Tribunal tem evitado in- terferir na competéncia do Congresso ‘Nacional para conceder anistia**a seus proprios membros, como prescreve 0 art, 48, VIII, da Constituicao. Enten- de o STF que “a anistia € ato politico, concedido mediante lei, assim da com- peténcia do Congtesso e do Chefe do Executivo, correndo por conta destesa avaliacao dos critérios deconveniéncia ¢ oportunidade do ato, sem dispensa, entretanto, do controle judicial, por- que pode ocorrer, por exemplo, des- vio do poder de legislar ow afronta 20 devido processo legal substancial (CE art. 5.°, LIV)" (ADI 1.231/DF).” Ou- tro nao foi o entendimento da Corte no julgamento da ADI 2.306/DE™ no qual {oi reafirmada a competéncia do Con- gresso Nacional para conceder anistia, inclusive seus membros. 36. No tocante ao tema da anistia, lem- ‘bros ligdes de Joao Barbalho, em co- ‘mentirios ao art. 34, 27, da CF/1891: “Decretando anistia, 0 Congresso Na ional exerce atribuicdo sua privatv de cardter eminentemente politico, ¢ renhum dos outros ramos do poder piblico tem autoridade para entrar na apreciacto da justica ou conveniencia € motivos da lei promulgada conse- sgrando al medida, que éumatosolene de cleméncia autorizada por motivos de ordem superior” (Joo Barbalho Uchoa Cavalcanti, Constituicao Fede- ral brasileira (1891), Brasflia: Senado Federal, 2002, p. 133). 37, ADI 1.231/DE, rel. Carlos Velloso, DJ 28.04.2006, 38, ADI 2.306/DE, rel. Ellen Gracie, DJ 31.10.2002. 2. Titularidade do direito a protegao judicial efetiva Sao titulares do direito & protecto Judicial efetiva tanto as pessoas natu- aiscomoas pessoas juridicas. Atémes- mo as pessoas juridicas de diteito p- Dlico interno ou as pessoas juridicas de direito publico estrangeiras gozam do direito a protecdo judicial efetiva con- tralesdo ou ameaca de lesio a direito Ecomumnasdiversasordensjuridi- casa adogio de critérios diferentes para a capacidade de direito e a capacidade de exercicio, no ambito da protecio ju- dicial efetiva (arts. 7.°a 13 do CPC). Assim, ainda que se reconheca a capacidade de direito de eventual titu- lar menor de idade, o direito ha de ser exercido mediante representacdo ou assistencia de pessoas legalmente de- signadas (arts. 8.°¢ 9.° do CPC). Nao raras vezes a lei distingue cla- ramente a personalidade juridica da personalidade judiciéria, outorgando aentidadesdespersonalizadas odireito de defesa de interesses em juizo, como ocorre, por exemplo, nas hipoteses em ‘que a massa falida ¢ representada pelo sindico, ¢0 esp6lio, pelo inventariante (art. 12 do CPC), No plexo constitucional dos direi- tos individuais ecoletivos relacionados a9 direito do trabalho, ajurisprudencia do STF aponta para outra modalidade de adjudicagao que escapa a essas figu- ras classicas do direito processual civil infra, item sobre substituigao proces- sual), Trata-se do instituto da substitui- ‘fo processual promovida pelos sindi- ceatos, aos quai, nos termos do inc. Il do art. 8° da CF/1988, “cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questdes judiciais ou administrativas”. De modo geral, todos esses casos regulares excepcionais de titularidade das garantias fundamentais do proces- s0 sio indicativos de que o carter de indisponibilidade dos direitos funda- ‘mentais pode permitir, em determina- dos casos especificos, a invocagao de prerrogativas por outros atores indi- viduais e coletivos que, atendidos os requisitos legais, passam a atuar como interlocutores do Poder Judiciario. 