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Roberto Mangabeira Unger DEMOCRACIA REALIZADA a alternativa progressista Borremrs EDITORIAL Copyright © 1998 by Roberto Mangabeira Unger Titulo original em inglés Democracy Realized — The Progressive Alternative Copyright © 1999 da tradugio brasileira Boitempo Editorial ‘Traducéo Carlos Graieb Marcio Grandchamp Paulo César Castanheira Tradugio do Apéndice Caio Farah Rodriguez: Edigao de texto Elzira Arantes Capa Ivana Jinkings Revisao Daniela Jinkings de Oliveira Maria Corina Rocha Maria de Fatima C. Madeira Editoragio eletronica Set-up Time Artes Grdficas Produgao grafica Sirlei Augusta Chaves Fotolitos Village Imptessio e acabamento Bartira Grafica e Editora ISBN 85.85934.42.5 "Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste livro pode ser utilizada ou reproduzida sem. expressa autorizagio da editora. BOITEMPO EDITORIAL Jinkings Editores Associados Ltda. Avenida Pompéia, 1991 ~ Perdizes Sao Paulo — SP — 05023-001 Telefax (11) 3865 6947 e 3872 6869 E-mail: boitempo @ ensino.net SUMARIO I UMA ARGUMENTACAO, 9 DIFICULDADES DO EXPERIMENTALISMO DEMOCRATICO, 11 O QUE E O EXPERIMENTALISMO DEMOCRATICO?, 13 Progresso pratico e emancipacao do individuo, 13 O experimentalismo democrdtico e as pessoas comuns: discernimento ¢ ago, 17 Inovagio institucional, 20 Falsa necessidade ¢ pluralismos alternativos, 24 Plano do livro, 29 VANGUARDAS E RETAGUARDAS, 32 A nogao de distribuigéo hierdrquica da produgio, 32 Definindo a produgao vanguardista, 34 Quatro situagées tipicas, 36 Compensar ou superar a distingdo entre vanguarda e retaguarda, 39 TRES PROJETOS PARA A REORGANIZACAO DAS EMPRESAS, 41 O projeto gerencial de renovagio industrial, 41 A solucdo social-democrata, 42 A alternativa radical-democrdtica, 46 ONEOLIBERALISMO E SEUS DESCONTENTES, 49 Definigao do neoliberalismo, 49 : Do micro ao macro; dos pafses ricos para o resto do mundo, 53 A falsa necessidade da vantagem comparativa, 56 As relagGes instaveis entre a economia ¢ a politica neoliberais, 60 A busca de alternativas ao neoliberalismo nos paises ricos, 63 A busca de alternativas ao neoliberalismo nos paises em desenvolvimento, 69 As sedes de resisténcia: os grandes paises marginalizados, 73 Rebeliéio nacional e organizagéo internacional, 73 Russia, 76 China, 88 Brasil, 93 UMA ALTERNATIVA PROGRESSISTA, 109 Dois estdgios de uma alternativa, 109 programa inicial: tributagio, poupanga e investimento, 113 Tributagito reformulada, 113 Reforma previdencidria, 120 Poupanca e produgéo, 121 O programa inicial: salétio ¢ bem-estar, 131 Politica social redistributiva ¢ inovagéo institucional, 131 A participagdo dos saldrios na renda nacional, 136 Capital livre e trabalho ndo-livre: 0 contexto internacional do compromisso de elevar a participagdo do saldrio na renda nacional, 140 Titularidades sociais e ago social, 146 O programa inicial: coordenagéo descentralizada, 149 Duas tarefas: a mobilizagdo das poupancas para investimento e a difustio das praticas vanguardistas, 149 Tlusées antiexperimentalistas, 150 Exemplos ¢ admoestagies: gouernos nacionais ¢ fazendas familiares, 152 Exemplos ¢ admoestagies: coordenagiio estratégica e Estados duros no nordeste asidtico, 153 Exemplos e admoestagies: reorganizagito industrial nos paises ricos, 156 O vanguardismo econbmico reorientado, 158 © programa inicial: da educagéo democtética & heranga social, 162 O programa avangado: redistribuigao ¢ antidualismo, 163 Os programas inicial e avangado redefinidos, 163 A proposta redistributiva, 164 O lado antidualista, 166 programa avangado: uma democracia aprofundada ¢ uma escola emancipatéria, 168 O constitucionalismo da politica acelerada, 169 Aumento da participagho politica, 172 A organizagéo independente da sociedade civil, 174 A escola, 180 O jogo triplo do experimentalismo democratico, 185 Programa e risco, 185 O risco de instabilidade: politica forte, grupos fracos, 187 O risco da falta de agio: a auséncia do agente da polttica inclusiva, 189 O risco