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LETRAS COLONIAIS E HISTORIOGRAFIA LITERARIA Joao Adolfo Hansen Resumo: O texto trata da histéria das letras luso-brasileiras dos séculos XVI, XVII e XVIII. Propde a arqueologia de suas catego- rias retéricas e teolégico-politicas para evitar a desistoricizagao pés-moderna e os anacronismos das histérias literdrias fundadas no continuo temporal iluminista ¢ roméntico. Pacaveas-chave: Histéria literdria, retérica, teologia, cédigo biblio- grafico O que vou lhes dizer aqui nao € novo, pois retomo coisas que ja fiz, falei e escrevi sobre as letras luso-brasileiras dos sécu- los XVI, XVII e XVIII € a historiografia literaria. Muitas dessas coisas aprendi com o trabalho e a amizade generosa de Luiz Cos- ta Lima, Leon Kossovitch e Alcir Pécora. Falando muito generi- camente, sabemos que, desde os gregos até a segunda metade do século XVIII, 0 discurso da historia foi um repertério de topicas epiditicas cuja verdade de magistra vitae era reescrita intermi- navelmente como a combinatéria de um comentario verossimil. As apropriagées cristas dessa histéria epiditica deram-lhe sentido providencialista, incluindo a histéria como uma figura do tempo definido como ente criado, efeito e signo da unica Causa e Coisa absolutamente auténtica, Deus. O esquecimento dessa historia providencialista se tornou natural a partir da segunda metade do século XVIII, quando o tempo se tornou apenas quantitativo ou contingente e, perdendo sua qualidade substancial ou participativa anterior, foi subordinado 4 histéria, como diz Kant em sua Antro- pologia, como objeto de um célculo apenas humano que passou a 14 Jo&o AvoLFo HANSEN orientar seu sentido como evolugiio, consciéncia e progresso. Assim, as histérias escritas no século XIX pressupdem o conti- nuo evolutivo e a classificagio dedutiva de épocas, periodos ¢ estilos artisticos por meio de unidades sucessivas e irreversiveis que avancam de maneira ou cumulativa ou dialética, como acon- tece em nossas historias da arte e historias literarias, como Idade Média, Renascimento, Maneirismo, Barroco, Neoclassicismo etc. Leon Kossovitch demonstrou, em um ensaio publicado recen- temente pelo Museu do Louvre, que nessas historias a descontinuidade tem o pape! fundamental de delimitacao dos pe- riodos e dos estilos artisticos que se sucedem no tempo posto kantianamente como seu a priori. A descontinuidade assegura a positividade da existéncia das unidades estanques ¢ irreversiveis aplicadas como taxonomia ou classificagao dedutiva. A propria descontinuidade 6, contudo, como que transparente e nao pensa- da, pois é aplicada como nogao simplesmente instrumental, como se fosse exterior a propria histéria. Segundo essa concepgao do idealismo alemao, que até agora é mantida na maioria dos estu- dos histéricos brasileiros de artes ¢ letras, os estilos artisticos so invariantes dedutivas que se realizam em ocorréncias positivas ou obras particulares que os exemplificam. Assim, em sua suces- so, eles evoluem sem que a propria descontinuidade que os deli- mita seja pensada. Como Kossovitch demonstra, a descontinuidade é, em todos os casos, o principio de alternancia que garante 0 retorno sucessivo de um estilo depois do outro, como ocorre exem- plarmente na oposigaio de cléssico/barroco de Heinrich Wl fflin ou na oposigao de vontades expressivas ligadas 4 abstragao © & empatia de Worringer. Como demonstra Kossovitch, essa oposi- cio dos estilos ou das vontades no considera as diferengas his- toricas, pois é justamente a historicidade que impede o retorno das formas estilisticas. Esse mesmo a priori da descontinuidade aplicado nas his- torias literdrias e da arte caudatarias da historiografia evolucionista ou teleolégica do século XIX se encontra como neokantismo em LETRAS COLONIAIS E HISTORIOGRAFIA LITERARIA 15, uma historia muitissimo influente que as destréi, a historia arque- oldgica da loucura