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STEWART R. CLEGG, CYNTHIA HARDY, WALTER R. NORD Organizadores MIGUEL CALDAS (EAESP/FGV), ROBERTO FACHIN (UFRGS), ‘TANIA FISCHER (UFBA) Organizadores da Edigio Brasileira HANDBOOK DE ESTUDOS ORGANIZACIONAIS Volume 1 MODELOS DE ANALISE E NOVAS QUESTOES EM ESTUDOS ORGANIZACIONAIS 1 TEORIZAGAO ORGANIZACIONAL: uM Campo HistorIcAMENTE CONTESTADO 0s esudos organizacionais im origens histvieas nos esrtos de pensadores do sé culo XB, como Saint Simon, qe tentaram antecpare interpretar as nascentes trans formagies deolgicaseestraruraisgeradss pelo capitalismo industrial (Wolin, 1961). A. ‘modemiago instigada pelo desperar do capitaliemo troune mudangas econ6micas, polities e soa, que ciaram um mundo findamentelment distnto daguele em qve imperavam as formas de producio ead ristagio em pequena escala,tipeas da pi rmeiras faces do desenvolimento tepitalista do séeulo XVI e prinipio do século XIX (Bendix 1974). Entre o fim do século XK € 0 inicio do séeulo X%, as grandes unidades organizactonsecitnirem-e amplamente, dominando as esferas econémica, sociale polities, § medica que a crescente comple~ dade e intensidade da atividae coletiva invihilizavam a coordenacio personaizada ¢ direts, assim exgiam incrementos de ca acidadeacministeativa (Weld, 1948). De fato, a ascensio do “estado administrative” simbolizou um pave modo de organiza da sociedade, em que a natureza humano adi. duct Cant de Sou Sve Bee Crgut ims eviso Téciea Frederico Guarls, Marcos Cer ‘gota Line e Tania Frc, fj transformada pela organizagéo racional ecientifica Organizagio como forma de poder ~ esta foi aligdo ensinada por SaintSi- ‘on. A nova orem seria regia nao mais or homens, mas por “principos cientif- coe” baseados na “natureza das coisas", ‘portnto absolutamente independents davontade humans. Desa form, a pro- essa da sociedade organizacional era ‘o predominio das leis centificas sobre 2 subjedvidade humana, © que levaria #0 Gesaparecimento completo do elemento politico...) {a organizaso) &0 “gran- e instrumento” para etransformagio as irracicnalidades humanas em com- portamentos racionais (Wolin, 1961 378-383), ‘Assim, a8 ralaes histéricas dos esmudos organizacionais esto profundamente in setidas em um conjunto de trabathos que ganhou expressfo a partir da segunda me tade do século XIX, e que antecipaya de forma confiante o triunfo da ciéncia sobre a politica, bem como a vitdria da ordem edo rogresso coletivos concebides raconalmen te acima da recalcitrncia eirracionalidade hhumanas (Reed, 1985). © crescimento de uma “sociedade or ganizacional” representou um avango ine xordvel da razio, liberdade e justiga e da possbilidade de exradicagio da ignorincia, coergéo e pobreza. As organizagSes foram racionalmente projetadas para resolver con- fRitos permanentes entre as necessidades coletivas ¢ as vontades individuals aue vi- ‘ham obsmuindo 0 progresso social desde ‘0s dias da Grécia Antiga (Wolin, 1961). As corganizagoes garantiam a ordem social e a Iiberdade pessoal pela combinacio en- ‘xe processos decisérios coletivos e interes- ses individuais (Storing, 1962), por meio de urn projero de bases cientificas em que estrururas administraivas subjugassem os interesses sectérios aos objetivos coletivos insriucionalizados. O conflito perene entre “sociedad” e “individuo” seria permanente mente superado. Enquanto Hegel fez uso da dialética historia para erradicar 0 conflto social (Plant, 1973), 0s te6ricos organiza ‘ionais depositavam sua fé na organizacio moderna como a solugéo universal para 0 problema da ordem social. 0s organisaconisas vam a socie- dade como um srranj de fangbes, uma ‘construgio uslitéria de atvidades inte. ‘radas, ox um meio defocalizar as ener. {pias huranas em um exforg combinado. Enquanto o simbelo de cormunidade era «a fateriade, o simbolo de organizagio 1a 0 poder. organizago significa um ‘nérodo de contele socal, un meio de impor ordem, escrurara eunifocmizarao ‘a soeiedade Qvelin, 1961 343-348). No entanto, com a compreenséo con- {erida pela perspectiva historia do final do século XX, 0 estudo ¢ a prética de organi- _zagbes jd Sdo muito diferentes de antes. As primeiras metanarrativas que tratavam da ‘ordem coletiva e liberdade individual por meio da organizacfo racional e do progresso -material foram fragmentadas e dispersas em ‘uma grande diversidade de “discursos” sem nena forca moral ou coeréncia analitica (Reed, 1992). A prometida garantia de pro- sgresso material e social por meio do incre mento tecnolégico continuo, da organizacio moderna e da administragio cientiica hoje fem dia parece cada vex mais distante. Tanto a efetividede téenica quanto a virtude moral das organizagbes “formais” ou “complexas” so questionadas por transformagSes inte- Jectuaise institucionais que esto levando- nos 8 fragmentacdo social, 8 desintegracio politica e ao relativismo ético. Quem entre és pode dar-se ao luxo de ignorar aquilo que Bauman chama de “padres de aso teenol6gico-burocréticos modemnos ea men- talidade que estes instucionalizam, geram, sustentain e reproduzem’ (1989 : 75), ¢ ‘que eonsistiram nos aicerces psicosso nas precondigées organizacionais para 0 Holocansto? [Em suma, os estudiosos de organizagio contemporineos encontram-se mum posi- (io historia e num contexto social em que as “certezas” ideol6gicas ¢ os “remendos” ‘éenicas que outzora eram.0 suporte de sua “disciplina’ esto sendo questionados e apa- renterente jd comecam a recuar no debate sobre 2 natureza da organizacdo © quais os rmeids intelectuais mais adequados a0 seu cesrudo (Reed e Hughes, 1992). Fundamen- tar-se em pressupostos de que qualidades ra Cionais e éricas so inerentes 4 organizagé moderna é algo cada vez mais contestado por vores alternativas que crticam radix mente a objerividade e bondade “natural das organizagbes (Cooper e Burrell, 1988). Se textos publicados nos anos 50 ¢ principio dos 60 esbanjavam autoconfianca na “ident tidade intelectual e racionalismo” de sua “disciptina” (CE Haire, 1960; Argyris, 1964; Blau e Scout, 1963), nos rabalhios dos anos £80 €90, prediominain expectativas incerta, complexas ¢ confusas sobre a natureza e 0 mérito dos estudos organizacionais. Em termos kubnianos,vivemos em uma fase de ciéncia “revoluciondtia", nao mais emuma fase de ciéneia “normal” (Kubn, 3970). A ciéncia normal é dominada pela ‘atividade de resolver problemas e por pro- _gramas de pesquisa incremental, realizados ‘com base em modelos tedricos amplamen- te aceitos © fortemente institucionalizados (Lakatos e Musgrave, 1970). Jé a ciéacia revolucionétia ocorre quando os “pressu- ppostos comuns” sobre o objeto de estudo, ‘08 modelos de interpretagio e o préprio “conhecimento esto expostos a critica e rea valiagéo continuas (Gouldner, 1971). pes- 4quisa e & anilise so moldadas pela busca de anomalias ¢ contradigSes dentro de um ‘modelo tedrico prevalecente, gerando uma dinémiea intelectual interna de confitos ‘eéricos. Significa que tal disciplina & avas- salada por confltos interes ¢ desacordos sobre fundamentagées ideol6gicas ¢ episte- rmol6gicas; seus varios defensores habitam e representam “mundos” paradigmaticos diferentes, entre os quais a comunicagio, € vito menos a mediacéo, tomam-se impos- siveis (Kuhn, 1970; Hassard, 1990). A frag- mentacio e a descontinuidade tornam-te as caracteristicas predominantes da identidade edarationale do campo de estudos, a0 inves daestabilidade e coesdo que caracterizam a *citncia normal” (Willmott, 1993). ‘Uma forte estratégia de reagio so im pacto divisor resultante da quebra com a ortodaxia fancionalista/positivisra é a bus- ca nostilgica das certezas do passado e do conforzo consensual que elas garantiar (Do naldson, 1985). Essa "reagHo conservadora” pode também requerer um consenso politico igidamente imposto e vigiado dentro do campo, com o fim de reparer o tecido in- telectual danificado por décadas de luras intemas e restabelecer a hegemonia tebr ca de determinado paradigma de pesquisa (Pieffer, 1993). Tanto a