do conflito entre a necessidade pessoal e as exigéncias da democracia: o ideal da personalidade, 193 PARA ALEM DAS INSTITUIGOES, 198 Nacionalismo ¢ mudanga institucional, 198 O politico ¢ 0 pessoal, 199 Il UM MANIFESTO, 205 A ORGANIZACAO CONSTITUCIONAL DO GOVERNO E A ESTRUTURA. LEGAL DA POLITICA ELEITORAL, 207 Primeira tese: da histéria das instituigées democrdticas, 207 Segunda tese: das estruturas constitucionais de governo, 208 Terceira tese: da reorganizacéo da politica eleitoral, 208 AORGANIZAGAO DA SOCIEDADE CIVIL EA PROTECGAO DOS DIREITOS, 210 Quarta tese: do conceito de direitos fundamentais, 210 Quinta tese: da proteg’o dos direitos fundamentais, 211 Sexta tese: da organizacao legal da sociedade civil, 211 AORGANIZACAO DAS FINANGAS PUBLICAS EDA ECONOMIA, 214 Sétima tese: das finangas ptiblicas e do sistema fiscal, 214 Oitava tese: da reforma do sistema produtivo e de sua relagéo com o Estado, 214 Nona tese: dos direitos de propriedade, 215 ADEMOCRACIA EA ESQUERDA, 217 Décima tese: do significado de ser progressista hoje em dia, 217 Décima primeira tese: da interpretacéo da causa democratica, 217 Décima segunda tese: da base social aos partidos progressistas, 218 Décima terceira tese: do foco da inovagao institucional e do conflito ideolégico no mundo, 218 UM APENDICE SOBRE POUPANCA E INVESTIMENTO, por Zhiyuan Cui, 221 I UMA ARGUMENTACAO DIFICULDADES DO EXPERIMENTALISMO DEMOCRATICO No mundo inteiro, o foco do conflito ideoldgico esté mudando. A antiga oposigao entre estatismo e privatismo, mercado ¢ dirigismo, est4 morren- do. Ela vem sendo substituida por uma rivalidade mais promissora entre formas institucionais alternativas de pluralismo econdmico, social e politi- co. A premissa bdsica desse novo conflito ¢ que as economias de mercado, as sociedades civis livres e as democracias representativas podem assumir diversas formas institucionais, com conseqiiéncias radicalmente diferentes para a sociedade. As instituigdes politicas e econémicas estabelecidas nos paises industrializados ricos representam uma pequena parcela de um espec- tro muito mais amplo de possibilidades. As disting6es existentes entre essas formas possiveis — por exemplo, a diferenga entre as instituigdes corporativas da Alemanha, do Japo e dos Estados Unidos — equivalem a instancias limitadas ¢ efémeras de variac6es potenciais muito mais amplas. No entanto, ha hoje por toda parte um sentimento de exaustio e de perplexidade na formulacao de alternativas confidveis ao programa neoliberal ea sua tpica crenga na convergéncia para um tnico sistema de institui- g6es democraticas e de mercado. Tendo abandonado compromissos esta- tistas e testemunhado o colapso dos regimes comunistas, os progressistas buscam em vao uma dire¢do mais afirmativa do que a defesa de retaguarda da social-democracia. A confusao ¢ 0 desapontamento nao se restringem a esquerda; transfor- maram-se em estigmas comuns dos que s4o politicamente conscientes. Mesmo nos Estados Unidos, pals hegeménico, que vive um momento triun- fal em suas relagdes com 0 resto do mundo, o cidadao trabalhador comum esta sujeito a se sentir um excluido irado, parte de uma maioria fragmen- tada e marginalizada, sem forgas para reformar as bases coletivas dos pro- blemas coletivos que enfrenta. Ele encontra bloqueadas as vias de mobili- dade social para si para seus filhos, em uma sociedade supostamente sem classes. Acredita que os responsdyeis pelo governo e pelos grandes negécios do pafs estio reunidos em uma conspiragdo predatéria. Desilude-se com a politica ¢ os politicos e busca uma escapatéria individual para as condigdes sociais. A intelligentsia piiblica do pals zomba da politica ideoldgica, dos proje- tos de reforma institucional em larga escala ¢ da mobilizagao politica po- pular, considerando-as roménticas e impraticdveis. Insiste na supremacia UMA ARGUMENTAGAO da andlise técnica das agdes politicas e na resolugio das questdes praticas por especialistas. No entanto, essa politica vazia de projeto e sem