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Coordenagto Editorial da Biblioteca Basica de Servigo Social Blisabete Borgianni Conselho editorial da Area de Serica Social Ademir Alves da Silva Dilséa Adeodata Bonetti Maria Liicia Carvalho da Silva Maria Liicia Silva Barroco Dados Intemacionais de Catalogacao na Publicagao (CIP) (Camara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Netto, José Paulo Economia politica : uma introducio critica / José Paulo Netto e Marcelo Braz. — So Paulo : Corte, 2006, (Biblioteca bésica de servigos social : v. 1) Bibliografia, ISBN 85-240-1258-8 |. Beonomia I, Braz, Marcelo. Il Titulo. Il Série. 06-6539 cpp-330 Indices para catdlogo sistemético: 1, Cigncias econémicas 330 2 Beonomia 330 3. conomia politica 330 ECONOMIA POLITICA: uma introducao critica BIBLIOTECA BASICA DE SERVICO SOCIAL VOLUME 1 10 nosso lado, falando com “a vor da experiéncia”, a espantar as nossas vidas, dizendo-nos que sempre foi assim. Nao, nem sempre foi assim — de fato, est sendo assim aproximada- Inente apenas nos tiltimos trezentos anos (e se 6 nosso leitor hesitar quanto esse apes, basta que volte as paginas anteriores). Neste capitulo, nosso objetivo ¢ oferecer alguns elementos te6ricos e hist6ricos para a compreen- iho la historicidade do que parece to “natural”. 3.1. Mercadoria e produgao mercantil Produc¢ao de mercadorias e modo de producao canitalista ‘Comecemos por caracterizar a merendoria: ela € um objeto externo a0 homem, algo que, pelas suas propriedades, satisfaz uma necessidade hu- ‘mana qualquer, material ou espiritual — a sua utilidade, determinada pe- ns suas propriedades, faz dela um valor de uso O intercambio entre a sociedade ¢ a natureza, que mencionamos a0 dar o trabalho (Capitulo 1), resulta na produgao de bens que sao valo- tes de uso, Sem esse intercéimbio (ou seja: sem o trabalho de que resulta a produgio de valores de uso), a sociedade nao pode se manter; em resumi: das contas, a existéncia da sociedade sempre depend da producio de valo- res de uso, Na medida em que é valor de uso, a mercadoria € produto do trabalho — mas nem tudo que possui onlor de uso resultante de trabalho & merca- Moria Nejamos por que Em primeiro lugar, porque s6 constituem mercadorias aqueles valo- res de uso que podem ser repradizidas, isto & produzidos mais de uma vez, repetidamente. O exemplo fornecido por dois especialistas & suficiente para esclarecer esse aspecto: “A Giaconda, enquanto tal, é um produto; as repro- dudes da Gioconda, que nao sao a propria Gioconda, constituem mercado- rias porque so reprodutiveis” (Salama e Valier, 1975: 7). Em segundo lu- a, porque a mercadoria é um valor de uso que se prodicz para a troca, para @ ‘xn; 08 valores de uso produzidos para 0 autoconsumo do produtor (0) mével que um marceneiro fabrica para uso em sua prépria casa) no si mercadorias — somente valores de uso que satisfacam necessidades s0- “A rie as soci i ‘es Seciedades em que domina 0 modo de producio ca- Pata aparece como uma imensa colesao de mercadorias, $a Individual como sun forma lementar" (Mare 198s Pn seen do por tales gutta O capita, descreve algo que ¢ sobejamente conhece i caueles que, como nés (autores ¢ leitores deste livzo) vivem 'ncia o modo de produgo capitalista, uma experiéncia cotidiana; eis af “a relagto mais sna 8 compra ea inunee ened mais simples, corriqueira, fundamental, massa sdsa, *Parames mil e uma vezes” (Lénin, apud Nikitin, venda, oon si Dinheiro —> Outra Mercadoria) © produtor, portanto, nao tinha na posse do dinheiro 0 seu objetivo central: 0 dinheiro Ihe servia exclusivamente como meio de ti di nheiro funciona aqui imples i 1a aqui como simples intermediagdo entre mer - e readorias di- ' tes, E, na escala de um mercado local, a cireulagéo das mercadorias ra restrita: ela passava quase diretamente das maos do produtor as do consumidor. pregos baixos e vender a pregos mais all egos mais altos. Freqtientemente combi p nando a compra e a venda com a pirataria e os saques, comecaram a acumular gran- des lucros —a base do seu capital comercial (ou capital de comeércio de merca- dorias que, junto cor it 7 1m © capital de comércio de dinkeiro, constitui 0 capi iro, © capital aca De fato, a circulagéo mercantil se modifica com a ieee en los