3. Conformacio elimitacio do direito a protecio judicial efetiva Como oambito da protecao judicial é inequivocamente normativo, nao ha divida de que as providéncias legislati- vas basicas que se desenvolvam tém por escopo conferir conformacao a esse di- reito. Evidentequeoexerciciododireito de protecao judicial efetiva pressupoe a cexistencia de tribunais, que sejam au- tonomos e independentes na tarefa de definigao de competéncias e de adocao de procedimentos a serem adotados. Dat afirmar-se correntemente 0 ca- réter de garantia institucional desse di- reito, o que nao autoriza, porém, con- cluir que semelhante garantia depende exclusivamente da atividade legislati- vva ordinaria ou que qualquer decisto do legislador configura concretizacio Pronto wo1cH. 00s om reNcnuenras | 391 do direito a protecao judicial efetiva” Em muitos casos lei fixa requisitos de admissibilidade da agao e estabelece regras basicas de procedimento. Anote-se que nem todas as normas legais referentesa esses direitos indivi- duais t@m 0 propésito de restringir ou limitar poderes ou faculdades. Nao ra- ras vezes, destinam-se as normas legais a completar, densificar e concretizar direito fundamental? E 0 que se verifica, vg., em regra, na disciplina ordinaria do direito de propriedade material ¢ intelectual, do direito de sucessdes (CR art. 5.°, XXI- XXXD), no ambito da protecao ao con- sumidor (CE, art. 5.°, XXXT1) e do di- reito a protecao judiciaria (CF, art. 5.°, XXXV, LXVILLXXID. ‘Sem pressupor a existéncia das nor- masdedireitoprivadorelativasaodireito de propriedade, ao direito de proprieda- de intelectual e ao direito de sucessdes, no haveria cogitar de uma efetiva ga- rantia constitucional desses direitos, Da mesma forma, a falta de regras processuais adequadas poderia trans- formar o direito de protecao judicié- ria em simples esforco retorico. Nes- 39, Cf, Pieroth/Schlink, Grundrechte—Sta- atsrecht U, cit, p. 265. CL, sobre o assunto, Robert Alexy, ‘Theorie der Grundrechte, Frankfurt am Main: Suhrkamp, 1986, p. 300; Bodo Pieroth, Bernhard Schlink, Grundre- chte ~ Staatsrecht Il, 21. ed., Heidel- berg, 2005, p. 53-54; José Joaquim Gomes Canotilho, Direito constitucio- nal, 4.ed., Coimbra: Almedina, 1986, 633. #0. 392 | Gilmar Ferreira Mendes sa hipotese, o texto constitucional € explicito ao estabelecer que “a lei nao excluiré da apreciacao do Poder Judi- cidrio lesdo ou ameaca a direito” (art. 5°, XXXV). Fica evidente, pois, quea intervencao legislativa nao apenas se afigura inevitavel, como também ne- cesséria, Veda-se, porém, aquela in- tervencio legislativa que possa afetar aprotecdo judicial efetiva. Dessarte, a simples supressio de rnormas integrantes da legislagao ordi- natia sobre esses institutos pode lesar ‘do apenas a garantia institucional ob- jetiva, mas também direito subjetivo constituctonalmente tutelado.* A conformagao dos direitos indi- viduais assume relevancia no tocante 0s chamados direitos com ambito de protecao estrita ou marcadamen- te normativo (rechtsnormgepragter Schutzbereich), uma vez que € a pré- prianormacio ordindria que acaba por conferir contetido € efetividade a ga- rantia constitucional.®” Todavia, regtas sobre capacidade processual, competéncia, obrigatorie- dade ou nao de atuacéo de advogado, prazos para propositura da acto, efeito vinculante de decisoes de outros tribu- nais, coisa julgada hio de ser conside- radas, em principio, normas destina- das a conferir conformacio ao direito de protecao judicial efetiva 41. Robert Alexy, Theorie der Grndrechte cit, p. 303, 42. Cf., sobre oassunto, José Joaquim Go- ‘mes Canotilho, Direito constitucional ‘it, p. 634, Valendo-se da formula ambigua constante do art. 5.°, XXXV —alei nao poderd excluir -, pode-se sustentar que, ao lado da tarefa conformadora, © legislador nao esta impedido de res- tringir ou limitar o exercicio do direito a protecdo judicial, especialmente em razio de eventual colisio com outros direitos ou valores constitucionsis.” Nesseambito,coloca-seodebateso- bre as formulas de preclusao que, mui- tas vezes, impoem limites temporais 20 exercicio do direito, tendo emvistacon- sideragdes de seguranca juridica Qualquer que seja a conclusio a propésito do carater de mera confor macao ou de limitagdo, nao pode o le- gislador, a pretexto de conformar ou disciplinar a garantia da protecao judi- ial efetiva, adotar disciplina que afete, de forma direta ou indireta, o exercicio substancial desse direito. Nesse sentido, vale mencionar a decisdo do STF na Rp. LO77/RJ, de 28.03.1984. Cuidava-se da aferigdo a constitucionalidade de dispositivos constantes da Lei Estadual 383 (de 04.12.1980, do Estado do Rio de