forma “nostalgica” ‘quanto a “politica” de conservadorismao téra or objetivo resistir as tendéncias centri- petas desencadeadas pela luta intelectual © promover o retome ortodexia ceérica © ideolégica, Uma combinagéo robusta de “volta as raizes" e “imposico paradigm tica” pode ser uma opgio bastante atrativa ara aqueles que se sentiram perturbados Pela fermentacio intelecrual que ocorre nos estudos organizacionzis. ‘Ao invés da “imposigao paradigmatica", utzoe académicos buscam a “proliferagio paradigmética” por meio do desenvolvi- ‘mento intelectual separado e do estimulo 2 abordagens distintas dentro de dominios diferentes, que néo foram contaminados pelo contato com as perspectivas competiti- ‘vas (Morgan, 1986; Jackson e Carter, 1991). ssa reagéo & mudanca social e sublevacio intelectual forece sustentagao teérica para “experimentagdes idicas sérias” em estu- dos organizacionais, nos quais a ironia e hhumildade do pés-modemismo substiruem as obviedades sagradas que caracterizam 0 ‘modemnismo racional, incapaz de perceber «que'“a verdade objetiva nfo € 0 nico cami- ‘no possivel” (Gergen, 1992) Se nem o conservadorismo, nem 0 re- Iativismo agradarem, uma terceira opgio ¢ recontar a histéria da teoria organizacional de forma a redescobrir as narrativas ara cas € 08 discursos éticos que moldaram seu desenvolvimento e Iegitimaram sua essénacia (Reed, 1992; Willmotr, 1993). Tais aborda- sens questionam tanto o retorno as origens quanto a celebragéo irrestrita da descon- tinuidade e diversidade: nem a adesdo 2 onda relativista nem o recuo aos pordes da ortodoxia parecem futuros atraentes para © estudo das organizagbes. O primeiro pro mete iberdade intelectual imitads, mas a0 custo do isolacionismo e de fragmentacao; 0 segundo recai em um consenso antiquado, sustentado por constante vigilancia e con- trole inteleetuaie, Exe capitulo adota a terceira via, Seu objetivo éreconstrir a histéria do desenvol- vvimento intelectual da teovia organizacional de forma a balancear contexto social com idéiasteérias, bem como condigées estrutu rais com inovagdo conceltual. Essa forma de pensar oferece a possibilidade de redesco- brire renovar um senso de viséo histrica e de sensiblidade contextual que dio crédito tanto 2 “sociedade” quanto as “idéias". A historia dos estudos organizacionais © a ma~ neira como essa histéria contada nio 680 representagSes neutras do que se conseguit, 1 passado. De fato, qualquer processo de reconstrugio histérica que pretenda servir ‘de base &s visbes do presente do fururo 6, nna verdade, uma interpretacio controversa e contestada que sempre poder ser reft- tada. Portanto, 0 objetiva deste capitulo é mapear a teoria da organizagéo como um ‘campo de conflitos histéricas em que dife- rentes linguas, abordagens e filosofias Iutarm por reconhecimente e aceitacéo. A préxima segdo examina a criagio e © desenvolvimento da teoria em estudos organizacionais como uma atividade inte- lectual que esta necessariamente envolvida ‘com © contexto social € histérico em que ela ¢ criada e recriada. O capitulo ento ‘examinard seis modelos interpretatives que estruturaram 0 desenvolvimento do eam po a0 longo do tiktimo século, bem como ‘of contextos histérico-sociais em que eles atingiram certo grau de predomingncia in- telectual (sempre sujeita a contestagao}. A pemiltima secdo considera as exclusbes ou Dmiss6es mais significativas que se eviden- ‘iam nessas principais tradigdes narrativas. © capitulo & concluido com uma avaliagio de desenvolvimentos intelectuais fururos, contextualizados dentro das formas narra: tivas previamente esbogadas. A Oxcanizacio a Troma Essa concepedo de teorizagio organiza- ional é baseada na visio de Gouldner de {que tanto © processo quanto o produto da teoria devem ser vistos como um “processo de apo e criaco realizado por pessoas num periodo historico especifico" (1980 : 9). A. andlise ¢ 0 debate sobre organizacbes ¢ 0 organtzar com base em informagées tesricas s20 resultados de uma combinacao precézia de visdo individual com produgéo técnica situada dentro de um contexto histbrico- social dinamico. Como ta, a eriagao te6rica tem a responsabilidade de subverter con- vengSes institucionalizadas e petrificadas fem ortodoxias aceitas sem reflexdo e que portanto nunca poderio caber inteiramente ‘em modelos cognitivos ¢ pardmetros con- cceituais estabelecidos. Concudo, a probabi- lidade de que iniciativas teérieas espectficas sejam convertidas em “mudancas de para- ddigmas conceituais” mais significativas de- pende muito de seu impacto cumulative nas comunidades e tradigbes intelectuais que as medeiam ¢ recebém (Willmott, 1993). Dessa forma, ao passo em que a criagao teériea é sempre potencialmente subver- siva do status quo intelectual, seu impacto € sempre atenuado por meio das relagées conhecimento/poder existentes e pela "re- ceptividade contextual", que é conferida a desenvolvimentos intelectuais especificos sob condigges histérico-socias particulares ouimin, 1972). Em suma, a criaglo de uma teoria & ‘uma prética intelectual situads em dado contexto historico e que esté voltada para a construgdo e mobilizacdo de recursos ideais, materiaise instieacionais para legi- tmar certos conhecimentos e os projetos politicos que deles derivam. O debate te6 rico estd inserido em contextos intelecruais socials que tém um efeito crucial na forma ‘eno conteido das inovacSes conceituais es- pecificas, a medida que estas lutam com 0 objetivo de obteraceitago dentro da comu- nidade em geral (Clegg, 1994; Thompson © ‘Mectiugh, 1990). Como afimma Bendix, “um cestudo das is como armas para a gestdo de organizagées poderia proporcionar um melhor entendimento das relagées entre idéias © agies” (1974 : 309, Isto no significa, contudo, que nao existam bases coletivas reconhecidas que possam ser utilizadas para a avaliagio de ‘conhecimentos contraditérios. Em qualquer ‘mamento histérico, os estudos organizacio nais sempre foram constituidos por linhas comuns de debate «diélogo, que estabelece- ram os limites intelectuais ¢ oportunidades ‘para julgamento de novas contribuicdes, 0 julgamento coletiva de novos e velhos trabalhos & feito com base em regras e nor- mas negociadas, das quais emergem um vvocabulrio e uma gramética da andlise or- ganizacional. Essa “racionalidade funda: mencada” (Reed, 1993) pode pecar pela falta de universalidacle que normalmente se associa, ainda que etroneamente (CE Put- nam, 1978), &s chamadas cigncias hard, ras mesmo assim cla estabelece um mode: lo identificével de procedimentos e praticas “gue geram seu dscurso proprio sobre prova cientifica” (Thompson, 1978 : 205-206) Assim, a teoria organizacional é sujeica a ‘procedimentos metodalégicos cemuns, mas ‘que podem ser revisados, por intermédio dos quais modelos e teorias explicativas so negociados e debatidos. A interacéo e comestagao de tadigSes intelectuais rivais implica a existéncia de entendimentos n Tabela 1 Narrativas analitcas em andlise organizacional Modelo de | Problemitica Perspectivas ‘Transigbes ‘metanarrativa| principal usteativas/exemplos contextuals interpretativa Racionalidade [Ordem Teotia das Organizagies cissica, [de Estado Jadminstrapio clentiica, teoria da | guarda-notarmo cist, Taylor Fayol, simon a Estado induserat Inegragdo | Gonsenso | RelagSes Humanas, neo- de epitelismo RU, funcional, ceoria da empresa, contingéncia/sintmiea, cura eorparauia, Durkheim, Barnard, Mayo, Parsons [Teoria da rma, economia a capiclistno do = bemestar Nato (brine peerreny » |fniacocal cutee ansarto, [geen feore dean depetincae |Scapialane Teeuses cots popanonal”_|acoerd fore Criecondineed | i Rae oninazts | Weeranes ovale, manismo” ec clewano fotcccoranaa peeswode (ibert [aba tconetectcona bez, locopratvisno (ios ests Gracineno [Gok (iondiola iabsaraian ae Jeeganacnasporeseuuntsa, —{tnasvinisna/ \pibndaenaise,pieforasa’ " |poderaade [Redro,rveni Gaile ona lai \domorrae |igiareaiszer po modem) ae Paridpasio | Bic dc npicon novidades ‘(de denoaoce Babermas | £08, democracn ndstrish, ‘eon