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Michel Mollat radugao Heloisa Jahn porlanto, no passa de uma tentativa, de um convite a pesquisa. Se em breve ele for superado por novas obras, seria uma satisfagao nao ter sido inatil.* ''Na orientagio bibliogrifica (p.369 ss.) 0s ttulos das obras relativas a cada capitulo estio indicados na ordem em que foram ulllizaclas. As referencias 8 citagdes textuais silo mencionaclas nas notas de pé de pagina. | | ' \ | i | SUMARIO y A Guisa de Introducao Encontro com os Pobres: Seres Fouco Conhecidos € Ambigiios.. Parte 1 Os Fracos a Sombra dos Poderosos(Séculos VXI) 13 Capitulo l A Heranca da Antiguidade Tardia 15 Sobrevivéntia Oriental da Pobreza Urbana Antiga 5 0s Doutores da Pobreza 20 Capttuto 1 Um Destino Mediocre Numa Sociedadeem Movimento (Séculos VI-XI) 25 1 26 nL 32. } Capituto HI ‘ODever de Esmo! lidade Monastica Os Humildes na Comunidade Crista (Fim do Sé- culo XI- Inicio do Século XII)... Capitulo 1v 7 Paste 4 Uma Presenca Permanente . 59 X Pobres e Indigentes: Presencas Incomodas e In- 1. As Investicas da Miséei 39 | paletontes (Mead do SiciloX1V- Inicio do Sécuto i, Os Camiahos do Info 6 Fie a Capituto V i Capitulo X Contrastes ¢ Escndalos.... . a De Provacao em Provacao: Entre a Peste Negra cas Per- Dyas Constantes: a Humilhagio @0 Desprezo a ' turbacdes do Final do Século XIV. © Encontro dos Pobres ¢ dos Ercmitas 75 i: ORERSDER Desilusoes © Clamores dos Pobres 81 ' i Den eecee Sf Capitulo vr Capitulo XE A Urgéncia da Caridade .... a7 | A Escalada do Pauperismo. 1, Renovagio das Obras de Mi 87 Ii, Uma Teologia do Pobre... wot | 1. Parte 3 “"Mendigos Implorando Seu Pao" Os Indigentes Diante dos Ricos * (des Sao Francis- Coa SCS ee a reza se Recruta no Campo. 60 @ Grande Peste)........: | ‘A Gldade, Enerusitoada das Miser Os Vagabundos. Capitulo VIE Um Novo Othar Sobre os Pobres ‘Tradiglo ¢ Novidade em S40 Domin, As Ordens Mendicantes Vao a0 Enc ‘A Educagao das Conscignetas.... Capitulo VEE ‘lorescimento das Instituigdes de Assisténcia Capitulo XII Das Obras de Miseric6rdia A “Politica dos Pobre: 1. A Garidade em Questio.... Entre 0 Temor e 0 Desprezo Entre a Caridade e a Justg. ¢ I. A Misericérdia Nao Tem Insuficiéncia da Esmola MI, Busca de Eficécia.. Confrarias e Mesas dos Pobres Montepioss.. Reformas Hospitatare Enquadramento dos Men Capttulo 1x Realidades ¢ Decepgoes. Conelusao 1, Estruturas e Conjunta “Talvez. a Natureza ‘Tenha Criado Essa Gente Para Ser Prédromos das Cr Miseravel Pobres das Cidades Pobres do Campo... O Niimero de Bobres... i ; Rootes ta Il, Esperangas e Decepgdes dos Pobres As Necessidades dos POBTES....... Ortentacho BI Limites e Nao-Realizacoes da Beneficéncia Atraso do Pensamento Sobre a Realidade Viviela. ‘Aigumas 1s Pobres. Camelds ¢ Sonbadores... : 05 Exploradores da Colera dos Pobres..... 180 A GUISA DE INTRODUGAO ENCONTRO COM OS POBRES: SERES POUCO CONHECIDOS E AMBIGUOS 1 C Suprimi-la, desde as sequelas do piuiperismo antigo © da regressio social e econdmica dos tempos barbaros, até 0 momento ‘em que 0s contemporiineos dla Renascenca.e da Reforma clesen- volveram um sentimento de vergonha diante de um estado indigno do homem. Assim como a carida inisericGrdia- Nenhuma dessas correntes, porém, podia conceber 1enlo 40s pobres ou uma ibulatio que exprime a di atitudes e os sentimentos que lesse modo refletiram-se nos espfritos e ios discursos dos homens a proliferagio da miséria, sua agravagio 4 ‘geralmente a pastic de um sinico ponto de vista, o olhar dos outros homens sobre os pobres. | ‘Um contfaste caracteriza a designacio da pobreza entre as duas ureté © pauvrelé, povre e pauvre, em italiano poverta e grandes fases lingiisticas da Idade Média. Os sinnimos latinos de m portugués e em espanhol pobreza e pobre, em inglés pauper também seguiram uma evolucio da forma adjetiva pat personagem uma qualidade moral de nobreza antes de definir sua .