Janei- 10) que elevavam, significativamente, os valores da taxa judicidria naquela unidade federada. Apés precisar a na- tureza e as caracteristicas da taxa ju- diciéria, enfatizou 0 eminente relator, ‘Min. Moreira Alves: “Sendo — como jé se acentuou — a taxa judicidria, em face do atual siste- 43, CL. sobre o assunto, no direto alemo, PlerothySchlink, Grundrechte— Staats- recht II cit., p.67. ‘ma constitucional, taxa que serve de contraprestagio a atuacao de 6rgaos da Justica cujas despesas nao sejam cober- tas por custas e emolumentos, tem ela como toda taxa com carater de con- traprestagao—um limite, que é 0 custo da atividade do Estado, dirigido aque- Ie contribuinte. Esse limite, evidente- mente, € relativo, dada a dificuldade de se saber, exatamente, 0 custo dos servicos a que corresponde tal contra- prestagao. O que é certo, porém, €que nao pode taxa dessa natureza ultrapas- sar uma equivalencia razoavel entre © custo teal dos servicos eo montante a que pode ser compelido o contribuinte a pagar, tendo em vistaa base de célcu- lo estabelecida pela lei eo quantum da aliquota por esta fixado”.** Fixada essa idéia de equivalen- cia razoavel entre custo do servico € prestacdo cobrada, concluiu-se pela inconstitucionalidade do art. 118 da lei estadual fluminense, que, de forma genérica, fixava em 2% sobre o valor do pedido o quantum devido pelo contri- buinte, pelas seguintes razies: “(..) Porisso, taxas cujo montante seapura combase em valor do proveito do contribuinte (como ¢ 0 caso do va- lor real do pedido), sobre qual incide aliquota invaridvel, tem necessaria- mente de ter um limite, sob pena de se tornar, com relacao as causas acima de determinado valor, indiscutivelmente exorbitante em face do custo real da atuacdo do Estado em favor do contri- 44, Rp. L077, rel, Moreira Alves, RTJ, 112 (4, 58.59. ProTeXo NOI. bos oeTos ences | 393, buinte. Isso se agrava em se tratando de taxa judicidria, tendo em vista que boa parte das despesas do Estado ja sto cobertas pelas custas e emolumentos. Nao estabelecendo a lei esse limite, € nao podendo o Poder Judicidrio esta- belecé-lo, é de ser declarada a incons- titucionalidade do proprio mecanistno de aferigao do valor, no caso concreto, da taxa judiciaria, certo como € que conduzird, sem divida alguma,a valo- res reais muito superiores aos custos a que servem de contraprestacao. A falta desse limite torna incompativel 0 pro- prio modo de calcular o valor concreto da taxa com a natureza remuneratéria desta, transformando-a, na realidade, num verdadeiro imposto”.* ‘Ve-se, assim, que, embora se acei- te a idéia da tributacao com o fim de assegurar a prestagio do servigo juris- dicional (taxa judiciaria), repudia-se a possibilidade de que estas alcancem valores que possam dificultar 0 pr6- prio exercicio do direito de protecto judicial efetiva.* 45, Rp. 1.077, rel, Moreira Alves, RTJ, 112 aya4ess, 46, Nesse sentido: ADI 2.655/MT, rel. El Ten Gracie, DJ 26.03.2004; ADI 2.040, rel. Mauricio Corréa, DJ 25.02.2000; ADI 948, rel. Francisco Rezek, Dj 17.03.2000; ADI-MC 1.926, rel. Se- pullveda Pertence, DJ 10.09.1999; ADI-MC 1.651, tel, Sydney Sanches, DJ 11.09.1998; ADLMC 1.889, rel, Nelson Jobim, DJ 14.11.2002; ADI- MC 1.772, rel, Carlos Velloso, DJ (08.09.2000; ADI-MC 1.378, rel. Celso de Mello, DJ 30.05.1997; Rp. 1.074, rel Djaci Paledo, DJ 07.12.1984. 38 | Gilmar Ferreira Mendes Evidentemente, nao se pode olvi- dar queo texto constitucional assegura também a assisténcia judicial gratuita para aqueles que nao dispoem de con- digdes financeiras (art. 5.