ou a historia genealdgica da verdade de Michel Foucault, que funda os discursos nao mais sobre o continuo, mas sobre a propria descontinuidade. Como sabemos, Foucault elimi- na as positividades e também as idealidades, sejam elas subjeti- vas, factuais ou estilisticas, da historiografia do continuo e da consciéncia. Com a eliminagao, somos remetido’s a um fundo ina- cessivel, uma nao-origem como an-arkhé ou nao-principio, cuja eficacia decorre justamente de que, como fundo, é suposta como invisivel, indizivel ¢ impensavel. Com Foucault — e continuo fa- lando com Kossovitch — a descontinuidade é estabelecida por condigées de possibilidade formalmente puras, que sio as da lin- guagem em sua definigdo estruturalista como estrutura que se pensa a si mesma nos homens. Uma histdria de tipo neokantiano como ade Foucault, demonstra Kossovitch, nao pode traduzir-se sendo como histéria de obras arqueologicamente puras que exclui © impuro, ou seja, os dominios contingentes das obras e de suas praticas produtivas e consumidoras, onde uma multiplicidade intotalizavel de escolhas taticas e vias artisticas em que cocxis- tem temporalidades heterogéneas aparece executada sem nenhuma consideragao por condigdes puras. Quando se trata de categorias puras, tanto em Foucault como nas histérias teleoldgicas, a redu- gAo classificatoria dos periodos histéricos e seus estilos artisticos se impde a priori, como no caso da oposigao de classico € barroco corrente nas histérias literdrias brasileiras que se ocu- pam das letras coloniais. Outras possibilidades de historia da arte, que pressupd6em sua radical impureza contingente, sio propostas por Kossovitch. Elas passam ao lado do continuo evolutivo do século XIX e tam- bem da descontinuidade nao-explicitada de Foucault, pensando 0 tempo e 0 espago de um modo que aproxima a operagiio das ope- ragdes de Nietzsche, Freud e Marx, que nao o pressupdem kantianamente como a priori, nem fundam a diferenga num fun- do impensavel, mas remetem a historicidade da historia a materialidade contingente dos processos produtivos, cuja considerag’io 18 JoAo Avotro Hansen Como resultado, foi possivel propor que as imagens dessa poesia nao sao realistas, como a critica brasileira ainda afirma, pois a sdtira € inyentada retoricamente: nao imita a empiria nem reflete nenhuma infraestrutura, mas encontra a realidade de seu tempo como pratica discursiva também real, que aplica tépicas, verossimilhangas e decoros partilhados assimetricamente por su- jeitos de enunciagao, destinatarios textuais e ptiblicos empiricos. Para falar com Chartier, ela figura a compatibilidade entre as interpretagdes feitas pelos personagens satiricos em ato e os atos de interpretagaio das recepodes empiricas diferenciadas, que conferem valor ¢ sentido a representacao!. Assim, quando cruzei a satira com as dentincias que se seguiram 4 visita do Santo Ofi- cio da Inquisig4o 4 Bahia no inicio do século XVII e alguns manu- ais inquisitoriais, como o de Eymerich e Pefia, 0 Manual dos Inquisidores, além do Malleus maleficarum e mais instrumentos do terror catélico, foi possivel constituir modelos e preceitos seiscentistas de uma tecnologia catdlica de controle do corpo e producao da alma e, com eles, propor que o discurso ficcional da satira é homélogo das praticas inquisitoriais de dentincia ¢ confis- sio. Tanto as satiras quanto as deniincias se fundamentam no Direito Canénico, encenando publicamente para um destinatério textual e ptiblicos empiricos diferenciados a presenga da luz natu- ral da Graga inata nas instituigSes portuguesas. Para isso, mobi- lizam distingdes como legal, legitimo, eterno, natural, positivo, puro, impuro, catélico, herege, gentio, metaforizando-as por meio das técnicas retoricas de uma racionalidade nao-psicoldgi- ca, a do conceito engenhoso ou agudeza, em que a defesa da hierarquia é nuclear. Fiz o trabalho sobre Gregorio tentando passar ao lado da