perueipea,reora ses, gociados ¢ relacionados a dado contexto & Situagdo histériea, que tomam-a argumen- tagdo racional possivel Reed, 1993). (0s modelos intexpretativos da ‘Tebela 1 formam o campo intelectual de confitos histéricos em que a andlise organizacional se desenvolveu ~ um campo que deve ser ‘mapeado e atravessado levando-se em con- sideraglo as inter-relagdes entxe os fatores, processuais econtextuais em tomo dos quais tessa érea do conhecimento emergiu (Mor yan = Stanley, 1993). Eeces modelos con formatam o desenvolvimento dos estudos ‘organizacionais por pelo menos um século, a medida que forneceram: a gramatica por teio da qual narzativas coerentemente es. ‘mucuradas podem ser construidas e difun- didas, 05 recursos simbélicns ¢ tecnicos por ‘meio dos quais a natureza da organizacéo pode ser discutida; ¢ um conjunto de tex- tos e discursos comparihados que podem ser usados para mediar debates entre au itneias leigas ou especialistas. Tais mo- delos desenvoivem uma relacao dialética ‘com processos histéricos e sociais, como formas contestadas ¢ pouco estruturadas de conceitualizar ¢ debater aspectos chaves da ‘organizagao, Cada um deles €definido com vistas & problematica central em tomo da qual cles se desenvolveram e 20 contexto hist6rico-social em que foram articulados. ssa discussdo, portanto, fornece uma apre- ciagio fundamentada de narrativas anakit ‘cas estratégicas por meio das quais 0 campo de estudos organizacionais ¢ constiruido enquanto prética intelectual dindmica, per- meada de controvérsias tedricas e conflites ideolégicos em tomo da questao de como a “organizagao” pode ¢ deve ser Trrunro po Racionarismo Como defende Stretton, “bebemos racionalidade desde as primeiras gotas de leite materno” (1969 : 406). Tal erenga na naturalidade do raciocinio caleulado tem ralzeshistércase ideoldgioas bem definidas Ha una tendéncia a consideras Saint-Simoa (1958) o primeiro "te6rico organizacional’, supondo-se ter sido ele, “provavelmente, 2 rimeizo a observa 0 surgimento dos pe- res organizacionais modernos, identif- cando alguns de seus aspectos distintives e insistindo na importancia que eles trian para a sociedade que se formava... perce ‘eu ele que as regras bisices da soviedade moderna haviam sido profundamente ale- radas, de modn que organizacées delibers- ‘damente concebidas e planejadas viriam & desempenhar um novo papel no mundo” (Gouldner, 1959 : 400-401). A crenga ce que a soriedade moderna ¢ dominada por tama “logica da organizacdo” € recorrene ‘20 longo de toda a histéria dos estudos ar ganizacionals, promovendo o principio de rganivacio social em que a fungao técnica racionalmente atribuida a cada individwo, grupo ou classe define sua localizagéo so- Cloeconémice, eu grau de autoridade tio de comportamento. De acordo com Saint's ‘mon, tal légiea fornece uma poderosa defesa canta 0 confito social a incerteza politica, Amadida que estabelece uma nova estrunura de poder baseada em capacidade técnice e na sua contribuigéo para o funcionamento adequatio da sociedad, e nao desivada de fatores aleatérios ou de mercado, ov mesmo de privilégios de bereo. A organizagéo construida racionalmen- 1 forma de um instrumente dirigido para a solugo de problemas coletivos, de cordem social ou de gesto esta refletida 10s eseritos de Taylor (1912), Payol (1949), Urwiek o Brech (1947) e Brech (1948). Es ses tabalhos sustentam que a teoria cas ‘organizagées seem que ver com ert de com ene porn sbve a ides de Sito Go unbabo ema empres. 8 iva do taba ¢o sheer don Sieg dua para gueea tao (Gace Ue 1387"3), (Os autores citados legitimam a idéia de que'a sociedade e as unidades organizacio- iis que a constitaem sero regidas por leis centficas de administrago excluindo total- ‘mente valores e emogées humanas (Waldo, 1948). Principios epistemolégicos ¢ téené- cas administrativas transformam preceitos normativos altamente questiondveis em leis cientficas universais, objetivas, imutdveis portanto incontestaveis. O "individuo ra- ional é, e deve ses, organizado ¢ institu- cionalizado” (Simon, 1987 : 101-102). 0: seres humanos tornam-se “matérie-prim: - transformada pelas teenologias da sociedade ‘moderna em membros bem comportados © rodutivos da sociedade, pouco propensos a interferir nos planos de longo prazo das, ‘lasses dominantese elites. Portanto, 0s pro. Dlemas sociais, politicos e morais podem ser ‘tansformados em problemas de engenha ra passiveis de solugio técnica (Gouldner, 1971). As organizagGes modernas anuncia- vam o triunfo do conhecimento racional e da téenica sobre a emogio € 0 preconceito ‘bumano, aparentemente intratdveis. Esse modelo impregnou o micleo ideo- ligicoe te6rico dos estudos organizacionais Ge forma téo abrangente ¢ aatural, que sua Jdentidade e influbneia foram vircualmente lmpossiveis de ser detectadas ou questiona- ‘des. Como Gouldner (1959) afirma, 0 mo ddelo prescreve o “mapa” de uma estratara autoritéria em que os individuos e grupos ‘io obcigados a seguir certas leis. Princi- los de funcionamento ficient e eisz ram promulgados como um axioma para icigic todas as formas de prética e andlise ‘rganizacional. Tal modelo fornece, assim, uma caracterizagio universal da "realidade” de uma organizagio formal, independen- femente de tempo, lugar e situagao. Uma ‘ez aceito esse “mapa”, legitimot-se uma ‘Visio de organizagées como unidades so. “elas independentes e autGnomas, acima de ‘Gualquer avaliagio moral ou debate politico ‘Gouldnes, 1971), Embora a “era da organizacio" neces- sitasse de uma nova hierarquia profissional para atender as necessidades da sociedade Industrial em desenvolvimento, sobrepon- do-se aos clamores da aristocracia moribun- da ¢ dos empresérios conservadores, essa visio era profundamente antidemoerdtica e antiigualitria, Uma concepefo determinada Por critérios técnicos e adminiserativos de hierarquia, de subordinacio e autoridade pperdia espaco em um contexte sociopalitco de agitacdo inspirada em ideais de sufrégio ‘universal, tanto no ambiente de trabalho quanto na pélis (Wolin, 1961; Mouzelis, 1967; Clegg e Dunkerley, 1980). A orga nizagéo racional burocritica era social © moralmemt legitimada como uma forma ‘ndispensével de poder organizado, baseado em fungGes téenieas objetivas e necesséria para o funcionamento efetive e eficiente de uma ordem social fundamentada em auto: ridade racional-legal (Frug, 1964; Presthus, 1975). Esses princ(pios esto profundamente ‘embutidos nos fundamentos epistemolégi- os ¢tedricos das perspectivas analiticas que constituem o cere conceitual dos estudos organizacionais. A “administragao cientifi ca” de Taylor € direcionada 20 permanente ‘monopélio do conhecimento organizacional por intermédio da racionalicagio do desem- penlto do trabalho e lo design funcional. Como coments Merile: ‘ultrapassando suas origens nacionais e téenieas, 0 taylorismo tornouse um !mporeante componente da perspectiva ‘losica da exizagdo industrial mo: dems, definindo vitwde como eficée a, estabelecendo um nove papel para ‘0s expecialstas em produgio, «cris 4o parmets para novos padres de ‘ismbuigo social” (1980 = 623. Como Sdeoiogia ou como prates, 0 aylrismo ‘eraextremamente hast ateorias empre- ‘aiais das organizagbes que enfocassem necestidades téenicase de legitimagto de uma pequena elite (Bendix, 1974; ote gamma me ose, 1975: Clegg ¢ Dunkerley, 1980), Como ressalta Bend, “as ideclogine gorenciais de hoje sto dic tintas das deologias exapresarais do par- sailo, b medida que as primeicas supose ‘aente ajudain o emprezador ov seus agentes @ controlar digs as atividades os empregades” (1974: 9) 0s principios organizacionais de Fayol, ainda que modificados pela crescente cons- cientizagéo de que ha uma necessidade de adaptacio contextual e de conciliagao de forgas, foram orientados pela necessidade de construir uma arquiterura de coorde- ‘nago e controle que contivesse a descon- tinuidade © 0 confito inevitéveis causados pelo comportamento “informal”. A teoria organizacional “classica” fandaments-se na