°, XXIV), Em relacao a tais restrigdes, assu- me significado 0 principio da propor- cionalidade na sua triplice acepcao (adequacao, necessidade ¢ proporcio- nalidade em sentido estrito).. Um bom exemplo é aquele cons- tante da ADI 3.168." Eis o teor da ‘ementa desse julgado que, retomando a jurisprudéncia firmada com relacio a Lei 9.099/1995 (Lei dos Juizados Es- peciais), estabeleceu distingao entre as causas civeis e criminais no ambito da competéncia dos juizados especiais, federais instituidos por meio da Lei 10.259/2001: “Agdo direta de inconstitucionali- dade. Juizados especiais federais. Lei 10.259/2001 art. 10. Dispensabilidade de advogado nas causas civeis. Impres- cindibilidade da presenga de advogado znas causas criminais. Aplicagao subsi- diariada Lei9.099/1995. Interpretacio conforme a Constituicao. E constitucional o art. 10 da Lei 10.259/2001, que facultaas partes de- signacdo de representantes para a cau- ssa, advogados ou nao, no ambito dos Juizados especiais federais. No que se tefere aos processosde natureza civel, 0 STF ja firmou o entendimento de que a imprescindibilidade de advogado € re- lativa, podendo, portanto, ser afastada 47. ADL 3.168/DF, rel Joaquim Barbosa, ‘DJ03.08.2007. pela lei em relacao aos juizados espe- Ciais. Precedentes. Perante os juizados especiais federais, em processos de na- tureza civel, as partes podem compare- cer pessoalmente em juizo ou designar representante, advogado ou nao, desde que a causa nao ultrapasse o valor de sessentasalariosminimos (art.3.°daLet 10.259/2001) e sem prejuizo da aplica- ao subsididria integral dos paragrafos do art. 9.°da Lei 9.099/1995. Ja quanto ‘aos processos de natureza criminal, em. homenagem ao prinespio da ampla de- fesa, €imperativo que o réu compareca, 0 processo devidamente acompanha- do de profissional habilitado a ofere- cer-the defesa técnica de qualidade, ou seja, deadvogado devidamente inscrito nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil ou defensor puiblico. Aplica- ‘edo subsididria do art. 68, Il, da Lei 9.099/1995. Interpretagao conforme, para excluir do ambito de incidéncia do art. 10 da Lei 10.259/2001 05 feitos de competéncia dos juizados especiais ccriminais da Justica Federal”. No caso desse precedente, o Tribu- nal buscou resguardar a indisponibili- dade do direito de defesa na esfera pe- nal e de seu aperfeicoamento por meio do acesso dos cidadaos & protecio téc- \co-juridica proporcionada pelos pro- issionais da advocacia e da defensoria publica no bojo da tarefa indispensavel de tutela de prerrogativas que, a0 me- nos em tese, podem repercutir sobre a liberdade de locomogao do jurisdicio- nado (art. 5°, XV, da CF/1988). bea 3.1. Proibi¢do de liminares e exigéncia de caucio Questo que, de quando em vez, suscita diivida diz respeito a compati- bilidade da proibigao de cautelar, em determinadas matérias, com o princi- pio da protecao judicial efetiva OSTF tementendido queasimples proibicao de concessao de cautelar em determinadas situagdes ou matérias indo se revela afrontosa ao principio da protecto judicial efetiva, ja que, mui- tas vezes, tais proibigdes apenas expli- citam regras do senso comurn quanto aosriscosreversos, decorrentes da pro- babilidade de se ter um quadro de diff- cilreversio ou de revisdo praticamente impossivel. Assim, so comuns, na or- dem juridica brasileira, proibigdes de liminares, cautelares ou tutelas anteci- ‘padas, como se observa, por exemplo, nas disposicdes da Lei 4.348/1964, que profbea concessao de medidas limina- res em mandados de seguranca, que tenham por objeto a reclassificacao ou equiparacao de servidores publicos, ou a concessio de aumento ou extensio de vantagens (art. 5.° da CF/1988). A proibigo genérica de conces- sto de liminares pode, porém, afetar a propria protecio judicial efetiva, pois, ‘muitas vezes, o deferimento da liminar tem em vista a conservagio do direito material postulado. Aodiscutiraconstitucionatidadeda Lei 7969/1989, queestendia paraasme- didas cautelares as restric6es existentes para a liminar em mandado de seguran- a, anotou o relator para o Acordao, Se- piilveda Pertence, que referida lei con- ProT¢X0 IGA 008 oo wuNcn | 395 sistin em uma “resposta a manifestacao daquele entusiasmado e bem intencio- nado abuso da cautelar inominada (..) que vinha provocando um fendmeno inusitado na pratica brasileira, a fuga do mandado de seguranca para a acto cautelar inominada, porque, em relagio a esta, nao vigoravam as vedagdes e li- ‘mitagbes antecedentes do mandado de

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