critica brasileira que define os estilos das representagdes coloni- ais dos séculos XVI, XVII e¢ XVIII por meio das unidades crono- légicas fechadas e irreversiveis de que falei, “Classicismo”, “Barroco”, “Neoclassicismo”. Quando estudei as ruinas do século XVII nos arquivos, ficou evidente pelo menos para mim que essas unidades s%o dedutivas e aprioristicas, ou seja, idealistas. Quando LETRAS COLONIAIS E HISTORIOGRAFIA LITERARIA 19. fiz o trabalho, ainda usei a categoria “Barroco”, coisa que hoje acho totalmente desnecessaria, pois s6 produz equivocos de in- terpretagio. No caso da tradigdo colonial Gregdério de Matos, seu uso unifica todos os estilos de poemas particulares de varios géneros como exemplos ou ilustragdes de caracteristicas da es- séncia classificatéria, nio considerando que, no tempo assim etiquetado, coexistem multiplas temporalidades heterogéneas de modelos artisticos que sao imitados diferencialmente pelo supos- to autor dos poemas segundo preceitos, técnicas, formas, estilos e finalidades sem correspondéncia com as categorias evolucionistas e psicologistas pressupostas na classificagaio, Desde o século XIX, a critica que se ocupa da poesia atribuida a Gregério e de outros discursos coloniais — penso por exemplo em Anchieta, Nobrega, Bento Teixeira, Vieira, Manuel Botelho de Oliveira, Clau- dio Manuel da Costa, Basilio da Gama etc. — costuma ignorar e eliminar sistematicamente suas categorias, substituindo-as por outras, que universalizam valores interessados do presente dos intérpretes. As categorias escoldsticas que compoem a pessoalidade “eu-tu” no processo de interlocugo dos discursos sao ignoradas ¢ substi- tuidas por categorias liberais e psicologicas da subjetividade bur- guesa; a orientagio metafisica, religiosa e providencialista do sentido da histéria, que é propria da politica catélica portuguesa em luta contra a heresia maquiavélica ¢ luterana, é climinada e substituida por concepgdes evolutivas, iluministas e liberais, formativas, progressistas e nacionalistas; a regulagao retorica dos preceitos artisticos e das formas, além da interpretagao teolégi- co-politica da sua significagao e do seu sentido, sto apagadas, propondo-se em seu lugar categorias estéticas exteriores, como a expressio da psicologia dos autores, a oposi¢&o “forma/contet- do”, 0 realismo documental, a antecipagao protonacionalista do Estado nacional brasileiro. Além disso, o uso naturalizado da no- Ao de “Barroco” para classificar essa poesia e totalizar seu tem- po generaliza transistoricamente as definigdes liberais, 4s vezes marxistas, das nogdcs de “autor”, “obra” ¢ “piiblico”. 20 JoAo Avotro HaNsen LETRAS COLONIAIS E HISTORIOGRAFIA LITERARIA 21 Assim, para lhes falar do meu trabalho sobre essa ruina arruinada, as letras coloniais dos séculos XVI, XVII e XVII pro- duzidas no Estado do Brasil e Estado do Maranhio e Grao-Para, repito que é um trabalho arqueolégico condicionado pelo seu lugar institucional, a universidade neoliberal que conhecem. Ele passa ao lado da historiografia literaria fundamentada nas cate- gorias do continuo evolucionista do século XIX, como disse, e tenta inventar, de modo verossimil, a estrutura, a fungao, a comu- nicag%io e valores dessas letras em seu presente colonial. Para isso, pressupde os condicionamentos materiais e institucionais da sua produgao na circunstancia colonial, como 0 exclusivo metro- politano, 0 escravismo € 0 catolicismo contra-reformista; a ago de agéncias culturais, como a Companhia de Jesus, responsavel pela educacao colegial e universitaria dos letrados coloniais; a situagaio profissional e a posi¢ao hierarquica dos letrados cooptados nas redes clientelistas locais; os esteredtipos ibéricos da “limpeza de sangue”; as censuras do Santo Oficio da Inquisigao e da Coroa ete. O trabalho também se ocupa de cddigos bibliogrificos, como a manuscritura. O conceito de “publicagao” do tempo dessas le- tras ¢ mais extenso que 0 nosso: o manuscrito, que circula sendo copiado em versdes produtoras de variantes, também é publi- cacao, diversamente de hoje, quando entendemos pelo termo ape- nas 0 texto impresso. Grande parte das letras coloniais foram inicialmente publicadas como manuscritos, tornando-se “obras” somente quando oralizadas em circunstancias cerimoniais e polé- micas?, Em sua tese de doutorado sobre os cédices gregorianos, Marcello Moreira demonstrou que a oralidade produzia variantes que novamente eram copiadas em manuscritos segundo a movéncia discursiva de que Paul Zumthor fala em seus estudos da poesia medieval. Baseado em evidéncias da existéncia local de uma cultura de escribas que faziam cépias de poemas, Moreira critica a filologia de Lachmann e Bédier, demonstrando que seus pressupostos romAnticos acerca da autoria e da arte — originali- dade, autenticidade, “primeira intengao autoral”, restituig&o de tex- to etc. niio dio conta dos modes contemporaneos da invengao, circulagao, consumo ¢ valoragao dessa poesia. Além disso, quando os poemas passaram a ser editados na forma do livro impresso, principalmente a partir do século XIX, a primeira ordenagao que tém nos manuscritos quase sempre foi eliminada ou alterada. Moreira demonstra que, nos cédices, os poemas sfio dispostos segundo uma hierarquia dos géneros que forma um conjunto polildgico, intertextual, com remissdes e citagdes internas que evidenciam os modos contemporineos de produzir, consumir e valorar a poesia. O conjunto ¢ evidentemente destruido quando poemas sao selecionados e publicados na forma impressa das an- tologias, como a de Varnhagen e as do século XX. Também se destréi a pontuagao retérica deles, indicativa de pausas intensi- vas da actio deles na oralidade, que ¢ substituida pela pontuagao gramatical impessoal e ldgica, indicativa de fungdes sintaticas* . Esse trabalho é complementado pelo exame dos cédigos lingiiisticos que modelam e interpretam as representagdes. Os codigos lingiiisticos so retérico-poéticos € teoldgico-politicos. No caso deles, a arqueologia é dupla: diacronicamente, relaciona as letras coloniais com sistemas de representagao anteriores que elas imitam e transformam. Falando muito genericamente, esses sistemas so 0 que podemos chamar “o bloco greco-latino”, as varias retéricas gregas ¢ latinas ¢ suas diversas verses patristicas, bizantinas, escolasticas ¢ neoescolasticas, bem como as letras an- tigas, a poesia e a prosa de diversos géneros. Sincronicamente, a arqueologia relaciona as letras coloniais com 0 campo semantico geral da cultura de seu presente* e para isso também examina documentos de n&o-ficgao, como disse, com o fim de estabelecer homologias estruturais e funcionais que possam especificar sua historicidade de modo plausivel. Hoje, depois que varias genealogias ¢ arqueologias do pas- sado demonstraram que a_ historia literaria romAntica e hegeliana da tradigao iluminista nao é mais uma evidéncia, as redefinigdes do estatuto da historiografia literaria se acompanham da critica a generalizagao transistorica das categorias nacionalistas do continuo teleolégico do século XIX e aos processos neoliberais de 22 Jodo ApoLFo HaNseN LETRAS COLONIAIS E HISTORIOGRAFIA LITERARIA 23 desistoricizagao do presente. As redefinigdes enfrentam uma ques- tao decisiva: a do tipo de histéria que se vai fazer com as letras coloniais, supondo-se que ainda haja algum interesse em fazé Como sabem, nos cursos universitarios de Letras essas represen- tagdes nao sao mais estudadas ou tém lugar mais que secundario de disciplina optativa, pois os modelos evolutivos, formativos e nacionalistas de interpretagao as definem a priori como etapa superada da histéria do pais. Segundo a opiniao de muitos colegas de Letras, 0 estudo delas provavelmente deve usar carbono 14 ¢ quem se dedica a ele demonstra a alienacao de um antiquario que coleciona fésseis. Mas, como provavelmente