¢ poor, Poco importa, por exemplo, a diversidade das for- forma substantiva, Esse fenémeno € comum, aliis, a0s termos jee Peowas social no mundo des senhores, E possivel fazerse Seta tive An ciiekienac eam b fexprimem identifica com um estado ow ma of soc classificagao tipolégica em que os quadros correspondem a oe {ade das formas de adversidade bem como aos julgamentos e, fato foi observaclo com relagio & palavra nobilis, conferindo a um i o/ sentiments formulados em relagio aos desvalidos, Jf, esse modo colocanrse em ‘evidéncia a impectinia eo des- ro rs pojamento em geral (egens, egenus, indigens, inops, insufficiens, Ww ates ‘miser), a deficiéncia alimentar (esuriens, famelicus) e de See SE RN LSni So ae desTgUaNdRdeS nO y Mi Termidade em geral Cinfirmus), lepra Cleprosus), ferida (vulneratus), : ‘dade (aogrotans, debilis, senex, i ‘de uma pobreza que, no obstante, é partilhada. Ma a debilidade da_satide ou ig aaah peer green ar ta alotudinariu), adeficlencia mental (idiotus; imbecilis simplez), 08 restuario (nudus, pannosus), a deficiéncia Fisica: cegueira (caecus), claudicagio (claudus), reumatismos deformantes (contracts), en- sos Soniage da ineeias palavina’Sotsoe ecnigpre mall. perfodos de debilidade das mulheres grividas ou em estado pucr- eeouon ee ee ’ fa - Petal, (mulierantoetpost partum), as situagoes deadversidade, como ee aa arena esee edie _ Sprivagio do pai ¢ da mae (orphans), do marido (vidua), da SEE aa ee a ee leeperar ae bs liberdade Ccaptious), o banimento € o exilio (bannus, exiliatus), As ppanrhl & aocodepede Loa Ce dc compausto dé origem a umn matiz favorivel de pobres, Uma terceira etapa foi supetack quando ao emprego do t (miserabilis, sessorabils Basen culras yebes ES: a deriva da ore", e em seguida das formula . aco pela discriglo do “pobre envesgonhado” (pauper vere- is oy To pobr ae ‘orespeito a imagem’ de Cristo refletida no pobre exprime- eer ital de "pobre de Cristo” (Pauper Christ), anteriormente reservado aos monges, pobres voluntirios poramora Devs, Ha muita Condescendéncia no diminutive pobrezinho Cpauperculus, pau- ‘portinn). Da condescendencia passa-se a0 desclém, do desdém a0 Gesprezo e do desprezo a repulsa, através de simples alteragbes de ‘nem sempre é compreendida ‘compa € 0 século XVI, no ritmo do desenvolvimento eris- je seseavolvaneno do paupens grau. A humildade do pobre (ut ‘como a manifestacio da virtude “Serva do Senhor";a fraqueza do pequeno Cimpotens) vulgaridade do ristico Cignobilis,vilise até vilissintus). pado, nauseabundo, coberto de ilceras, o pobre torna- Cabjectus). Desa forma, seria possivel repertoriar a stimula das misérias e decadéncias, cujos nomes variados Cabjectio, bumilitas. réplica a cada adjetivo empregado } ar os desvalidos, A nomenclatura assim ‘apresentada nio é fruto de mera reconsttuigo. Os homens do século_ | ¢ a evolugio do emprego das palavras pobre e pobreza ide a determinadas mudancas profundas ¢ lentas das ‘seus antOnimos, suas mente dignos cle atengio. a compl lamentos que esses suscitam, Poder-se-4 ies e esses Comportamentos s0 conheciclos para eles, um conju com uma exigéncia de no mesmo sécul Grand joa) clos monges e da pobreza simulada (si silo como monumentos finebres ¢ pa ia (coactd) & a dos mendigos da pobreza? dos a viver no cami Determinaclas assimilagdes verbais e determin conitibuem para precisar a condigh homens que fiana de sua subsisténcia: © "pobs ham a terra com as mios para a lavrador” de La cotidiano ¢ exprimir a incerteza do amant lamidades, certas palavras, surgidas a0 lado das ps ma angéstia, a afligio Cancdetas, angustid), a falta de recursos (carestia, penuria). ‘Algumas antonimias situam © pobre diante do homem cujo poder (potens), forca militar (miles), liberdade civica (cfvis, burgensts) @ riqueza (dived) se opdem a sua inferioridade. A ap! ccontrastes corresponde as etapas da cronologia medi ‘Quando as linguas vulgares substituiram o lat um alentado instrumental verbal para designare qu: pobreza. , este possuia iraduzidas do latim, exprimindo as nocdes fundament da caridade, acrescentaram-se outras, adaptadas As circunstincias