energia deixa de resolver os problemas préticos pelos quais renunciou as ambicdes maiores, Desliza, impotente ¢ a deriva, porque se permite degenerar em pactos episddicos, facciosos e de curto prazo, realizados contra um pano de fundo de instituigdes e concepgdes que permanecem incontestadas, ou até despercebidas. Enquanto isso, em todas as democracias industriais ricas, a comesar pelos Estados Unidos, um experimentalismo subterraneo vigoroso come- gou a mudar a produgo e o aprendizado, informando e inspirando em- presas ¢ escolas. O contraste entre a definigao ¢ a execugio de tarefas, entre empregos de supervisio e empregos executivos, se torna mais suave. Coo- pera¢’o e competi¢ao se misturam nas mesmas atividades. Nao sio mais relegadas a dominios separados. A inovaco permanente se transforma na pedra de toque do éxito; empresas bem-sucedidas precisam se parecer mais € mais com boas escolas. No entanto, esse experimentalismo no microcosmo da empresa e da escola colide no fim com os limites impostos pela esfera publica inalterada, ainda exausta e perplexa. Democracia realizada reinterpreta essa exaustéo e responde a essa per- plexidade. Cumpre a tarefa em dois passos: em primeiro lugar, por meio de uma dissertaco argumentativa; em segundo, pela enumeracio de teses que descrevem o contetido de uma possfvel alternativa. O QUE E O EXPERIMENTALISMO, DEMOCRATICO? Progresso pratico e emancipagio do individuo O conceito que inspira a argumentagao e a proposta deste livro ¢ 0 ex- perimentalismo democratico. O experimentalismo democrdtico é uma in- terpretagdo da causa democratica, o mais influente conjunto de idéias e compromissos em vigor no mundo de hoje. Ele une duas esperangas a uma pritica de pensamento de aio. A primeira esperanca de um democrata, segundo o experimentalismo democratico, é encontrar a area de coincidéncia entre as condigdes do pro- gresso pritico ¢ as exigéncias da emancipagao do individuo. Entre essas condigées e exigéncias se destacam as estruturas institucionais da socieda- de. O progresso prdtico ou material inclui o crescimento econémico e a inovacdo tecnoldgica ou médica, com apoio na descoberta cientifica. E a evo- lugdo de nossa capacidade de afastar a sujei¢Zo a escassez, 4 doenga, a fra- queza 4 ignorancia. Ea capacitagio da humanidade para agir sobre o mundo. A emancipagio do individuo se refere a libertacdo dos individuos da prisio de arraigados papéis sociais, divisdes e hierarquias, principal- mente quando esse aparato social extrai forgas de vantagens herdadas, moldando as oportunidades de vida dos individuos. Muitas das grandes doutrinas politicas e das teorias sociais evolucionistas do século 19 subscrevem a crenga otimista em uma harmonia preestabele- cida entre progresso prdtico e emancipagio do individuo. Tanto os pensa- dores liberais quanto os socialistas vislumbraram no projeto de reforma institucional que defendiam as bases necessdrias, ¢ até suficientes, para a liberdade ¢ a prosperidade. Nao podemos mais acreditar nos pressupostos funcionalistas e deterministas acerca da mudanga social que tornaram essa perspectiva inteligivel e convincente. A idéia de uma harmonia preestabelecida perdeu sua autoridade. Mui- tos, contudo, sao agora tentados a substituir esse dogma pelo dogma, igual- mente injustificavel, do conflito entre os beneficios da prosperidade e os da liberdade. Cada um deles se basearia em acordos e traria conseqiiéncias destrutivas para o outro. Mesmo aqueles que se recusam a abragar essa visdo trdgica podem sofrer sua influéncia. Eles podem reduzir a causa democrdtica a uma concepsao UMAARGUMENTAGAO, moral ¢ politica que justifica restrig6es as forgas préticas, sobre as quais a democracia nfo tem ingeréncia. Podem ver a vida econémica e o progresso tecnolégico ou cientifico como exteriores ao avango democratico, uma fonte de problemas mais que de solugées. Em sua primeira esperanga, o experimentalista democratico afirma que pode ocorrer uma intersec¢do entre as condigdes de