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hélade Antologia da Cultura Grega Organizagao ¢ tradugio do original Maria Helena da Rocha Pereira 10: edigao 2he38 UNIVERSIDADE DE COIMBRA Faculdade de Letras 48/42 [2c 10 as 25, mAADA Propotigiio e invocagée Cante-me, 6 deusa, a célera funesta de Aquiles, filho de Peleu, que eausou aos Aqueus softimentos sem conta ce precipitou no Hades muitas almas ilustres de herbie, fazendo deles mesmos a presa dos cies e de todas as aves — cumpriam-se os designios de Zeus — desde 0 momento em que se separaram, diseordande um do outro, © Atrida, senhor dos homens, ¢ 0 divino Aquiles. a1 O sacerdote de Apolo Quem dentre os deuses os impeliu & disedrdia? 0 filho de Zeus ¢ de Latona. Pois este, irado contra o rei, suscitou no exéreito uma doenga funesta, ¢ pereciam os povos, porque o Atrida desconsiderara o secerdote Crises: este veio até as naus velozes dos Aqueus, 4 fim de libertar a filha, trazendo um enorme resgate, ¢,na mio, as fitas de Apolo que acerta no alv cenroladas no ceptro de ouro. E dirigiu séplicas a todos os Aqueus, cepsciainente so dis Avda, commdanes doe pov: “6 Atridas, e demais Aquens de belas enémides! Que os deuses, habitantes do Olimpo, vos concedam destruir a cidade de Priamo e regressar, felizes, a casa. Mas libertai a minha filha querida, recebei o prego do resgste, por respeito para com o filho de Latons, Apolo que acerta no alvo,” Entio todos os outros Aqueus concordaram «que se respeitasse o sacerdote e se recebessem os dons intmeros. Porém isso niio aprouve ao animo do Atrida Agamémnon, ‘que o despediu com mau modo, acrescentando palavras violentas: “Que eu nio te encontre, 6 velho, junto das cncavas nau cou demorando-te agora ou volvendo de novo mais tarde, que pode ser que do nada te vatha o ceptro on as bandas do deus. A cla nfo a entregarei eu, antes que Ihe eobrevenhs a velhice, 30 na morada que é a nossa, em Argos, longe da patria, a trabalhar ao tear e a servir no meu leito. ‘Mas vai-te, néo me epoquentes, se queres ir daqui a salvo". (1, 8-32) A proce de Crises Assim falou, Assuston-se 0 anciéo, ¢ obedecen as ordens. Avanga em silénefo ao longo da praia do mar marulhante, 35 ¢ depois de caminhar para muito longe, suplicoa 10 principe Apolo, filho de Latona de eabelos formosos: “Exeuta-me, Senhor do arco de prata, tu que proteges Crise ¢adivina Cla, ¢ governas Ténedos com o teu poder, 6 Esminteu! Se jamais erigi templo que te agradasse, 40 se jamais te queimei pingues coxas de touros ou de cabras, atende este meu desejo que os Diinaos paguem as minkes lagrimas com os teus dardos” @, 33.42) Apolo langa a peste sobre o exérecito Assim foi a sua oragio, ¢ ouviu-o Febo Apolo. Desceu dos eumes do Olimpo, de coragio irado, 45 trazendo aos ombros o arco e a aljava toda fechada; a medida que ele avangava, as flechas retiniam xno ombro do deus enfurecido. E ele soguia, semelhante & noite, Sentou-se longe das naus, ¢ langou uma flechas do arco de prata saiu um silvo tervivel. 50 Atacon primeiro as mules e o efes veloze depois atiron aos préprios homens com seu dardo pontiagudos ax pitas dos cadiveres ardiam sem cessar. , 43-52) 18 70 8 85 A.assembleia dos chefes Durante nove diae, os dardos divinos oorreram o exército, Ao décimo, Aquiles convocou o pove pars uma reuniio, Hera, a deusa de alvos bragos, é que Ihe deu essa ideia. Preocupars-se com os Danaos, porque os via morrer. ‘Depois que se reuniram ¢ formaram uma sssembleia, levantou-se diante deles Aquiles de pés velozes © disse: “Atrida, ereio bem que vamos agora voltar para trés, regreseundo & nossa patria, ee a0 menos excaparmos & morte, pols que « guerra ¢ a peste, a um tempo, dominam os Aqueus. ‘Vamos, interroguemos tim vate ou um sacerdote, ‘ou umm adivinho dos sonhos — pois também estes vém de Zeus — pare que ele nos dige por que tanto se enfureceu Febo Apolo, se sito preces ou hecatombes o que tem a censurar-n0s, ‘aver se ele quer aceitar o fumo dos earneiros das eabras imaculadas, ¢ afastar de nés o flagelo.” Assim falou, ¢ sentou-se. No meio delea levantou-s6 Caleas Testérida, o melhor dos sugures, ‘que conhecia o presente, o futuro e o passado, econduzira a flion as naus dos Aqueus, gragas ao dom de adivinhar, que Febo Apolo Ihe conceders. Cheio de bons sentimentos, tomou a palavra ¢ disse: “Mandas-me que explique, Aquiles, querido s Zeus, ‘a razio da cdlera de Apolo, o senhor que acerta no alvos dir-ta-ei pois; mas ta compreende bem e jura ‘que me ajudarés, resoluto, com palavras e acgées. ois reccio irritar o homem que tem mais poder centre todos os Argivos, ¢ a quem os Aqueus obedecem. Muita é a forga do rei, quando se irrita com alguém mais fraco. E, ne acaso digere a sus bilis nesse dia, fica-Ihe 10 peito o ressentimento, até o satisfazer, Pensa, pois, se me salvaris.” Em resposta, declarou-the Aquiles do pés veloze “Podes anunciar, confiante, essa decisio dos deuses, que conheces; pois, por Apolo, querido # Zeus, a quem diriges tuas preces, 6 Calcas, para desvendares aos Dinaos os seus oréculos, znunca, enquanto eu for vivo ¢ contemplar esta terra, ninguém entre todos os Danaos, pord sobre ti as pesadas milos, 0 90 junto das cOncavas naus, nem que te refiras 2 Agaméamnon, que agora tem a gl6ria de ser 0 maior dos Aqueus”, Entio o inclito adivinho disse, confiante: “Nao vos censura por falta de preces ou de heeatombes, ‘mas por causa do sacerdote, que Agamémnon desonrau, 95 pols no libertou a sua filha nem recebeu o resgate. Por isso 0 deus que acerta no alvo vos deu e daré ainda sofrimentos, ‘eniio afastaré dos Dinaos o flagclo afrontoso, antes que ao pai querido se dé a donzela de olhos negros, sem page © sem reagate, ¢ se leve uma heeatombe sagrada 100» Crise: #6 entio poderemos torné-lo propicio convencé-lo.” Assim falou, ¢ sentou-se, No meio deles levantou-se, sombrio, o heréi Atrida, Agamémnon de vasto poder; 0 seu peito obscurece-e, pleno de furor; ‘os olhos assemelharm-se ao lampejer do fogo. Primeiro que sudo, 105 dirige-se a Calcas, com um olhar funesto: “Profeta da desgraga, jamais disseste coisa que me agradasse! 0 tou deleite foi sempre snunciar ealamidades, ‘emunca disseste ou cumpriste algo de bom. Ainda agora proclamas aos Diiaaos, como um oréculo divine 110 que o Deus que acerta no alvo nos causa sofrimentos, porque eu nilo quis receber o espléndido resgate da jovem Criseida, pois antes quero té-la em casa. E que eu prefiro-a a Clitemnestra, sinks legitima esposa; nao Ihe é inferior, 115 nem de corpo ou estatura, de espirito ou habilidade. Tenciono, néo obstante, entregé-la, se for melhor assim. Antes quero a salvage do povo que a sua perda, ‘Mas preparem-me ja um prémio, sem detenga, a fim de que no [oeja eu, soxinko entre os Argivos, destituido de presente, 0 que nie ficaris 120 Considerai vés todos, como o meu dom se vai para outra: Em seguida respondeu-the Aquiles, égil de pés: “Atsida ilustre, és 0 mais ambicioso do mundo, Como hito-de dar-te um prémio o» magninimos Aqueus? iio vemos em parte alguma dédivas armazenadas. 125 De quantas cidedes arcasimos, tudo se reparti, eno parece bem ir reclamar ao povo o que Ihe demos. 20 130 135 40 us. 150 155 Por agora, entrega essa mulher ao deus; e logo nés, os Aqueus, te pagaremos 0 triplo e o quédruplo, se algum dia Zeus nos coneeder tomarmos a cidade de ‘Tréia, de fortes muralhas.” Em resposta declarou-the o poderoso Agamémnon: “Nao me iludas assim, seja qual for o teu préstimo, Aquiles semethante aos deuses! Nio me desviards nem me [convencerés. Acazo pretendes que, para conservares o teu presente, ex fique para aqui privado do meu? E por isso que me mandas [entregé-ta? Ainda ee 08 magniinimos Aqueus mo derem um prémio excolhido s men gosto, que seja digno do anterior. ‘Mas, oe no mo derem, eu mesmo irei buscé-lo etiré-lo, ou ati, ow a Ajax, ou a Ulisses, Grande ser a ira daquele que ou visitar, ‘Mas disto falaremos nés mais tarde. Por agora levemos para o mar divino wma nau negra, equipemo-ta de remadores a preceito, metamos dentro ‘uma hecatombe, mandemos embarcar Criseida de belas faces: seja seu chefe um dos homens do conselho, ‘Ajax, Kdomencu, ou o divino Ulisse, ou tu, Pelida, o mais terrivel dos homens, para executares sacrificios que apaziguem o deus que afasta os [males.” Olhando-o de sobrecenho carregado, respondew-the fee 2 pés velozes: “Que homem coberte de desearo, que epirito ambicioso! ‘Como queres tn que te obedega de bom grado algum Aquen, ‘ou para marchar ou para combater o inimigo pela forga? ‘Eu nfo vim lutar para aqui por causa dos Troianos Delicosos, pois eles nada me fizeram Jamais me tiraram bois ou cavalos, nem destruiram as colheitas na Ftin de solo fértl, ceriadora de herSis, pois muitos aio os acidentes que Scan de permeio: ‘48 montenhas umbrosas ¢ o marulhante mar. ‘Mas seguimos-te, grande descarado, para teu prazer, para vos granjcar honra”, a Menclau ¢ a ti, 6 cara de cio, Dante a1 160 165 170 115 180 185 190 junto dos Troianos. Disso no curas nem pensas tu! E ainda me ameagas que hés-de tirar-me o meu prémio, por que tanto me eaforcei, e que me deram os filhos dos Aqueus! Contudo nunca eu tenko prémio que o teu iguale, quando os [Aquens arrasam uma cidade bem povoada de Troianos. Da luta impetuosa fazem os meus bracos ‘a maior parte, mas, quando toca a repartir, © teu prémio é muito maior, ¢ eu venho para os navios com um dom pequeno, mas estimado, depois de me estafar no [combate. ois agora vou para & Ftia, ji que 6 muito melhor ir para casa com as naus recurvas. Nio tenciono ficar aqui sem honra”, a granjear-te abundancia ¢ riqueza.” Em seguida, respondeu-the Agamémnon, principe dos homer “Poge Id, se 0 teu coracio 0 deseja, Nao sou eu quem te pede que fiques por minha causa. Junto de mim tenho gutros para me honrarem, ¢ Zeus prudente, acima de todos. Es para mim o mais odioso dos reis criados por Zeus: 86 gostas sempre da discérdia, de lutas e de combates. Se és muito forte, um deus to concedeu. ‘Vai para casa com tuas naus ¢ 08 teus homens, governar os Mirmidses. Nao me importo contigo, xem me aflige 0 tou furor. Mas eis do que te ameago: como Febo Apolo me arrebata Criseida, eu. mando no meu navio com os meus homens, assim eu irei em pessoa a tua tenda buscar Briseida de rosto [ormoso, © teu prémio, para que saibas bem quanto mais valho do que tu, qualquer outro receie falar-me como a um igual ce equiparar-se a mim na minha frente,’ Assim falou. Docu-se o filho de Peleu, ¢ no seu peito Viril o eoragio oscilava-The entre duas decisées: ‘ou desembainhava ao longo da coxa « expada agugads, faria levantar os outros, enquanto matava 0 Atride, ‘ou cessaria a sua célera ¢ apaziguaria o seu animo™. 53-192) wean @) mds, 2 195, 200 205 210 215 220 Aparigéa de Atena Enquanto deliberava assim no seu espirito ¢ no seu fnimo, e tirava da bainha a enorme espada, desce Atena do eéu; mandava-a Hera de alvos bragos, que a ambos amava em seu coracio, ¢ com ambos se preocupava. Colocou-se por tras, ¢ agarrou nos louros cabelos do filho de Pelew, visivel 86 para ele, ¢ sem que nenhum dos outros a contemplass Aquiles ficou estupefacto, voltou-se, ¢ logo reconheceu elas Atena: o¢ seus olhos tinham um brilho tervivel. Dirigindo-se a ela, proferiu catas palavras aladas: “Porque vieste, filha de Zeus detentor da égide? ‘Acaso foi para veres a insoléncia do Atrida Agamémnon? Eu te digo, ¢ julgo que o cumprirei: por causa da sua arrogincia, em breve perderé a vidal.” Por sua vez, disse-Ihe Atens de olhos gargos: “Desci do oéa para fazer cessar a tua célera; vé se me obedeces. Mandou-me Hera, a deusa de alvos bragos, que & ambos estima e com ambos se preocupa em seu coragio”. ‘Vamos! Cessa a tua firia, uo desembainhes a espada com tua mio. Ultrajs-o com palavras, anuncia-Ihe o futuro que o espera. 0 que eu te von dizer, € 0 que hi-de cumpri ‘Terds um dia trés vezes mais presentes eepléndidos, por causa desta insoléncia. Domina-te ¢ obedece-nos.” Em resposta, declaroucthe Aquiles de pés velozes: “Forga 6, 6 deusa, observar as vossas ordens, por muito irado ‘que esteja o nose Snimo”. & melhor assim. Quem aos deuses obedece, 6 2 quem cles mais atendem.” Disse, e pousou a pesada mao nos copos de prati logo enfiou a grande espada na bainha, e niio desobedecen as palavras de Atena; esta encaminhou-te para o Olimpo, para a mansio de Zeus detentor da égide, junto dos outros deuses. i, 198-222) Wy omds 2B A disputa entre os chefes Entretanto o Pelida, com palavras contundentes, dirigiu-se de novo ao Atrida, sem cessar a sua célera: 225 “O vinho te pesa, tens olhar de cio, coragio de veado! [Nunca tiveste coragem de te armares para a luta com 0 ten povo, nem de fazeres uma emboecada com os Aqueus mais valentes. Taso parecia o fim" de tudo. Decerto vale muito mais arrebatar os presentes « quem esta na tua frente, 230 junto do vasto exército dos Aqueus. Rei que devoras 0 teu povo, governas gente de pouca monta. Se niio, Atrida, era hoje o ten iltimo ultraje. ‘Mas eu te digo ¢ te jaro com um grande juramento, por este ceptro, que jamais criaré folhas ou ramos, 235 uma ver que deixou a érvore em que o cortaram na montanha, © que nffo tornaré a florir. 0 bronze tirow-Ihe a folhagem © a canea; agora trazem-no nas maos os filhos dos Aqueus que fazem justigs, e, em nome de Zeus, mantém a lei. Esse serd para tio maior dos juramentos. 