crenga de que a organizacio fornece 0 principio do projeto estrutural e valoriza uma pratica de controle operacional, que podem ser determinades racionalmente © formalizados antes de qualquer operacao. De fato, a teoria assume que a operaciona~ lizaglo decorréncia automética da légica do projeto e funciona como instrument de ‘controle embutido na estrurura formal da orgenizacio (Massie, 1965). Ainda que 0 conceito de Simon (1945) de “racionalidade limitada” e sua teoria de “comportamenzo administrativo” se baseiem ‘em uma erftica mordaz 20 racionalismo € formalismo excessivos presentes na teoria organizacional e gerencial, suas idéias tam- >ém fandamentarm-se em uma abordagem que entende2 escolha racional entre pees, claramente delineadas como base da 2qa0 social (March, 1988). Essa visao reduz 0 “trabalho interprerativo”, vital para o bom Gesempenho de atores individuais e organi- zacionais, a um mero processo de cognicso dominado por regras e programas operacio- “ nals padronizadas. § notivel a exclusdo de vvarveis importantes como polities, cultura, moral e histéria do modelo da “racionall- Gade limitada’, Essas variaveis tornam-se EEE RTS analiticamente marginelizadas, se forem omitidas dos parametros conceituais do ‘modelo preferido de Simon, & medida que forem tratadas como elementos aleatérios, ‘excemos e portanto nfo sujetos &influéncia dos processes cognitves, ds procedimen- tos organizacionais, e muito menos de seu controle. © racionalismo exerceu profunda in- Aiuéncia no desenvolvimento historico © ‘oneeitual da andlise organizacional. Bsta- beleceu um modelo cognitive « uma pauta de pesquisas que nao puderam ser igno- radas, mesmo por aqueles que quiseram adotar uma linha radicalmente diferente (Perro, 1986). Além disso, tal corrente repercutiu ideologicamente no desenvolvi- ‘mento politico de insticuicdes ¢ estruturas fecondmieas durante o principio e meados do século XX, tornando as corporacies © estado politico “alcancSveis pelo conhe- cimento”, 0 racionalismo forneceu uma representagio de formas organizacionais emergentes que legitimaram seu crescente poderio e sua influéneia como caracteristi- cas inevitiveis em uma trajetdria historica de longo prazo, por meio de discursos acer ca da administracto e geréncia tecnocriti- ca racional (Ellul, 1964; Gowdner, 1976) ‘Ademais, cle “clevou” a teoria prétice da administragdo organizacional de uma arte intutiva para um corpo de conhecimentos codificados e analisdveis, tornande poss!- vel, inclusive, transagsies com 0 poderosis- simo capital cltural e com o simbolismo da “cifacia". ‘Considerade nesses termos, oracionalis- ‘mo estabeleceu uma concepeéo de teorla © andlise organizacionais come uma tecnologia ‘intelectual em condigGes de oferecer um “mecansmo capaz de tornar a realidade passivel de manipulagio por certes pos {e agio (..); 0 racionalisme envolve 0 processo de cleunscraver a realidade os cdleuos gavernamentas, por meio tbe tenicas materia rlaivamente mum danas” (Rose e Milles, 1990 : 7) “TeORAGKO ORGARZACONAL: Uk CAMPO HISTORICANERNTE CONTESIIDO A “organizagio” torna-se ferramenta fou instrumento para autorizar e realizar objetivos coletivos por meio do desenho e do gerenciamento de estruturas voltadas & ladministragao ¢ manipulagio de compor- tamentos organizacionais. A tomada de decisbes organizacionais apéie-se em uma ance racional das opgbes disponfvels, com base em conhecimento qualificado e deli beradamente orientado pelo aparato legal estabelecido. Essa “iégica das organizacoes” toma-se garantia de avango material, pro- _gresso social e ordem politica nas sociedades industriais modernas, 2 medida que elas convergem para um padrio de desenvolvi- ‘mento institucional e capacidade adminis- ‘rativa em que a "mao invisivel do mercado” foi sendo gradualmente substituida pela “née visivel da organizacio”. A despeito do fato de estar presen- te nos primérdios do desenvolvimento da teoria orgenizacional, o modelo racional nunca teve dominio ideolégico e intelectual completo, Sempre foj contestado por linhas alternativas. Os contestadores fregiiente- ‘mente comparilhavam 0 projeto politico © ideolégico do modelo racional, que con- siste em descobrir uma novg,fonte de aur toridade e contaole dentro dos processos # estruturas da organizagio modema, porém usavam discursos e pratioas diferentes para aleancé-las. Em particular, muitos viam a inabilidade de lidar com o dinamismo e ins- tabilidade de organizacoes complexes como uma das maiores falhas do modelo racional, Esse senao erescente de limitagbes priticas € conceituais e a natureza ut6pica do projeto politico que o modelo racional sustentava ram espago para que 0 pensamento orga~ nicisca prosperasse onde antes as formas de discurso mecaniista predominavam. REpESCOBRINDO A ComUNIDADE ‘As questBes que mais deixavam os cxi- ticos perplexos, a partir dos anos 20 e 40, CAA cram a incapacidade da organizaco raco- nalstica em resolver problemas de integra io socal eas implicagSes deseo fato pare a ‘manutene2o da orem social em usn mando sais instivel eincerto. Essa forma de abor ddagem permaneceu coga as critieas de que ‘a autoridade nao ¢eficaa sem “cooperacéo espontinea ou intencional’ (Bendix, 1974). Os extioos, apreensivos com o alto grau de racionalismo, enfatizavam a necessidade pritica e tedrica de uma base alternative parao poder e autoridadeinvestides 20 ge- rencialismo pelo projeto organizacional © pensamento organiista preocupava-se também com a manera como as organiza- bes modernas combinam autordade com lum sentiments de comunidade entre seus membros A missho da rganizagio én ape nas prover bens services, mas tambem (nat 0 companheirismo. A confianca do ur maderno no poder da organizagto Seriva de uma crenca mais ampla, ¢ (gue a organizagio é 0 camiaho pata FedeneSo humane frente a sua propria ‘mormalidade,. Na comunidads e dentro des organizagées, o homer moderno tlaborou objetos politicos em substi (80 aos objeos de amor, A busca pela Comunidade buscou refi na noo {66 homem como um anima politico; a lsderaggo da orgonieagso fo) parcialmen te inspirada na esparanca de enconcrar suma nova forma de civiidade (Welin, 1961 368). Esta € uma questdo central na emer- sgéncia da perspectiva da escola de relagies, bumanas na andlise orgenizacional, que embora trate dos mesmos problemas do modelo racional, fornece para estes solu Ges distintas ‘A monografia Administragdo eo trabe- thador (Roethlisberger e Dickson, 1939) © ‘06 eseritor de Mayo (1933; 1945), portan to, acusam a tradigao racional de tgnorar as qualidades naturais ¢ evolucionarias das nova formas socials geradas pela industria lizagio. Toda a forga da escola de relagées hhumanas vem da dentifieacio doisolamen- to social e dos confitos como sintomas de tua patologie socal. A “boa” sociedadec a organizagao eficaz so aquelas capazes de facilitar © sustentar a realidade sociopsico- 16gica de cooperacio espontinea e estab ‘dade Social etm face de mudangas econémi- «as, pokiticas eteenologicas que ameagam a integragio do individuo e do grupo dentro de uma comunidade mais ampla. fa longo de wirios anna, essa concen: (lo de organizacéies como unidades sociais inermedirias que integram os individuos 8 civlizagio industrial modema, sob a tu tela de uma aéministragio benevelente ¢ socialmente habil,institucionalizou-se de tal modo que comecou a desbancar a posi- fo predominance mantida por exponentes eo modelo racional (Child, 1959: Nichols, 1969; Bartell, 1976; Thompson e McHugh, 11990), Essa concepgio convergiaem teorias organizacionais com caracteristicas social6- gicaseabstratas mais acentuadas, que det- harm grande afnidade com as preferéacias evolucianistas ¢ narualistas da escola de relagies humanas (Parsons, 1956; Mercon, 13949; Selick, 1949; Blan, 1955).Portanto, em suas origens o pensamento organiista nos estuios organizacionais baseou-se na renga de que 0 racionalismo fornecia wma viséo exzemamente limitada ¢ frequente tmente enganadora da realidades" da vida organizacional (Gouldner, 1959; Mouzelis, 1967; Silverman, 1970). Ela enftizava 2 fordem eo controle impostes mecanicamente aninvésda itegracio, da interdependéncia «do eqilibro que devera exist nos sise- mas sociis em desenvolvimento orgénico (cada um com sua dindeica prdpra).