comerciantes; com eles, 0 esquema original se toma distinto: D—+M— D> (Dinheiro — Mercadoria —> Dinheiro acrescido) Note-se que eles nao partici ss ndo participavam das atividades produtivas seja nas cts a Se aa are te nen bens de apc ete ses pas (Os seus ganhos (isto é, ucros) fundavam-se iferenga entre 0 que pagavam e o que recebi tusacona fou fmt a, ent feng pate € representa ForD?) Reconexs como vinosno pila antein qu fra gue ia tera origem entre os grupos mercantis cujas for memente nos séculos XV e XVI. Ps foranes cesta enon De outro lado, alteraram-se as condi prod , se as condi tre lor Procexavis una dfennais ene oar ue mi “lay ia produgao mercantil simp {fabalho © a propriedade privada {yercantil capitalista essa propri a ‘9 capitalista rabalha — cle compra a forga de traballo que, que the pertencem, wiv esa forga de trabalho que pode ser comprada e vendida. oy mai fexatamente, veremos como vevteaoria, Por agora, o que importa sublinhar € que a prosucso mest {capitalist &diferenca da producto mercanti simples, assent Tt explo- agi da forca de trabalho, que jganhos (lucros) do capitalista, tthe provém da circulagaox sua origem esti na explo do ‘rubato de no interior do processo de produgao de pelo capitalista. Com a demanda de mercadorias aumentada e com a expansio d ‘emprego do dinheiro, foram i Bes gernis que empnege docile iran #6 medion x5 condigdes gerais que contextulizavam a produsie ‘mercantil simples. A ampliagao das ativida- . ais e a constituigao de mercados cada vez maiores e afastad alterou aquele quadro, De um lado, os comerciantes se introduzem entre a Produ coe leristicas individuais, os capitalistas, assim como os proletérios, apresen- tam-se numa infinita gradacio — das personalidades generosas as figuras mais canalhas. Igualmente, é preciso deixar de lado toda a ideologia que lenta revestir com um verniz. moralizador a acdo das empresas capitalistas; essa ideologia (atualmente resumida nos motes “empresa cidada”, “em= presa com responsabilidad social” etc:) pretend ocultar o objetivo central dle todo e qualquer empreendimento capitalista: a caga aos lucros. Para niio hos alongarmos: capitalistas e empresas capitalistas s6 existem, e s6 podem cexistr, se tiverem no lucro a sua razao de ser; um capitalista e uma empresa copitalista que ndo se empenharem prioritéria e sistematicamente na ob- tengo de lucros serao liquidados. Retornemos, porém, a formula D -* M ~> D’(desdobraremos inteira- mente esta formula no Capitulo 4, item 47.) Se o leitor bem se recorda, no Capitulo 3, quando ela the foi apresentada, nés nao a distinguimos apenas dla {6rmula propria a circulagao simples de mercadorias (M — D — M); também a diferenciamos da frmula D > M — Dé (dinheiro/mercadoriajd- ikeiro acrescide), que expressa a intervencao do capital comercial (mercan= lil) na circulacéo das mercadorias. Naquela altura, dissemos que o capital omercia! encontra em D* dinheiro e lucro; contudo, enfatizamos que © ucto obtido pelo comerciante nao derivava de qualquer acréscimo de var Jor, mas, téo-somente, da diferenca entre o prego que pagava pela mercado= fa o preco pelo qual a vendia, Ora, a0 capitalista interessa, assim como a0 ‘comerciante, o lucro, O Iuero do capitalista, porém, nao se deve a diferen= {ils entre pregos de compra e precos de venda, ocorrentes na esfera da elt lagi: o Lucro do capitaliste provém de processos ocorrentes na esfera da prod (Wo, provém de um acréscime de valor, cristalizado em MY e realizado quando o capitalista obtém D, Aqui, de fato, esta contido o Iuero do eapl- {alista, mas D’ possui uma natureza inteiramente distinta de D': em sD! 9e onoretizn a forma tipicn que o excedente econdmico adquire no MPC — excedens 4 Bivklentemente, na socledade capitalist tamim se obtém lucros comprand bara # ‘yor caro — mas este no 6 @ procenso expeciive que asegure om gabon do capital serosmaz te apropriado pelo capitalista, fonte de seu lucto e que se denomina mais- valia (m). 