240 Um dia a saudade de Aquiles sobreviré 20s filhos todos dos Aqueus. Entio nio poderés acudir-lhes, por mais aflito que estejas, quando eles cairem em grande niimero, mortos por Heitor homicida; tu dilacerars 0 teu eoragio" Id no {fntimo, furioso por nio teres honrado o mais valente® dos Aqueus.” 245 Assim falou o filho de Pelen; atirou por terra o ceptro cravejado de pregos de ouro, ¢ sentou-se. Do outro lado, 0 Atrida estava furioso. No meio deles, cergue-se Nestor de falas agradiveia, o orador harmonioso doe [Pitios; da sun boca escorriam palavras mais doces que o mel; 250 para ele, é se haviam extinguido duae geragdes de homens mortais, ‘que em sua vida haviam sido nados e criados na divina Pilos; cele reinsva agora sobre a terceira. Dei. @) ood. (©) por, 4 255 265 270 275 280 285 Cheio de boas intengées, tomou a palavra e disse: “Ail Que grande Into sobrevém a terra dos Aquons! Regonijar-se-ia Priamo, e os filhoe de Prismo, © 08 demais Trolanos ce alegrariam no seu coragio”, se soubessem tudo o que ve pasea nesta contenda, entre vés dois, dos Dinaos, os primeiros no conselho e no combate! ‘Mas obedecei-me, pois sois amboe mais jovens do que eu. Eu jé andei com varées mais valentes do que ve, munca eles tiveram par mim desprezo. Ainda nfo vi homens — nem poderei ver — como Piritoo © Driante, pastor de povos, Cenas, Exadio ¢ 0 divino Polifemo, ¢ Teseu, filho de Egeu, semelhante aoa imortais. Esses cram o6 mais fortes dos homens gerados sobre a terra, ceram os mais fortes, e com os mais fortes combatiam, ‘08 Feres dos montes, que pereceram horrivelmente, Sai de Pilos, essa terra longinqus, para com eles conviver, pois que me tinham convidado. Eu lutava por minha conta. Com esses, nenkum dos mortais, ‘que ora vivem sobre a terra, seria capas de combater. Contado, eles pediam-me conselho e obedeciam as minhas palavras Obedecei vés também, que obedecer é melhor. Apesar de valente”, no the tires a donzela; deixa-Iha, que lha deram antes por prémio os filhos dos Aqueus. E tu, Pelida, nao te irrites em face de um rei. Aum soberano, detentor do czptro, a quem Zeus concedeu a gléria, rio the cabem honrarias® como as tuas. Se és mais forte, uma deusa te gerow, ‘mas ele é mais importante, porque governa mais homens. Atrida, cessa a tua eélera. E eu mesmo te pego: remuncia ‘tua ira contra Aquiles, que é a fortaleza suprema dos Aqueus, contra os males da guerra.” Em resposte, declarou-lhe 0 poderoso Agamémnon: “Nao bd davida, 6 anci#o, que em tudo falaste com justics. Mas este homem quer estar acima de todos, ‘todos quer dominar, de todos ser senhor, Wende @) bya, @) muh. 1 todos dar ordens, a que eu sei que alguém nio obedoceré. 290 Se os deuses, que existem sempre, fizeram dele um guerreiro, ‘nem por isto 0 incumbiram de proferie 96 injéria Abruptamente retorquit-the o divino Aquiles: “Poderiam bem chamar-me cobarde e homem de pouca monta, se eu me submetesse a tudo o que tu dissesses. 295 Dé cssas ordens a outros, nfo mandes em mim, quo eu nio ereio que poses jamais obedecer-te. Ontra coisa te direl, pde-na no teu pensamento: da donzela, rninguém, jé que me tirais o que me [destes. 300 Mas, de outros bens que eu tenha junto da negra nau veloz, nada tirards, sem men consentimento, E, se nfo, experimenta, para estes o saberem também, Em breve o sangue correré com forga em volta da minha langa.”” Depois de assim combaterem os dois com palavras violentas, 305 erguoram-se, ¢ dissolveram a aseembleia, perto das naus dos Aqueus. 0 Pelida foi para as mas tondas ¢ 2s suas nets; com ele o filho de Menécio ¢ os seus compankeiros. (4, 223-307) O ritual da purificagéo Atrida mandou arrastar para o mar uma nau velo, escolhen vinte remadores, mandou embarcar uma hecatombe 310 para o deus, ¢ lé instalon também Criseida de rosto formoso. ‘Como chefe, subiu para o navio Ulisses dos mil expedientes. [Logo que embarcaram, fizeram-te ao largo dos hiimidos eaminhos, 0 Atrida exorta os seus homens a purificarem-se Eles purificaram-se ¢ atiraram com as impurezas as ondas, 315 Fizeram a Apolo hecatombes sem mancha de touros e cabras, a0 longo da praia do pélago estéril. Em eopirais de fumo, a gordura sobe até a0 céu. (i, 308-317) 26 320 325, 330 335 340 345, Os arautos véo buscar Briseida Estes eram os trabalhos no exército. Max Agamémnon nilo cessou a sua ira com que antes ameagara Aquiles, Dirigiu-se a Taltibio e a Euribates, ambos seus arautos efigis servidores: “Ide a tenda de Aquiles, filho de Pelew, pegai na mio de Briseida de rosto formoso trarei-ma; se a nfo entregarem, eu mesino irel i tiré-la, com maior forge de homens; e pior seré para ele.” Com estas palavras os despedia, dando as suas ordens com violéneia. Eles foram-se, contra vontade, ao longo da praia do pélago estéril, até que chegaram as tendas ¢ aos navios dos Mirmidies. ‘Encontraram-no sentado junto da tenda e da negra nan, ‘© 0 vé-los no se alegrou, por certo, Aquiles. ‘Com receio e respeito pelo rei, estacaram ambos, e nio se dirigiram a ele, nem 0 interrogaram. Porém logo ele compreenden em seu expirito™, e fa “Salve, arautos, mensageiros de Zeus ¢ dos homens, acereai-vos, Perante mim nio sois vés eulpados mes sim [Agamémnon, que vos mandou por causa da jovem Briseida. Anda, divino Pétroclo, traz ef para fora a donzela © entrega-a para eles a levarem. Sede vés testemunhas, perante os deuses bem-aventurados ¢ os bomens mortais, ease rei cruel, se algum dia eu tornar a ser preciso, para afastar dos outros um flagelo ignominioso. (0 seu dnimo! estd possuido de ama ira funesta, le nifo sabe calcular, pelo pasado e pelo faturo, ‘como os Aqueus hio-de combater com seguranga junto das naus.” Assim falou, ¢ Pétroclo obedecen ao seu querido companheiro. ‘Trouxe para fora da tenda Briseida de rosto formoso, « entregou-s. Eles seguem ao longo das naus dos Aqueus. Com: eles avanga a mulher, mau grado 801. sess (1, 318-848) Derm 7 350 355 370 315 Aquiles ¢ Tétis . Mas Aquiles, chorando, sentou-se, retirada dos companbeiros, junto da praia do mar pardacento, olhando o pélago cor de vinho. E, estendendo os bragos, dirigit uma splice & mile querida: “Mie, jé que me criaste para uma curta vida, devia Zeus Olimpioo, senhor do trovlo, conceder-me alguna honra; mas agora, em nada me dignificou, pois acaba de me desconsiderar o Atrida Agamémnon, de vasto poder; levou-me e arrebatou-me o meu presente de honra.” Assim falou, derramando légrimas; ouviu-o a mite venerével, sentada nas profundezas marinkas, junto do idoso pai. Répids, surgiu a superficie do mar pardacento, como uma névos, foi sentar-se diante do fhe choroso; acariciou-o com a mio e dirigiu-se a ele, chamando- pelo nome: “Meu filho, porque choras? Que desgosto cain sabre o tou espirito? Diz, nio o escondas, para ambos ficarmos a saber.” Suspirando profundamente, respondew-lhe Aquiles de pés velozes: “Tu sabes. Porque hei-de contar-te aquilo que conheces? [Nos fomos 2 Tebas, cidade sagrada de Eécion, destruimo-Ia ¢ trouxemos tndo para aqui. 0 produto do saque foi repartido entre os filhos dos Aqueus, escolhiendo, para o Atrida, Criseida, de belas faces. Porém, Crises, o sacerdote de Apolo que acerta no alvo, veio junto das naus velozes dos Aqueus de brénzeas tiinicas, para libertar a fithe, trazendo um enorme resgate, , nas mios, as fitas de Apolo que acerta no alvo, sobre 0 ceptro de onro, Implorou todos os Aqueus, ‘mas mais os dois Atridas, ordenadores dos povos. Entdo todos os outros Aqueus comcordaram que se respeitasse o sacerdote e se recebesse 0 eapléndido resgate. Mas isto no sprouve so animo" do Atrida Agamémnon, que o despediu com mau modo, dando as suas ordens com violéncia. 0 ancido retirou-te enfurecido. Apolo escutoit as suas preces, pois que muito o estima. Despediu sobre os Argivos um dardo terrivel. E entio 08 povos Wend 2% 390 395 a0 415 pereciam uns apés outros, ¢ as flechas do deus partiam cm todas as direogées, pelo vasto exército dos Aqueus. 0 sébio adivinho proclamou-nos o oréculo do que acerta no alvo. ‘Logo eu exortei, antes de todos, a tornar 0 deus propicio. ‘Mas a ira apossou-se do filho de Atreu. Levantou-se de sihito, fez a ameaga que agora ee cumpria. Os Aqueus de olhos negros levam a donzela a Crise, ‘numa nau veloz, ¢ 20 deus apresentam oferendas s arantos levaram da minha tenda para a nau a donzela, filha de Brises, que me deram 0s filhos dos Aquens. Mas tu, se £6 cxpaz, socorre o teu filho. Vai ao Olimpo implorar Zeus, se jé algum dia gamhaste 0 seu coracio, com palavras ou acgies. Muitas vezes te ouvi vangloriares-te disso, no palicio de meu pai, quando contavas como afastaras o flagelo ignominioso do Crénida das mavens negras, sozinha entre os imortais, quando os demais Olimpicos queriams aprisioné-lo, Hera e Postidon, ¢ Palas Atencia. ‘Mas tu foste ter com ele, 6 deusa, destigaste-o d ‘¢ deprosea chamaste as alturas do Olimpo © gigante dos cem bragos — a quem chamam os deuses Briareu, © 08 homens todos Egéon — superior ao proprio pai na forga. Esse sentou-ce junto do Crénida, orguthoso da sua forga gloriosa. ‘Temeram-no 08 deuses bem-aventurados, ¢ mio o prenderam. Lembra-te agora disto, esenta-te 20 pé dele, tomando-Ihe os joelhos, Pode ser que ele queira prestar socorro aos Troianos, fazer recuar os Aqueus, esmagados, para as suas naus, no mar, ‘fim de que todos tirem proveito do rei que tem, que pereebs o Atrida, Agamémnon de vasto poder, © seu desvario”, por néo honrar 0 mais™ valoroso™ dos Aqueus.” Em aeguida, responden-the Tétis, banhada em lagrimas: “Ai, men filho, para que te criei eu, que terrivel geragio! Quem dera que ta ficasses no pé das naus, sem lagrimas rem penss, pois que breve € 0 teu destino, ¢ de curta duragao! E agora segues éaminbo para uma morte pronta, deegragado, mais que todos. Para este triste destino te dei A Int no palcio. Oem @) Spnores. 2» ‘You fazer este pedido a Zeus tonitruante. 420 Eu mesma irei ao Olimpo, coberto de neves, a ver se 0 convengo, E tu, agora, senta-te junto das naus velozes, irado contra os Aqueus, ¢ abstém-te por completo da lute, ‘Ontem foi Zeus para o8 lados do Oceano a um banquete com os Etfopes sem macula, e com ele seguiram todos os deuses. 425, Ao fim de doze dias voltara de nove ao Olimpo, ‘e entio irei ao palicio de Zeus, com seu limiar de bronze, abragarthe-ci os joelhos, ¢ julgo que o convencerei.”” Ditas estas palaveas, afastou-se, deixando ali o filho irado, a pensar na mulher de bela cintura, 430. que Ihe haviam arrebatado & forga, contra stia yontade. (G, 348-430) Desagravo ao deus Apolo Entretanto chega Ulisses a Crise com a sagrada hecatombe. ‘Assim que entraram no porto de aguas profundas, ‘colheram as velas, guardaram-nas na negra natt, baixaram o mastro para o seu cevalete, encurtaram ot eabos, 495 com presteza, puseram-se a remar para o ancoradouro, Atiram as pedras e prendem as amarras, Desembarcam eles, 20 longo da praia maritima, desembarca hecatombe para Apolo, que acerta no alvo, sai também Criseida da nau que corre o8 mares. 440 Ulisses dos mil expedientes a conduz ao altar, entrega-a nas mio de seu pai, ¢ diz 6 Crises, mandou-me Agamémnon, senbor dos homens, trazer-te 2 tua filba, ¢ fazer a Febo ume sagrada hecatombe pelos Dinaos, a fim de apariguarmos o deus, 1445. que hé pouco desfechou sobre os Argivos cuidados que fazem gemer. Ditas estas palavras, pés-Iha nos bragos. Com jibilo recebew a filha querida, Sem detenga, colocam em boa ordem ‘a inclita heestombe para o deus, em.volta do bem edificado altar. Em seguida, fizeram libagfes e tomaram os gros de cevada. 450 Crises, erguendo as mios, pediu por eles bem alto: “Bacuta-me, 6 deus do arco de prata, tu que proteges Crise 30 455 460 470 415, 480 ¢.a divina Cila, ¢ governas Ténedos com o teu poder! ‘J antes atendeste aoe meus rogos © me honraste, atingindo duramente © povo dos Aquew Cumpre agora também este men voto: afasta doravante dos Danaos o flagelo ignominioso.” Tal foi a sua oragio, ¢ ouviu-o Febo Apolo. Assim que rexaram ¢ espalharam os gris de cevada, Puxam primeiro 08 pescogos, estrangulam e esfolam, cortam us coxas, revestem-nas de gordura, de um e ontro lado. Sobre elas pdom a carne crua. Queima-os 0 velho nas brasas, derrama por cima o vinho da cor da chama. Junto dele, os jovens eegaram nas mos os expetos de cinco dentes. Depois de queimarem as coxas e comerem as entranhas, cortam o resto aos bocados e atravessam-no com os espetos, assam-no com euidado e retiram tudo do fogo. Assim que terminaram 0 trabalho e aprontaram o festim, Danquetearam-s, ¢ 20 seu fnimo” nada faltou no festim eqqitativa, Depoie que se saciaram de bebida e de comida, 0 jovens enchem os crateres de liquido a trasbordar distribuem a todos are as Ubagdes. ‘Todo o dia os filhos dos Argivos, com seus cantos, apariguaram o deus, entoando belos peanes, para celebrar o que afasta os males. Este excutavs-oa com deleite. Entao o Sol merguthou ¢ desapareceu nas trev Deitaram-se, pois, ao longo das amarras do navio. Eis que surge a filha da manhi, a Aurora dos dedos réscos, ‘eles fazem-se a0 largo, 2 caminho do vasto exéreito aque. Apolo que afasta os males manda-thes uma brisa favorivel. Tgaram o mastro, distenderam as brancas velas. ‘0 vento enche 0 meio da vela, as vages purpriress saltam a grande altura, em volta da esteira do navio, que avanga corre pelas ondas, trithando o seu caminho. Assim que chegaram no vasto acampamento dos Aqueus, puxaram para terra firme a negra nau, ‘bem alto, sobre o areal, e escoraram-na bem, Os homens dispersaram-ee pelas tendas e pelos navios. (1, 431-487) a eonds 31 495 505 510 0 heréi desonrado