novas, Nem todas essas formulas eram caridosas, Pauper e pobre conservaram Uma conotacio religiosa, mas a terminologia relativa 08 deserdadlos caracterizou-se, desde meados do século XIV, por uma degradagio do sentido das palavras e pelo surgimento de um ‘vocabulirio 20 mesmo tempo truculento e depreci am_o mendigo impregnam-se_de_ uma as categorias de desocupados e vadios. . periéncia das dificuldades econdmicas desvendou pouco a pouco, Como uma indigéncia digna de interesse, a pobreza laboriosa do homem cujo trabalho nao basta para garantir 0 propno sustento © 0 4 acho desses | qual a precariedade s ¥ SXsim, sobre dois planos separados por uma frigil linha de demar- ‘a vulnerabilidade as agressbes do inforttinio € a Segundo a natureza das aflicoes, podem-se distiny dos seus. Assim, 0 mundo dos "pobres" acolhe novos recrutas, sem uas caracteristicas essenciais se alterem. a bre e de seuestado deve, portanto, ‘ bre_é aquele re) ragio de debilidade, dependén 42> ciguma, de meio aigum. Tampouco exclui aeeetico ow mistico, decidiam afastarse do mundo ou 4) Gevolamento, opraram por viver pobres entre os pobres a, a pobreza comporta gradagdes, Varia no plano wean de cultura e desenvolvimento difere de acordo com 2 posig & ‘esa Idade Media dizia que um homem “cai")_ capa de arse) am ponto de ruptura, um ransforma em miséria. A pobreza situa-se, coe sociolG, tério eo nobre para as s na cidade © na | camentos comercias, 0 clérigo ccavalgadas guerreiras? As condi lnvoura. A vulnerabilidade fisiol6gica result da habit imentacao. £ perfeitamente evi da mi —de cago extremamente dific \coes médicas contempor 5 5 sas podem esclarecer \ 5 componentes da miséria fsiologica dos séculos passados. A sua Aos rejeitados somavam-se os excluidos por rxzdes ce ct) leterminada alusdo ao regime alimentar no Roman de Renart, de~ iais propriamente ditos, contestatiios pr , Sociedade, Estado, Nem todos eram c foi o caso dos “homens da flores! ais tarde, no sécul ido detalhe fisico de um personagem pintado por Brueghel, rminado vestigio de raquitismo descoberto em um esqueleto no de escavagoes em ios, assumem um signifi , idades, senhorias e Estados, de das disponibilidades do abastecimento; des dependem do desei econdmico e demogriico, midades. © movimento dos m bandos, a margem da sociedade e, como tais, suspeitos de heresia ou de subversio. Recrutados entre os indi exercida até mesmo sobre os 5 senhor ido: Coroando tudo, nponés ¢: da socials? Essa questio iniroduz a nogao 4 miséria, definida pela porcentagem de marginals que uma so ide pode suportar, sem perturbagdo nem repressao, Essa pro- 1porsio varia segundo as circunstdncias econémicas, sociais e morais, oh g ta do vocabulirio da pobreza ¢ o discemnimento infortinio nao sao suficientes para resolver as breza. Essas ambigitidades também estio pre- as atitudes. Seria simples imitar aqueles cuja “boa cons. Sem isso, 0 homem nao era mais nada, visto que ios reditava ser capaz de distinguir os pobres “bons” ¢ dle existéncia social. A partir desse momento, desclassificado, ex. iros” dos outros, os “maus", os “falsos", os “rcbeldes. marginais tém por palco as tavernas € cabarés (foi nese momento. que esta palavra surgiu). De mendigo, o individuo transforma-se em malandro Giruand, caiman, belistre, coquin © guetat ). Da mendi- cidade fraudulenta, passa-se a0 pequeno fur icado, Na taverna estabelecem-se as “ci € corroborado pelos textos, Em Paris, a natureza dos crimes © parece evoluir da violéncia, em meacios do século XIV (golpes € feimentos em 7036 dos casos julgatos pela alta justign de lo roupas, sapatos, ‘comerciantes de roupas usadas que desempen! Tihtimos ver-se-iam mendiciincia” caso no fosse concedido o perdio. Nem scmpre 08 culpados so mendigos; a pobreza laboriosa ‘mal remunerada contributa com seu contingente para a delingtléncia. B. Geremek anal profissional dos réus do tre 1389 ¢ 1392. Bram 127, entre os quai se encontavam, res, Esclarecend cidades ¢ do campo. O desemprego panhias” do século XIV