a USP nao é o mundo, pode-se perguntar: a historia delas deve ser uma hist6ria normativa de sua hipotética primeira legibilidade normativa cujo conheci- mento permitiria excluir significagdes nao-previstas na invengaio delas? No nosso caso brasileiro, essa historia nao deixa de ser perti- nente, pois a primeira normatividade delas, que é normatividade tcolégico-politica e retérico-poética, foi sistematicamente elimi- nada e substituida, desde 0 século XIX, por categorias psicolé- gicas ¢ documentalistas do continuo iluminista. Ou essa histéria deve ser descritiva? Uma histéria descritiva, lembra Hans Ulrich Gumbrecht, deveria ser uma hist6ria de todas as leituras possi- veis de um texto determinado, tratando-se de reconstituir as con- digdes técnicas, matcriais ¢ institucionais em que varias significagdes foram geradas por leitores cujas disposigdes receptivas possuiam diferentes mediagdes historicas ¢ sociais. Tentando dar conta dessas questées que para mim impli- cam principalmente a questao teérica ¢ politica dos usos do pas- sado aqui-agora, 0 trabalho de que lhes falo pressupée a articulagio temporal de passado/ presente como a correlagaio* proposta por Michel de Certeau em seu estudo sobre Surin ¢ a mistica france- sa do século XVII. A correlagao € um dispositivo de encenagaio de duas estruturas verossimeis de ag3o discursiva, 0 presente da enunciagio da pesquisa feita como trabalho parcial que pressupoe a divisao intelectual do trabalho condicionada pelo lugar institucional onde se realiza, a area de Literatura Brasileira da USP. A outra estrutura ¢ a do passado da enunciagiio e enuncia- dos das representagées coloniais. Por meio da correlagao, é pos- sivel, como disse, constituir a estrutura, a fungao, a comunicagao e valores normativos que elas tinham em seu tempo. Ou seja, cons- tituir os modelos de seus varios géneros, estabelecendo a relagao deles com as referéncias simbdlicas anteriores e contemporaneas que eles transformam em situagdes de comunicagao cerimonial e polémica, institucional e informal, segundo varios meios, como a oralidade, evidenciada na manuscritura de folhas avulsas ou, como Marcello Moreira demonstrou que foi costume na Bahia dos sé- culos XVII e XVIII, encadernadas em cadernos grossos que for- mam cédices como os que hoje est%io depositados na Biblioteca Nacional, Simultaneamente, a correlagao possibilita examinar a cadeia heterogénea de suas recepgées historicas desde os pri- meiros romanticos do século XIX, como 0 cénego Januario Bar- bosa, j4 no final dos anos 1820, 0 grupo de Gongalves de Magathies na revista Niterdi, em 1836, ou 0 Instituto Histérico e Geogrifico Brasileiro, a partir de 1838. Aqui, eu diria que é razoa- velmente simples reconstituir descritivamente as cadeias dessas apropriagdes para evidenciar a particularidade interessada das interpretagdes romanticas, deterministas, modernistas, concretistas, pés-utdpicas etc. que foram e sao feitas dessas letras, nos termos de Hobsbawm, como invengio de tradigdes nacionais e naciona- listas. Mas a reconstituigao das proprias_leituras coloniais das letras coloniais é quase sempre lacunar. Além de serem material- mente limitadas pelo vazio dos arquivos brasileiros, as proprias evidéncias coloniais de leitores e de Icituras coloniais de diferen- tes mediagées sociais sd muito raras, o que faz com que a histé- ria descritiva delas também seja bastante rarefeita. Supondo a rarefagio das informagées sobre as apropriagbes empiricas € os usos provaveis dessas letras na condigao colonial, acredito que é pertinente reconstituir a primeira legibilidade normativa que aparece formalizada no contrato enunciativo dos discursos, lembrando que é justamente essa normatividade que foi - ¢ continua sendo ~ eliminada nas historias literarias brasileiras e nos cursos de literatu- ra da escola secundaria e da Universidade.

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