Entretanto, sentado perto das suas répidas naus, estava irado 0 divino filho de Peleu, Aquiles de pés velozes. ‘Nem frequentava a assembleia, que dé glérin aos homens, nem 0 combate, mas ali permanecia consumindo © seu precioso tempo", com saudades do alarido e do combate. (488-492) ‘Tétis suplicante no Olimpo Mas quando, depois disto, sobreveio « duodécima aurora, 08 deuses, que duram sempre, se dirigiam todos juntos para o Olispo, com Zeus a frente, Tétis néo se esquecet, das sGplicas do filho, Ergue-se dentre as vagas marinas e cleva-se nos ares, até ao magno céu € a0 Olimpo, Encontrou 0 Crénida de vor potente sentado longe dos outros, no mais alto pinearo do escarpado Olimpo. ‘Sentou-se em frente dele; com a mio esqucrda tomousthe ‘os joethos, com a dextra tocow-the na barba, ¢ dirigiu-se, suplicante, a Zeus, filho de Cronos e senhor: “Zeus padre, se slgum dia en te servi, dentre os imortais, cm palavras ou em obras, atonde a este meu pedido: honra o meu filho, a quem coube um destino mais curto que aos outros. Acaba de o desonrar Agamémnon, principe dos homens. Arrebatow-lhe o sen prémio, privou-o dele e detém-no. Mas tu o honrarés, 6 prudente Zeus Olimpico. Dé a eupremacia aos Troianos, até que os Aqueus clever o meu filho ¢ o aereacentem em honrarias”.” Assim falou. E nada lhe disse Zeus que amontoa as nuvens, ‘mas permanecen longo tempo silencioso. Tétis, que the abracara 08 joelhos, agarrou-se a eles e de novo suplicon: “Ah! Faz-me uma promessa verdadeira, dé um sinal de anuéncia, Q) xp. @) sah ae 515. on recusa — pois nada tens a recear — para que eu saiba no certo como eu sou, dentre todos os deuses, a mais desprezada.” Muito indignado, respondeu-the Zeus que amontoa ae nuvens: “Funesta empresa é ett, se me obrigas a ter uma questo com Hera, quando vier provocar-me com palavras contundentes, 520 Esta sempre a discutir comigo, em presenga dos deuses imortais, e afirma quo en auxilio os Troianos em combate, Mas tu retira-te jé, para que Hera o no saib A-mim compete-me velar por que 0 teu desejo se cumpra. Vou acenar-te com a cabeca, para que tu me acredites. ‘este o penhor maximo da minha parte para com os imortais. Pois ndo pode alterar-se, nem enganar, nem deixar de se cumprir aquilo a que en acenar com a minha eabega.” 525, (1, 493-527) O sinal de Zeus Disse, e 0 Crénida, com as suas sobrancelhas escuras, fex 0 sinal; 0 cabelo de ambrésia do soberano agitou-se 530 sobre a sua eabeca imortal, eo vasto Olimpo tremen. (1, 528-530) Os deuses no Olimpo Tendo assim deliberado, separaram-se. Entio ela saltou do Olimpo alvinitente para o mar profundo. ¢ Zeus foi para sua casa. Todos os deuses se levantaram, am emp dor egos pretence deepal neon 535 esperar pela sus chegada, mas todos se ergueram diante dele E assim foi sentar-se no trono. Mas a Hera lio passou despercehida a promessa a Tétis de pés argéntéos, filha do vetho do mar. E loge com palaveas cortantes se dirigiu a Zeus Crénide: 38 540 “Que nova promesse fizeste ta, 6 pérfido deus? Gostas sempre de tomar decsses a ocultas de min, ‘quando ev estou longe; ¢ nunca quiseste de boa mente dizer-me os planos gue premeditavas.” Em seguida, respondeu-the o pai dos homens e dos deuses: 5A5 “Hera, nlo esperes conbecer todos os meus designios. Serte-ia penoso, apeser de minha esposa. Os que convier que conhesas, ninguém os seberé antes, nem dos deuses nem dos homens. Aqueles, porém, que eu plancer longe dos deuses, 550 no os indagues, nem me interrogues sobre ele.” ‘Em seguida, respondeu-the a venerével Hera de olhos grandes: “Crénida terrivel, que palaveas aio a8 tuas? ‘Nunca anteriormente indaguei ou te interroguei, antes podeste meditar em paz quanto queria 555. Agora, porém, tenho um receio terrével de que te tenha transviado ‘Tétis de pés argnteos, a filha do velho do mar. ‘De manhi cedo se sentou 2 teu Indo e se abragou aos teusjosthos.. ulgo que aniste com o sinal verdadeiro, athonrar Aquiles ea perder nas naus grande néimero de Aqueus.” 560 Em resposte, declarou-the Zeus que amontos as nuvens: “Es eapantosa! Estas sempre a imaginer! Nada porso encobrirte! Mas faces o que fizeres, nada conseguirés, sento afastarte mais do men coragio". Tanto pior para ti. Se assim 6 de facto, isso mesmo me aprer. 4565, Senta-teecala, obedece as minhas ordens, sob pena de nfo te valeren quantos deuses hi no Olimpo, se eu me acercar e pousar em ti as minbas teniveis mos.” ‘Assim falou, © encheu de temor Hera venerivel, de olhos grandes; cm eiléncio se sentou, reprimindo 0 seu énimo®. 510 Pelo palicio de Zeus fora, irritaramse os deutes cclestes, ‘Gomegou entio a falar-thes Hefestos,oinclto artista, para ser agradével a mie querida, Hera de alvos bragos: “Caso funesto seré este, de ndo poder saportar-se, se ambos vis discotis assim, por causa dos mortsis, ‘515 © errastas este tumulto pare o meio doe deuses! ‘Néo mais teremos prazer nos bons banquete, ee vence 0 pior partido. Oy ende Ox. 4 590 595 10 Um consetho dow a mina mie, por mais sensata que seja: procure agradar a men pai, 0 caro Zeus, ppara que ele ¢ ndo ira, nem perturbe o nosso fest. E se 0 Olimpico langador do raio quisesse derrubé-la do trono? Ele é muitissimo mais forte! ‘Vai cativi-lo com palavras brandas, «logo em seguida 0 Olimpico se nos tornaré propicio.” ‘Assim falou; pegow na taga de duas ases «coloca-a nas mios da mie, dizendo-Ihe: “Tem pacigncia, minha mie, ¢ aguente, por mais que te euste, para eu néo ver com os meus olhos bater em quem tanto estimo, pois entio no posso valer-e, por mais ait que esteja, ‘isto que édiffilresstir ao senhor do Olimpo, Bi uma ver que eu quis acudir-te ‘me agarrou pelo pée me atirou fore do limiar sagredo, Um dia intero voei; e, a0 pdr do Sol, fai cair em Lemnos. Ja pouco alenta” me restara, ‘Af 08 Sint me receberam, depois da minha queds Assim falou, ¢corrin-se Hera, 2 deusa de alvos bragos, wsorrir, ecebeu a taga das mos de seu flho le entdo, comegando pela direta, pév-se a servir aos outros deuses 1 doce néetar, que hauria no crater. Um riso inextinguivel se erguen entre todos os deuses hem- [-aventurados, 20 verem Hefestor afadigar-se pelo paicio fora. Durante todo o dia, até ao pdr do Sol, cstiveram em festa, 20 sen imo nada faltou no fstim equitatvo,, ‘nem « formosa lira, que Apolo empunhava, cas Musas, que cantavam alternadamente com a sua bela vor. Mas, quando « luz brlhante do Sol mergulhow nas aguas, foram deitar-se, cada wm para a sus moreda, ‘onde 0 ilustre Hefestos Anfigicu hevia construido ‘ume casa, com a sua arte subtil. Zeus Olimpico, langador do rai, foi para o su lito Aicostumava repouser, até vir 0 doce sono, {ise deitou, a dormir, e, junto dele, Hera do trono dourado. (1, 531-611) Woinbe 150 155 160 165 Nova invocagéo as Musas — pois vés sois deusas, estais presentes ¢ tudo eabels, ao paseo que nés 26 ouvimos o que diz a fama, e mada vimos — quaia os chefes ¢ roberanos dos Danaos. (i, 484-487) A boleza de Helena Ora junto de Priamo, Pantoo ¢ Timetes, de Lampo, de Clitio © Hicetéon, vergdntea de Ares, sentam-se dois homens sensatos, Ucalégon ¢ Antenor, nesse coneelho dos sncigos, junto das Portas Ceias, Para cles a velhice pés termo aos combates, mas sio habeis oradores, semelhantes a cigarras, que, pousadss nums arvore, soltam na floresta a sua vos delicada. Assim estavam na fortaleza os chefes dos Troianos. Quando viram Helena avangar sobre o adarve, murmuraram entre fi estas palavras alad. “Que os Troianos ¢ os Aquens de belas enémides hd tanto tempo cofram tonto por uma muther assim, ninguém pode ceasurar. Se olharmos para ela, infunde temor eua parecenca com as deusas imortaia! Mas, apesar da sua beleza, que embarque nos navios, que no a deixem aqui para castigo noseo ¢ dos noseos filhos.”" (HE, 146-160) Retrato de Agamémnon. Enquanto assim falavam, Priamo chamou Helene com 2 sua vor. “Vem para aqui, filha querids, senta-te defronte de mim, para veres o que outrora foi teu marida, os teus parentes ¢ amigos — perante mim no é% tu eulpada; culpados sio os deuses ‘que me langaram nesta guerra com os Aqueus, plena de légrimas para me dizeres o nome daquele guerreira prodigioso, 6 170 430 435 gem ete homem de armas aque, belo grande, certo que hé outros de cabega mais alta, ‘mas jamais vi com estes olhos homem tie belo, ‘nem tio majestoso. Tem todo 0 aspecto de um rei (Uti, 261-170) Ure juramento “Zeus pai, Senhor do Ida, muito alto glorioso! Halios que tudo vis ¢ tudo escutas! Rios ¢ Terral E vés que, debaixo do solo, ‘castigais os mortos que juraram falso! Sede nossas testemunhas, guardai o juramento lea.” UL, 276-280) Os dois exéreitos ‘Tal como quando, nas praias marulhantes, as vages marinhas s9 movem mas apés outras, eob o impulso do Zéfiro, primeiro se alteiam ao largo, e logo, frementes, se quebram em terra, ¢ em volta dos promontérios se arqueiam cuspindo a espuma do mar, — assim se moviam ummas apés outras as falanges dos Dinaos, para o combate, sem cessar. Cada um dos generais Ihes dava ordens, ¢ eles marchavara celados; ninguém diria ‘que soguia ali tanta gente dotada de vox em seu peito, pois mosteavam no siléncio o temor pelos chefes; em todos bbritham as armas coruscantes, que haviam revestido para a marcha. ‘Mas os Troianos — quais ovelhas no redil de homem abastedo, juntas 20s mailhares, para ee thes mungir o alvo leite, ‘ balirem sem cessar, quando ouvem a vox dos cordeiros, sim era 6 alarido que ve erguia do vasto exército troiano. E que nem todos tinham a mesma fala ou von, ‘mas misturavam-se as linguas e os guerreiros eram de muitas partes. (, 422-438) 330 335, 355 A deusa ferida em combate Diomedes persegue Cipria com o seu bronze impiedoso, sabendo-a uma deusa sem forga. Nao é daquelas divindades que presidem aos combates dos heréis, no uma Atena, ou uma Enio assoladora, Assim que a encontrou, seguin-a através da confusio, © entio ataca-a o filho do magninimo Tideu, fore-Ihe o extremo do brago sem defesa, arremeseando a lange pontiaguda. Logo a langa penetra na pele, cima do pulso, através do peplos imortal, tecido pelas préprias Gragas. Corre o divino sangue imortal, ‘oicor, que 0 que tém os deuses bem-aventurados. ois eles no comem pio, nem bebem o vinho cor de fogos, por isso no possuem sangue e se chamam imortais. (v, 380-342) Arrebatou-a da refrega fris de pés velozes como o vento, consumida pela dor. A sua pele formoss enegrecis, Encontrou depois o fogoso Ares, sentado & direita da contenda. A lange e os cavalos velozes descansavam, encostados a uma [nuvem. Cai de joethos ¢ implora instantemente o irmio querido, «que Ihe ceda os seus cavalos de freio de ouro. (¥, 353-358) O escudo mivénico Depois de assim falar, retirou-se Heitor de casco faiscante, Bate-the nos tornozelos, tanto como no pescogo, o negro eouro, que corre a toda a volta da orla do seu escudo bombeado. (V1,116-118) 38 Glauco e Diomedes Entiéo Glawco, fio de Hipéloco, ¢ o filho de Tideu 120 aproximaram-se um do outro, no campo de batatha, ansiosos por [combater. Quando estavam suficientemente perto, Diomedes, notavel pelo seu grito bélico,falou primeiro: “Quem és tu, dentre os homens mortais? ois nunea te vi na batatha que dé gléria aos homens. 125 Mas nio hé diivide que a todos excedes em coragem, tu que aguardas a pé firme a minha lange, com a sua sombra [alongada! Infelizes aqueles cujos filhos fazem face & minha célora. Mas, se acaso pertences uo niimero dos imortais, descidos do eéu, info sou cut quem combata com os deuses Id das alturas.” (VI, 119.129) A goragio humana é como as folhas das éroores Respondeu-the o ilustre filho de Hipéloco: 145 “Tidida magnanimo, porque me perguntas pela minha linhagem? Tel como a geragio das folhas, assim 6 também a dos homens. ‘As folhas, umas deita-as o vento ao chio, ¢ logo a floresta vigosa cria outras, quando surge a primaver Assim nasce uma raga de homens, e outra cessa de exist.” (VT, 144.149) ee eee rs eo ere 39 210 215 230 235 Arete» “Mandou-me para Tréia, recomendando-me com insisténcia que fosse® sempre valente” © superior aos outros, 1 fim de no envergonhar a linhagem paterna, a mais® conceituada” em Kfira e na vasta Licia”. (V1, 207-210) Deveres de hospitalidade Assim falou, ¢ regorijou-se Diomedes, notavel” pelo” seu” grito™ [batico Espetow a langa no solo ubérrimo, ¢ dirigiu-se com palavras doces aquele pastor dos povor “Ab! Mas ent tu 6s hi muito héspede da casa paternal Afastemos as langas um do outro no ardor da refregs. Hé muitos Troianos ilustres para eu matar, se 0 deus mo conceder ¢ eu 0s atingir na corrids, «© muitos so os Aqueus para tu aniquilares, se puderes; troquemos, pois, ss armas, a fim de que estes saibam ‘que nos sentimos honrados com a hospitalidade dos nossos maiores.” Depois de assim falarem, saltaram dos seus cavalos, apertaram as mios ¢ juraram lealdade. Decerto que entio Zeus Crénida tirou o senso a Glanco, le que trocou as armas com Diomedes, dando 0 oro pelo bronze, o valor de cem bois por nove apenas. (VI, 212-215; 226.236) Danone @) dpome 3) Boy dxyeabbs, 40 470 415 480 485 Despedida de Heitor ¢ Andrémaca Depois que assim falou, oilustre Heitor estendeu os bragos ao filho. Logo a crianga se voltou aos gritos, para o seio da ama de bela [eintura, assustado com 0 aspecto do seu amad pi com medo do bronze e do penacho de crinas de cavalo, que via tremer, asaustador, no slto do capacete. Desatow a rir o pai queride ea me venerivel. Logo o ilustre Heitor retirou o eapacete da eabega €0 pousou no solo, todo