4.2. A producao capitalista: produgao de mais-valia Na formula D —M — D*, D ¢ capital sob a forma dinheiro. O dinhei- zo, em si mesmo, nao é capital; ele se converte em capital apenas quando compra forga de trabalho e outras mercadorias para produzir novas merca- dorias (novos valores de uso e de troca) que serdo vendidas por mais dinheiro. Vé-se, pois, que o capital ndo é uma coisa ou um conjunto de objetos — cle s6 existe na medida em que subordina a forca de trabalho; de fato, 0 capital, mesmo que se expresse através de coisas (dinheiro, objetos, mercadorias etc), 6 sempre uma relagio social. E com D (capital sob a forma dinheiro) que se inicia a produgio capi- talista. Seu possuidor, o capitalista (que pode ser um sujeito individual/ uma pessoa ou coletive/uma sociedade constituida por varias pessoas), compra M, isto é, um conjunto de mercadorias, para dat curso a um pro cesso de produsdo (P) que se conclui quando esté pronta a mercadoria que © capitalista pretende vender (M’); quando essa mercadoria é vendida (di- em 0s economistas: quando ela se realize), o capitalista obtém D'(recupera © dinheiro que investiu, acrescido da mais-valia). Vejamos a natureza das ‘mercadorias (M) que o capitalista adquire, partindo da hipstese segundo a qual o capitalista as paga segundo o seu valor. Com uma parte de D, 0 capitalista adquire (compra e/ou aluga) insta- lagdes, méquinas, instrumentos, matérias (brutas ou primas) e insumos (energia, combustivel etc.), ou seja, o capitalista investe naquilo que deno- minamos meios de produgdo. No processo de producéo, 0 meios de produ- ‘ao ndo criam novos valores, apenas tém transferido 0 seu valor A mercado- ria que esté sendo produzida;' por exemplo: na produgao de automéveis, 08 meios de producao utilizados (maquinas, ago, borracha ete.) tém transfe. Fido 0 seu valor ao valor do automével — se uma maquina tem a vida «til de dez anos, a cada ano ela transfere um décimo do sett valor ao valor dos 4.Os metos de produgao que ocapitalista compro, tim 0 seu valor também suibmitido fe du wor: avaliamseseyundo o trabalho soialmente neces que exigiram pa +a pra Nels. trabalho tests realizado; por io, ite que canstituem tubo mrt, 0 cova rourcx uanmanuchocica - carros.’ Ou seja: no curso do processo de producao, 0 valor dos meios de produto nao se altera (0 que perdeim no desgaste reaparece na mercadoria produzida); por isso, a parte do capital (D) que ¢ investida neles constitu capital constante (c). Com a outra parte de D, o capitalista compra a mercadoria sem a qual de produgio sio imiteis: compra a forca de trabalho dos operiios (proletirios). Do ponto de vista do capitalista, essa compra identifica-se & anterior (ou seja: & compra das outras mercadorias de que necessita para implementar o processo de producao), porque em ambos os casos se trata, aos olhos do possuidor do capital, de uma despesa (um “custo” igual a ‘outro qualquer). Essa identificagao, que atende aos interesses do capitalise ta," oculta um elemento essencial: 0 fato de a mercadoria forga de trabalho constituir uma mercadoria especial. A peculiaridade da mercadoria forga de trabatho precisa ser sublinhada para que se possa compreender 0 segredo dla produgao capitalista — por isso, convidamos o leitor a nos seguir com calma, passo a passo, nesse caminho complexo. As outras mercadorias que o capitalista comprou, ele as adquiriu pelo seu valor, pagando por elas um dado preco. Ja sabemos que: 1") 0 valor laguelas mercadorias foi determinado pelo tempo de trabalho socialmente necessério para produzi-las; e, 2") 0 seu valor nao variard no processo de produgdo: ele apenas sera transferido mercadoria a ser produzida (recor de-se a méquina e 0 ago empregados na producto do automével). Vejamos ‘agora o que se passa quando o capitalista compra a mercadoria forca de trabalho e a utiliza para implementar o processo de produca © prego que ele pagard por ela — precisamente o salirio — também correspondera ao seu valor. Como se determina o valor dessa mercadoria? Do mesmo modo como se determina 0 valor das outras mercadorias: le> vanclo em conta 0 tempo de trabalho socialmente necessario & sua produ: 0, © que significa dizer que o talor da forga de trabalho & determinado pelo 5. Essa transferéncia de valor 6 & posivel pela intervencao da forge de trabalho, 6. Acontabilidade capitalistadistingue o “capital xo” Ginstalagies, maquina nstranien- on) 0 “capital ciculante™(matrias-primas, matérasauxilanes, combustives e forga de tral, que capitalists chama de “mao-

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