os bandos do século XV, cujos delitos fc Anotados pelo Burgués de Paris. A questio dos caymans__ em Paris em 1448, 0 processo dos Coquillards na Borgonha em 1453 e dos rs do Languedoc nove anos mais tarde sio bem conhecidas disso, Mas se o talento de Toyaulx. — pobres leais. Eustache Des xamps chama de povres Os vagabundos expresso, clecasos de pobreza por parte do compra- , incapacidade de pagar um aluguel, desemprego. As icados a tomar as, viu-se os partidos no poderexilarem ; na Alemanha, por volta de 1350-1360, 0 ni de banidos era em média dez. em Stralsund, catorze em Spire; dicta de Frankfurt em 1397, hd 450 vagabundos. A desergio wwoadios, como resultado de perfodos de fome e de utindo: tratava-se de uma contradanga de miseriveis Depois das pesquisas re: gragdes © vagabundagem na ra do Geom Anos praduchi a eh “Também eram vagabundos os homens de armas Yagabundos igualmente, muitos falsos pen ente, aqueles novos Wanderprediger que er ‘A chegada dos ciganos a Europa Central, por em seguida a Franca, em 1419, nao. simpl ‘complexa da vagabundagem. Aquel vel estatura®, sua vida emtendas “4 mai seus “cavalos negros como a cauda de um porineos souberam exprimir como 0 ido de sua chegada diante “Em suma, cram as pessoas mais pobres que ji ir A Franca. B, apesar de sua pobreza, no grupo havia is dos pobres que vagabundeavam, porém, estavam atras -celagens aumentou a lo XII, de trabalhadores brabanteses para a I artesaos eta grancle no fi loXIV em Paris. Um confecciona- dor de malhas nascido em Tournai exercera um pouco de seu oficio m1 Laon, Soissons, Noyon, Reims e Chartres antes de fixar-se em is. Um companheiro alfaiate trabalhou durante trés anos, sucessi- Mantes, Bougers, Le Blanc, Paris, Melun, Brie- ‘ompiegne, Senlis, s mo € observado em outros paises, por exemplo em. Frankfurt, Konstanz, Gdansk, Em Augsburgo, transcorreu 0 caso, ho de artesto, nascido aprendiz e depois estudante iveu a tmendigan tomou-se auxiliar de ites em Augsburgo, depois em Nurembergue, voliou a sua carreira tico € respeitado. Simonnet ido do Berry, de Dun-le-Roy, nao teve a mesma sorte; para Paris, comecou a guardar os cameiros de um 243, ee eh hb bn bbb 6 DO 6646S S46 bee ‘20 dia; torna-se empregado doméstico em Savigny-sur-Orge, depois foge do amo e volta para Paris, onde trabalha como ca ante oito dias, em seguida € palafreneiro em Meaux, volta part ‘mas em lugar de conseguir emprego € detido © pres. A lidade e os azares do mercado de mio-de-obra eram mais tes que 2 obrigacto de residéncia reiterada desde 1354. Também panheiros de passagem’, extremamente nociva nos pobres vagabun- ios, bem como os habitos nascentes do tour plo por um aprendiz de ourives de Tours, que parti “part ‘boas cidacles para aprender melhor". Nem todos tinham razées ‘Quanta gente, naquele tempo, percorrendo as estradas! E quantos tos suspeitos, a0 lado de seres pobres € castigados. Em relagio a les, 0 corpo social podia escolher entre o rigor € a atencao justa € ‘compassiva, ‘do subsielios.” 10 Vieat Rex, 1405 CAPITULO XII DAS OBRAS DE MISERICORDIA A “POLITICA” DOS POBRES 1. ACARIDADE EM QUESTAO desenvolvimento do pauperismo a partir da segunda metade ia ndio sem motivos, desorientar alguns © ‘Nunca fora tio nit “Entre o temor e 0 desprezo ‘ja percebemos as razdes pelas quais Thomas Bri vor depois dos acontecimentos de 1381. Sobravam pro Jaueles que, como ele, sentiam uma compalsaio sincere pela miséria. aa es cog’ menos sensiveis, tudo era raza0 para escandalo, Como. associar a imagem de Cris Yadlio ou do bandido? ee Gabelecida e a vontade de Deus? Come lesiings + mendicidade do homem vilido, contriria 2 2 S qolerar 6 afentaddo 0 estabilidade tradi eagabundagem? Como, finalmente,alimentas, com &mo postadas, o envilecimento do indigente, ofende Ramana? 0 testemunho dos textos, @linguagem Tomadas de posigio duras ou embaragadas por pa ariados meios e pertencentes a pelo menos (rés Be 1 desconfianca ao medo € dt medo_nao ¢ 245

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