resplandecente. Depois que beijou 0 caro flho, © 0 embalow nos bragos, dlicigin esta proce a Zeus ¢ aos outros deuses: “Zeus ¢ demais deuses, concedei-me que este meu filbo venha a ser como eu, se dstinga entre os Troianos, ja assim forte e governe ilion com 0 sou poder. E que alguém diga: “E: bem mais valente que 0 p: quando regressar do combate. Que traga or despojos sangrentos do inimigo que abateu, para géudio de sua mie.” Dito isto, pds nos bragos da esposa ‘filhinho; ela recebeu-o no selo perfumado, centre risos ligrimas; condoeu-se 0 marido a0 vé-ls, acariciou-a,¢ dirigiu-the estas palavras, chamando-a pelo nome: “Louca, nio te aflijas assim no ten coragio! ‘Ninguém me langaré ao Hades contra as ordens do Destino! Garanto-te que nunca homem algum, bom ou mau, cscapou ao seu Desting, desde que naseeu! ‘Vai para casa tratar dos teus trabalhos, ‘tear e # roca, edi ordem as tu dle fazer 0 seu servigos a guerra dis respeito aos homens, 4 quantos nasceram em flion, ¢ « mim mais que a nenbum!” (VI, 482-493) 0 bans. @) alo (8) potpa a 0 15 20 25 Zeus protbe os deuses de intervir na uta Derramava-se pola terra toda a Aurora vestida da cor de agafrio, quando Zeus tonitruante convocou & aasembleis dos deuses, no cimo mais elevado do Olimpo de muitos piacaro Ele mesmo fez o diseurso, e 08 deuses eseutaram todos: “Ouvicme, deuses ¢ deusas todos, para eu dizer o que em meu peito ordena 0 meu coragio”, Que nem um 56 deus, nem uma s6 deusa tente infringir as minhas ordens! Temam-nas todos, 4 fim de eu eumprir mais cedo esta tarefa. ‘Aquete que eu souber que intenta afastar-se dos deuses, para ir socorrer Dingos ou Troianos, eu 0 agredirei de tal sorte que chegaré ao Olimpo em de Ou ent&o pego nele atiro-o ao Tartaro bolorento, bom longe, nas profandezas abissais, debaixo da terra. A fioam os portdes de ferro o limiar de bronze, tio abaixo do Hades, quanto o céu da terra, E entio sabereis como eu sou o mais poderoto de todos os deuses. Se quereis experimentar, 6 deuses, para que todos saibsis, ssuspendei do oéu ums corda de ouro, agarrai-vos todos a ela, deusas ¢ deuses, ois no arrastareis do céu & terra Zeus, © mais sébio de todos, por mais que vos esforceis. Mas, se quiser eu puxar com entasiaamo, arrasto-vos com a terra e com o préprio mar. Depois, atarie a corda s uma escarpa do Olimpo, ¢ tudo ficaria « flutaar nos ares. Atal ponto en estou acima dos deuses e dos homens.” (vu, 1-27) Wend 2 0 555 A balanca de Zeus Enquanto duron a Aurora ¢ ereseeu sagrado dia, dos dois Iados os dardos acertavam, e o povo sucumbia, ‘Mas ao tempo que Hélios atingiu o meio do céu, © Pai estenden a balay Colocou Ié os dois destinos” da morte que derruba as pessoas, 1 dos Troisnos domadores de cavalos e a dos Aqueus de brénzess [tinicas, pegs-the pelo meio e segura-a; inelina-se para o dia fatal dos Aqueus. O destino dos Aqueus cain para a terra eriadors, © dos Troianos ergueu-se para o vasto céu. Do alto do Ida, causou um extrondo terrivel, e mandou para o meio dos Aqueus um fulgor coruscante, Estes temeram a0 vé-lo, e apossou-se detes um terror livido, (VEIL, 66-77) Nocturno ‘Orguthosos, instalam-se para toda a noite aqueles baluartes da guerra, Para eles ardem fogueiras intimerat ‘Tal como no e6u cintilam elaras as estrelas ‘em volta da Lua resplandecente, nos dias em que no ar ni hé vento, brilham todos os cumes, os altos promont6rios © 08 vales, no céu rasgou-se 0 éter imenso, todos os astros ae véem,e alegra-te 0 pastor no seu coragao, — aseim entre as naus ¢ a corrente do Xanto . brithavam as fogueiras acesas pelos Troianos defronte de flion. Mil fogos ardiam na planicie, e junto de cada um, 4 sua lus incandescente, sentavam-se einquenta homens, De pé, junto dos earros, os cavalos mastigam a branca cevada a espelta, enquanto aguardam a chegada da Aurora de trono [formoso, (VI, 353-565) Ori. 43 190 195 O canto de Aquiles Segquem os dois 20 longo ds costa do mar marulhante, rogando com afinco ao Senor do solo, o deus que abala s terra, que thes conceda persuadir facilmente 0 espirito” altanciro do [Eécida. Chegaram as tendas ¢ as naus dos MirmidSes, ¢ encontraram-no a deleitar o seu espitito com uma lira [harmoniosa, lavrada com requinte, sobre a qual passava uma barra de prata. ‘Tinha-a tomado para si, quando arrasara a cidade de Eécion. Coa els deleitava o sew dnimo®, cantando feitos gloriosos. Em frente a ele estava sentado apenas Patroclo, em siléncio, pera atender o Bécida, quando cessasse 0 seu canto. «GX, 182-191) Recepeao da embaixada Avangaram 0 dois, sob 0 comando do divino Ulisses, © postaram-te na sus frente. Surpreso, Aquiles ergueu-se com a lira na mio, deixando o luger onde se sentara. Do mesmo modo, Pétroclo, a vista dos vardes, se ps de pé. Recebeu-os Aquiles de pés velozes, com estas palavra “Salve! Decerto vindes como amigos! Ou por algumaa grave [necessidade? ccaros dos Aqueus.” ‘Mesmo assim irritado, sois vés ambos os Der @) 66s. 4 Depois de assim falar, mandou-os entrar divine Aquiles, 200 instalou-os em leitos com tapegarias de pirpura. E logo se dirigin a Patroclo, que estava ali perto: “Prepara o maior crater, 6 filho de Menécio, faz uma mistura forte, oferece tagas a cada um, pois amigos muito queridos eo os que vieram aos meus dominio.” (@%, 192-204) “Arete” “Para isso me enviou, a fim de eu te ensinar do isto, a saber fazer discursos ¢ a praticar nobros feitos.” (IX, 442-443) Qualidades dos deuses “Mas domina, 6 Aquiles, 0 ton espirito magnanimo; nio te fica bem ter um animo indomavel. Mutaveis, até os deuses 0 sd0 —eles a quem é dada a maior valentia®, honra® e forga.” (AX, 496-498) Sper 2) nw, 170 115, 180 185, A.taga de Nestor «+ Junto uma taga belissima, trazida de casa pelo anciiio, ‘ornada de duureos pregos; quatro eram suas ases, volts de cada uma, duas pombas douradas .vam alimento; por baixo, havia dois suportes. Quando estava chein, 2 qualquer outro custaria levanticla da mesa; o velho Nestor, porém, erguia-a sem esforgo. (KI, 632-687) As ordens de Zeus Assi falou ¢ nito the desobedecen fris de pés yelozes como 0 yento. ‘Caminha pela encosta do Ida abaixo, para flion sagrada. ‘Tal como cai das nuvens a nevo ou 0 granizo gelado, ao sopro de Boreas, filho do Fter, ‘assim cortaya os ares com ardor fris veloz. Colocando-se perto, dirigin-se ao inclito deus que ebala a terra. “Venho aqui trazer-te, 6 Senor do solo, deus dos cabelos de anil, uma mensagem de Zeus, senhor da éyide, Ordena ele que cesses a contenda © a huts ribos dos deuses, ou para as ondas divinas. E se nfo cederes is ordens, e delas no curares, ameaga-te aquele deus de vir aqui, combater cara a cara, Exorta-te a fagires do seu brago, pois diz ele que te 6 superior em forga, «mais velho pelo nascimento. Mas o teu peito! nfo receia proclamar-se seu par, quando os outros todos o tememn.” Muito irvitado, respondeu-the o inclito deus que abal “Ab! Pode cle ser mito valente, mas falou com insolneia se quer dominar-me pela forca, « mim que tenko iguais honr [Nés somos tes irmios, filbos de Cronos e gerados por Rei Zeus e eu; 0 tereeiro é Hades, que governa os mortos. ‘Tudo se dividia em wrés partes, cada um tove a sus honra®. @ Fee muh, 46 190 200 495 Ce etre vee Assim, coube-me habitar para sempre o mar cinzento, depois que tirei a sorte; as trevas bolorentas sairam a Hades, 8 Zeus 0 vasto véu no éter e nas nuvens. A terra € comum a todos, bem como o enorme Olimpo. Nao vivo pois a vontade de Zeus, mas que permanesa tranquilo, apesar de poderoso, no terceiro dos lotes" E que ee ndo ponha a assustar-me com o seu brago, como ce eu fora um malvado. Melhor seria censurar com palavras terriveis as filhas e flhos, ordens & forga.” Em eoguida respondeu Ihe fris de pés veloses como vento: “E assim que eu hei-de levar a Zeus, 6 Senhor do solo, de cabelos de anil, a tua resposta, crus ¢ violenta? Ou modificaras algo? O espirito” dos valentes domavel. Sabes que as Exinias acompanham sempre os mais velhos.” que ele mesmo gerou, para escutarem (XY, 168-204) Ezortagéo a0 combate “Combatei em massa junto das naus! Aquele de vés ‘que, ferido ou atingido, reecher a morte ¢ 0 fim, que morra! Nao é vergonha morrer a lutar pela pétria, Ficam salvos de futuro a mulher e os filhos; nna casa ¢ nas terras nio se toca, quando um dia os Aqueus partirem para a pétria cara em suas naus.” (XY, 494-499) A oragiio de Aquiles Em seguida rezou de pé, no meio do recinto, derramando 0 vinho ‘eerguendo 0s olhos para o céu e no passou despercebido « Zeus [tonitruante: Wasipa 2) gpm a 235 25, “Zeus senor, de Dodo eds Pelasos, que moras Longe, tu que governas a tempestuosa Dodona! Junto habitam 08 Sclos, teosintérpretes, que no podem lavar os péae dormem no chi ‘4é ouviste a minha prece e me deste honra, atingindo duramente 0 povo dos Aquens. E agora cumpre também o men deseje. Permanccerei eu no sitio dos navios, mas mando o men compankeiro com inimeros Mirmiddes, para combater. Concede-Ihe a gléria, 6 Zeus de vox potente, fortalece-Ihe o inimo", para que reconheca Heitor se 0 nosso auxiliar sabe combater 96, ‘ou se acaso os seus bragos temiveis 186 se enraivecem, quando eu vou também para « refrega de Ares. Mas, quando ele repelir das naus a lute ¢ 0 alarido, que ele rogresse so ¢ salvo as naus velozes, ‘com as suas armas todas ¢ os companheiros aguerridos.” (XVI, 231-248) Submissao ao destino Em seguida respondeu-Ihe a venerével Hera de olhos grandes: “Crénida terrfvel, que palavras aio as tuss? Um homem, que é mortal, ha muito marcado pelo destino” que [lhe compete, ¢ tu queres libert-to da morte nefasta? Félo, mas nés, 08 outros deuses todos, nao te louvamos. Mas uma coisa te digo, e tu pondera-a no tou espirito™: se mandares Sarpédon vive para sua casa, tem euidado, nio va depois outro deus querer enviar o filho querido para longe da refrega violenta. ois muitos sto 08 filhoe de imortais que pelejam volta da grande cidadela de Priamo. A esses langarias num [terrivel ressentimento.” (XVI, 439-449) Ape. @aica, ©) spin. 48 850 5, 20 A morte de Patroclo Quase a desfelecer, disseste-Ihe ainda, 6 Pétroclo cavaleiro: “E cede para te vangloriares, Heitor; a vitéria foi Zeus Crénida e Apolo que ta deram; a eases, foi féeil dominar-me: eles meamos me tiraram as armas dos ombros. Se vinte homens como tu vieram a0 meu encontro, todos vinte pereceram, vencidos pela minha langa ‘Mas o Destino" funesto ¢ 0 fillho de Latona, e, entre os homens, Enforbo me mataram. Tu és 0 terceiro a abater-me. Ontra coisa te direi, pondera-a no teu espsrito, Nao viverds muito também; j4 de tise accreou 2 morte © 0 Destino" potente, que te fardo subjugar pelo brago ilustre de Aquiles Eécida.” A-estas palavres, envolveu-o 0 termo da morte ‘A alma" evola-se dos seus membros para a mansio do Hades, gemendo a sua sorte, ao deixar a forga da juventude. (XVI, 843-857) A suprema gléria “B agora vou-me, a0 encontro de quem me destruiu aquela [rabega amada, de Heitor. A morte, hei-de recebé-la quando Zeus © 08 outros deuses imortais quiserem que se eumpra. Na verdade, nem a forga de Hércules evitou a morte!, cle que era 0 mais caro a Zeus soberano, filho de Cronos; ‘mas subjugou-o o Destino! e a ira cruel de Hera ‘Também en, se Destino” semethante me incumbe, Hei-de jazer morto, Mas agora quero alcangar uma nobre gloria, ‘e que as Troianas ¢ Dardinidas de bela cintura, cenxugendo com ambas as miios as Kigrimas nas tenras faces, solucem profundamente, Wastpa: ®) epi. vox (9 xp. 0 125 © apercebam de quanto tempo me abstive do combate. or muito que me ames, nfo me afastes da luta: néo me convencerés.” (xvIT, 114-126) O grito de guerra de Aquiles 215 Detém-se sobre o valado, depois de passar « muralha, ‘endo se mistura com os Aqueus, pois respeita as ordens sensatas [da mie. Parou ai ¢ soltou um grito; a distincia repetiu-o Palas Atena; entre 08 Troianos surgiu logo um tumulto indizivel. ‘Tal como o som ingente da trombeta que ressoa, 220 quando os inimigos cruéis envolvem a cidade, ‘assim goou a vox ingente do Eécida. Logo que escutaram a vor terrivel de beonze, abalou-se-thes a todos 0 nimo", os cavalos de bel fazem voltar 0s seus carros; o seu nimo” antevé 56 desgracas. 225 Os coeheiros ficam aténitos, ao verem o fogo invencivel e tremendo, que fulge sobre a fronte do Pelida magnanimo. Atigara-o Atena, a dousa de olhos garcos. ‘Trés veres sobre o valado solton o seu grito ingente o divino [Aquiles; ce trés yeres se arrevearam os Troisnos ¢ os seus ilustres aliados. (XVIII, 215-229) O escudo de Aquiles Fabricon primeiro um escudo grande e forte, lavrado por todos os Iados. Poe-The uma cercadura lustrosa, 480 triplice e coruseante, com um talabarte de prata. Cinco eram as eamadas que dispés, ¢ em cada uma delas ous 485, 490 495, 510 515 520 compae lavores numerosos, com seus sitbios pensamentos. Forjou lé a terra, o eéu ¢ 0 mar, © Sol infatigavel e a Lua na plenitade, e ainda quantos astros coroam 0 eéa, as Pléiades e as Hiedes, ¢ a forca de Orion, ca Ursa, conhecida igualmente pelo nome de Carro, que gira no mesmo lugar e espreita para o Orion, © € a dnica a quem nio coube tomar banho no Oceano. Forjou também duas cidades de homens falantes, mui elas. Numa bavia bodas e festins: ao luar dos archotes, levam pela cidade as noivas saidas do tdlamo; elevam-se no ar muitos eantos nupeiain. Rodopiam os jovens na danga ¢, no meio deles, flautas e citaras erguem a sua melodia, As portas, as mulheres apreciam, deslumbradas. 