“in- terferéncias” por pate de agentes extern0s, tais como o projeto planejado das esracuras orgenizacionais, ameacam a sobrevivencia do sistema, ‘Acrganizagio como um sistema social facdlita ¢ integragio de individuos dentzo da comunidade mais ampla, bem como @ adaptacio desta s condigbes téenico-sociais de mudanga, que freqlentemente ocorre de forma volétil. Essa visio € teoricamente antecipada, ainda que de forma embrioné- Fa, por Roethlisberger e Dickson, que falar da organizagao industrial como um siste- ‘ma social operante que busca 0 equilibrio ‘em um ambiente dindmico (1939 : 567). Essa concepgia é influenciada pela teoria dos sistemas sociais equilibrados de Pareto (2935), em que as disparidades nas taxas de mudanga sociotécnica e 0s desequilfbrios ‘que estas trazem 20s organismos sfo com- pensados automaticamente por respostas internas que, ao longo do tempo, restabe- lecem 0 equilibrio do sistema, Entende-se que as estrucaras orgs- nizacionais so mantides homeastatea fe espontaneamente, As mdengas n08 padres organizacionais so entendidas ‘como consegifncia da reagdes cumuls- tivas, nfo planejades, e adapttivas &s ameacas2o equifbrio de todo o sisteme. [Respostas aos problemas sio considera: das mecanismos de defesagradatvamer- {e desenvolvido, moldados por valores que esti profundament internalizados pelos membros da arganizagéo. O foro fempirico, portant, édirecionado a ee ‘paturas que emergem esponsaneamente, sancionadas normtivamente na organi 2agho (Gouldner, 1959: 405-406). essa forma, processos emergentes, © ndo estruturas planejadas, asseguram a es- tabilidade e scbrevivéncia de longo prazo do sistema. ‘Ao final dos anos 40 e comago dos 50, ‘essa concepeio de organizagées como siste ‘mas sociaisvoltados para as “necessidades” de integragio e sobrevivencia das ordens societérias maiores, das quais elas faziam Parte, estabeleceu-se como 0 modelo teé- rico predominante dento da andlise orga- nizacional. Simultaneamente e de forma convergente, eram desenvolvidos os fun- damentos da “teoria geral dos sistemas”, origindria das areas da biologia e da fisica (von Bertalantfy, 1950; 1956), 0 que for necia inspiracio conceitual considerével para o desenvolvimento subseqiiente da teoria de sistemas sociotécnicos (Miller e Rice, 1967) e das “metodologias de siste mas soft” (Checkland, 1994). Foi, contudo, a interpretacio estrutural-funcionalista da abordagem sistémica que assumiu proemi néncia dentro da “andlise organizacional” fe que dominaria o desenvolvimento teérico © a pesquisa empirica desse campo entre 0 anos 50 « 70 (Silverman, 1970; Clege Dunkerley, 1980; Reed, 1985). 0 funcio- nalismo estrutural e sua progénie, a teoria de sistemas, forneceram urn foco “interno” no projeto organizacional, com uma preo- ‘cupagio “externa” volrada para a incerteza ambiental (Thompson, 1967). A primeira visio enfarizava a necessidade de grau mi imo de estabilidade e seguranga internas ‘alongo prazo para a sobrevivéncia do siste- ma, a segunda expanhe as indererminacdes inerentes & acio organizacional tendo em ‘vista as demandas ambientais e as ameagas que eseapam ao controle da organizagzo. A questio fundamental de pesquisa que emet- se dessa sintese entre preocupagies estru turais e ambientais € 0 estabelecimento da combinagio entre configuraGes internas & condigSes externas que facilitem a estabili- dade e crescimento da organizagio a longo prazo (Donaldson, 1985). 0 funcionalismo estravural a weoria de sistemas também fizeram uma “despo litizagao” eficaz dos processos de tomada dde decisio por meio dos quais se estabe- Jece uma adaptacéo funcional adequada entre a organizacio ¢ seu ambiente, Certos “imperativos funcionais",tais como a ne- cessidade de equiltbrio de longo prazo do sistema para a sobrevivencia, presumivel- ‘mente erarn impostos a todos os atores or- ganizacionais, determinando 06 resultados os projetos produzidos por seu processo decisério (Child, 1972; 1973; Crozi berg, 1980). Esse “passe de magica” tedrico relega os processos politicos & margem da anilise organizacional. Ao manter as ress nncias ideol6gicas mais amplas da teoria de sistemas, a concepeio converte confltos de valor sobre fins e meios em questies téc- nieas que podem ser "resolvidas" por meio dde um projeto eficaz de sistema e de admi nlstragio. Como indica Boguslaw (1965), essa conversio apdia-se em uma fachada teérica, para ndo dizer utdpica, de homo- geneidade de valores; a realidade politica das mudangas organizacionais, bem como as tensbes ¢ deformacées que elas geram, mascarada como pequenos elementos de atrito de um sistema que em tudo o mais funciona perfeitamente Ela também atende snecessidades ideolbgicas e praticas de um grupo ascendente de projetistas de sistemas @ administradores que almejam o controle absoluto em meio a uma sociedade cada vez mais complexa e diferenciada Assim, 0 entusiasmo geral com que 2 teoria de sistemas foi recebida pela comuni dade de estudas organizacionais nos anos 50 ‘260 refletia uma ampla renascenca do pen samento usépieo, que presumia quea andli- se funcional dos sistemas sociais fomeceria, os fundamentos intelectuais pare a nova cigncia social (Kumar, 1978). 0 proceso de diferenciagéo socicorganizacional, talvez com a ajuda de engenheiros sociais espe- cializados, resolveria 0 problema da ordem social por meio de estruturas que evoiuem naturalmence, capazes de lidar com es cres centestensées endémicas entre es interesses individuais ¢ as demandas institucionais. A postura de que a sociedade em si resolveria © problema da ordem social fiava-se em ‘um “pressuposto do campo” de que “toda a histéria da humanidade tem uma forma caracteristica, um padréo, uma ice ou si nado que perme divested eve tos aparentemente desconexos” (Satompk, 1993 107). A andlise funcional de sistemas fornecia a chave teérica para desvendat 08 ristécios desse desenvolvimento sécio-his- t6rieo, capacitando os cientistas sociais © organiacionais a prover, explicar ¢ c= £2 twolar tanto a sua dinémica interna quanto suas consegiléncias institucionais. Apesar de essa visto lidar com uma forma de evo Tucionisme e funcionalismo socioorganiza- cional cujas raizes remontam aos escritos de Comite, Saint-Simon e Durkheim (Wiein- berg, 1969; Clegg e Dunkerley 1980; Smart, 1992), ela 86 veio a alcancar seu spogeu ‘nos anos 50 e 60, no trabalho dos cientistas, sociais que contribuiram para o desenvalvi- ‘mento da teoria da sociedade industrial, € ‘que demonstraram etreunspecezo histérica sensibilidade politica muito inferiores as de seus predecessores académicos. Conseqiientemente, a ortodoxia funcio- nalista/de sistemas, que veio @ dominas, ou pelo menos estrurura, a préticainteleewual © o desenvolvimento das andlises organizacio- nas entre cs anos 40 € 60, eta apenas parte de um movimento muito mais amplo que ressusciton os modelos evolucionistas do sé culo XIX (Kamar, 1978: 179-190). Na teoria organizacional, essa ortodoxia completou- s¢ teoricamente com o desenvolvimento da “teoria da contingéncia” entre o fim dos anos 60 e principio dos 70 (Thompson, 1967; Lawrence e Lorsch, 1967; Woodward, 1970; Pugh e Hickson, 1976; Donaldson, 1985) ‘Essa abordagem mostrava todas as vireudes c vicios intelectuais da tradicio teérica de onde buscaram sua inspiragao ideolégica e metodolégica. Ela também reforcava a tien gerencialista que tinha a pretenséo de resolver, por intermédio de uma engenharia social especializada ¢ um projeto flexivel de organizacio (Geller, 1964; Giddens, 1984), as problemas institucionals e poll ‘cos fondamentais das sociedades indus- ‘tials modernas (Lipset, 1960; Bell, 1960; Galbraith, 1969) Ainda assim, & medida que os anos 60 vangavam, as virtudes do pensamento oy ganicista eram cada vez mais sombreadas Dor sens