progresso prético ¢ as de emancipacao do individuo. Um subconjunto das condigées institucio- nais de progresso prético também serve a0 propésito da emancipacao do individuo. Um subconjunto das condigdes institucionais de emancipacio do individuo também promove o objetivo do progresso pratico. O experi- mentalismo democrético quer encontrar essa zona de coincidéncia e avan- car dentro dela. O que torna plausivel essa esperanga de encontrar e utilizar a zona de coin- cidéncia? Tanto o progresso prético quanto a emancipacao do individuo dependem da capacidade de transformar o esforgo social em aprendizado coletivo e de agir sobre as ligées aprendidas, sem se deter pela necessidade de respeitar um plano preestabelecido de divisio social ¢ hierarquia, ou uma distribuigdo restritiva de papéis sociais. Tais restricdes subvertem espe- cialmente a descoberta e a invengio coletiva quando refletem prerrogativas herdadas, pois elas se impdem, como um destino cego e insuperavel, cer- ceando o empenho individual. A idéia intuitiva no cerne da conjectura acerca da posstvel coincidéncia € que tanto o experimentalismo prdtico quanto a emancipacao do indivi- duo exigem estruturas que minimizem as barreiras ao aprendizado coleti- vo. Minimizam tais barreiras ao combinar o fortalecimento da capacidade e da seguranga individuais com oportunidades mais amplas para testar novas vatiantes de associago com outras pessoas, em todos os dominios de nossa experiéncia prdtica e moral. Esse ponto de vista, por sua vez, vinculado a uma tese sobre nossa relago com as estruturas institucionais e discursivas que constru{mos e ocupa- mos. Desenvolyemos nossas faculdades e capacidades ao nos movermos dentro dessas estruturas, mas também ao resistir a elas, superd-las e revisd- las. Podemos até mesmo tornd-las mais convidativas para o exercicio e 0 fortalecimento de nossa capacidade de desafiar os limites de nossos con- textos sociais ¢ culturais. A melhor maneira de elaborar a idéia de uma afinidade entre progresso pratico e emancipagao do individuo é desenvolver nossa compreensao da estrutura interna de cada um desses dois grupos de interesse. No coragao de cada um deles jaz um conflito de exigéncias. Ao modificar e moderar esse conflito, acentuamos o alcance e a forga das capacidades humanas, aprofundando nossa experiéncia fundamental de liberdade. © QUE E EXPERIMENTALISMO DEMOCRATICO? O progresso pratico, no qual o crescimento econémico ¢ a inovacéo tecnoldgica sio as espécies mais importantes, conta para um experimenta- lista democrdtico de mais de uma forma. O crescimento econémico, com seu brago fortalecedor do desenvolvimento tecnolégico, alivia a vida hu- mana dos pesos da labuta escorchante e da debilidade. Nao podemos ser livres quando estamos fracos. A perversdéo do crescimento econémico ¢ de seus frutos comega quando tentamos compensar a escassez de bens publi- cos produzindo mais bens privados, e encontrar no consumo privado um consolo estéril para a frustragao social. Os beneficios materiais do progresso econémico e tecnolégico sao, con- tudo, apenas parte da histéria. Também nos importa abrir 0 mundo dos negécios mais completamente as experiéncias morais que tanto a demo- cracia quanto 0 experimentalismo devem utilizar. As pessoas passam gran- de parte de suas vidas no trabalho, entregues a atividades econdmicas pra- ticas. Faz diferenca se as vidas cotidianas das pessoas sio moldadas de for- ma a extrair e manter o elemento comum da democracia e do experimen- talismo. Crucial a todos os aspectos do progresso material é a relago entre coope- ragio € inovagio. Inovacao exige cooperacao. Nao obstante, toda forma real de cooperacao permanece incrustada em estruturas que geram expec- tativas estabelecidas e direitos adquiridos de diferentes grupos, uns em relagio aos outros. As pessoas em geral resistem 4 inovacdo porque temem, acertadamente, que ela ameace tais direitos e expectativas. Algumas formas de organizar a cooperacéo convidam mais que outras & inovagao. Elas baseiam a seguranga mais em qualidades individuais que em privilégios de grupo. Ao preferir ¢ desenvolver tais formas de coopera- go — no local de trabalho, em cada setor de produgao e na economia como um todo — moderamos a tensio entre a cooperagao € a inova¢ao, e as torna- mos capazes de se reforcar mutuamente. Desse modo, ‘ampliamos o alcance da inovagdo experimental na ativida~ de econémica. Alimentamos também algumas das experiéncias centrais que sustentam uma cultura democrdtica: o predominio de qualidades e capacidades individuais sobre privilégios de grupo, assim como a aptiddo para cooperar além dos limites de divisdes ¢ hierarquias sociais prees- tabelecidas, principalmente aquelas herdadas. Consideremos agora a estrutura interna da vantagem da emancipagao do individuo. O desenvolvimento da individualidade exige um fortaleci- mento cumulativo de nossos lagos praticos, cognitivos e emocionais. Tal fortalecimento, contudo, nos ameaga perpetuamente com o duplo risco da subjugagao a outras pessoas e da despersonalizagao sob o peso de papéis sociais congelados. Aprofundamos a liberdade — a forma mais basica de UMAARGUMENTAGAO dos. O resultado da mudanga das estruturas ao longo do tempo € revisar 0 contetido, bem como o contexto, dos interesses reconhecidos e dos ideais professados. Os ideais e os interesses extraem sua esséncia, em boa parte, de seu cenério institucional implicito. Ao deslocar o terreno institucional subja- cente a cles, pressionamos nossa compreensio de seu contetido. Expomos ambigiiidades de significado ¢ alternativas de desenvolvimento que jaziam ocultas ¢ invisfveis enquanto esse terreno permanecia inabalado. As estratégias conservadoras ¢ excludentes na definigao ¢ na defesa de interesses de grupo podem com freqiiéncia ser autodefensivas, mas quase sempre parecem seguras. Elas apresentam a vantagem de ser tangiveis. Em contraste, as abordagens transformadoras e soliddrias podem parecer um salto no escuro. A alegacio de que uma estratégia soliddria ¢ mais susten- tavel a longo prazo pode normalmente se revelar insuficiente para superar a forca do imediatismo de que desfruta a estratégia excludente. E por isso que 0 argumento favoravel a um projeto transformador e solidario precisa de ajuda adicional. © elemento visiondrio na politica proporciona tal ajuda. A insinuagéo de um mundo diferente, em que nos tornariamos pessoas (ligeiramente) diferentes, com compreensdes de nossos interesses € ideais (ligeiramente) revi- sadas, suplementa o apelo frio a interesses de grupo ¢ a convicgdes bem conhecidas. Assim, na politica transformadora devemos falar nas duas lin- guas, de célculo de interesses ¢ de profecia politica. A disponibilidade de modos solidérios ¢ transformadores de defesa de interesses reconhecidos e de ideais professados é a premissa bdsica que jus- tifica a segunda esperanga do democrata. Correspondéncia ¢ assimetria complementam o dualismo, como caracteristicas da agio, na compreensao da mudanga social da qual depende o experimentalismo democratico. De acordo com a tese da correspondéncia, aliangas ¢ antagonismos en- tre grupos s4o sempre apenas 0 outro lado de um conjunto de estruturas institucionais e de uma seqiiéncia de reformas institucionais. A possibili- dade de que uma determinada alianga entre grupos sociais possa ser de- senvolvida e sustentada ao longo do tempo depende da existéncia de uma circunstancia institucional, ou de uma trajetéria de reforma institucional, que torne posstvel a convergéncia de interesses ¢ ideais dos grupos participan- tes. Quanto mais amplo o programa de reforma, mais estreita e mais eviden- te se torna a ligacdo entre a légica de aliangas ¢ a diregao da mudanga insti- tucional. Por exemplo, se faz ou nao sentido para os trabalhadores organizados na indiistria intensiva de capital se aliar aos trabalhadores tempordrios e ter- ceirizados, depende da existéncia de um projeto de reforma institucional ¢

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