0 povo juntou-se na praga piblica. Suscita-se af uma contenda: dois homens discutem a pena pela morte de outro, Garante um ao povo, com énfase, que tudo pagou, nega v outro que algo recebesse. Ambos se dirigem a um juiz, para dirimir a contenda. © povo grita u favor ora de um, ora de outro. Amos tém quem os apoie. Os arautos contim a multidéo, Os anciios sentam-se em pedras polidas, num circulo sagrado. segurando nas mos o ceptro dos arautos de bronzea voz. Com ele levantam a voz ¢ julgam cada um por sua ver Jazem no meio dois talentos de ouro, para se darem a quem, dentre eles, proferir a sentenga mais recta, Em volta da outra cidade estavam dois exércitos de homens, ‘com armas ofuscamtes. Dividia-se-thes 0 animo, se haviam de arrasar, ou de repartir tudo quanto a cidade de delicias possufa lé dentro em bens, Mas eles nio atendem a nada, e armam-se a ocultas para uma emboscada. As mulheres queridas e os fillos pequeninos, postados nas murathas, defendem-nas, ‘que a idade retém. Os homens sairam. Comanda-os Ares Palas Atena, ambos de ouro, ¢ de oure vestidos, formosos e grandes com suas armas. Como deuses que sio, istinguem-se bem; os homens sio um pouce menores. ‘Quando pois chegaram ao sitio eseolhido para a emboxcada, A beira-rio, onde se dessedentava a multidio dos gados, com elas, os velhos, 3 525, 530 535 545, 550 555, | ‘postam-e af cobertos de fulvo bronze. A distancia puseram dois vigias, pera observerem a chegada das ovelhes e dos bois de chifres recurvos. Estes surgiram em breve. Seguiam-nos dois pastores ozando 0 som da flauta, pois no euspeitavam do logro. ‘Ao vé-los, caem sobre eles, ¢, logo em seguids isolam a manada de bois, ¢ 0 rebanho formoso de alvas ovethas, e matam 0s pastores. ‘Os que estavam sentados em frente do lugar da aesombleia, ‘assim que distinguem o magno clamor junto dos bois, ‘altam logo para os cavalos ligeiros, em sua perseguicio, e-em breve chegam. Param a combater ao longo das margens do rio, « atiram uns aos outros com as langas ornadas de bronze. Acompanham-nos a Discérdia, o Tumulto ¢ o Fado! fanesto, que ora segura um feride de hé pouco, ainda vivo, ora um nio [ferido ainda, ora arrasta pelos pés um jé morto, no ardor da refrega. Pende-the dos ombros um manto purpsireo, tinto em sangue dos homens. 0 recontro é como o de mortais com vida, como tais combatem ¢ arrastam os cadaveres de ambas as partes, Forjou também uma leira macia, um campo fértil, vyasto ¢ ubérrimo, Nela, lavradores indmeros fazem andar as suas juntes num ¢ noutro sentido, E, quando dio a volta, ao chegar ao extremo do campo, acorre um homem a entregar-lhes nas mos ums taga de vinko, dirigindo-as para « meta da leira profunda. Para tras deles fica a terra negra, semelhante a que é laveada, aapesar de ser de ouro. Tal foi o prodigio que ele executou! Forjou também uma quinta régia. Ai ha ceifeiros a trabathar, com fouces agudas nas mios. 0s molhos compactos tombam no solo em fileiras, outros sio atados por homens que os ligam em feixes. Estio lé trés homens para isso; por trés, eriangas a enfeixar, ‘que trazem as paveias nos bracos ¢ as fornecem sem cessar. [No meio deles, de pé, em siléncio, sobre a leira, © rei, com o sou ceptro, regozija-se em espirito”. @) xp. 52 580 595, ‘Ao longe, o* arautos preparam a comida debaixo de um carvalho, imolam um boi enorme e arranjam-no. Entretanto, as mulheres deitam muita farinhs alva, para o jantar dos ceifeiros. Forjou ainda uma vinha bem carregada de cachos, formosa ¢ dourada. Os bagos pendentes cram negros. Segura-os de ponta a ponta com argénteos estcios Em volte estendeu um fosso excuro ¢ uma sebe de extanho. Uma 26 vereda condusia até i. Por ela seguiam 0s vindimadores, quando iam colher as uvas. Donzelas ¢ rapazes de espirito inocente ‘transportam em cestos entretecidos o fruto doce como mel. No meio deles um jovem tange a maravilha ‘uma citara harmoniosa, cantando formosa endechs com a sua vor aguda. Os outros pisam o solo a compasso, com cantos ¢ gritos, © acompanham-no saltando com os pés, Fabricou tamhém uma manada de vacas de chifres erguidos. ‘As vacas forjon-as de ouro e de estanho também. Caminham, a mugir, do estabnlo para a pastagem, ‘20 longo do rio murmurante e do canavial flexivel. Quatro boieiros de ouro movem seus passos junto das vacas, ¢ seguem-nas nove cies de patas velozes. Mas dois terriveis ledes, na primeira fila das vacae, agarvam um touro a berrar. Este muge muito alto, mas eles arrebatam-no. Os cies ¢ 0s mogos vito atrés dele. s dois dilaceraram jé a pele do touro ingente, ¢ devoram-the as entranhas ¢ o negro sangues 0s boieiros perseguem-nos, agulando os cies velores, Mas estes livram-se de morder nos ledes, apenas se colocam mui perto, a ladrar, mas fugindo-thes. Forjou sinda o inclito Anfigieu uma pastagem, ‘grande, num vale formoso, com ovethas alvinitentes, estabulos, tendas eobertas ¢ parques. Cinzelou ainda uma danga o inclito Anfigiew semelhante & que outrora, na imensa Cnossos, Dédalo organizou para Ariadna de belas trancas. ‘Ai dangavam, segurando a mo uns 80s outros, pelo pulso, ‘mogos e mogas tais que se oferecem por elas muitos bois. Elas usam vestes de pano fino, ¢ eles enfiaram ttinicas bem tecidss, que luzem brendamente, 58 605, devido ao azeite, Elas trazem dindemas formosos, cles espadas de ouro, pendentes de correias de prata, ‘Ora correm depressa, com pés bem adestrades — ‘como quando o oleiro, sentado, experimenta aroda afcigoada pelas suas mios, a ver se gira — ora correm em fila, uns atrés dos outros. Una grande multido assete em volta, deleitada com a danga graciosa. [No meio deles, cantava 0 aedo divino, tangendo a lira. | Dois acrobatas ‘andam no meio, « revolutear, ao som da musica, ‘Modelou ainda a grande forga do rio Oceano, na cereadura extrema de escudo tio bem lavrado. (XVII, 478-608) “Ate” . “Nao sou eu o culpado, ‘mas Zeus, ¢ 0 Destino’ a Erfnia que caminha na sombra, quando, na astembleia, me langaram no espirito” o desvario™ [velvagem® naguele dia em que arrebatei o presente de honra # Aquiles. “Mas que havia on de fazer? Uma divindade tudo leva a termo: 6 Ate, a filha venerdvel de Zeus, que a todos cega essa entidade funesta. Tem pés delicados, porque o solo, mas caminha sobre as cabesas dos homens, prejudicando-os ¢, ao menos a um dos dois adversérios, algems-o Them (XIX, 86.94) © Maipa ©) epi @ am, Se ee ee ee ce 15 220 130 Douses e homens Mas a Hera de alvos bracos niio passou despercebide que o filho de Anquises buscava o Pelida no tumulto guerreito. Retine os deuses todos e dirige-thes a palavea: “Vode vés em vosso expirito”, Ponéidon ¢ Atena, © caminko que lovario a8 coisas, Encias, com seu capacete de bronze fulgente, partiu de encontro ao Pelida, atirado por Febo Apolo Mas vamos, e, quanto antes, fagamo-lo voltar para trés. Ou entio que um de nés se calogue xo lado de Aquiles, the dé uma grande forga, para que o anima” the no desfalega, e saiba que o amam os melhores dentre os imortais, e que so frégeis os que hi muito defendem 08 Troianos contra 2 guerra e a carnificina. Desgamos todos do Olimpo, para estarmos preventes esta batalha, a fim de que, em meio dos Troianos, nada sofra hoje Aquiles; mais tarde suportard quanto o Destino” Ihe fioa ao naseer, quando # mie a dew a lus. Mas, se Aquiles nfo for prevenido por uma vor divina, tomar-se-é de pinico, quando ao seu encontro vier um deus, em meio da refrega; a vista de um deus é dificil de suportar.”” (KX, 12481) A “Arete” vem de Zeus “Mas Zeus acrescente ou diminui o valor® dos homens, conforme Ihe apraz, pois ele é 0 mais poderoso de todos.” (KX, 242-243) Dein 2) Od, @alox ) épech. Intervengao divina 875 Entdo acercou-se de Heitor Febo Apolo e disse-Ihe: “Heitor, nio lutes mais com Aquiles na frente de batalha, recebe-o antes no meio da multidio ¢ do fragor do combate; quando nio, ele pode atingir-te, ou dar-te com a langa.” Assim falou, e logo Heitor, receoso, mergulhou no tumulto [guerreiro, 380 quando ouviu a vos do deus que the falara. (XX, 375-380) 0 combate do fogo e da égua isso, ¢ langou-se sobre Aquiles, agitando as éguas, alto c Limpetuoso, 325 rumorejante de espuma, de sangue e de cadaveres. Ergue-se a vaga purptirea do rio caitlo do céu, prestes a derrubar o filho de Pelew. ‘Temendo por Aquiles, Hera soltou um grande grito, com medo que o grande rio de fundos redemoinhos o levasse. 830 E logo se dirige a Hefestos, seu filo. Assim falou, ¢ Hefestos preparou um incéndio violento Primeiro acendeu-se 0 fogo na planicie, queimando cadaveres ‘sem ntimero, mortos por Aquiles, que abundavam no ri 345 Toda a planura ficou seca, ¢ a égua csplendente sustou o seu curso, ‘Tal como quando o Béreas outonal seca de repente um pomar hé pouco inundado, com giudio de quem 0 cultiva, ‘= assim secou toda a planicie, queimando os eadéveres. Volta entao para o rio a sua chama plena de fulgor. 350 Ardem os olmos, salgueiros ¢ tammarindos, arde o trevo, 0 junco ¢ a galanga, gp nascet com ator junto das helas gus do io. © tormento das enguias ¢ dos outros peixes, nos redemoinhos; jaltam para todos os lados, nas belas gu ey 355, dilacerados pelo sopro do engenhoso Hefestos, A forca do rio, a arder, dirige-te 20 deus e diz-lhe: “Hefestos, no ha deus que possa rivalizar contigo, «no seria eu quem lutaria contra ti, quando o tea fogo arde assim. Cessa a contenda. Que o divino Aquiles expulse jé da cidadela 360. 08 Troianos. Que tenho eu que futar para o8 eocorrer?” (XXE, 324.330; 342-360) O combate entre os deuses 385 A contende acabrunhante abate-se entio, tremenda, zo meio dos outros deuses. O fnimo", em seu coragio”, hesita centre dois partidos. Caem uns sobre os outros, com rufdo temeroso, rretsoa # vasta terra eo eft imenso toca o clarim em volta dees. Esoutou-o Zeus, sentado no Olimpo, ¢ 0 seu eoracio® jubilose 390 riu-se, por ver os deuses entrarem em conflito (XXI, 385-390) © combate de Heitor ¢ Aquiles 90 Bra essim que, chorosos, ambos se dirigiam ao amado filho, implorando-o com insisténeia. Mas nko persuadiram 0 animo de [Heitor, ‘que aguardou que se aproximasse o ingente Aquiles. ‘Tal como a serpente da montanha, i entrada do seu buraco, {aguarda 0 homem, depois de engolir funestos venenos, uma e6lera terrivel a domina, 95 c observa com olhar temeroso, enroscada dentro do buraco, Gy omde, ® giv. 8) trop. 37 _— asim Heitor, toreado de uraa forga inextinguivel, nlo se retirava, apoiando sobre o rebordo da muralha o exeudo resplandecente, Mas cis que, irritado, se dirigiu ao sea megndnimo coragio: “Ai de mim, se me refugio nas portas e nas muralhas, Polidamante serd o primeiro a Iangar-me em rosto 0 oprébrio, le que me mandou conduair os Troianos para a cidade zo comego daquela noite funesta em que o divino Aquiles entrou [em acgio. Ea, porém, nio acedi; bem melhor teria sido, por certo. E agora, depois que pela minha insfinia deitei o povo a perder, sinto vergonha dos Troianos e das Troianas de peplos a arrastar, fovarde do que eu diner um dia forga, deitou 0 povo a perde Assim dirdo. H entio muito mais veleria para mim ‘on caminhar ao encontro de Aquiles ¢ maté-lo, ou tombar gloriosamente as suas mos, em frente da cidade. Ah! Mas se cu depusesse o meu escuda bombeado co forte capacete, se encostasse a lange & muratha, se fosse em pessoa ao encontro do inclito Aquies, prometer-The Helena e junto com ela os tesouros, todos quantos Alexandre trouxe para Tréia thas eBneavas naus — comego dos nossos dissidios —, © dé-los aos Atridas para os levarem, e, em separado, entregar aos Aqueus tudo quanto esta cidade encerra? Ese depois arrancasse aos Troianos o juramento dos anciios, de nada ocultar, mas dividir ao meio tudo, ‘quanios haveres tem li dentro a deleitosa cidade? Mas para que esta o meu coragio a discutir estes planos? ‘Temo que, se for ao seu encontro, ele néo tenha de maim piedade nem respeito, © me mate, assim inerme, 5 como se fosse uma mulher, depois de depostas as armas. ‘Mas néo sio horas de comegar, desde o carvalho ¢ a rocha, ‘com uma conversa, como a donzela ¢ 0 jovem, 4a donzela ¢ 0 jovem em conversa um com o outro. E melhor é acorrer ao desafio, o mais célere que posse. Vejamoa a qual dos dois o Olimpo outorgaré o triunfo.” Assim meditava, expectante. Mas perto dele chega Aquiles, semelhante a Enislio, guerreiro de casco faiscante: no ombro direito vibra a langa de freixo do Pétion, 38 terrivel; em sua volta relampeja o bronze semelhante ao claro 135 do fogo a arder ou do Sol que desponta. © pinico, assim que 0 percebeu, apoderou-se de Heitor; no ousou ppermanecer ali, mas deixou as portas para trés, e parte, com medo. 0 Pelida precipita-se, confiante na velocidade dos seus ‘Tal como, nas montanhas, o milhafre, © mais célere dos seres slados, 140 ai facilmente sobre s timida pombs, la foge, receose, ele aproxima-se com gritos agudos, em constante perseguigio, pois o incita 0 fimo « agareé-le — assim, cheio de ardor, cle voava direito 20 outro, e foge Heitor junto da muralha de Tréia, movendo, répido, os joethos. 