vieios, especialmente quando as Tealidades sociais, econdmicas e politcas se Teeusavam a adequar-se as teorias explicati- ‘vas promulgedas portal narrativa. Modelos alternativos de interpretagsojé comecavam ‘ emergir para questionar o funcionalismo, baseadas em tradigées inrelectuaise histri- cas muito diferentes. Antes que as possamos considerar, contado, & necessério adentrar 2s teotias de organizagéo orientadas pelo mercado. Enea em Cena 0 Mencapo ‘Teorias organizacionais baseadas no mereado parecem ser uma contradicéo, em termos: Se 8 mercados operam da forma especificada pela teoria econémiea neoclés- sica, ou seja, mecanismos de ajustes perfei- tos que equilibram preco e custo, entfo no ‘ha nenhum papel conceitual ou necessidade éenica para a existéncia de “organizacao”. ‘Como constata Coase (1937) em seu artigo lissico, se os mercados sio perfeitos, entao as firmas (e organizagies) deveriam desen- ‘volver transaghes de mercado perfeitamente reguladas, baseadas no intereambio volun- ‘drio de informagoes entre agentes econd- micas iguais. Coase foi, conrudo, forcado a reconhecer a realidade das firmas na con digao de agentes econdmicos coletivos, 20s ‘quais se atsibui a “soluggo” para as falhas de mercado ou do colapso do sistema. Como mecanismos de “internalizacao” de woces ‘econémicas recorrentes, as firmas reduzem ‘o custo das transacées individuais por meio de padronizacSo e rotinizacdo, e aumentam a eficiéncia da alocagso de recursos dentro do sistema de mercado ema sua totalidad, & ‘medida que minimizam os custos de transa~ ‘fo entre os agentes, os quais, por natureza, desconfiam de seus parceizos. Coase, inadvertidamente, faz uso do modelo racional quando admite que o com- portamento ¢ motivado, primariamente, pelo objetivo de minimizar eustos de mer- feado @ maximizar sens rerornns. Tanto a ‘radigdo racionalista quanto a economicista a andlise organizacional so construidas com base na “racionalidade limitada” para | | | | -TeoR7AGho ORGAOUZACIONAL: UE caNO HNSTORICAMENTE CONTESTADO 73 SS a explicar ¢ prever a ago social e individual; ambas apdiem teorias que reconhecem a lorganizagio em termos de eficgncia e efi- cécia; ambas reverenciam intelectialmente ‘0s modelos organicos, quando enfatizeam 2 evoluggo “natural” das formas organiza- cionais, que otimizam retornes dentro dos ambientes em gue as pressées competitivas restringem as opgbes estratégicas. As (eo rias econémicas da organizacSo também Sidam com elementos da tradicio organi- cista, quando enfocam organizagies como ‘um produto evolucionsrio e semi-racional de condigbes espontdneas e involuntérias (Gayek, 1978). As organizagdes sito uma resposta automitica e um prego razoavel 8 ser pago pela necessidade de se dispor de agentes econémicos formalmente livres Jguais, capazes de negociar e monitorar con- ‘watos em meio a tansagées complexas de mercado, que néo poder ser acomodadas em arranjos institucionais existentes. Exsas teorias econémicas da organt- ‘acdo surgicam em resposta as limitacdes cexplanattiias e analiticas inerentes as teo- ‘las classica e neocléssica da firma (Cyerte March, 1963). Blas exigem que se considere melhor o problema da alocagéo de recursos come um determinante primério do compor tamentoe projeto organizacional (William son e Winter, 1991), 0 foco na “microsco- nomia da organizacio” (Donaldson, 1990; Williamson, 1990), assim como uma teoria do comportamento da firma mais sensivel {6 limitagdes insttucionals em que so con- lucidas as transapies econdmicas, ncoraia- ram. formulagao de uma agenda de pesqui- ‘a.com énfase nas estruturas corporativas de ‘adninistragao e em seu elo com as funcies ‘organizacionais (Williamson, 1990). Esse modelo também se vale da concepgio de Barnard sobre organizagio como coopera- ‘SHo, “que é consciente, deliberada © com fins especicos” (1938 : 4). e que somente pode ser explicada como o resultado de wma interagao complexa entre a racionsliéade formal e a substantiva ou entre requisitos téenicos ¢ ordem moral (Williamson, 1990). ‘A rentativa original de Bamard de fore: cer uma sintese de organizagio como um: concepcao sistémica “racional” e “natural 4 0 fundamento das teorias baseadas no mercado, que floresceram nos anos 70 ¢ 80, tais como 2 andlise do custo de transa- 40 (Williamson, 1975; Francis, 1983) e 2 ‘ecologia populacional (Aldrich, 1979; 19925 Hannan e Freeman, 1988). Apesar de haver diferencas tebricas importantes entre essas duas abordagens, particularmente em relagéo & forma e a0 sgrau de determinismo ambiental do quat las se valem (Morgan, 1990), ambas se Daseiam em uma série de premissas que ‘compatibilizam formas administrativas in reas com condigoes externas de mercado por meio de uma Iégica evolucionéria, que subordina a ado individual e coletiva aos imperatives de efieiéncia e sobrevivéncia, que vio muito além ds induéncia humana, A teoria do custo de tansacao preocupa-se ‘com os ajustes adaptacivos que as organiza ‘ges precisam fazer para enfrentar as pres ses de maxlmizacdo da eficiéncia em suas transagoes internas e externas. A ecologia populacional destaca o papel das pressées competitivas, que selecionarn alguns tipos de organizagao em detrimento de outros. Ambas as perspectivas séo baseadas em um ‘modelo de organizacao em que seu proje to, funcionamento e desenvolvimento s0 tratados como resultados diretos de forgas uuniversais, que néo podem ser modificades pela agao estratégica (© que fica evidente no modelo do mer- cado € falta de qualquer tentativa continua de abordar a questéo do poder social e da ‘ntervengo humana. Nem a abordagem de mercados/nierarquias, nem a de ecologia populacional, ou mesmo a “teoria liberal das Drganizages” de Donaldson (1990; 1994) se interessam muito pelos meics pelos quais ‘a mudangs organizacional se estratura em fungio de hitas de poder entre atores s0- ciais e as formas de dominagio que eles legitimam (Francis, 1983; Perrow, 1986; ‘Thompson e McHfugh, 1980). Essas abor- dagens tratam a “organizagao” como sendo constitulda de uma ordem social ¢ moral fem que os interesses e valores individusis ¢ sgrupais so simplesmente derivados de uma estrutura de “interesses ¢ valores do siste- ‘ma", que no se contaminam por coaflitos setoriais e lutas de poder (Willman, 1983). ‘Uma vez que esse conceito unitario é con: siderado inato, “aceita” coma wm aspecto “natural” ¢ virtualmente invisvel da orga- aizagdo, o poder, os confltes ea dominacao podem ser seguramenteignorados,tratados como elementos “externos” a0 campo de visio analitica e de preocupacio empitica do modelo. Essa forma unitdria de conceber a or- ganizacao é inteiramente compativel com ‘um contexto politico eidealégico mais am- plo, dominado por teorias neoliberais de organizagao e controle da sociedade, que clevam as “forgas impessoais de mercado” & categoria analitica de universalidades onto- Iogicas determinando as chances individuais « coletivas de sobrevivéncia (Miller ¢ Rose, 1990; Rose, 1992; Silver, 1987). Desde as deologias neoliberais ou darwinianas do sé- culo XIX (Bendix, 1974) até doutrinas mais ecentes que enfatizam a “sobrevivéncia os mais aptos”, tndas essas teorias defen- dem a expansio progressiva do mercado, da racionalidade econdmica e da iniciativa rivada, em detrimento de conceitos cada vvez mais frageis e marginaliaados de co- unidade, servigo piblico e preocupagées socials. Por meio da globalizacko, as nasées empresas envolvem-se em Iutas cada vez mais acirradas, que terdo por vencedoras as organizagSes e economias que se adaptarem de forma intensiva as demandas do mercado (Du Gay e Salaman, 1992; Du Gay, 1994), ‘Assim, teorias organizacionsis baseadas no mercado lidam com movimentos ciclicos ral que ressurge (Alford e Friedland, 1985; Cemy, 1990; Miller e Rose, 1990; Johnson, 1998). Tal pesquisa também questiona a co- eréncla analtica eo aleance explanatorio de ‘um modelo teérico de poder com capacida. de limitada de lidar com as complexidades materials, culturais epolticas das mudangas orgenizacionais, Conncimenzo & Poper (© modelo baseado em conhecimento tem sérias prevengdes contra as tendéncias Institucionaise estruturais que caracterizam os modelos analitices previamente exami- nados, Bsse modelo rejeta as varias formas de determinismo metodalégico e reérico © a explanagio légica “totalizante” na qual 0s outros se inserem. Ao invés disso, esse abordagem tata de todas as formas da 280 social institucionalizada eestruturada como um mosaico tempordrio de interagdes € aliangas taticas, que formam redes mutéveis erelativainente fustéveis de pode tenden- do & decadéncia e dissolucio internas. Ele explica 0 desenvolvimento de “sistemas” modernos da diseiplina organizacional ¢ controle governamentel como mecanismos rregociados e contingentes de poder erela- hes, cujasraeesinsrucionas estéo naca- pacidade de exercer gerenciamento efetivo dos meios de producto de novas formas do poder em si (Cerny, 1990 7), ‘Assim, surgem como foco estratégico de-andlise mecanismos téenicose cultaras, por meio dos quais campos pariculares de ‘compartamento humane (sade, educacéo, sriminologia, administragio) sioestabelec- dos como revervas de mercado para certos cespecialistas ou grupos de peritos. Esses recanismos tém muito maior significado do que 0s poderes econémicos e politicos auténomos, tas com “estado” ou “classe” © conhecimente, ¢ 0 poder que ele poten- cialmente confer, assume o papel central fornecendo a chave cognitiva e os recur s0s representativos para a aplicagao de urn conjunto de ténicas com que regimes dis Ciplinares, ainda que tempordrios e inst ves, podem ser construdes (Clegg, 1994). Conihecimentosaltamente especalizados © aparentemente exotéricas, que podem, po- tenciaimente, ser acessados e dominados por qualquer individuo ou gpupo com tei namento e hablidade necessrios Blackler, 1993), fornecem os recursos estratégicos Para apropriacio do tempo, do espaca e da consciénca. Assim, a produgao, codifieacko, éstoque e uso daqueles conhecimentes, que so televantes para a regulagao do com- portamento social, tomam-se Uns questio estratégica para a mobilizacéo einsttucio- nalizagio de uma forma de poder organi- zado que permits o “controle a disténcia”™ (Cooper, 1992). Retrabalhada dentro dessa problem: tic, a “organizaglo” toma-se portadora de conhecimentos sociais, téenieos e de habi- Uidades por meio dos quais modelos parti Cares de selacionamerto social surgem Seproduzem-se (Law, 1Y¥4a). Esse po de “organizacio” nao tem caracterstica onto- 26giea inerente nem significado expianaté- lo como entidade ou estrutusa generali- ‘eoTwzagio ORGITZAGIONAL: a CAMPO ExSTORICAMENTE CONTESTADO 77 ie TIE zével € monolitca. A contingéncia, ¢ nd 2 universalidade, impera tanto no tocante {20 conhecimente localizado e restrito, que torma possivel cxisténcia de organizacbes, ‘quanto nas relagées de poder que elas ge- ram. 0 fovo da pesquisa encontra-se na “or dem interacional” que produ aorganizacéo € 05 estoques de conhecimentos por meio dos quais agentes se envolvem em prticas situacionais que constrocm as estruturas ‘que reproduzem a “organizagio” (Goffman, 1983; Layder, 1994), Varias abordagens tedricas espectfi- ‘as baseiam-se nessa orientagio geral para desemvolver uma agenda de pesquisa para ‘anélise organizacional que tenia, como in- teresse estrardgicn, 0s processos de prod- ‘io do conhecimento por meio dos quais a “organizacéo” é reproduzida. A ernometo- éologia (Boden, 1994), as abordagens pés- todernistas para cultura esimbolismo orge- rizacional (Calés e Smircich, 1991; Martin, 10992), a teoria da tomada de decisdo neo- racionalista (March ¢ Olsen, 1986; Mer ch, 1988), a teoria rede-ator (Law, 1991; 1994a) a teoria pés-estruturalisa (Kondo, 1990; Cooper, 1992; Gene e Johnson, 1993. Clege, 1994; Ferry, 1994) contribuem, co- Tetivamente, para uma mudanga do foco na andlise organitacional, desloeando-o do nivel macro de formalizagao ou institcio nalizaeZo para um nivel micro de andlise do ordenamento ou rotinizagao social. A ‘seus diferentes modes, essas abordagens = mmuitas das quais so representadas nesse livro (ver os Capitulos de Cals e Smircich, Clegg ¢ Hardy e Alvesson e Deetz, neste Handbook) - tentam reformular o conceit de organizagéo como sendo uma “ordem” socialmente constraida e sustentada, ne- cessariamente fundamentada em reservas localizades de conhecimento, em rosinas préticas e em mecanismos técnicos mobili econ por atoces soci em uc inseragdee e discursos do dia-e-dia, ‘Tomados em sua totaidede, os estucos contempordneos de discursos sobre conhe- | j { ineessnresseneerenneniene elmmento/pocer concentram-se nos mecanis- ‘mos por meio dos quais 0s membros orga nizacionais tentam impor ordem 8 organi zasS0, gerando redes relacionals dindmicas ‘e ambiguas. Essa abordagem ratifies uma visio de organizagées como "a condensacio de culturas locais de valores, poder, regras, critério ¢ paradoxo” (Clegg, 1994 : 172). Esses estudos esto em consonancia com as imagens e preconcsitos de um espirito ‘pés- industrial” ou "pés-modemo”, de acordo ‘cont v qual 2 oraurizayio € desvoustiuidae ‘em termos da “tomada de decisao local 2ada, descentralizada, instanténea...” de forma que as “transformagbes e inovagées corganizacionais acontecem do encontzo en- ‘te informacio e interagl0” (Boden, 1994 210). sto estd, por sua ver, inteiramente de ‘acordo com as teorias da especializacio fle xivel (Piore Sabel, 1984) edo capitalismo desorganizado (Lash e Urry, 1987; 1994), fem gue as formas ou estruturas insttucio: mais, uma vez.consideradas constitutivos da -conomia politica”, dissolvem-se em fluxos ce redes de informacées fragmentadas. Hé, contudo, uma diivida persistente quanto ao que esté perdido nessa “localiza 80" da andlise organizacional e sua aparen: te obsessiio com 0 nivel micro de processos préticas. A divide faz essas abordagens ‘parecerem estranhamente dissociadas das questées mais amplas sobre justica,igual- dade, democracia e racionalidade. Pergun- tase: e quanto & preocupasso sociol6gica cléssica com os aspectos macroestruturais da ‘modemidade (Laydex, 1994) e suas implica- ‘gées na forma como “deveriamos” conduzit ‘nossas vidas organizacionais? Escatas pe Jusriga (© refiigio analitico que os estudos or- -ganizacionais buscaram dentro de aspectos Iocais da vida da organizagio os distancia, tedrica e epistemologicamente, dos temas rormativos e das questbes estruturais que TTS formaram seu desenvolvimento histérico ¢ sua racionalidade intelectual. Pode-se dizer, pelo menos, que esse afastamento redefine, radicalmente, sua “missdo intelectual”, ds tanciando-se de universalidades éticas e de abstragGes conceituais, a0 tempo em que se aproxima de relatividades culturais e de esquemas interpretativos que slo, inerente- mente, resistentes a generalizagbes histor cas e teéricas, Contudo, essa mudanga em diregéo & andlise local em organizagbes © a recuse em enfiemtar questées mais ideolé sgicas eestruturais ndo passaram desaperce bidas. Varios crticos tentaram redirecionar o estudo das organizagdes para as formes institucionaise as questées analticas enor ‘mativas que elas levantam. Um exemplo selativamente dbvio desse desenvolvimento é encontrado no “navo ins titucionalismo” (Powell e DiMaggio, 1997; Meyer ¢ Scott, 1992; Whitley, 1992, Perry 1992). Outro pode ser visto no ressurgimen- to do interesse pela politica econémica da organizagéo e suas implicagées para a exter slo da vigilancia e do controle burocrétices nna “modernidade tardia’, que se observara na complexa cadeia de formas e priticas institucionals (Alford e Friedland, 1985; Giddens, 1985; 1990; Cemy, 1990; Wolin, 1988; Thompson, 1993; Silberman, 1993; Dandeker, 1990). Por fim, debates sobre 2 perspectiva imediata e de longo prazo para a democracta e participacio organizacional dentro de estruturas de contre corporativo, debates estes que se desenvolveram em eco ‘nomias politicas dominadas por deologias ¢ praticas neoliberais durante as décadas de 80 ¢ 90 (Lammers e Szell, 1989; Morgan, 1990; Fulke Steinfield, 1990; Hirst, 