145 Correram além da espia e da figueira exposta 20 ven sempre para longe da muralba, vio dar a estrada, ‘e chegam as duas fontes de belan dguas. & af que jorram ‘as duas nascentes dos redemoinhos do Escamandro. ‘De uma corre égua quente ¢ em volta um fumo 150. ve eleva, como se fosse de fogo ardente. Da outra escorre, mesmo de verio, uma linfa semelhante ao granizo, ‘ow a fria neve, ou ao gelo de agua formado. Ao lado deles, bem perto, ficam vastos lavadouros, helos, de pedra, no lugar onde vinham lavar 155. as vestes brithantes as mulheres © as filhas formosas dos Troianos — mas isto era dantes, em tempos de paz, antes que chegassem os [filhos dos Aquens. Foi por af que passaram a correr, um em fuga, o outro atrés a - Iperseguito. A frente fugia um valente, mas bem mais forte era.o que 0 perseguis, « toda s velocidade, pois nio era por uma vitima ou por um excudo {de pele de boi 160 que os dois contendiai, por um daqueles prémios que os omens [ganham com os pés, ‘mas 2 corrida era pela vida de Heitor domador de avalos ‘Tal como quando cavalos monodéctilos jé premiados ‘correm, lestos, em volta do termo da carreirs, e um grande prémio [ld est’, uma trfpode ou uma mula, quando se celebra um guerreiro morto im os dois por trés vezes andaram & volta da cidade de [Priamo ‘com os seus pés velozes, E os deuses todos olhbsvam para cles ‘Tendo assim falado, puxou da espada afiada, ‘que pendia, grande e forte, do seu flanco, investiu e atacou, tal como a aguia que voa nas alturs se langa na planura, através das negras nuvens, 310 para arrebatar um cordeiro tenro ou uma Iebre agachada im Heitor investiu, brandindo a expeda sfiada. Deu Aquiles um salto. 0 coragéo cheio de uma ira selvagem, ocultou com o belo escudo lavrado ‘o peito em frente; o capacete acenava, brilhante, 315. com quatro pontas; agitavam-ee as belas crinas de ouro, que Hefestos dispusera, compactas, em volta do penacho. ‘Tal como a estrela avanga entre as estrelas, na noite profunda, a Estrela Vésper, 0 mais belo astro que se situa no céu, —assim irradiava luz da langa pontiaguda, que Aquiles 320 brandia na mio direita, pensando na desgraca do divino Heitor, olhando para o seu belo corpo, a ver onde ficava o melhor alvo. Revestem-no todo, no mais, as belas, brénzess armas, de que despojara Pétroclo, depois que o matara. Mas via-to o lugar onde a clavicula separa das espiduas 0 colo, 325 a garganta, onde mais breve se deita a vida « perder. E ai que o divino Aquiles, ao investir contra ele, enterra a lang a ponta seguit a direito através do colo delicado. Mas a pesada langa de bronze nao cortou a traqueia, de sorte que podia trocar com ele algumas palavr: 330 Caiu no p, ¢ 0 divino Aquiles rejubilou: “Julgavas, Heitor, que, ao despojar Patroclo das armas, ficarias a salvo, sem pensares em mim, que estava longe? Louco! Mas, a distincia, um campedo bem mais forte tinha ficado nas edncavas naus, tinha ficado eu, 435 que te quebrei as forgas. A ti hao-de arrastar-te, de forma {horrenda, os cies ¢ as aves; mas a cle, os Aqueus Ihe hio-de tributar honras [finebres.” Respirando a custo, respondew-Ihe Heitor de casco faiseant “Pela tua vida, pelos teus joelhos, pelos teus pais, te implors no deixes que os cies me devorem junto das naus dos Aquets; 340 aceita bronze ¢ ouro em quantidade, o ‘9 dédivas que te oferecerem o meu pai e « minha mie venerével, ‘mas entrega o meu corpo para o levarem para casa, 4 fim de 08 Troisnos ¢ as esposas dos Troianos me darem as chamas [que sio 0 lote de um morto.” Othando-o de sobrecenho carregado, respondeu-Ihe Aquiles de pés io me impl lo eth Lae Tanto como minkefacomeu eartgin mea a relharste e a comer-te as carnes eruas, tal foi o que me fixeste, assim 6 certo que nfo havers quem afaste os cies da tua caber znem que aqui me trouxessem ¢ pesassem dez, 350 vinte vezes o teu reagate, e me prometessem mais ainda, nem mesmo que mandaste 0 teu peso em ouro Priamo Dardénida, nem assim a tus mie venerdvel te depositaré num leito para carpir aquele que ela gerou, ‘mas 08 ces ¢ as aves te repartirio todo inteiro.” 355. Ao morrer respondeu-Ihe Heitor de casco faiseante: “Ao verte, conkeg-t bem: nf ria persuade lio ha divida que um coragao de ferro é o que tens no peito. Mas penta bem, ndo véeutornarme para thn ‘causa da ira dos deuses, no dis em que Paris ¢ Febo Apolo, 360 mau grado a tua valentia, junto das Portas Geias te fizerom perecer.” 345, (XXIL, 90-166, 206-366) Admiragio pelo inimigo morto Assim falou. Tiron do cadéver a brénzea lance, ¢ pé-ln de lado. Dos ombros soltou as arm censanguentadas. Os restantes filhos dos Aqueut 370 acorreran # contemplar a estatura 6 a belez de Heitor sssesse evel (XXIT, 367-371) a 5 100 105 0 sonho de Aquiles Entretanto, tomou-o 0 sono, dissipando os cuidados do seu animo ¢ derramando-se docemente sobre ele. Muito haviam penado ‘08 seus membros ilustres, ao repelir Heitor ante 2 ventos Mar eis que surge a alma” do miserando Pétroclo, ‘em tudo semelhante a elo, na estatura, nos olhos formosos, ‘ens voz, 0 corpo envolvido nas mesmas vestes. Pousa sobre a sua cabeca e dirige-the estas palavras: “Tu dormes, e segues o teu caminko, esquecido de mim, 6 Aquiles! Nio me deacuravas em vide, mas depois que pereci. Seplta-meo male flere que poses para cu pasar we porte i Afastam-me para longe as almas”, imagens dos defuntos, ‘eno contentena que passe o rio para me juntar a elas. ‘Ando crrante pela mansio do Hades, de lurgos portées. ‘Mas dé-me 2 mio, imploro-te, pois nf tornarci a sair do Hades, quando me couberem em sorte as chamas da pira.” (XXEIL, 62-76) Sobrevivéncia no Hades ‘Tendo assim falado, estendew os bragos, mas nada agarrou. Como 0 fumo, a alia” partira para debaixo da terra, soltando um pequeno grto. Ergueu-se Aquiles de um salto baten com as mos uma na outra, e proferin estas lamentagies: “Ah! £ entio verdade que existe na mansio do Hades sit tama alana e uma imagem, que nio tem, contudo, espirito” (algun! ‘Toda a noite # alma” do miserando Patroclo esteve comigo, a gemer ea lamentar-se ¢ a fazer-me recomendagdee! Maravitha 6 a parecenga que tinha com 0 prépric!” (XXII, 99.107) Over @ opin. @ 195, 205 210 a5 220 0 ausitio dos ventas ‘Mas a pira do cadaver de Pétroclo no ce inflama. ‘Teve ento uma ideia o divino Aquiles, de pés velozes. Coloca-se longe da pira e faz uma prece aos dois Ventoa, Boreas e Zéfiro, prometende-thes sacrificios faustozos. Com ibagSes intimeras da sua taga de ouro, rogou-thes ‘que acudiaem, para os cadaveres serem em breve consumidos pelo fogo, e a lenha ve pér em chamas. Répida, frie, cescuta as preces ¢ corre com a mensegem 4 morada dos Ventos. Estavam todos juntos, em casa do tempertuoso Zéfiro, acelebrar um featim, fris corre detém-se no limiar de pedra. Assim que os seus olhos a avistam, Jevantam-se todos, © cada um chama-a para junto de si porém, recusa o lugar e exclama: “Nao quero sentar-me. Vou para as margens do Oceano, 4a terra dos Etiopes, que esto a fazer hecatombes ‘208 imortais, pois quero também tomar parte no banquete sugrado. Mas Aquiles implora a presence de Béreas ¢ de Zéfiro rumoroso. Oferece-thes sacrificios faustosos, para que comecem a fazer arder a pira, na qual jax Pitroclo, por quem solugam todos os Aqueus.” Assim falou, ¢ retirou-se. Eles levantam-se com um ruido temeroso, empurrando as nuvens na frente, Em breve atingem o pélago com seu sopro, ¢ as vagas erguem-se sob a se aragem sonora. Chegem a fértil Teéia, « precipitam-se sobre a pira. 0 fogo arde com violéncia, grande altura. Toda a noite atigaram juntos a chama da pire, com o seu sopro ululante. E toda a noite Aquiles veloz, enchendo no crater de ouro a taga de duas seas, tirava o vinho, para o derramar no solo, e humedecia 2 teres, invocando a alma!” de Pétroclo misérrimo. QOUH, 192-221) Domi 6 Vinganga cruel de Aquiles . Nao Ihe passava despereebido © romper da aurora sobre o mar e as arribas. ‘Atrela ao seu carro 08 cavalos velozes, 15 amarra Heitor & parte de trés, para o puxar. Depois de o arrastar por trés veses em volta do témulo do filho morto de Menécio, de novo repousa na tenda, deixando-o estendido no pé, com o rosto voltado para baixo.. cary, 12-18) Recepeiio a Tétis no Olimpo Encontrou Tétis numa gruta escavada, ¢ om sua volta, sentadas, a8 outras deusas marinbas reunidas. 85 No meio delae Tétis chorava # sorte do seu ilustre filho, aque havia de perecer na fértil Tebia, longe da pétria. Acereando-te dela, disse-Ihe fris de pés velozes: “Levantacte, 6 Tétis. Chama-te Zeus, 0 de planos imortais.” Respondeu-the logo Tétis, a deusa de pés argénteos: 90 “Porque me chama o deus supremo? Custa-me conviver com of imortais, pois tenho na alms” tama dor sem tréguas, rei contudo, pois nio ser vii ums ordem sus.” Depois de assim falar, a divina entre as deneas pegou num véu sombrio, nem ha veste mais escura. 95 Avanga, ¢ a frente dela, abre caminho a répida de pés velozes como o vento. Em volta, fazem alas as ondas do mar, Sobem até & margem e sio levadas para 0 cét. Encontram o Crénida de vox potente, e, em seu redor, sentavam-se juntos o¢ deuses bem-aventurados, que perduram sempre, 100 Ela tomou lugar junto de Zeus, pois Atena lho coder Hera piethe nas mios uma hela taga de ouro e snudou-a com boas palavras. Tétis bebeu por ela, ¢ entreyou-a. Entio comegou a falar o pai dos homens e dos deuses. (XXIV, 83-108) Dvn on 470 415 485 490 495, O resgate de Heitor ‘Tendo assim falado, Hermes partiu em direcgio ‘40 magno Olimpo, Priamo saltou do carro de cavalos para 0 chio, deixou ficar Ideu no lugar. Ente postou-se de guarda 2 cavalos ¢ mulas. 0 anciio caminha a dircito para a casa onde estava Aquiles, querido de Zeus. Encontrou-o em pessor ‘os companheiros sentavem-cc a distincia; dois deles apenas, o heréi Automedonte ¢ Alcimo, vergéntes de Ares, estavam a0 lado, a servi-lo. Havia poueo terminars a refeigio, 1 comida o « bebida. A mesa estava ainda em frente dete Passou-thes despercebida a entrada do magno Priamo. [Colocando-se perto, abragou-se aos jocthos de Aquiles © beijou-the as mios lerriveis, assassinas, que The mataram tantos dos seus flhos. ‘Tal como quando um desvario dominador se apodera de um {homem, que por matar alguém no seu pats chega a terra estranha, «a caca de pessoa abastada, e o expanto se apossa de quantos 0 véem, — assim Aquiles se espantou ao ver Priamo semelhante aos deuses. Espantaram-se os restantes por igual, e olharam uns para os outros. Suplicante, dirigiu-Ihe Priamo estas palavre “Lembra-te de teu pai, Aquiles semelhante aos deuses, teu pai é da minha idade, no termo da velhice funesta. Cercam-no vitinhos em volta dele, que o fatigam, ¢ nie hé ninguém para o defender do mal ¢ da desgraga. Mas ele, a0 menos, a0 ouvir que estis vivo, rregozija-se no seu coragio, « todos os dias espera ver regresear de Tréia o filho querido. A minha desgrace, porém, é completa, pois gerei filhos valentes na vasta Tréia, mas no posto afirmar que deixasse um sé deles. Cinguenta eram os que eu tinha, quando chegaram os filhos dos [Aqueus. Dezanove eram os que en poseufa, nascidos do mesmo ventre; 00 restantes conceheram-nos mulheres que havia no palicio. A tantos que eram, o impetuoso Ares thes quebrou as forgas. 0 sinieo que me restava, o que protegia a cidade ¢ os seus homens, foste tu que 9 mataste, quando Iutava pela patria: era Heitor. £ por cause dele que venho agora is naus dos Aqueus 6 505 510 515 520 525 330 535. para obter de ti o resgate, trazendo incontaveis riquezas. ‘Mas respeita os deuses, Aquiles, lembra-te do ten pai «e amerceia-te de mim. Sou sem diivida mais digno de compaixio, eu que ousci o que nenhum outro mortal ousou sobre a terra: aproximar da minha boca as mos do homem que matou © mew [filho.” Assim falou, e despertou nele 0 desejo de chorar pelo pai. Pega-The na mao ¢ afasta o ancigo com brandura, Ambos ee recordam. Um chora sem cessar por Heitor, destruiga [dos guerreieos, dobrado em frente aos pés de Aquiles; por sua ver, Aquiles chora pelo pai, out por Pétroclo. Os seus gemidos erguem-se pela casa fo Mas depoia que se saciou de lamentos 0 divino Aquile: ceese desejo abandonou 0 seu entendimento e o seu corpo, de sibito, ergueu-se da cadeira, levantou o velho pela mio, condofdo da cabega encanecida, da branea barba, ce, dirigindo-te a ele, proferin estas palavras aledas: ““Deagragado! Muitos foram os males que suportaste no teu [coragio! ‘Como ousaste vir sozinho as naus dos Aqueus, a vista do homem que te matou ‘muitos e nobres filhos? Decerto o teu coragio é de ferro! ‘Mas vamos, senta-te numa cadeira, ¢ deixemos ‘2 dor serenar no nosso peito, mau grado as nossas aflisdes. Pols de nada servem os gemidoe arrepiantes. Foi iaso 0 que os deuses decretaram para os m{seros mortais: gue vivam na afligio; eles, porém, so isentos de euidados. E que duas sio as vasilhas enterradas no solo da casa de Zeus, ‘uma que dé os maus, outra os bons presentes. Aquele a quem Zeus tonitruante der uma mistura deles, uma ver experimentard a deagraga, outra a felicidade. ‘Mas aquele a quem der a desgraga, faz dele um miserével, esse uma fome devastadora empurré-lo-& pela terra divina, andaré errante, privado de honras, quer dos deuses, quer dos [homens. Foi assim que a Peleu os deuses outorgaram dons esplendorosos, desde que nasceu: a todos os homens sobrepujava cm felicidade e riqueza; era rei dos Mirmidées, cy 545: 550 555, 565 570 «©, vendo mortal, fizeram de uma deusa sua esposa. ‘Mas o deus pée-the em cima uma desgraca, no eeu palécio no se gerou nenhum filho feito para reinar, ras deu o ser a um 26 deseendente de corta duragio; no o acompanharei na velhice, pois, bem longe da patria, estou para aqui em Tréia, para dor tua e dos teus filhos. ‘Também de ti 6 anciZo, ousimos dizer outrora que eras afortwnado. Nos confine de Lesbos, terra de Mécar, ¢ mais acima, tna Frigia e no ilimitado Helesponto, em riqueza e em filhos se dizia que eras supremo, 6 ancii Mas depois que os denses celestiais te impuseram esta desgraga, aio hé em volta da cidade sendo combates e mortandades. Coragem, nao te lamentes sem cessar no teu coragio! Nada conseguirds, a afligi-te pelo teu filho, nem o trards & vida, antes que venha sobre ti outra desdita.” Em seguida respondeu-the o velho Priamo, semelhante aos deuses: “Nao me fagas sentar numa eadeira, homem dilecto de Zeus, [enquanto Heitor jaa na tenda sem se cuidar dele. Entrega-mo quanto antes ‘que eu possa vé-lo com os meus olhos. Recebe tu um resgate imenso que te trazemos. E que possas regressar 2 casa, ¢ chegar 4B terra da tua pétria, j4 que tio pronto consentiste em poupar a minha vida ¢ deixar-me ver a luz do Sol.” Othando-o de sobrecenho carregado, reepondew-the Aquiles de [pé velozes: -venhes agora irritar-me, 6 anciao. Eu mesmo penso entregar-te Heitor, pois da parte de Zeus me chegou um mensageiro, a minha mie, que me gerou, a filha do Velho do Mar. E também reconhego, 6 Priamo, no meu espirito — néo me iludo— aque alguém dentre os deuses te guiou as naus velozes dos Aqueus. Nao havia mortal que ousasse vir, ainda que na forga da juventude, até 20 nosso acampamento: ni escaparia aos guardas, néo seria [acid remover as trancas das noseas portas Por isso, no excites agora mais o meu coragdo atormentado, aio suceda, 6 ancio, que eu te nfo consinta estar na minha tends, a despeito de seres um suplicante, ¢ infrinja os proceitos de Zeus.” ‘Assim falou; temeu o ancido, e obedeceu as suas palavras, 0 Pelida saltou, como um leo, para fora de portas, or 81s. 580 585, 625 635, io sozinho, que o seguiam também dois escudeiros, © heréi Automedonte e Alcimo, dos companheiros 08 que Aquiles mais honrava, depois do extinto Pétroclo. Desatrelam entio do jugo os cavalos ¢ as mula, trazem para dentro o arauto, pregociro do anciao, € sentam-no num lugar. Do carro bem lavrado tiram o resgate imenso pela eabega de Heitor. ‘Mas deixaram ficar dois mantos ¢ uma tiinica bem tecida, «fim de cobrir o cadaver, antes de Aquiles deixar que o levassem [para casa. ‘Chamou as servas ¢ mandou-as lavé-lo ¢ ungi-lo, depois de o ter levado para longe, para que Priamo nio visseo filho. Podia suceder que, no seu coragdo aflito, no dominesse a eétera 40 avistar o filho, ¢ que de Aquiles se excitasse 0 peito € 0 matasse, ¢ infringisse 08 preceitos de Zeus. Depois que as servas 0 lavaram ¢ ungiram com 6leo Iangaram-the em volta um belo manto ¢ uma tinics. Aqquiles em pessoa 0 soergueu ¢ 0 colocou num 08 companheiros levam-no sobre carro bem lavrado. Falou, ¢ orguou-so de stbito 0 veloz Aquiles, para degolar uma ovelha branca. Os companheiros eefolam-na ¢ preparam-na [a preceito, cortam-na com mestria ¢ atravessam-na com os expetoe, ‘ascam-na com cuidado retiram tudo do fogo. Automedonte pega no pao e distribui-o na mesa ‘em belos cestos. Aquiles, por sua vez, reparte a carne, 08 outros estendem as mios para as iguarias ali preparadas. Depois que se suciaram de bebids e de comida, {oj entdo que Priamo Dardinida se pis a admirar Aquiles, a sua estatura e beleza. Parecia um deus na frente dele! Por sua vez, Aquiles admirava Priamo Dardinide, 0 contemplar 0 seu nobre aspecto ¢ ouvir ax suas palavea Depois que se deleitaram a olhar um pars 0 outro, {oi o velho Priamo semelhante aos deuses quem primeiro falon: “Deixa-me agora repousar quanto antes, homem dilecto de Zeus, 1 fim de que, deitados, gozemos ja a dogura do sono; ois sob as minhas pélpcbras os olhoe nio sc me cerraram ainda, Cy 645, 650 655 660 665 670 desde que, as tuas mios, 0 meu filho perdeu a vida. [Nao fago sendo gemer e recozor mil sofrimentos, rolando-me no estrume no reeinto do meu pitio. 56 agora tome’ alimento e deixei passar na garganta 6 vinho ratilante; antes disso, nada engoli.” Disse; ¢ Aquiles deu ordem aos companheiros ¢ escravas de colocar no pértico 0 leito ¢ 08 belos lengéis de parpura, de estender por cima tapecarias, de pir cobertores de lé para os cobrir. Saem elas da sala, com tochas na mio, © prontamente se aprescam a estender os dois leitos. Em jeito de graca, a Priamo se dirige Aquiles de pés velozes: “Vais deitar-te lé fora, caro ancido, no suceda que um dos Aqueus do conselho chegue aqui, um daqueles que {estio sempre 8 vir sentar-se ao pé de mim para deliberar, como tém direito, Se algum desses te evistasse no decurso da breve e negra noite, logo o iria contar a Agamémmon, pastor de povos, « podia até haver demora na entrega do cadaver. Mas vamos, diz-me uma coisa e explica-te com precisi ‘quantos dias desejas para cumprir os rtos finebres do divino Heitor, para durante esse tempo eu aguardar, e reter 0 exército?” Em seguida respondeu-the o vetho Priamo semelhante aos deuses: “Sena verdade queres que eu cumpra 03 rituais fiinebres do [divin Heitor, fazendo assim, Aquiles, grande € 0 favor que me concedes. ‘Tu sabes como estamos comprimidos na cidade, que fica longe flenha, para a trazer da montana, e como os Troianos tém receio. Nove dias quereriamos lamenti-lo no palici 20 décimo sepulté-lo ¢ dar ao pove o banquete fiinebre. No undécimo erigiamos um timulo sobre ele. ‘Ao duodécimo poderemos combater, se tal for necessirio.” — Respondeu-the por sua ver 0 divino Aquiles agil de pés: “Também isto te ser concedido, 6 velho Priamo, como desejas: susterei « guerra tanto tempo quanto aquele que pretenderes. (XXIV, 468-590, 621-670) Cy 10 15 20 ODISSEIA. Proposicio e invocagio Canta-me, 6 Must, © homem fértl em expedicntes, que muito vagueou, depois que destruiu a cidadela sagrada de Tri que viu as cidades de muitos homens e conheceu o seu espirito, que padeceu, sobre as ondas, muitas dores no seu coragio, em luta pela vida e pelo regresso! dos seus companheiros Mas a estos no péde salvi-lo, a despeito dos seus esforgos. Esses pereceram pela sua prépria insensatez —loucost que foram devorar os bois eontagrados a Hipérion, © Sol! Por isso 0 deus o8 privou do dia do regresso. Sobre estes feitos, 6 deusa, fitha de Zeua, fala-nos, ‘anés também, principiando em qualquer altura. , 1-10) Comeco da narragia ‘IH entio todos os outros, que haviam eseapado A morte reinos te encontravam em eas livres da guerra e do mar 6 ele, que devejava o regress" e a sua mulher, ctavs eativo de Calipso, a ninfa venerdvel, divina entre as deusas, no reeBnoavo das aus gritas, pois almejava te-lo por exposo. Mas quando chegou o ano, no dober dos tempos, em que os deures Ihe iaraim o regreso cans, 1 Itaca, nem af eseapou is provegdes, spesar de estar entre os teu, Fodos ov deuses se smercearam, salve Postidon, tomado de uma ira sem tréguss contra © divino Ulisses, antes de ele chegat a, 1-21) veers, O homem, os deuses ¢ 0 destino Os restantes deuses ‘stavam reunidos no palicio de Zeus Olimpico, Para eles comegou a falar 0 pai dos homens e dos deuses. que lhe vinha ao espirito « lembranga do inclito Existo, 30 a quem matara o glorioso Orestes, filho de Agamémnon. Recordando-ee disso, assim falou aos Imortsis: “Ora vede! Como ot mortais acusam os deuses! Dizem que de nés thes vém as desgragas, quando sio eles ‘que por sua insensatez sofrem dores acima das que Ihes estavam [destinadas, 35 como ainda agora Bgisto excodeu o destino, desposando a mulher do Atrida, e matando-o quando regressava, E sabin que a sua morte estava iminente, pois lho predisséramos, ‘Tinhamos-the mandado Hermes, o vigilante Argeifonte, dizer-lhe que nio 0 matasse nem Ihe cortejasse a esposa, 49 pois » vinganga do Atrida surgiria por parte de Orestes, quando chegasse & juventude e sentisse a nostalgia da pitria, ‘Assim Ihe falou Hermes, mas nao persuadin o fimo” de Ezisto, apesar de Ihe dar bons conselhos: ¢ agora pagout tudo junto.” (1, 26-43) Situagéio no palécio de ftaca 245 “Quantos chefes® dominam nas ilhas, Duliquio, Samos e Zacinto cheia de florestas, ‘e quantos administram a rochosa ftace, tantos slo os que fazom a corte a minha mie ¢ arruinam esta casa. Ela nao rejeita esponsais que Ihe so odiosos, nem tem forgas 150 para por termo a situagio, enquanto eles eonsomem os meus 250 para pi ago, eng i devorando-os; em breve me hio-de dilacerar # mim.” 245-251) Deir @) dor. n 325 330 335, 345; 350 355 O canto do aedo No meio cantava o ilustre acdo, e eles, em silencio, escutavam, sentados. Cantava 0 regresso funesto dos Aqueus, que, de Tréia, thes outorgara Palas Atena. Do andar de cima, ouvin o canto inspirado afitha de fearo, a sensata Penélope. Quando a mais divina das mulheres se acercou dos pretendentes, deteve-se junto ao pilar do tecto bem construido, com os véus brilhantes sobre as faces, De cada lado, as Entio dirigin-se, com lgrimas, ao divino aedo: “mio, muitos so 0s fetos de homens e deuses que sabes, para deleite dos mortais, e que celebram os aedos. Canta-thes aqui um desses! E eles que bebam ‘em silencio. Mas cessa esse canto doloroso, ‘que sempre me dilacera o coragio no peito, 44 que sobre mim desceu uma dor sem tréguas: ‘Tais as saudades que tenho do homem «que sempre me lembra, ce cuja gloria € vasta na Hélade e no meio da Argélide.” Em resposta, declarou-Ihe o sensato Telémaco: “Minha mie, porque censurar o aedo fiel, por nos deleitar conforme o espirito 0 impele? De resto, niio sio culpados 08 aedos, mas Zeus que a cada um dos homens que buscam seu sustento deu a parte que entendeu. Nao Ihe levemos a mal que cante dos Dinaos a triste sorte. Os homens apreciam, mais que tudo, o canto que tiver mais novidade aos seus ouvidos. Coragem! Que o teu espirito ¢ o teu coragio 0 escutem! ‘Nem Ulissea foi o tnico que em Tréia perdew ‘at esperanga do regresso! Muitos outros pereceram também!" (1, 325-355) 2 210 23 Projectos de Telémaco “Eurimaco e vée outros, ilustres pretendentes, © que vou dizee nao é j4 um pedido nem um diseurso, Iéo sabem os deuses ¢ todos os Aqueous. Daicme uma nau veloz e vinte companheiros, que fagam comigo 0 trajecto todo, pois eu vou a Esparta e & arenosa Pilos, para me informar do regresso de meu pai, que hé tanto partin, 2 ver se algum mortal mo diz ou se oigo a vor de Zeus que tantas veres carreia a gléria entre o8 homens.” (11, 209-217) A edueagao de Telémaco “Mentor, como hei-de eu dirigir-me a ele? [Nio son experiente em burilar discursos. E um rapaz tem vergonba de interrogar quem é mais velho.” Respondew-Ihe entio Atona, a deusa de olhos garcos. “Telémaco, uma parte achards em teu espirito®, ‘outea, um deus hé-de sugerir-ta, Nuo foi contra a vontade dos denses — segundo julgo — que nasceste e te criaste.” (alt, 22-28) A Moira Mas a morte 6 comum a todos, ¢ nem os deuses dela podem afastar um homem, por muito que o amem, quando a Moiea funesta da morte o vier derrubar. (UI, 236.238) verre, (2) goin. B 375, 6 20 28 Os deuses amam os valentes Depois de assim falar, afastou-se Atena de olhos gargos, tomando a forma de ums dguia marinha; 0 temor apossou-se de todos os Aqueus; pasmou o ancifio de a ver com seus olhes, Pegou na mio de Telémaco, e falou, chamando-o pelo nome: “Amigo, nio ereio que jamais venhas a ser vil ou covarde, se, to novo ainda, ja os deuses te server de guia. (UL, 371-376) Um banquete no patio de Menelau Assim se banqueteavam, sob os altos tectos do vasto pal 6 viainhos ¢ amigos do ilustre Menelau Grande era o seu deleite: no meio deles cantava 0 divine aedo, companhado pela ira; dois acrobatas, dangando ao som da misicn, faziam a5 suas evolugies entre os héapedes. (IV, 15-19) O dever de hospitalidade Detiveram-se & entrada do palécio, os dois, com seus cavalos, © her6i Telémaco e o ilustre fitho de Nestor. Avistou-os ao sair © nobre Eteonex, vvassalo diligente do glorioso Menelau, Apressa-se a amuncif-lo no paldcio ao pastor de povos, , acercando-se dele, proferin estas palavras alad “Estdo ali dois ostrangeiros", Menelau vindo de Zeus, que se parecem com a raga de Zeus omaipotente. Diz tu se devemos desatrelar os seus velozes cavalos, ou 4e 05 mandamos a outra cass que queira acolhé-los bet v05 (et Give 30 35 55 Muito indignado, respondeu 0 loiro Menelau: “Dantes ndo eras insensato, Eteoneu, flho de Boeto. Mas agora o tou falar & igual ao das criangas! ‘Acato aio chegimos née aqui, depois de termos eomido muita vex 3 mesa dos outros? Que Zeus doravante nos livre dessa desgraca! Desatrela os cavalos dos héapedes™,¢, a eles, trélos aqui pare a festa.” Assim falou. Ble corren pelo palcio, para chamar ‘outros vassalos diligentes, que fossem com cle. Desatrelaram os eavatos, que suavarn com 0 jugo, prenderam-nos junto da manjedoura, ‘e deram-Ihes trigo misturado com alva cevada: ‘encostaram 06 carr0s ao muro brilhante, ‘econduziram os dois ao divino palicio, Ao vé-lo, marsvilhavam-se com a mansio do rei vindo de Zeus Como surge o brilho do Sole da Lua, assim era a palicio de altos tectos do inclito Menelan, Depois de se deleitarem com esta contemplacio, entraram para as banheiras polidas, para se lavarem. asim que as eacravas os banharam ¢ ungiram com éleo, enfiaram tinieas ¢ mantos expestos, sentaramn-se em eadeiras de espaldar, junto do Atrida Menelau. ‘Uma aia trouxe a égua, em belo gomil de ouro, sobre bacia de prata, para lavarem as mios. Junto dees colocou uma mesa polid A veneravel despenseira trouxe pio para os servir, ‘ps na mesa manjaresinimeros, regalando-os com o que ba [0 trinchante erguera as travessas de carnes de toda a espéci e servin-os, Ao lado deles colocon as tagas de ouro-] Apontando para tudo, disse-Ihes o louro Menelan: ““Tomai alimento a vontade e com prazer. E depois de terdes comida, dir-me-cis quem