1993), e despertaram o interesse por questées go bais que devem ser objeto da andlise de organizagGes. Cada um desses campos da literatura levanta questées fundamentais sobre 08 1 os de contole corporativo predominantes ‘has organizagSes contempordneas eem sua ‘bases de julgamentos morais e politicos so bre justiga ¢ imparcialidade, em contraste com outros interesses e valores. Essa lite ratura também reafirma a imporcancia das questées relativas & distibuigéo instruc: rralizada de forgas econdmicas, politicas ¢ culturais em sociedades desenvelvidas e em desenvolvimento, que tendem a ser margi- nalizadas nos discursos pés-modernistas pés-estruturalistas, centrados na prética de interpretagées representagbes locals. Essas sbordagens reavivam uma concepcio da or- ‘ganizagdo como uma escrucura inetinuciona- lizada de poder e autoridade que esta acima das micropraticaslocalizadas dos membros organizacionals. DiMaggio e Powell sustentam que o “novo instirucionalismo” representa uma “rejeigdo dos modelos de atores racio: ais, um interes nas instituiges como varidvelsindependentes, uma volta As cxplicagdes cognitvas ecultarals, eam {interes em propiedad de unidades de nile sepa in iduais que nfo podem ser ceduzidas a agregagées ou tatadas como conseqincia direta de atibatce ou smtives indviduais" (1992 8). Eles concentram seu foco na estratura cxganizacional e em préticas encomtradas em Giferentes setores instrucionais, nos "mites deracionalidade” que legitimam e rotinizam arranjos predominantes e, fnaimente, ‘nas formas pelas quis a ago € ext turada ea ordem é viabilizad por siste mos cempartthadas de regras que, por um lado, restingem a capacidade e pro- ppenslo dos atores em otimizas recursos ©, por out, priilegiam alguns grupos (jos ineresses eso assegurados por ‘ncentvos e punigdes” (1991: 1), Sua énfase nas priticas que penetram as estruturas e processos organizacionais fais como 0 Estado, a classe social, ¢ receitas as profissdese indstrias/sevores revela 0 Dapel estratégico desempenhado pelaslutas de poder entre atores instirucionais com 0 objetivo de controlar “a formacio e reforma dos sistemas de regras que guiam & ago politica e evontmica” (2991 : 28) Aoreconhecer que a geragao ea imple- rmentago ce formas e préticasinstinucionais ‘so “replotas de conflitos, contradicio e am- Digitidade” (1991 :28), 2 teoria institucional ‘tem, como preocupacio central, o processo ‘cultural e politico por meio do qual atores « seus interesses/ valores s80 instirucional- ‘mente construidos e mobilizados no apoio de certas“Idgicas organizacionais” em detri- ‘mento de outras. Dessa forma, explicagses que relacionam o comportamento e desenho corgenizacional aos contextos de nfvel macro ganham primaaia, dado que estes sio cons- tituldos por padres de atividades ‘supra-organizacionais que conduzern no Fempo e no espago as vidas materais dds sere amanos, bem como por siste- ‘mas simblieos por melo dos quais eles categorizam suas atvidades thes con- ferem significedo” Friedland e Alford, 1991: 232), Na condigio de formas institucional zadas de prética social, as organizagSes sio ‘vistas como “estruturas nas quais as pessoas poderosas dedicar-se a algum valor ou in teresse", © esse poder “tem mufto que ver coma preservagio historica dos padrdes de valores" (Stinchcombe, 1968 : 107). Portan- 'o, 0 posicionamento histérico, estrutural © contextual dos valores e interesses de atores coletivos, © ndo sua (re)produgao local por meio de praticas de nivel miero, surgem como a prioridade analitica e explicativa para a teoria institucional. Esse foco no desenvolvimento histérico ena contextualizacio estrutural de organi- zacbes, caracteristco do “novo instituciona- lismo”, est refletido em um trabalho recente sobre as mudancas na capacidade de “Vigi- llincia e controle” das orgenizages moderas ue, como sugere Giddens, tem o tema da *refleividade institucional” como seu objeto de estudo estratégico. Trata-se da insitucionalizagéo de uma posture in- vestgadorae calculise que se inreressa Dor condiges genéricas de reproduso do sera; elaao mesmo tempo eat Ise reflete um declnio nos meios tadi- cionais de fazer a coisas. Br também associada &geraco de poder (entendida ‘como capacidade transformative). A ex- pansdo da reflexvidade institucional est. por és da prolferagio de orgenizagces ‘esicontext modemes, iacluindo org nizapbes de altance global (1999 : 6), ‘A ascensiio de formas e praticas organi- ‘acionais modernas 6 vista como intimamen- te ligada & crescente sofisticacdo, alcance e variedade de sistemas buzoeriticas de vigt- ancia e controle, que podem ser adaptados a varias circunstincias sociais e historicas iferentes (Dandever 1990). A emergéncia € a sedimentacao institucional de estado- nagio e das estruturas administrativas pro- fissionais desempenham um papel crucial ‘no avango das condighes materiaise sociais fos quais a vigilancia e o controle organiza ional podem ser estendides (Cerny, 1990; Siberman, 1993). Mudangas tecnolégicas, colturais ¢ polticas relativamente recentes estimularam a criacdo e a difusto de siste- mas de vigilancia mais discretos, que #80 muito menos dependentes de supervisdo € do conuole diretos (Zuboff, 1988; Lyon, 1994). 0 ctescimento da sofisticagio téeni cae da penetragao de sistemas de controle também servern para reafirmar a relevancia anual da preocupacio de Weber sobre a pers- pectiva, a longo prazo, de envoivimento in. dividual significative em uma ordera social organizacional, que parece cada vez. mais préxima, ainda que continue distante, das ‘vides cotidianas (Ray e Reed, 1994), A anélise organizacional parece, en- ‘Ao, ter completado um ciclo ideol6gico ¢ ‘te6rico, umna vez que a percepgio de amea- aA liberdade represencada pelas formas Organizacionais burocrdticas “modemes” Go inicio do século 2% ecoam agora em de- ‘bates sobre participacio e democracia, em mefo ao regime de vigilancia e controle, 8Bo sofisticado quanto discreto, que emer. glu no final do séealo (Webster ¢ Robins, 19983). Amedida que a organizacto pés-mo- ema toma-se-um mecanismo de contzele sociocultural altamente disperso,dinmico e descentrado (Clegg, 1990), impossivel de ser detectado ou combatido, questies {que relacionam responsabiidade politica e idadania tornam se tdo importantes ago- 1 quanto cram hd cem anos. Como Wolln 961 : 434) elegantemente argumentou, ‘oria organizacional e a teoria politica jevem novamente ser vistas como a forma de conhecimento que trata do que ¢ gerale Integrative para o homem [sc]; uma vida de envoivimento eomunn” sea aspiragio de reaver uma “visio institucional” em andlise organizacional, ue fale do relacionamento entre 0 cidadio, 4 organizacao, a comunidade e o Estado has fociedades modernas (Etzioni, 1993; ‘Acne, 1994), €um rema rio. As pesquisas sobre participacao © democraca organiza: cional sugerem que esforgos de deseavol- ‘iment de projetos organizacionaie ais Participstivose igualiérios tim encontrado diffcaldades exeremas nos times 15 snes (Lammers e Szell, 1989). Perspectivas de longo preze para a democracia parecem ‘gualmente pesimistas em wm mundo cada vez mais globalizado fragmentado, que desestabiliza ou mesmo destst identide- des sociopolitieas eeulturas estabelecidas, MILLER, B Governing economic lif. Economy and Society (2): 1-31, 1999, [SAINFSIMON, 1. Socal ongaizaton, the science of man, and ether wricings. New York: Harper Torch, 1958. SCARBROUGH, H., CORBETT M. J. Technology and organiazion. Londres: Rowdedge, 1992 SELZNICK, 2 The TVA ond the grasr roots New York: Harper and Row, 1949, SILBERMAN, 3. 5. Cages of reason: the rise of ‘the rational ate in France, Japan, the United States and Great Brita. Chicago: University of Chieago Press, 199, SIVER, J. 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Particularmente digna de nota & a Tabela 1 ddo texto ~ Narrativas analtioas em andlise organtzacional -, em que Reed relaciona as diferentes perspectivas tesricas acopladas a

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