sis. Nao se perdeu em vés a raga progenitora, ras a vores inhagem é dos reis, vindos de Zeus, ‘ detentores do ceptro. Filhos destes, nlo os geram os vildes!” (LV, 20-64) W keivest 65 0 6 80 85 Esplendor no paldcio de Menelau ‘Assim falou e, por suas préprias mos, Ihes passou © assado de lombo de boi, que lhe fora dado como pega de honra; cles, por sua ver, serviram-se das iguarias na sua frente, Quando se saciaram de bebida e de comida, ‘Telémaco dirigiu-se ao filho de Nestor, aproximando a eabega da dele, para que of outros no ouvissem: “Repara, Nestérida, a quem tanto quero, no brilho do bronze, do oure ¢ do ambar, da prata e do marfim, que hé neste p Accorte de Zeus Olimpico é com certeza assim, de uma belezs cima das palavras: a sua vista enche-me de admiragao.” (IV, 65-75) Fortuna nao é felicidade Pereeheu esta conversa o loure Menelau, ¢, dirigindo-se a eles, disse estan palavras aladas: “Caros filhos, nenhum dentre os mortais pode rivalizar com Zeus, pois imortais so os seus palicios e havere Dos homens, quem seré ou nao seré meu émulo em fortuna? De verdade, muito sofri e muito vagueei para chegar aqui, 20 fim de sete anos, com os meus navios! Andei errante por Chipre, a Fenicia ¢ o Egipto, abordei a Etidpia, a Sidon, a Arabia e a Libia, onde nascem carneiros ja providos de chifres, trés veres no ano tém erias as ovelhas. indo hi falta de queijo, nem de carne ou de doce kite, quer se seja principe ou pastor, mas ha sempre Jeite em abundancia, que fornecem para mungir. ‘Enquanto eu vagneava por esses lugares, recolhendo muitos viveres, outrem me matava o irmi ‘is ocultas, sem se contar, pela traigo da esposa nefanda. Assim & que, sem prazer, sou senhor destas riquezas, 6 95 100 120 125 130 135 Decerto ouvistes conté-lo a vostos pais, sejam quem forem. Pois sofri muitas desgracas, e perdi o meu lar, habitado por entes queridos, cheio de preciosidades! Quem dera que eu morasse nesta casa, tendo 66 a terga parte” que fossem vivos os herdis que pereceram outrora na vasta Tréia, longe de Argos criadora de cavalos! Mas por todos eu me lamento ¢ choro, muitas vezes, sentado no palicio que é pertenga nossa!” (vy, 76.101) 0 séquito de Helena Enquanto assim hesitava no seu animo! e no seu coragiio®, surgiu, vinda do seu quarto perfumado ¢ de altos tectos, Helena, semelhante a Artemis, a densa da roca dourada. Por-lhe Adrasta uma cadeira finamente trabalhada, trouxe Alcipe uma alfombra da mais macia li, Filo, o agafate de prata, que Ihe dera Alcendra, esposa de Polibio, que morava em Tebas do Egipto, onde se amontoam mais riquezas nas casas. A Menelau oferecera ele duas banheiras de prata, duas tripods ¢ dex talentos de ouro. Por sua vez a esposa dera a Helena dédivas formosas, tuma roca de ouro ¢ um agafate de prata, com rodas, enfeitado com rebordos dourados. Era esse que trouxera, cheio do fio bem trabalhado, a sua ais Filo, que Iho pusera ao lado. Sobre cle, estava estendida a roca, com la cor da escura violet Sentou-se Helena na cadeira, com o escabelo aos pés. y, 120-136) Dacre @) gpm. (8) 665. n 170 115 180 | | 230 © poder de Menelau Em resposta declarou-the 0 louro Menelau: “Ah! Veio a minha casa o filho de um grande amigo, daquele que por minha causa se esforgou em muitas lutas. Prometi que, s¢ ele cd viense, o estimaria mais que a todos 06 Argivos, se nos garantiase 0 regresso sobre as ondas em naus velozes o Olimpico Zeus, senhor de uma vox potente. Erguia-Ihe uma cidade em Argos, edificava-lhe um palicio. ‘Tréclo-ia de ftaca com os seus bens, o flho, €0 povo inteiro. Despovoava uma cidade dessas af em redor, das que me sio submissas E assim, estando perto, podiamos conviver. Nada perturba ‘estima ¢ deleite, antes que nos envolvesse a negra névoa da morte. Mas decerto algum deus me invejou esta sorte © aquele infeliz, apenas, 0 privou do regresso a patri av, 168-182) A medicina egipcia Tal cra o remédio excelente que tinha a filha de Zeus. Dera-tho Polidamna, esposa de Ton, uma egipe Ajo solo fecundo produs abundantes mezinhas, uumas que faz bem tomar, outras muita nociv. Cada um dos médicos sabe mais que todos 08 outros, pois descendem da linhagem de Peéon. (v, 227-232) As camas dos héspedes ‘Assim disse. E a argiva Helena deu ordem as criadas de colocar leitos no atrio, pér-Ihes belos lengéis B 300 565, 625 de pirpura, e estender por cima alfombras € mantas espessas para os cobrirem. Elas safram do mégaron, com archotes nas colocaram of Ieitos, Um arauto conduziu os héspedes, © heréi Telémaco e o ilustre filho de Nestor. Ai'se deitaram, & entrada da casa (IV, 296-303) Os Campos Elisios ““A tindo te estd destinado, Meneleu, vindo de Zeus, morrer em Argos criadora de eavalos, nem encontrar o teu fim. Mas of imortais te mandargo para a Planura Elisia, no extremo da terra, onde esti o louro Radamanto. ‘Ai se oferece aos homens uma vida mais faci. Nao neva, néo hé grande invernia, nem chuva. ‘Mas as brisas do Zéfiro sopram sempre ligeiras, Vindas do Oceano, para refrescar os homens. Isto porque possuis Helena, e para eles és genro de Zeus.” 561-569) Entretenimentos dos pretendentes no paldcio de Ulisses Assim cles preparavam 0 jantar no palécio. Entretanto os pretendentes, em frente eo colar de Ulisses, divertiam-se a langar disco ¢ o dardo zo solo firme. A sua insoléneia era a mesma de sempre. Estavam Id sentados Antinoo e Eurimaco semelhantes sos deuse ram ot chefes dos pretendentes distinguiam-se pela sua valentia™. (lV, 624-629) Tapert 9 45, 50 65 0 5 Na gruta de Calipso Disse, ¢ nao the desobedeceu o mensageiro Argeifonte. Atou fogo aos pés as belas sandalias de ouro i ‘que o levaram sobre o liquido elemento ‘ea terra intérmina, como na brisa do vento. , com que enfeitiga os olhos dos homens _que quer, e depois os desperta do sono. Levando-a nas mios, levantou voo 0 possante Argeifonte, ¢, descendo pela Pereia, caiu do éter sobre 0 mar. Gorren a flor das vagas, semelhante ao alcfone, que pelos terriveis recessos do mar infecundo, & caca dos peixes, humedece nas dguas as densas asas. Assim era levado Hermes pelas ondas sem niimero. Mas logo que chegou aquela remota ilha, saiu do mar cor de violeta, ¢ caminhou pela terra, para ir & enorme grata, onde morava Ninfa de belas trangas, Encontrou-a em casa. No lar ardia uma grande fogueira. Ao longe, por toda a ilha chegava o perfume do fissil cedro e da tuia a arder. Anninfa, 1é dentro, cantava com uma bela voz ¢ trabalhava ao tear, tecendo com a langadeira de ouro. A volta da caverna crescia uma floresta frondosa, de élamos, choupos ¢ ciprestes odoriferos, Af nidificavam as aves de asas largas, corujas, milhafres ¢ aleatrazes de grandes linguas, aves que vivem no mar e nele tém seu labor. ‘Ao pé da gruta escavada, estendia-se uma vinha forte: desentranhava-se em cacho: Havia a seguir quatro fontes, que deitavam ‘gua clara, cerca umas das outras, mas em direogSes diversas. Em volta prados macios, floridos de violetas ¢ aipo. ‘Ao chegar ali, até mesmo ura imortal, quedaria a contemplé-la, deleitando 0 seu espirito”. Af oe deteve a olhar o mensageiro Argeifonte. Mas depois que tudo contemplou em seu énimo”, Dew @) Bonds. 0 A 150 315 entrou na vasta grata, Ao vé-lo ne sus frente, nfo deixou de o conbecer Calipso, divine entre ax deusas, [Nio costumam o# deusea desconhecer-se uns aos outros, nom que habitem maito Longe da casa dos imortais. (V, 43-80) Oexilado Com estas pslavras, retirou-se 0 potente Argeifonte. E a ninfa veneravel foi ter com o corajoso Ulisses, assim que ouviu s mensagem de Zeus. Eneontrou-o sentado sobre um promontéri [Niko se Ihe enxugavam os olhos de lagrimas. Consumia ‘a doce vide a suspirar pelo regresso «.. (¥, 148-153) Passava os dias sentado nas falésias da margem, [sacudido pelo pranto, pelos suspiros e dores, othando o pélago estéril, ¢ deixando cair as ligrimas. (V, 156-158) Tempestade no mar Depois que assim falou, abateu-se sobre ele, de alto a baixo, uma grande vaga, com {mpeto terrivel, fazendo virar a jangada. Ulisses foi cair longe dela, largando o leme das maos. Os ventos misturamt-se numa tremenda borrasca, quebrando o mastro pelo meio, A vela 8 ponta da verga vio cair a distancia, no mar. Longo tempo esteve Ulisses debaixo de agua, sem poder aguentar o impeto daquela vaga imensa. Faziam-Ihe peso as vestes, que The dera a divina Calipso, al Por fim emergiu, cuspin da boca a espuma amarga, ‘que lhe escorria da cabeca em abundancia. ‘Mas, mesmo assim exausto, niio se esquecen da 325 dando um salto nas ondas, apoderou-se dela e sentou-se no meio, para fagir ao termo da morte. ‘As grandes vagas levavam-na para todos os lados, ao sabor da feorrente. ‘Tal como o Béreas outonal arrasta consigo pela fone ‘08 acantos que estavam seguros uns aos outros, 330 assim of ventos 0 viravam para todos o8 lados, pelo mar fora. Uma ver era o Noto que. atirava no Breas para o levar, coutras o Euro que 0 codia ao Zéfiro para o perseguir. (V, 313-332) O sonho de Nausicaa Assim adormeceu nesse lugar o divino Ulisses, ‘que’ muito!” sofren", vencido pelo sono e pela fadiga. Entretanto Atena a0 povo e cidade dos Feaces, ‘que moraram outrora na vastidio da Hipéria, 5 perto dos Cielopes, homens insolentes, ‘que 09 saqueavam, e os superavam em forga. Seindo de ld, Nausitoo, semelhante aos deuses, os levou pat {Esquéria, onde se estabeleceram, longe dos homens que buscam seu sustento, Em volta da cidade langou uma muralha, construiu casas, 10 erigiu templos aos denses, ¢ repartin as terras. Mas eis que ele, vencido pelo destino”, caminha para o Hades. Governava entio Alcinoo, homem de pensamentos divinos. Acasa dele se dirigin Atena, # deusa de olhos gargos, reocupada com o regresso do magniinimo Ulisses. 15 Dirige-se para o télamo finamente lavrado, no qual repousava ‘a donzela de estatura c belesa semelhante & das deusas imortais, Nausicaa, a filha do magninime Aleinoo. Wrotitiag ®) ip. co 20 25 30 35 43 Perto dela, dues ais, possuidoras da beleza das Gragas, guardavam dos dois lados o limiar; fechadas estavam aa portas {potidas, ‘Tal uma brisa, acercou-se do leito, colocou-se sobre a cabeca e dirigiu-lhe a palavra, tomando # aparéncia da jovem filha de Dimas, navegante ilustre, ‘qual cra de mesma idade, ¢ por quem Na Tomando o seu aspecto, disse-Ihe Atena de olhos gargos: “Nauefeas, como pode a tua mie criar-te tio desleixada? ‘Tens para af sem cuidados a tua roups lustross, Esta proximo o teu casamento. Deves entio vestir belos trajes © proporcioné-los aqueles que forem no teu cortejo. A bos fama de tudo isto corre jé entre os homens, regoaijam-se o pai ea mie venerével. Vamos ld entio lavar ao despontar da aurora! Serei tua companheira, para andares mais depressa, pois pouco é jé o tempo que te resta pars seres virgem. Solicitam-te ja os melhores entre todos o# Feaces. E desses é também tua linhagem. ‘Vamos, antes do romper de alva, incita o teu pai ilustre amendarte aparelhar o carro e as malas, para te levarem cintos, peplos ¢ vestes brilhantes. E mesmo pare ti sera muito mais bonito ir assim do que a pé: 03 tanques ficam longe da cidade!” (v1, 1-40) 0 Olimpo Depois que assim falou, partiu Atena de olhos gargos para o Olimpo, onde se diz que fics dos deuses a eterna ¢ segura ‘masnsio: niio a abslam os ventos, nem « humedece a chuva;, nfo ee acerca dela a neve, mas um céu brihante 2e abre sem nuvens. Uma luz alvinitente se derrama por cima, Ai se deleitam todo o tempo os deuses bem-aventurados. Para Id ee retirou Atena, depois de falar a donzela. (VI, 41-47) 8 Ocupagdes dos reis dos Feaces Logo surgiu « Aurora do trono magnifico, que veio acordar Nausicaa, a dos peplos formovos. Admirada com 0 sonho que tivera, 50 atravessa o palicio, para ir conté-lo aos seus progenitores, 0 pai querido e & mie, Encontrou-os a ambos dentro de case —a mie sentada junto ao lar, com suas aias, a fiar a li cor da pirpura marinha; ao pai, encontrou-o quando ia a sair a porta, juntamente com os inclitos reis, 55. caminho do conselho, xo qual o convocavam os ilustres Feaces. (v1, 48:55) Nausicaa pede um carro a seu pai Parando junto dele, dirigin-se ao pai amado: “Papa querido, ¢ se tu me mandasses aparelhar um carro, alto e de belas rodas, para eu levar a roupa a0 rio, para lavar? Bsté para af tudo sujo. 60 E a titambém nfo te agrada, quando vais para o conselho, ‘com os primeiros do reino, sendo roupa imaculada. Cinco flhos te naseeram no palicio, dois jé casados, ¢ trés jovens florescentes. Esaes querem sempre ter roupa lavada, 65 para levarem para a dana. Tudo isso esta a men cargo.” Assim falou. Pejava-se de aludie as mépcias juvenis, diante do pai querido. Este pereebeu tudo ¢ respondeu: “Nao te recuso as mules, filha, nem nenhuma outra coisa, Vai. Os servos vao jé aparelhar-te um carro 70 alto e de belas rodas, bem equipado por cima.” (VI, 56-70) Preparativos para a partida Depois de assim falar, chamou os eseravos, que logo obedeceram. Prepararam eé fora um carro de mulas, com belas rodas, trouxeram 0s animais e atrelaram-nos a0 veiculo, A donzela trouxe dos seus aposentos as vestes brilbantes 75 ecolocou-as em cima do carro lavrado. Annie pée-lhe numa cesta a comida aprazivel ¢ variada, manjares e vinko deitado num odre de pele de cabra. Jé a donzela subira para o carro, ela ainda Ihe entregou num Iécito de ouro 0 hiimido azeite, 80 para com cle se ungir, bem como as mutheres, suas ai [Nauafeaa pegou no chicote e nas rédeas brilhantes,

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